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N.° 3
SESSÃO DE 11 DE JANEIRO DE 1902
Presidencia do Ex.mo Sr. Matheus Teixeira de Azevedo
Secretarios -os Ex.mos Srs.
Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Joaquim Mendes Leal
SUMMARIO
Approvada a acta e lido o expediente, o Sr. Presidente convida os supplentes a presidencia a prestarem juramento. - São introduzidos e prestam juramento varios Srs. Deputados. - O Sr. Presidente participa o fallecimento de Joaquim Mousinho de Albuquerque e propõe um voto de sentimento, que é unanimemente approvado. - Sobre este fallecimento falam successivamente os Srs. Ministro da Guerra (Pimentel Pinto), Pereira dos Santos, Francisco Beirão e Sarsfield- É approvada por acclamação a proposta do Governo, concedendo uma pensão a viuva de Mousinho de Albuquerque.- O Sr. Ministro da Fazenda (Mattozo Santos) apresenta uma proposta para accumularem funcções varios Deputados, e o Sr. Presidente do Conselho (Hintze Ribeiro) outra com o mesmo fim. - O Sr. Possollo participa a constituição da commissão de resposta ao Discurso da Coroa e o Sr. Oliveira Simões a do bill.
Na ordem do dia (eleição do commissões) são successivamente eleitas as commissões administrativa e de redacção, a de fazenda e a do Orçamento. - Participa-se a constituição da commissão de redacção e annuncia-se que esta não fizera alteração na proposta de pensão á viuva Mousinho.
Primeira chamada - Ás duas horas da tarde.
Presentes - 8 Senhores Deputados.
Segunda chamada - Ás tres horas e quinze minutos da tarde.
Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.
Presentes - 78 Senhores Deputados.
São os seguintes: - Abel Pereira de Andrade, Affonso Xavier Lopes Vieira, Agostinho Lucio e Silva, Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto Botelho, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alvaro Augusto Froes Possollo do Sousa, Alvaro de Sousa Rego, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Belard da Fonseca, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra, Antonio Roque da Silveira, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Belchior José Machado, Carlos de Almeida Pessanha, Carlos Malheiros Dias, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Paçô-Vieira, Domingos Eusebio da Fonseca, Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Fernando Mattozo Santos, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Frederico dos Santos Martins, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Matheus dos Santos, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Ignacio José Franco, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Joaquim André de Freitas, João Marcellino Arroyo, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Tavares, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José Caetano de Sousa e Lacerda, José Coelho da Motta Prego, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim Dias Gallas, José Joaquim Mendes Leal, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Simões, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Augusto Petra Vianna, Julio Ernesto de Lima Duque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz José Dias, Luiz de Mello Correia Pereira Medelia, Manuel Joaquim Fratel, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Marquez de Reriz, Matheus Teixeira de Azevedo, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral o Rodrigo Affonso Pequito.
Entraram durante a sessão os Srs.: - Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio de Almeida Dias, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio José Boavida, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Carlos Alberto Soares Cardoso, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Conde de Castro e Solla, Custodio Miguel de Borja, Francisco José Patricio, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Joaquim Antonio de Sant'Anna, Joaquim Faustino de Poças Leitão, Joaquim Pereira Jardim, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria Pereira de Lima, José Matinas Nunes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Manuel Antonio Moreira Junior, Paulo de Barros Pinto Osorio e Visconde de Mangualde.
Não compareceram á sessão os Srs.: - Antonio Eduardo Villaça, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Augusto Cesar da Rocha Louza, Augusto Fuschini, Augusto José da Cunha, Conde de Penha Garcia, Eduardo Burnay, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, João Alfredo do Faria, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, José Adolpho de Mello e Sousa, José da Cunha Lima, José Dias Ferreira, José da Gama Lobo Lamare, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, Julio Maria de Andrade e Sousa, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel de Sousa Avides, Marianno Cyrillo de Carvalho e Marianno José da Silva Prezado.
Acta - Approvada.
EXPEDIENTE
Officios
Da Presidencia da Camara dos Dignos Pares do Reino, participando que ficou organizada a mesa d'aquella Ca-
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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
mara, para a actual sessão legislativa, tendo sido eleitos para os cargos de Secretarios e Vice-Secretarios os Dignos Pares constantes d'esta relação:
Secretarios:
Visconde de Athouguia.
Fernando Larcher.
Vice-Secretarios:
Conde de Mártens Ferrão.
Marquez de Penafiel.
Para a secretaria.
Da Presidencia da mesma Camara, remettendo, para serem presentes á Camara dos Senhores Deputados, a relação dos projectos de lei de iniciativa d'esta Camara, os quaes ficaram pendentes na Camara dos Dignos Pares.
Para o archivo.
Do mesmo Ministerio, accusando a recepção do officio da Providencia da Camara dos Senhores Deputados, em que participa achar-se definitivamente constituida a Camara.
Para a secretaria.
o Ministerio da Guerra, remettendo, para serem distribuidos á Camara dos Senhores Deputados, 140 exemplares das contas da gerencia do mesmo Ministerio, relativas ao anno economico de 1899-1900 e ao exercicio de 1898-1899.
Para a secretaria.
Do Ministerio da Fazenda, remettendo, para serem distribuidos pela Camara dos Senhores Deputados, 160 exemplares da "Estatistica do real de agua e outros impostos indicados", relativos ao anno economico de 1899-1900.
Para a secretaria.
Do Ministerio das Obras Publicas, remettendo os esclarecimentos pedidos pelo Sr. Deputado Manuel de Sousa Avides, em sessão de 4 de maio proximo passado.
Da Presciencia do Senado do Reino de Hespanha, remettendo á Camara dos Senhores Deputados da Nação Portuguesa os tomos correspondentes ás legislatura de 1899-1900.
Para a secretaria.
Da Camara dos Deputados da Republica Francesa, remettendo á Camara dos Senhores Deputados da Nação Portuguesa, projectos de lei e outras publicações durante o periodo de 1900-1901.
