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22 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

dente do conselho, por um financeiro, ou pelo menos por um ministro que tinha obrigação de o ser, por isso que tem gerido a pasta da fazenda em differentes administrações, é uma heresia de tal ordem, que eu confesso não esperava ouvir a s. exa.

Pois então porque o imposto dos carros vae directamente incidir sobre os carreiros, não têem nada que ver com tal imposto as outras classes? Pois não se sabe que esta contribuição deve, em ultima analyse, ser paga pelos consumidores da cidade? Pois ignora o sr. ex-ministro da fazenda que se trata de um caso de «incidencia» e «repercussão» de imposto, previsto pelo bom senso popular?

Então como póde alguém admirar-se e muito menos s. exa., que interviessem no movimento os commerciantes ou industriaes?

S. exa. o sr. presidente do conselho pareceu-me querer lançar desdouro sobre a genuidade do movimento do Porto, unicamente porque n'elle intervinham chapeleiros e ourives; pois eu digo que esta circumstancia de tomarem parte no movimento individuos que exercem diversas profissões, algumas d'ellas de grande importancia e influencia, bastava pelo contrario para mostrar a seriedade da greve de resistencia aos impostos lançados pela camara municipal do Porto!

Demais, sr. presidente, uma corporação administrativa não tem a força moral necessaria para cobrar novos impostos, quando essa corporação, como a camara municipal do Porto, ainda não ha muito tempo gastava loucamente o dinheiro dos seus cofres em festas, que a consciencia publica já marcou com o stygma indelevel de uma merecida reprovação!

O sr. presidente do conselho, que esteve em Inglaterra, deve saber como em Londres se fazem meetings e greves quasi mensalmente; recordo-me neste momento de uma greve celebre na historia da grande metropole ingleza, realisada em 1860, e tendo como consequencia uma enorme manifestação em Regents Park, composta de 160:000 pessoas, todas operarios constructores.

Esta monstruosa manifestação grevista reuniu-se em plena paz, não se encontrando nem um unico policeman em meio dos manifestantes, para intervir nos actos de resistencia legal que ali tiveram logar.

E isto porque? Porque era Inglaterra nenhum estadista, embora pertencesse á escola mais reaccionaria (e eu desejaria que os liberaes do meu paiz fossem tão avançados como os reaccionacios d'aquella nação), porque nenhum estadista, digo, embora reaccionario, ordenaria ali que a força publica interviesse em uma reunião d'aquella ordem.

É assim, sr. presidente do conselho, que se respeita a liberdade!

Vou concluir renovando o meu pedido, sr. presidente.

O que eu peço são os documentos das ordens dadas pelo sr. ministro do reino ao governador civil do Porto, e os documentos que mostrem quaes as instrucções que o commandante da guarda municipal recebeu do governador civil d'aquelle districto.

Sabe-se que o sr. governador civil do Porto se comprometteu a usar da sua influencia para se suspender o imposto sobre os carros, depois de se terem dado os tristes successos a que nos estamos referindo, e depois do meeting imponentissimo a que concorreram todas as classes do Porto, ter, por assim dizer, arrancado á auctoridade tal promettiinento.

Pois bem. Se o governador civil do Porto, quer dizer, se o governo julgou que tinha força bastante para poder fazer suspender o imposto, depois de se terem dado as desordens e as mortes que se lhes seguiram, porque não fez esse mesmo promettimento quando a greve ainda não tinha attingido o seu estado agudo, e não passava ainda de um movimento pacifico e perfeitamente legitimo?

Se o governador civil do Porto se considerou auctorisado a prometter que seria suspenso o imposto sobre os carros, porque não tomou essa mesma deliberação dois dias antes, com o que se teriam evitado as desgraças que depois succederam?

Pergunto: porque não mandou o governo fazer essa communicação mais cedo aos interessados?

De modo que, este acto pelo qual eu poderia louvar o ministerio em virtude da sua prudencia, se antes se houvesse praticado, tornou-se exactamente em libello de severa condenmação, pela maneira como se effectuou: fóra de tempo e quando nada podia já evitar.

E depois, sr. presidente, o dilemma n'este caso é fatal. Se o governador civil se comprometteu a que o imposto sobre os carros seria suspenso, é porque entendeu que esse imposto era iniquo; pois, de contrario, se houvesse julgado que elle era justo, não daria assim rasão aos manifestantes.

Se o imposto fosse equitativo, seria um triste acto do pussilanimidade e fraqueza da parte do governo recuar perante uma manifestação popular, n'esse caso sem rasão. Mas não era equitativo o imposto sobre os carros, e a prova de que o não era está no procedimento do governador civil do Porto.

A responsabilidade do governo, apesar de se tratar de um imposto municipal, já vê v. exa. que não é tão pequena como ao sr. presidente do conselho se afigurava.

Concluindo as minhas considerações, peço ao sr. presidente do conselho que remetia a esta camara copia da correspondencia e telegrammas trocados entre o governo e o seu delegado na cidade do Porto, assim como a nota das instrucções dadas pela mesma auctoridade ao commandante da guarda municipal.

Limito-me a fazer este pedido, sentindo que o sr. presidente do conselho não tivesse começado o seu discurso pela apresentação de taes documentos, que constituem o corpo de delicto necessario para que possamos emittir a nossa opinião ácerca dos factos occorridos no Porto e da responsabilidade que n'elles cabe ao governo.

Disse.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Quando ha pouco usei da palavra, não comecei exactamente por onde queria o illustre deputado que acaba de fallar, porque, eu só tinha que responder ás perguntas que se me faziam.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Ainda tenho mais perguntas a fazer.

O Orador: - Então o illustre deputado tem mais perguntas a fazer, e guardou-as para depois? Pois foi o mesmo que eu fiz. (Riso.) Responde-se ao que se nos pergunta, e não ao que está fora da discussão. (Apoiados.)

Eu, que fui agora mais particularmente aggredido pelo illustre deputado, pelas faltas que tenho commettido e peias responsabilidades que sobre mim pesam, provenientes dos acontecimentos do Porto e pela omissão de documentos que possam justificar o governo, vou responder a alguns pontos que julgo necessario esclarecer, mas em breves palavras, porque a hora está adiantada e eu não quero abusar da benevolencia da camara.

Sobre tudo procurarei responder, por parte do governo, ás arguições feitas pelo nobre deputado.

Em primeiro logar, declaro que não tenho duvida alguma em mandar para a camara, se ella assim o desejar, copia da correspondencia havida entre o governo e o seu delegado no Porto, a respeito dos acontecimentos de que se trata; e se a hora não estivesse tão adiantada, se a luz não fosse tão pouca e a minha vista não estivesse já tão cansada, talvez eu lesse á camara essa correspondencia, porque a tenho aqui na minha gaveta. Não o faço, porém, e ficará para ser enviada para a mesa, se a camara, repito, assim o desejar.

Devo, porém, declarar desde já, que as instrucções dadas pelo governo ao seu delegado no Porto foram: que mantivesse a liberdade de todos e que procedesse com firmeza e