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SESSÃO N.º 4 DE 9 DE JANEIRO DE 1896 17

Carlos Lobo d'Avila tinha, como muito poucos, a habilidade superior do imprimir a uma questão que incidentalmente se levantasse nu parlamento a forma por que mais convinha encaral-a, discutil-a o encaminhai-a no sentido dos interesses da facção que defendia. Mas a arte suprema de Carlos Lobo d'Avila foi principalmente revelada pelo modo como elle só apresentou senhor da oratoria discreta, serena e habil, que necessita usar quem falla dos bancos do governo.
Não era só sabor a conveniencia ou inconveniencia de trazer ou não trazer tal ou tal assumpto para a tela da discussão; era a sciencia incomparavel da forma por que elle dizia só o que queria o com o numero indispensavel de palavras que para o que queria eram necessarias.

Por isso succedeu que Carlos Lobo d'Avila na breve, mas nem por isso menos intensa campanha parlamentar de 1894, subiu acima de todos os oradores. Sendo contra elle que a opposição d'essa epocha preparara mais de um combato, a breve trecho essa opposição reconhecia em Carlos Lobo d'Avila um luctador com quem nSo era possivel traçar as armas sem se sair mal ferido da lucta.

Carlos Lobo d'Avila não era só orador de governo nas bancadas ministeriaes na camara dos deputados ou na camara dos pares; era ainda orador de governo quando, como nos jantares que se deram em Lisboa para comemorar o restabelecimento das nossas relações com o Brazil, tinha necessidade de fallar sobre essa questão ainda tão ardente, sobre essa questão que a uns trazia apaixonados pelas glorias de Portugal e a outros inquietos pelos interesses do Brazil. (Apoiados.)

Póde-se ser mais eloquente do que elle foi como tribuno ou como academico, mas como orador de governo, Carlos Lobo d'Avila era o primeiro do seu paiz.

Como escriptor, publicou aos dezeseis annos um livro, que não só valo em relação aoo annos e conhecimentos de quem tão moço escrevia, mas vale tambem era absoluto, comparado com outros, de assumptos do viagens, que foi o assumpto que elle encolheu. É para mim de só que, se tivesse proferido a carreira litteraria e se a ella tivesse dedicado as faculdades que Deus lhe dera, e, sobretudo, a observação assombrosa de psychologia com que elle devassava a alma e os intentos dos homens atraves a maior resistência que elles empregassem para esconderem o pensamento, - teria enriquecido a litteratura pátria com livros primorosos.

Elle que deixou memoria no governo com uma vida tão curta, teria tambem deixado de si uma memoria perduravel se só á litteratura se consagrasse. Quem sabe separa elle teria assim sido menos lardeada do desgostos a curtissima existencia?!. Quem sabe se teria poupado a muitas maguas os curtos annos que viveu, escrevendo tres ou quatro livros, como elle era capaz de os fazer e fugindo da politica, que só lhe deu essa rapida passagem de dois annos pelas cadeiras do poder! (Apoiados.)

Carlos Lobo d'Avila, como ministro, quer dizer, sob o ponto do vista das qualidades que se exigem a um homem de governo, realisou um verdadeiro prodigio em Portugal. Isto não é desmerecer a sua memoria, não é injurial-o - mas quando elle entrou nos conselhos da coroa, não logrou alcançar um movimento de sympathia.

Pois decorridos incompletamente dois annos, gerindo os negocios de duas pastas -uma difficil sempre e outra muito delicada na occasião, - conquistava por completo a confiança do paiz. Teve a gloria suprema em sua vida de ser, não um ministro popular, - o que para um homem de governo, na opinião de Bismarck, é absolutamente indifferente. Bismarck dizia, na occasião em que só realisava a unidade allemã e em que elle na camara ora accusado de impopular: "que sim, que tinha a honra de sor o homem mais impopular do seu paiz". Eu não digo que tal cousa seja para invejar. O que é verdade, porém, o que eu quero accentuar, é que quando um negocio delicado e melindroso estava confiado a Carlos Lobo d'Avila, todos dormiam tranquillos.

Todos! Até os que o tinham aggredido rancorosamente, todos confiavam em que o que fosse preciso fazer-se seria feito. Isso viu-se bem quando elle desappareceu. Todos se lembram, todos terão notado como a magna geral se não fundava tão sómente no desapparacimento de uma individualidade notavel; o que se exprimia, o que se sentia era o desapparecimento de alguem que fazia falta á guarda dos nossos interesses, que em sua mão se sentiam bem parados.

Foi essa a rasão de ser da dor verdadeira e da magua sincera, não só entre os politicos da differentes matizes, mas de todo o paiz, de todas as classes sociaes, d'aquelles todos que têem a comprehensão das dificuldades que a nação atravessa e do futuro que podo ainda esperar. (Apoiados.)

Tal foi o motivo, a rasão da dor e da tortura que em todos lançou a morto de Carlos Lobo d'Avila. (Apoiados.)

Por isso digo que como homem de governo elle realisou o prodigio de, em menos de dois annos, ter sabido inspirar confiança ao paiz inteiro, - elle, que no momento de entrar para o governo não inspirava ao mesmo paiz nem confiança, nem sympathia.

Como homem politico, que melhor demonstração se póde fazer d'essa outra qualidade, indispensavel ao homem de estado moderno, assim patenteada pela transformação que Carlos Lobo d'Avila soube effectuar? Não é admiravel o tacto, a delicadeza de trabalho, com que elle assim soube nanejar as cousas, de forma que em logar de ter de romper violentamente com individuos e com interesses, a cada um fez occupar o seu logar, não só como um grande principio de utilidade publica, mas tambem de humanidade nos processos? Esta simples nota, como que define a sua habilidade superior. N'estes modernos tempos, e não sei se em toda a historia constitucional, não houve ninguem mais chorado do que elle; pois nos modernos tempos, e não sei se na historia constitucional portugueza, nunca homem algum foi recebido na ponta das lanças, mais cruel e mais aleivosamente, do que Carlos Lobo d'Avila. (Apoiados.)

Tudo isto é a prova de que Carlos Lobo d'Avila sabia dirigir os homens com um fio de seda - que é como os homens gostara de ser dirigidos. Nenhum homem teve mais a noção d'isso do que Carlos Lobo d'Avila, e nenhum o excedeu tambem em firmeza.
É esta uma outra affirmação que quero fazer perante a camara, para que tenha bem a comprehensão do valor politico do homem que perdeu. Era de uma energia excepcional; ainda não vi quem o excedesse em energia governativa, - energia que não é a violencia, energia que é a presumpção absurda de quem a todo o transe impõe a sua vontade. A energia governativa é uma cousa completamente differente.
É, - dada a previsão sobre acontecimentos de cuja utilidade estamos convencidos, - não nos deixar desnortear pelas primeiras difficuldades que se levantam, não ceder aos primeiros ruidos que se fazem, ouvir, distinguindo o que é ficticio do que é verdadeiro, não nos deixando por isso decidir e vencer pelo tumulto do que vão cá fora.

Carlos Valbom gostava de repetir a phrase de Constans, de que os povos estimam sentir no governe une main douce et ferme. Pois nunca em Portugal, sr. presidente, houve quem dirigisse os homens mais docemente e os governasse com mais firmeza.

Note v. exa., sr. presidente, que se em Portugal é facil ser energico no logar que eu occupo, é muito mais difficil ser energico na pasta dos estrangeiros. E escuso de dizer porque motivos. Pois a sua energia reconhecia-se tanto nos negocios da sua pasta, como em qualquer outro assumpto de governo. Creio ter demonstrado por uma forma comprehensivel,