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SESSÃO DE 14 DE OUTUBRO.

(Presidencia do Sr. Macario de Castro.)

ABRIU-SE a sessão às onze horas e meia da manhã, estando presentes noventa e um Srs. Deputados.

Leu-se e approvou-se a acta da sessão anterior.

ORDEM DO DIA.

O Sr. Presidente: - Continua a discussão sobre a organisação da segunda camara, o Sr. Ochôa tem a palavra.

O Sr. Ochôa: - Pedi hontem a palavra, quando parecia ultimar-se a discussão, sem intento nenhum de a prolongar, mas só para declarar o meu voto; e resolvi-me a fazer esta declaração, por ver, ou parecer-me que houve durante a discussão, ou proximamente a ella alguma mudança de opiniões, sem motivo que me fosse conhecido. Desejo manifestar solemnemente que eu não mudei, e que voto pela parecer da maioria da Commissão, por a convicção em que sempre estive e permaneço de ser muito preferivel ao da minoria, maxime em nossas circumstancias presentes.

Não entrarei na polemica das questões largamente debatidas pró e contra.

Em materia tão complicada e obscura como esta, não pode haver demonstrações, porque não ha principios de theoria conhecidos e fixos, onde se possa estabelecer um systema de sciencia tudo é hypothetico; donde vem que, tanto mais se augmenta, tanto mais se corre perigo de aberrar da verdade.

Cada um de nós (estou persuadido) acertará, melhor pela sua propria meditação, pelo seu proprio senso, pelos dictames da sua intima consciencia, do que por a lição dos escriptores theoricos, ou por as suggestões dos argumentadores de qualquer especie, que trabalham para nos arrastar às suas opiniões, ou ao que tem por suas opiniões.

Digo-o assim porque muitos fallam até só por fallar, e por ostentação, sem que na realidade tenham uma opinião formada, que mereça este nome, sem contar aquelles que fallam de má fé. E digo isto em toda a maior generalidade sem querer fazer applicação nenhuma, e menos offensa a quem quer que seja.

Eu tenho, Sr. Presidente, por um facto incontestavel, que se vê, que se apalpa, que se ouve geralmente repetir, de que não é licito duvidar, que a maior necessidade da nação portugueza é a de repouso. (Apoiado). Ella tem sido levada muito rapidamente, e como de rastos, no caminho do progresso politico: e isto por entre catastrofes horrorosas, e grandissimos trabalhos.

Necessita descançar, e descançar muito, para medicar as feridas, que ainda vertem sangue, para ganhar forças, e igualmente para se dar razão do que tem feito, aproveitar e firmar os bons passos, emendar e desandar os errados.

Se continuarmos em leva-la do mesmo modo, ou succumbirá por falta de forças, ou resistirá, desesperada, aos seus conductores. E todos sabemos que não faltam grandes instigadores, para movê-la a esta resistencia, e para apoia-la tanto de dentro, como de fora de casa.

Eis-aqui a principal razão, por que eu votei por a divisão do corpo legislativo em duas camaras, e porque voto que os Senadores sejam vitalicios, ou de nomeação real, ou ao menos escolhidos por um methodo mixto, que se conhece, e tem sido lembrado.

Se acontecer que o parecer da minoria se vença, hei de arrepender-me muito de ter votado por duas camaras. Entendo que fôra melhor ter uma só, do que duas quasi homogeneas.

Considero a segunda temporaria como uma inutilidade, como uma roda de nenhum prestimo ao regular andamento da maquina legislativa, e que só servirá para mais a desordenar. Quem votou inteligentemente por duas camaras não posso conceber como possa votar por um Senado temporario.

Mais ainda, Sr. Presidente, porque a duração dos Senadores vitalicios no poder pouca differença fará de qualquer periodo temporario, que se fixe. Dado que se requeira a idade de trinta e cinco a quarenta annos para alli entrar, teremos termo medio da entrada cincoenta annos pouco mais ou menos, e termo medio da permanencia dez annos, porque as enfermidades da idade, e a morte cortarão infallivelmente o fio da sua duração: lá ficará algum de fibra mais fosse ainda mais alguns annos; mas em compensação quantos irão mais cedo, e muito mais cedo?

Assim se irá executando tambem naturalmente uma progressiva e nunca interrompida renovação, renovação mais facil, suave, e melhor por todos os lados, quanto são sempre melhores as obras da natureza, do que as dos homens.

Quem sabe se ainda assim vitalicio terá o Senado a dignidade, a força, e a estabilidade que necessitâmos tenha, e sobre tudo a independencia! Mas outros inconvenientes, e as nossas circumstancias nos impedem de dar-lhe mais. Façamos o que póde ser.

Agora não posso deixar de juntar o meu testemunho ao de outros illustres Deputados, que affirmaram ser este voto mais conforme ao pensamento mais geral da nação. Eu tambem pela minha parte tenho bastante observado e examinado a vontade da nação, e tiro os mesmos resultados. Basta reflectir no grande numero de cartistas conscienciosos e não conscienciosos. Todos vão para este lado. Os miguelistas ou absolutistas igualmente, ainda que menos comentes, por quererem mais por isso mesmo acceitam antes o menos do que nada.

Entre os mesmos setembristas (permitta-se-me esta denominação) ha uma conhecida maioria; e aprova está na propria convenção de Belém, em que prevaleceu a idéa de propor a Carta como fonte das modificações; e a idéa de recommendar a harmonia da nova Constituição com as Constituições Europeas.

Não era com a Belgica que esta harmonia se recommendava. Era com a Inglaterra e com a França, estas nações mais poderosas, e mais adiantadas no systema constitucional representativa, em desharmonia com os quaes apenas poderemos subsistir como nação, quanto mais sustentar instituições tão combatidas de dentro e de fóra.

Não vejo, nem sei quem veja com probabilidade prospectos nenhuns de futuro, que nos possam persuadir a que sacrifiquemos assim o presente, não dando às nossas instituições a possivel estabilidade. Tudo mostra antes que não existem taes prospectos. De sobejo daremos conveniente entrada aos melhoramentos futuros, deixando-lhe aberta constitucionalmente a porta, como estava na Constituição de 1822, e na Carta.

O Sr. Derramado: - Sr. Presidente, vou concluir por minha parte a importante discussão, que nos occupa, com o mesmo espirito de verdade e exame, que me animou quando a encetei. Forte da minha convicção, e do meu direito, sustentarei a minha parte, sem pertender calumniar as opiniões dos meus contrarios. (Apoiado, apoiado.) E se no calor do discurso me escapar alguma frase, ou alguma palavra, que possam offender levemente, se quer, a decencia parlamentar, eu as retiro antecipadamente protestando que nesse caso a minha lingua não é interprete fiel dos meus sentimentos, nem da minha vontade. Sr. Presidente, não póde ser boa uma causa, em que tão distinctos advogados, que tomaram a sua defeza ainda não poderam tirar conclusões favoraveis ao seu triunfo, que caibam nos principios da razão, e do direito, que devem presidir á sua decisão! E tal

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é a causa dos illustres defensores da democracia caminhando rapidamente á conquista de todos os governos; tal é ainda a causa dos patronos da classe media absorvente de todas as outras classes, e de todas os poderes; desse meio sem extremos, desse absorvente menor do que o absorvido!

Por mais que se tenham afadigado os campeões destas duas especies de soberania para a constituirem numa forma de Governo, que mereça o nome de monarchico, representativo, baldados tem sido os seus esforços; porque toda a sua habilidade não póde fazer que uma cousa seja, e não seja a mesma n'um só tempo.

A monarchia constitucional, e representativa consiste essencialmente n'um governo composto d'um Rei, a quem exclusivamente compete o poder executivo, e que concorre por sua indispensavel sancção, e direito de proposta, para a factura das leis com duas Camaras co-legislativas, uma patriciana e permanente, e outra de origem popular, e electiva. Querer esta especie de organisação politica, e rejeitar os seus elementos, é querer, e não querer ao mesmo tempo; é sahir da posição logica, em que os oradores, que assim praticam, se ostentam tão seguros; é representar por si mesmos essa sonhada phantasmagoria, cuja representação elles tem attribuido aos seus adversarios. Estes por mais attentos que observem as duas Camaras, (ou antes as duas secções d'uma só Camará) que lhes querem dar em boa composição, os juizes de paz entre duas theorias essencialmente repugnantes, não pódem ver neste tractado senão uma Camara optica de Senadores, e uma Camara dupla de Deputados; quero dizer: a monarchia real, e representativa em phantasmagoria, e a democracia real em corpo e alma!

Neste caso diria eu = Non sunt multiplicanda entitates obsque necessitate. Não haja tanto incommodo: se o nosso fim é sómente obter mais alguma pausa, e reflexão nas deliberações do corpo legislativo e dar garantias á propriedade, não apuremos mais a paciencia do povo portuguez, já cançado do motu continuo eleitoral com uma nova eleição: elejam-se sómente, e por um só methodo os Deputados do povo; e em chegando a S. Bento diga-se-lhes: eia, Srs., os mais moços, e mais pobres fiquem aqui nesta sala; e passem para aquella outra os mais velhos, e mais ricos. Mas outras são as indicações, que preenchem as duas Camaras; e por isso não posso approvar este methodo, álias mui elegante, e expedito. (Apoiado.)

Um distincto filosofo politico, historiador da revolução franceza, fallando do modo, por que foram tractadas na Assemblèa constituinte de França as questões, que occupam actualmente os constituintes portuguezes, diz: que os partidistas da Constituição ingleza Neeker, Munier, e Laly, não souberam ver, em que devia consistir a monarchia, e que, ainda mesmo que o soubessem, elles não teriam ousado dizer á Assembléa que a vontade nacional (depois de constituido o governo) não podia ser omnipotente, e que esta vontade devia impedir mais do que devia obrar.

Honra, Sr. Presidente, honra seja feita, não só á Assembléa portugueza, mas a todo o povo portuguez, que está mais civilisado para ouvir dizer em que consiste a monarchia constitucional. Os defensores da monarchia de Neeker, Munier, e Laly não carecem de coragem civica para a definir e sustentar nesta Assembléa, e perante os seus constituintes. (Apoiado, apoiado.)

O mesmo historiador diz tambem que a Constituição de Inglaterra era o modello, que se apresentava naturalmente a muitos espiritos, por ser uma especie de transacção entre os tres grandes interesses, que dividem os Estados modernos da Europa; a realeza, a aristocracia, e a democracia. Mas reflecte que esta transacção é um tractado de paz, que não póde estipular-se senão depois de exhanridas as forças dos combatentes. " Querer (accrescenta elle) operar a transaçção antes do combate, é querer fazer a paz antes da guerra. Esta verdade é triste; mas ella é incontestavel: a Constituição ingleza não era por tanto possivel em França senão depois da revolução. Deos não tem dado a justiça aos homens, senão depois dos combates!"

Combateu por esta lei do destino das paixões dos homens, combateu a França como a Inglatarra; soffreu aquella como esta havia já soffrido a democracia, e a usurpação. Longa, e ensanguentada foi a lucta: por toda aparte nos dous paizes. " Sunt lackrymaz rerum." Mas cançados já de luctarem os tres grandes elementos politicos, e escarmentados todos das suas desfeitas, e dos seus proprios triunfos, aprenderam a viver juntos, e amigos, e concluiram esse celebre tractado de paz, que tem por titulo = monarchia real, e representativa, ou Imperium bene constitutum regali optimo et populari compositum. Ora, Sr. Presidente, assim como a França, e Inglaterra tem guerreado, e pactuado; assim tem guerreado, e pactuado muitas outras nações da Europa: e onde quer que não está ainda assignado o tractado de paz nos seus devidos termos "Agnosco oeteris vestigia flamma." (Apoiado.) Cuidava eu, Sr. Presidente, que os tres grandes interesses das sociedades da Europa já tinham luctado assás entre nós os portuguezes; e que estes como os Gregos em Virgilio, depois da guerra de Troia, "jam fructi bello fatisque repulie: queriam pactuar sincera, e definitivamente, e que nós eramos os seus plenipotenciarios. Mas quando eu esperava ouvir de todos os lados desta sala.

"Jam satis terris nivis atque. dirac;
"Grandinis misit pater......"

"Façamos e paz naquelles termos, que a experiencia, abona como capazes de a tornar duradoira."

Ouço ainda algumas vozes, que, se fossem escutadas e attendidas pelos pacificadoras da patria, deixariam no tractado uma estipulação, que não póde ser acceita por doas das partes contrastantes, senão com reluctancia; e eu teria razão para receiar, e praza ao ceo que seja vão o meu receio! Nunca mortal algum dirigiu a Deus Optimo, e Máximo um voto mais sincero do que eu lhe dirijo nesta solemne occasião! Praza ao ceo que seja vão o meu receio! Mas repito que eu teria motivo para receiar que não fossem applicaveis ao nosso preterito sómente os maviosos versos do poeta moralista.

"Audiet pugnas, vitio parentus, Rara juventus."

Agora já poderá o meu illustre adversario da seita dos escrupulosos conhecer, a razão, que eu tinha no meu discurso antecedente, para me admirar de se pôr de novo em problema um principio, que segundo os publicistas, e historiadores politicos mais ubalisados, constitue actualmente um dogma de direito publico constitucional; e que não era um mero phantasma, que eu perseguia, depois da decisão deste Congresso que sanccionou as duas Camaras.

A democracia real ainda aqui me apparece com suas pertenções exaggeradas contra a purpura, e contra os arminhos; e, com o dogmatismo das suas máximas absolutas, argúe d'intolerancia mais que theologica uma opinião, que até ao presente se tem reputado por excellencia a opinião conciliadora !!!

Mas quaes são os fundamentos desta pertenção, a meu vêr, intempestiva e demasiada?

Se eu os dispo dos ornatos oratorios, com que os tem enfeitado os seus defensores; se rejeito as dissertações historicas, com que se tem forçado os factos das discordias civís, a servir exclusivamente esta má causa, e as phrases habilmente calculadas, para os tentar como um serviço, e como uma justiça devida ao povo uma exigencia, que eu respeito em detrimento dos verdadeiros interesses populares, não posso observar nos argumentos dos oradores desta opinião, mais do que o perpetuo commentario dos sermões politicos de Re-

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verendo Hugues Petters, e do Doutor Price, que eu assentava não ouvir mais commentar, depois que o grande estadista, de quem Fox se honrava de ser discipulo, demonstrou que elles conduziam directamente á anarchia, melhor do que o illustre Deputado por Aveiro demonstrou que as minhas doutrinas conduziriam ao absolutismo; demonstração, que, apezar do seu engenho, elle só ha de completar quando os pharões de Old Jervrey, e de Salm, forem guias mais seguras em materias de direito publico constitucional, do que os oraculos de IV estminster Luaembourg e S. Sulpicio.

Segundo estes oraculos, que no mundo dos publicistas são reputados como os menos fallazes da soberania prática da rasão, do direito, e da justiça, eu considerarei sempre uma Camara patriciana hereditaria, ou vitalicia, nomeada pelo throno, como a perfeição mais carecteristica da monarchia real e representativa, com differença da democracia do mesmo nome.

Duas Camaras electivas, e temporarias, que valem o mesmo que a assembléa geral do povo, fazendo as leis com um rei seu primeiro magistrado, ou executor das suas vontades, só poderão ser monarchia para Sieyez e seus sequazes, que não fazem differença entre esta fórma de governo e o da republica, senão a de ter esta mais d'um, e aquella um só magistrado! Mas a escóla, a que pertenço, nunca chamou monarchia o governo da moderna Polonia, posto que tivesse um rei; nem tão pouco ao da antiga Esparta ainda que tivesse dous.

