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SESSÃO DE 15 DE ABRIL DE 1887

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos srs.

Francisco José de Medeiros
José Maria de Alpoim Cerqueira Borjes Cabral

SUMMARIO

A camara dos deputados da republica franceza, agradecendo a remessa de documentos parlamentares que se lhe fez, retribue com a offerta de documentos do parlamento d'aquelle paiz, e este offerecimento é recebido com especial agrado. - Lêem-se na mesa as dezeseis propostas de lei de fazenda, apresentadas na sessão anterior. - Apresentação de pareceres e requerimentos. - É proclamado deputado o sr. João Cardoso Valente. - Prestam juramento os srs. José Frederico Laranjo, Joaquim Alves Matheus, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, José Alves de Moura e Albano de Mello. - O sr. Arroyo apresenta um requerimento, assignado por dezeseis srs. deputados, para que o processo eleitoral, relativo ao circulo n.º 27 (Felgueiras) seja remettido ao tribunal especial creado pela lei de 21 de maio de 1884. - O sr. Azevedo Castello Branco interroga o sr. ministro dos negocias estrangeiros ácerca das noticias que corriam do estado de saude de Sua Magestade o Imperador do Brazil. - Responde-lhe o sr. ministro dos negocios estrangeiros, e lança se na acta a declaração de que a camara recebera com satisfação a noticia de não ser de gravidade o estado de saude do Imperador. - Justificaram as suas faltas os srs. Alves Matos, Teixeira de Vasconcellos e Henrique Mendia. - A sessão foi consagrada a commemorar as qualidades, e os serviços do insigne estadista Fontes Pereira de Mello, usando da palavra em seu elogio os srs. presidente do conselho, José Luciano de Castro: Pinheiro Chagas e Antonio Candido. - Em seguida encerra-se a sessão pela approvação da seguinte proposta: «Proponho que se dê por terminada a sessão de hoje, em testemunho de sentimento pela morte do eminente estadista Fontes Pereira Mello e que se communiquem estes votos da camara á familia do illustre finado. - Sala das sessões, 15 de abril de 1887. = Antonio Candido.»

Abertura - Ás tres horas da tarde.

Presentes á chamada - 92 srs. deputados.

Presentes á abertara da sessão: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Pereira, Anselmo de Assis Andrade, Antonio Alves Pereira da Fonseca, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Baptista de Sousa, Antonio de Campos Valdez, Antonio Candido Ribeiro da Costa, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Eduardo Villaça, Antonio José Pereira Borges, Antonio Lucio Tavares Crespo, Antonio Luiz Gomes Branco de Moraes Sarmento, Antonio Maria de Carvalho, Antonio Maria Jalles, Antonio Simões dos Reis, Arthur Hintze Ribeiro, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto Faustino dos Santos Crespo, Augusto Fuschini, Carlos Lobo d'Avila, Eduardo José Coelho, Ernesto Madeira Pinto, Fernando de Sousa Coutinho (D.), Firmmo João Lopes, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco de Castro Gomes Monteiro, Francisco José Fernandes Vaz, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Frederico de Gusmão Correia Arouca, Guilhermino Augusto de Barros, Henrique de Sá Nogueira de Vasconcellos, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João Antonio Pires Villar, Joào Augusto Pina, João Cardoso Valente, João Eduardo Searnichia, João Ferreira Franco Pinto de Castello Branco, João Joaquim Izidro dos Reis, João José Dias Gallas, João Lobo Santiago Gouveia, João Marcellino Arroyo, João Menezes Parreira, João Monteiro Vieira de Castro, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João de Sousa Machado, Joaquim de Almeida Correia Leal, Joaquim Alves Matheus, Joaquim Antonio da Silva Cordeiro, Joaquim José Maria de Oliveira Valle, Joaquim Teixeira Sampaio, José Alves de Moura, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Augusto Barbosa Collen, José de Azevedo Castello Branco, José Barbosa de Magalhães, José Elias Garcia, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Frederico Laranjo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim de Vasconcellos Gusmão, José Luciano de Castro Pereira Corte Real, José Luiz Ferreira Freire, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Andrade, José Maria do Oliveira Matos, José Maria Rodrigues de Carvalho, José Simões Dias, José de Sousa dos Santos Moreira, Julio Cesar de Faria Graça, Julio José Pires, Lopo Vaz de Sampaio e Mello, Luiz Augusto da Cunha Mancellos Ferraz, Luiz Emilio Vieira Lisboa, Luiz José Dias, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel d'Assumpção, Manuel José Correia, Manuel José Vieira, Manuel Pinheiro Chagas, Matheus Teixeira de Azevedo, Pedro Antonio Monteiro, Pedro Victor da Costa Sequeira, Vicente Rodrigues Monteiro, Victoriano Estrella Braga, Visconde de Monsaraz e Zophimo Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Antonio Francisco Ribeiro Ferreira, Antonio Lopes de Guimarães Pedrosa, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Maria Pereira Carrilho, Augusto Victor dos Santos, Bernardo Homem Machado, Eduardo de Abreu, Frederico Ressano Garcia, João José d'Antas Souto Rodrigues, Joaquim Heliodoro da Veiga, Julio Carlos de Abreu e Sousa, Marçal de Azevedo Pacheco, Marianno José da Silva Prezado e Tito Augusto de Carvalho.

