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N.°6

SESSÃO DE 17 DE JANEIRO DE 1902

Presidencia do Ex.mo Sr. Matheus Teixeira de Azevedo

Secretarios-os Ex.mos Srs.

Amandio Eduardo da Mota Veiga

José Joaquim Mendes Leal

SUMMARIO

Aberta a sessão e lida a acta, o Sr. Rodrigues Nogueira pergunta se d'ella constam as funcções que, no Ministerio das Obras Publicas, exercem os Srs. Deputados, a que se refere a proposta na sessão anterior approvada, ao que o Sr. Presidente responde que, da acta, não constam essas funcções, porque tambem não constavam da proposta inicial, que foi fielmente reproduzida. - Sobre este assumpto trava-se discussão, em quo tomam parte os Srs. Rodrigues Nogueira, João Arroyo e Francisco Machado; levantando-se grande agitação, é a sessão interrompida. Reaberta, approva-se a acta, depois de algumas considerações do Sr. Francisco Machado, e seguidamente dá-se conta do expediente. - O Sr. Rodrigues Nogueira pergunta ao Sr. Ministro da Fazenda se julga subsistente a auctorização para contratar com o Banco de Portugal, respondendo-lhe o Sr. Mattozo Santos affirmativamente. - O Sr. Costa Pinto refere-se ao fallecimento de dois aluirmos do Lyceu de Lisboa, e desaccumulação de alumnos do mesmo estabelecimento; o Sr. Oliveira Mattos á epidemia de meningite cerebro-espinal no quartel de infantaria n.° 23; o Sr. José de Alpoim ás eleições administrativas no Funchal: o Sr. Cayolla á febre aphtosa em Portalegre; e o Sr. Antonio Cabral á saida de uma companhia do regimento de infantaria n.° 12. Respondem-lhes os Srs. Presidente do Conselho e Ministro da Guerra.- O Sr. Alberto Navarro apresenta um parecer da commissão de fazenda; os Srs. Luiz José Dias, Carlos Ferreira, Rodrigues Nogueira, Ramirez, Antonio Centeno e Francisco Machado requerem esclarecimentos por varios Ministerios; os Srs. Mendes Leal. André de Freitas e Motta Veiga renovam a iniciativa de projectos de lei; o Sr. Costa Ornellas apresenta um projecto de lei; e o Sr. Francisco Machado uma proposta, para que a discussão dos avisos previos seja feita em dias alternados -Presta juramento e toma assento o Sr. Visconde de Reguengo (Jorge).

Na ordem do dia entra em discussão o projecto de lei n.° 3, bill de indemnidade, usando da palavra os Srs. Beirão, Presidente do Conselho e Mello e Sousa, que apresenta duas propostas.- Antes de se encerrar a sessão, usam da palavra para explicações os Srs. Rodrigues Nogueira e Francisco Machado. Responde o Sr. Presidente do Conselho.

Abertura da sessão - Ás 3 horas e 1/4 da tarde.

Presentes á chamada - 64 Senhores Deputados.

São os seguintes: - Abel Pereira de Andrade, Affonso Xavier Lopes Vieira, Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto Botelho, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Cesar Brandão, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Alvaro de Sousa Rego, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio de Almeida Dias, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio José Boavida, Antonio José Lopes Navarro, Antonio do Sousa Pinto de Magalhães, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Augusto Cesar Claro da Ricca, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Carlos Alberto Soares Cardoso, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Castro e Solla, Conde de Paçô-Vieira, Domingos Eusebio da Fonseca Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco José Machado, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Frederico dos Santos Martins, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alfredo de Faria, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Marcellino Arroyo, João de Sousa Tavares, Joaquim Antonio de Sant'Anna, Joaquim Faustino de Pôças Leitão, Joaquim Pereira Jardim, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José Caetano de Sousa e Lacerda, José Coelho da Motta Prego, José da Cunha Lima, Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Dias s, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim de sousa Cavalheiro, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria de Oliveira Simões, José Mathias Nunes, Julio Augusto Petra Vianna, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manuel Joaquim Fratel, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Matheus Teixeira de Azevedo, Rodrigo Affonso Pequito, Visconde de Mangualde e Visconde da Torre.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Agostinho Lucio Silva, Albino Maria de Carvalho Moreira, Alexandre Torreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar da Rocha Louza, Belchior José Machado, Carlos de Almeida Pessanha, Carlos Augusto Ferreira, Carlos Malheiros Dias, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Conde de Penha Garcia, Custodio Miguel de Borja, Fernando Mattozo Santos, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José de Medeiros, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique Matheus dos Santos, João Joaquim André de Freitas, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, José Adolpho de Mello e Sousa, José Dias Ferreira, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Ernesto de Lima Duque, Julio Maria de Andrade e Sousa, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luiz Fisher Berquó Pôças Falcão, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral e Visconde de Reguengo (Jorge).

Não compareceram á sessão os Srs.: - Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alipio Albano Camello, Antonio Belard da Fonseca, Antonio Roque da Silveira, Antonio Sergio da Silva e Castro, Augusto Fuschini, Augusto José da Cunha, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Eduardo Burnay, Francisco José Patricio, Ignacio José Franco, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, José da Gama Lobo Lamare, José Maria Pereira de Lima,

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DIÁRIO DA GAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Manuel dn Suur.a Avide.s, Marianno Oyrillo de Carvalho, Míiiiauno ,fosú da Silva Piu/aito, Marque/, de Ueri/. c Pítulii de JíaiTor, Pinto Otiorio.

O Sr. Rodrigues Nogueira (nulre a acta): - Sr. l'renid-into: ivm que de forma alguma envolva PIU censura a quem fé/ a leitura da, acta, o quo ó certo 6 quo não pude perceber, HO na relação dos funeoioinrios dependeu-lês do Ministério das Obra» Publicas, para OF quacs ó solicitada n licença para aecuuiulnrcm a» luncyòes que exercem com as de Deputados, juleante dos nomes respectivos vei m indicados os cargos qno doncmpcnham no Ministério refe.riilo.

Denejo, portanto, que V. Ex.° mo informo se-sim ou ní,n <_-cs p='p' cnrgob='cnrgob' designados='designados' na='na' vêem='vêem' acta.='acta.'>

O Sr. Pve-idente: Peço perdíio. Parcce,-me, porem, que o tjuc o Sr. Dcput.ulo acaba, de expor nílo ó uma reelnmae.ilo subro a acta.

O Si. RodriKUOS Nogueira:-- Ora essa! Então sobre O que é, V

O Sr Presidente: MH a qual 6 a parto da acta a que V. Ex,1 t>tt refere e nobre quo tem iluviduf?

O Sr. Rorlviglies Nogueira: -Peco u V. Ex.J quo tnniiflo h r n proposta do Sr. Ministro dus Obra" Publi cãs.

O Sr. ijiesi dente: A proposta não faz parto da .nct-i.

,

O Sr. José de Alpoira:-- KnlJio u proposta nau tios pnrtc da «eln

O Sr. Lourengo Cayolla: Então para quo serve a

«Cia?

O Sr. Prr.sideiite : Qual e, a proposta « que o Sr. Deputado líodriicucH Nogueira !'o refere?

O Sr. liodrigues Nogueira:- É a quo pode aut-lo-mac.lo para iierumularcin us nuas ftmeeões administriiti va-f eom ÍH loiíiblntivH-» vario» Sra. De-putados, dt-peudeii-toí. do MinicterlodaH Olirnt 1'ubliciiK.

O Sr. Presidente: Vim lor-se a parle da acta rela-tir.i ao ponto 'i que o Sr. DeptiUido Rodripjue» Nogueira 1,11 referi-.

IVço a atti-mjilo d>i (Inmarn.

(> Sr. Rodrigues Nogueira: - líeqneiro que MI addi-cioiiciu a ess-i relação as fmiccfies que esses Sr.-!. Deputada ilcscm]i(>nhiiin in> Ministério dau Obras 1'uhlicmi, para (•'-.ini HC Jicar «ábondo os nomes do alguns dos comini»- !i-

O Sr. João Arroyo: - -Sr. Presidente, o único ponto que ha a verificar, trat indo se de uma disciiRsíio sobre a ítcl'1, ó, iiesfe caso, se o qun nella RO lu, é ou nào a repo-lie-lo da proposta, quo u Tâmara approvou. tApoindtia),

Tinia u qualquer outra que.stào pode opportnuamente w r Icvniitada por qualquer membro da ('amara, mas não agora sobre o ponto rc-tricto da acta. (Apiaado»). Por-t:n:t(>, rugi» a Y. Kx.!l quo mande vcriíic.ar, se na acta se encontra a icpctiyào da proposta tal «jnal foi apresentada pulo Sr. Ministro d:m Obra» Publicas-, e que a Gamara :ip|'i'< vou.

O Sr. FrosideutP : • Vae Icr-so a pr.ipo.stn, approvula HM .--osiiílo anterior, do Sr. Ministro das Obras Publicas para que a Camará veja se está ou não, em harmonia com o qun se lê na acta.

/'('"-Art II /0/'Mít/.

O Sr. Presidente: - - Ido é o que con&ta da proposta, por coiwquenei.M está c.onfc.rmo c.om a acta.

O Sr. Frunoisoo José Maonado:- V. Ex.» inseriu cMeclivnincjili', ou mandou inferir, na unta a proposta do Sv Ministro das Oiira-. Publica», mas a ('amara níío pode ajijicová Ia.

Vozns: .f(5 a approvfin.

O Orador: - - Porque estão ahi nomes quu uàu constam que sejam empregados do Ministério das Obras Publie.aH.

Por exemplo, quem i's que «abe. be o Sr. Malheiros Dias ó empregado no .Ministério das Obra» Publicas? Quem é que sabe t is o Sr. Pereira Lima e outros, cujos nomes voem nesse documento, t^io empregados no Mmistc.rio das Obras Publicas V (Âjutiadus).

E preciso ipie o (Joverno não esteja a ludibriar a Ca-iiura, como tem lubidriado o jiaís. (Ajwiaúos),

E preciso que o Governo vcnba dar conta categórica dos; sons actos.

K preciuo

K ncetíji.sario quo te saiba quo o Governo tem distribuído um bodo aos stms amigos. Tenham ao menos a co-rage.ni do vir aqui di/.er. . .

Vozes : - - Ordem, ordem.

O Sr. Presidente: - Peco ao Sr. Deputado quo se rostrinja ao assumpto.

O Orador: Como ú quu a Tâmara sabo s-e o<_ que='que' ohicial='ohicial' publicas='publicas' no='no' verdadeira.='verdadeira.' lia='lia' uma='uma' documento='documento' níio='níio' menos='menos' das='das' pio='pio' obríip.='obríip.' são='são' eiiipre.idos='eiiipre.idos' só='só' a='a' refere='refere' e='e' proposta='proposta' o='o' p='p' comprove='comprove' cavalheiros='cavalheiros' minihtcrio='minihtcrio' ivlacào='ivlacào' pé='pé' algum='algum'>

VOSSOS: Ordem, ordiim.