Para a secretaria.
Do Instituto das Sciencias Politicas da Universidade de Vienna, pedindo a remessa de dois exemplares do regimento interno d'esta Camara, como elemento para o estudo a que o mesmo Instituto está procedendo sobre a organização interna das assembléas parlamentares.
Mandou-se satisfazer.
O Sr. Presidente: - Vou ler o decreto real que nomeia os supplentes á presidencia e vice-presidencia da Camara:
(Foi lido o decreto, pelo qual Sua Majestade El-Rei, houve por bem nomear os Deputados Eduardo Abranches Ferreira da Cunha e Visconde da Torre para supprirem o simultaneo impedimento do Presidente e Vice Presidente da Camara.
Convido o Sr. Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha a prestar juramento na qualidade do supplente á presidencia.
(Prestou juramento).
O Sr. Presidente: - Consta-me que estão nos corredores da sala alguns Srs. Deputados a fim de prestarem juramento.
Convido, portanto, os Srs. José de Alpoim e Alberto Botelho a introduzirem S. Exas. na sala.
(Foram introduzidos, prestaram juramento e tomaram assento os Srs. Paulo de Barros Pinto Osorio, Lourenço da Gama Lobo Cayolla, Frederico Garcia Ramirez, Francisco José Patricio, Antonio Alberto Charula Pessanha e Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda).
O Sr. Presidente: - Cumpro o dever de participar á Camara o fallecimento de Mousinho de Albuquerque, tenente-coronel de cavallaria, um dos homens mais distinctos da ultima quadra do seculo que acaba de passar e que illustrou o seu nome um brilhantes serviços á patria. O fallecimento tragico d'este official contristou todo o povo português, e por esse motivo eu julgo interpretar os sentimentos da Camara, propondo que na acta da sessão de hoje se lance um voto de sentimento pelo passamento de tão illustre varão e que se façam as communicações devidas á familia do extincto. (Apoiados geraes).
O Sr. Ministro da Guerra (Pimentel Pinto): - Sr. Presidente: venho em nume do Governo, de que tenho a honra de fazer parte, associar-me ao voto de sentimento proposto por V. Exa. e ás palavras de justo e sentido pesar que V. Exa. proferiu, commemorando o acontecimento tragico que, no dia 8 d'este mês, roubou á patria um dos seus filhos mais illustres e ao exercito, um official que tinha uma folha de serviços a mais brilhante - aquelle do que todos nós, com a mais justa razão, nos orgulhamos. Tambem Sr. Presidente, em nome do Governo, vou submetter á approvação do Parlamento uma proposta de lei, cuja urgencia desde já requeiro, destinada a honrar o nome d'esse valente official, e destinada, a mesmo tempo, a melhorar as condições em que ficou a sua viuva (Apoiados), senhora que, pelas suas virtudes e merecimentos (Apoiados) é credora dos nosso maior respeito e da nossa mais viva sympathia. (Apoiados}.
Passo a ler a proposta que tenho a honra de submetter á approvação da Camara.
(O orador lê a proposta que vae adeante publicada).
Sr. Presidente: é cedo, ainda muito cedo para fazer a biographia de Joaquim Mousinho, do bravo, do valente, do heroico official que com si sua espada escreveu na nossa historia, essa gloriosa pagina, onde se lê a palavra Chaimite,- essa palavra, senhores, que nos traz á memoria o mais brilhante feito de armas, entre todos os actos brilhantissimos praticados em Africa pelos nossos valentes officiaes de mar e terra no seculo que acaba de findar. (Apoiados).
Como meteoro brilhante, que fulgura no espaço por um momento e que nos deixa, por assim dizer, assombrados, Joaquim Mousinho passou tambem rapidamente entre nós, praticando nesse curto espaço de tempo, actos de tão esforçado valor, proezas tantas e tão grandes, que ainda hoje nos assombram! (Muitos apoiados).
Estão, porem, muito perto ainda de nós, esses feitos gloriosos; irradiam ainda luz muito viva e intensa, para que nós os possamos fitar com firmeza, - com a firmeza que é necessaria para os poder descrever com verdade. Mas, Sr. Presidente, ainda que assim não fosse, ainda que esta fosse a occasião mais propria, mais asada para celebrar os feitos gloriosos de Joaquim Mousinho, nunca poderia eu lembrar-me de tentar empresa para mim tão difficil; certo como estou, de que a grandeza do assumpto pede, reclama, exige, para a sua descripção, recursos oratorios muito superiores áquelles, pequenissimos, de que posso dispor. Anima-me, porem, a esperança de que nesta Ca
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mara, onde ha tantos e tão formosos talentos, alguns d'elles virão depois de mim dizer em phrases apropriadas á grandeza do assumpto, quem foi Joaquim Mousinho, o muito que o país deve á sua memoria (Muitos apoiadas), e viremos então que a patria portuguesa acaba de soffrer uma grande perda, uma perda nacional! Então talvez penseis, Senhores Deputados, como eu penso já, que a gloriosa bandeira das quinas, esse symbolo augusto da patria, cm que hontem vimos Mousinho envolvido, e que elle pelo seu esforçado valor tão alto ergueu nas campanhas de Africa, talvez penseis, digo, como eu penso já, que ella devia estar envolta em crepes.
Mas se a pragmatica não permitto essa manifestação de pesar e de luto, ella está com certeza, na alma de todos aquelles que, como todos nós, estremeceram de jubilo, e sentiram bater apressado o coração, quando, em 1896, nos chegou a noticia do feito extraordinario praticado por Joaquim Mousinho, que foi, por assim dizer, o epilogo glorioso d'essa sublime epopeia escrita em Africa com sangue dos nossos soldados. (Apoiados).
