SESSÃO DE 9 DE JANEIRO DE 1888 57
com progressistas. O que se innovou ha pouco, ou melhor, o que se mudou ha pouco, foi a forma de pedir o imposto; pediu-se por meio de licenças, como se faz na França e n'outros paizes, porque a experiencia demonstrava que esse meio de percepção era o mais facil e o mais equitativo.
O sr. Pinheiro Chagas: - Se as licenças são equitativas, porque as suspendem?
O Orador: - Faça favor de ouvir que já explico.
O sr. Pinheiro Chagas:- Quem me póde chamar á ordem é o sr. presidente, não é o illustre deputado.
Tome cautela.
Vozes:-Ora, ora.
Outras vozes:- Ordem, ordem.
Estabelece-se alguma agitação na assembléa.
O sr. Presidente (tocando a campainha}:- Peço aos srs. deputados que se mantenham na ordem.
O sr. Pinheiro Chagas :- O illustre deputado ha de ouvir as minhas interrupções. Só o sr. presidente me póde chamar á ordem, e eu hei de manter os meus direitos parlamentares contra o sr. Laranjo ou contra seja quem for.
O sr. Arroyo:- E por qualquer meio.
Trocam-se differentes ápartes.
O sr. Presidente:-Peço ordem.
O Orador:- Sr. presidente, passam-se no parlamento portuguez muitas cousas incomprehensiveis para mim; mas a mais incomprehensivel de todas ellas é esta irritação agora do sr. Pinheiro Chagas para commingo.
O sr. Pinheiro Chagas:- Nunca vi que um orador, como o illustre deputado, que não se desconcerta facilmente, se irritasse assim com uma interrupção.
As interrupções são permittidas ha muitos annos no parlamento, e admiro-me de que o illustre deputado se irritasse assim com uma interrupção feita á boa parte.
O sr. Presidente :- Peço que não haja interrupções.
O Orador:- Eu estava a dizer, e repito, que se passam no parlamento portuguez muitas cousas incomprehensiveis para mim, mas que a mais incomprehensivel de todas ellas era esta irritação agora do sr. Pinheiro Chagas para commigo.
Eu disse que as licenças eram equitativas, e o sr. Pinheiro Chagas, interrompeu-me, perguntando: Se as licenças são equitativas, por que é que as suspendem?
Eu respondi: Faça favor de ouvir que já explico; o sr. Pinheiro Chagas brada que não lhe consinto interrupções, que tem direito de as fazer e que o ha de manter contra mim e contra todos. Podia replicar que o regimento me dá o direito quando estou fallando, de ninguem me interromper sem minha licença; a interrupção não é pois um direito de quem a faz, é um favor de quem a consente; mas direito ou favor, eu não o tinha negado ao sr. Pinheiro Chagas; é elle o irritavel e o irritado e é das minhas irritações que se queixa! (Apoiados).
Voltando ao assumpto. Se as licenças são equitativas por que as suspendem? A resposta é simples: Para acabar com explorações de desordeiros. Por meu turno pergunto:- Se as licenças se suspenderam e era esse o motivo das agitações, por que é que as continuam?.(Apoiados).
Francamente, pois, o imposto das licenças era uma injustiça tão grave e tão geral que podesse dar origem aos acontecimentos que estão apparecendo ?
Faça a opposição mais justiça a si propria; se esse imposto fosse a injustiça flagrante de que agora fallamos a opposição teria levantado a voz o anno passado contra tal disposição da lei; se o fosse, teria protestado e não haveria cansaço que a desculpasse de o não ter feito. (Apoiados).
Vejamos o outro motivo da agitação. É o inquerito agricola.