(Hnxsurro).

O Sr. Presidente: -O Sr. Deputado esta foru da ordem. A ordem é a disenasíio da acta, peco ao Sr. Deputado quo HH restrinja a esta disciisifto.

'J Orador: -O Sr. Ministro das Obra. Publicas que venha aqui dnr conta dos seus actos como é dsi sua obri-

Se está dooutu e RO pode fa/.er ou despachos em sua casa, também ]>'nl« vir aqui dar satisfaciio doti seus actos. (tíramlc puxstirro). (Vor.c«: - Ordem, ordom).

Koi'a da ordem está a maioria e nào eu. Então o Go-I verno tem nomeado toda a gente (pie, quer, e não elucida l a (,'amara e não da couta dos seus actos? Voí!G3: --Ordem, ordem.

O Sr. Presidente: -V. Ex.a está fora da ordem, e se continua vejo-mo na necessidade d« suspemlur a sessão, ou chama-lo .-i ordem.

O Orador:- -Pois o Sr. Ministro nomeia amigos c imo quer vir dar conta do* snus ados á ('amara. (.ljn VO/ÍÍB: Ordem, ordem

O Sr. Presidente: Está Hiit-pcni-a a eessâo.
Knnn tri-s hoitm t: trinta A» quatro liorax a cinco iHÍniitim fui rcafii i-la « xtJlt^uo.
O Sr. Presidente: - -Vou dar a palavra ao Sr Ma l chado, mas timplesiiu-nte para falnr sobre a act.i.
O Sr. ÍVanoiSGO José Machado :--Pedi a palavr.i sobro a acta, porque imaginava (jiic dev;.i coiintar d'el!a as fiinccòcK que cxprcem no Ministério das Obrns Publicou, os Srs. Deputados que, o Sr. Vargaa pediu á ('amara para accumuliir, com os cargos que exercem, as funcçiu K legislativas. Desde que V. Ex.'1 mandou ler a acta e que vejo que cila (itú t m harmonia c"in a relação apresentada, nada mais tenho a dizer, rcscrvando-mo para mandar pura n mesa, em occasiíio opportuiiii, um requerimento pedindo unicamente que seja cuinmiuiicado 11 Camani n n/l

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SESSÃO N.º 6 DE 17 DE JANEIRO DE 1902 3

Publicas os Srs. Deputados, para cuja accumulação foi pedida auctorização.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais reclamações sobre a acta, vão esta ser posta á votação.

foi approvada.

O Sr. Presidente: - Vão dar-se conta do

EXPEDIENTE

Segunda leitura

Proposta para renovação de iniciativa

Renovamos a iniciativa do projecto n.º 11-B do anno passado, assignado pelo Sr. Deputado Costa Ornellas, e que diz respeito ao tenente do quadro da Africa occidental, Manuel José Ferreira dos Santos. = Os Deputados, F. J. Machado = Costa Ornellas.

Foi admittida e enviada á commissão do ultramar.

Refere-se esta renovação de iniciativa ao seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.° Ao tenente do quadro occidental da Africa e guarnição da provincia de S. Thomé e Principe, Manuel José Ferreira dos Santos, será levado em conta para offeitos do promoção e reforma, o tempo decorrido desde 27 de junho do 18915 a 13 de abril de 1894 e desde 11 do setembro de 1896 a 25 de fevereiro de 1897, em que esteve na inactividade para tratar da sua saude.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

O Sr. Alberto Navarro: - Mando para a mesa por parte da commissão de fazenda, o parecer sobre a proposta de lei relativa ao imposto de mercês, cuja iniciativa foi ha dias renovada.

A imprimir com urgencia.

O Sr. Rodrigues Nogueira (para um negocio urgente): - Sr. Presidente: pedi a palavra para um assumpto, cuja urgencia V. Exa. reconheceu, e que a Camara, decerto, tambem assim o considerará. Desejo interrogar o Governo relativamente ás negociações entaboladas cora o Banco de Portugal.

No caminho desvairado em que o Governo se lançou, malbaratando os dinheiros publicos, todos os collegas do Sr. Hintze Ribeiro o teem acompanhado com um valor extraordinario, mas que não é para imitar-se. (Apoiados).

Até o Sr. Vargas, que tão notavel se tornou o anno passado nesta Camara, pela sua ausencia, quis associar se ao largo esbanjamento, subscrevendo essa longa lista do funccionarios, que ha dias vem enchendo as paginas do Diario ao Governo!

No cahos de administração em que nos lançou este Governo, a figura do Sr. Ministro das Obras Publicas traz á minha imaginação essas illuminuras biblicas, em que o Padre Eterno é figurado pelos antigos pintores sob a legenda: Et spiritus Dei ferebatur super aquas que alguns traduzem por vento forte, mas que, no caso presente, é o vento da demencia, que tem assolado este país!

O Sr. Ministro da Fazenda, por um acto exclusivamente seu, auctorizou-se a negociar cora o Banco de Portugal. Foi um acto do dictadura illegalissimo, mas em todo o caso teve S. Exa. a franqueza de o confessar.

Outros contratos, porem, teem sido feitos, que até hoje ainda não foram confessados. Por exemplo: o Sr. Presidente do Conselho realizou um contrato com a Empresa do Theatro de S. Carlos, e ainda até hoje não se inseriu qualquer palavra d'esse documento nas paginas do Diario do Governo!

Quando no anno passado falei acêrca de assumptos d'esta natureza o Sr. Ministro da Fazenda disse: «que havia de proceder em harmonia com os interesses do país». Eu, porem, não comprehendo como se possam harmonizar os interesses do país com a enchurrada de nomeações que desde semanas se vão alastrando pelo Diario do Governo!

O que me parece é que se trata simplesmente dos interesses do Governo. O Governo quer criar proselytos!... Mas o Sr. Presidente do Conselho recorda-se, de que foi exactamente quando nas antigas hostes romanas entraram os mercenarios, que no Imperio começou a derrocada.

São porventura os interesses do país estes esbanjamentos continuados?!

Sr. Presidente, o Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro viu que o país enfermava do grande numero do funccionarios o que era pessima a administração! Pois vem com mais funccionarios, faz a nomeação de mais empregados publicos! Similia similibus curantur.

A desgraça arrasta uma desgraça maior! O que receio é que applicando á sociedade portuguesa o principio de Hannheman applicado ao individuo, não a mate era vez do a curar, porque o organismo debilitado do enfermo com certeza não escapa da cura...

Disse S. Exa., em resposta á declaração formal do Sr. Conselheiro Beirão, que se se encontrasse novamente um circumstancias identicas, havia de proceder da mesma maneira em relação ás dictaduras.

Senhores generaes do partido regenerador, era nome dos interesses sagrados do país, acompanhem o Sr. Presidente do Conselho, dêem-lhe todo o apoio, não o abandonem, porque senão, nova enchurrada do nomeações nós veremos nas paginas do Diario do Governo. Dêem-lhe todo o apoio, não se afastem d'elle. (Apoiados).

É claro, que para fazer face a todas estas despesas excessivas se torna necessario haver dinheiro.

Auctorizou-se, por isso, o Governo dictatorialmente, por decreto de 22 de novembro ultimo, a fazer um contrato com o Banco de Portugal. Mas ha mais. Chegou o dia 2 do janeiro, abriu-se o Parlamento e o contrato não estava celebrado. Eu pergunto ao Governo, especialmente ao Sr. Ministro da Fazenda, se acha que ainda pode usar da auctorisação, que a si mesmo se deu, para approvar o contrato, dada a hypothese que elle seja tambem approvado pela direcção do Banco de Portugal?

É uma pergunta simples, nitida, e eu peço a S. Exa. que me dê a unica resposta que tem, sim ou não.

O Governo auctorizou se por um decreto dictatorial a fechar um contrato com o Banco do Portugal. Esse contrato não estava feito quando ao abriu o Parlamento; não está feito ainda hoje. Dada a hypothese que a direcção do Banco de Portugal acceite esse contrato, o Governo julga que ainda pode usar d'essa auctorização que a si mesmo se deu?

É esta a pergunta que formulo, e nesse sentida mandarei para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos, porque desejo occupar-me d'esse assumpto.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas).

O sr. Ministro da Fazenda (Mattozo Santos): - Sr. Presidente: vou responder, singela o precisamente, á pergunta que me foi feita pelo illustre Deputado Sr. Nogueira.

Perguntou S. Exa. se o Governo só julgava auctorizado pelo decreto dictatorial que tinha publicado, e ainda mesmo depois do Parlamento aberto, a assignar o contrato com o Banco de Portugal.

Responderei ao illustre Deputado que o Governo se julga auctorizado a assigná-lo (Muitos apoiados); porque, emquanto a Camara não revogar ou modificar os decretos dictatoriaes, estes continuam em vigor (Muitos apoiados), e portanto subsiste o decreto relativo a esse contrato e o Governo pode ainda usar da auctorização que tem. (Muitos apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu).

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Sr. Costa Pinto (Para um negocia urgente): Pedi a palavra para um negocio urgente, mas antes devo declarar á Camara, que se reuniu a commissão administrativa do que V. Exa. é Presidente nato, nomeando para Secretario o Sr. Motta Veiga e distinguindo-me com a escolha para thesoureiro.

Feita esta participação, passo a occupar me do negocio urgente para que pedi a palavra.

Na quarta feira passada, fui procurado, logo de manhã, por alguns chefes do familias que teem filhos a educar no Lyceu Central de Lisboa, apavorados com o boato que correu, de que tinham adoecido com meningite cerebro-espinal alguns alumnos que frequentam este estabelecimento de ensino.

Recebida esta noticia alarmante, entendi do meu dever, em lugar de vir á Camara levantar a questão, dirigir-me immediatamete ao Lyceu de Lisboa onde tenho tambem um filho a educar, para sabor o que havia a tal respeite.

Effectivamente correra o boato de que tinha morrido da epidemia alludida um alumno do 6.° anno, o Sr. Parreiras, uma criança interessantissima, que era o enlevo não só dos professores, que tinham por elle muita consideração, mas tambem dos condiscipulos, que o idolatravam.

O Sr. Claro de Ricca: - Apoiado.

O Orador: - Quando constou no Lyceu, que se tinha dado este fatal desenlace, o reitor d'aquelle estabelecimento o Sr. José Maria Rodrigues havia participado já no Governo o triste acontecimento, e a Direcção Geral do Instrucção Publica tinha dado as mais instantes ordens, para que a junta de saude procurasse saber o que havia a esse respeito. Encontrei, por isso, no edificio os nossos dignou collegas os Srs. Clemente Pinto e Almeida Dias, acompanhados do Sr. Saccadura, que procediam a uma rigorosa inspecção informando-se do que se tinha passado. Os boatos alarmantes não eram, felizmente, verdadeiros. O alumno que falleceu succumbira a uma meningite tuberculosa. Não sei se o Governo recebeu informações differentes das que eu tive. Entendo, porem, que urge, pela voz auctorizada do Sr. Presidente do Conselho, mencionar nesta casa do Parlamento, as informações que S. Exa. tem a esse respeito, para socegar os chefes de familia justamente alarmados. (Apoiados).

