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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nheiro de armas de Sá da Bandeira n'uma das lutas da liberdade em Portugal.

Chegámos a uma epocha triste, á hora crepuscular do seculo. A geração dos grandes feitos vae-se desfolhando no tumulo como as arvores no outono! (Vozes: — Muito bem.)

Bem poucos restam já dos heroes de 1834, dos ministros do Imperador, d'esses Titães que emprehenderam a obra da nossa regeneração social; o ultimo baqueou prostrado pela morte. E o nosso respeito e a nossa veneração procuram debalde em torno de nós um d'esses vultos que ousaram, sem hesitar um só instante, demolir a velha sociedade, alastrar o chão de ruinas, para erguerem de entre os destroços o edificio da liberdade tão solidamente arreigado, que nem os erros e desvarios de seus filhos conseguem já abalar-lhe os alicerces. (Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente, n'esse grande drama da nossa vida nacional o marquez de Sá da Bandeira desempenhou um duplo papel, como estadista nos conselhos da corôa, como soldado no tablado ardente dos campos da batalha.

Estadista, foi o representante constante e inabalavel da democracia liberal. (Apoiados.) Soldado, foi o protagonista d'essas pelejas legendarias, em que se combatia um contra vinte, como em Aljubarrota e em Dio. Sá da Bandeira defendeu a liberdade com os brios cavalheirescos de um cavalleiro da idade media; como elles, como que perfumou a sua alma para a transformar no tabernáculo d'essa deusa immortal das sociedades contemporâneas. Como as leis da cavallaria exigiam dos seus adeptos, não só o valor e a abnegação, mas a pureza da consciencia, a lealdade sem quebra, e a virtude sem mancha, Sá da Bandeira, que foi, por assim dizermos, não um soldado da liberdade, mas o seu paladino infatigavel; Sá da Bandeira, que era um d'esses varões de Plutarco, que apparecem de seculos a seculos na historia, que se chamam Nuno Alvares Pereira na nossa idade media, Bayard em França, D. João de Castro na nossa epopéa indiana; Sá da Bandeira, o cavalleiro sans peur et sans reproche, valente como a sua espada, era tambem como a sua espada um espelho de lealdade, de pundonor e de brio. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Felizes os que morrem! Estas tradições austeras, este culto supersticioso da honra, esta rigidez inquebrantável de caracter, vão-se apagando, como tudo o que é elevado e grande no espirito das gerações contemporâneas. Como succedeu na historia aos vultos grandiosos dos conquistadores da India, as physionomias effeminadas dos vencidos de Alcacer-Kibir; aos caracteres austeros dos Castros e Albuquerque s, as consciencias accessiveis ás cédulas de Christovão de Moura; assim á geração potente que nos deu a liberdade succede uma geração egoísta e epicuriana, que mal sabe conserva-la. Aos homens de ferro succedem os homens de oiro; aos corações, accesos no puro fogo do enthusiasmo, as almas onde vacilla, ao sopro de um «cepticismo frívolo e de uma assustadora indifferença, a chamma da liberdade.

Que ao menos os nomes d'estes grandes homens, que vão desapparecendo da face da terra, desperte a emulação nos nossos animos! Que o nome de Sá da Bandeira, evocado no meio da luta das nossas paixões, desperte na nossa alma os dois echos, em que se resumem os seus dois grandes affectos: a patria e a liberdade. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

O marquez de Sá da Bandeira foi um dos vultos mais notaveis d'essa grande epopéa do nosso seculo, a epopéa liberal, tão grandiosa como os Lusíadas, mas ainda mais santa do que elles.

Os cantos das epopéas têem muitas vezes por echo os gemidos dos povos. O carro triumphal esmaga as nações levando manietada a liberdade como os vencidos captivos nos triumphos romanos. As estatuas das columnas Vando-me fundem-se com o bronze dos canhões e as algemas dos escravos.

Perante os vultos dos Cesares, se a historia ajoelha primeiro deslumbrada e attonita, a consciencia dos povos não tarda a erguer-se para traduzir em maldições ao tyranno os hymnos do conquistador.

Esta nossa epopéa liberal não foi só um poema, foi mais, foi um evangelho; não deu a Portugal a gloria, deu-lhe mais, deu-lhe liberdade. A gloria é o relâmpago da procella, que sulca as trevas da noite para as fazer voltar depois mais densas; a liberdade é a luz radiante da aurora, que desperta e reanima a natureza inteira. (Vozes: — Muito bem.)

Curvemo-nos, pois, diante d'estes heroes da epopéa liberal que nos trouxeram no gladio, como os apostolos na cruz, a liberdade e a redempção.

Se tomei a palavra, sr. presidente, foi tambem para acrescentar um additamento á proposta mandada para a mesa pelos srs. Osorio de Vasconcellos e Teixeira de Vasconcellos.

Acabamos de saber que a camara dos dignos pares resolveu prestar a homenagem mais completa á memoria do nobre marquez de Sá da Bandeira, e suspendeu as suas sessões até terça feira, Parece-me justo que a imitemos.

Mando para a mesa o meu additamento (leu).

(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho, como additamento á proposta antecedente, que a camara dos deputados, a exemplo do que se fez na camara dos pares, suspenda as suas sessões até terça feira. Manuel Pinheiro Chagas.

Foi admittida.

O sr. Presidente: — Parece-me que interpreto fielmente os sentimentos da camara declarando que as sessões são interrompidas até terça feira. (Apoiados.)

Igualmente me parece que a camara está conforme em que na acta se faça menção da profunda magua que nos causou a noticia do fallecimento do nobre marquez de Sá da Bandeira. (Apoiados.)

Ha de mencionar-se na acta que as duas propostas foram approvadas por unanimidade. (Apoiados.)

A camara quererá de certo que a mesa nomeie uma deputação numerosa, que assista ao funeral de tão distincto varão. (Muitos apoiados.)

A deputação fica composta dos srs.:

Francisco Costa.

Mouta e Vasconcellos.

Thomás Bastos.

Luiz de Lencastre.

Pedro Franco.

Braamcamp.

José Luciano.

Osorio de Vasconcellos.

Teixeira de Vasconcellos.

Pinheiro Chagas.

Figueiredo de Faria.

Quintino de Macedo.

João Maria de Magalhães.

Francisco de Albuquerque.

Manuel Pacheco.

Palma.

Antonio José de Avila Junior. Pereira Rodrigues. Julio de Vilhena. A esta deputação consideram-se aggregados todos os membros da camara que poderem assistir ao acto funebre Parece-me ainda que a camara quererá que se manifeste á familia do finado, seu sentimento por tão infausto acontecimento. (Muitos apoiados.)

A proposta dos srs. Teixeira de Vasconcellos e Osorio de Vasconcellos, e bem assim o additamento do sr. Pinheiro Chagas foram aprovados unanimemente.