Não compareceram á sessão os srs.: - Alfredo Cesar de Oliveira, Antonio Centeno, Antonio Joaquim da Fonseca, Antonio José Ennes, Antonio José Gomes Neto, Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello Ganhado, Conde de Castello de Paiva, Conde de Fonte Bella, Conde de Villa Real, Elvino José de Sousa e Brito, Elyseu Xavier de Sousa e Serpa, Emygdio Julio Navarro, Ernesto Júlio Góes Pinto, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Feliciano João Teixeira, Fernando Matoso dos Santos, Fidelio Freitas Branco, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Castro Matoso da Silva Côrte Real, Francisco de Lucena Mello e Faro (D.), Francisco Pinto Coelho Soares de Moura, Francisco Severino de Avellar, Gabriel José Ramires, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique de Barros Gomes, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jeronymo Pereira da Silva Baima de Bastos, Joaquim Maria Leite, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Joaquim Simões Ferreira, Jorge O'Neill, José Augusto Ferreira Galvão, José Barroso Pereira e Matos, José Bento Ferreira de Almeida, José Dias Ferreira, José Domingos Ruivo Godinho, José Guilherme Pacheco, José de Lemos e Napoles, José Maria dos Santos, José de Saldanha Oliveira e Sousa (D.), José Soares Pinto de Mascarenhas, José Ventura dos Santos Reis, Luiz Fisher Berquó de Poças Falcão, Manuel Affonso Espregueira, Manuel Maria de Brito Fernandes, Marianno Cyrillo de Carvalho, Miguel Antonio da Silveira, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro Augusto Correia da Silva, Pedro Guilherme dos Santos Diniz, Thomás Frederico Pereira Bastos, Visconde da Torre e Visconde de Silves.

Acta - Approvada.

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66 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

EXPEDIENTE

Officios

1.º Do ministerio da guerra, acompanhando 180 exemplares das contas d'este ministerio, relativas á gerencia de 1885-1886 e ao exercicio de 1884-1885.
Mandaram-se distribuir.

2.º Do ministerio dos negocios estrangeiros, acompanhando 200 exemplares das contas de gerencia d'este ministerio relativas ao anno economico de 1880-1886 e ao exercicio de 1885-1886.
Mandaram-se distribuir.

3.º Do ministerio das obras publicas, remettendo 170 exemplares do Annuario estatistico de Portugal, relativo ao anno de 1884.
Mandaram-se distribuir.

4.º Do mesmo ministerio, remettendo 150 exemplares da conta de gerencia d'este ministerio relativa ao anno económico de 1884-1885 e exercicio de 1883-1884.
Mandaram-se distribuir.

5.º Da alfandega do consumo, remettendo 150 exemplares da estatistica d'esta alfandega, referida ao anno de 1886.
Mandaram-se distribuir.

6.º Da mesma alfândega, remettendo 25 exemplares do relatorio ácerca dos serviços d'esta casa fiscal.
Para a secretaria.

7.º Da commissão central anti-phylloxerica do sul do reino, remettendo 138 exemplares do relatorio d'esta commissão, respectivo ao anno de 1885.
Mandaram-se distribuir.

8.º Da sociedade de geographia de Lisboa, remettendo o boletim n.º 2 da 6.ª serie mandado publicar por esta sociedade.
A secretaria.

9.º Do ministerio de instruccão publica de França, acompanhando um officio da presidencia da camara dos senhores deputados e uma caixa contendo documentos parlamentares offerecidos por aquella camara.
A secretaria.

10.° Da commissão do recenseamento de Villa Nova de Gaia, remettendo copia authentica da acta do apuramento, a que se procedeu no dia 13 de março ultimo, da eleição que se verificou n'este concelho, de um deputado ás côrtes.
A commissão de verificação de poderes.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.º Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja enviada com a maior urgencia a esta camara:

I. Uma nota circumstanciada da applicação especial do ultimo emprestimo de 10.800:000$000 réis, auctorisado pelas leis de 19 de maio e 23 de junho de 1880, 20 e 29 de março e 26 de junho de 1883 e 11 de março e 19 de maio de 1884;
II. Nota dos empregados addidos ao ministerio da fazenda á data do decreto com força de lei de 4 de agosto de 1886 e dos existentes á data de hoje;
III. Processo de aposentação do official da repartição de fazenda de Villa Real, José Augusto Ribeiro. = José Azevedo Castello Branco.
Mandou-se expedir com urgencia.

