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sobre o Senado, que sobre o poder judicial. A camara dos Pares tem quasi sempre muito maior numero d'ouvintes, que os tribunaes, a imprensa occupa-se incomparavelmente mais dos corpos legislativos, que do poder judicial, as decisões das Côrtes tocam quasi sempre a muito maior numero de pessoas que as dos juizes. Em quanto a responsabilidade legal é certo que ella é nulla nos membros dos corpos legislativos, e se acha decretada para os do poder judicial porém cumpre-nos confessar que em tal objecto, a lei é, e ha de ser em todos os tempos illudida com rarissimas excepções.

Que a lei da responsabilidade dos juizes é no tempo actual constantemente illudida, ninguém ousará pôr em duvida. Todos tem noticia de factos arbitrarios, e manifestamente oppostos às leis praticados por jui7es, e com tudo ninguem será tão feliz, que possa citar-me um caso em que essa gabada lei da responsabilidade fosse devidamente executada. (Apoiado).

De mais, examinemos o codigo do processo que ha poucos mezes foi approvado pela maioria d'este Congresso, e reconhecer-se-ha facilmente que a responsabilidade legal dos juizes é uma bem insignificante garantia. Não exaggero, o juiz que atacar a lei, cuja execução lhe incumbe, ha de ser julgado por seus collegas, e não se ignora o espirito de classe que domina os individuos de semelhante corporação, espirito que é hoje mui geralmente considerado ainda superior ao dos corpos ecclesiastico e militar. E no caso d'absolvição injusta do juiz accusado, quem tem de julgar a estes máos julgadores? Outros membros do poder judicial; de sorte que nos achamos sempre involvidos num circulo vicioso. (Apoiado)

Ao menos no Senado verifica-se as mais das vezes o contrario, suas decisões injustas podem, no maior numero de casos, ser de todos remediadas por uma de duas authoridades diversas della, o governo, e a camara dos Deputados.

Tomemos porém a questão na sua maior generalidade, olhemo-la por todos os lados, profundemo-la em todas as hypothesis, e seremos levados a concluir - que a responsabilidade legal dos juizes é um meio bem insufficiente, e bem precario! Sr. Presidente, a consequencia não é minha, é d'um jurisconsulto talvez o mais philosopho de nossos dias. Suas proprias palavras, sem as traduzir, são as seguintes: - la responsabilité est un moyen bien insuffisant e bien precaire. - São innumeraveis, continua elle, as occasiões em que um juiz pode fazer mal, e muito mal, sem que as injustiças deixem depois de si traços assaz visiveis, para serem susceptiveis de provas, destas provas assaz fortes para produzirem o castigo do culpado, e em quantos casos seria necessario deixar a má fé impunida com medo de punir um erro innocente, ou uma falta digna de desculpa? A censura publica vai mais longe Senhores, penso não dever progredir na opposição das idéas deste celebre escritor, o que tenho repetido é bastante , para se conhecer quanta possibilidade tem os juizes na maior parte dos casos d'illudirem a responsabilidade legal, ainda dentro dos termos da decencia. Mas se o tribunal superior judicial, applicando a lei da responsabilidade, proferisse uma sentença escandalosamente injusta, que remedio? Desgraçados os povos, se a maioria de seus juizes não possuirem rectidão, pudor, ou não ambicionassem a publica estima, isto é, se não influisse poderosamente sobre elles a responsabilidade moral!

Finalmente apresentarei um argumento de simples observação, a que jamais se poderá responder: - não ha corporação mais justa, do que a camara dos Lords d'Inglaterra, quando constituida em tribunal de justiça. Nesta verdade concordam todos os jurisconsultos inglezes, e todos os viajantes sensatos, e de boa fé que tem observado aquelle paiz.