É certo, que nos ultimos annos, a população escolar do Lyceu de Lisboa tem augmentado consideravelmente, devido, em grande parte, ao reitor d'aquelle estabelecimento, um dos funcionarios mais distinctos e mais intelligentes que eu conheço.

Todos os elogios que se lhe façam são poucos, e por isso se explica, que todos es que desejam para seus filhos uma boa educação, lh'os confiem á sua guarda.

Não tinhamos um Lyceu preparado para receber uma população escolar de 1:200 alumnos que tantos são os que hoje frequentam o Lyceu.

O Sr. Augusto Ricca: - Apoiado.

O Orador: - O Sr. Heitor fez a diligencia de apropriar o melhor que pôde o edificio; mas é certo que este distincto funccionario não podia fazer milagres. Uma casa que não está apropriada para receber tão elevado numero de alumnos, em condições regulares de hygiene, não pode, de um para o outro momento, transformar-se facilmente. (Apoiados).

É necessario, pois, que o Governo tome urgentes e immediatas providencias; estou certo que nesta questão não haverá divergencias politicas; todos auxiliarão o Governo qualquer elle seja, progressista ou regenerador, a fim de proporcionar aos alumnos um estabelecimento com as condições, hygienicas necessarias para as aulas poderem funccionar. (Apoiados).

Todos nós sabemos que se começou a edificar o Lyceu junto á Igreja de Jesus, onde se gastaram grossas quantias com os alicerces; diz-se, porem, que não é hygienico o sitio escolhido. Peço ao Governo que trate de averiguar, se realmente sitio é bom ou não para se edificar o Lyceu e, se o não fôr, trate urgentemente do obter os meios necessarios para só fazer um edificio apropriado.

Quer-me parecer que não pode haver um só lyceu, e digo isto como Deputado por Lisboa, porque me cumpre zelar os interesses da capital. Entendo que só devem estabelecer tres lyceus, um no centro, outro do lado do oriente e o terceiro ao occidente. (Apoiados).

Estes tres estabelecimentos secundarios podiam ser installados, não em edificios que custassem grossos capitães, mas em construcções singelos. Podiam mesmo construir-se, como existem na Allemanha, umas casas do tijolo e ferro, arejadas e cheias de luz, onde as crianças estivessem sem lhes correr o menor perigo a suade. (Apoiados).

Peço a attenção do Governo para este assumpto, tendo, ocioso é dizê-lo, toda a confiança em que ha de corresponder á espectativa publica, dando immediatas providencias como já o fez, o que é muito para louvar. (Apoiados).

Portanto, o Governo ha de resolver esta questão que, em todo o caso, não é do facil solução. (Apoiados).

(O orador não reviu as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Em primeiro logar respondo ao illustre Deputado com satisfação, para poder tranquillizar o espirito de tantos chefes de familia que, felizmente, não tem havido até agora casos de meningite cerebro-espinal no Lyceu de Lisboa.

Houve effectivamente um caso fatal que se deu com um estudante; mas, não só o diagnostico nunca ao estabeleceu como do meningite cerebro-espinal, como tambem analyse bacteriologica foi absolutamente negativa; o que se apurou é que tinha sido um caso de meningite tuberculosa.

Correu que um outro caso se dera em outro estudante do Lyceu, que se achava em tratamento; mas apurou-se já, porque nestes assumptos V. Exa. comprehende quanto o espirito publico se alarmou e quanto eu fui, por conseguinte, solicitado para dar promptas informações e providencias, apurou-se, repito, que este caso era simplesmente de abcessos dos seios frontaes.

Em todo o caso, assentou-se em que, dia a dia, um dos inspectores sanitarios (Apoiados) fosse ao Lyceu colher informações do Reitor, e apurar quaesquer occorrencias que se dessem, a fim de que as providencias fossem immediatas. (Muitos apoiados).

Foram já desinfectadas as duas salas que eram frequentadas pelos alumnos a que ha pouco me referi (Apoiados), e, portanto, não ha motivo para que só adoptem de prompto providencias mais graves.

Todas as medidas de vigilancia e de prevenção estão tomadas, e até agora não ha caso algum que possa justificar receios, que seriam absolutamente infundados. (Vozes: - Muito bem).

Pelo que toca ás considerações que S. Exa. fez, e muito bem, acêrca das condições em que se encontra o Lyceu de Lisboa, é certo que o mal, que hoje existo, é o de uma exagerada accumulação de estudantes; mas isso resulta da reforma de instrucção secundaria, pois, sobretudo quando se chegou ao quinto anno da sua execução, e se apurou a manifesta superioridade do ensino no Lyceu, confrontando-o com o ensino em outros estabelecimentos particulares, (Apoiados) a affluencia dos estudantes áquelle estabelecimento de ensino augmentou consideravelmente. Para essa affluencia concorreu tambem, e muito, o que S. Exa. disse ha pouco, com inteira justiça e merecido louvor: a maneira zelosissima, previdente, fraternal, com que o Reitor do Lyceu cumpre os seus deveres e olha por todos os serviços d'aquella casa de ensino. (Apoiadas).

A desaccumulação dos estudantes impõe-se effectivamente como uma necessidade, dia a dia mais urgente, por isso que a frequencia vae sendo successivamente maior; não me parece, porem, que o remedio possa estar na edificação de um novo lyceu, construido no sitio projectado,

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ou em outro qualquer ponto, porque o mal é presente e uma edificação evidentemente leva um grande espaço de tempo. (Apoiados}.

No meu entender, a accumulação dos estudantes do Lyceu de Lisboa carece de providencias mais immediatas que a construcção do Lyceu. (Muitos apoiados}.

Ora, neste sentido, tomarei informações para poder providenciar, ou trazer ao Parlamento qualquer proposta, caso careça de auctorização legislativa para obtemperar a esse mal. (Muitos apoiados}.

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu}.

O Sr. Oliveira Mattos (sobre um negocio urgente): - Como vejo presente o Sr. Ministro da Guerra, vou dirigir me a S. Ex.a, a fim de chamar a sua attenção para uns casos de doença occorridos na cidade de Coimbra, nomeadamente no quartel do regimento de infantaria n.° 23, de meningite cerebro-espinal, tendo já feito algumas victimas.

Não sei se S. Exa. terá já conhecimento d'estes casos fataes.

(Signal negativo do Sr. Ministro da Guerra)

S. Exa. diz-me que não; pois é para lamentar, porque a elles se teem já referido os jornaes, pedindo providencias, tanto mais que o Sr. Ministro da Guerra é prompto em as dar noutro genero, e neste caso para admirar é que se tenha mantido em reserva.

Não duvido do que S. Exa. diz; mas vou citar factos que são de bastante gravidade, tendo-se já, repito, dado casos fataes e sendo necessario proceder immediatamente á desinfecção de tres casernas, ou melhor de uma só, mandada effectuar pelo digno commandante do regimento. Parti as outras não a houve. E sem de forma alguma querer fazer politica, nem quaesquer referencias devo, todavia, dizer que, custando essa desinfecção 11$000 réis, o Ministerio da Guerra, parece incrível! não auctorizou aquella verba.

Este facto é muito grave.

A agglomeração e falta de asseio são as causas principaes do desenvolvimento d'aquella epidemia.

Chega a ser inacreditavel que o Sr. Ministro da Guerra não conheça estes casos; e que no Ministerio da Guerra, sob a direcção do actual titular, que tão largo é em esbanjar os dinheiros publicos ás centenas de contos de réis, desorganizando o exercito o descontentando todos, transformando o nosso exercito em arma politica para satisfazer os pedidos d'esta ou d'aquella povoação, para ter um regimento, um batalhão, uma musica (.Riso), gostando-se o que se sabe, e talvez o que não se sabe, como nas celebres manobras de Trajouce, que tanta gloria deram a S. Exa. no pais e no estrangeiro (Riso - Muitos apoiados da esquerda), se não auctorizasse este infimo dispendio.

Effectivamente não se comprehende, que por causa de uma verba tão pequena, 11$000 réis, não se evitasse que naquelle regimento houvesse casos fataes de molestia contagiosa, e não fossem tomadas immediatas providencias! Bem diminuta era esta verba realmente; mas o Sr. Ministro da Guerra não se preoccupa com estas pequenas cousas. Não ha exercito, nem material, nem quadros nos corpos, nem pessoal, como se tem provado; mas as despesas teem continuado, e, portanto, não admira que S. Exa. não se possa occupar com estas pequenas cousas. (Apoiados).

É para este facto simplesmente que eu chamo a attenção do Sr. Ministro da Guerra, não só em nome do regimento a que aliado, mas no interesse d'aquella cidade, onde se teem dado mais casos do meningite cerebro-espinal, dizendo-se que o motivo porque esta doença está irradiando pela cidade é devida ao quartel de 23, que de ha muito está condemnado pelas suas más condições hygienicas, e que não deve continuar-a existir. Por mais de uma vez Coimbra tem representado, e o Sr. Ministro da Guerra não o deve ignorar, acêrca das pessimas condições d'aquelle quartel; por mais de uma vez se tem pedido para elle ser removido para Sant'Anna, ou para Santa Clara; emfim, o melhor era tirá-lo desde já ia Rua da Sophia, que fica no centro da cidade, onde não ha condições algumas de salubridade e hygiene. (Apoiados).

É possivel que S. Exa. ignore que teem sido feitas estas reclamações; mas eu sei que por mais de uma vez ellas teem sido formuladas ao Sr. Presidente do Conselho, quer em representações, quer em solicitações directas em nome dos interesses d'aquella terra.

Uma questão que prendo directamente com a saude publica da cidade, é a questão da canalização dos esgotos.

E, cousa extraordinaria, quando o anno passado se discutiu o Orçamento, eu propus uma emenda, que o sr. relator geral do Orçamento acceitou, e a commissão tambem, para que da verba de 80 contos de réis fosse destinada a quantia de 10 contos para o saneamento da cidade. Essa proposta teve a rara fortuna de ser acceita.

Pois, a breve trecho do encerramento das Camaras, tendo-se já gasto um conto e tanto, suspenderam-se as obras, e nada mais se fez até agora, dando-se por desculpa que não ha dinheiro, o de que não ha lei para maior dispendio. Oh Sr. Presidente! pois então ha lei para tudo; ha lei para se inundar o país do inspectores fiscaes e de inspectores do sêllo; ha lei para todos estes esbanjamentos, e não ha lei para se applicar á cidade de Coimbra uma verba que ficou como sagrada no Orçamento, como pertencente só aquella obra, o que por forma alguma deveria ser desviada para outro fim? O estado da cidade de Coimbra é sempre mau: mas neste momento offerece maior perigo, pelo foco de infecção desenvolvido no quartel de infantaria n.° 23.