Sr. Presidente: foi, ha tres dias, no dia 8 de janeiro, que Joaquim Mousinho pôs termo á sua vida pelo modo tragico que todos nós conhecemos. Foi tambem em um outro dia 8 de janeiro, seis annos exactamente contados dia a dia, que no Parlamento Português se fez a apotheose de Joaquim Mousinho de Albuquerque, e dos seus valentes companheiros de armas. (Apoiados).
Foi em 8 de janeiro de 1896 que nas Côrtes Portuguesas, na Camara dos Senhores Deputados e na Camara dos Pares, se realizaram as sessões mais notaveis a que eu tenho assistido. (Muitos apoiados}.
Nesse dia, vi eu, vimos nós todos, marejados de lagrimas olhos pouco habituados a chorar. (Muitos apoiadas).
Era porque nesse dia tinhamos o sentimento do rejuvenescimento da patria; e era isto o que a todos enchia de jubilo. (Muitos apoiados}.
A estrella de Portugal, que desapparecera por tanto tempo do firmamento, acabava de se levantar em Africa com o seu antigo fulgor! (Muitos apoiados).
Isto explica, isto justifica a commoção que todos nós sentimos naquelle momento. (Muitos apoiados).
Sr. Presidente, tudo em Mousinho era singular! Pondo de parte as suas façanhas, que não ha português, que não conheça, não falando no seu talento, que era muito, (Apoiados) não falando na sua illustração, que muita era tambem, direi apenas duas palavras sobre o seu caracter, sobre a sua especial psychologia: pensando um pouco no seu feitio moral, ficámos verdadeiramente surprehendidos, verdadeiramente admirados.
Por um phenomeno de atavismo, talvez, Mousinho de Albuquerque não era um homem da sua epoca. Mousinho era, por assim dizer, o cavalleiro de outro tempo, o ca-valleiro da idade media (Muitos apoiados), com qualidades, talvez com defeitos, que hoje mal se podem comprehender. (Muitos apoiados).
Nesta epoca de descrença real, e, felizmente, talvez mais de fingida descrença, Mousinho era um crente, e tinha a coragem de publicamente o confessar. (Muitos apoiados}.
Nesta epoca, em que foi preciso inventar um euphemismo, uma palavra especial, para significar a versatilidade facil de opiniões, Joaquim Mousinho era um homem de profundas convicções, de convicções absolutas, que altivamente defendia contra todas as opiniões, quaesquer que fossem, por mais contrarias, por mais oppostas ás opiniões hoje geralmente acceitas; por mais contrarias e oppostas que fossem até aos dogmas da sociedade moderna.
Joaquim Mousinho, Sr. Presidente, e esse era talvez o seu maior defeito- Joaquim Mousinho, nesta epoca, em que toda e qualquer manifestação externa, e o sentimento apaixonado, grandioso, enthusiasta, é considerado muitas vezes, quasi sempre, como uma incorrecção, quando não é considerado ainda cousa peor, como ridiculo, Joaquim Mousinho foi sempre, meus senhores, um apaixonado que não escondia os seus enthusiasmos, que nunca se dignou afivelar no rosto uma mascara que occultasse aos outros o que pensava, o que sentia. (Muitos apoiados).
Sr. Presidente: para que um homem assim, para que um homem tão avido de gloria, tão conscio do seu valor, tão devotado ao seu rei e á sua patria; para que um homem que tinha soffrido tanto e passado privações tão grandes nos inhospitos climas de Africa, viesse afinal a deixar-se vencer na luta da vida, é preciso que elle soffresse muito nos ultimos dias, é preciso quo fosse muito grande a tormenta que se lhe desencadeou no espirito!
Joaquim Mousinho, não era, disse o já, um homem d'esta epoca; não era susceptivel de só adaptar ao meio em que vivemos.
Joaquim Mousinho praticou um acto que todos nós lamentamos. É por isso que prestada a homenagem do meu respeito e admiração ao heroe que tão alto levantou o nome da patria, vou terminar, curvando-me reverente perante o grande infortunio d'esse homem que se chamou Joaquim Mousinho de Albuquerque.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(S. Exa. não reviu estas notas).
(A proposta vae adeante publicada ao verificar se a votação).
O Sr. Pereira dos Santos: - Vem, tambem, associar-se ao voto de sentimento, de dor e pesar, proposto pelo Sr. Presidente, pela perda de Mousinho de Albuquerque. Já foi longo o rol, feito na primeira sessão d'esta Camara, de perdas de cidadãos illustres, que, pelos seus serviços, tanto honraram o país. Foi grande, tambem, o pesar manifestado pela saudosa memoria de tantos collegas nas lides parlamentares.
Nessa sessão, o illustre leader da maioria regeneradora, o sr. Conselheiro Arroyo, com a sua palavra eloquente e alevantada, prestando homenagem a todos esses cavalheiros, e fazendo a consagração do seu alto valor e serviços, bem accentuou, em dolorosas phrases, a circumstancia triste de serem muitos os que tinhamos de prantear. (Apoiados).
Mal diriam, porem, todos que, na seguinte sessão, tão cedo, teriam de vir ao Parlamento commemorar, ainda mais, o nome de um heroe tão distincto, que tão alevantadamente se tornou merecedor das honras d'esta Camara!
Quando todos viram, na ultima sessão, levantar-se a voz quente de oradores illustres, consagrando o nome illustre de Antonio Ennes, e prestar homenagem, aos altos serviços que elle, como diplomata, e com raro tino administrativo, prestara, para o alevantamento da provincia de Moçambique, mal diriam, certamente, que nesse momento, a essa hora, evolava-se d'esta vida o extraordinario heroe, que tão alto levantou o prestigio nacional, que tão fundo falou á alma e a consciencia nacional. (Vozes: - Muito bem).
A perda de Mousinho de Albuquerque transmittiu-se a todos os pontos do país com vertiginosa rapidez; e de toda a parte nos chegam, já, os echos do enorme pesar que, em toda a nação, cansou tão infausto acontecimento. ( Vozes: - Muito bem).