2.º Os abaixo assignados, deputados eleitos ou com os seus poderes já verificados, requerem, de conformidade com o disposto no artigo 11.º da lei de 21 de maio de 1884, que o processo eleitoral relativo ao circulo n.º 27 (Felgueiras), seja remettido ao tribunal de verificação de poderes creado pela referida lei, a fim de ser pelo mesmo tribunal julgado. = João Marcellino Arroyo = João Franco Castello Branco = Lopo Vaz de Sampaio e Mello = Arthur Hintze Ribeiro = Antonio Augusto de Sousa e Silva = Antonio do Azevedo Castello Branco = Henrique da Cunha Matos de Mendia = Firmino João Lopes = Fontes Ganhado = Pedro Victor da Costa Sequeira = Pedro Guilherme dos Santos Diniz = Marçal Pacheco = Manuel d'Assumpção = Tito Augusto de Carvalho = José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas.
Foi apresentado pelo sr. deputado Arroyo e enviado á commissão de verificação de poderes.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro que faltei ás primeiras sessões da junta preparatoria, por motivo justificado. = Teixeira de Vasconcellos.

2.ª Participo a v. exa. e á camara, que o sr. Henrique de Mendia tem faltado às sessões da camara e faltará ainda a mais algumas por motivo de molestia grave que o atacou. = Arroyo.

3.ª Declaro que por motivo justificado não pude comparecer às ultimas sessões. = O deputado, Alves Matheus.
Para a secretaria.
Leram se na mesa as propostas de lei apresentadas pelo sr. ministro da fazenda na sessão antecedente.

O sr. Alves da Fonseca: - Mando para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes sobre a eleição pelo circulo n.° 27 (Felgueiras), a fim de que siga os tramites devidos.
O sr. Tavares Crespo: - Mando para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes sobre o diploma do sr. deputado eleito pelo circulo n.º 33 (Gaia), e peço a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento, a fim de que este parecer entre desde já em discussão.
O sr. Presidente: - A camara dos deputados da ré publica franceza agradeceu a esta camara a remessa dos documentos parlamentares relativos às sessões de 1884- 1885, retribuindo com a offerta de documentos parlamentares pertencentes á camara dos deputados d'aquelle paiz. Creio que a camara quererá que na acta se mencione que este offerecimento foi recebido com especial agrado. (Apoiados.)
Leu-se na mesa o seguinte

PARECER

Senhores. - Á vossa primeira commissão de verificação de poderes foi presente o diploma do deputado eleito pelo circulo n.º 33 (Gaia) cuja eleição foi já approvada. E porque o diploma está em forma legal, é a vossa commissão de parecer que seja proclamado deputado o cidadão João Cardoso Valente, eleito por aquelle circulo. = José Maria de Andrade = Pereira dos Santos = Baptista de Sousa = Dr. Oliveira Valle = Alfredo Pereira = Alves da Fonseca = Antonio Lucio Tavares Crespo.
Foi approvado.

