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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

3.ª SESSÃO

(PREPARATORIA)

(Constituição da Camara.)

EM 4 DE MARÇO DE 1909

SUMMARIO. - É lida e appvovada a acta da sessão anterior. É lido o decreto que nomeia Presidente da Camara dos Deputados o Sr. Conselheiro Mendes Leal. - Presta juramento como Presidente o Sr. Conselheiro Mendes Leal. Presta juramento como Vice-Presidente o Sr. Motta Prego. - O Sr. Presidente propõe um voto de sentimento pelos Deputados fallecidos no interregno parlamentar, a que se associam os Srs. Ministro da Marinha (Antonio Cabral), Conde de Paçô-Vieira, Moreira Junior, Fialho Gomes, Alvaro Penalva, Pinto dos Santos, Brito Camacho e Pinheiro Torres, sendo a proposta approvada. - Presta juramento o Sr. João Augusto Pereira - O Sr. Presidente propõe um voto de sentimento pela catastrophe da Italia. - O Sr. Moreira Júnior propõe que a sessão seja levantada em sinal de luto por essa desgraça. - Associam-se a esta proposta os Srs. Conde de Paçô-Vieira, Ministro da Marinha (Antonio Cabral), Pereira dos Santos, Pinto dos Santos, Almeida Garrett, Alexandre Braga e Pinheiro Torres, sendo a proposta approvada por acclamação e depois encerrada a sessão.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. José Joaquim da Silva Amado (Decano)

Secretarios - os Exmos. Srs.

Henrique Anachoreta
João Monteiro

Primeira chamada: - Ás 2 horas e 5 minutos da tarde.

Segunda chamada: - Ás 2 horas e 50 minutos da tarde.

Presentes: - 85 Srs. Deputados.

São os seguintes:-Abel de Mattos Abreu, Alberto Pinheiro Torres, Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, Alfredo Carlos Le Cocq, Alfredo Pereira, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Alvaro Rodrigues Valdez Penalva, Amadeu de Magalhães Infante de La Cerda, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alves Oliveira Guimarães, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Bellard da Fonseca, Antonio Centeno, Antonio Duarte Ramada Curto, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio Macedo Ramalho Ortigão, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Costa da Silveira, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Tavares Festas, Antonio Zeferino Candido da Piedade, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Augusto Cesar Claro da Ricca, Aurelio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, Carlos Augusto Ferreira; Christiano José de Senna Barcellos, Conde de Azevedo, Conde de Castro e Solla, Conde de Paçô-Vieira, Diogo Domingues Peres, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Ernesto Jardim de Vilhena, Fernando de Almeida Loureiro e Vasconcellos, Francisco Cabral Metello, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Miranda da Costa Lobo, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, Henrique de Mello Archer da Silva, João do Canto e Castro Silva Antunes, João Duarte de Menezes, João Feliciano Marques Pereira, João Henrique Ulrich, João Ignacio de Araujo Lima, João Joaquim Isidro dos Reis, João José da Silva Ferreira Netto, João José Sinel de Cordes, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Soares Branco, João de Sousa Calvet de Magalhães, João de Sousa Tavares, Joaquim José Pimenta Tello, Jorge Vieira, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Augusto Moreira de Almeida, José Bento da Rocha e Mello, José Cabral Correia do Amaral, José Caeiro da Matta, José Coelho da Motta Prego, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Jeronimo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim da Silva Amado, José Maria Cordeiro de Sousa, José Maria de Oliveira Simões, José Mathias Nunes, José Osorio da Gama e Castro, José Paulo Monteiro Cancella, José Ribeiro da Cunha, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Manuel Affonso da Silva Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel de Sousa Avides, Matheus Augusto Ribeiro de Sampaio, Miguel Augusto Bombarda, Paulo de Barros Pinto Osorio, Roberto da Cunha Baptista, Sabino Maria Teixeira Coelho, Vicente de Moura Coutinho de Almeida d'Eça, Visconde de Coruçhe, Visconde de Villa Moura.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Adriano Anthero de Sousa Pinto, Affonso Augusto da Costa, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alexandre Braga, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio de Almeida Pinto da Motta, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Hintze Ribeiro, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Conde de Mangualde, Conde de Penha Garcia, Duarte Gustavo de Reboredo Sampaio e Mello, Emygdio Lino da Silva Junior, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, João Augusto Pereira, João Pereira de Magalhães, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim Mattoso da Camara, José Francisco Teixeira de Azevedo, José Julio Vieira Ramos, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Queiroz Velloso, Luis da Gama, Manuel de Brito Camacho, Manuel Francisco de Vargas, Manuel Nunes da Silva, Rodrigo Affonso Pequito, Thomás de Aquino de Almeida Garrett, Visconde de Ollivã.

Não compareceram a sessão os Srs.: Abel Pereira de Andrade, Abilio Augusto de Madureira Beça, Antonio Alberto Charulla Pessanha, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio José de Almeida, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Sérgio da Silva e Castro. Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Augusto ViHal de Castilho Barreto e Noronha, Conde de Arrochella, Eduardo Burnay, Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Fernando de Sousa Botelho e Mello (D.), Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Xavier Correia Mendes, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, João Carlos de Mello Barreto, João Correia Botelho Castello Branco, Joaquim Anselmo da Matta Oliveira, Joaquim Pedro Martins, José Antonio da Rocha Lousa, José de Ascensão Guimarães, José Caetano Rebello, José Estevam de Vasconcellos, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Malheiro Reymão, José Maria Joaquim Tayares, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria Pereira de Lima, José dos Santos Pereira Jardim, Luis Filippe de Castro (D.), Luis Vaz de Carvalho Crespo, Manuel Joaquim Fratel, Manuel Telles de Vasconcellos, Mariano José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Thomás de Almeida Manuel de Vilhena (D.), Visconde de Reguengo (Jorge), Visconde da Torre.

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SESSÃO N.° 3 DE 4 DE MARÇO DE 1909 3

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 3 horas da tarde

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio do Reino, enviando o decreto pelo qual Sua Majestade El-Rei houve por bem nomear o Sr. Deputado José Joaquim Mendes Leal para o logar de Presidente da Camara dos Senhores Deputados, e o Sr. Deputado José Coelho da Motta Prego para o de Vice-Presidente.

Para a secretaria.

O Sr. Presidente: - Vou ler o seguinte:

Decreto

Tomando em consideração ã proposta da Camara dos Senhores Deputados da Nação Portuguesa, nos termos do artigo 21.° da Carta Constitucional da Monarchia: hei por bem nomear o Deputado José Joaquim Mendes Leal para o logar de Presidente, e o Deputado José Coelho da Motta Prego para o de Vice-Presidente da mesma Camara.

Paço, em 4 de março de 1909. = REI. = Arthur Alberto de Campos Henriques.

Para a acta e archive-se.

O Sr. Presidente: - Convido o Sr. Deputado José Joaquim Mendes Leal a vir prestar juramento. S. Exa. prestou juramento e occupou o seu logar.

O Sr. Presidente (Mendes Leal): - Convido os Srs. Deputados eleitos secretarios, João Pereira de Magalhães e João José Sinel de Cordes, a occuparem os seus logares.

S. Exas. tomaram os seus lagares.

O Sr. Presidente: - A Camara dos Srs. Deputados acha se definitivamente constituida.

Convido o Sr. Deputado Motta Prego a prestar juramento na qualidade de Vice-Presidente.

S. Exa. prestou juramento.

O Sr. Presidente: - Ao occupar este honroso logar, permitta-me á Camara algumas singelas palavras.