Que contraste pronunciado, com essas manifestações de jubilo, patrioticas, com que foram acolhidas no pais, em 1896, as noticias, quo levantaram tão superiormente o espirito nacional, que tanto encheram de prestigio a nação portuguesa, que tão fundo calaram no coração do povo português, e tão rapidamente fizeram vibrar as cordas mais intimas do sentimento humano! (Vozes:-Muito bem).
Como representante legitimo da nação, á Camara dos Senhores Deputados compete exprimir, em nome da mesma nação, o voto de sentimento, pesar e luto, que neste momento está soffrendo todo o povo português.
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Por isso bem desejaria elle, orador, que nesta occasião, uma voz, que não fosse publica como a sua, se fiz esse ouvir.
Por sua parte, não pode prestar mais do que uma ligeira homenagem á consagração que, em palavras mais brilhantes e vibrantes, ha de ser ainda feita por parte de outros illustres oradores, como já o foi, por parte do nobre Ministro da Guerra.
Mousinho de Albuquerque era uma intelligencia clara, animada por uma vontade poderosa, secundada por uma energia intemerata.
Todas estas qualidades conjugadas tornariam grande um homem em toda a parte, fosso qual fosse o modo de vida que elle adoptasse.
Tinha Mousinho do Albuquerque de seguir a carreira militar. Chamavam-o para isso as tradições honrosas de sua familia, em que houve horoes, que só pela liberdade viveram e só pela liberdade morreram. (Muitos Apoiados).
Mas ainda sem estas tradições de familia, outras qualidades especiaes de Mousinho de Albuquerque, juntas ao seu valor e coragem seguramente o fariam seguir a carreira das armas.
Foi nessa carreira, foi na nobre familia militar, de que elle era um dos membros mais illustres e mais queridos; foi licita carreira que elle tanto exaltou, e que fez com que fosse o orgulho de todos os seus camaradas o collegas; foi sobretudo nella, como guerreiro, que o nome de Mousinho de Albuquerque ficou, e ficará para sempre, nas paginas da historia de Portugal. (Vozes: - Muito bem).
É certo que a boa sorte o auxiliou para poder desenvolver, em beneficio do seu país, todas as qualidades extraordinarias, que possuia; mas Mousinho de Albuquerque não esperava que a sorte o procurasse; ia elle mesmo procurar ser util ao seu país; e onde visse a bandeira nacional em perigo, ahi estava elle, para mais a levantar.( Apoiados).
Talvez para ninguem é tão verdadeiro, como para Mousinho de Albuquerque, este lemma: A luta e a alegria, é a vida; o marasmo, o descanso, é o aborrecimento; é, talvez, a morte.
ousinho de Albuquerque era, como militar, dotado de um golpe de vista rapido. Com precisão extraordinaria conhecia e via as manobras dos seus adversarios; e com grande, energia e bravura lutava immediatamente. Todavia, apesar do seu extraordinario arrojo, tinha, mesmo nas occasiões criticas, uma extraordinaria prudencia. Nunca envolvia os seus soldados em operações secundarias, mas, no momento de crise e de perigo, desenvolvia, então, toda a sua intemerata energia. (Apoiados}. E era nesse momento extraordinario que elle, com o exemplo de seu alevantado valor, fazia com que a victoria voltasse naturalmente para o seu lado. (Vozes: - Muito bem).
Taes eram as qualidades militares de Mousinho de Albuquerque. Foi com ellas que principalmente se distinguiu na segunda campanha de Gaza, na batalha dos Namarraes. Foi ahi que se viu o que podia e valia a tatica e a coragem de Mousinho de Albuquerque. A victoria era decisiva, relampejante; representava o arranco indomito das forças portuguesas. (Vozes: - Muito bem).
Mas não foi principalmente a campanha contra os Namarraes, que distinguem Mousinho. O que mais veiu reavivar a alma nacional, e fez vibrar o coração de toda a nação, foi Chaimite, feito extraordinario; tão grande em si, que quasi parece ter sido exclusivamente talhado, para fazer salientar bem as altas qualidades da energia intemerata d'esse grande heroe. (Vozes: - Muito bem).
Não houve, então, um unico combate; mas para nacionaes e estrangeiros, é considerada como a façanha mais heroica dos ultimos tempos. (Apoiados geraes.)
É de Chaimite que são a historia militar moderna, trazendo-nos á idéa esses heroes dos tempos antigos, que levantaram, no seculo XVI, a nação portuguesa ao apogeu de toda a sua gloria, alcançando para ella um imperio, nunca até então conquistado. (Vozes: - Muito bem).
Foi ahi que Mousinho de Albuquerque pôde mostrar nos o prototypo verdadeiro da energia e grandeza, dedicadas ao progresso da sua patria.
Mas foi esse feito só util á grandeza do nome militar? Não; foi tambem de grande alcance politico para a Nação.
stava assediada a Africa por ambições entranhas; e, succumbir perante a audacia criminosa de cafres revoltados, seria uma ignominia para o nome português.
Foi então necessario fazer se um appello á coragem e valentia do exercito português, e esse appello não falhou. Foi naquellas regiões que o soldado português mais uma vez se manifestou digno successor do soldado de outros tempos. (Vozes: - Muito bem).
Nem as difficuldades do territorio, nem as febres, nem os pantanos, nem as perdas numericas, impediram que a campanha fosse a mais notavel dos ultimos tempos. (Apoiados).
Estava concluida a victoria; era necessario concluir a paz.
Era necessario um pouco mais: firmar o nosso dominio.
Era necessario, indispensavel, deixar a espada e substitui-la pelo alvião e pela charrua.
Veio então Chaimite, e com elle se realizaram esses factos.
A segunda campanha de Gaza foi determinada pela necessidade immediata do vingar a vida de um distincto official português, e de quatro soldados que o acompanhavam.
A gloria militar surgiu, mas era necessario dar principio á gloria e ao desenvolvimento da provincia. Abriu-se, então, mais um caminho para o interior do sertão; mais uma communicação para o desenvolvimento economico d'aquella região. (Vozes: - Muito bem).