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Seguidamente foi proclamado deputado o sr. João Cardoso Valente.
Foram introduzidos na sala, prestaram juramento e tomaram assento os srs. João Frederico Laranjo, Joaquim Alves Matheus, Francisco Simão de Lacerda Ravasco = José Alves de Moura, Albano de Mello.
Sr. João Arroyo. - Mando para a mesa um requerimento, com os requesitos legaes, para que seja enviado ao tribunal especial o processo eleitoral relativo ao circulo 27 (Felgueiras).
Mando igualmente o diploma do sr. Godinho, deputado eleito por Castello Branco, e uma justificação de faltas do sr. Henrique Mendia.
Sr. José de Azevedo Castello Branco - Mando para a mesa o seguinte requerimento.
(Leu).
Escuso encarecer a urgencia que tenho destes documentos, porque, se porventura a opposição regeneradora resolver entrar na discussão da resposta ao discurso da coroa, eu tenciono tomar parte no debate, e para isso preciso instruir-me com esses documentos.
Visto estar com a palavra, e aproveitando a presença do sr. ministro dos negócios estrangeiros, vou dirigir-lhe uma pergunta.
Vi em alguns jornaes de hoje que não era satisfactorio, e era até perigoso, o estado de saúde do Imperador do Brazil; acrescentando até um dos jornaes que esse estado era por tal forma grave, que já tinha sido chamada uma pessoa de sua familia, que anda viajando pela Europa. Como é de ver, esta noticia trouxe o alvoroço ao espirito publico, não só pelos muitos interesses que nos ligam ao Brazil, mas ainda pelo affecto que em geral tem o povo portuguez pela dynastia que ali reina.
O nobre ministro está presente, creio que tem sobre isto informações mais exactas do que as dos jornaes, e peço a s. exa. queira tranquillisar o espirito publico, se porventura, esta noticia, como desejo e espero não for exacta.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barro s Gomes): - Sr. presidente, apenas constou ao governo que Sua Magestade o Imperador do Brazil fôra atacado de um padecimento, que tomara um caracter mais serio, e que podia fazer inspirar receios pela sua vida, apressámo-nos a telegraphar ao nosso representante no Rio de Janeiro para que diariamente mandasse informações ácerca do estado de saude do Imperador.
Assim se fez, e mais tarde, vencidas as preoccupações que a principio tinha suscitado a situação do Imperador, elle póde annunciar-nos que Sua Magestade entrára francamente em um periodo de convalescença.
As informações ácerca do estado de saude do Imperador constam mais especialmente de um despacho que eu recebi d'aquelle ministro no fim do mez passado. São as seguintes, que eu passo a ler á camara, porque dos bancos do poder só posso associar-me ao interesse que o sr. Azevedo Castello Branco declarou merecer a toda a nação portugueza a saude e o prolongamento da vida do imperante do Brazil. (Muitos apoiados.)
São tantos os lanços que nos prendem áquelle paiz; o reinado d'aquelle monarcha, um dos mais longos de que resa a historia, tem sido assignalado por tantos beneficies e por taes desenvolvimentos de riqueza e de prosperidade para o Brazil, que é natural que nós, portugueses, que consideramos talvez uma das nossas maiores glorias o termos concorrido para constituir na America um estado tão florescente, tomemos parte nos desejos e nos votos que formula a nação brazileira para que o reinado tão fecundo do Senhor D. Pedro II se possa prolongar por muitos annos. (Apoiados.)
O despacho do ministre no Rio de Janeiro é o seguinte.
(Leu.)
N'estas circumstancias suppozemos que estava de todo vencida a crise que ameaçára a saude d'aquelle soberano.
Depois d'isto, o governo recebeu ha pouco um telegramma dizendo que se tinham aggravado de novo os padecimentos do Imperador, mas n'esta communicação não havia cousa alguma que fizesse suppor uma gravidade tal que seja legitimo e corollario de se achar em risco a vida d'aquelle soberano, nem consta officialmente que tivesse partido do governo brazileiro communicação para a princeza imperial, actualmente em viagem na Europa, regressar ao imperio.
Portanto, repito que as noticias não podem infelizmente ser tão favoraveis como nós todos desejávamos, mas nem por isso são tão inquietadoras como se quiz afigurar.
Termino fazendo votos para que esta crise se conjure e que o Imperador possa continuar por largos annos á frente do império do Brazil. (Apoiados.)
O Sr. Presidente: - Creio que intrepreto bem os sentimentos da camara, mandando exarar na acta que a camara recebeu com satisfação a noticia de que não se aggravára o estado de saude do Imperador Brazil, o faz sinceros e fervorosos votos pelo restabelecimento da sua saude, sendo esta deliberação da camara communicada ao representante do Brazil n'esta côrte (Muitos apoiados.}
Vae entrar-se na ordem do dia.
A ordem do dia para hoje é a eleição de commissões; e como não ha na mesa requerimento ou proposta para tratar de outro assumpto, convido os srs. deputados a formularem as suas listas para a eleição dos supplentes á presidencia e vice-presidencia da camara.
O sr. Pinheiro Chagas: - Peço a palavra.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Pinheiro Chagas.
O sr. Presidente do Conselho: - Peço a palavra.
O sr. Pinheiro Chagas: - Cedo a palavra ao sr. presidente do conselho.
O sr. Presidente do Conselho (José Luciano de Castro): - Sr. presidente, na ultima sessão d'esta camara v. exa. proferiu algumas palavras para commemorar a morte do insigne estadista Fontes Pereira de Mello.
Eu não tive occasião de ouvir essas palavras, e não pude então associar-me, por parte do governo, a essa honrosa manifestação provocada por v. exa. Approveito, portanto, o primeiro ensejo que se me offerece, para, por mim e pelo governo de que sou chefe, adherir ás palavras dignas, elevadas, eloquentes, e sobre tudo justas, com que v. exa. commemorou os assignalados serviços e as relevantes virtudes e qualidades que exornavam o eminente estadista que se chamou António Maria de Fontes Pereira de Mello, e cuja morte todos sinceramente deploramos.
E fervorosamente applaudo a resolução de v. exa. e d'esta camara, do consagrar uma sessão especial a esta solemne e justa commemoração.
Foi aqui, foi na camara dos deputados, que alvoreceu a poderosa individualidade de Fontes Pereira de Mello. Foi aqui que se fez a iniciação das suas vigorosas faculdades parlamentares. Foi aqui que pela primeira voz lhe sorriu e o captivou a gloria com todas as suas formosas e esplendidas fascinações. Foi aqui que elle, laborioso operário, e infatigavel iniciador ou collaborador de todos os grandes melhoramentos que transformaram a sociedade portugueza do nosso tempo, luctou, trabalhou e venceu as suas mais renhidas batalhas, e viveu os seus melhores dias, e inscreveu o seu nome nas paginas mais gloriosas da tribuna parlamentar, soffreu resignado os revezes da fortuna e se levantou sem orgulho ás maiores alturas. (Apoiados.)
Foi aqui que elle educou o seu espirito na escola dos grandes mestres, que aperfeiçoou as suas excepcionaes faculdades, que enriqueceu a sua palavra amena, correcta e facil com os primores d'aquella eloquencia mascula, natural, espontanea, elevada, vigorosa sem descortezia, irreprehensivel na aggressão e na defeza, que o assignalou entre todos os oradores do seu tempo.
Foi d'aqui que elle, o grande, o notavel estadista, partiu