Duas cousas peço ao Governo: em primeiro logar, que mande desinfectar todas as casernas alem da que já soffreu esta operação, approvando a verba insignificante gasta nesse serviço, em segundo logar, que faça com que a verba destinada ás obras a que me referi, tenha aquella applicação, acudindo-se assim a uma grande necessidade do saude publica. (Apoiados).

Tenho dito.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Dou a hora de se passar á ordem do dia; os Srs. Deputados que pediram a palavra e que teem papeis a mandar para a mesa, podem fazê-lo.

O Sr. Luiz José Dias: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

1.º

Requeiro que sejam remettidos a esta Camara, com toda a urgencia, os seguintes esclarecimentos pelo Ministerio das Obras Publicas:

Qual o estado em 31 de dezembro de 1901, da verba de 12:000$000 réis destinada a ajudas de custo e subsídios de marcha, consignada na secção 1.º do artigo 3.° do capitulo 2.° do orçamento corrente; indivíduo" que receberam e quanto e por que serviços?

2.°

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, sejam remettidos, com urgencia, á Camara os seguintes dados:

Qqual o estado da verba destinada a ajudas de custo e subsidios de marcha consignada na secção 3.º do capitulo 2.° do orçamento corrente em 31 de dezembro findo e quaes os individuos que recebem, quanto cada um e por que serviços, e os mesmos esclarecimentos com respeito á verba analoga da secção numero do mesmo artigo e capitulo do orçamento corrente?

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

3.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, sejam remettidos a esta Camara, com urgencia, os esclarecimentos seguintes:

Qual a verba despendida com ou chefes do conservação de estradas desde l de janeiro a 31 de dezembro de 1901 o qual a despendida dentro do mesmo periodo cxo a conservação das entradas, discriminando-se as despesas, para cada entrada, do pessoal da do material, o de modo que se conheça claramente o quanto custou o pessoal o material de cada uma das estradas; qual o estado em 31 de dezembro do l901 das duas verbas consignadas nos artigos 6.º e 7.º do capitulo 3.º do orçamento corrente; quanto o liquidado o quanto o pago?

4.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, seja remettido, com urgencia, a esta Camara o seguinte:

Qual o estado das verbas das secções 1.ª o 2.ª do artigo 3.º, capitulo 4.º, do orçamento corrente, em 31 de dezembro de 1901, e quanto se gastam em cada obra com o pessoal e quanto com o material, liquidado e pago, e liquidado e não pago?

5.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, e com urgencia, sejam remettidos a esta Camara os seguintes e esclarecimentos:

Quanto se gastou desde l do janeiro do 1901 até 21 de dezembro do mesmo anno com edificios publicos e mais serviços a que se refere a accção 1.ª do artigo 9.° do capitulo 1.º do orçamento corrente como pessoal o quanto com o material o quanto com a mão de obra em cada um dos edificios ou obras; bem assim qual o estado da verba; da secção 1.ª do artigo 9.º do capitulo 4.° em 31 de dezembro do 1901, liquidado e pago o liquidado e não pago?

6.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, sujam remettidos, com urgencia, a esta Camara os seguintes dados:

Quadro do pessoal do Mercado Central de productos Agricolas em 1 de Janeiro de 1901, designação de categorias e dos vencimentos de cada um; quadro do mesmo pessoal em 31 de dezembro do mesmo anno; fundamentos dos despachos do pessoal que existir a mais no referido dia 31 e quaes os ordenados respectivos.

7.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, seja remettido, com urgencia, a esta Camara o seguinte:

Estado da verba da secção 7.ª do artigo 14.° capitulo 7.º do orçamento corrente em 31 de dezembro do 1901; quem recebeu e por que serviços; liquidado e pago o liquidado o não pago.

8.°

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, sejam remettidos a esta Camara, com urgencia, os seguintes esclarecimentos:

Relação nominal do pessoal empregado na fiscalização da venda do vinhos, azeite" o vinagres, quanto recebo cada um d'esse individuo: e fundamento do despacho que collocou cada um nesse serviço e lhe estipulou o vencimentos e data dos despachos.

9.º

Requeiro que, pelo Ministerio da Obras Publicas, seja remettido, com urgencia, a esta Camara, o seguinte:

Relação nominal do pessoal empregado na fiscalização da venda de leite e lacticinios e do empregado da fiscalização technica do pão e das farinhas; quanto vence um d'estes empregados; fundamento dos respectivos despachos o ordenados e data de cada um d'esses despachos.

10.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, sujam remettidos, com urgencia, a esta Camara, os seguintes esclarecimentos:

Quanto se despendeu da verba de 20:000$000 reis destinada á propaganda para a collocação dos nossos vinhos desde l do janeiro de 1901 a 31 do dezembro do mesmo anno; qual o estado d'essa verba em 3l do dezembro do 1901. Relação nominal dos individuos encarregados d'esse serviço; vencimento do cada um; nome da entidade ou estacão que fez a proposta d'esses individuos e data do despacho de cada um d'elles e seu fundamento.

11.º

Roqueiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, seja remettido, com urgencia, a esta Camara o seguinte:

Relação nominal de todo o pessoal contratado para quaesquer serviços dependentes da pasta das Obras Publicas, com a designação dos serviços a que respeita o contrato, data d'este e preço o duração do contrato.

12.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, seja remettido a esta Camara o seguinte:

Relação nominal dos individuos encarregados da inspecção ás vaccarias de Lisboa; data do despacho e quantitativos do seu ordenado ou gratificação por esto serviço; qual o estado da verba em 31 do dezembro de 1901 destinada a este serviço.

13.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, seja remettido a esta Camara, com urgencia, o seguinte:

Quanto se despendeu desde, l de janeiro a 31 de dezembro do 1901 com o serviço de dunas, discriminando a despesa do material da do pessoal e relação nominal d'este e dos sitios ou localidade onde se fez o serviço. Quanto se gastou dentro do mesmo periodo com o serviço do sementeiras, plantações, serviços das montanhas, descriminando o dispendio com o material e com o pessoal, sitios ou localidades onde se gastou o dinheiro, qual o estado da verba em 3l de dezembro de, 1901, destinado para estes serviços.

14.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, com urgencia, sejam remettidos a esta Camara os seguintes esclarecimentos:

Quanto se despendeu desde l de janeiro a 3l de dezembro de 1901 com a construcção de portos artificiaes e quanto com melhoramento dos existentes, designando-se os sitios das obras o discriminando a despesa da do pessoal do material em cada porto - Estado da verba orçamental relativa a estes serviços em 31 de dezembro do 1901 - liquidado e pago liquidado e não pago?

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas e com urgencia, sejam remettidos a esta Camara os seguintes esclarecimentos:

Estado da verba de 400:000$000 réis, destinada no orçamento corrente á construcção de estrada e grandes reparações e subsidio á construcção das municipaes em 31 de dezembro do 1901: - Quaes as camaras, que tiveram subsidio da verba, quanto cada uma? Quanto se despendeu com reparação e quanto com a construção de novas entradas? Determinação ou designação das estradas construidas, discriminando em cada lanço do ramal ou de estrada a despesa do material da do pessoal e indicando-se se a estrada é obra nova ou se já havia começado a construcção - quando, e para as estradas e lanços de novo come-

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çados, quaes os fundamentos do despacho, que ordenou essa obra.

16.°

Requeira que, pelo Ministerio das Obras Publicas, e com urgencia, sejam remettidos a esta Camara os esclarecimentos seguintes:

Relação nominal de todos os commissarios ou fiscaes nomeados para fiscalizar os actos de companhias, empresas, sociedades anonymas. Nota que cada um fiscaliza, ordenados de cada um d'esses funccionarios; capitulo, artigo o secção orçamental, onde esteja consignada dotação para esse serviço ou, em caso negativo, qual a proveniencia da receita destinada a esses pagamentos e qual a lei, que auctorizou a lançar os impostos respectivos.

17.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, e com urgencia, seja remettido a esta Camara, o seguinte:

Qual o estado da verba a que se refere o artigo 55.° do capitulo 13.º do orçamento corrente, em 31 de dezembro de 1901; quaes as linhas férreas correspondentes aos pagamentos effectuados desde l de janeiro de 1901 a 31 de dezembro do mesmo anno; quanto recebeu cada companhia ou entidade representante d'essas linhas; data e fundamento dos despachos que auctorizaram as ordens de pagamento.

18.°

Roqueiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, com urgencia, rejam remettidos á Camara dos Senhores Deputados os esclarecimentos seguintes:

Qual a despesa com o pessoal do cada um dos serviços organizados ou reorganizados pelo Ministerio das Obras Publicas, tanto em virtude da auctorização parlamentar como em virtude da dictadura?

Relação nominal, relativa a cada serviço, organizado ou reorganizado, do pessoal collocado nesses serviços e que era estranho ao quadro, e tudo referido ao anno de 1901.

19.º

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, com urgencia, sejam remettidas a esta Camara as seguintes notas:

Qual a despesa com o material de cada um dos serviços organizados ou reorganizados pelo Ministerio das Obras Publicas, em virtude de auctorização parlamentar ou em dictadura, durante o anno de 1901.

20.°

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, e com urgencia, seja remettido a esta Camara o seguinte:

Copia das epigraphes ou designações technicas o officiaes de todos os serviços organizados, reorganizados, dos extinctos, durante o anno de 1901, em virtude de dictadura ou de auctorização parlamentar. = O Deputado, Luiz, José Dias.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Carlos Ferreira: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Roqueiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, me sejam enviadas, com urgencia, copias da acta da sessão do Conselho Superior de Agricultura, realizada em 6 de dezembro de 1901; e do relatorio da commissão delegada do mesmo Conselho, relativo ás reclamações contra a percentagem de trigo exotico, propostas pela commissão technica revisora da tabeliã do 3 de abril de 1899. = 0 Deputado, Carlos Ferreira.

Mandou-se expedir.

O Sr. Costa Ornellas: - Mando para a mesa um projecto de lei, que tem por fim constituir a freguesia Arazede do concelho de Montemor-o-Velho, num districto do paz, com sedo em Arazede, continuando a existir o districto de paz de Carapinheira, sem aquella freguesia.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Rodrigues Nogueira: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pela Secretaria dos Negocios da Fazenda me seja enviada copia da correspondencia trocada entre o Governo e o Banco do Portugal, desde 3 de janeiro de 1901 até hoje, relativa ao projecto de contrato que o Governo se auctorizou a fazer por decreto de 22 de novembro ultimo. = O Deputado, A. R. Nogueira.