Modesto Deputado, cumpre-me agradecer á Camara, reconhecido, mais do que reconhecido, commovido mesmo, a honrosa votação que habilitou Sua Majestade El-Rei a escolher-me para Presidente deste alto corpo politico.

É esta, sem duvida, a maior honra e tambem o maior encargo que pode impender sobre um homem publico num regime parlamentar, e, eu, meus senhores, sentir-me-hia profundamente satisfeito se me reconhecesse qualidades de saber, de intelligencia e de autoridade para desempenhar conrligriamente tão honroso como elevado cargo; infelizmente receio que a benévola espectativa da Camara seja illudida.

Animaram-me, porem, a acceitar: primeiro, a minha intenção formal, inabalavel, de cumprir religiosamente á lei e o regimento d'esta casa; (Vozes: - Muito bem), segundo, o meu respeito absoluto por todos os direitos e pelas garantias parlamentares dos Srs. Deputados; (Vozes: - Muito bem), terceiro, a muita illustração e o patriotismo de todos os Deputados, sejam quaes forem as parcialidades em que militam, para, sem quebra das suas ideias, quererem collaborar para o bem da patria que todos amamos, e ainda a benevolencia com que todos me teem honrado e a amizade que muitos sempre quiseram dar á minha modesta individualidade; provas de consideração e de estima muito superiores aos meus merecimentos.

Srs. Deputados, acabei ha pouco de jurar desempenhar quanto mo permittissem as minhas faculdades OB deveres que me impõe tão honroso cargo; nunca faltei aos meus juramentos, não faltarei a este; cumprirei a lei como souber, inspirando me sempre nos exemplos dos meus antecessores, e muito especialmente no exemplo do Sr. Dr. Libanio Fialho Gomes que, com tanto brilho e com tanta autoridade e illustração, presidiu á primeira sessão da presente legislatura. (Apoiados).

Entrego-me pois confiadamente á Camara, á sua benevolencia e tambem á sua justiça. Se não conseguir desem-penhar-rne cabalmente por me faltarem para isso as faculdades, a uma cousa aspiro: a que se reconheçam as minhas boas intenções.

Espero pois que todos nós havemos de cumprir absolutamente a lei e o regimento. O decoro parlamentar, a ordem e a dignidade á Camara a entrego. (Vozes: - Muito bem). E lembro tambem a todos os espectadores que teem entrada, por lei, nas galerias, que lhes compete conservarem a ordem e serem apenas meros espectadores.

São estas as minhas observações.

Antes de continuar os trabalhos, parece-me que estará no animo de todos os que me ouvem que seja inserida na acta da sessão de hoje um voto á mesa provisoria (Apoiados), que tão distinctamente dirigiu os trabalhos da constituição da Camara. (Apoiados geraes).

Em vista da manifestação da Camara, julgo este voto approvado.

Cumpre-me agora participar á Camara, no cumpri mento de um dever doloroso, o passamento de alguns antigos Deputados que honraram esta Camara e honraram o país com os seus talentos e com os seus servir-os. Enumerá-los-hei pela data do seu passamento. O primeiro, foi Augusto Pinto de Miranda Montenegro, general de divisão, honra do nosso exercito. (Apoiados). Foi inspector geral dos serviços de engenharia; pertenceu o illustre extincto a essa pleiade notavel de engenheiros a quem Portugal deve, nos ultimos tempos, seus melhoramentos materiaes. (Apoiados).

Encontra se nesta Camara, e é nosso collega, seu filho, Sr. Conselheiro Artur Montenegro, a quem me prendem, de ha muito, relações de amizade, que honra a Camara com o seu talento (Apoiados), e com o seu grande caracter. (Apoiados).

O segundo, foi Licinio Pinto Leite, espirito culto (Apoiados), homem largamente conhecido e com grande influencia no norte do país. (Apoiados).

O terceiro, foi Correia de Barros, doutor em mathematica e engenheiro.

Foi uma mentalidade do seu tempo (Apoiados), foi um politico de uma alta envergadura (Apoiados) e um administrador de uma larga e profunda iniciativa (Apoiados).

Bem merece, portanto, do país e de todos nós. (Apoiados).

O quarto foi D. Gaudencio Pereira, arcebispo de Portalegre. Educado na escola liberal do velho Bispo de Viseu, foi liberal e foi um bom. (Apoiados).

O quinto foi Alvares da Silva. Advogado que foi nos auditorios de Lisboa, desempenhou diversas commissões de serviço publico sempre com muita illustração. (Apoiados).

O sexto foi o Visconde de Reguengo, fidalgo da velha

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guarda e que tambem entre nós tem um representante nesta Camara, o nosso collega Visconde de Reguengo.

Permitta-me agora a Camara que mais particularmente chame para a minha saudade os nomes de Jayme Arthur da Costa Pinto e do general Francisco Maria da Cunha.

Jayme Arthur da Costa Pinto era conhecido em todo o país (Apoiados); era um bom (Apoiados); era um altruista (Apoiados), e os seus serviços hão de ser recordados com saudade. (Apoiados).

Costa Pinto foi monarchico por sentimento (Apoiados) e foi um politico por convicção. (Apoiados).

Bem merece, portanto, de todos nós e ainda hoje vive para a nossa saudade. (Apoiados).

O general Francisco Maria da Cunha, a quem, apesar da differença de idade e de situação, me ligava amizade que não posso esquecer.

Tive a honra de servir com elle na Escola do Exercito, quando elle era director e eu um dos mais humildes membros.

Pertenceu á arma de artilharia e foi um official distincto (Apoiados). Foi director do Collegio Militar, commandou a primeira divisão militar, e na vida publica desempenhou os elevados cargos de governador de Macau e da India. Foi presidente da commissão de limites e foi Ministro de Estado.

Em todos estes Jogares as suas faculdades de trabalho e o seu patriotismo foram largamente affirmados. (Apoiados geraes).

Creio que interpreto tambem o sentimento da Camara propondo que na acta da sessão de hoje se lance um voto de profundo sentimento pelo seu passamento (Apoiados geraes), e se façam as devidas communicações. (Apoiados (geraes).

Darei a palavra aos Srs. Deputados que queiram usar d'ella sobre a minha proposta.

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro da Marinha (Antonio Cabral): - Sr. Presidente: em nome do Governo, que tenho a honra de representar n'esta casa do Parlamento, felicito V. Exa. por o ver occupando esse alto cargo e felicito-me e felicito a Camara por ter um presidente tão illustrado e tão digno como V. Exa. (Apoiados).

V. Exa. já não é dos mais novos parlamentares. Já tem dado as suas provas n'esta casa do Parlamento e mostrado o seu talento e o brilhantismo da sua palavra nas discussões em que tem intervindo e illustrado com a sua Incida intelligencia e exclarecimento. (Apoiados geraes).

Tenho, pois, a certeza de que V. Exa., no desempenho d'essa altissima magistratura, ha de saber honrar esse logar que tem sido ocupado por tantos distinctos homens publicos (Apoiados geraes).

Ainda ha pouco V. Exa. citou o exemplo do seu antecessor, meu querido, amigo e correligionario, Sr. Libanio Fialho Gomes. V. Exa. disse que havia de empregar todos os esforços ao seu alcance para seguir-lhe o exemplo.

Nada mais é preciso (Muitos apoiados), porque todos sabem quanto o illustre predecessor de V. Exa. honrou o logar que V. Exa. neste momento occupa. (Apoiados geraes). Tenho a certeza de que, quando V. Exa. sair desse logar, ha de ser-lhe tambem feita a mesma justiça que se faz ao meu querido amigo, Sr. Fialho Gomes. (Apoiados).