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para os conselhos da corôa, para as immorredouras obras que perpetuaram o seu nome, para as mais altas culminações da vida publica.
Aqui foi o campo das suas glorias, Aqui devia ser o logar da sua glorificação.
Dizem que vão levantar-lhe uma estatua. A sua melhor estatua é a sua obra parlamentar. (Apoiados.)
Foi a tribuna que o levantou. É na tribuna que a posteridade ha de vir procurar a verdadeira medida da sua colossal estatura. (Vozes. - Muito bem.)
Honram-se os homens publicos, elevam-se os parlamentos e os governos quando, enrolada a bandeira partidária, se inclinam respeitosos diante da memoria dos grandes cidadãos, dos benemeritos da civilisação e da patria, ainda quando furam seus adversarios, e reconhecem, e como que authenticam os seus títulos á admiração da historia e á gratidão nacional.
E não ha contradicção entre os louvores encarecidos de hoje e as philippicas inflammadas de hontem. Não ha.
Na vehemencia da lucta, no ardor da refrega partidaria, muitas vezes a paixão escurece ou exalta os melhores entendimentos a ponto de lhes fazer esquecer os limites que separam a essencial cortezia dos debates da irreflectida intemperança de linguagem, que não raro macula os explendores da nossa tribuna.
Passada, porém, a refrega, e terminada a peleja que nos arremessou uns contra os outros, somos faceis em esquecer, e generosos em perdoar. Raras vezes a exaltação dos discussões politicas chega a perturbar as relações da vida particular. (Apoiados.) E, quando soa a hora da justiça, não sabemos recusal-a a quem a merece. (Muitos apoiados.)
É por isso que eu, adversário modesto, mas intransigente, de Fontes Pereira de Mello, durantes muitos annos, mas adversario que soube fazer justiça ao seu elevado caracter e nobilissimas qualidades, (Apoiados.) não hesitei um momento em vir aqui, por mim e pelos meus amigos politicos, por todos quantos prezam a grandeza d'esta terra, associar-me a quaesquer manifestações de sympathia e de respeitosa saudade, que esta camara quizesse render á memoria de um homem por tantos títulos notável, de um homem que muito amou a sua patria, e que muito trabalhou e sofreu por ella, (Apoiados.} de um homem que se engrandeceu pelo trabalho e pela sua inconcussa probidade, (Apoiados.) de um homem que serviu o seu partido com uma firmeza e uma lealdade que podem ser exemplo e modelo a todos os chefes de partido. (Apoiados.)
É por isso que n'este momento uno, com sincero prazer, a minha voz, ás dos meus leaes adversarios para commemorar e applaudir as distinctas virtudes, as qualidades eminentes, e os serviços assignalados do benemerito cidadão e do grande estadista, cuja falta eu deploro como uma perda nacional. (Muitos apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados de todos os lados da camara.)
O sr. Pinheiro Chagas: - Sr. presidente, começo, em nome da minoria d'esta camara por agradecer a v. exa. a iniciativa que se dignou tomar na ultima sessão de prestar uma homenagem elevada, homenagem tão digna do seu caracter e dos seus talentos, á memoria do nosso chorado chefe, o eminente estadista Fontes Pereira de Mello.
Folgámos, todos os que combatemos á sombra da bandeira empunhada por aquelle grandioso vulto, com que partisse de v. exa. uma iniciativa que lhe é tão honrosa. Folgámos, e folgámos deveras ao ouvir hoje a palavra eloquente do sr. presidente do conselho, eloquente sempre, mas que nunca o foi tanto como n'esta sessão; (Apoiados.) folgámos de o ouvir prestar uma homenagem tão justa, - tão leal e tão sincera á memoria d'aquelle que foi seu adversario intransigente e energico, mas que foi tambem, como s. exa. bem sabe, seu leal amigo. (Apoiados.)