Atravessa o paiz, atravessa a Europa, uma crise agricola gravissima, resultante da concorrencia da America jovem e da Australia ainda mais jovem; para combater a
crise foi preciso em Portugal, como nas outras nações, proceder a estudos, que só se podiam fazer por meio de inqueritos. Fazem-se os inqueritos; pergunta-se, entre outras cousas, qual é a diminuição que tem soffrido o valor da propriedade, para se lhe diminuirem proporcionalmente os impostos, e é contra estes inqueritos que se hão levantar desordens e arruaças ? (Apoiados).
Espontaneos que fossem estes movimentos, havia de o governo ceder e retirar-se diante d'elles ? Queriam os seus successores ficar impedidos de fazer inqueritos? Pois não são os jornaes da opposição os que se vêem obrigados a confessar que a agitação contra o inquerito agricola é absurda e injusta? Pois não diz isto o jornal do sr. Pinheiro Chagas? E havia de o governo retirar-se diante da ignorancia explorada e da injustiça manifesta? (Apoiados).
Diz-se : Tem corrido sangue, e ainda a pouco o sr. Manuel d'Assumpção exclamava: Nós, regeneradores, nunca mandamos matar, nem maltratar os cidadãos que usavam do seu direito de petição.
Mas quem os mandou matar, quem os mandou maltratar agora? Os mortos, os maltratados não foram os que usavam do direito de petição; foram os que perseguiram durante uns poucos de kilometros a força publica, que protegia os que no cumprimento do seu dever iam pedir nos povos informações, que eram pedidas em beneficio d'esses mesmos povos. (Apoiados).
Ai! Exclama o sr. Manuel d'Assumpção, a que tempos nós chegámos ! A que tempos nós chegámos, digo eu tambem, tempos em que a opposição se sente tão falta de forças e tão cheia de ambições, que, não encontrando outras armas para aggredir o governo, lança mão do inquerito agricola e de outros inqueritos, perturbando um e pretendendo diminuir o valor do outro, que depois acceita! (Apoiados).
Avante, dizia o sr. Manuel d'Assumpção ; avante, que é caminhar para a ruina. Avante, digo eu tambem ; avante com o inquerito agricola, que é necessario para o conhecimento do paiz ; avante com o estudo e applicação dos meios que possam mais facilmente evitar attritos, porque os partidos não se deshonram quando, ensinados pela experiencia, reformam hoje aquillo que fizeram hontem.
Podem ficar ali, brada a opposição, mas não podem dar um passo. Se até hoje, e ainda ha poucos dias que a sessão se abriu, não temos dado um passo, é porque pela maneira por que a opposição procede, não tem consentido que haja ordem do dia, e, sem se preoccupar com o proprio defeito, ella, a causa d'estas demoras, atira nos depois com ellas em rosto, como se fossemos nós os culpados. (Apoiados). Vem em seguida, no discurso do sr. Manuel d'Assumpção, a recordação da cabeça de Luiz XVI, rolando no cadafalso. Bom seria que o ex-ministro da corôa não trouxesse para aqui, porque não vem a proposito, a pavida historia. (Apoiados}.
A força, disse o sr. Marçal Pacheco, representa-se sob a fórma de uma mulher de rosto sereno e de braços crusados. É verdade, é; está n'esse pensamento a critica severa do procedimento d'esse lado da camara; se a força da rasão e da justiça estivesse do lado da opposição, a opposição seria serena, a opposição seria prudente. (Apoiados.)
O governo, diz-se tambem, está perdido, porque está calado o dissidente o sr. Antonio Candido; porque não concorda com todos os seus actos o sr. Oliveira Martins; porque na sessão passada criticou um voto de uma commissão e da camara o sr. Elvino de Brito; porque n'um jornal escreveu qualquer phrase o sr. Carlos Lobo d'Avila, e porque até o sr. .Antonio Ennes dissera que fundara um jornal para ter uma penna que ninguem lhe podesse arrancar das mãos.
Eu não sei se com o meu amigo, o sr. Antonio Candido, ha dissidencias, creio que não; eu não sei tambem se para homens de intelligencia se contarem entre os amigos de um governo é preciso que o applaudam absolutamente em tudo;