Portanto em nome do Governo felicito V. Exa. e a Camara e felicito-me a mim por o ver occupando esse logar.

Agora permitta-me V. Exa. que em nome do Governo me associe á sua proposta.

É larga a lista dos homens illustres que a morte roubou a este país.

Seguindo a ordem que V. Exa. seguiu, começo por citar o nome do Sr. General Montenegro, engenheiro distincto, militar brioso, possuidor de vastos conhecimentos (Apoiados geraes), de quem fui amigo, tendo-o, como meu collaborador dos mais valiosos, quando occupei a pasta das obras publicas. As luzes do sen talento e aos seus esclarecimentos deve o país importantes serviços. (Apoiados geraes).

Era S. Exa. pae de um dos mais queridos e estimados membros desta Camara, um dos meus mais intimos amigos e valiosos correligionarios. O Sr. Arthur Montenegro é digno filho do pae que teve, como o pae era ligitimo orgulho do filho e do país. (Muitos apoiados).

Deploro, como toda a Camara, a perda do Sr. General Montenegro, que era tambem membro muito distincto do partido progressista e foi Deputado em varias legislaturas e por isso o partido progressista lastima o passamento de tão illustre militar. (Apoiados).

O Sr. Dr. Pinto Leite foi meu contemporaneo em Coimbra, e, comquanto mais antigo do que eu e frequentasse uma faculdade diversa da minha, tive com elle ligeiras relações. Foi membro illustre do partido regenerador e pelos serviços que lhe prestou e ao país bem merece que nós commemoremos o seu passamento.

Correia de Barros militou no partido progressista. Foi governador civil no Porto em varias epocas e foi um dos vultos mais atacados da politica portuguesa. Não houve ataque e calumnia que não lhe assacassem, mas de tudo elle saiu sempre triunfante.

Foi Deputado varias vezes e por ultimo Par do Reino, e, se pela muita modestia não tomava grande parte nas lutas parlamentares, em trabalhos de commissões tanto n'esta casa do Parlamento como na outra, elle nunca deixou de tomar o seu logar.

Nestas condições eu não podia deixar de me associar com intimo pesar á proposta de V. Exa.

O Arcebispo de Portalegre, D. Gaudencio, foi tambem membro illustre do partido progressista. Era um prelado querido que deixou saudades no coração de tudos quantos o conheciam.

Alvares da Silva, advogado illustre, foi tambem membro distincto d'esta casa do Parlamento.

Costa Pinto, a quem V. Exa. se referiu, com palavras sentidas e maguadas, era estimado e querido por todos que o conheciam.

São largamente conhecidos os serviços que prestou ao país o os que ultimamente estava prestando no desempenho das suas funcções de provedor da Casa Pia de Lisboa. Quando Ministro das Obras Publicas tive occasião de avaliar de perto os altissimos serviços que Costa Pinto estava prestando n'aquelle estabelecimento de educação.

Victimado por uma doença deploravel vimo-lo rapidamente desapparecer quando ainda podia prestar muitos e extraordinarios serviços no seu país. Nas camaras de Cascaes, Almada e Lisboa estão vestigios da sua passagem. E, pois, com profunda dor que eu me associo á proposta de V. Exa.

Francisco Maria da Cunha era um dos vultos mais pró eminentes do partido progressista. Ministro da Guerra desse partido, Deputado e Par do Reino, era uma d'aquellas figuras que se impunham pela sua autoridade e affa-bilidade. Governador: geral da India e de Macau deixou no desempenho do seu cargo largos vestigios a sua passagem.

Chefe da casa militar de El-Rei, perdeu a Familia Real e a monarchia um leal servidor.

E ainda, com relação ao Visconde de Reguengo, eu tambem tomo parte, em nome do Governo, na proposta feita por V. Exa.

O Visconde de Reguengo, fidalgo de alta estirpe, foi pae de um dos membros desta Camara e meu amigo, o Sr. Visconde de Reguengo, a quem me prendem laços de verdadeira estima.

Associo-me, pois, com bastante pesar á proposta que V. Exa., Sr. Presidente, acaba de fazer.

(O orador não reviu).

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O Sr. Conde de Paçô-Vieira: - As suas primeiras palavras serão para felicitar o Sr. Presidente pela merecida honra que recebeu, sendo eleito para tão alto cargo, e felicitar a Camara por ter escolhido para dirigir os seus trabalhos um homem que pelas suas altas qualidades de talento e de caracter é garantia segura de bem desempenhar o seu espinhoso logar.

Ser Presidente da Camara é sempre uma missão difficil, sobretudo hoje, que S. Exa. vem substituir o Sr. Fialho Gomes, que, pela correcção que manteve na sessão passada, deixou em cada Deputado um amigo e tornou inolvidavel a forma como exerceu a sua magistratura.

Prometteu o Sr. Presidente que cumpriria sempre a lei. E isso e só isso o que se lhe pede. E ninguém melhor do que S. Exa. para o poder fazer, visto que reune em si as duas qualidades de jurisconsulto distincto e brioso official.

Dá lhe uma a facilidade de estudo e a comprehensão da lei, dá-lhe a outra, pelo habito da disciplina militar, a obediencia a ella e só a ella, sem que na sua interpretação ou applicação tenha nunca de ver se é de um adversario, se de um. correligionario que se trata.

Se S. Exa. assim proceder, e ha de proceder, porque acaba de o prometter e jurar, sairá S. Exa. desse logar como saiu o seu antecessor, querido e respeitado.

Posto isto, associa-se, em nome dos Deputados regeneradores que acompanham o Governo, ao voto de sentimento que acaba de ser proposto.

Não se abre infelizmente uma nova sessão parlamentar sem que haja commemorações funebres.

E a de hoje é das de maior tristeza, não só pelo grande numero de mortos illustres que abrange, mas tambem e sobretudo porque entre elles ha nomes, de amigos intimos, nossos leaes companheiros de muitos annos.

Sem distincção de partido todos elles bem serviram o seu país e por isso sinceramente lamentardes a sua morte. O Sr. D. Gaudencio, Bispo de Portalegre, foi um prelado bondosissimo que pelas suas preclaras virtudes mereceu e teve durante a vida o respeito de todos, como tem agora, morto, a nossa saudade e a nossa veneração. E por igual sentimos tambem o desapparecimento do nobre Visconde de Reguengo que foi um collega querido e estimado; do Dr. Alvares da Silva, um dos mais notaveis advogados de Lisboa; de Licinio Pinto Leite, antigo Deputado pelo Porto e caracter primoroso; de Correia de Barros politico de alto valor e espirito dos mais cultos; de Francisco Maria da Cunha, que ao país prestou os mais relevantes serviços, perdendo n'elle o exercito uma das suas glorias e o partido progressista um dos seus membros mais respeitados.

Mas não só estes nomes contém a lista dos mortos. Ha n'ella ainda mais dois, que propositadamente o orador deixou para o fim por desejar fazer-lhes menção muito especial: são os de Jayme Arthur da Costa Pinte e de Augusto Montenegro.

Com viva saudade e com enternecido respeito evoca estes dois nomes. O primeiro de um devotado correligionario; o segundo de um leal adversario. E com igual sentimento os envolve e fala D'elles. Jayme Pinto foi um grande amigo.

Crê que o foi de todos os que o conheceram, porque conhece-lo era querer-lhe pela sua grande bondade, pela lisura do seu caracter, pela inestinguivel generosidade do seu coração.

O partido regenerador deveu-lhe muito. Nunca d'elle precisou que o não encontrasse.