Requeiro que, com urgencia, me seja enviada pela Secretaria doa Negocios do Reino:

1.° Copia de quaesquer propostas que, porventura tenham sido feitas ao Governo para a exploração do Real Theatro de S. Carlos;

2.° Copia de todos os documentos relativos ao contrato actualmente em vigor.
Roqueiro mais a publicação no Diario do Governo d'este mesmo contrato. = O Deputado, A. R. Nogueira.

Requeiro que, pela Secretaria dos Negocios de Obras Publicas, Commercio e Industria, me sejam enviados com a maior urgencia possivel, os seguintes documentos:

a) Copia doa relatorios enviados á Direcção Geral do Commercio e Industria, no fim do ultimo anno lectivo, pelos directores das escolas industriaes;

b) Se o Governo encarregou algum funccionario de estudar no estrangeiro a Organização dos institutos e escolas industriaes, copia do diploma que o nomeou, copia das instrucções que lhe deu, o copia de todos os documentos relativos á sua missão;

c) Copia de quaesquer documentos officiaes que, porventura, serviram de base ou se referem á ultima reforma dos institutos e escolas industriaes;

d) Relação nominal de todos os professores auxiliares das escolas industriaes, com indicação dos serviços que actualmente desempenham, e das habilitações littorarias que possuem. = O Deputado, A. R. Nogueira.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Frederico Ramirez: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro, pelo Ministerio das Obras Publicas, nota circumstanciada dos logares que exercem os diferentes Deputados para os quaes pediu accumulação de funcções com as legislativas o Sr. Ministro das Obras Publicas. = Frederico Ramirez.

Mandou-se expedir.

O Sr. Antonio Centeno: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que me seja enviada copia dos contratos que desde 26 de junho de 1900 tenham sido effectuados pelo Ministerio da Fazenda, no pais ou fora do país, com entidades portuguesas ou banqueiros estrangeiros por divida fluctuante, supprimentos, contas correntes, aberturas de créditos ou quaesquer outras operações de thosouraria de onde lhe tenham provindo receitas ou renovação de antigos debitos. = Antonio Centeno.

Mandou-se expedir.

O Sr. Francisco José Machado: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que a discussão dos avisos previos seja feita em dias alternados, ficando os dias livres reservados para

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os simples pedidos do palavra antes do ordem do dia. = F. J. Machado.

Envio tambem para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, se mande para a Camara uma notadas funcções que exercem os Senhores Deputados, aos quaes se refere o pedido do accumulação, apresentado pelo respectivo Ministro. = F. J. Machado.

Mandou se expedir.

A proposta ficou para segunda leitura.

O Sr. Motta Veiga: - Mando para a mesa uma proposta de renovação de iniciativa do projecto de lei n.° 89 de 190l, relativo a contar a Francisco Ribeiro Nobre, professor do Lyceu Central do Porto, para os officios da sua aposentação, o tempo que serviu no exercito.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Mendes Leal: - Mando para a mesa uma proposta de renovação de iniciativa do projecto do lei n.° 49 de 1901, que tem por fim auctorizar a Camara Municipal do Celorico da Beira, a cobrar a porcentagem de 75 por cento addicionaes, ás contribuições directas do Estado, para despesas com o serviço espacial da instrucção primaria.

Ficou para a segunda leitura.

O Sr. André de Freitas: - Mando para a mesa uma proposta de renovação de, iniciativa do projecto do lei n.º 29, de 1901, que no refere a isenção da contribuição de registo, pela compra de um predio o terreno adjacente que a Santa Casa da Misericordia da Horta adquiriu para construcção de um hospital.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. José de Alpoim: - Eu tinha pedido a palavra para um negocio urgente. Bastam-me apenas dois minutos.

O Sr. Presidente: - É a hora de se passar á ordem do dia, mas como o assumpto urgente prefere, eu darei a palavra ao Sr. Deputado na sua altura.

Agora vou concedê-la ao Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Ministro da Guerra (Pimentel Pinto): - Pondo do parte as considerações feitas pelo Sr. Oliveira Mattos, acêrca dos meus esbanjamentos, que se realizaram no outomno de 1901 e ainda acêrca das reformas decretadas, que S. Exa. diz que desorganizaram o exercito, e que tambem descontaram toda a gente, e abstrahindo tambem das considerações feitas por S. Exa., não porque ou não tenha toda a consideração pela palavra illustrada do Sr. Oliveira Mattos, mas porque tendo já dado a hora de entrar na ordem do dia, como a Camara acaba de, ouvir, devo e vou limitar-me a responder precisamente ao assumpto a que S. Exa. se referiu, assegurando todavia, ao illustre Deputado que ou estou aqui todos os dias em que me mandam avisos previos, o sempre prompto a responder pelos meus actos. (Muitos apoiados).

O Sr. Oliveira Mattos: - Cá estaremos.

O Orador: - E eu cá estarei, e sempre ás suas ordens. (Muitos apoiados).

Pondo, por isso, do parto aquellas considerações vou responder...

O Sr. Oliveira Mattos: - V. Exa. não fará como o Sr. Ministro das Obras Publicas que não vem ao Parlamento.

O Orador: - Se S. Exa. não está hoje aqui é por um motivo que todos conhecem e que é digno de respeito.(Muitos apoiados).

O illustre Deputado quando está doente tambem não vem. (Muitos apoiados).

O Sr. José de Alpoim: - V. Exa. não tem o direito de falar d'essa maneira; quem em l900 procedeu como a opposição regeneradora, pedindo a todo o transe a presença do Sr. Luciano de Castro, gravemente enfermo.

Note-se a differença do proceder...

O Orador: - Sabe-se que este ponto está justificado para a Camara, e se não está justificado para a Camara, está para o país.

(Interrupção).

Eu não discuto a idéa; V. Exa. é que alludiu á doença do Sr. Ministro das Obras Publicas; e, o Sr. Deputado Oliveira Mattos é que se referiu ao Sr. Vargass, não fui eu.

Mas, respondendo precisamente á pergunta feita pelo Sr. Oliveira Mattos, devo dizer que, effectivamente antes de vir hoje para a Camara, não sabia que houvesse em Coimbra qualquer caso de meningite cerebro-espinal. E devo accrescentar, que já hoje vi toda a correspondencia que precisava do deliberação minha, recebida hoje mesmo no Ministerio, e nella não encontrei uma só palavra sobre o assumpto a que se referiu S. Exa.

Direi mais ainda; por acaso estive hoje, não só com o Chefe, da 6.º Repartição, mas tambem com o Sub-Chefe e nem um nem outro d'estes funccionarios me falaram d'esse gravissimo assumpto.

Mas, depois de entrar nesta Camara, um amigo meu me falou do assumpto a que S. Exa. acaba de referir-se. E para mostrar ao illustre Deputado, que o Ministro da Guerra não descura as suas obrigações, já aqui mesmo da Camara expedi um telegramma ao commandante do regimento n.° 23 perguntando: «se no regimento havia alguns casos de meningite corebro-espinal, quantos, só algum tinha sido fatal, e que se algumas providencias, que dependessem do Ministerio da Guerra, se tornavam necessarias, por telegramma seriam adoptadas». (Muitos apoiados).

Creio ter respondido satisfatoriamente a S. Exa. (Muitos apoiados).

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. José de Alpoim (para um negocio urgente): - Tratando do assumpto urgente para que pedi a palavra, tomarei á Camara simplesmente dois ou tres minutos, mas, antes d'isso, peço á Camara que me desculpo a forma um pouco arrebatada, talvez, por que interrompi o Sr. Ministro da Guerra, quando S. Exa. se dirigia a nós, ao referir-se ao seu collega das Obras Publicas.

Da parte da opposição progressista ainda não se reclamou, sequer, a presença do Sr. Conselheiro Vargas.

Se o Sr. Ministro da Guerra quer fazer rhetorica á nossa custa e por motivo tão insignificante, não lhe podemos perdoar sem protesto.

Está na memoria de todos o que aconteceu ao nobre chefe do partido progressista, Sr. Luciano do Castro, quando o seu estado de saude era gravissimo. Todos sabem, que todos os dias nesta Camara se reclamava a sua, presença de uma maneira tenaz, apesar dos Ministros presentes se acharem aptos para responder.

É necessario que o país inteiro faça o confronto entre o nosso procedimento e o da maioria actual.

Nós não a seguiremos nesse caminho.

Pedindo de novo desculpa á Camara pela forma um pouco arrebatada com que me levantei, quando o Sr. Ministro da Guerra se referiu ao Sr. Conselheiro Vargas, vou entrar immediatamente no assumpto para que pedi a palavra.

Eu disse que precisava apenas de dois ou tres minutos o esse tempo me basta.

Recebi ha dias noticia do estado anarchico em que se encontra a ilha da Madeira, pelas provocações dos agentes do Governo.

Todos sabem os factos, irregulares que só deram, quando foi das eleições dos Deputados.

Mas, isso ha de ser discutido a seu tempo; não é a esses factos que me retiro agora.

Sei que se vão realizar as eleições da junta districtal e

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das camaras municipaes no dia 19. O Governador Civil já designou o local e o dia em que se devem effectuar essas eleições.

As auctoridades da Madeira fizeram saber, que hão de por todas as formas, por todos os meios, correctos eu incorrectos, a bem ou a mal, ganhar as eleições.

Sr. Presidente, á frente do Commissariado Geral da Policia do Funchal e dos concelhos de Lobos e Machico, estão empregados pronunciados por crimes, e que apesar da pronuncia, continuam á frente dos seus cargos fazendo gala da confiança que o Governo nelles deposita, o dizendo, que hão de levar por deante a sua obra de expoliação contra o partido progressista.

Chegou a tal ponto o proposito de prejudicar os nossos correligionarios, que não ha quasi policia civil na cidade do Funchal. Os agentes policiaes andam distrahidos a fazer ameaças aos eleitores, e a policia da cidade é feita por praças do regimento de infantaria 27.

Só em um dia, foram nomeados para afastar eleitores progressistas, 280 cabos do policia!

A imprensa regeneradora dá a perceber que vae para ali um navio de guerra, com o pretexto de fazer honra aos navios estrangeiros, mas effectivamente para exercer funcções de galopinagem eleitoral.

Toda a Camara sabe, que por occasião da eleição de Deputados chegou a desembarcar a marinhagem para intimidar os eleitores.

Sr. Presidente: tenho tambem do participar ao nobre Presidente do Conselho e a V. Exa., que se procura usar de expedientes sobremaneira odiosos a fim de evitar que os progressistas votem nessas eleições.

As eleições na Madeira costumam realizar-se nos templos e não em outros edifícios. O proposito agora annunciado pelo Governador Civil, é fazer com que as eleições se effectuem nas escolas municipaes e em outros edificios, a fim de que ás oito horas da manhã, a policia o a força armada se aposse das salas o evitar por esta forma que os progressistas entrem no local, obstando que o presidente da mesa se possa fazer acompanhar dos seus amigos, para lançar mão de todos os meios violentos, de maneira que, as eleições lhes sejam favoraveis, em um ponto onde o partido regenerador quasi não tem elementos.