Assim é que eu tenho applicado, o que ha de essencial nos governos de Inglaterra e França ao da minha patria; mas tenho modificado e rectificado os seus principios, em relação às circunstancias particulares do paiz, sem destruir todavia a essencia daquelles governos. Ainda aqui não ha phantasma, mas sim realidade, que o habil romancista das opiniões e dos factos pode combater a seu grado. Porém, Sr. Presidente, os adversarios da minha opinião tem pertendido negar a propriedade, de imitar as nações mais cultas, e mais experimentadas nas verdadeiras garantias da liberdade prática, em quanto esta depende das instituições. Tem-nos dito que não ha duas nações semelhantes, e que a Inglaterra existe só na Gram-Bretanha.

Mas não é o homem social o mesmo em toda a parte do mundo? Não ha em todas as nações, um pouco adiantadas em civilisação, as grandes tres e mui distinctas classes, da grande, média, e da pequena ou nenhuma propriedade? Não são as duas primeiras, que formam o paiz legal nos governos representativos? E não é uma dellas representada na Camara dos Pares, e a outra na Camara dos Deputados? Tudo isto assim é. E então se é assim , porque razão não será conveniente transportar para o nosso paiz os elementos d'uma organisação politica, que se acommoda perfeitamente bem com o estado actual da sociedade n'outros paizes, analogo, ou antes identico, (nesta parte) ao que existe em nossa terra? Em todos os tempos, Sr. Presidente, foi d'uso para as nações mais modernas, ou menos civilisadas, procurarem nas mais antigas ou mais cultas o modelo das suas instituições. A antiga Roma foi copiar á mais antiga Grecia; ao Egypto a Grecia; e á Índia o Egypto; e o padrão de Inglaterra tem afferido quasi todas aa monarchias constitucionaes dos povos da Europa. Admiro que este uso salutar se pertenda proscrever agora por muitos daquelles senhores, que n'outras questões de direito publico constituendo, em que não era indicado, nos tem apresentado aqui = quid Rema factum fuit, e não, quid fieri debet! =

A uma popular, a quem não devo nem quero ser ingrato, porque me tem obsequiado por muitas vezes no meu Concelho, na minha Comarca, no meu Districto, e na minha, e nas alheias Provincias; (apoiadas.) A urna eleitoral do povo, em quanto encerra no seu seio os candidatos do Governo economico, e municipal, e os da representação em Parlamento de todos os direitos, de todos os interesses, e de todas as opiniões fluctuantes dessa classe média, e empreendedora, que eu considero como a mais vital da sociedade civil, figura-se-me como a taça d'Amalthea, que vai despargir os bens, de que está recheada por todas as ordens do Estado. Mas a uma eleitoral do povo incluindo no seu bôjo a sorte de todos os direitos, interesses, e opiniões das trez distinctas classes, em que naturalmente se dividem todas as sociedades modernas, antolha-se-me como a bocita de Pandora, que se póde abrir uma vez para lançar no paiz até ao ultimo dos males, sem ver algum Epimetheu, que possa fecha-la a tempo de não deixar escapar tambem o ultimo dos bens, a esperança! Este Epimetheu é que eu procurava na Camara dos Senadores, composta das cathegorias indicadas no projecto, cathegorias, que representam incontestavelmente grandes os interesses e direitos das fortunas fundadas em harmonia com os direitos e interesses das fortunas fluctuantes. E que se póde recear d'uma semelhante aristocracia? Acaso a inviolabilidade do direito de propriedade não interessa tanto ao penhor das defesas acasteladas, como ao dono d'uma pequena choupana? A prosperidade do com-mercio, que póde locuplectar o armador de navios, será nociva a um simples tendeiro? E o respeito e consideração, que se tributa ao saber, e aos serviços uteis, já coroados na aposentadoria do templo das leis, serão damnosos, ou estereis para os que se avançam na mesma carreira? Nada disto, Sr. Presidente! Pois então o que se teme d'uma Camara vitalicia de tão conspicues Senadores? Ah! Se eu podesse ver sempre na urna eleitoral a expressão dos verdadeiros interesses, da verdadeira opinião nacional, eu consentira em retirar a proposta de um Senado, que póde ser a unica barreira capaz de defender o Throno, e o povo, dos interesses invasores, e das opiniões e exigencias verdadeiramente facciosas, que muitas vezes se encobrem debaixo das côres nacionaes!

Depois de ter assim reassumido, e considerado a questão debaixo das suas relações genericas, resta-me responder a alguns argumentos mais salientes, com que os meus adversarios tem atacado a parte, que eu defendo na sua especialidade.

O illustre Deputado por Avaro asseverou-nos que a democracia caminhava rapidamente á conquista de todos os Governos, e que em breve não haveria outro privilegio se não o do numero! Accrescentau que eu, unindo o prognostico ao desejo, tinha afirmado que a classe media nunca chegaria a absorver as outras classes da sociedade.

Sr. Presidente, se eu não desejo esta conquista da democracia , ou da classe média sobre as outras classes da sociedade, provo que não sou avarento, nem ambicioso, porque como sectario, e camarada dos conquistadores, alguma parte me caberia dos despojos dos vencidos; mas estou firmemente convencido que a segurança da propriedade, o concurso de forças, a divisão do trabalho, o augmento e a conservação das luzes, são os beneficios por excellencia da ordem social, que no progresso natural desta acham seu logar proprio todos os candidatos de fortuna; e que o numero dos felizes augmenta constantemente. Estou igualmente persuadido que o phenomeno politico que, espera o illustre Deputado, nem é muito para desejar, por ser incompativel com a boa economia social, nem é possivel; pois que já tinha tempo de se ter verificado desde 776 annos antes da era de Christo, de que datam os tempos historicos. O erudito author da historia das revoluções antigas e modernas, apenas póde descobrir das republicas gregas uma sombra desta idade d'ouro em Athenas, mas lá mesmo observou que um Orador na Tribuna, com tanto que soubesse enfiar phrases, fazia hoje envenenar Socrates, ámanhã banir Phocion, e que o povo soberano tinha sempre á sua testa Pisistrato, Hipias, Themistocles, Pericles, Alcibiades, ou algum outro. E n'uma época analoga da sua mesma patria, vio um triumvirato de fabricadores de cadaveres mandar

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á guilhotina mais de oitenta mil victimas de todas as jerarchias, de ambos os sexos, e de todas as idades!

Desenganado então, de que não era possivel a igualdade, e a justiça nas sociedades humanas, extasiou-se com a sublimidade do discurso de Rosseau sobre a origem da desigualdade das condições do homem, e foi gozar da verdadeira liberdade entre os selvagens do Canadá, onde passou uma deliciosa noite, em mais deliciosa companhia que eu lhe não invejo! Ahi mesmo não se esqueceu de dar ordens ao hollandez, que o acompanhava. Tanto a son insçu o dominava o amor da superioridade! Depois desta, e d'outras viagens, é S. Exa. o Visconde de Chateaubriand, de quem o honrado Membro, a quem respondo, nos leu aqui duas paginas em menoscabo da aristocracia!

O honrado Membro, que não gosta de citações, depois de nos ter citado como authoridades irrecusaveis. Odillon Barrot, Mauguin, e o veneravel Lafayette pareceu incommodado com o reflexo da luz da veneranda galeria, que eu lhe havia patenteado do lado contrario, com os bustos de Cicero até Montesquieu, e de Foz ate Benjamin Constant. Mas o que mais offendeu o illustre Deputado, foi esta asserção motivada do Achilles da Liberdade na Tribuna Parlamentar. "Quando se colloca um homem num logar tão elevado, como o Throno d'um Monarcha, se quizermos dispensa-lo de estar sempre com o alfange na mão, é necessario
rodea-lo d'outros homens, que tenham um interesse particular em o sustentar." O illustre Deputado vio então o Rei de França rodeado desses homens, ha seis annos, continuamente com o alfange na mão. Mas, durante todo este periodo, eu só vejo o Rei dos Francezes armado da espada da justiça contra os agitadores, e facciosos regicidas; da espada, que poseram na sua mão, por mutuo consentimento, os Pares do Reino, e os Deputados do povo; espada, que não póde descarregar o golpe, senão depois d'uma sentença proferida por juizes tão conspicuos, e depois de taes formalidades protectoras da innocencia, que tem feito, que ella tenha sido sempre o oraculo da justiça. O honrado Membro não quiz ver na Inglaterra um Monarcha rodeado dos mesmos homens, ha já cento e quarenta e oito annos, sem que uma só vez, em tão longo periodo, tivesse necessidade de recorrer ao seu alfange! Elle recommendou-me por fim que não fizesse destas citações, que não abonavam a minha logica. Não me accusa a consciencia de lhe ter merecido tanta urbanidade que me authorisa para lhe recommendar que não faça destas recommendações, que não abonam a sua critica!

O illustre Deputado, respondendo a uma das minhas considerações em favor da Camara vitalicia dos Senadores, em quanto eu figurava esta instituição como o Fantheon das grandes illustrações sociaes vivas, como o fim d'uma carreira aberta a todas as ambições nobres, como uma recompensa legitima do desinteresse, da coragem, e do patriotismo, propria igualmente para servir de estimulo as classes elevadas da sociedade, a fim de se applicarem aos estudos peniveis da sciencia, da politica e administração dos Estados: - respondendo, digo, a esta consideração, fez uma invectivn amarga contra o Senado, que imaginou logo composto exclusivamente dos talentos, e das luzes, a mais insupportavel de todas as aristocracias, e dos Empregados publicos, a quem por este modo eu queria entregar a bolsa do Povo, que era o mesmo que entregar os contribuintes aos recebedores!

O illustre Deputado em toda esta discussão tem imitado a tactica do ultimo dos Horacios contra os Curiacios. Não podendo combater os tres elementos unidos, usou dos seus ardis para separa-los. Mas rogo-lhe que observe que o Rei, a Aristocracia, e o Povo, no meu sistema de composição do Corpo Legislativo, só podem ser bem considerados no seu ajuntamento, e debaixo das relações de sua mutua dependencia, porque é esta que produz sua concordia, que os
sujeita a regras fixas, e lhes dá uma marcha uniforme, e sustentada.

Note que fazendo a censura aos talentos, além de ser ingrato á Natureza, faz a censura a duas Camaras homogeneas, e electivas , onde só pode prevalecer esta especie de Aristocracia. - Note mais, que a minha Camara de Senadores, além das outras differenças da Camara dos Deputados, ainda se destinguirá desta, em não ser composta (electivamente) de dous terços de Empregados publicos, como a actual, mas sim de dous terços dos maiores contribuintes da Nação!
Porém, Sr. Presidente, o que mais tem posto em tortura o meu adversario d'opinião, e seus amigos politicos, é a resposta cabal ao argumento, que eu fiz aqui pela primeira vez, que funda a necessidade de declarar inamoviveis os Senadores, a fim de poderem desempenhar com sufficiente independencia da Coroa, e do Povo as elevadas funcções, que lhes devem ser conferidas como juizes dos crimes, que forem commettidos pelos Principes de sangue da Casa Real, e dos outros grandes do Reino, e dos altos funccionarios do Estado. - Uns tem pertendido negar aos Senadores todas as funcções de uma alta Corte judiciaria, e fazer julgar os Grandes da terra pelos mesmos Juizes, que devem conhecer dos crimes da communidade dos Cidadãos; e querem que um Juizo composto de homens, creaturas, e dependentes dos criminosos, tenha assaz de valôr, e integridade para decidir contra os seus superiores, investidos de tudo quanto póde impôr respeito aos sentidos, e á imaginação! - Outros tem negado que a inamovibilidade dos Juizes seja necessaria para manter a sua independencia , e tem pertendido disputar na urna eleitoral os logares da Magistratura, como os de Senador, e Deputado. Venham mais ambas estas novidades, para em tudo se parecer a nossa com as outras Monarchias Constitucionaes da Europa. - Mas o meu especial adversario, e ao mesmo tempo meu amigo, que não quer que os Senadores sejam Juizes, disse que a independencia nestes é uma garantia, e que naquelles é um perigo, e desafiou a todos para lhe responderem. - Eu lhe respondo que a independencia absoluta seria um perigo, tanto nos Senadores, como nos Juizes, mas que a dependencia immediata d'uns e d'outros, quer seja da Corôa, quer do Povo, que os elegesse e demittisse a seu arbitrio, seria ainda mais calamitosa nos Senadores que nos Juizes, porque uma Lei má importa infinitas más sentenças!

Sr. Presidente, vou-me sentindo cançado: os meus illustres adversarios, além das vantagens moraes, que tem sobre mim, tambem me excedem em vigor fisico. Eu quizera responder a todos os seus argumentos, para o que trazia notas; mas faltam-me as forças, e o meu nobre amigo o sr. Barão da Ribeira de Sabrosa me tirou a necessidade deste trabalho. Não posso com tudo deixar sem observação, o que os advogados da opinião contraria tem dito, ácerca das clausulas das nossas procurações, que segundo a minha opinião, e a dos meus amigos politicos, nos adstringem a compôr a Monarchia Constitucional dos elementos indicados no Projecto da maioria da Commissão. - Elles (os nossos contrarios) tem dito diversas cousas a este respeito, interpretações forçadas, vicios d'origem, etc., etc.

Eu respeito as nossas procurações, como a vontade expressa dos nossos Constituintes, quero dizer, de toda a Nação Portugueza. Mas admittindo de graça que ellas tenham algum vicio, desde que nós as rectificamos, por um juramento á face dos Altares, em que promettemos cumpri-las, não nos resta outra alternativa entre o cumprimento, e o perjurio.

Sr. Presidente, se todas as considerações, que levo feitas, e que me parece serem capazes de nos persuadir que tanto os principios do direito publico filosofico, como os factos das revoluções das sociedades, e dos interesses reaes dos societarios, d'acordo com a letra e espirito do nosso mandato,

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nos obrigam a constituir uma Camara de Senadores como se propõem no artigo 45 do Projecto; se todas estas considerações não são ainda bastantes para mover alguns Senhores a esta condescendencia, rogo-lhes que se movam ao menos por esta maxima d'uma authoridade, que não póde ser suspeita aos liberaes da sua côr, que é a do Abbade Sieyez. "Devemos elevar os nossos desejos até á altura dos nossos direitos; mas reduzir os nossos projectos á medida dos nossos meios." Esta maxima é profundamente conceituosa: ai de quem não attingir toda a sua comprehensão!

Tenho exposto a minha opinião, e seus fundamentos, com toda a franqueza e lealdade, com que a professo, e a sustento constantemente depois que appareci na scena politica. (Apoiados.) Homem do Povo, ainda não servi causa contraria á sua.

(Vozes: - É verdade, é verdade.)

O Orador; - Por elle, e para elle tenho sempre figurado no pouco que valho, e que sou; e é agora mesmo que, talvez desgostando alguma parte do povo, eu estou servindo mais lealmente a sua causa! Escravo das minhas convicções, direi o ultimo pensamento que dicta a minha politica. Estou intimamente convencido que, se nos sanccionassemos um poder legislativo composto da Rainha, e de duas camaras heterogeneas, por sua origem, composição; e duração, seria esta sancção por si só o Iris da paz para todo o paiz legal, que veria neste horoscopo o seu melhor quinhão de vantagens, que offerecer-lhe possa a ordem politica,

Se esta minha crença é um sonho, seja-me licito, ao menos sonhando assim agradavel e innocentemente,

"Um momento, se quer, gosar da Pátria!"

E se é um erro, saibam todos os meus constituintes que o seu procurador não acerta com o mandato; e a urna eleitoral se me feche para sempre, e não possa eu errar mais no delles, e no meu detrimento!