E muito lhe deveu tambem o país, porque não houve emprehendimento de utilidade publica ou obra de caridade em que elle entrasse a que não desse todo o seu esforço e toda a sua energia e vontade.

Por isso, com profunda magua, todos choram a sua morte.

Augusto Montenegro foi desde a Universidade, onde se formou em mathematica, um calino e um reflectido.

De uma grande illustração e de uma educação primorosa, era encantador no trato intimo. E apesar de ser um notavel escritor e de nos ter deixado grande numero de obras de real valor sobre os mais variados assuntos, desde o livro Aguas de, Lisboa que publicou em 1893, até o da Hygiene Pullica em Portugal, de 1906, nenhuma vaidade ou pretensão de sábio ou literato empanava o brilho do seu talento.

Era extremamente modesto.

Como funccionario era modelar. E quer no ultramar, onde foi director das obras publicas de Cabo Verde, quer no continente, onde exerceu muitissimas e importantes commissões, o general Montenegro desempenhou sempre com o maior zelo, assiduidade e comprovada competencia os seus logares.

Foi tambem um homem verdadeiramente feliz. Porque póde em vida ver o filho, que adorava, ascender aos mais altos logares, conquistados unicamente pelo estudo e pelo saber, e reconhecer nelle o representante legitimo do seu honrado nome, digno herdeiro das suas primorosas qualidades e virtudes.

Ao partido progressista, que elle lealmente serviu, o ao nosso collega Arthur Montenegro, ali apresenta os protestos do seu sentimento.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Moreira Junior: - Sr. Presidente: em nome do partido progressista representado nesta casa do Parlamento, apresento a V. Exa. os nossos cumprimentos e as nossas felicitações.

É convicção absoluta nossa que V. Exa. ha de honrar a alta magistratura em que se acha envergado, de maneira inequivoca e exhuberante. (Apoiados).

Os primores de caracter que esmaltam a personalidade de V. Exa., as qualidades sãs de que V. Exa. dispõe, a intelligencia iucida que V. Exa. possue, são virtudes de natureza a dar segurança absoluta de que V. Exa. ha de muito bem desempenhar-se d'esse cargo sempre espinhoso e muito mais espinhoso agora em que é complexa a composição da Camara.

Pela parte do partido progressista eu direi a V. Exa. que procuraremos tanto quanto possivel alliviar a ardua tarefa de que V. Exa. está incumbido, e, certamente, ha de V. Exa. demonstrar que é um illustre successor do Sr. Libanio Fialho Gomes, a quem V. Exa. dirigiu e justissimamente (Apoiados) as palavras mais sentidas e verdadeiras de admiração e deferencia, palavras que, em nome do partido progressista, a V. Exa. agradeço.

Foi Libanio Fialho Gomes presidente integerrimo na sessão passada, e com raro brilho, isenção e elevação soube admiravelmente desempenhar-se das difficeis funcções de presidente.

Tambem V. Exa. ha de honrar essa cadeira, e, ao sair d'ella, de parte de todos nós ouvirá referencias iguaes ás que está ouvindo Libanio Fialho Gomes. (Apoiados).

Finalmente, cumpre-me também, em nome do partido progressista, associar-me ás palavras justas e sentidas que V. Exa. proferiu sobre aquelles que a morte sempre traiçoeira e impiedosa arrebatou do nosso convivio.

O partido progressista foi alanceado por esta crueza inexoravel, mas embora na lista negra figurem individualidades de outras parcialidades politicas, entre ellas o partido regenerador, não ha duvida que foi o partido progressista que mais soffreu, desapparecendo d'elle figuras do maior destaque e nobreza, correligionarios leaes e dedicados, cujas qualidades ha pouco foram postas em relevo por todos os lados da Camara.

É grande, é profundo o nosso sentimento e por isso é justo que nós prestemos a nossa homenagem.

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De entre os illustres finados, distinctas personalidades, permitia-me V. Exa. e a Camara que destaque pondo em relevo, pelas suas altas qualidades, Francisco Maria da Cunha, Licinio Pinto Leite, general Montenegro e Jayme da Costa Pinto.

Francisco Maria da Cunha e Licinio Pinto Leite tornaram-se notaveis, não só como partidarios e funccionarios publicos como tambem pelas notas evidentes que sempre deram das suas altas virtudes. (Apoiados).

Jayme da Costa Pinto foi um coração de ouro no exercicio das suas funcções e finalmente o general Montenegro cuja affabilidade encantava, espirito lucido a quem as classes desprotegidas muito devem, porque sempre na sua defesa se arvorou paladino.

Associo-me pois, Sr. Presidente, comovidamente ás palavras compungidas que V. Exa. pronunciou, em meu nome e em nome da maioria progressista desta casa do Parlamento.

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem, muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Fialho Gomes: - Sr. Presidente: associo-me ao voto de sentimento proposto por V. Exa. pelos nossos collegas extinctos, com alguns dos quaes mantive as mais estreitas relações de amizade.

Não pedi a palavra para fazer o elogio dos illustres extinctos, porque já o leader o tinha feito, mas unicamente para agradecer, em primeiro logar a V. Exa., ao Governo, representado pelo meu illustre amigo Sr. António Cabral, ao Sr. Conde de Paçô-Vieira e ao Sr. Dr. Moreira Junior as honrosas referencias que me dirigiram, e ao mesmo tempo agradecer á Camara o modo honroso como acolheu as reflexões feitas por estes illustres Deputados.

Não felicito V. Exa. por ter ascendido a esse logar, mas felicito a Camara e a mim proprio pela escolha que fez.

Nada mais digo. (Vozes: - Muito bem. muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Pereira dos Santos: - Sr. Presidente: a opposição regeneradora desta casa do Parlamento acaba de ouvir com toda a attenção as palavras de V. Exa.

Ella não contribuiu com o seu voto para que V. Exa. ascendesse á elevada dignidade que representa n'esse logar, mas nem por isso deixamos de o felicitar por essa subida honra.

Relativamente ás palavras de V. Exa. que definem o programma que tenciona seguir no desempenho do seu alto cargo, e em que ao mesmo tempo nos pede a nossa cooperação para o desempenho da sua espinhosa e honrosa missão, eu tenho simplesmente a dizer o seguinte:

Por tradição, por principio, o partido regenerador é, antes de tudo e acima talvez de tudo, respeitador do prestigio e lustre da representação nacional. (Apoiados).

Nós comprehendemos toda a responsabilidade da nossa alta missão, sabemos que nesta Camara reside uma parte da soberania nacional, sabemos qual é toda a grandeza e toda a majestade da funcção que nos incumbe, e havemos de ter sempre presente no nosso procedimento dentro do Parlamento este principio que é dominante dos nossos principies. (Apoiados).

Mas, assim como V. Exa. appella para a nossa cooperação, é tambem natural que nós da nossa parte declaremos a V. Exa. o que unica e simplesmente solicitamos para p conveniente desempenho da nossa aspiração legitima. É nossa intenção respeitar absolutamente e sempre o logar que occupamos, manifestar sempre a mais subida consideração e apreço pelas funcções que desempenhamos; unica e simplesmente o que pedimos, o que exigimos até, é que nos seja garantido o exercicio pleno dos nossos direitos parlamentares consignados no regimento desta casa, e esperamos, confiando na integridade, na independencia, na isenção de V. Exa., que essa garantia dos nossos direitos nos seja assegurada. Desde que assim seja, repito, pode V. Exa. contar, absoluta e completam ente, com a cooperação do partido que represento.