Folgo immenso de que n'esta occasião, de que nas vesperas das luctas que vão travar-se ámanhã possamos, por assim dizer, inclinar as espadas diante dos nossos adverarios nestas luctas cortezes, de que possamos hoje unir-nos todos, lembrando-nos uma vez, já que tantas vezes d'isso nos esquecemos, de que somos filhos da mesma patria, que somos todos portuguezes, para nos associarmos na commemoração de uma das mais brilhantes glorias da tribuna portugueza, e uma das glorias mais brilhantes da nossa historia politica. (Vozes: - Muito bem).
O sr. presidente do conselho lembrou, e muito bem, que era aqui no parlamento que se devia fazer a glorificação de um homem que no parlamento conquistou as suas mais levantadas glorias, que tudo foi e tudo quiz ser no parlamento e pelo parlamento. (Apoiados.)
Por mais de uma vez, depois d'aquelle doloroso acontecimento tenho tido occasião de prestar homenagem da minha saudade á memória d'aquelle homem que a patria hoje deplora. Mas confesso a v. exa. que nunca o fiz debaixo de uma impressão tão profunda como o faço hoje.
Fallei no cemiterio, fallei junto da sua campa entreaberta, a dois passos dos seus restos. inanimados e frios; agora ergo a voz nesta sala, que foi, como muito bem disse o sr. José Luciano de Castro, a arena das suas luctas e o capitolio dos seus triumphos; n'esta sala, cujos echos, que vão repetir os sons que os seus labios emittem, como que ainda conservam a ultima vibração da sua inspirada palavra.
No cemiterio estava o seu corpo, mas aqui como que está ainda a sua alma. No cemiterio estava o que havia n'elle de corruptivel, e estava a terra da patria, sim, mas terra fria, indifferente que se preparava para devoral-o. Aqui está o que havia n'elle de incorruptivel, de immortal, seu espirito grandioso, o seu luminoso espirito, e está tambem representado em nós todos, em nós representantes do povo, em nós filhos da eleição, está representada em todos nós e em todos nós viva e palpitante a dupla alma sagrada da patria que elle serviu e da liberdade que elle amou. (Vozes: - Muito bem.)
Prestam lhe hoje homenagem os seus proprios adversarios, homenagem levantada e eloquente, como aquella que ouvimos ha pouco; prestam homenagem os seus adversarios e não lha prestam só progressistas ou republicanos, inimigos de um dia, inimigos de uma hora, que inclinaes, como nós inclinamos tambem, as nossas bandeiras partidarias diante d'essa bandeira, que nos enrola a todos nós com as suas dobras gloriosas e que se chama bandeira da patria.
Não lh'as prestarieis só vós, porque Fontes Pereira de Mello era mais do que um homem que honrou a sua patria, foi um homem que honrou a humanidade. (Apoiados.) Prestam mesmo homenagem aquelles que seriam seus adversarios intransigentes.
Aquella grande Rainha de Hespanha, Izabel a Catholica, se vivesse e se o tivesse a elle como a portuguez intransigente que era, por inimigo intransigente e figadal, tambem diria d'elle, ao saber a noticia da sua morte, o que disse de D. João II «Morreu o homem!»
Fontes tinha, na verdade, o que constitue a nobreza de uma obra prima da creação - o homem; tinha a virilidade de caracter, e tinha, por assim dizer, a feminilidade do coração. Tinha todas as grandezas, todas as energias: era inquebrantavel como o aço, e como o aço flexivel; austero para si, e tolerante para os outros; (Apoiados.) incapaz de uma fraqueza e compadecendo-se de todas, (Apoiados.) prestando a todos os ideaes o culto mais levantado e nobre, e sabendo, comtudo, caminhar atravez de todas as realidades. (Apoiados.)
Quando fallava aqui, possuido do intimo dever, consubstanciava em si tudo o que constitue a força, a energia, a vitalidade do organismo humano. Tinha a luz no olhar ra-

