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SESSÃO DE 7 DE JANEIRO DE 1885 21

ponto capital da questão, o sr. presidente do conselho procura responder ás perguntas categoricas que se lhe fazem, com estas phrases vagas, quasi verdadeiras evasivas, que a nada obrigam, que a nada vinculam a responsabilidade do governo?!

É preciso que se descreva tudo o que se passou em termos claros e terminantes.

É preciso saber-se qual o procedimento da força publica em tão grave conjunctura; se ella cumpriu todas as formalidades que os regulamentos policiaes mandam observar n'estes casos, ou se pelo contrario ella arbitrariamente commetteu uma grande violencia, direi mesmo, um crime atroz. Por tudo isso o governo é responsavel perante a camara.

O sr. Antonio Candido, dirigindo-se ha pouco ao sr. presidente do conselho, invocava a sua leitura em litteratura allemã, a proposito do trecho de um poeta da Grermania, que citava; permitta-se-me que, seguindo o exemplo do meu illustre collega, eu invoque tambem as leituras do sr. presidente do conselho para um trecho de litteratura politica franceza que deve, sem duvida, ser conhecido de s. exa.

Quando o sr. presidente do conselho se levantou ha pouco e em phrases banaes, releve-me s. exa. a expressão, e em termos vagos, improprios do assumpto e da occasião, descrevia qual tinha sido o procedimento da força publica para com os grevistas do Porto, recordei-me involuntariamente de um debate celebre, occorrido no parlamento francez nos ultimos tempos da existencia do imperio.

O facto que então se discutia era em tudo analogo a este de que nos occupâmos agora.

Como o sr. presidente do conselho deve saber, tratava-se de uma greve promovida por operarios da mina Creuso, da intervenção da força publica, n'esse movimento de resistencia.

A força publica interviera, mas conservára-se na expectativa; não teve que disparar um tiro, não houve um unica victima a lamentar.

Entretanto, percorrendo os annaes parlamentares francezes d'essa epocha, v. exa. póde ver como na sessão a que me estou referindo se estabeleceu a verdadeira doutrina constitucional e parlamentar em assumptos analogos; doutrina digna de servir de norma aos governos que se sentem honrados ao respeitarem a liberdade dos cidadãos nas suas legitimas manifestações.

A theoria exposta com admiravel lucidez, viril eloquencia, e com o assentimento de uma parte importante da camara, pelo illustre tribuno Gambetta, é que a intervenção da força publica era face de uma greve, a não ser n'um certo numero de casos restrictos e bem especificados, representa um acto violento do poder; acto que tornará responsavel o governo por todas as tristissimas consequencia: que d'essa intervenção possam resultar.

E agora, note bem a camara, não se trata de um case de mera expectativa da força publica em presença de um movimento grevista, como então; trata-se da intervenção effectiva da força armada, do espingardeamento do povo, que teve como consequencia alguns ferimentos e a morte de dois populares, que eram chefes de familia, e que deixam esposa e filhos em tristissima orphandade!

Pois não mereceriam essas duas victimas, ás quaes s. exa. tão de leve se referiu no seu discurso, mais algumas palavras para que todas as responsabilidades officiaes podessem ficar devidamente liquidadas?

O sr. Antonio Candido declarou que já tinha o seu juizo formado ácerca do que significaram os acontecimentos do Porto. Tambem eu sei, sr. presidente, o que esses acontecimentos significam, e como se explicam. Explicam-se, pelo estado de desorganisação e desordem anarchica, em que este pobre paiz se encontra.

Tambem sei que esses motivos são apenas symptomas de um estado pathologico geral; tambem sei que elles são apenas um acto de drama em que, quem sabe, por quantas peripecias nós próprios teremos que passar.

Tambem sei que esses acontecimentos que se deram agora no Porto se hão de repetir cada vez mais a miudo; porque, recordando á camara a phrase que proferi ha pouco, estou convencido que a nação começa a responder de um modo sinistramente serio á imprudente imprevidencia dos seus governantes.

Não ha duvidas, não podemos illudir-nos a tal respeito. A nação começa a reagir contra a phrase impensada e provocadora que se encontra no discurso da corôa, que o paiz está desafogado para poder pagar os seus compromissos, phrase que não e mais do que uma nova edição d'essa outra do si, presidente do conselho: «que o paiz póde e deve pagar mais».

Explique s. exa. como quizer os successos do Porto; mas o que é certo é que o povo está nas circumstancias da não poder nem dever pagar mais, pelo menos em quanto nos diversos ramos da administração publica se não fizerem as reformas que são indispensaveis, e que o simples s bom senso bastaria a aconselhar!

Estou completamente de accordo com o que disse o sr. Antonio Candido ácerca da significação dos acontecimentos do Porto.

Não será ainda a revolução; mas, quem sabe? talvez paraphraseando um dito celebre dirigido a Luiz XVI, quando estavam escalando os muros da Bastilha: nos devemos dizer que é o começo d'ella!...

O que posso affirmar ao sr. presidente do conselho é que estes factos succeder-se-hão com mais frequencia de hoje em diante, se a administração publica continuar entregue aos baldões de uma politica sem patriotismo nos seus intuitos, sem sciencia e sem consciencia nos seus resultados e nas suas applicações!

Mas voltemos á questão, quanto a mim, principal d'este debate.

Ha victimas e portanto, é preciso saber-se á vista dos documentos officiaes, qual foi a altitude que o governo tomou em face dos acontecimentos. É preciso saber-se qual foi o procedimento do governo era face do conflicto que ha dias se preparava e se previa.

Por isso eu sinto que o sr. presidente do conselho não tivesse apresentado já os documentos necessarios para mostrar a grande responsabilidade que lhe cabe. São precisos documentos e não palavras, documentos e não phrases, por que estas por si. só não convencem ninguem, apesar dos applausos da maioria que o sr. presidente do conselho com tanta solicitude cultiva!

Eu preciso em primeiro logar saber quaes foram as instrucções dadas pelo governo ao seu delegado, o governador civil do Porto; em segundo logar preciso ter conhecimento das ordens dadas pelo sr. ministro da guerra ao general da divisão; preciso tambem saber quaes foram as instrucções dadas pelo governador civil do Porto ao commandante da guarda municipal, o qual segundo é voz publica, foi quem deu ordem de fogo á tropa que atirou sobre o povo. E conforme o que disserem os documentos, eu não terei duvida em vir dizer a esta camara se o governo andou correctamente ou não, para no caso negativo lhe formular a mais severa censura.

Mas não concluirei sem levantar duas ou tres asserções curiosas do sr. presidente do conselho, uma d'ellas tanto mais digna de reparo, por partir de um homem que tem por mais do uma vez sobraçado a pasta da fazenda.

V. exa., sr. presidente, viu que uma das rasões dadas pelo sr. presidente do conselho para desvirtuar a origem; ou a intenção do movimento do Porto, foi que, tendo esse movimento como causa o imposto municipal sobre os carros, era para estranhar que entre os presos apparecessem chapelleiros, ourives, commerciantes, quando tal gente nada absolutamente tinha que ver com o imposto dos carros.

Estas phrases proferidas emphaticamente pelo sr. presi-