Uma corporação composta de homens, pela sua idade fóra do fogo das paixões, já verdadeiramente ezperimentadas independentes por seus teres, que tem dado decididas provas de intelligencia, moralidade, e adhesão aos principios liberaes, e que são verdadeiramente interessados na conservação do systema governativo de que formam uma parte essencial, comprehende toda a perfeição possivel em cousas humanas. O caso esta em serem nomeados por quem os escolha com escrupulo, e com um cabal conhecimento da materia, a fim de que reunam todas as referidas condições porém sendo escolhidos pelo Rei com um ministro responsavel d'uma lista triplice votada por collegios eleitoraes respeitaveis, offerecem as maiores garantias (Apoiado.) Pódem mudar, tem dito alguns illustres oradores é verdade que alguns Senadores assim nomeados podem mudar; mas é impossivel moralmente que mude a maior parte delles. E para que hão de mudar os membros d'uma corporação tal? Para arriscarem o seu socego, a sua propriedade, e a existencia d'um systema de que formam o elemento mais importante? Não é possivel, entretanto convém descer a uma analyse mais miuda.

Que males póde fazer uma segunda Camara? Tomar deliberações prejudiciaes? Não, porque a Camara dos Deputados, ou o Governo póde rejeita-las. O unico mal, que pode fazer uma Camara semelhante, é rejeitar algum projecto util, que lhe seja enviado pela primeira. Entretanto este mal é mui pequeno em comparação dos importantes beneficios que pode prestar, obstando a que sejam reduzidos a lei uma infinidade de projectos nocivos. Com effeito a Camara dos Deputados, ou um Senado de organisação semelhante, tem uma tendencia constante para fazer novas leis, e para o progresso rapido, ao mesmo tempo que bem definidas as garantias, e decretadas todas as reformas no sentido o mais liberal, é absolutamente indispensavel que não se faça lei alguma senão as que forem necessarias, e reclamadas pela opinião publica, e vê-se que estas não serão rejeitadas por uma Camara de Pares, como eu proponho, senão quando se atacarem as prerogativas de seus Membros, e ainda assim desapparecerá toda a resistencia, logo que a opinião publica altamente reclame semelhantes medidas. (Apoiado)

Esta doutrina geral tem uma rigorosa applicação ao nosso estado presente. As garantias individuaes já se acham por nos decretadas, as duas dictaduras publicaram uma infinidade de leis, que pela maior parte são excessivamente liberaes, consideradas politicamente, porém que o são mui pouco pelo lado civil, isto é, garantem muito imperfeitamente os direitos civis é portanto indispensavel que sejam reformadas quanto antes, a fim de que os portuguezes gozem de maior segurança pessoal, maior liberdade individual, e mais amplo direito de propriedade. Se esta é a nossa maior precisão actualmente, é claro que uma Camara de Pares tal, qual tenho a honra de propor, é a que póde convir-nos. Um Senado constituido semelhantemente á Camara dos Deputados, tenderia constantemente para o progresso, e para o liberalismo, e serviria só para alimentar cada dia mais a desordem em que nos achamos. E se por casualidade o ministerio influisse na eleição, poderia bem acontecer que o Senado não fosse mais que mero executor da vontade do poder executivo.

Se nós pelo contrario necessitassemos hoje de leis politicamente mais liberaes, ou ainda se nos conviesse dar uma maior amplidão aos direitos civis de cada um dos portuguezes, poder-se-ia recear que a segunda Camara causasse algum embaraço, organisada conforme os meus principios, rejeitando as medidas de progresso que a outra lhe enviasse comtudo ainda assim as viria a adoptar, se ellas fossem realmente uteis, logo que a opinião publica as approvasse, e exigisse dum modo enérgico. Não foi de outra maneira que a Camara dos Lords de Inglaterra, corpo muito mais estacionario do que o póde ser qualquer Senado, que nós estabeleçamos, depois de se haver opposto por tanto tempo á emancipação dos catholicos, a reforma eleitoral etc., os veio por fim a approvar. (Apoiado.)