Porém , Sr. Presidente, qualquer que seja o destino que a providencia tenha reservado para esta infeliz nação em geral, e aos homens que figuram na scena politica em particular; qualquer que seja o tempo, e o logar dos meus ultimos arrancos.... hoje, ámanhã, daqui a um mez, daqui a um ou muitos annos; escravo, ou cidadão, particular, ou homem publico, no parlamento, ou no retiro, no trium-pho, ou no patibulo, protesto viver e morrer (politicamente fallando) na fé de Benjamin Constant, na fé da causa dos Reis, e dos povos, da bella causa da monarchia real e representativa, d'essa monarchia veneranda, da qual

"...... Multosque per annos
Stat fortuna domns, et avi numerantur avorum."

Mas não d'essa outra appellidada monarcbia, que onde quer que tem pertendido ensaiar-se

"Nascer, sofrer, morrer ..... eis sua historia!"

(Apoiado prolongado.)

O Sr. Prado Pereira: - Sr. Presidente, esgotada a materia, seria temeridade minha procurar novos argumentos para desenvolver o meu pensamento a semelhante respeito; emudeço por consequencia na presença d'um Congresso já assaz illustrado. É provavel que seja nominal a votação sobre este objecto (apoiado, apoiado), todavia a sua delicadeza tornará talvez bem complicada a maneira de o pôr a votos, e mesmo é possivel que não seja conforma ás minhas intenções, bem que por equivoco, ou desintelliengia das propostas, seja consequencia de meus votos; por isso pedi a palavra unicamente para declarar d'antemão que voto para
que a camara dos Senadores seja temporaria e de eleição mixta.

O Sr. Pereira Brandão: - Tendo muitas vezes procurado acabar com algumas discussões neste Congresso, não sou hoje da mesma opinião, porque desejo ouvir o maior numero de razões para me illustrar em materia de tanta ponderação como aquella, que ha uns poucos de dias se questiona.

Os argumentos, que vou expôr a favor do meu voto não os irei buscar á historia, mas sim ao estado do nosso paiz. Este estado é tal que nos mostra a necessidade de estabelecer uma segunda camara com toda a independencia capaz de dar às leis preciso desenvolvimento. - Tenho visto, no curto espaço de tres annos, leis sobre leis, que não tem dado ao paiz paz, segurança, nem mais prosperidade; por isso não posso ser da opinião de muitos Srs. Deputados, que pertendem que a desorganisação do nosso paiz provém das revoluções, que entre os portuguezes tem havido; não, Senhores, essa desorganisação tem nascido da multiplicidade de leis, sem ordem, sem nexo de systema, e sem haver quem as ensine a praticar. Quiz-se introduzir em Portugal a legislação mais bella de toda a Europa, (assim se suppunha) mas o resultado foi a introducção daquella legislação em retalhos, só para ir conforme com os costumes de outras nações, em que fez a felicidade de povos opulentos, mas sem se reparar se nos convinha em tudo. - Alguns Srs. Deputados tem-se esforçado a querer demonstrar que as léis de administração, que hoje existem neste Reino, não são convenientes, que essa legislação tem muitos defeitos, e que não póde por ella governar-se o paiz. Eu convenho com elles em que uma tal legislação não satisfaz a todas as necessidades; mas é porque ella não tem sido introdusida no nosso paiz com a organisação de um systema perfeito de leis, e regimentos, tão conformes, como os que dirigem a administração da França, dessa opulenta nação, que hoje é o modelo do mundo civilisado: se assim se praticasse de certo se teria feito a prosperidade de Portugal. Em consequencia, não attribuamos ao estado das convulsões, em que o paiz tem estado, a sua desorganisação, porque esta procede das leis; é necessario pois que estas sejam modificadas, e que haja uma segunda camara perfeitamente independente para coadjuvar a reforma de toda a administração, não só judicial, mas propriamente dita. - Mas diz-se que não é das leis que veio esta desorganisação: então perguntarei aos Senhores, que são desta opinião, que me apresentem factos ha um seculo a esta parte, pelos quaes se prove que se praticaram crimes, como os que se tem observado no districto de Penafiel, onde no raio de uma legoa, á execpção de tres ou quatro cazas, todas as outras mais consideraveis, e ricas tem sido atacadas e escaladas á força, dando-se batalhas, em que tem morrido mais de cem pessoas.

Tantos e tão horrorosos crimes, no curto periodo de dous annos, e em tão limitado espaço, denota, além de desmoralização, insuficiencia, e falta de cumprimento das leis; porque os culpados não tem sido conhecidos, e tem ficado a maior parte impunes. Foi necessario entrar na administração da justiça daquelle districto um illustre membro deste Congresso, o qual pela sua actividade e procedimento, talvez além das leis, tem processado, miudamente indagado os crimes, e prendido muitos dos culpados, minorando assim os males daquelle desgraçado districto. Nas visinhanças de Lisboa vejo eu um desgraçado moleiro assassinado de dia uma quadrilha, e pouco depois, ainda com signaes de sangue do infeliz, serem prezos os matadoros nominal a votado só- saneue do infeliz, serem nrezos os matadores quando estavam comendo e bebendo. Este crime foi observado por gente de uma povoação, que prendeu os malvados, e os conduzio às cadeias de Torres Vedras. Mas quem ha de acreditar que não passou muito tempo que os assassinos se viram a passear por entre os povos, entre os quaes praticaram o escandaloso crime. Estes e muitissimos outros factos semelhantes é verdade que vem da desmoralisação dos povos, mas

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ainda mais da insufficiencia das leis, porque ha muitos annos que sou julgador, nunca vi impunidade tão digna de admiração. Vejo em outro districto do Alemtéjo ser roubado um lavrador por guardas nacionaes, a quem extorquiram duzentos mil réis. O pacifico cidadão nem deu parte á authoridade judicial, mas sabendo esta do facto começou o processo, e não foi preciso mais nada para que os ladrões fossem assassinar o desgraçado a quem tinham roubado vejo mais nas visinhanças de Coimbra em menos de um mez assinados sete homens, sem que os processos tenham dado a conhecer os culpados, tendo os assassinos sido feitos quasi todos de dia. Tudo isto prova a desorganização do paiz, pela insufficiencia de suas leis, e grandissimos defeitos que encerram. Não poderei dispensar-me de dizer bem alto, que os mais graves provém de terem os reformadores introdusido na legislação providencias, que elles não viram em paiz algum. E como esta desorganisação provém das leis, não posso deixar de votar que haja uma parte do corpo legislativo perfeitamente independente, e que, sem depender segunda vez da urna eleitoral, nem do Rei, possa na formação e modificação das leis occorrer aos males da sociedade. Em consequencia voto que haja uma camara de senadores de eleição popular por cathegorias, apresentando-se lista triplice ao Rei para escolher, e que seja vitalicia.

O Sr. José Estevão: - Pedi a palavra sobre a ordem; não tenho intenção de, com este pretexto, entrar na materia.

Sinto que não esteja presente o illustre Deputado a quem me dirijo, porque o que tinha a dizer tem um caracter pessoal , mas não ódio.... O (Entrou o Sr. Derramado.) Bem: o meu illustre amigo, que agora entra na sala, tem estado comigo em uma especie de contenda, sobre qual de nós havia de pedir a palavra por ultimo, e fechar a discussão. Com tudo algumas expressões minhas na sessão de hontem pozeram S. Sa. em uma certa coacção de fallar; obriguei-o a pedir a palavra primeiro do que eu, e agora não me julgo habilitado a combater o seu ultimo discurso sem uma suspeita de deslealdade, que eu quero arredar de mim. Só S. Sa. me póde livrar deste escrupulo......

O Sr. Derramado: - Póde fallar.

O Orador: - Eu tenho sido mal entendido por alguns de meus adversarios, deslealmente contrariado por outros, invectivado por muitos. A tudo tinha que responder, mas como não fallo por amor proprio, mas por dever, e pelo interesse das questões não pertendo que a discussão se prolongue por minha causa. Para os meus desaggravos não faltarão occasiões. Com tudo, julgando-me desligado do meu comprimento para com o Sr. Derramado, estou á mercê do Congresso, se quizer, se entender que devo fallar, fallarei, se não, sento-me.

(Vozes: - Falle. falle.)

(Muitas vozes: - Votos, votos.)

O Sr. Derramado: - Eu só queria declarar que muito estimaria que o illustre Deputado fallasse, porque sempre o ouço com muito prazer.

(Vozes: - Votos, votos.)

O Orador: - Agora julgo que é a occasião de dar conta ao Congresso de uma carta, que me dirigio o meu illustre amigo o Sr. Brigadeiro Raivoso, pedindo-me que lha fizesse presente. Em consequencia, se o Congresso convier, eu passo a lê-la, e declaro que della não pertendo fazer uso algum.

Leu então a seguinte carta.

Illmo. Sr. José Ignacio Pereira Derramado. - Constrangido pelas minhas multiplicadas e graves molestias, a não sahir de minha casa, e desejando que meus Constituintes não ignorem a minha opinião, a respeito da organisação da Camara dos Senadores, agora em discussão nesse Soberano Congresso, a que tenho a honra de pertencer; rogo a V. Sa. A mercê de dizer no mesmo Congresso, sem offensa das conveniencias parlamentares que, se o Deputado Raivoso fosse presente á dita discussão, e votação , que a deve seguir, opinaria e votaria pelo artigo 45 do Projecto de modificações na Constituição, tal como se acha redigido, com excepção do ultimo membro da oração, que diz = e sem numero fixo. - Tenho a honra de ser de V. Sa. amigo verdadeiro e obrigado - Manoel de Sousa Raivoso. - Sua casa, 11 de Outubro de 1837. 1

O Sr. Presidente: - Não ha mais nenhum Sr. Deputado inscripto. ( Grande pausa. ) Torno a repetir, que não ha mais nenhum Deputado, que tenha pedido a palavra. (Grande pausa.) Por consequencia passa-se á votação.

Tracta-se do modo de propor a questão, peço a attenção do Congresso. (Profundo silencio.)

Esta questão póde propôr-se de duas maneiras: ou como está enunciada no Parecer da maioria da Commissão, (artigo 45 do Projecto), e nesse caso terá de ser dividida a proposição em tres partes differentes, a saber - 1.ª A Camara dos Senadores será vitalicia? - 2.ª Será nomeada pelo Bei? - 3.ª Será sem numero fixo de membros? - Ou então a questão póde ser proposta em quesitos, (apoiado) e, sendo-o, proporia eu, primó - qual a origem da Camara, e depois - qual o tempo da sua duração. (Apoiados geraes.) Quanto á origem eu faria os tres quesitos seguintes:
- 1.° Deverá a Camara dos Senadores ser nomeada pelo Rei puramente? - 2.° Será de nomeação pura do Povo? (não passando nenhum destes) - 3.º Será de origem mixta? - Em ultimo logar, proporia. - 4° Se a mesma Camara será vitalicia, ou temporaria. (Apoiados geraes.) - Tema palavra o Sr. Leonel, mas sómente sobre a ordem da votação.

O Sr. Leonel: - Eu concordo na proposta por quesitos, como V. Exa. indicou; e, se ninguem se oppozer a isso, podemos já passar á votação.

O Sr. Presidente - Tenho ainda de fazer uma advertencia aos Srs. Deputados, e é; que aquelles, que quizerem propôr outros quesitos, tenham a bondade de os mandar para a mesa escriptos.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada: - Eu pedi a palavra para dizer, que convenho no resultado proposto por V. Exa., mas que estas votações devem ser, salvas as emendas que estão sobre a mesa.....

(Rumor: - Nada, nada.)

O Orador: - É preciso que se faça esta declaração, ao menos quando se votarem alguns dos quesitos, para que depois se não diga que as emendas ficaram prejudicadas.

O Sr. Barjona: - Approvo completamente a maneira de propor, que V. Exa. indicou, accrescentando sómente uma idéa, posto que não sei se seria da intenção de V. Exa. accrescenta-la tambem, vem a ser logo que se vote sobre, se a segunda Camara ha de ser de nomeação mixta, V. Exa. pergunte depois, se será eleita pelo Povo, e escolhida pelo Rei, ou proposta pelo Rei, e depois escolhida pelo Povo. (Rumor.)

O Sr. Presidente: - Eu expuz os quesitos sem explicação alguma, o Congresso lha dará, se assim o entender.

O Sr. Costa Cabral: - Eu não pediria a palavra, se por ventura um illustre Deputado não impugnasse a maneira de propor, que V. Exa. indicou. Não é possivel admittir-se a opinião do Sr. Visconde de Fonte Arcada, em quanto quer que não fiquem prejudicados quaesquer modos ou systemas de formar a segunda Camara, com o vencimento que resultar das votações, por isso mesmo que esses modos, ou systemas, não podem deixar de contrapôr-se às votações, porque cada uma das indicadas é tambem um systema: por conseguinte, ha aqui alguma contradicção, e então não póde admittir-se a moção do Sr. Visconde.

O Sr. Leonel: - Se bem entendi o Sr. Visconde de Fonte Arcada, creio que a sua proposta se reduz a que, vencendo-se que a formação da segunda camara ha de ter

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logar por um methodo mixto, não se vote agora sobre a natureza desse methodo. Acho que isto tem de ser objecto de discussão, e nisto parece-me que todos estamos de acordo. (Apoiado).

O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu pedi a palavra quando o Sr. Visconde de Fonte Arcada pediu que ficassem salvos os additamentos, que estão sobre a mesa, para lembrar que nós agora o que fazemos é votar na questão, e que o progresso da votação é que ha da mostrar, o que depois temos a fazer.

O Sr. José Estevão: - Se a intenção do Sr. Visconde de Fonte Arcada era, como se acaba de dizer, pedir que ficassem salvos quaesquer additamentos que acho não prejudicar um vencimento, que o Congresso não póde deixar de acceder aos seus desejos. (Apoiado.)

O Sr. Presidente: - Como ninguem mais pedia a palavra, proponho se as votações terão logar por quesitos? (Decidiu-se affirmativamente) Proponho mais se as votações serão nominaes? (Resolveu-se que sim unanimemente.)

Passamos a votar.

Os Sr. Deputados, que são de opinião = que a Camara dos Senadores seja de nomeação puramente do Rei = dizem approvo; os de opinião contraria dizem rejeito.

Procedendo-se á chamada, disseram approvo os Srs.

Antonio Fernandes Coelho.
Barão da Ribeira de Sabrosa. (*)
Conde de Lumiares.
Conde da Taipa.
Faustino da Gama.
Francisco Antonio Pereira de Lemos.
José Victorino Freire Cardoso.
José Ignacio Pereira Derramado.
José Teixeira Rebello.
Ignacio Pissarro de Moraes Sarmento.
Lourenço José Moniz.
Marino Miguel Franzini.
Marquez de Fronteira.
Marquez de Loulé.
Rodrigo Joaquim de Menezes.

E disseram rejeito os Srs.

Anselmo José Braamcamp.
Alberto Carlos Cerqueira de Faria.
Antonio Bernardo da Costa Cabral.
Antonio Joaquim Barjoua.
Antonio Joaquim Duarte e Campos.
Antonio Maria d'Albuquerque.
Antonio José Pires Pereira de Vera.
Antonio Joaquim Nunes de Vasconcellos.
Antonio das Neves Carneiro.
Antonio Ferreira Borralho.
Barão de Faro.

(*) Ao perguntar-se-lhe o seu voto, disse

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Perdoe V. Exa., mas a votação deve ser muito clara: a Commissão não attribue á Corôa o direito de escolher os Senadores, senão sobre cathegorias. (Rumor nas galerias.)