Agora vou tambem cumprir um doloroso dever, o de em nome dos meus amigos exprimir o sentimento de dor que nos assiste pela perda de alguns illustres membros d'esta Camara, fallecidos no intervallo parlamentar.

Alguns pertenciam á aggremiação politica em que me encontro, outros fizeram parte de outras aggremiações, mas o nosso sentimento de pesar é para todos, pois não ha rivalidades politicas que subsistam deante da morte e, Sr. Presidente, são sempre dignos de compaixão e do nosso reconhecimento aquelles que procuraram esforçar-se em beneficio do seu pais, fossem quaes fossem as ideias ou principios que durante a sua vida tivessem advogado.

São muitos, Sr. Presidente, os illustres extinctos que o país perdeu no interregno parlamentar. Em breves palavras me referirei a todos elles pela ordem da data do seu fallecimento.

Em primeiro logar esta Camara manifestou o seu sentimento de dor e pesar pela perda do illustre general Augusto Pinto de Miranda Montenegro.

Sr. Presidente: o general Montenegro foi um dos membros da engenharia portuguesa que, a principiar em 1851, mais contribuiram pelos seus esforços e pelos seus talentos, para a grande obra do desenvolvimento economico e material do país, transformando esta nação na situação de relativa prosperidade em que se encontra ainda hoje. (Apoiados).

Foi sobretudo pela dedicação e pelos esforços de uma pleiade de cidadãos, que se póde conseguir essa obra do desenvolvimento do pais, que tão beneficos resultados tem produzido entre nós.

Nesta occasiao uma circunstancia accidental faz com que eu tenha a honra de substituir o general Montenegro, de ser presidente da Associação dos Engenheiros Civis Portugueses. E é nesta qualidade que dirijo as minhas sinceras condolencias ao representante do illustre extincto, pela perda desse collega que sempre foi altamente considerado e apreciado na corporação dos engenheiros civis que elle tão nobremente honrou. (Apoiados).

Licinio Pinto Leite conheci-o no periodo da vida em que as affeições se radicam mais fundas no coração. Fui condiscipulo de Licinio Pinto Leite, conheci todos os primores do seu apreciavel caracter: fui companheiro d'elle n'esta Camara e em todas as circunstancias da minha vida costumei-me ã respeitar este cidadão que, com tanto proveito, se applicou ao progredimento do seu país (Apoiados), deixando um nome honrado e considerado na cidade do Porto.

Correia de Barros. Tambem, Sr. Presidente, dirijo ao partido progressista as minhas sinceras condolencias pela justa magua que deve ter produzido a perda d'este distincto correligionario que um papel tão brilhante exerceu na politica portuguesa (Apoiados), e em que foi um dos propugnadores mais activos, contribuindo para o progredimento da cidade do Porto. (Apoiados).

O Visconde de Reguengo. Quero exprimir o meu sentimento pela perda deste fidalgo illustre que, ao mesmo tempo que honrou os seus pergaminhos, se dedicou ao desenvolvimento da agricultura nacional. (Apoiados).

Outro extincto. o Sr. Francisco Maria da Cunha, tão digno no trato da vida, mereceu sem duvida a consideração publica. (Apoiados).

O illustre general Francisco Maria da Cunha, durante um largo periodo da sua vida, nos serviços que desempenhou, fez brilhar sempre as instituições militares, sendo um dos generaes mais queridos e estimados do exercito portugues. (Apoiados). Elle soube sempre honrar as armas que gloriosamente serviu. (Muitos apoiados).

Mas o illustre extincto Francisco Maria da Cunha foi

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SESSÃO N.º 3 DE 4 DE MARÇO DE 1909 7

apenas por esse lado digno da nossa consideração e estima? Não.

Os serviços deste illustre militar e distincto parlamentar foram tambem de grande proveito para o país no desempenho de altos cargos na administração das provincias coloniaes. (Muitos apoiados).

Finalmente, um dos ultimos da lista - e deixei-o para o fim - é o nome de Jayme Arthur da Costa Pinto, ,dresse nosso querido amigo, sobre o qual a opposição regeneradora chora lagrimas de intensa saudade, (Muitos apoiados), não podendo esquecer a camaradagem sempre leal, sempre dedicada deste companheiro de trabalho durante tantos annos. (Muitos apoiados).

Mas por mais que o nosso muito querido companheiro se possa levantar no conceito e nos votos da opposição regeneradora, desse conceito e desses votos mais alto falam por certo as populações dos circulos que representou n'esta Camara, as quaes serviu dedicadamente, empenhando-se sempre pelo bem estar das regiões. (Muitos apoiados).

Em abono de Costa Pinto ha ainda mais os votos de tantos desgraçados cuja orfandade elle amparou. (Apoiados geraes).

Sr. Presidente: falta ainda falar num illustre extincto e ornamento da igreja portuguesa, o Bispo de Portalegre, D. Gaudencio José Pereira.

A opposição regeneradora associa-se ao voto de sentimento pela perda d'este inclito varão. (Apoiados).

Sr. Presidente: a opposição regeneradora desta Camara inclina-se reverente e respeitosa perante a memoria dos fallecidos. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Alvaro Penalva: - Recorda que desde o principio da sessão legislativa tiveram todos a fortuna de ver a maneira correctissima como procedeu na Presidencia o Sr. Dr. Fialho Gomes. E felicitando o Sr. Presidente, pela sua elevação a tão alto cargo, está cônscio de que S. Exa. continuará as tradições do seu illustre antecessor.

Vae tambem associar-se em seu nome e no dos seus amigos politicos á manifestação de sentimento pela perda dos distinctos homens que honraram o Parlamento e trabalharam pela pátria portuguesa.

A Augusto Montenegro, engenheiro distinctissimo, philantropo reconhecido, não teve, o orador, a honra de conhecer pessoalmente. Sabe, porem, por tradicção que era um caracter diamantino.

Em nome, pois, dos seus amigos politicos e no seu associa-se ao.voto proposto pelo Sr. Presidente.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr.. João Pinto dos Santos: - Sr. Presidente: começo por felicitar V. Exa. em nome do partido que tenho a honra de representar n'esta casa.

Não contribuimos com o nosso voto para a elevação de V. Exa. a esse cargo, mas tambem não contribuimos para outro qualquer nome.

Votámos com listas brancas para cumprimento do regimento.

Pelo conhecimento particular que tenho de V. Exa., estou convencido que honrará as palavras que acaba de proferir. V. Exa. não é Presidente do Governo, não é Presidente da maioria é Presidente d'esta Camara.

Se V. Exa. souber, como creio, respeitar a Camara, honrando-se como é de esperar, tenho a convicção que encontrará todo o nosso apoio, seja qual for o ardor com que combatamos o Governo, para o desempenho de tão elevada missão.

Se V. Exa. quiser postergar os direitos que nos assistem pelo regimento, V. Exa. encontrará em nós até a violencia.

Ditas estas palavras, permitta-me a Camara que faça referencia tambem á homenagem prestada aos mortos; mas, como todos os oradores que se inscreveram já fizeram essas referencias, entendo que da minha parte só me devo associar ás palavras que nesse sentido V. Exa. proferiu.

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: pedi a palavra para, em nome da minoria republicana me associar ao voto de sentimento, que deve ficar exarado na acta, pelos illustres Deputados que falleceram no interregno parlamentar.

Considero esta manifestação como sendo meramente um acto de piedade para com os mortos e um acto de respeitosa cortesia para com os vivos, e por isso abstenho-me de fazer quaesquer considerações, quer para exaltar virtudes, quer para encarecer merecimentos.

Desejaria muito não intrometter numa cerimonia funebre as felicitações que é da praxe dirigir a V. Exa., Sr. Presidente.