É no dia 10 do corrente que o Governador Civil tem de fixar o edital marcando o local onde deve effectuar-se a eleição.

Foi por isso que pedi a palavra a V. Exa., a fim de que o Governo exerça a sua acção directa e seja cumprida a lei, se porventura uma acção benefica pode entrar no seu coração.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - O Sr. Ministro das Obras Publicas não tem vindo ao Parlamento nestes dias porque realmente não tem podido.

O Sr. Alpoim: - Quem disso o contrario?

O Orador: - Disse o illustre Deputado.

O Sr. Alpoim: - Peço perdão a V. Exa. Estamos aqui a discutir com o respeito devido ao Parlamento. V. Exa. tem bastante talento e escusa de recorrer a esses processos. Falo com esta energia porque me revolta e magoa que V. Exa. diga isso.

(Sussurro).

Não tem aqui vindo o Sr. Vargas, e nós não fizemos nenhuma reclamação.

O Orador: - O illustre Deputado exerce o seu direito parlamentar como entende, o eu cumpro o meu dever de solidariedade ministerial como entendo e devo. (Muitos apoiados).

Ouvi arguir violentamente o Sr. Ministro das Obras Publicas. (Apoiados).

(Sussurro).

Ouvi atacar com violencia os actos do Sr. Ministro das Obras Publicas e com apreciações de todo o ponto apaixonadas. (Apoiados).

O illustre Deputado, que timbra em ser correcto na sua acção parlamentar, ha de permittir que eu o seja tambem.

Faltaria a um dever de correcção, a um dever de solidariedade para um collega meu, se neste momento em que ouvi no Parlamento, onde S. Exa. não está, porque não pode estar (Apoiados), arguições graves que, creio, se S. Exa. estivesse presente, o podiam molestar e o levariam ou a um desforço parlamentar, como pode praticar um Ministro, ou em todo o caso a uma justificação dos seus actos e da sua vida publica, faltaria, repito, a um dever sagrado se não viesse defender o meu collega. (Apoiados).

O illustre Deputado ha de consentir que emquanto tenha voz no Parlamento defenda os meus collegas.

Interrupções do Sr. José de Alpoim e de outros Srs. Deputados que não foram percebidas.

O Orador: - Sr. Presidente: eu não proferi uma palavra que pudesse traduzir um desacato a qualquer dos membros da opposição parlamentar. (Muitos apoiados).

Eu timbro sempre em ser respeitador de todos aquelles que me escutam. (Muitos apoiados).

Mas ha uma cousa que ninguem pode estranhar, é que eu defenda os meus collegas por todas as formas e tanto quanto possa. (Muitos apoiados).

O Sr. Ministro das Obras Publicas não está, porque não pode estar (Muitos apoiados), mas encontra-se presente o chefe do Governo que responde por qualquer arguição que se faça a esse Ministro. (Muitos apoiados).

Interrupções da esquerda parlamentar.

O Sr. Fialho Gomes: - Então diga V. Exa. quem ao os commissarios regios nomeados pelo Sr. Ministro das Obras Publicas.

(Sussurro).

O Orador: - Os illustres Deputados mandam para a mesa os seus requerimentos; aguardem, pois, as respostas, que não deverão demorar. (Muitos apoiados).

(Interrupções).

Estamos no segundo dia da sessão parlamentar e creiam os illustres Deputados que nem acêrca d'este assumpto, nem de qualquer outro, o Governo receia a discussão. (Muitos apoiados).

Os illustres Deputados com phrases vehementes verberam o procedimento politico do Governo, mas o Governo que praticou a dictadura, traz á Camara o bill de indemnidade e abre se logo a discussão...

(Sussurro).

(Interrupções).

Se ha arguições ao Ministerio, não as ha fundadas em factos. (Apoiados).

(Interrupções).

O Sr. Alpoim: - Quando se discutiu a reforma eleitoral V. Exa. sairam. (Apoiados).

(Interrupções).

O Orador: - Posta uma questão previa, direi que a situação era entra.

A opposição parlamentar não podia naquelle assumpto cooperar com o resto da Camara, quando entendia que esta não tinha com potencia para o discutir. (Apoiados).

(Interrupções que não foram ouvidas).

Quer o illustre Deputado dizer que o Parlamento não tem competencia para conhecer de um bill, da regularidade ou irregularidade dos actos do Governo?

Quanto isto é differente!

Mas não foi só dictadura que o Governo exerceu; usou de auctorizações.

O illustre Deputado annunciou uma interpellação sobre o assumpto, e eu immediatamente me de dei por habilitado (Apoiados); quando essa discussão vier, e vem breve decerto, S. Exa. terá vasto ensejo de fazer todas as suas

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accusações ao Governo; e, quando o Governo se justificar, então V. Exa. verá se elle justifica bem ou não. (Apoiados).

Posto isto, Sr. Presidente, eu respondo assim por um motivo: os illustres Deputados podem apreciar como entenderem os actos do Governo, mas emquanto vierem só com declamações, com phrases mais ou menos bem architectadas, mas sem argumentos...

(Interrupções que não ouviram).

Vozes: - Ordem, ordem.

O Orador: - Emquanto vierem, repito, só com declamações vagas, ficam apenas as suas proprias declamações; mas, quando vierem com factos e argumentos, hão de, ver então que o Governo lhes responde.

E, deixem me dizer uma cousa: eu respeito muito S. Exa. mas não me arreceio discussão. Podem atacar o Governo pelos actos de dictadura, pelo uso das auctorizações, por tudo quanto elle tem feito, que aqui estará quem lhes responda.

O Governo, repito, não se arreceia da discussão. (Muitos apoiados).

Agora vou responder á pergunta do illustre Deputado.

O Sr. Alpoim pediu a palavra para um assumpto urgente, o qual se restringe atinai á eleição de corpos administrativos que um breve deve realizar-se no districto do Funchal.

O illustre Deputado não me tinha prevenido do que vinha hoje chamar a minha attenção para este assumpto..

O Sr. José fie Alpoim: - Foi urgente.

O Orador: - Bem sei que foi urgente, mas o illustre Deputado está hoje tão susceptivel que nem me deixou terminar o periodo.

Eu não dizia isto para o arguir por me não haver prevenido, mas somente para completar o período que S. Exa. me interceptou.

O que eu ia si dizer é que o illustre Deputado me não tinha prevenido de que hoje vinha chamar a minha attenção sobre esse assumpto; e, todavia, eu tinha dado já as instrucções mais completas formaes ao Sr. Governador Civil do Funchal, indo até ao ponto de lhe dizer que preteriria perder a eleição de qualquer camara municipal, a que no Funchal houvessem violencias, pressões, perturbações de ordem publica. (Apoiados).

Já vê V. Exa., portanto, que fui adeante do seu proprio desejo.

Ha, porem, uma cousa de que eu não posso abdicar, é do meu dever de fazer manter a ordem o impedir que qualquer a procure perturbar, porque a lei tem de ser a mesma para todos.

A repressão tem do ser igual para um e outro lados. Eu não posso deixar que uma parcialidade qualquer proteja actos que sejam violencias ou exorbitancias. (Apoiados).

Repressão só para os meus amigos politicos, não! Para todos, sim!

E o que o illustre Deputado pode exigir de mim é que faço manter a ordem por igual, e que os meus delegados procedam de forma que os direitos individuaes se manifestem [ilegível] aconselhar e resolver, e no que toca ao procedimento d'esses magistrados syndicados lá estão os tribunaes o a propria lei para ser cumprida. (Apoiados).

Se não o for pela minha parte, então o illustre Depuputado virá combater e arguir-me.

O que não posso é ser justo para com amigos e injusto para com os meus adversarios até ao ponto de sor parcial. (Apoiados).

Em relação á eleição do Funchal, repito, prefiro perder qualquer eleição de camara municipal, a que seja perturbada a ordem publica.

Hw de usar do toda a repressão, seja para que parcialidade for. Com isto pode o illustre Deputado contar, e neste sentido dei precisas ordens ao (Governador Civil do Funchal. (Muitos apoiados).

Vozes: - Muito bom.

(S. Exa. me reviu).

O Sr. Presidente: - Constando-me que está nos corredores da sala o Sr. Visconde do Reguengos (Jorge), a fim de prestar juramento, convido os Srs. Conde de Paçô Vieira o Moraes de Carvalho Sobrinho a introduzirem-o na sala.

Foi introduzido, prestou juramento e tomou assento.

O Sr. Lourenço Cayolla: - Pedi a palavra para fazer algumas considerações da maior importancia ao Sr. Presidente do Conselho; mas antes d'isso devo dizer que oxalá a promessa de S. Exa., com respeito á eleição da Madeira, Beja cumprida.

V. Exa. e a Camara sabem que lavra no país, com excepcional gravidade, a febre aphtosa. Essa epidemia tem-se propagado em muitos pontoa do país, e em grande parto no districto de Portalegre; é uma epidemia para a qual o Governo deve tomar providencias energicas o immediatas, porque ella não só dizima grande parte do gado caprino, ovino o suino, mas pode mesmo tornar-se contagiosa á raça humana. (Apoiados).

Eu não pergunto agora ao Governo quaes são as providencias que tem empregado para combater a epidemia da febre aphtosa; este assumpto depende, em graudo parte, da pasta do Sr. Ministro das Obras Publicas; e eu sou, como todos os collegas d'esta minoria, dou que neste momento não reclamam a presença de S. Exa. neste logar (Apoiados); não pergunto, pois, ao Governo quaes as providencias que tenciona empregar para combater a epidemia; o que desejo é communicar ao Sr. Presidente do Conselho um facto, que é grave.

Como disse, em Portalegre existe a febre aphtosa. O Governador Civil de Evora prohibiu a entrada do gado caprino, ovino e suino no seu districto, proveniente do districto do Portalegre.

É uma medida que está na alçada das suas attribuições o que seria logica e conveniente, se o districto de Evora não estivesse tambem invadido pela febre aphtosa. Mas não só dá este caso.

Tenho aqui um jornal, que dispõe sempre de uma informação a mais cuidada e a mais auctorizada possivel, que diz o seguinte.

(Leu).

Quer dizer a febre, aphtosa está espalhada no districto do Evora, o até na propria cidade capital do districto. Pois apesar d'isto, o governador civil de Evora entendeu que devia prohibir a entrada de gado do districto de Portalegre no seu districto, que tambem está infestado da mesma molestia.

Eu não comprehendo este cordão sumario entre duas povoações igualmente, infestadas pelo mesmo mal. (Apoiados).

O facto causa um terrivel prejuizo aos lavradores do districto de Portalegre, que teem de reduzir os mercados para os seus gados apenas aos pontos do districto, e não podem ir ao de Evora, onde nesta epoca ha uma das fei-

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ras mais importantes do pais (Apoiados), o onde poderiam obter lucros para a sua industria. (Apoiados).