O Sr. Presidente: - Eu peço aos Srs. das galerias que se conservem silenciosos...

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrasa: -Eu peço a V. Exa. que os deixe desabafar.

O Sr. José Estevão:- E eu peço a V. Exa. que não só os não deixe desabafar, mas nem tugir, nem mugir. (Apoiado.)

O Sr. Presidente: - Eu peço a todos ordem.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Peço a palavra...

O Sr. Presidente: - Não posso interromper a votação.

O Sr. José Estevão: - Mas nem ha motivo.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Peço a palavra para uma explicação logo depois da votação. (Rumor. - Prosegue a votação.)

Balthazar Machado da Silva Salazar.
Bazilio Cabral Teixeira de Queiroz.
Bernardino Sampaio Araujo.
Barão de Noronha.
Caetano Xavier Pereira Brandão.
Custodio Rebello de Carvalho.
Fernando Maria do Prado Pereira.
Francisco Fernandes da Costa.
Francisco José Barbosa Pereira Couceiro Marreca.
Francisco José Gomes da Motta.
Francisco Mont'Alverne.
Francisco de Paula Leite.
Francisco Soares Caldeira.
José Maria d'Andrade.
Joaquim Pompilio da Motta.
Joaquim d'Oliveira Baptista.
João Alberto Pereira. D'Azevedo.
João Baptista Leitão d'Almeida Garrett.
João Gualberto de Pina Cabral.
João Joaquim Pinto.
João Lopes de Moraes.
João Manoel Teixeira de Carvalho.
João Pedro Soares Luna.
João Pedro Tavares Ribeiro.
João Victorino de Sousa Albuquerque.
João da Silveira de Lacerda.
Joaquim Pedro Judice Samora.
Joaquim Placido Galvão Palma.
José Caetano de Campos.
José Estevão Coelho de Magalhães.
José Ferreira Pinto Basto.
José Ferreira Pinto Basto, Junior.
José Liberato Freire de Carvalho.
José da Costa Sousa Pinto Basto.
José Lopes Monteiro.
José Pinto Pereira Borges.
José Ozorio de Castro Cabral.
José Fortunato Ferreira de Castro.
José Gomes d'Almeida Branquinho Feio.
José Homem Corrêa Telles.
José Placido Campeam.
José Joaquim da Costa Pinto.
João da Cunha Sotto-maior.
José Henriques Ferreira.
José Mendes de Mattos.
João Soares d'Albergaria.
Leonel Tavares Cabral.
Luiz Ribeiro de Sousa Saraiva.
Luiz Moreira Maia e Silva.
Manoel de Mascarenhas Zuzarte Lobo Coelho e Sande.
Macario de Castro.
Manoel da Costa de Vasconcellos Delgado.
Manoel Alves do Rio.
Manoel Antonio de Vasconcellos.
Manoel Bernardo de Brito Perache.
Manoel dos Santos Cruz.
Manoel de Vasconcellos Pereira.
Paulo Midosi.
Pedro de Sande Salema.
Rodrigo Machado da Silva Salazar.
Roque Francisco Furtado de Mello.
Roque Joaquim Fernandes Thomaz.
Valentim Marcellino dos Santos.
Venancio Bernardino Ochôa.
Visconde de Fonte-Arcada.

Em consequencia desta votação ficou rejeitado o primeiro quesito por setenta e seis votos contra quinze.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Eu tinha pedido a palavra para dizer alguma cousa no fim desta votação.

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O Sr. Presidente: - Eu não posso dar-lhe a palavra senão no fim de todas as votações.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Se V. Exa. me não dá agora a palavra, não sei que conceito hei de fazer da mesa, nem do Congresso. (Rumor.)

O Sr. Presidente: - Passa-se a votar sobre o segundo quesito, isto é = Se a Camara dos Senadores deve ser d'eleição pura do pavo? = Os Srs. Deputados que o approvam dizem approvo, e dizem rejeito aquelles que votam contra.

Procedendo-se á chamada, disseram approvo os Srs.

Alberto Carlos Cerqueira de Faria.
Antonio Bernardo da Costa Cabral.
Antonio Maria d'Albuquerque.
Antonio José Pires Pereira de Vera.
Antonio Joaquim Nunes de Vasconcellos.
Antonio das Neves Carneiro.
Antonio Ferreira Borralho.
Barão de Faro.
Balthazar Machado da Silva Salazar.
Barão de Noronha.
Francisco Fernandes da Costa.
Francisco José Barbosa Pereira Couceiro Marreca.
Francisco José Gomes da Moita.
Francisco de Mont'Alverne.
Francisco Soares Caldeira.
Joaquim d'Oliveira Baptista.
João Manoel Teixeira de Carvalho.
João Pedro Soares Lima.
João Victorino de Sousa Albuquerque.
Joaquim Pedro Judice Samora.
Joaquim Placido Galvão Palma.
José Caetano de Campos.
José Estevão Coelho de Magalhães.
José Ferreira Pinto Basto.
José Ferreira Pinto Basto, Junior.
José Liberato Freire de Carvalho.
José da Costa Sousa Pinto Basto.
José Lopes Monteiro.
José Pinto Pereira Borges.
José Ozorio de Castro Cabral.
José Gomes d'Almeida Branquinho Feio.
José Placido Campeam.
José Joaquim da Costa Pinto.
João da Cunha Sotto-maior.
José Henriques Ferreira.
José Mendes de Mattos.
Leonel Tavares Cabral.
Luiz Ribeiro de Sousa Saraiva.
Luiz Moreira Maia e Silva.
Manoel da Costa Vasconcellos Delgado.
Manoel Antonio de Vasconcellos.
Manoel dos Santos Cruz.
Paulo Midosi.
Pedro de Sande Salema.
Rodrigo Machado da Silva Salazar.
Roque Francisco Furtado de Mello.
Roque Joaquim Fernandes Thomaz.
Valentim Marcellino dos Santos.

E disseram rejeito os Srs.

Anselmo José Braarncamp.
Antonio Joaquim Barjona.
Antonio Joaquim Duarte e Campos.
Antonio Fernandes Coelho.
Barão da Ribeira de Sabrosa.
Bazilio Cabral Teixeira de Queiroz.
Bernardino Sampaio Araujo.
Caetano Xavier Pereira Brandão.
Conde de Lumiares.
Conde da Taipa.
Custodio Rebello de Carvalho.
Faustino da Gama.
Fernando Maria do Piado Pereira.
Francisco Antonio Pereira de Lemos.
Francisco de Paula Leite.
José Maria d'Andrade.
Joaquim Pompilio da Motta.
José Victorino Freire Cardozo.
João Alberto Pereira d'Azevedo.
João Baptista Leitão d'Almeida Garrett.
João Gualberto de Pinna Cabral.
João Joaquim Pinto.
João Lopes de Moraes.
João Pedro Tavares Ribeiro.
João da Silveira de Lacerda.
José Ignacio Pereira Derramado.
José Fortunato Ferreira de Castro.
José Homem Corrêa Telles.
José Teixeira Rebello.
João Soares d'Albergaria.
Ignacio Pissarro de Moraes Sarmento.
Lourenço José Moniz.
Manoel de Máscarenhas Zuzarte Lobo Coelho e Sande.
Macario de Castro.
Manoel Alves do Rio.
Manoel Bernardo de Brito Peraehe.
Marino Miguel Franzini.
Marquez de Fronteira.
Manoel de Vasconcellos Pereira.
Marquez de Loulé.
Rodrigo Joaquim de Menezes.
Venancio Bernardino Ochôa.
Visconde de Fonte Arcada.

O Sr. Presidente: - O segundo quesito está approvado por quarenta e oito votos, e rejeitado por quarenta e três.

O Sr. Barjona: - Agora depois desta decisão não sei como hei de votar nos pontos, que se seguem. Vou sahir para fóra da sala, e logo direi a razão, por que não sei votar quando V. Exa. me der a palavra, que já peço para uma explicação.

O Sr. Presidente: - Em consequencia desta votação, parece-me que o terceiro quesito está prejudicado. (Apoiado.)

Assim o julgou o Congresso.

O Sr. Presidente: - Vou pôr á votação o quarto quesito.

O Sr. Derramado: - Estava em discussão o artigo 45 da maioria da Commissão, que propõe uma camara vitalicia de nomeação do rei sem numero fixo: agora uma camara vitalicia da eleição pura do povo sem nenhuma interferencia do rei... é preciso saber o que negamos, ou affirmamos. V. Exa. pergunta-me se eu admitto uma camara de Senadores da eleição pura do povo, sem nenhuma interferencia do rei, de duração vitalicia, ou pergunta-me se eu admitto uma camara de eleição popular vitalicia com a interferencia do rei para a sua nomeação? Se me pergunta a primeira cousa, a minha resposta é uma; e se me pergunta a segunda, a minha resposta é outra.

O Sr. Presidente: - Não ha objecto de ordem; são quesitos approvados pelo Congresso. Eu puz tres quesitos sobre a origem desta camara - o Congresso approvou o segundo, isto é, que ha de ser da eleição do povo: agora segue-se o outro. Permitta-me o Sr. Deputado que lhe diga que em harmonia com as mesmas votações acho prejudicado, o que disse o Sr. Deputado.

Passamos á votação do quarto quesito, isto é = Se a Camara dos Senadores será vitalicia? =

Disseram approvo os Srs.

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Bazilio Cabral Teixeira de Queiroz.
João Gualberto de Pina Cabral.
Manoel de Vasconcellos Pereira.
Visconde de Fonte-Arcada.

E disseram rejeito os Srs.

Anselmo José Braamcamp.
Alberto Carlos Cerqueira de Faria.
Antonio Bernardo da Costa Cabral.
Antonio Maria d'Albuquerque.
Antonio José Pires Pereira de Vera.
Antonio Joaquim Nunes de Vasconcellos.
Antonio das Neves Carneiro.
Antonio Ferreira Borralho.
Barão de Faro.
Balthazar Machado da Silva Salazar.
Barão de Noronha.
Custodio Rebello de Carvalho.
Fernando Maria do Prado Pereira.
Francisco Fernandes da Costa.
Francisco José Barbosa Pereira Couceiro Marreca.
Francisco José Gomes da Motta.
Francisco Mont'Alverne.
Francisco Soares Caldeira.
José Maria d'Andrade.
Joaquim Pompilio da Motta.
Joaquim d'Oliveira Baptista.
José Victorino Freire Cardoso.
João Alberto Pereira d'Azevedo.
João Manoel Teixeira de Carvalho.
João Pedro Soares Luna.
João Pedro Tavares Ribeiro.
João Victorino de Sousa Albuquerque.
João da Silveira de Lacerda.
Joaquim Pedro Judice Samora.
Joaquim Placido Galvão Palma.
José Caetano de Campos.
José Estevão Coelho de Magalhães.
José Ferreira Pinto Basto.
José Ferreira Pinto Basto Junior.
José Liberato Freire de Carvalho.
José da Costa Souza Pinto Basto.
José Lopes Monteiro.
José Pinto Pereira Borges.
José Ozorjo de Castro Cabral.
José Gomes d'Almeida Branquinho Feio.
José Homem Corrêa Telles.
José Placido Campeam.
José Joaquim da Costa Pinto.
João da Cunha Sotto-Maior.
José Henriques Ferreira.
José Mendes de Mattos.
Leonel Tavares Cabral.
Luiz Ribeiro de Sousa Saralva
Luiz Moreira Maia e Silva.
Macario de Castro.
Manoel da Costa Vasconcellos Delgado.
Manoel Alves do Rio.
Manoel Antonio de Vasconcellos.
Manoel dos Santos Cruz.
Paulo Midosi.
Pedro de Sande Salema.
Rodrigo Machado da Silva Salazar.
Rodrigo Joaquim de Menezes.
Roque Francisco Furtado de Mello.
Roque Joaquim Fernandes Thomaz.
Valentim Marcelino dos Santos.

Ficando por tanto rejeitado o quarto quesito por sessenta e um votos contra quatro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa para uma explicação.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa : - Quando o Sr. Secretario Rebello de Carvalho pedia o meu voto, e não a minha opinião, porque a minha opinião é conhecida pelos meus constituintes e pelo povo portuguez ha seis mezes, povo que não está nesta galeria, mas que está em todo o Reino de Portugal, porque, nesta galeria não está senão uma migalha do povo, e eu voto para o povo, então disse eu - approvo; isto é, constatei a minha opinião, e a nada mais dei attenção; neste momento voltou-se V. Exa. para as galerias e chamou-se á ordem; foi nessa occasião que eu entendi que alguns cavalheiros, que occupam esta galeria tinham desapprovado a minha opinião: se Suas Senhorias a desapprovaram, eu despreso soberanamente a delles; (Apoiado.)

O. Sr. João Victorino: - Sr. Presidente, julgo muito essencial declarar a minha votação, quando a fiz a favor do quesito - Será de eleição pura do povo a segunda camara - Quando este quesito se ia a pôr a votos pedi a palavra para me esclarecer se ficava excluida a condição essencial na minha opinião, de ser feita esta eleição sobre cathegorias; e tambem se a idéa de eleição pura do povo excluia o acto, da escolha nas listas desses eleitos feita pela corôa. Não se me deu a palavra, e eu sentei-me logo. Votei consequentemente approvando esta eleição pura, mas a minha opinião era, para que apresentado o resultado desta eleição popular ao Rei em listas duplas, ou triplices, podesse elle nestas escolher aquelles membros, que lhe approuvesse, e com tal visse assim a segunda camara destes elementos. Acha-se agora, ouço dizer, pela expressão de eleição pura prevenida a minha tenção ha votação, e por isso declaro que nesse sentido é que votei. Eu, Sr. Presidente, não concebo como possa a eleição popular, por mais pura que se queira conceber, prevenir a idéa da escolha, ou antes designação do Rei dos membros competentes da camara segunda, feita sobre esses mesmos eleitos.

Mas previna, ou não previna, nada absolutamente me importa, a minha, tenção, a minha intelligencia, a minha vontade, e aqui muito explicitamente o declaro, era esta. Está alii bem prompta a imprensa para eu fazer constar á pação o sentido, em que votei; mandarei lançar nos periodicos esta minha declaração. Votei por segunda camara, votei porque ella fosse electiva pelo povo, votei que dos eleitos só compozessem listas duplas, ou triplices, das quaes o Rei escolhesse, e designasse os cidadãos, que formassem a segunda camara, votei por cathegorias aonde o mesmo povo fizesse as suas eleições, votei que esta segunda camara não fosse vitalicia, mas temporaria isto tudo votei nas differentes vezes que fallei neste objecto; não ouvi depois argumento, razão, ou prova, que podesse despersuadir-me, e não havia agora desdizer-me; mais facil seria deixar a vida nesta cadeira do que por nenhuma contemplação do mundo atraiçoar a minha persuasão. Esta era a declaração, para que pedi a palavra, e que, farei publica aos meus constituintes.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado estivesse presente, quando eu fiz os quesitos, não teria agora essa duvida.

O Orador: - Eu digo ainda uma palavra, mais, eu antes quero passar por estupido em não entender bem a força da proposta á votação, do que passar por homem, que vota por uma cousa, que não tem na sua persuasão, e que vai fóra do entender da sua consciencia.

O Sr. Presidente: - Eu não fiz tal arguição ao Sr. Deputado: disse que, quando propuz os quisitos, que os expliquei.

O Orador; - Mas não se entendeu: eu ao menos ou não ouvi, ou não entendi isto; era, torno a dizer, muito possivel dar-se uma eleição puramente popular, e ao mesmo tempo combinar-se com a faculdade na corôa de formar a

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camara dos Senadores desses eleitos. De resto, depois do que V. Exa. acaba de dizer, é mais natural que eu não ouvisse a explicação.