Mas se não o fizesse poderia isso ser tomado como desprimor, e, se sou incapaz de ser desprimoroso para as pessoas que apenas considero, muito menos o seria para com aquellas que não só considero, mas que estimo.

Não contribui para que V. Exa. occupe esse logar, e se votei, assim como os meus camaradas, foi unica e simplesmente porque achando-me já pouco liberal, em vista do liberalismo que por ahi se apregoa, quis dar um exemplo de ordem, acatando as disposições do regimento.

O Sr. Presidente não está nesse logar por assim o querer a Camara, está ahi porque aprouve ao Sr. Campos Henriques recommendá-lo á escolha do Sr. D. Manuel.

Se a alguem, pois, V. Exa. tem de agradecer essa honra, não é á Camara é ao Rei.

Sinto de ter de o constatar, porque a Camara devia constituir-se livremente, sem que o Rei interviesse de algum modo na sua constituição.

Estou plenamente convencido que V. Exa. ha de bem. desempenhar-se das funcções do seu alto cargo, intelligente e serio como é. Se algumas difficuldades encontrar, não lhe serão levantadas pelos Deputados republicanos, mas pelos seus amigos, pelos seus camaradas da vespera e pelos seus aliados de occasião.

Por mais de uma vez na sessão legislativa finda, os Deputados republicanos apoiaram o Sr. Presidente contra os seus proprios correligionarios.

V. Exa., Sr. Presidente, prometteu seguir o procedimento do Sr. Fialho Gomes, seu illustre predecessor.

Se é esse o seu propósito e conseguir realiza-lIo, verá que a opposição republicana, longe de lhe criar embaraços, tornará fácil a sua missão, visto não estarmos aqui senão para trabalhar.

O Sr. Pinheiro Torres: - Em nome do partido que> represento, associo-me tambem ás affectuosas palavras que a V. Exa. foram dirigidas pelos oradores que me precederam, mas não estranhe V. Exa. que eu, no desempenho, do meu papel, formule, sobretudo n'esta occasião, votos muito ardentes e sinceros para que a eleição de V. Exa. ao alto cargo de que está investido concorra efficazmente para a manutenção do prestigio parlamentar, que mais do que nunca é preciso mostrar ao país o que pode e o que vale, fazendo obras justas e patrióticas, pondo acima de tudo os sagrados interesses do país. (Apoiados).

Procedendo assim, o Parlamento affirmará que a verdadeira grandeza é a grandeza moral.

Em nome do partido que represento associo-me commovidamente ás palavras de homenagem e saudade pelos fallecidos no interregno parlamentar.

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Permittam-me no entanto, que eu, de entre todos, destaque dois, porque muito de perto soube avaliar a sua obra e as suas qualidades: o Arcebispo de Portalegre e Jaime Artur da Costa Pinto.

O primeiro era uma honra do episcopado português, em que se encontram homens de alta envergadura e que honram a pátria, como Frei Bartholomeu dos Martyres e Frei Caetano Brandão.

O Arcebispo de Portalegre era um espirito cultissimo, desempenhando as altas funcções do seu cargo de forma tão correcta que conquistou a estima e o respeito de todos.

Nada mais direi sobre este illustre prelado, porque a sua ultima vontade, que eu quero respeitar, foi de que não lhe fizessem elogios.

Ha pouco, no Parlamento Francês, Léon Bourgeois disse uma cousa que ficou impressa no meu coração: é que ha uma immortalidade que todos nós podemos conquistar - é sermos bons e uteis.

Nada se perde na natureza; e essa parte de nós mesmos que damos á nossa vida é o nosso quinhão de immortalidade sobre a terra.

As qualidades affectivas de Costa Pinto e a sua bondade eram tamanhas, que o impuseram ao país inteiro. (Apoiados).

Sabendo eu quanta dedicação é precisa para a obra da educação de menores, e sabendo eu quanta dedicação Costa Pinto tinha pelo Instituto de que era director, não podiam ser mais sinceras nem mais sentidas as palavras que proferi.

Tenho dito (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Arthur Montenegro: - Sr. Presidente: pedi a palavra para agradecer a V. Exa., ao Governo e aos meus collegas as palavras que proferiram, de justiça para a memoria do meu querido e saudoso pae, o general Montenegro, e de benevolencia para mim - palavras que muito me sensibilizaram.

O Sr. Presidente: - Estando esgotada a inscrição e em vista da manifestação de todos os lados da Camara, considero a proposta approvada. (Apoiados geraes).

Está nos corredores da Camara o Sr. João Augusto Pereira, que deseja prestar juramento.

Convido os Srs. Garcia Guerreiro e Soares Branco a introduzirem S. Exa. na sala.

E introduzido na sala, presta juramento e toma assento.

O Sr. Presidente: - A Camara conhece a pavorosa catastrophe que, ainda ha pouco tempo, enlutou a Italia, essa nação que, pelo seu passado, tanto illustrou a historia, e que, pelo seu presente e pelas aspirações do futuro, tanto honra a humanidade.

O antigo Presidente d'esta Camara, o Sr. Libanio Fialho Gomes, interpretando o sentir de todos nós, telegraphou a El-Rei Victor Manuel e aos Presidentes do Senado e da Camara dos Deputados, apresentando-lhes as nossas condolencias por tão terrivel desastre.

El-Rei Victor Manuel e os Presidentes das duas casas do Parlamento Italiano responderam com os telegrammas que vou ter a honra de ler á Camara:

"Presidente da Camara dos Deputados. - Portugal. - Expresso-vos, Sr. Presidente, o meu sincero reconhecimento pela commovedora sympathia que me exprimiu pelo terrivel desastre, cujas funestas consequencias me compungem e a todo o meu povo. = Victor Manuel".

"Tornando-me interprete do gratissimo sentimento do Senada Italiano, agradeço ao Sr. Presidente da Camara Portuguesa as expressões de sentida condolencia no presente luto da Italia. = O Presidente do Senado, Monfredi".

"Em nome dos meus collegas, dos quaes eu sou seguramente o interprete dos sentimentos, peço-vos para manifestardes á Camara Portuguesa o nosso mais vivo reconhecimento pelas expressões da affectuosa condolencia que por vosso intermedio nos dirigiu neste momento de profunda consternação para a nossa patria. = O Presidente da Camara dos Deputados, Marconi".

Está, pois, cumprido pelo antigo Presidente desta Camara um dever de cortesia internacional. Nem todo o caso, se a Camara entender ou desejar com-memorar ou fazer qualquer proposta no sentido de manifestar a sua condolencia, eu darei a palavra a qualquer Sr. Deputado sobre o assunto;

O Sr. Conde de Paçô-Vieira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para me associar, em meu nome e dos meus amigos deste lado da Camara, ás palavras proferidas por V. Exa. pela grande desgraça que enlutou toda a Italia e fez estremecer de horror todo o mundo civilizado. (Apoiados).

Portugal sentiu como sua essa grande desgraça, e ninguem melhor do que nós pode bem comprehende-la, porque, infelizmente, já soffremos ha pouco mais de um seculo identica desgraça.

E, se para desgraças desta natureza houvesse consolações, a Italia tinha-as recebido completas ao ver esse grande movimento de solidariedade humana em que se reuniram todos os povos para tentar mitigar o seu grande infortunio.

Portugal não faltou nesse movimento, e, se o nosso concurso foi insignificante, pouco, é porque nós somos pobres, mas a nossa dor foi grande. (Apoiados).

Nós demos alguma cousa, e demo-lo com carinho, com amor, porque o povo português é bom e é generoso. (Vozes: - Muito bem).