Peço, portanto, ao Sr. Presidente do Conselho que chame a si esta questão, que a estude e a resolva. A medida tomada pelo governador civil de Evora pode ser muito radical, mas é extremamente lesiva para os interesses dos lavradores de Portalegre e sem vantagem nenhuma para a saude publica. (Apoiados).

Repito, se o districto de Evora não estivesse infestado pela febre aphtosa, eu não me atreveria a criticar a resolução tomada pelo governador civil; mas não acontece assim; este funccionario tem conhecimento de que a febre aphtosa existe na propria capital do districto, o portanto a ordem d'aquella auctoridade pode ser muito radical, mas é lesiva dos interesses dos lavradores e sem vantagem para a saude publica. (Apoiados).

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho, de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - É certo que, por virtude da vinda pela raia, do gado suino principalmente, se teem dado casos de febre aphtosa em alguns pontoa do país, e até mesmo em Lisboa. Esto facto motivou providencias immediatas, que foram tomadas, porque muito embora, segundo o parecer dos technicos a febre aphtosa não seja de effeito prejudicial, em extremo, para as pessoas que bebem o leite, todavia era um caso grave, porque nas vaccarias de Lisboa, aconteceu, muitas vaccas morrerem d'esta doença. Por isso o Governo fez com que os subdelegados de saude exercessem toda a vigilancia nos estabulos (Apoiados), a fim de que o leite, que fosse ministrado ao publico, estivesse em boas condições, e recommendassem, alem d'isso, que o leite fosse fervido, isto em Lisboa é claro, porque nas regiões mais proximas da raia, se tem dado casos como os que o illustre Deputado referiu.

Eu não tenho conhecimento das providencias do Sr. Governador Civil de Evora, a que o illustre Deputado se referiu, mas informar-me-hei; e se o illustre Deputado effectivamente, pelo facto que citou, tiver razão fundada para arguir a deliberação tomada pelo Sr. Governador Civil de Evora, no que toca á prohibição de entrada do gado que vá de Portalegre para Evora, eu acompanharei o illustre Deputado nas suas razões.

Por emquanto não tenho claras informações para sobre o assumpto assentar um juizo que apresento á Camara, e não me animo a dizer que a providencia tomada pelo Sr. Governador fosse infundada, porque não conheço bastante as circumstancias peculiares em que se encontra, sob este ponto de vista, o districto de Evora; o que sei é que effectivamente foi prohibida a entrada de gado em Evora.

O illustre Deputado podo coutar que as instrucções a transmittir ao Governador Civil, serão as de livre transito se d'ahi não resultar prejuizo para os lavradores. (Muitos apoiados).

Tenho dito.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Antonio Cabral (para um negocio urgente): - Eu tomo muito pouco tempo á Camara. O assumpto a que me vou referir é do ordem publica, e não me esqueço das declarações feitas pelo illustre leader da minoria, o meu amigo Sr. Francisco Beirão, ao cair o ministerio progressista, de que este partido nunca fazia politica das questões de ordem publica. Eu não faço politica com o assumpto que vou tratar, mas entendi do meu dever, chamar a attenção do Governo, e especialmente do Sr. Ministro da Guerra, para o assumpto a que me vou referir, porque entendo que é melhor prevenir do que remediar.

Recebi hoje da Guarda informações de que se receiam graves alterações do ordem publica nesta cidade, á semelhança da que se deu no dia l de janeiro, em que como o Governo sabe, houve alteração da ordem, chegando-se a disparar tiros o onde uma pobre velha foi espancada e ameaçada com um revólver.

Receíam-se graves tumultos quando só transferir uma das companhias d'aquelle regimento para Pinhel.

V. Exa. sabe, que nestas questões de ordem publica é melhor prevenir do que remediar; e por isso entendo, da minha obrigação, chamar a attenção do Governo para este assumpto, por isso que vejo que, durante o consulado d'este Governo, a ordem publica está sendo alterada por todo o país.

V. Exa. sabe, que tem havido tumultos em Torres Novas, no Sobral do Monte Agraço, em Alpiarça, em Lagos e na Guarda; e tambem em Mirandella houve alteração de ordem publica!... Mas como é que isto se ha de estranhar? Se o Sr. Hintze Ribeiro não teve prestigio para manter a ordem no seu partido, como o ha de ter para manter no país?!... (Apoiados). Não posso por isso, a este respeito, ter confiança no Sr. Presidente do Conselho.

Em todos os ramos do serviço publico, S. Exa. é um verdadeiro perturbador. Como ha de, pois, manter a ordem publica o chefe de partido que dispõem do prestigio que S. Exa. tem? (Apoiados).

Não confio, repito, no Governo para manter a ordem publica.

Quando ao Sr. Hintze Ribeiro se aponta a responsabilidade de qualquer facto, S. Exa. mettendo a mão na sobrecasaca, diz: «que assume as responsabilidades de tudo!» Mas todos nós sabemos em que ellas consistem!... Mas sejam de que ordem forem, quero exigiras responsabilidades do Sr. Hintze Ribeiro e do Sr. Ministro da Guerra, e quando se fizer a transferencia do regimento n.° 14 para Pinhel houver qualquer alteração de ordem publica.

Chamo para este assumpto a attenção do Sr. Presidente do Conselho, a quem está incumbida a ordem publica no país, e do Sr. Ministro da Guerra, porque creio que tambem depende de S. Exa. a acção directa sobre este assumpto.

Todos sabemos qual é a disciplina do sr. Ministro da Guerra no exercito e o que S. Exa. tem feito para a manter, depois da bella figura do exercito em Trajouce!...

Entendo dever chamar a attenção do Governo para este assumpto, a fim de evitar a repetição de factos como os que se deram no principio d'este anno, quando se fizer a transferencia da companhia para Pinhel.

Não desejo resposta, quero frisar este facto, por isso que desejo chamar o Governo á responsabilidade se não adoptar as providencias, que devia tomar.

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro da Guerra (Pimentel Pinto): - Sr. Presidente: vou dizer apenas duas palavras, em resposta ao que acaba de dizer o Sr. Antonio Cabral. Sobre a questão geral de ordem publica, o Sr. Presidente do Conselho responderá se quiser; eu vou responder apenas ás considerações feitas por S. Exa. acêrca do assumpto que propriamente me toca.

Se em qualquer occasião mo affirmassem, que no regimento de infanteria n.° 12, podia haver alteração de ordem ao dar-se cumprimento a qualquer determinação - e decerto se S. Exa. o disse foi porque nesse sentido recebeu informações - eu a priori duvidaria de tal affirmação, pelo conhecimento que tenho do espirito de disciplina que ha no exercito (Apoiados) e ainda pelo conceito que me mereço e mereceu ao meu antecessor, o commandante do regimento.

O Sr. Antonio Cabral: - As desordens que se receiam, não é por parte dos soldados, mas sim da população da cidade.

O Orador: - Julgava que V. Exa. alludisse aos militares.

Pelo lado militar, a priori eu duvidaria e diria mesmo,

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que nada haveria, porque o soldado português obedece sempre quando recebe uma ordem. (Apoiados). Mas, todas as opiniões, todas as affirmações a priori são contingentes, porque, tantas vezes os proprios factos se incumbem de as contrariar.

No caso sujeito, só posso dizer, e então a posteriori, que a companhia devia ter saído hontem da Guarda, o que até este momento o Governo não tem a mais pequena noticia do que houvesse no regimento, nem na cidade, a mais pequena alteração de ordem. (Muitos apoiados).

O Sr. Antonio Cabral: - Mas não tem ainda de sair outra companhia?

O Orador: - Não senhor. A companhia que tinha de sair, deveria tê-lo feito hontem. (Apoiados).

O Sr. Antonio Cabral: - A carta que recebi foi escrita hontem; por consequencia antes da companhia sair. Se não houve desordens felicito-me por isso.

O Orador: Creio pois, que tive a felicidade de poder convencer o illustre deputado de que eram infundados os teus rateios. (Apoiados).

Tenho dito.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: Ainda ha mais dois Srs. Deputados que pediram a palavra para negocios urgentes. Um é o Sr. Alpoim, que deseja referir-se á crise agricola do concelho de Alemquer. A mesa não julgou urgente esse assumpto. O outro é o Sr. Vellado da Fonseca que deseja tratar das providencias que o Governo devia tomar em relação ao Lyceu do Lisboa, por causa da epidemia da meningite cerebro espinal

Esse assumpto tambem a mesa não o julga urgente porque já está tratado.

Por consequencia, vou consultar a Camara, como o regimento mo obriga, sobre se permitte que eu dê a palavra e estes Sra. Deputados.

(Consultada a Camara resolveu negativamente).

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á

ORDEM DO DIA

Discussão do parecer n.° 3 (bill de indemnizado)

Leu-se na mesa e é o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 3

Senhores: - A vossa commissão incumbida de emittir parecer sobre, a proposta de lei n.° l- A, respeitante a actos da natureza legislativa praticados pelo Governo no periodo inter parlamentar, vem expor vos o resultado do seu exame.

A proposta do lei n.º l-A refere-se a actos de, natureza de diversa ordem:

1. - Reforma do processo da eleição e da organização da Camara dos Senhores Deputados (decreto de 8 do agosto de 1901).

2. - Bases da reorganização da administração e serviços municipaes de Lisboa (decreto de 8 do agosto de 1901).

3. - Approvação do contrato da Camara Municipal do concelho da Bouças para abastecimento do agua (decreto de 27 de setembro de 1901).

4. - Autorização á gerencia municipal de Lisboa para contrahir um emprestimo de 400:000$000 reis (decreto de 24 de dezembro do 1901).

5. - Auctorização á Fazenda Publica para modificar o contrato com o Banco de Portugal em determinadas condições (decreto de 22 do novembro do 1901).

6. - Reforma do serviço do recrutamento militar; auctorização para applicar algumas quantias do fundo das remissões a melhoramentos do material de guerra, bem como a adquirir armamento para a defesa doa portos de Lisboa o Porto; regulamento da reforma, por equiparação, dos officiaes do exercito; plano da reorganização do exercito ( 5 decretos de 19 do outubro do 1901).

7. - Isenção temporaria do imposto de exportação a favor do algodão produzido na provincia de Angola, e estabelecimento de premios para os agricultores, concedendo o beneficio da restituição do imposto de producção do alcool o aguardente, produzido nas provincias do Angola e Moçambique e exportado para portos nacionaes ou estrangeiros (3 decretos de 2 de setembro de 1901).

8.- Reorganização das forças militares do ultramar (decreto de 14 de novembro de 1901).

9.- Providencias reclamadas pela crise da viticultura (decreto de 14 de junho do 1901).

10. - Reforma do ensino a cargo do Instituto do Agronomia o Veterinaria (decreto de 11 de outubro de 1901).