Taes são os factos que honram o exercito português de terra e mar, salientando-se, porem, o vulto heroico do Mousinho de Albuquerque.
Agora, que elle, orador, esboçou, em traços leves e largos, o vulto d'aquelle heroe, pouco mais lhe resta a dizer.
Mousinho de Albuquerque deixa um nome illustre, que ficará gravado nas paginas mais brilhantes da historia militar portuguesa, para gloria dos que o acompanharam em vida, e para exemplo e incitamento dos que vierem depois.
Ninguem, com mais dedicação, serviu a patria, que elle tanto honrou, as instituições e o proprio Rei, que tanto o distinguiu com a sua amizade.
Curva-se, pois, respeitoso e reverente, elle, orador, perante esse nome e perante esse heroe da nossa patria, associando-se, em nome da maioria da Camara, ao voto de sentimento quo foi proposto (Muitos apoiados); porque esse voto do sentimento é, ao mesmo tempo, a significação do sentimento, da dor e da magua, que neste momento compunge toda a nação portuguesa. (Apoiados).
Feitos tão extraordinarios, serviços tão superiores, em beneficio da patria, não se fizeram sem sacrificio das commodidades de casa e da propria vida.
E em conjuntura nenhuma elles serão mais apreciados do que na actual, votando-se a proposta do Sr. Ministro da Guerra. (Apoiados).
Circumstancias tem havido em que se teem dado casos, semelhantes; mas seguramente nenhuma se tem importo mais de que a actual, quando se trata de celebrar os enormes serviços de Mousinho de Albuquerque.
Propõe, portanto, que seja dispensado o Regimento, a fim de que a proposta, apresentada pelo Sr. Ministro da
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Guerra, seja posta desde já em discussão. (Vozes: - Muito bem).
(O discurso será publicado na integra e em appendice a esta sessão quando S. Exa. devolver as notas tachygraphicas}.
O Sr. Francisco Beirão: - Sr. Presidente: a minoria progressista, em nome da qual tenho mais uma vez a honra immerecida (Não apoiados) e a grata satisfação de falar, associa-se unanime e compungida a todos os sentimentos, que acabam de ser expressos a proposito da morte d'esse valente cabo de guerra, que se chamou em vida Mousinho de Albuquerque. (Vozes: - Muito bem).
Na hora sombria, que vamos atravessando, em que toda a esperança parece esmagar-se entro a audacia impenitente de uns, e a culposa indiferença de muitos, ajusta-se bem ao rigor do destino que esta Camara inicie as suas sessões, não traduzindo as aspirações generosas da nação, mas celebrando as exequias de tantos homens illustres, flores alterosas da nossa raça, que a morte implacavel, como o tyranno antigo, vae desbastando com a sua ferrea e lugubre vara! (Repetidos apoiados}.
Hontem Antonio Ennes, hoje Mousinho de Albuquerque. Hontem arrefecia pouco a pouco até á immobilidade completa o cerebro possante que previra, concebera e planeara uma empresa digna dos tempos heroicos, hoje... hoje paralysa-se, inopinadamente, o braço alteroso d'aquelle que um dia, verdadeiro alferes-mor da nação, soube desfraldar, perante o gentio indomito e a Europa maravilhada, o velho estandarte cuja sombra foi a primeira a desenhar-se nas terras adustas do continente africano!
De Mousinho de Albuquerque disse eu tudo quanto pensava, na sua propria presença numa reunião celebre, a que, representante do Governo e Deputado pelo Porto, tive a honra de presidir nessa cidade e onde a palavra correcta do Dr. Leopoldo Mourão, a eloquencia imaginosa de Luiz de Magalhães, o verbo tribunicio de José de Alpoim, fizeram ao heroe a mais justa e merecida de todas as apotheoses. (Apoiados}.
Foi então que elle, recebendo uma artistica espada do honra, que lhe fôra offerecida, jurou perante todos, que nunca a desembainharia senão em defesa do Rei e da patria. Do Rei e da patria... que aquelle grande espirito nunca comprehendeu desunidos ou separados. Quantas vezes nessa verdadeira marcha triumphal em que elle percorreu o país, quantas vezes elle soube e quis que os excessos de enthusiasmo que saudavam nelle o soldado da patria, fossem tambem rendida homenagem ao leal servidor, d'aquelle que se honrava com a sua amizade (Apoiados) e que hoje deplora a perda do amigo, como a patria deplora a morte do seu cabo de guerra 1
Mousinho foi um verdadeiro português, com todas as grandes qualidades, e - porque não hei de dizê-lo?- tambem com todos os excessos da nossa raça; mas foi, ainda mais, um homem, trabalhado, talvez, das duvidas do tempo, tocado de uma ponta do pessimismo, mas em todo o caso um homem no sentido elevado e nobre da palavra.
Conheceu como poucos os gozos inebriantes da gloria, experimentou talvez como ninguem as perturbadoras alegrias da popularidade. Tudo mereceu e tudo foi justo. Elle porem é que se não deixou tomar dos fumos da vaidade, e acima da gloria Q da popularidade pôs sempre a affirmação do seu caracter e o cumprimento do seu dever. (Muitos apoiados).
Sr. Presidente: associo-me, tambem, á proposta que o Sr. Ministro da Guerra mandou para a mesa e em nome d'este lado da Camara não tenho duvida em votar, exa. cepcionalmente para ella, a dispensa do Regimento e em approvar até por acclamação a propria pensão, porque não me esqueço que se no dia da festa e do triumpho eu pude ter a subida honra de offerecer o braço a uma das mais nobres damas da familia Mousinho, não quero regatear nem sequer demorar á sua nobilissima viuva, no dia de luto, da orphandade e da viuvez, a homenagem a que tem direito.
A bravura, que foi talvez a qualidade primacial da personalidade de Mousinho, em tanta maneira original, essa lendaria bravura se teve qualquer desfallecimento, foi só um, o primeiro, o ultimo, o unico. Verdadeira allucinação! Lamentemo-lo.