Oxalá, pois, e são esses os meus votos, que a Itália que é tão grande, tão generosa, saiba receber deste pequenino país que tanto a respeita, que tanto lhe quer, aquillo que elle deu com a alma e com o coração. (Vozes: - Muito bem.

(O orador não reviu).

O Sr. Moreira Junior: - Pedi a palavra para, em nome do partido progressista, me associar não só ás palavras de dolorosa confraternização contidas no telegramma do nosso illustre ex-Presidente, Libanio Fialho Gomes, mas para me associar tambem ás palavras de sentimento proferidas por V. Exa. É que umas e outras traduziam não só o sentimento da Camara mas o de todo o pais, (Apoiados) é que a desgraça enorme que assolou e affligiu a Italia se repercutiu em todo o mundo e ao mesmo tempo provocou o alto movimento de solidariedade que é uma honra para a humanidade. (Apoiados).

N'esse movimento de intima solidariedade, de profunda e piedosa confraternização, encontrou-se Portugal, que mais uma vez pôs em evidencia, por variadissimas formas, o que ha de bom, de grande, de piedoso e generoso tambem no seu coração. (Apoiados).

As palavras, do nosso illustre ex-Presidehte, as palavras de V. Ex.a, traduzem o nosso sentimento intimo, o sentimento de todo o pais, e porque assim é, a ellas me associo, as applaudo e proponho que, independentemente do que está feito, na nossa acta se consigne um voto de profundissimo sentimento pela desgraça que victimou a nação amiga e em seguida se encerre a sessão. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Pereira dos Santos: - Sr. Presidente: em nome da opposição regeneradora associo-me, tambem ás palavras proferidas por V. Exa. As minhas palavras não

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SESSÃO DE 3 DE MARÇO DE 1909 9

serão mais do que um eco da magua e da dor que se espalhou por toda a humanidade, pelo enorme cataclismo de que foram victimas essas duas cidades italianas, cataclismo que, em bem poucos minutos, as converteu num vastissimo cemiterio, lançando um manto de morte e de dor n'aquella região.

Sr. Presidente: mal se pode comprehender a angustia e os horrores que houve nesse momento terrivel, em que foram sepultados no leito da morte milhares e milhares de cidadãos, sem esperança de poderem, ao menos, dirigir um eterno adeus aos entes que mais queriam. Mal se pode comprehender a angustia enorme das que, sobrevivendo á catastrophe, se viram orfãos ou privados dos entes que mais estremeciam e outros que eram ricos se viram reduzidos á miseria.

Compraz-me e consola-me o movimento de solidariedade que se desenvolveu na nação portuguesa ao ter-se conhecimento da tragedia que assolou o sul de Italia.

A nação portuguesa deu n'essa occasião mais um testemunho da sua proverbial generosidade associando-se á cruzada que se estendeu por todo o mundo, criando donativos para mitigar a sorte dos sobreviventes.

Acima d'esse sentimento e como complemento d'elle, entendo que é necessario tambem o voto d'esta Camara, porque Portugal é uma nação amiga. (Apoiados).

Mas se isso não bastasse para justificar esse voto, havia mais para o justificar a justa consideração que nos devo merecer esse nobre povo italiano que foi berço da nossa civilização.

E, portanto, com verdadeiro calor e enthusiasmo que me associo á proposta que acaba de ser apresentada pelo Sr. Moreira Junior. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro da Marinha (Antonio Cabral): - Sr. Presidente: pedi a palavra para, em nome do Governo, me assobiar ao voto de sentimento que acaba de propor, o meu illustre collega e amigo Sr. Moreira Junior e ás palavras que V. Exa. proferiu, com relação á catastrophe de que foram victimas as cidades de Messina e de Regio.

Sr. Presidente: bastariam as relações de cordial amizade que existem entre Portugal e a Italia e tambem as estreitas relações de parentesco que unem as Familias Reaes dos dois paises, para eu não poder deixar de me associar, em nome do Governo, ás palavras de V. Exa.

Estão ainda na memoria de todos os horrores que confrangeram os corações de todo o mundo quando a imprensa italiana communicou a terrivel catastrophe que assolou aquella bella região de Messina.

E eu que a conheço quereria, para d'ella dar a V. Exa. e á Camara uma pallida e apagada ideia;, ter nas minhas palavras o brilho e os fulgores que não possuo.

A cidade de Messina chamada "A nobre" é uma das mais bellas cidades do mundo; esplanando-se em amphitheatro, cercada de figueiras, aninhada no meio de verdura, tendo em frente o Mar Tyrrheno, em que ella se espelha, dir-se hia que a natureza foi para ella de invejavel prodigalidade.

Em frente, encontra-se Reggio, não menos bella nem possuindo menos qualidades para cativar. Pois, Sr. Presidente, foi n'esta região que se deu a catastrophe, que sepultou nos escombros das suas ruinas milhares e milhares de pessoas.

Logo que o Governo teve conhecimento da assombrosa catastrophe, mandou que um navio de guerra português, o Vasco da Gama, levasse o auxilio devido para os sobreviventes.

Cumpriu, então, o Governo um dever e agora cumpre tambem outro, associando-se ao voto de sentimento proposto pelo Sr. Moreira Junior e ás palavras de dor que V. Exa. proferiu ha pouco.

Sr. Presidente: não quero cansar mais a attenção da Camara e, por isso vou terminar, convencido de que não ha ninguem que rejeite o seu voto ao voto de sentimento proposto por V. Exa. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta mandada para a mesa pelo Sr. Moreira Junior.

Proposta

Proponho que, alem de quanto é feito, se consigne na acta o sentimento da Camara e que a sessão seja levantada em homenagem á Italia. = Moreira Junior.

Lida na mesa é admittida á discussão.

O Sr. João Pinto dos Santos: - Deante de acontecimentos como aquelle de que a Camara se vem occupando, o seu espirito pensa que, quando os elementos se desencadeiam, os homens, que vivem quasi sempre desunidos e em luta aberta uns com os outros, se unem para mostrar solidariedade. Foi essa a impressão que, a par da tristeza que lhe deixaramos acontecimentos de Reggio e de Messina, lhe deixou a consolação de ver que em momentos tão trágicos uma cousa havia que se manifestava, a solidariedade humana, e, deve dizer 1.º para honra de Portugal, que nós nos associámos largamente a esse movimento de solidariedade quando lutavamos com a miseria no Douro e em quasi todas as provincias do país.

Associa-se, portanto, em seu nome e no dos seus amigos politicos, ao voto de sentimento que a Camara seguramente vae votar.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Almeida Garrett: - Sr. Presidente: eu começarei por felicitar V. Exa. pela sua elevação a esse logar e á Camara por ter escolhido V. Exa. para elle.
Sr. Presidente: não podia esta Camara começar de uma maneira mais nobre nem mais digna as suas sessões do que mostrando o seu profundo sentimento pela catástrofe que enlutou a Italia inteira, a Italia mãe desta alma portuguesa que mal intencionados, cobarde e criminosamente, teem querido denegrir, mas que ha de ser sempre nobre e sempre altiva, sempre caritativa e sempre boa.

Falar da Italia é falar de liberdade e é falar de amor. É lembrar todo esse bello territorio, vinhedo em cachos e roseiraes em flor por cujas veredas passaram em noites luarentas casaes de namorados, corações onde a vida palpitou em rithmos de esperança, alvoradas de amor e sonhos de venturas, e sobre cujos labios agora lividos já os raios d'aquelle sol bemdito não podem depor nenhum beijo ardente.