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diante, o calor na voz apaixonada, a electricidade na communicativa eloquencia. (Apoiados)
Ha uma palavra que define Fontes, era vibrante, não era? (Apoiados.) Sim, vibrante, como a corda de um violino; e veiu a morte de subito, e quebrou de um momento para o outro esse instrumento maravilhoso, que pouco antes enchia esta sala com as suas vibrações potentes; gelou-se perante a morte, deixando bem uma memoria eterna no coração dos que sobrevivem, uma eterna gloria no livro de oiro da patria. (Apoiados. - Vozes: - Muito bem.)
Esse livro de oiro, de lucto, enriquece-se com os nomes que nós perdemos.
A liberdade em Portugal teve duas grandes epochas, 1834 e 1851, a revolução e a pacificação, o louro e a oliveira, o alvião e a espada, a tempestade que derruba o velho edificio, e o trabalho que consolida, completa e corôa o edificio das novas instituições, tenda de um dia em que a humanidade se abriga para repousar um instante do seu eterno caminhar.
O movimento admiravel de 1851 póde dizer-se que se symbolisa em Fontes Pereira de Mello. Podem discutil-o; podem contestal-o, podem guerreal-o, mas o movimento que elle iniciou todos o seguem fatalmente.
Pão certo aos funccionarios, pagamento honrado da divida nacional atravez de todas as difficuldades; estradas, fomento para o paiz, reformas constitucionaes no parlamento e pelo parlamento, e não na guerra civil e pela guerra civil, eis aqui o programma de 1851, que todos, principiando pelos seus mais ardentes adversarios, se ufanam de seguir.
É este, sr. presidente, o caracteristico dos genios politicos verdadeiramente immortaes, é terem deixado profundamente impresso o seu cunho na historia do seu paiz.
O que se escreve na areia da politica partidaria vem a onda e apaga-o; mas o que se escreve na pedra do monumento publico da politica nacional isso desafia os seculos. (Apoiados. - Vozes: - Muito bem.)
Por isso, tenho visto na minha carreira parlamentar o parlamento esquecer as suas divergencias, as suas dissenções para se curvar unanime perante Joaquim Antonio de Aguiar, que foi o revolucionario; perante Sá da Bandeira, que foi o emancipador heroico, e agora perante Fontes Pereira de Mello, que foi o semeador sublime d'essa abençoada colheita que está enchendo os nossos celleiros nacionaes de prosperidade e de paz, e as nossas almas do culto radioso e pacifico
Da liberdade. (Muitos apoiados.)
Ámanhã recomeçarão as nossas luctas acerbas, acerbas como eram aquellas em que elle tomava parte, mas o que se passa hoje n'esta casa é consolador para todos.
Consola pensar que chega um momento em que emmudecem todos os clamores insensatos, e em que as vozes mais irritadas são aquellas que entoam mais alto o cantico da apotheose. (Apoiados.- Vozes: - Muito bem.)
É que, como dizia ha pouco um grande escriptor francez: -o que se faz para a bulha faz-se para o vento - mas, digo eu apenas o que se faz pela patria, o que se faz pelo bem, isso faz-se para a justiça, faz-se para a immortalidade. (Muitos apoiados.)
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi cumprimentado por muitos srs. deputados de todos os lados da camara.)
O sr. Antonio Candido: - A maioria da camara ouviu com profundo sentimento e com a mais respeitosa sympathia as eloquentissimas palavras proferidas pelo sr. Pinheiro Chagas; e eu, sabendo que interpreto a vontade de todos os meus amigos politicos, (Apoiados.) proponho que, depois de consagrada esta merecida homenagem a Fontes Pereira de Mello pelos oradores que queiram inscrever-se, v. exa. levante logo a sessão. (Muitos apoiados.)
Fica assim o dia de hoje assignalado e ennobrecido por um acto de verdadeira justiça nacional.
Foi para fazer esta proposta que eu pedi a palavra; mas, tendo-a n'este momento, vou tomar algum espaço de tempo á camara, menos para justificar a minha proposta, que é recebida com unanimes applausos, (Apoiados.) do que para satisfazer o meu coração, que a morte do eminente estadista impressionou e commoveu tão profundamente!
É claro que não me cabe a mim o honroso encargo da sua oração funebre. Esse dever, que é um acto de justiça e o desafogo de grandes saudades, pertencia á sua illustre familia politica, que tão fervorosamente tem sabido zelar e enaltecer a memoria do que foi seu chefe venerado e prestigiosissimo!
Lamentando que ainda se não tivesse feito uma apreciação exacta, e completa de William Pitt, dizia ha pouco um grande escriptor francez, que é tambem um critico eminente:
"Compare-se o numero dos grandes homens ao numero dos grandes historiadores, e ver-se-ha que é bem mais difficil julgar a gloria do que merecel-a.
Am la bem que a esplendida gloria do distinctissimo homem d'estado, cuja commemoração se faz hoje aqui, foi comprehendida e julgada devidamente pelo brilhante orador que me precedeu. Ainda bem que a palavra de Pinheiro Chagas, palavra illuminada e quente, que tem sempre os relevos e as incrustações mais preciosas da historia, da arte, do coração e do espirito, soube modular, com harmoniosa e sentida eloquencia, o hymno e a elegia do que fôra seu chefe e seu amigo! (Apoiados.)
Fontes, foi na politica portugueza, um dos homens mais combatidos do seu tempo.
Era bem natural.
Quando um homem de extraordinarias faculdades personalisa um pensamento politico, activo e militante, a lucta que elle determina tem forçosamente de ser intensa e apaixonada: os que o seguem cobram alento, a toda a hora, da qualidade do chefe, e os que o combatem têem de graduar o esforço pela resistencia que encontram. (Muitos apoiados.)
D'este logar, onde tenho a honra de fallar agora, fiz a Fontes Pereira de Mello a mais calorosa e convicta opposição. Não me doe o coração, porque o respeitei sempre; não me accusa a consciencia, porque cumpri o meu dever (Apoiados.) Mas tenho saudades, vivas saudades, d'aquelle luctador formidavel e bello, aprumado, correcto, eloquentissimo, cheio de gloria e de poder, com quem era uma honra insigne terçar as armas leaes do argumento e da palavra!
E direi mais que, entre as recordações agradaveis da minha vida, o tempo não ha de delir nunca da gentillissima deferencia com que elle recebeu sempre, sem ver a minha humildade, a expressão, tantas vezes apaixonada, da minha hostilidade parlamentar!
O destino d'este homem de estado foi exemplarmente feliz. Teve, durante a vida, o ruido, a lucta e o prestigio, que elle. pretendia e amava; agora, morto, tem mais do que a paz; tem a paz e tem a gloria!
É justo!
Foi grande e foi bom.
Este seculo é infinitamente complexo. Quando, no futuro, a critica inventariar o seu immenso trabalho e a sua opulencia, terá de descrever todos os ideaes da psychologia humana, todos os problemas da philosophia social, a theoria e a applicação de todas as sciencias, a revolução em todas as suas fórmas, a affirmação e a negação de todas as cousas, uma ancia de vida, como nunca houve, e uma sensação de dôr, como nunca a alma humana soffreu! (Muitos apoiados.)
Não será possivel caracterisar por uma só idéa dominante e por um unico titulo a labutação gloriosa do seculo XIX. Mas, entre os seus grandes serviços prestados á civilisação humana, destacará sempre, em grande relevo,