Chegado ao cimo da montanha luminosa não se resignou a descer-lhe o aspero declive, o tomado de subita vertigem deixou-se tombar até se desfazer na lagea do sepulchro!
Que admira? Tambem o sol com ser o astro radioso que a todo o Universo dá luz e calor e vida, tambem o sol, por algumas d'essas calidas tardes de estio, em que a ardencia suffoca, o suão abrasa, e se evolam da terra não sei que capitosos effluvios, tambem o sol, em vez de immergir suavemente nos saudosos cambiantes do crepusculo, precipita-se numa rubra faixa como se quisesse desapparecer de todo num louco turbilhão de sangue e fogo!
Que admira, e que importa?
O sol renasce sereno n brilhante; como elle, Mousinho de Albuquerque ha de ámanhã, - e amanhã é hoje mesmo, - resplandecer na historia e no logar eminente que alcançou por direito de conquista!
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O Sr. Alexandre Sarsfield: - Sr. Presidente: a circumstancia fortuita de ser eu o unico membro d'esta Camara que teve a honra e a fortuna de combater ao lado d'esse soldado glorioso que hoje a patria pranteia e o exercito chora, impõe-me o dever de não ficar silencioso no meio d'esta commemoração, e de vir tambem trazer aqui o preito da minha homenagem sentida, a magua da minha saudade, o testemunho da minha admiração, por esse vulto heroico que tão alto soube erguer o nome e a bandeira portuguesa. (Apoiados}.
Sr. Presidente: quando o nosso país, adormecido na morbida indolencia de uma prolongada vida de paz, julgava ver tambem adormecidos no coração de seus filhos os sentimentos viris o masculos da antiga raça portuguesa, foi acordado, foi sacudido pela realidade quente, vibrante, do esforço de seus soldados, que dos sirenes africanos vieram restituir-lhe o prestigio e o renome a que tem direito, em face da civilização, apontando-o á Europa inteira na continuação da sua missão historica.
D'esses soldados, Sr. Presidente, elle foi o maior. (Apoiados}.
Tão grande, que a fama da sua coragem, da sua audacia nunca excedida, do esforçado valor da sua espada gloriosa não coube na estreita faixa de Portugal, e transpondo as fronteiras foi repercutir-se por essa Europa alem, na affirmação solemne, que os portugueses de hoje são os mesmos do que os portugueses dos tempos epicos da nossa brilhante historia. (Apoiados}.
E é por isso que o Adamastor, ha longos annos afastado dos alcantis e das fragas do promontorio da Boa Esperança, la estava em Chaimite, com os mesmos olhos encovados, com a mesma barba esqualida, mas como que sorrindo para os soldados de Mousinho de Albuquerque porque via nelles os legitimos irmãos dos marinheiros de Bartholumeu Dias. (Apoiados).
Sr. Presidente: em Coolella, que foi sem contestação o mais notavel combate que Portugal feriu em terras de Africa nos tempos modernos, não só pelas consequencias politicas que d'ahi advieram para o país, como pela enorme desproporcionalidade no numero dos combatentes, eu vi, na mais serena impassibilidade, com a mais estoica coragem, Mousinho, no centro do quadrado, como que a sorrir para o desencadear da tempestade.
Nós eramos poucos. Os inimigos contavam-se aos milhares.
Nós estávamos ali num quadrado estreito, apertado, em massa compacta.
Elles formavam um grande semi-circulo, de mais de l
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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
kilometro de extensão e com mais de 2:000 espingardas
Em torno das nossas cabeças, com uma impetuosidade violenta, caía uma chuva de, balas, entoando a lugubre canção da morte.
Quando acabou a refrega, ainda o estou a ver, ainda o estou a ouvir, Mousinho disse, com um sorriso orgulhoso:
"Senti as bem passar em volta da minha cabeça e como que atravessar-me o corpo, matando-me o cavallo".
Mas nessa jornada estava lhe reservada uma importantissima missão, a mais importante talvez d'aquella campanha.
Quando o valoroso e heroico vencedor de Coolella, o bravo coronel Galhardo (Apoiados); deu balanço ás perdas d'aquelle dia, viu, com a maior magna, que era grande o numero dos nossos feridos.
Impossivel seria avançar logo sobre o Manjacaze. Havia e penso dos feridos e a necessidade impreterivel de algum repouso.
E esta demora trazia gravas complicações á columna impossibilitando-a de poder completar a sua acção, porque os viveres era tão escassos... apenas os necessarios para ir de Chicomo a Manjacaze e de Manjacaze a Chicomo...
A demora de mais dois ou tres dias trazia como consequencia fatal ficar indecisa uma victoria que tanto esforço, que tanto sacrificio e tanto sangue nos tinha custado.
O não avalizar, seria deixar ficar em Manjacaze o potentado negro, cercado ainda com o prestigio da auctoridade, continuando a escarnecer da bandeira das quinas que tanta luz, tanto bem, tanta justiça e tanta verdade tem espalhado por essas terras de alem-mar. (Apoiados).
Nesta conjuntura, o coronal Galhardo disse a Mousinho:
"É indispensavel que vá a Chicomo buscar viveres".
Mousinho nem respondeu; como quem recebia uma ordem para uma guarda de honra, aprompta a sua gente, que eram pouco mais do que duas duzias de soldados, e sortiu.
E lá os vi partir, Sr. Presidente, lá os vi sumir-se no horisonte da langua de Coolella, aquelles bravos soldados levando á frente o seu gloriosos commandante, que se chamava Mousinho de Albuquerque, os quaes iam atravessar um país inimigo, em guerra, a temerosa guerra cafreal, toda de traições, de ardis, de embuscadas, e que de um para outro momento poderia subverter esse punhado de valentes, que eram toda a esperança da columna, numa espantosa catastrophe.
Ainda mais.