Falar da Italia é falar de amor. E falar de amor é lembrar essa figura heróica da minha amparando nos seus braços os desgraçados, soltando da sua boca palavras de alivio e consolação, acarinhando ao seu peito forte e bom os filhinhos d'aquelles que sob os escombros dormiram o derradeiro somno.

Falar da Italia é falar de liberdade; é lembrarmos Victor Manuel, Garibaldi e tantos outros que á sua Patria deram o seu sangue, para a tornar grande, para á fazer feliz.

E foram muitos, Sr. Presidente, foi a nação inteira.

Porque, quando um povo, tendo perdido a noção dos seus deveres, a consciencia da sua força começa a declinar, só o esforço de todos o pode salvar d'essa derrocada, o pode tirar do abysmo por suas proprias mãos aos pés aberto.

E foi o esforço de todos que fez a Italia uma prospera e rica, que é hoje grande exemplo a seguir.

E falar da Itália é ainda lembrar alguem que para esta terra veio (Apoiados), que a ella deu toda a sua vida,

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a, ella dá todos os affectos do seu coração (Muitos apoia-dos), Alguém tão grande na sua dor, tão digna no seu soffrimento. (Apoiados geraes).

E por tudo isso que nós nos associamos de todo o coração ao voto de sentimento que V. Exa. propôs pela catastrofe de Italia. (Apoiados geraes). (Vozes: - Muito bem).

O Sr. Alexandre Braga: - Declara que o partido republicano, por intermédio dos seus representantes em Côrtes, se associa commovidamente ao voto de sentimento que a Camara vae lavrar, pela catastrophe que enlutou a grande pátria italiana e sacudiu a sentimentalidade do mundo num fundo e angustiado abalo de dulorosa magua, de pungente surpresa e de contagiosa solidariedade humana.

A tragica e apavorante desgraça, fosse qual fosse o logar incerto da terra em que ella se produzisse, bastaria a confranger de dilacerante piedade todas as fibras das almas bem formadas, e, para as victimas da cullossal desventura, e para a nação, amargurada e afflicta por tão suprema e inarravel dor, iria toda a expressão do nosso affecto, da nossa sympathia, da nossa maguada tristeza; mas a pátria, ferida pelo allucinante pesadelo de horrores, foi a da gloriosa terra da Italia, nossa irmã pela raça, pela estreita affinidade de lingua e ainda pela commum aspiração que nos eleva a um mesmo ideal de liberdade e de resgate.

Dizer Italia é evocar toda a maravilhosa civilização de uma raça eleita, que, através das incontaveis eras, viveu e soffreu na insaciada aspiração da arte, no encanto e na fascinação de um ideal de belleza suprema e na busca a vida, tenaz, palpitante, insoffrida, de uma mais larga e mais tolerante, de uma mais generosa e nobre liberdade. Na doce e energica sonancia deste nome de Italia revive a fulgida ala dos predestinados de genio, herdeiros da Hellenia, que animou os marmores de Paros, immortalizando-os, em Phidias e Praxiteles, vivificando-os nas linhas harmoniosas e sobrias do Partenon, na curva maternal do collo genésico de Venus; da Hellenia, que fundiu a magia das tintas na lendaria e inédita maravilha de colorido que illuminou as telas de Zeuxis,Parrasio e Apelles; da Hellenia, que galvanizou para a vida ephetuera do tablado, contorcionadas na expressão das supremas angustias e das implacaveis satyras, as criações gigantescas de Sophocles, de Eschylo, de Euripedes e de Aristofanes; da Hellenia soberba, que encarnou a eterna aspiração de liberdade e de justiça na palavra fulminante e vingadora de Demosthenes e de Eschines.

Foi a patria de Savanarolae de Giordano Bruno, arrastados á fogueira pela intolerancia fanatica do Papado, foi a patria de Dante, de Petrarcha e de Boccacio, e para os republicanos, para os que anceiam por uma transformação salvadora da pobre pátria portuguesa, envilecida e espoliada, foi a patria da revolta de Milão, a pátria heróica que respondeu ás violencias sanguinarias de Humberto, ás felicitações que elle mandou ás tropas assassinas e ao galardão que, de modo proprio, offereceu ao general Bava Beccaris, pondo-lhe ao peito uma gran-cruz, fazendo entrar no Parlamento cerca de cem Deputados da extrema esquerda, e forçando a monarchia ferina, que fizera a primavera de sangue, a entrar, domada e submissa, num caminho de transigencias, de concessões e de liberdades. Para os republicanos, foi a pátria de Garibaldi, a terra mãe de Mazzini, cuja intrepida audácia de revolucionario oppôs ao mysticismo conservador de Gioberti, sonhando a illusoria alliança da igreja e da liberdade, na visionada tutela dos Estados italianos pelo Papado, a formula salvadora de Dio e Populo, que traria pela republica, depois da Roma dos Cesares e dos Papas, a Roma liberta do povo.

A sua soberba e corajosa audácia foi vencida, é certo, pela formula de timido opportunismo que encarnou a ideia da unificação na figura, sempre minuscula de um homem, embora esse homem fosse, por acaso, um rei.

Se elle vencido não fora, não teria a nobre Itália de contemporizar com o Papado, não teria a terra orgulhosa de liberdade de humilhar-se perante o sólio romano, vendo repellir pelo pontifice, altivo e desdenhoso, a carta submissa de Victor Manuel ao entrar na cidade sagrada. Triunfou passageiramente, por certo, porque os séculos são instantes na vida da humanidade, um lastimoso equivoco da historia, mas sejam quaes forem os destinos da Itália, não ha duvida de que a sua unificação e a sua grandeza actual ella as deve originariamente, indiscutivelmente, ao patriotismo, á coragem, á abnegação e ao sacrificio dos republicanos, que a despertaram para a liberdade e para a luta.

É esta a saudação que os republicanos enviam á Italia como sendo a expressão do seu profundo sentimento pela desgraça que a feriu.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Pinheiro Torres: - Depois do discurso, eloquentissimo na forma e no estylo, do orador que o precedeu, elle, orador, nada devia dizer: no entanto tem que cumprir um dever, é o de se associar, em nome do partido que n'esta Camara representa, ao voto de sentimento proposto pela catrastrophe que feriu a Itália, grande nação, berço da civilização, que ao mesmo tempo que nos educa, encanta e deslumbra pela producção do seu génio e da sua alma abrasadora, na arte, na pintura e na musica, nos mostra a sua anciã de conquista pelo alem.

Essa catastrophe horrenda, que tantas victimas produziu, despertou em toda a humanidade um movimento intensivo de solidariedade, e Portugal foi dos paises que mais fez, porque ainda não póde esquecer a medonha catastrophe de 1755 que devastou Lisboa.

E se não podemos esquecer, ao falar de Messina, da horrivel catastrophe que tambem nos victimou, não podemos tambem esquecer que os Reis de Itália, que tão bem souberam cumprir o seu dever, porque um rei nunca é tão grande como quando desce até junto do seu povo, nem o arcebispo de Messina, que, descalço, envolto no seu manto e de báculo na mão, ia por entre os escombros lançar a benção aos moribundos.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição. Creio que a Camara, em vista da manifestação, quererá que a proposta seja approvada por acclamação. (Apoiados geraes).

A primeira sessão é no sabbado, á hora regimental, e a ordem do dia é a eleição da lista quintupla para a escolha dos supplentes á presidencia e a eleição de commissões.

Está levantada a sessão.

Eram 5 horas e 10 minutos da tarde.

O REDACTOR = Luiz de Moraes Carvalho.

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