O Sr. L. J. Moniz: - Sr. Presidente, como eu fui um dos que sahiram da sala depois da votação dos dous primeiros quesitos, cumpre-me dar a razão deste meu procedimento.

Eu sustentei nas discussões a instituição de uma camara vitalicia; ainda presisto neste meu voto.

Parecendo-me que o quarto quesito, ou o da Commissão mixta estava prejudicado pela votação a favor da camara temporaria, e de pura eleição popular, assentei que não tinha já em que votar: que, se eu o approvasse, podia parecer contradictorio a respeito do que até agora tinha sustentado. Eis-aqui a razão, que tive para sahir da sala, e não a de despeito por ficar vencido, pois que eu já ha muito sabia que havia de ficar em minoria, e nem por isso mudei de parecer, porque tenho opiniões minhas, filhas de uma convicção, que é minha.

O Sr. Duarte e Campos; - Ea tinha declarado, quando fallei sobre a materia, que não approvava uma segunda camara de eleição popular pura e simples, assim como não opprovava tambem uma segunda camara de pura nomeação regia: na hypothese de que se vencesse o systema mixto, pertendia eu que fosse vitalicia a segunda camara, mas, dada a decisão do Congresso, eu seria incoherente, se persistisse na mesma opinião; votaria, por tanto, se estivesse presente, que a segunda camara organisada pelo methodo vencido fosse temporaria.

O Sr. José Maria de Andrade. - Sr. Presidente, tramo o nosso regimento não permitte motivar na acta qualquer declaração de voto, eu me vejo hoje forçado a explicar o meu, e para isso pedi a palavra, e rogo aos Srs. Tachigrafos que tomem nota desta minha declaração. Eu quereria uma Camara de Senadores de eleição mixta, e vitalicia, e nesse sentido dei o meu suffragio nas duas primeiras votações; mas vencida a segunda da maneira que se venceu, cahiu forçosamente o meu systema neste caso, e então era tambem forçoso que rejeitasse a camara vitalicia, para não dar um voto que, a não ser mesmo absurdo, ao menos era inconsequente, com o que se acabava de vencer.

O sr. João Victorino; - Eu não me retractei, nem precisa retractar-se um homem como eu, eu, Sr. Presidente, tenho usado como ninguem, de toda a liberdade, que me faculta o lugar, em que me acho: eu, até me lisongeio de ser talvez o primeiro Deputado, que aqui tenho dado o exemplo de fallar com franqueza, e sem medo alguns em objectos; que outros Srs. julgariam melindrosos. Para votar por eleição pura popular quiz saber a latitude desta proposição; não foi possivel obter a palavra. Eu não ouvi bem a explicação, que se diz tinha já havido sobre a materia. Como não pude obter esclarecimentos disse dentro de mim mesmo a eleição pura do povo deve entender-se uma eleição estreme popular, e sem mistura de outro agente, que não fosse elle. Recordei-me da eleição de varios corpos legislativos, em que ella é mixta, pois uns Deputados são escolhidos pelo povo, outros por eleitores de outra natureza. Da Camara dos Communs eram antes da reforma eleitos uns Membros pelo povo, mas outros eram levados áquelle logar por Srs. particulares, que tinham nas suas familias o direito, ou antes o abuso de o fazer. A eleição do corpo legislativo nas 7 Provincias unidas da Hollanda era formado elegendo a nobreza, de cada uma dellas um Deputado do seu corpo, e as Cidades os outros; ora isto é a que eu chamava eleição mixta. Mas eleger o povo puramente sem concurso de algum outro agente os Senadores, e formar as lista destes seus escolhidos, não é isto uma eleição puramente popular? E da formação da Camara pela Corôa, tirando destas listas os cidadãos, que julgasse mais capazes, e que foram eleitos por aquelle acto puramente do povo, é isto por ventura alterar a essencia da eleição popular? De nenhuma sorte. Logo, votando neste sentido, e declarando-o agora tão alta, e solemnemente, não é dar idèa alguma de querer retractar-se, é antes fazer conhecer que se podia combinar optimamente a idéa de eleição pura popular, e formação pela Corôa, da Camara dos Senadores, dos apurados nella.

O Sr Barão da Ribeira de Sabrosa: - Eu creio que todos os meus nobres collegas desejariam que V. Exa. ordenasse que a votação de hoje apparecesse no Diario do Governo de segunda feira, não digo a discussão, porque não é possivel, mas o extracto das differentes votações.

O Sr Secretario Rebello de Carvalho: - Já mandei essa relação para o Diario do Governo, e Nacional, para se transcrever.

(Vozes = Bem, bem.)

O Sr. Fransini: - Como não é permittido pela pratica seguida no Congresso dar explicações de voto por escripto, aproveito esta occasião para declarar que quando eu votei para que a nomeação dos Senadores fosse pela Corôa, era na supposicão das cathegorias, que ligavam a Corôa á escolha de certos individuos. Entretanto a minha opinião era a eleição mixta, essa mesma foi a que eu expressei no meu discurso. Ora agora, tendo-se vencido que fosse simplesmente popular, claro estava que não podia continuar a votar, porque, sendo minha opinião que fosse vitalicia não era natural que podesse votar numa Camara vitalicia eleita pelo povo, porque seria absurdo suppor que o povo quereria nomear Senadores vitalicios, não nomeando vitalicios os Deputados. Eis-aqui porque não assisti á ultima votação, julgando-a prejudicada, e então seria preciso para ser coherente votar pela Camara temporaria. Agora seja-me permit-tido aproveitar esta occasião para fazer a devida justiça, ao menos pela minha parte, ao nobre comportamento que tem mantido estas galerias, porque com leves excepções tem dado exemplo de sisudez e prudencia, verdadeiramente extraordinarias nas circumstancias, em que nos temos achado. (Apoiado. )

O Sr. Rodrigo de Menezes: - Sr Presidente, como póde parecer a alguem que eu fallei d'um modo, e obrei de outro na votação, preciso tambem explicar o meu voto na discussão, do que acaba de decidir-se, eu tinha emittido a minha opinião de que a Camara dos Senadores fosse de eleição do Rei, e partindo deste principio queria que tivesse uma duração vitalicia. Agora eu acabo de votar contra essa duração vitalicia, e a razão é, porque a Camara de eleição do povo não é a mesma entidade, que a Camara de nomeação da Corôa.

O Sr Perache: - Sr. Presidente, eu rejeitei o primeiro, e segundo quesitos, porque era minha intenção approvar o terceiro, isto é, que os Senadores fossem eleitos por eleição mixta. Respeito a decisão do Congresso, porém não duvido dizer com a ingenuidade, que me é propria, que era minha convicção, de que este methodo de eleição seria o mais conveniente para o estado presente da Nação, e que ao mesmo tempo melhor harmonizava os poderes expressados na minha procuração.

O Sr. Barjona: - Não cançarei a attenção das = Côrtes com a razão, porque rejeitei os dous primeiros quesitos entendi que devia rejeita-los, e tanto basta por agora.

Sahi da sala, e não votei nos quesitos seguintes, porque entendi sempre que a segunda Camara deve ser d'eleição mixta e vitalicia, mas tendo o Congresso decidido que ella seja d'eleição meramente popular, já não sei se convirá mais a amovibilidade ou a inamovibilidade.

Agora declaro ainda, que daqui em diante já não sei votar: uma constituição é um systema cujas partes devem estar n'uma completa relação entre si eu tenho o meu systema formado ha muitos annos, o Congresso acaba de estabelecer um dos elementos mais importantes do systema, d'um modo inteiramente diverso do que entendo; conseguin-

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temente não sei como os outros elementos devem ficar, não os sei calcular.

O Sr. Presidente: - Não sei se o Congresso quer que se passem, a ler muitos requerimentos, que estão sobre a mesa, e tambem devo já dizer que creio que a ordem do dia para a sessão seguinte será a questão do veto .... (Rumor.) Eu duvido se por ventura devo dar para ordem do dia a formação da segunda Camara, ou o veto; como é questão assaz complicada para o fim da hora, desde já a proponho.

O Sr. José Estevão: - Entendo que deve ser dada para ordem do dia a questão do veto, para se completar a organisação do poder legislativo, e depois a questão da dissolução.

O Sr. Leonel: - Parece-me que a questão a tractar agora, será melhor a das cathegorias, se V. Exa. tiver a bondade de a dar para ordem do dia, logo que fôr possivel continuar a tractar de constituição será conveniente. Entretanto não me parece conveniente que se tracte de algum novo objecto: eu bem vejo alguns inconvenientes no contrario, mas tambem me parecia melhor tractar de materia, que produzisse nos espiritos alguma quietação, por ser menos grave, do que a que temos tractado.

Mas, Sr. Presidente, sem querer prejudicar a materia, que V. Exa. queria dar agora para discussão, eu vejo-me com tudo obrigado a pedir a palavra a V. Exa. para a hora da correspondencia, a fim de lêr dous pareceres de Commissão.

O Sr. João Victorino: - Eu sou da mesma opinião do Sr. José Estevão, e voto tambem que se tracte só da discussão da constituição.

O Sr. Presidente: - Passa-se á correspondencia; mas eu pedia ao Sr. Vice-Presidente que viesse occupar a cadeira.

O Sr. Vice-Presidente assim o fez.

O Sr. José Estevão: - Eu peço a V. Exa. que queira mandar communicar aos Srs. Ministros dos Negocios da Fazenda, Estrangeiros, e das Justiças, que eu tenho de os interpellar na occasião, em que a Suas Exa. o for menos incommodo, sobre materias relativas às repartições da sua competencia.

O Sr. Secretario Rebello de Carvalho mencionou a seguinte correspondencia.

1.° Um officio do Ministro da Fazenda, sollicitando do Congresso uma decisão, que habilite o Governo a deliberar de qualquer modo ácerca do subsidio, ou gratificação diaria, que convém arbitrar aos Membros da Commissão creada por Decreto de 23 de Setembro proximo passado, para estabelecer o despacho, e mais expediente d'Alfandega da Cidade do Porto, em harmonia com o sistema adoptado n'Alfandega grande de Lisboa.

Foi mandado á Commissão de Fazenda.

2.º Um officio do Ministerio das Justiças, remettendo duas copias, uma da conta dada pelo juiz de direito da commarca de Soure , e outra pelo juiz ordinario do julgado da Batalha, representando a necessidade, que ha, de attender sobre a divisão do territorio às queixas dos povos das Freguezias, de que tractam.

Foi mandado á Commissão d'Estatistica.

O Sr. Presidente: - Passa-se às segundas leituras.

1.º Requerimento do Sr. Theodorico José d'Abranches. Sendo gravemente nociva aos orfãos da Provincia de Moçambique, a abolição do cofre respectivo, tendo muitos pais de familia da dita Provincia requerido às authoridades superiores della a reinstalação do mesmo cofre; tendo sido varios os deferimentos dessas authoridades; mas sendo forçoso reconhecer que os cofres dos órfãos estão abolidos por lei, e que só por outra lei pode ser restabelecido o de Moçambique : proponho que as copias juntas dos requerimentos feitos sobre esta mataria às já mencionadas authoridades dos seus deferimentos, sejam enviadas á Commissão do Ultramar, convidando-se esta para que, se julgar conveniente, proponha sobre o objecto indicado alguma medida legislativa.

Foi approvado sem discussão.

2.° Requerimento do Sr. Furtado de Mello. Requeiro se peça ao Governo uma relação nominal de todos os officios revoltosos, comprehendidos no convenio de 20 de Setembro ultimo, declarando os postos, corpos, e armas, a que pertenciam, e quaes delles são considerados chefes da revolta.

Foi approvado sem discussão.

3.º Requerimento do Sr. João Joaquim Pinto. Requeiro se peça ao Governo, pela repartição competente, envia a este Congresso copia do balanço da receita e despeza, vindo ultimamente d'Angolla, e Benguella, para servir de base a alguns trabalhos a cargo da Commissão do Ultramar.

Foi approvado sem discussão.

4.º Requerimento do Sr. Pina Cabral, Requeiro que o Governo, pela repartição competente, faça apresentar a este Congresso, uma relação nominal de todos os coroneis pertencentes ao quadro effectivo do exercito mais antigos que o coronel de artilheria João Pedro Soares Luna.

Foi approvado sem discussão.

5° Um requerimento do Sr. Pereira Brandão; - Proponho que em quanto existirem Officiaes e Amanuenses supranumerarios, que não são necessarios para o serviço, não possa o Governo empregar nas Secretarias outras pessoas, que não sejam dos supranumerarios.

Subre este requerimento pedio a palavra

O Sr. Midosi: - Eu queria fazer um additamento a este requerimento, e vem a ser: perguntar ao Governo, se depois que se está discutindo o orçamento tem empregado de novo algum individuo.

O Sr. Costa Cabral: - Eu rejeito o requerimento feito pelo Sr. Brandão, pela fórma como se acha concebido, por que devemos deixar ao Governo as mãos livres para empregar quem queira, e pelo modo que for mais conveniente ao bem do serviço. (Apoiado, apoiado.)

O Sr. Leonel: - Eu peço a V. Exa. que mande ler o requerimento. (Leu-se.) Eu estou de acordo com a opinião enunciada no requerimento; mas parece-me que pelo simples requerimento não se preenche o fim desejado; porque pergunto eu: se o Congresso adoptar o requerimento, vem d'ahi uma resolução para que o Congresso se não possa apartar delle? Certamente não: - porque para ser lei, e ter força, era necessario que se lhe desse essa fórma. Digo pois, que eu não approvo o requerimento, approvando a materia delle; mas não o approvo por ser um simples requerimento.

O Sr. Costa Cabral: - Eu creio que ha uma Commissão no Congresso, encarregada da reforma das Secretarias, e sua organisação; e em consequencia, como esta materia diz respeito a empregados das Secretarias, acho conveniente, não só pelas razões, que apontou o Sr. Leonel Tavares, mas ainda por outras, que se não tome agora conhecimento do requerimento, e que vá remettido á Commissão.

O Sr. Santos Cruz: - Parece-me tambem que o requerimento não preenche o fim:-quanto mais, que a responsabilidade do executivo é ligada á idéa de escolha espontanea de seus empregados; e por isso não posso approvar o requerimento, como requerimento; é inconstitucional, é coarctar o throno, é invadir.

O Sr. Pereira Brandão: - Eu quero lembrar ao Congresso que na discussão do orçamento eu fiz um requerimento quasi com as mesmas idéas; mas o Congresso não tomou conhecimento delle: - com tudo ha um decreto, que manda que os empregados das repartições extinctas sejam occupados nestas secretarias: -á vista disto, eu peço ao Congresso que consinta retirar o requerimento, porque elle por ora não tem logar.

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O Sr Midosi: - Se o Congresso consentir que o Sr. Deputado retire o seu requerimento, eu não me opporei a isso, mas se ficar sobre a mesa eu então requero que vá a Commissão para o tomar em consideração, porque a materia é importante.

O Sr. Vice-Presidente propoz se devia ir o requerimento á Commissão; encarregada de apresentar o projecto da organisação das Secretarias. - O Congresso decidiu que sim.

O Sr. Nunes de Vasconcellos: - Eu já instei duas vezes neste Congresso pela brevidade do parecer da Commissão de fazenda; relatorio á proposta do Sr Ministro da fazenda sobre a introducção da moeda de cobre nas ilhas dos Açôres, e Madeira, providencia muitissimo necessaria; attentos os males, que aquelles póvos continuamente soffrem: - é por isso que eu pedia a V. Exca. que convidasse a Commissão para dar o seu parecer quanto antes: - eu não quero increpar a Commissão, mas sim dizer que e medida é muitissimo proveitosa, e necessaria; e por isso desejava que a Commissão declarasse, e removesse os embaraços, que encontra para interpor o seu parecer.