Foi e conseguiu trazer diante da ponta das lanças dos seus soldados, os pretos de Inhambane, trazendo-nos os diversos salvadores.
Este facto, que só por si era mais do que sufficiente para que o nome de Mousinho de Albuquerque fosse inscripto na gloria dos benemeritos, dos grandes servidores do país, ficou esquecido, offuscado, deante do outro, do maior, do grande, do collossal, que fez estremecer a nossa terra em assomos de orgulho, de consolações e de alegrias, e que levou, desde o Paço dos nossos Reis, até á mais recondita das nossas aldeias, o enthusiasmo espantoso de uma commoção vibrante, que bem traduzia o sentir da nação inteira, quando adquiriu a certeza de que o poderoso negro estava preso, pondo-se assim, de um modo tão epico, um remate glorioso á grande campanha. (Apoiados).
Quando entrou na povoação de Mahuéo, na região de Chaimite, elle não queria saber o numero dos inimigos!
Ia ali com a convicção profunda e com a consciencia arreigada do cumprimento de um sagrado cumprimento de um sagrado dever nacional!
Ou prendia o regulo, ou ficava lá morto!
Prendeu o e venceu!
Mas, Sr. Presidente, eu não quero cansar a attenção da Camara, rememorando factos conhecidos de toda a gente; a minha intenção, o meu desejo, é apenas juntar a minha embora humilde e desauctorizada no seio do Parlamento, a este concerto unanime do país, na magna que a todos deixou a perda de Mousinho, que assim caiu na campa fria da morte, embora reviva eternamente no bronzeo livro da historia.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi muito cumprimentado).
O Sr. Presidente: - Vae ler se a proposta mandada para a mesa pelo Sr. Pereira dos Santos.
Leu-se. É a seguinte:
Proposta
Proponho que, dispensado o Regimento, entre já em discussão a proposta de lei apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra, concedendo uma pensão á viuva de Joaquim Mousinho de Albuquerque. = Pereira dos Santos.
Foi approvada por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta mandada para a mesa pelo Sr. Ministro da Guerra.
Leu-se. É a seguinte:
Proposta
Senhores: - Se em todos os tempos as nações cultas procuraram, como cumprimento de um dever civico, prestar sentida homenagem aos seus grandes mortos, glorificando-os; se, apontando á posteridade autos de heroismo que trouxeram á collectividade nacional honra e proveito, procura a historia fomentar a continuação da pratica de iguaes virtudes, justo é que, neste momento, em que a patria chora a perda de um dos seus filhos mais illustres e o exercito um dos seus mais valentes soldados, o Governo venha ao Parlamento pedir vos, Senhores, o vosso assentimento para honrar a memoria d'essa legitima gloria nacional, que em vida se chamou Joaquim Augusto Mousinho de Albuquerque.
Crê o Governo que interpreta o sentimento do país inteiro, submettendo á vossa approvação esta proposta de lei, em que pede uma pensão para a desolada viuva do glorioso soldado, Vencedor do Chaimite, pensão que será como que o echo sentido do agradecimento da patria e testemunho inconfundivel de eterno reconhecimento e gratidão pelos excepcionaes o relevantissimos serviços que o país deve a essa brilhante espada, que acaba de perder-se.
Pensa o Governo que esta proposta de lei não carece de ser justificada, porque o valor dos feitos grandiosos de Joaquim Augusto Mousinho de Albuquerque, que tão alto ergueu, perante a Europa inteira, o nome português e a bandeira de Portugal, essa gloriosa bandeira, que, com tão rara fortuna tem sido beijada pelo sol dos combates e pelas aguas do mar, pertenço á historia, e a historia, que é uma resurreição, revivo no coração da humanidade, como irradiação sublime de eterna justiça.
Nesta convicção temos a honra de submetter ao vosso alto criterio a seguinte proposta do lei:
Artigo 1.º É concedida á Sr.ª D. Maria José de Mascarenhas Gaivão Mousinho de Albuquerque a pensão vitalicia que pela lei de 6 de abril de l896 foi dada ao seu fallecido marido, o tenente-coronel Joaquim Augusto Mousinho de Albuquerque, pelos excepcionaes serviços prestados na Africa Oriental, sendo todavia elevada a l:200$000 réis por anno.
§ unico. Esta pensão é isenta de quaesquer impostos, e será abonada desde o dia do fallecimento do referido official.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto.
Foi approvada por acclamação.
O Sr. Presidente: - Consulto a Camara sobre o voto de sentimento por mim proposto.
Foi approvado.
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SESSÃO N.º 3 DE 11 DE JANEIRO DE 1902 7
O Sr. Ministro da Fazenda (Fernando Mattozo Santos): - Mando para a mesa a seguinte
Proposta de accumulação
Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, o Governo de Sua Majestade pede á Camara dos Senhores Deputados a necessaria permissão para que possam accumular, querendo, as funcções legislativas com as dos empregos dependentes do Ministerio dos Negocios da Fazenda, que exercem em Lisboa, os Srs. Deputados:
Agostinho Lucio e Silva.
Antonio Eduardo Villaça.
Antonio José Lopes Navarro.
Antonio Maria Pereira Carrilho.
Antonio de Sousa Pinto de Magalhães.
Angusto Cesar da Rocha Louza.
Augusto José da Cunha.
José Antonio Ferro de Madureira Beça.
José Coelho da Motta Prego.
Visconde de Mangualde.
Secretaria de Estado dos Negocios da Fazenda, em 11 de janeiro de 1902. = Fernando Mattozo Santos.
Apresento duas propostas de renovação de iniciativa:
1.ª Remodelando a tabella do imposto do sêllo;
2.ª Modificando o imposto de mercê.
Estas propostas tinham sido apresentadas na ultima sessão legislativa.
(A publicar no Diario do Governo e enviadas depois ás commissões competentes}.
A proposta para accumulação foi approvada.