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70 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

a effectiva transformação das verdades da sciencia nos melhoramentos materiaes de toda a especie, nas commodidades da vida, nas celeridades do commercio, em todas as grandes vantagens que póde produzir a suppressão maravilhosa das distancias do espaço e das distancias do pensamento. (Muitos apoiados.)
A intelligencia, emancipada de antigos preconceitos, e a politica, entrada de uma nova alma, generosa e sympathica, tornaram possivel este magnifico resultado; (Apoiados.) mas a Fontes Pereira de Mello coube a grande fortuna e a grande gloria de comprehender e servir em Portugal esta missão utilissima do seu tempo (Apoiados.)
Elevado ao poder, como chefe do partido, Fontes Pereira de Mello governou este paiz em longos annos. Tinha na politica um pensamento seu e um processo proprio mas não é esta a hora de fazer a critica d'esse pensamento e d'esse processo.
Não ha homem, por mais vasto que seja o seu espirito, que tenha em si a verdade completa de um minuto, de um segundo... O absoluto é o ideal da nossa especie; não é propriedade exclusiva de ninguem. Quando um homem desapparece da vida deixa na historia o desenho e a impressão exacta da porção de verdade que trouxe na sua consciencia, e vê-se então como é fallivel a critica humana, ora augmentando ora diminuindo a realidade das cousas moraes! Mas é só então que se vê...
Mas se não é a hora de fazer a critica do pensamento e do processo de Fontes Pereira do Mello, é certamente a hora de dizer que raras vezes se reunem um homem de estado tantas virtudes moraes e tantos talentos como elle teve. (Apoiados.)
Intelligentissimo, activo, tendo a intuição das cousas e o conhecimento facil dos homens, tenaz e habil, malleavel e forte, alma lavada de invejas e de odios, sempre generoso, ambicioso no bom sentido, leal e verdadeiro, tendo a consciencia de si e sabendo estar no seu logar, perfeitamente equilibrado, sem grandes enthusiasmos e sem egoismo excessivo, nem muito crente nem muito sceptico, occupando por direito proprio a tribuna e sabendo dominar-se n'ella, Fontes Pereira de Mello era o maior homem da sociedade politica portuguesa, o primeiro que as vistas estranhas distinguiram de qualquer parte do mundo. (Muitos apoiados.) Se tivera nascido em França ou na Inglaterra, poderia ter governado qualquer d´estas grandes nações, e creio que, educado por influencias melhores que as nossas, teria sido lá maior e mais util ainda do que foi aqui...
A critica verdadeira, a critica completa, que se faz com a cabeça e com o coração, tem de exercer-se sobre a obra e sobre a virtualidade dos personagens que estuda.
Já fallei da sua eloquencia.
Era admiravel!
A voz clara e vibrante, a estatura erecta e sempre composta, a phrase prompta e felicissima, a defeza valente, a replica audaz e scintillante, a illuminação do olhar, o movimento gentil da cabeça, differente da de José Estevão, mas tão formosa como a d'elle... ah! que immensa pena eu sinto do que tudo isto tenha desapparecido para sempre! Foi a perda de tudo isto que me commoveu e me impressionou mais quando soube que a morte, a sinistra triumphadora de tudo e de todos, o vencêra e prostrara a final!
A sua palavra, rapida e facil, não movia vastos systemas de doutrina, nem se recamava de atavios preciosos e raros. Não era Gruizot, nem Thiers, nem Castellar, nem Gladstone, nem José Estevão... Mas servindo facilmente a inspiração de momento, e perfeitamente adequada aos assumptos que elle versava, era uma grande faculdade, tinha um vivo esplendor, e fica, com a sua originalidade inconfundivel, na mais alta constellação da nossa tribuna parlamentar. (Muitos apoiados.)
Não saberão o que elle foi os que o não ouviram... Como a lamina de uma fina espada que não tem brilhos quando immovel, em descanso, e só preluz o scintilla quando é erguida e vibrada - assim era a eloquencia de Fontes Pereira de Mello!
Termino aqui. Disse mais do que era preciso depois do eloquente discurso do sr. presidente do conselho e da larga e brilhante oração do sr. Pinheiro Chagas; mas o que posso affirmar a v. exa. e á camara é que disse menos do que desejava em louvor do grande homem, que tanta gloria deu áquella tribuna e tão grandes serviços prestou a este paiz! (Muitos e repetidos apoiados.)
(O orador foi comprimentado por toda a camara e por muitos pares do reino que estavam na sala.)
O sr. Presidente: - Vae ler-se a proposta mandada para a mesa pelo sr. Antonio Candido. (Leu-se.)
É a seguinte:

Proposta

Proponho que se dê por terminada a sessão de hoje, em testemunho de sentimento pela morte do eminente estadista Fontes Pereira de Mello, e que se communiquem estes votos da camara á familia do illustre finado.
Sala das sessões, 15 de abril de 1887. = Antonio Candido.
Foi approvada.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a mesma que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas e dez minutos.

Redactor - Rodrigues Cordeiro.

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