O Sr. Vice-Presidente: - Eu sou membro da Commissão de fazenda; e devo declarar que ella tem muito em vista este negocio, e que dará o seu parecer quanto antes.

O Sr. Leonel leu um parecer da Commissão mixta de guerra, e do legislação, que mandou para a mesa, paia seguir o competente destino.

O Sr. Pereira Brandão: - Eu peço a V. Exca. que queira ter a bondade de mandar ler um requerimento meu, que deve estar na mesa a respeito de Lord Btresford, e Lord Wellington, e que seja remettido á Commissão de guerra, com urgencia, visto a importancia da materia, e porque a discussão delle interessa á nação, por se terem illegalmente dissipado muitos contos de réis.

O Sr. Lacerda: - Sr Presidente, parece-me que esse negocio em nada pertence á Commissão de guerra, e sim á de legislação, onde é minha opinião que elle deve ir, por ser interpretação de lei, apegar desta minha opinião estou certo que a Commissão de guerra fará quanto possa por bem satisfazer ás deliberações do Congresso.

O Sr. Derramado: - Peço a V. Exca. dê destino á carta do meu amigo o Sr. Raivozo que apresentei, pedindo que della se faça menção na acta.

O Sr Vice-Presidente: - Como ha de ser lida ámanhã, depois se fará menção della.

O Sr Costa Cabral: - Eu desejo interpellar o Ministerio, peço que elle compareça nos seus logares, a fim de lhe fazer essa interpellação.

O Sr Presidente: - A mesa manda avisar o Ministerio. Continuam as segundas leituras.

6.° Requerimento do Sr. José Estevão. Requeiro 1.° que a parte da Commissão de administração publica, encarregada da lei para a organisação da guarda nacional seja convidada a reduzir a base, os trabalhos, que sobre este objecto tem promptos, e apresenta-los com urgencia ao Congresso 2.° que em todas as sessões, que se não discutir Constituição, se discuta uma hora as bases da lei da guarda nacional.

Sobre este requerimento teve a palavra.

O Sr. Leonel: - Eu não pedi a palavra sobre o requerimento, foi simplesmente para declarar que me fizeram a honra de nomear para essa Commissão, e eu não tenho nella dito uma só palavra; nem escripto uma só linha; não tenho trabalhado faço esta declaração para que se me não attribua culpa, nem que tão pouco se tome aos meus companheiros, não é culpa minha, porque tenho muitas commissões, e é impossivel que eu compareça em todas. Peço pois a dispensa desta, porque eu não posso trabalhar nella.

O Sr. José Estevão: - Eu fiz es e requerimento com o desejo, que produzisse effeito, em consequencia, antes de o fazer, tomei as medidas que a experiencia metem mostrado, que são necessarias para levar a conclusão qualquer negocio; por isso antes de o fazer fallei com um dos membros da Commissão, (o Sr. Garrett) o qual me disse que tinha esse trabalho completamente prompto, mas que esse projecto de reforma da guarda nacional não podia, por ser muito volumoso, ser apresentado, nem votado neste Congresso nas circumstancias presentes; em consequencia entendi eu, e entendeu o mesmo Sr. Deputado membro da Commissão; que seria conveniente reduzir esse trabalho a bases, votar o Congresso essas bases, e o Governo ficará com o direito de encher com os seus regulamentos o que faltar. Entendo, Sr. Presidente, que é um dever nosso organisar a guarda nacional; isto se se quer a sustentação da revolução de Setembro, que nós aqui representamos.

O Sr. Freire Cardozo: - Eu pedi a palavra para dizer, como membro da Commissão, encarregado da reformar a lei da guarda nacional, que não ha obstaculo algum em se apresentar o que requereu o Sr. José Estevão; e o que um membro da Commissão já propôz. O que o Congresso entendeu então que não convinha; se o Congresso agora entender que convém não ha duvida em que se faça.

O Sr. Santos Cruz: - Sr. Presidente; não se póde deixar de dar para a ordem do dia a mais proxima este objecto Sr. Presidente, a primeira necessidade que tem um estado é = fazenda = e depois = força = porque sem força não se póde durar, sem fazenda não se póde subsistir. A Constituição é a carta geografica; que se consulta quando é necessario a força, e a fazenda é a vida, e a provisão, que se gasta todos os dias, e que todos os dias é necessaria; para consultar cartão geograficas é preciso ter vida! A Constituição e um meio, a defesa um fim. Não nos illudamos de sofismas, não durmamos sobre o abysmo; tractemos de durar; e existir primeiro, porque é preciso existir para poder-se constituir um estado. Eu prefiro as leis de fazenda; e força á mesma da Constituição racional, até porque uma Constituição existe; e eu não sei se nesta vamos melhorar. Requeiro que se dê com urgencia para ordam do dia as leis, fazenda, e guarda nacional, e que se discutam parallelamente a Constituição do estado.

O Sr. João Victorino: - Sr. Presidente, não me importa ser reputado dissidente, excentrico, retrogrado, ou o que se queira; eu voto contra aquella proposta; a nossa obrigação e acabar aquillo, de que fomos particularmente encarregados pelos povos, nós temos objectos muito mais importantes, devemos deixar tudo o mais, e com todas as forças, e com toda a brevidade acabar a Constituição; o orçamento mesmo, senão podermos ultima-lo, fique para es nossos successores é indispensavel desimpedir estas cadeiras. Entreguemos a factura de uma lei da guarda nacional ás Côrtes futuras. Quando muito eu conviria em que se emendasse algum artigo mais clamorosamente injusto; e impraticavel; porque aquelle codigo offerece alguns desta natureza; aliás teremos que estar aqui tres annos, para o que eu não concorrerei de maneira alguma.

O Sr. José Estevão: - Sr. Presidente, o nobre Deputado não me entendeu; eu disse que não queria que se discutisse a lei, mas sim dividir a lei em bases, o que nos levará muito menos tempo o muito duas, ou tres sessões, eu pelo menos estou persuadido disso. Ora agora que ha cousas mais importantes não tem questão nenhuma; mas esta tambem é importante, porque sem força não se pode subsistir, eu peço ao Congresso que approve o meu requerimento, e espero que a Commissão com o seu zelo, quanto antes, apresente os trabalhos, que tiver a este respeito.

O Sr. Santos Cruz: - A lei da guarda nacional é uma lei constituinte; e organica, porque aguarda nacional é uma instituição essencialmente integrante do systema constitucional: por consequencia deve unir-se, ou ser discutida juntamente com a lei constitutiva do estado. De mais esta discussão não poderá levar tres sessões, como observou o illustre Deputado o Sr José Estevão, além disso a materia não

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será tão complicada como se diz, porque a Commissão tem já as bases organisadas, e podem já discutir-se, e depois a parte regulamentar. E tempo, Srs. de darmos a esta bella instituição frustada uma existencia real, como tem a de França. Srs., a existencia da guarda nacional em Portugal é um milagre de civismo do povo, porque ella não leve uma lei capaz de organisa-la... A salvação da causa santa pela guarda é um prodigio de puro valor, porque ella não estava para isso organisada agora que se vê a excellencia desta popular instituição: cesse-se pois de calumina-la, cesse-se de calumniar o povo, eu tenho plena confiança na guarda a prova que ella acaba de dar á pátria a immortalisa, e não deixa que duvida! Sem disciplina, sem ordem, sem chefes, ella a extremos de puro civismo, e valor resistiu firme á conspiração, e salvou os destinos da liberdade por toda a parte; minha debil voz lh'o aplaude, e lh'o agradece em nome da patria, ella é a sua esperança, a sua sympathia, a sua guarda natural; quem não quer a guarda não quer a causa constitucional, porque ella e desta a condição indivisivel, e perennal, ella exista pois, ella é leal, ella é forte, que lhe falta? A ordem, a organização militar, qual na franceza ha. E preciso pois dar ordem a esta instituição patriotica porque, Srs., nós estamos em guerra, porque está em estado de guerra com os tyrannos para conquistar a liberdade! Lembrai-vos da contra-reveloção, lembrai-vos da Hespanha, e das poucas, forças do exercito, e que esta força nós e sempre, e nos será ámanhã muito necessaria... Mas sem ordem ella não será nem conveniente, nem efficaz. A sua organisação geral pois insta. Eu voto pois pela urgencia desta lei com instancia, porque e uma lei da ordem constituinte, e não da ordem constituida na parallela á constituição. Peço que se marque a sessão para a sua discussão desde já.

O Sr. Presidente: - A proposta tem duas partes, acho conveniente dividi-la para evitar alguma duvida.

O Congresso approvou a primeira parte do requerimento, e rejeitou a segunda.

O Sr. Secretario continuou as segundas leituras.

7.° Requerimento do Sr. Menezes: - Requeiro que se não discuta o orçamento do ministerio da guerra, sem que se discuta a ordenança militar, que deve designar o numero dos officiaes, que devem compor o quadro effecttivo do exercito.

Sobre este requerimento pediu a palavra

O Sr. Rodrigo de Menezes: - Sr Presidente, nesse meu requerimento a mais nada me proponho que a vingar uma das attribuições das Côrtes, attribuições, que não tem sido até ao presente por ellas exercidas, nem o podem ser, em quanto houver uma corporação, cujo numero de funccionarios é indefinido. As Cortes pertence fixar a força de mar, e de terra ora este direito não consiste só em marcar o numero de praças de pret, de que ha de constar a força permanente, mas tambem em designar o numero, e a qualidade d'officiaes, que pertence a cada divisão, a cada brigada, a cada regimento, etc. Sem isto não sei como se possa fixar a força, e menos como se possa orçar a despeza da repartição da guerra. Entre tanto, Sr. Presidente, que temos nós visto na administração militar do paiz? Tem ella marchado pela estrada constitucional? Não de certo. O Sr. ministro da guerra faz promoções quando, e como quer; se lhe perguntam por que as faz, diz que lhe são necessarias, porque não ha o numero sufficiente d'officiaes, e como ha de haver numero sufficiente, havendo uma terceira secção para onde passa quem quer passar, ou quem o ministro quer que passe? Para obstar a um inconveniente tal, para se poder fixar a força não só em relação às necessidades, mas tambem ao estado pecuniario do paiz, e para se proceder com ordem ao orçamento dos negocios da guerra, é que eu mandei para a mesa esse requerimento, a fim de que se apresente, e receba a sancção do soberano Congresso a ordenança, que deve fixar o numero, e qualidade das patentes, de que deve constar o exercito nos diversos grupos, de que é organisado.

O Sr. Costa Cabral: - São muito louvaveis as intenções do Sr. Deputado, auctor do requerimento, mas não é por um tal meio que o Sr. Deputado ha de chegar ao fim, que pertende Sr. Presidente, eu entendo que uma das primeiras attribuições deste Congresso é fixar a força de mar e terra; marcar porém numero certo de Officiaes, e prohibir ao Governo que não promova além desse numero absolutamente e em todo o caso, isso é impossivel, porque não se póde prender as mãos ao Governo, e prohibir-lhe o nomear Officiaes leaes, e benemeritos na occasião de uma revolta contra o Governo estabelecido, e particularmente quando se praticam acções de valôr e distincção no campo da batalha. Eu entendo pois que o requerimento não tem logar.

O Sr. Lacerda: - Sr. Presidente, a legislação militar fixa o numero dos Officiaes do Exercito. Em quanto á 3.º Secção, eu espero que o Sr. Ministro da Guerra, quando precisar de Officiaes para o quadro effectivo, os irá tirar daquella classe, sempre que lá os haja em estado de bem servirem.

O Sr. R. de Menezes: - Sr. Presidente, disse um nobre Deputado, que eu pelos meios, que emprego, não tenho da conseguir os fins a que me proponho, que eu pedi uma cousa, que não póde realisar-se. Sr. Presidente, se os meios que emprego não são aquelles que devem conseguir o fim a que me proponho, fim, que tão louvavel pareceu ao mesmo illustre Deputado, eu perguntaria a S. Sa., quaes são esses meios? Mas nem o illustre Orador, nem algum outro Sr. Deputado os aponta, nem apontou ainda, desde que neste paiz ha Constituição, e por isso eu me julgo authorisado para inferir que os não ha. Mas, eu pedi cousas, que se não podem realisar!... Sr. Presidente, eu pedi que se verificasse a respeito desta classe, o que se tem verificado com as outras, assim como se não despacha maior numero de Administradores, do que o dos Districtos que existem, maior numero de Bispos, do que o das Dioceses do Reino, maior numero de Juizes de Direito do que o das Comarcas, julgava eu que tambem não podia haver maior numero de Generaes, do que o das Divisões ou Brigadas, mais Coroneis, do que Regimentos, etc. Mas se quem quer isto, quer impossiveis, impossivel é tambem o que quer o Sr. Deputado, porque sem isto não ha orçamento, e sem orçamento é impossivel haver Constituição. Mas diz o nobre Deputado, que se nós prendessemos as mãos ao Ministro, não lhe deixando galardoar livremente acções de valor praticadas no campo da batalha, provocariamos uma revolta. Sr. Presidente, eu deixo ao Illustre preopinante fantasiar quantas consequencias elle quizer, e taes, que eu as não ousava, nem ouso imaginar, mas o que é verdade, é que o meu requerimento não se oppõe a que uma Lei contenha regras excepcionaes em casos excepcionaes, eu convenho mesmo que seja conveniente deixar alguma latitude ao Governo para certos casos, mas essa latitude, os casos em que ella póde ter logar, e o modo porque se deve exercer, tudo eu desejo ver regulado por lei, e não entregue ao arbitrio dos Ministros, que fazem promoções, em que talvez despachem quem não devem, e despacharão de certo quem não podem. Sr. Presidente, nesta ultima promoção eu vi, entre outros, os nomes d'alguns Srs. Deputados, ora isto é ir de encontro com a Constituição, que veda aos Deputados receber do Governo mercês quaesquer, afóra as que lhes pertencerem por antiguidade ou escalla na sua carreira. Esta disposição é a do artigo 99, que vou ler (leu ) Ora, Sr. Presidente, taes factos parece que seriam bastantes, quando não fosse rigorosa obrigação nossa, a fazer-nos obstar medidas legislativas a taes abusos, e parece-me que no deferimento da minha petição está o remedio. Porém diz

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alguem que ha Leis, que regulam isto mesmo. Sr. Presidente, eu não posso neste logar reconhecer como Leis aquellas instituições, que, sendo dadas nos tempos do absolutismo, se não acham em harmonia com a Constituição que nos rege, reputem-se embora vigentes no Exercito, em quanto lhe não derem outras, para nós não o devem ser, em quanto o Corpo Legislativo, depois de examinar a sua conformidade, com a Lei fundamental, lhes não der sua sanação. Insisto pois pelo meu requerimento.