O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): -Mando para a mesa a seguinte
Proposta de accumulação
Em conformidade do artigo 3.° do 1.° Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, o Governo pede á Camara dos Senhores Deputados da Nação a precisa auctorização para que o Sr. Deputado Joaquim da Cunha Telles de Vasconcellos, possa accumular, querendo, as funcções legislativas com as do seu emprego dependente do Ministerio do Reino.
Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 11 de janeiro de l902.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.
Lida na mesa, foi em seguida approvada.
O Sr. Alvaro Possollo: - Por parte da commissão de resposta ao Discurso da Coroa, mando para a mesa a seguinte
Participação
Participo que se constituiu a commissão de resposta ao Discurso da Coroa, escolhendo para relator o Sr. Deputado Fratel, e a num para secretario. = A. Possollo.
Para a acta.
O Sr. Manuel Fratel: - Mando para a mesa o parecer da commissão de resposta ao Discurso da Coroa.
Foi a imprimir.
O Sr. Oliveira Simões: - Por parte da commissão do bill mando para a mesa a seguinte
Participação
Tenho a honra de participar que se constituiu a commissão do bill, sendo eleitos para presidente o Sr. Conselheiro João Marcellino Arroyo e para secretario o participante. = José Maria de Oliveira Simões.
Para a acta.
ORDEM DO DIA
Eleição de commissões
O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á eleição simultanea das commissões administrativas e de redacção. Convido os Srs. Deputados a formularem as suas listes.
Fez-se a chamada.
O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Lopes Navarro e Conde de Castro e Solla a servirem de escrutinadores.
Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna para a commissão administrativa 56 listas, saindo eleitos os Sra.:
Henrique Matheus dos Santos, com 56 votos
Jayme da Costa Pinto 56 "
Rodrigo Affonso Pequito 56 "
O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Alfredo de Albuquerque e Agostinho Lucio a servirem de escrutinadores.
Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna para a commissão de redacção 56 listas, saindo eleitos os Srs.:
Alberto Allen Pereira Bramão, com 56 votos
Alipio Albano Camello 56 "
Antonio Sergio da Silva e Castro 56 "
Carlos Malheiros Dias 56 "
José de Sousa Tavares 56 "
O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á eleição simultanea das commissões de fazenda e orçamento. Convido os Srs. Deputados a formularem as suas listas.
Fez-se a chamada.
O Sr. Presidente - Convido os Srs. Petra Vianna e Pereira de Vasconcellos a servirem de escrutinadores.
Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna 68 listas, ficando eleitos para a commissão de fazenda os Srs.:
Abel de Andrade, com 58 votos
Alvaro Possollo de Sousa 58 "
Alberto Pereira de Almeida Navarro 58 "
Anselmo Augusto Vieira 58 "
Antonio Lopes Navarro 58 "
Antonio Pinto de Magalhães 58 "
Augusto da Rocha Louza 58 "
Conde do Paçô-Vieira 58 "
Henrique Matheus dos Santos 58 "
João Marcellino Arroyo 58 "
José Dias Ferreira 58 "
José Maria Pereira de Lima 58 "
D. Luiz Filippe do Castro 58 "
Luiz Heis Torgal 58 "
Marianno Cyrillo de Carvalho 58 "
Manuel Joaquim Fratel 58 "
Ovidio do Alpoim 58 "
Rodrigo Affonso Pequito 58 "
Para a commissão do orçamento entraram na urna 68 listas, saindo eleitos os Srs.:
Abel Andrade, com 58 votos
Alberto Pereira de Almeida Navarro 58
Alfredo Cesar Brandão 58 "
Alipio Albano Camello 58 "
Anselmo Augusto Vieira 58 "
Clemente J. Pinto 58 "
Custodio M. Borja 58 "
Eduardo Burnay 58 "
Ernesto da Costa Ornellas 58 "
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Guilherme Santa Rita 58 votos
Jayme da Costa Pinto 58 "
João de Sousa Tavares 58 "
José Rodrigues Monteiro 58 "
José M. de Oliveira Simões 58 "
José Raposo Botelho 58 "
D. Luiz F. de Castro 58 "
Luiz José Dias 58 "
Marianno C. Carvalho 58 "
O Sr. Sousa Tavares: - Por parte da commissão de redacção mando para a mesa a seguinte participação:
"Participo haver se constituido a commissão de redacção, tendo escolhido o Sr. Sergio de Castro, para presidente e a mim, participante, para secretario".
Mando tambem para a mesa a ultima redacção da proposta hoje apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra e que a Camara approvou. A commissão não lhe fez alteração alguma:
Parecer
Senhores. - Á vossa commissão de redacção nau fez alteração alguma no projecto da pensão á viuva de Joaquim Mousinho de Albuquerque. = Sergio de Castro = Alberto Bramão = José de Sousa Tavares.
O Sr. Presidente: - A primeira sessão é na terça feira. A ordem do dia é a mesma que estava dada e mais o projecto de resposta ao Discurso da Coroa, se o respectivo parecer puder ser distribuido a tempo conveniente.
Está encerrada a sessão.
Eram cinco horas e um quarto da tarde.
O redactor = Barbosa Colen.
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APPENDICE Á SESSÃO N.º 3 DE 11 DE JANEIRO DE 1901
Propostas de renovação de intelativa apresentadas pelo Sr. Ministro da Fazenda, que deviam ler-se a pag. 8 da sessão n.° 3 de 11 de janeiro de 1902
Proposta de lei n.° 2-4
Renovo a inicitiva da proposta de lei que remodela a a tabella do imposto de sêllo apresentada na ultima sessão legislativa.
Sala das sessões, 11 de janeiro de 1902. = Fernando Mattozo Santos.
Foi enviada á commissão de fazenda.
Proposta de lei n.º 2-B
Renovo a iniciativa da proposta de lei que modifica o imposto de mercê, apresentada na ultima sessão legislativa.
Sala das sessões, 11 de janeiro de 1902. = Fernando Mattozo Santos.
Foi enviada á commissão de fazenda.