O Sr. Conde de Lumiares: - Sr Presidente, parte do que eu tinha a dizer disse o Sr. General Lacerda, entre tanto direi a outra parte, que elle deixou de dizer. Não me parece que haja necessidade alguma de demorar a discussão do orçamento da Guerra, pelos motivos que aponta o Sr Deputado no orçamento da Guerra vem marcado o numero de praças, de que se compõe o Exercito desde o General ate ao Tambor, excepto uma classe que nunca póde ser determinada, qual e a classe de reformados, por tanto, querendo o Congresso alterar, diminuir, ou augmentar a força do Exercito na mesma occasião da discussão do orçamento, póde convidar o Sr Ministro da Guerra, e indagar delle a força, que é necessaria para guarnecer Portugal nas actuaes circumstancias, e então, a vista da resposta, resolver aquillo, que lhe parecer conveniente. Ora quanto á promoção feita ultimamente pelo Sr. Ministro da Guerra, é necessario que o Sr. Deputado advirta que a maior parte dos Officiaes promovidos só foram graduados nos postos immediatos, por consequencia, esses ficam com o mesmo soldo, que até aqui tinham, e por isso voto contra o requerimento do Sr. Deputado, por não ver a sua necessidade.

O Sr. Sampaio Araujo: -Eu levanto-me para apoiar o requerimento do Sr Deputado, por exigir que haja uma fixação da força de mar e terra, nem se deva proseguir no respectivo orçamento, sem se fixar essa força de mar e terra. Parece-me que esta medida é absolutamente necessária, e sem ella o orçamento e impossivel. Em quanto as recompensas , estas não se fazem com empregos, fazem-se com fitas, e commendas, mas com empregos acho que não, porque os empregos não ha, nem devem haver senão es absolutamente necessarios, e ainda que elles faltem, nem por isso devem ficar sem recompensa, quem a merecer por tanto voto pelo requerimento do Sr. Deputado.

O Sr. Santos Cruz - Sr. Presidente, a proposição é inepta, ingrata, e inconstitucional, inepta, porque o direito de lixar as forças de mar o terra, é só quanto às praças de pret; se fosse quanto aos quadros do Exercito, era demittir officiaes, era uma expropriação, e repellia o bom seno. Ingrata, porque vai infelicitar uma officialidade victoriosa pela Patria, isso era uma injustiça, e repellia a gratidão Nacional. Inconstitucional, porque atacar no Throno o direito de promover, era uma invasão de poderes, e repellia o principio Constitucional! Primeiramente, Srs., aqui ha uma grande confusão a respeito do artigo Constitucional = fixar as forças de mar e ferra = entende-se só limitar no orçamento o numero de praças, que tem o Exercito, e a Esquadra, e jámais limitar-lhe os quadros, promoções, e numero de officialidade: isto pertence a uma lei permanente que é a ordenança militar, e não a lei temporaria, e annual do orçamento, aliás podiamos cada anno fazer e desfazer a officialidade; a patente não seria pois uma propriedade, mas uma Commissão precaria, que todos os annos podia acabar, e uma Constituição não podia ter absurdo tal. Aquelle artigo pois é só relativo às praças, e não tem nada com a marcha das promoções, e ordenança militar, que o Sr. Deputado cuida aqui ter logar, aqui ha pois uma confusão na interpretação do artigo Constitucional.

A proposição é tambem neste momento inconveniente, e ingrata no momento, em que applaudimos as victimas da Patria, e em que todos estamos tão penetrados dos serviços do Exercito, que a gratidão Nacional reclama (ainda que para isso houvesse direito), que agora se não discutam com mesquinha miudesa objectos taes! Que ingratidão, Srs., disputar promoções á nossa officialidade! A nossa officialidade, geralmente fallando, talvez já não possa contar os seus postos pelas suas cicatrizes, ella tem mais serviços que postos, mais feridas, que recompensas! E se é acaso que se pertende fiscalisar as promoções, que fez a sorte da guerra, que deu a escala das victorias, e se se pede á Assembléa um
voto neste sentido.... a generosidade Nacional o recusa!...

A idéa é mesquinha e ingrata!

Mas a proposição é tambem inconstitucional, invade os poderes, não pertence ao legislativo, o poder que promove é outro, a lei mesmo das promoções é especial, como é especial tudo o que é militar na organisação Constitucional. As leis militares em todos os paizes, mesmo Constitucionaes, tem uma especie de privilegio, são no premio, como no castigo excepcionaes, alli a escala é a victoria, o juiz o Rei, e o General. É preciso que mesmo no campo da batalha, e á face do Exercito, o General possa premiar os grandes actos onde existe a coragem, e preciso que a graça, e a patente caiam logo sobre o peito vencedor, que o valor ou a fortuna acaba de distinguir... E pela Constituição a quem compete dar o premio, e ao poder executivo não nos esqueçamos disto; e no momento de fiscalsarmos os vencedores, dos revolucionarios, não sejamos nós mesmos revolucionarios, não invadamos os poderes politicos, não confundamos o poder Constitucional de marcar as forças de mar e terra com o direito Real de promover, e premiar os serviços militares: o primeiro é um acto do orçamento, o segundo pertence á lei da ordenança militar, que aqui não tem logar, rejeito pois em nome da nação a proposição ella é confusa, inconveniente, ingrata, e inconstitucional, repellia a generosidade Nacional.

O Sr Lacerda: - Sr. Presidente, levanto-me unicamente para dizer ao Sr. Deputado, que não sou contra a sua opinião, isto é, em quanto ao desejo que elle tem, que se apresente pelo Ministerio competente um mappa da força do Exercito, ao mesmo tempo lhe devo dizer que não posso ser da sua opinião em quanto a dizer que, depois que cahio a Carta Constitucional, cahiram as leis anteriores militares, porque sendo assim não teriamos por onde sentenciar crime nenhum militar. Todas as leis que não estão em oposição aos principios da Constituição ultimamente jurada, ou que não tem sido expressamente derogadas, estão em vigor: assim tambem deve estar em vigor o regulamento de 1816, que marca o numero e classes do Officiaes Generaes, que formam o effectivo, que póde ter o Exercito.

Em quanto ao numero e organisação dos corpos das diversas armas está em vigor, o que foi decretado no tempo da ultima dictadura, porque este Congresso approvou todas as leis por ella feitas, e ahi se marca os officiaes que deve ter cada corpo, de cada classe: ora eu não defendo se são bem ou mal feitas as promoções, o que digo é, que não se diga que não existe lei, para na discussão do orçamento se poder votar com conhecimento, se tem ou não havido infracção, despachando maior numero do que a lei permittia. No orçamento ve-se os officiaes que ha em cada classe: se existirem mais do que o numere legal, o Congresso póde e deve exigir a responsabilidade, a quem os prometeu, e deixar de lhe votar o correspondente soldo, seja-me permittido dizer que hoje mesmo com todas essas promoções não ha se não trez Marechaes effectivos, quando a lei permitte mais de trez vezes trez. O Congrego póde, achando-o justo diminuir mesmo o numero dos Officiaes Generaes, e a força do Exercito quando se votar o orçamento da guerra, mas se se exigir, como diz o sr. Deputado, que o Ministerio apresente uma ordenança militar, ou do Exercito para depois se discutir o orçamento, estou certo que se não discutirá a de 37 para 38, e desconfio que nem a de 38 para 1839.

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O Sr. Lopes Monteiro: - Sr. Presidente, pedi a palavra porque vi n'esta discussão, tocar-se em pontos muito delicados, e que tem muita relação com a honra do Sr. Ministro da Guerra; eu sou tambem da opinião do illustre Deputado, quero que se respeite a Constituição de 1822, mas agora não se deve pronunciar juizo, sem se ouvir o Ministro, e sem que elle diga a razão, porque os despachou, se esses Srs. Deputados acceitaram esses empregos de que se falla; o que entendo porém, e pelo que desde já me pronuncio, é que não se póde de maneira nenhuma fazer arguição aos illustres Deputados que acceitaram promoções por seus serviços, quando muita gente as não queria; os illustres Deputados deram nisso mais um testemunho do seu patriotismo; eu entendo que por isso, longe de merecerem censura, devem ser louvados; concluo por tanto pedindo que não se continue mais em semelhante discussão, nem votação alguma haja, sem que esteja presente o Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Costa Cabral; - Sr, Presidente, folguei muito de ouvir a alguns Srs., que pertencem á vida militar que nós temos leis, que determinam qual deve ser o numero de officiaes que regularmente devem pertencer a cada corpo do exercito; sendo isto verdade, não se póde duvidar que se o Sr. Deputado entende que o Ministro offendeu a lei o deve accusar. Sr. Presidente, eu não ignoro que é ao Congresso que pertence o fixar a força de mar e terra, mas é preciso que isto se entenda como explicou o Sr. Santos Cruz: havemos de fixar a força de mar e terra mas não podemos de maneira nenhuma fixar absolutamente o numero certo dos officiaes; e prejudicar assim o direito, que possa ter o poder executivo de premiar um ou outro individuo, que pratique acções, que mereçam ser premiadas; e não temos nós a lei de Abril dé 35, que muito claramente diz que ficam salvas ag promoções feitas no campo da batalha ? Ouvi dizer a um Sr. Deputado que esses serviços se premiavam com fitas: desejava ver o Sr. Deputado perder um braço, ou uma perna, e que o premiassem com uma fita. Será d'uma fita que um desgraçado militar ha de tirar o seu sustento, e da sua familia? Isto é bom de dizer, executa-lo é mais difficil! Por consequencia, parece-me que se torna de nenhuma utilidade o requerimento do Sr. Deputado.........O mesmo Sr. Deputado observou que o Ministerio havia feito graças a alguns Deputados; será conveniente que o Sr. Deputado falle claro; quanto a mim, devo dizer que era juiz de relação em 1833 e ainda hoje sou o mesmo, não tenho mais nada: por tanto se o Sr. Deputado quiz alludir a mim, enganou-se completamente. Mas quem disse já ao Sr. Deputado que esses mesmos Srs. Deputados acceitaram as graças feitas? O que diz a Constituição, Sr. Presidente? Diz que nenhum Deputado póde acceitar....... mas diz ella que o Ministro não póde dar? Poderá o Sr. Deputado em vista da litteral disposição da Constituição accusar o Ministro como infractor da lei? De certo que não, e quem disse ao Sr. Menezes que o Sr. Deputado agraciado não rejeitou essa mesma graça? Ora, Sr. Presidente, tambem se fallou em Commissões, como querendo censurar os que d'ellas foram encarregados!

Vozes: - Não, não.

O Orador; - Que proveito tivemos nós de acceitar essas Commissões? Sr. Presidente, eu tirei um grande proveito: arrisquei a minha saude, e gastei aquillo que talvez não podesse.... Uma semelhante paga não esperava eu dos Srs. Deputados; (apoiado, apoiado) do governo sempre a esperei! Aproveito a occasião para declarar que o objecto da interpellação, que pertendo fazer ao Ministerio é sobre este assumpto.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, é verdade que eu, sendo Deputado hei de tambem votar sobre materias militares, mas tambem é verdade que para eu votar em materias militares, hei de estar muito attento a ouvir o que dizem os meus collegas militares, e resolverei o meu voto pelo que a elles ouvir, e não pelo que ouvir a um Sr. Deputado ecclesiastico.....(Riso.)

O Sr. Rodrigo de Menezes: - Mas liberal.

O Orador: - Apoiado, apoiado. Eu já ouvi a collegas nossos militares fazer explicações sobre esta materia, e convenceram-me; digo mais, já ouvi tambem a um Sr. Deputado não militar, que apresentou considerações de outra natureza a que dou muita importancia; ainda digo mais, que na situação em que nós estamos, se nos quisermos dirigir pelo requerimento do Sr. Deputado, em logar de fazermos um serviço ao paiz, fazemos-lhe um desserviço, porque vamos demorar uma das cousas mais necessarias para o mesmo paiz: as nossas circumstancias são extraordinarias, e não temos remedio senão ir por meios extraordinarios; se qui-zermos fazer outra cousa em logar de aproveitarmos, havemos de fazer mal; em consequencia eu por este lado voto contra o requerimento, e digo que hei de tambem votar contra tudo o mais. Ora eu tambem sou capaz de ser empregado, (e se o não sou, é porque não quero} por isso creio que, o meu voto não será suspeito quando digo que os cargos dados a collegas nossos não sei que offendessem a Constituição; pelo que respeita a commissões, conheço tudo que já foi dito, e julgo escusado repeti-lo, e o que se diga contra, é preciso demonstra-lo rigorosamente, porque álias faz mal ao Congresso, e ao paiz: nem se podem chamar despachos a essas commissões, foi uma grande cruz que se pôz às costas de alguns Deputados. (Apoiado.) A Constituição não diz que o Governo não dará, diz que o Deputado não acceitará. Ha um projecto de lei, sobre materia, que tem intima relação com aquella, de que actualmente se tracta, projecto, em que eu estou assignado, e que ha de ser aqui apresentado; então se poderá discutir esta doutrina largamente: mas agora não se diga que houve Deputados despachados contra a Constituição, porque quando se soltam asserções desta natureza é preciso demonstra-las; repito isto, não para me defender a mim, que não fui nem quero ser despachado, repito o para estorvar que se desacredite o Congresso, e se faça mal a Portugal. Voto contra o requerimento.

O Sr. Rodrigo Salazar: - V. Exa. tem a bondade de mandar ler o requerimento do nobre Deputado o Sr. Rodrigo de Menezes? (Lido continuou o Orador.) - Bem: - é um requerimento totalmente era harmonia com um artigo constitucional, e que de todas as garantias é esta inquestionavelmente a mais transcendente do governo representativo; e eu me admiro muito, que elle esteja soffrendo uma tão viva contestação.

Sr. Presidente, ha dias (discutia-se então a fórma da segunda camara) um, distincto Orador daquelle lado, (*) querendo provar a conveniencia do senado vitalicio, exclamou; "É necessario dar-lhe mais alguma estabilidade; é necessa-rio contrabalançar-lhe as suas attribuições, visto que a primeira camara tem em si a chave de todos os poderes, qual a concessão, ou negação dos subsidios, e á da fixação da força armada." (Apoiado, apoiado.) E então quereremos nós agora contestar o mais saudavel direito, que tem este Congresso? - Quereremos prescindir da mais consideravel da garantias? ....

Mas dizem alguns Srs. Deputados, que este direito é meramente extensivo aos soldados, e de maneira alguma aos officiaes. Sr. Presidente, eu entendo aquelle artigo, não só como uma garantia, mas tambem, e muito principalmente como uma economia. Se ao Governo compete o despachar indefinidamente todos aquelles officiaes que queira , então adeos finanças, porque todo o Thesouro poda em breve ser absorvido por elles.

Hoje, que á nação só basta ter um exercito, por exemplo de 5:000 homens, para que será necessario promover officiaes equivalentes para 10, ou para 100.000?! Que mais ridicula cousa, do que ver um exercito, cujos officiaes fazem o principal, em quanto que as praças o accessorio?

(*) O Orador apontava para o centro esquerdo.

SESS. EXTRAOR. DE 1837. VOL. III 66 *

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Tenha muito embora o Governo a liberdade de promoção, mas convém que seja restricta, e dentre dos limites da lei: Nem cousa cousa quer o meu nobre amigo o Sr. Rodrigo de Menezes.

Agora, Sr. Presidente, pelo que diz respeito às increpações do meu nobre amigo, eu mesmo Ihe peço que elle as não deixe tão vagas, e que seja mais explicito a esse respeito. Assim o é mister, para que não fique em duvida, nem sequer por momentos, a honra e independencia de qual quer membro deste Soberano Congresso.

Por mim, cumpre-me declarar, nem sollicitei, nem jámais sollicitarei, em quanto me conservar nesta posição, graça, ou emprego algum do Governo; e nem por sombras presumo que disso seja capaz algum dos meus illustres collegas.

Assim pois o espero do meu nobre amigo, como quem zela não menos o interesse proprio, do que de todo este Congresso, cuja dignidade até ao presente ainda se não acha compromettida.

O Sr. Vasconcellos Pereira: - Eu pedi a palavra sómente para evitar vim equivoco a respeito da força de mar; esta força foi proposta no orçamento pelo Ministerio, a Commissão examinou essa proposta, que a final foi approvada pelo Congresso. Por conseguinte acho que na parte do orçamento relativa á repartição da guerra se deverá fazer o mesmo; e se na discussão houver alguma duvida sobre o numero dos officiaes gerreraes, ou outra qualquer, estão os Srs. Deputados no direito de propor as diminuições, que julgarem a proposito.

O Sr. Rodrigo de Meneses: - Sou chamado a dar explicações, e o farei com lealdade. A primeira, que tenho a dar, é sobre uma asserção; em que não foi bem entendido por um nobre General, a quem muito respeito: suppoz-se que eu tinha dito que as leis anteriores á Carta, ou a promulgação da Constituição estavam sem vigor: não é assim ; eu só disse que reputava derogadas as que fossem d'encontro com a Constituição ou com a Carta, não podendo considerar vigentes no paiz quaesquer disposições anti-constitucionaes.

Agora saibamos: quaes foram as commissões , de que eu fallei? Deverei declarar ao nobre Deputado que desde que eu vivo em Lisboa, venho de minha casa para esta, e vou desta para aquella, não frequento associações, nem entro nas secretarias d'estado, por isso do que ha de novo só vejo alguma cousa nos poucos papeis publicos que leio. Sei que alguns Srs. Deputados foram nomeados para commissões extraordinarias cem authorisação do Congresso, e então é claro que, á não ser falto de censo, eu não havia de fazer increpações por actos, que tinha approvado com o meu voto. O illustre Deputado que me precedeu havia sido nomeado para uma commissão encarregada de preparar o modo de fazer uma promoção na marinha, o nobre membro escusou-se della, e no meu modo de entender fez muito bem. Mas não posso deixar de dizer que o Sr. Ministro da guerra não podia vir buscar um Deputado para commissão ordinaria, e menos ainda sem ter antes authorisação das Côrtes.

Fez-ee aqui um jogo de palavras, dizendo se que o Ministerio não está inhibido de despachar qualquer Deputado, mas que o Deputado é que não póde acceitar o despacho. Quem ha ahi que não conheça, que se o Deputado não póde acceitar tambem o Ministerio o não póde despachar; em geral o dever de um importa o dever do outro: se isto não é logico, então não ha logica no mundo; quem negar esta asserção é capaz de negar tambem que o Sol alumia. Tractou-se de galardoar dous nobres Deputados benemeritos, mas tanto se reconheceu a necessidade da authorisação das Côrtes para o Governo o poder fazer, que se apresentou ao Congresso um requerimento, assignado por mais de vinte Srs. Deputados. para o fim de obter essa authorisação; mas o Sr. Ministro da guerra não esperou pela decisão das Côrtes, e assim altamente infringia a Constituição. Eu não que ria descer a estas personalidades, entretanto sou forçado a isso para dar uma satisfação aos meus collegaa. Eu não sei d'outros despachos a fóra aquelles que li no Diario do Governo, e se julguei obrigação minha fazer uma declaração á nação sobre a conta em que se tinha esses despachos, nem faltei, nem podia alludir, porque os ignorava, a esses despachos de fitas, grancruzes, etc.; e devo ainda accrescentar que eu me não referi senão às promoções e despachos feitos pela secretaria da guerra.

Concluirei que se nós não temos o direito de dizer que haja taes, e tantos officiaes, então o poder das Côrtes é bem limitado! com isto não é minha intenção que se faça guerra às patentes; eu respeito como qealquer dos Srs. Deputados os direitos adquiridos; o requerimento que apresentei só era tendente a marcar um ponto de ordem para o futuro, por que tal poder não póde constitucionalmente ficar nas mãos do Governo.

O Sr. Judice Samora: - Vejo que ao Sr. Ministro da guerra se tem feito a grave censura de transtornar os principios constitucionaes consignados na lei fundamental da monarchia; entendo que não póde haver um crime maior do que este, e em vista disso, julgo que da nossa parte seria, cavalheiro, e até de justiça, que não progredissemos nesta questão sem elle estar presente: por consequencia proponho o adiamento da discussão do requerimento, de que se tracta para quando o Sr. Ministro aqui compareça, e peço aos meus illustres collegas tenham a bondade de me apoiar.

Sendo apoiado por mais de cinco membros, conforme o regimento, entrou em discussão o adiamento, sobre o qual pediu logo a palavra, e disse

O Sr. R. de Menezes :- Pedir o adiamento de um requerimento, só por que na discussão se tocaram pontos, que podiam exigir a presença do Sr. Ministro da guerra, parece-me que não tem logar. Preciso agora dizer que eu tinha pedido á palavra para quando o mesmo Sr. Ministro se achasse nesta sala; e se o Sr. Ministro sabia que havia um Deputado que o queria interpellar, devia ter-se apresentado; e desde que eu annunciei isto na presença do Sr. Ministro da guerra, eu não sou obrigado a dar mais satisfações quando vejo que os meus constituintes soffrem por acontecerem estas irregularidades. E que tem a presença do Sr. Ministro da guerra com o objecto do meu requerimento? Eu não peço mais nada senão que as Côrtes cumpram com um dever, que lhe impõe a Constituição. Se se não tivesse declarado ha tempos; que o Ministerio tinha pedido a sua demissão, en lhe teria passado uma grave censora sobre a sua administração, por me persuadir que tal maneira de administrar não convém ao paiz. Entre tanto os actos do Ministerio não vieram aqui senão como um incidente, porque o meu requerimento contém uma doutrina eminentemente constitucional, tem em vista um ramo de administração considerada no seu estado normal sem referencia a pessoas, ou casos particulares. O nobre Deputado author do adiamento confundio o meu requerimento com outras especies, que aqui se trouxeram; por ora não se tracta senão de saber se se deve, ou não discutir o orçamento da repartição da guerra, sem que esteja presente uma lei, que lhe deve servil de base: por tanto o adiamento não póde ter logar, porque para isto não é necessaria a presença do Sr. Ministro da guerra.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, agora a questão já não é de mera civilidade, a questão é da honra do Congresso, e da honra do Ministerio; quem a levou a estes termos é que tem a culpa da demora: pense-se no que se diz antes de se dizer, para não chegar á este resultado, agora não ha remedio senão arranjar bem o que aqui se disse, porque a Nação é multo interessada na honra de quem a governa, e na honra dos seus representantes: quem trouxe esta questão de uma maneira inconveniente, se julga que os seus constituintes soffrem com estas demoras queixe-se de si. (O Sr. R.

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de Menezes:- Ordem.) É preciso acabar este negocio, mas que se saiba que Deputados foram despachados, ferindo a Constituição.

O Sr. R. de Menezes;- Eu chamo o Sr. Deputado á ordem. (Rumor.)

O Sr. vice-Presidente: - Eu declaro que me não parece que o Sr. Deputado estivesse fóra da ordem, porque não fez alluzão alguma nominal de maneira que podesse escandalisar, fez talvez uma censura igual áquella, que outro Sr. Deputado tinha feito: o que é necessario é fallar-se com moderação. (Apoiado.) Convido o Congresso a que declare se o Sr. Deputado Leonel estava na ordem.

O Sr. R. de Menezes: - Peço a palavra para mostrar que estava fóra da ordem.

Vozes: - Votos, votos.

O Sr. Vice-Presidente: - Tem a palavra o Sr. Menezes.

O Sr. R. de Menezes: - Disse o Sr. Deputado que o author do requerimento apresentara aqui a questão de uma maneira inconveniente; no modo de vêr do Sr. Deputado, não me censurou esta expressão, mas censura-me em geral; se faltei a alguma regra elle que o mostre, e em quanto o não fizer, offendeu um Deputado, que estava no seu direito.

Não se fazendo outra observação sobre este incidente, o Sr. Vice-Presidente consultou o Congresso, e decidiu-se que o Sr. Leonel não tinha estado fóra da ordem. Continuando-se-lhe a palavra, disse

O Sr. Leonel: - É preciso adiar este negocio até que venha o Sr. Ministro da guerra, e até que o Sr. Deputado apresente a relação dos Deputados despachados contra a Constituição. Agora já no orçamento da marinha se fixou a força de mar, e no do exercito se ha de fixar a de terra, e assim fazemos, o que o Sr. Deputado quer no seu requerimento. O que se disse de um Deputado, a quem se deu uma grã-cruz não procede, porque em jurisprudencia criminal esta não é a logica - não é crime senão o que está dito na lei, e não ha inducção, não ha argumento, não ha declaração, nem explicação: em jurisprudencia esta é que é a logica - é o que me ensinaram onde a aprendi, e tenho ouvido dizer a todos que entendem da materia. Por consequencia para não me demorar mais voto pelo adiamento.

O Sr. Presidente: - Devo observar que não ha logar a fazer censura aos Ministros, porque no requerimento não se havia designado dia, e então o Ministério não foi avisado.

O Sr. Sampaio Araujo: - Eu pedi a palavra sobre o adiamento, mas verdadeiramente uso-a para um requerimento. Creio que esta discussão desorientou-se alguma cousa, porque o requerimento tendia a um fim, e na discussão apresentou-se outra cousa; eu entrei na primeira parte do requerimento por entender que se devia proceder á fixação das forças, e não fiz, nem faço censura alguma. Se o Governo despachou, ou não os Deputados, não o sei, e por isso não fiz increpação nenhuma a nenhum Deputado, nem tambem ao Governo: eu disse só por incidente que quando era preciso recompensar, para isso estavam creadas as ordens, e se recompensava com fitas, commendas, ou grão-cruzes. Disse isto em geral, e somente no caso de nenhum posto competir por escala; mas declaro que não sei se esses despachos, que se fizeram, estão feitos segundo a lei existente, se estão na escala, ou não, razão por que me abstenho de censurar factos, que não posso moralisar.

O Sr. Santos Cruz: - Eu rejeito tambem o requerimento porque a sua materia é - não se discutir o orçamento da guerra sem vir á discussão a ordenança militar -já mostrei a independencia que ha n'este objecto; entenda-se d'uma vez que orçamento é uma lei annual, que fixa as praças de pret, cobrança militar é uma lei permanente que regula os quadros de promoções do exercito, essa lei pode fazer-se, mas não é num orçamento, não é aqui. Perguntar, se as promoções foram bem feitas, isso é objecto á parte, isso pode fazer-se em separado, é o direito de inspecção superior nos actos do governo, nisto das promoções do exercito é em nome da generosidade nacional julgo ingrato reflectir.

O Sr. Pereira Brandão: - Queira V. Exa. propôr se a materia está discutida.

Julgou-se discutida a materia do adiamento; e posto este á votação foi approvado até que estivesse presente o Sr. Ministro da guerra.

O Sr. Furtado de Mello: - O Sr. Menezes confundiu postos com Commissões quando tractou dos Deputados que foram empregados pelo governo na crise passada. Cumpteme declarar que tambem acceitei uma Commissão, com authorisação das Côrtes, como muitos Srs. Deputados, dos quaes alguns quatro estão presentes; a minha Commissão foi de commandante geral da artilheria da linha da defeza d'esta capital: se o Sr. Deputado julga que isto é um posto muito vantajoso, eu lhe offereço as vantagens, que delle me resultaram, as quaes foram incommodos, trabalhos, vigilias etc. etc. (Apoiado). E visto que o Sr. Deputado fez uma tão grave censura a quem se foi expor, em defeza da liberdade tendo a pouca delicadeza de dizer, que alguns Deputados acceitaram Commissões do governo, mas que outros tiveram a honra de não as acceitar tambem lhe farei outra censura, admirando-me de que, sendo tão grande patriota, como ostenta, não corresse às linhas de defeza da capital, como outros muitos collegas nossos, que alli appareceram promptos e armados... (Apoiado). Finalmente declaro ao Sr. Deputado, que tenho muita honra em ser nomeado para aquella Commissão; e ainda que o não fosse, eu iria com a mesma vontade e com a mesma promptidão coabjuvar os illustres e bravos defensores da capital, que de perto era ameaçada por uma facção inimiga das nossas liberdades. (Apoiado).

O Sr. Vice-Presidente: -Isso é que é fóra da ordem. Primeiramente ainda que se pratica às vezes no Congresso, estimaria que se evitasse o designar os Srs. Deputados pelo seu nome - a pratica parlamentar não o permitte; e além disso não é proprio censurar os actos extra-parlamentares.

O Sr. Vice-Presidente: - Ainda ha alguns requerimentos, que o Sr. Secretario vai ler.

8.° Requerimento do Sr. Theodorico José de Abranches: constando-me que ao Governo faltam as informações e meios necessarios para apresentar às Côrtes um orçamento completo para o ultramar; sendo esta falta muito nociva ao serviço publico com relação tanto às differentes provincias ultramarinas, como á propria metropole, e tendo eu trazido de Moçambique varios documentos authenticos, que sobre esta materia muito poderão illustrar o governo e as Côrtes a respeito da dita provincia, offereço os indicados documentos, para ficarem na secretariado Congresso, e requeiro que delles se remettam copias ao Ministerio do ultramar.

Foi approvado sem discussão.

9.º Do Sr. Moniz: requeiro que este Congresso seja informado pelo Ministerio da Marinha e ultramar do uso, que tem feito o Governo do decreto do Sr. D. Pedro, que providenciava a ida até duzentos sacerdotes para o serviço parochial das Igrejas d'Africa, concedendo-lhes, além de outras vantagens, as da passagem, e ajuda de custo por conta do estado. Requeiro mais que o governo informe que resultados tem tido a lei das Côrtes de 1826, que mandava crear o instituto Africano, e se existem pessoas educadas por conta do estado, na conformidade daquella lei, e que destino tem tido.

Foi approvado sem discussão.

10.° Do Sr. Branquinho Feio: requeiro que o governo informe pela repartição competente, qual o numero de presos, que se acham detidos nas cadéas de Lisboa por não terem meios para satisfação de custas. Outro sim que informe qual a razão por que se não tem dado andamento ao processo crime do cidadão José Maria de Lemos Lucena Freire Beltrão, preso na cadeia, chamada Limoeiro, á ordem do magistrado de policia correccional do segundo districto.

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Sobre este requerimento pediu a palavra.

O Sr. Branquinho Feio: - Essa materia recommenda-se por si propria. É evidente que se alguns presos existem nas cadeias por falta de meios para pagarem as custas aos escrivães a lei judiciaria remedeia esse mal, ordenando que quando o preso é pobre e sem meios se ponha na rua, e a fazenda satisfaça. Quanto á segunda parte sou informado de que esse cidadão , filho d'um dos juizes de policia correccional, está em Lisboa, e por respeito a seu pai o escrivão não quer dar andamento a esse processo: se isto é verdade é horroroso. Eu peço essas informações sómente, e abstenho-me de fazer outras considerações, que possam macular esse magistrado.

Posto o requerimento á votação foi approvado.

O Sr. Vice-Presidente: - A hora deu, a ordem do dia para ámanhã é a continuação da discussão sobre a organisação da segunda camara, e na hora da correspondencia dous projectos de lei da Commissão de fazenda sobre impostos. Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

N. B. Na sessão de 15 de Outubro a pagina 249, l.ª columna, linha 39 onde se lê = e será adoptado o mesmo projtcto por dous terços dos Deputados e Senadores presentes, leia-se , e será adoptado o mesmo projecto, se for approvado por dous terços dos Deputados e Senadores presentes.

Na mesma columna linhas 43 em logar de substituição leia-se excepção. Na mesma pagina, 2.ª columna, linhas 20 , onde se lê, e chamem o povo, leia-se, e chamem povo.

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