1. - Reformado processo da eleição o da organização da Camara dos Senhores Deputados (decreto de 8 de agosto do 1901).
2.
O decreto de 8 do agosto do 1901, que, reformou a lei eleitoral, publicado em seguida á dissolução da Camara electiva por decreto de 4 de junho do mesmo anno, representa a realisação do proposito do reformar a lei eleitoral expresso no discurso que Sua Majestade se dignou ler perante as Côrtes d'aquelle anno.

Do mesmo modo que acontecimentos anormaes, succedidos na Camara dos Senhores Deputados, obrigaram o Gabinete, como Governo parlamentar, a propor a dissolução da Camara electiva, assim o interesso do país e o aperfeiçoamento das instituições representativas determinaram a publicação do decreto do 8 de agosto de 1901.

A substituição dos circulos uninominaes pelos circulos plurinominaes com lista, incompleta, alem de traduzir uma aspiração liberal, possue vantagens consideraveis. O systema dos circulos plurinominaes com lista incompleta imprime, ao suffragio uma elevada significação politica, emancipa o acto eleitoral dos restrictos interesses locaes, difficulta as pressões de toda a ordem o concorre efficazmente para a solida organização dos partidos politicos. De resto, a experiencia das eleições realizadas com os circulos uninominaes em 1897, 1899 o 1900 demonstrou a necessidade de fazer resurgir o systema dos circulos plurinominaes, consignado em parte na reforma do 1884, e mais tarde, em 1884, generalizado a todo o país, corrigindo-o devidamente pela adopção da lista incompleta.

A suppressão das commissões do recenseamento eleitoral, a simplificação do processo administrativo da revisão do recenseamento, o alargamento do prazo dos recursos para o poder judicial, a definição rigorosa das attribuições e responsabilidades do Secretario recenseador, o processo de supprir a indevida emissão de eleitores no recenseamento e o modo de eliminar os eleitores nelle inscriptos, a competencia dos tribunaes administrativos para rever a divisão das assembléas, o novo processo de escolher os presidentes das mesas eleitoraes, o outras disposições que se encontram no decreto de 8 do agosto de 1901, são providencias respectivamente determinadas pela experiencia, dos ultimos annos, ou pela adopção do escrutinio do lista incompleta.

2. - Bases da reorganização da administração e serviços municipaes de Lisboa (decreto do 8 do agosto de 1901).

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O decreto de 8 de agosto de 1901, que estabelece as bases da reorganização da administração e serviços municipaes de Lisboa, obedecendo á mesma orientação dos diplomas posteriores á lei do 18 de julho de 1885, relaciona mais intimamente os serviços do municipio de Lisboa com a acção do poder central.

A intima connexão que prende os serviços da policia de segurança e da extincção dos incendios, prova que elles devem ser collocados em situação parallela, subordinados á mesma repartição superior, de modo que se prestem mutua e efficaz coadjuvação.

A attribuição do Governo relativamente ao serviço do abastecimento de carnes verdes habilita-o a intervir, segundo as circumstancias, na melhor solução das questões connexas com esse abastecimento.

Como se dizia na proposta de lei apresentada ás Camaras na sessão de 16 de abril do anno transacto, o desenvolvimento da cidade do Lisboa, quer pela tendencia geral do concentração da população nas agglomerações urbanas, quer pelo incremento que lhe trazem, mercê do seu porto o situação geographica, o commercio o transito internacional e especialmente o commercio com as provincias ultramarinas, impõem á Camara Municipal indeclinaveis e gravosos deveres relativamente ao saneamento e embelezamento da cidade, á conservação, limpeza o melhoramento das ruas o logares publicos, a tudo que interessasse a commodidade, attractivos e policiamento de uma cidade frequentada por estrangeiros em numero cada vez mais accreacido. A construcção de canos de esgoto, lavadouros e balnearios, a abertura de novas ruas e avenidas, a construcção de novos bairros, a transformação de bairros infectos em saudaveis agglomerados de população, demandavam desvelos persistentes da parte da vereação. E para que no desenvolvimento material da cidade se procedesse com regrada prudencia, evitando desperdicios e aproveitando utilmente todos os recursos do municipio, tornou-se urgente a elaboração de um plano geral de melhoramentos, a que se subordinassem todas as obras de construcção. A esta necessidade acudiu a base 3.ª do decreto, fixando-se definitivamente o quadro do pessoal dos serviços technicos, para os quaes serão chamados, de futuro, funccionarios do Ministerio das Obras Publicas, Commercio o Industria, quando as vagas occorrentes não hajam de ser preenchidas com empregados addidos, ou não o possam ser pela promoção dos actuaes empregados, cujos interesses adquiridos é equitativo respeitar.

Das alterações decretadas nos serviços municipaes resultou a conveniencia de reduzir-se a quinze o numero de vereadores, como foi fixado pelo Codigo Administrativo de 1896, revogando-se o decreto de 11 de outubro de 1899 que, conforme a base 9.ª da lei de 26 de julho do mesmo anno, elevou esse numero a dezasete. A alteração do numero de vereadores importou alteração da sua actual distribuição pelos circulos eleitoraes do municipio.

Continúa pertencendo ao Governo a designação do vereador que ha de exercer a presidencia da Camara Municipal de Lisboa, ficando, porem, a acção do poder central desprendida de restricções actualmente vigentes. Segundo o Codigo Administrativo, a nomeação é, em regra, annual, e o vereador nomeado só pode ser removido da presidencia por motivos determinados e comprovados. Pela base 5.ª d'este decreto, o presidente pode ser sempre substituido no cargo por outro vereador da escolha do Governo, consoante a este pareça mais conveniente á administração do municipio ou do Estado.

Tambem é remodelada a divisão dos circulos eleitoraes do municipio do Porto. Está este municipio dividido em quatro circulos eleitoraes, tendo só dois bairros, ao passo que o municipio de Lisboa, muito mais populoso e com quatro bairros, está dividido em tres circulos. É manifesta a incongruencia d'esta divisão, que em ambos os municipios convirá formular por norma commum, sem deixar de attender-se ás circumstancias especiaes de cada cidade. Igualmente se prorogou o tempo por que serve a vereação portuense, estabelecendo-se para ella o exercicio de quatro annos, já em vigor para a Camara Municipal do Lisboa. Sendo analoga a organização eleitoral de um e outro municipio não é plausivel a actual disparidade sobre o periodo durante o qual são chamados a servir os vereadores eleitos.

3. - Approvação do contrato da Camara Municipal do Bouças para abastecimento de agua (decreto de 27 de setembro do 1901).

Por decreto de 27 de setembro do anuo ultimo approvou o Governo, para que se tornasse definitivo, o contrato provisorio para abastecer de aguas as freguesias de Mattesinhos e Leça da Palmeira, que constituem a Villa de Mattosinhos, celebrado entre a Camara Municipal do concelho de Bouças e a empresa representada pela companhia francesa denominada Compagnie Générale des Eaux pour l'Étranger, por escriptura do 2 de abril de 1897. Na ultima sessão legislativa havia a Camara dos Senhores Deputados votado um projecto de lei approvando esse contrato provisorio. Tambem a commissão de administração publica da Camara dos Dignos Pares do Reino, em 22 de maio d'esse anno, havia apreciado favoravelmente o mesmo projecto.

Julga a vossa commissão, que o contrato approvado por decreto de 27 de setembro importa, como foi reconhecido em ambas as Camaras, um melhoramento instantemente requerido pela hygiene e commodidade dos povos d'aquellas freguesias e dos forasteiros, que em avultado numero as frequentam.

Alem de que, a realização d'esse contrato interessava actualmente não só ás condições sanitarias das referidas povoações, mas tambem ás industrias metallurgicas da cidade do Porto, que estavam correndo o risco de reduzir a sua laboração com gravo prejuizo dos operarios e consequente gravame do Thesouro Publico.

4. - Auctorização á gerencia municipal de Lisboa para concluir um emprestimo de 400:000$000 réis (decreto de 24 de dezembro de 1901).

O Governo, por decreto de 24 de dezembro do anno findo, auctorizou a Camara Municipal de Lisboa a contratar com a Caixa Geral de Depositos um emprestimo, até á quantia de 400:000$000 réis, para ser exclusivamente applicado aos trabalhos de abertura de avenidas e ruas, na segunda das zonas, a que se refere a carta de lei de 9 de agosto de 1888, conforme os projectos approvados por decreto de 4 de outubro de 1889. O disposto neste decreto constava de um projecto de lei, que, apresentado á Camara dos Senhores Deputados da Nação pelos representantes do circulo eleitoral de Lisboa na ultima sessão legislativa, obteve parecer favoravel da commissão competente em 10 de maio d'esse anno e foi approvado pela mesma Camara em 21 do mesmo mês e anno, recebendo ainda assentimento da commissão respectiva na Camara dos Dignos Pares, de cuja approvação ficou pendente pelo encerramento da sessão legislativa. Por ultimo, a commissão administrativa do Municipio de Lisboa impetrou do Governo auctorização extraordinaria a fim de contrahir o sobredito emprestimo, demonstrando que a satisfação dos respectivos encargos não affectaria a fazenda municipal, por serem compensados pela venda dos terrenos sobejos das expropriações, nos termos da lei do 1888.

Á vossa commissão parece, que o engradecimento da capital do reino, o desenvolvimento das receitas do Estado e do Municipio, o os interessem da hygiene publica notavelmente favorecidos pela desaccumulação da população de

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Lisboa e construcção de saudaveis habitações, justificam a publicação do decreto do 24 do dezembro findo.

5.º Auctorização á Fazenda Publica para modificar o contrato com o Banco do Portugal em determinadas condições (decreto de 22 de novembro de 1901).

O decreto do 22 do novembro ultimo auctorizou o Governa a modificar o actual contrato com o Banco do Portugal. A vossa commissão faz suas as considerações, que se encontravam no relatorio da proposta do lei apresentada ao Parlamento, em maio do anno transacto, e subscreve, o parecer favoravel da commissão do fazenda da Camara dos Senhores Deputados.

A intenções do decreto de 22 do novembro consistem na diminuição doa actuaes encargos que pesam sobre o Thesouro o no augmento da segurança da circulação fiduciaria por meio da constituição do um fundo do reserva rapidamente crescente.

Consegue se o primeiro fim incorporando na conta corrente gratuita os dois emprestimos de l891 e 1893, na importancia de 14.000:000$000 réis, o supprimindo os encargos resultantes dos respectivos contratos de 4 do dezembro de 1891 e, de 14 de, janeiro de 1895. Importara os encargos de juros d'esses dois emprestimos em réis 597.000$000, alem da amortização do emprestimo de réis 8.000:000$000, a qual, suspensa provisoriamente, começaria a impor ao Thesouro o dispendio de 400:000$000 réis annuaes, a contar do anno economico de 1902-1903, e igualmente da amortização do emprestimo de, réis 7.000:000$000 do l891, realizavel ao menos pela venda annual de 150:000$000 réis de inscripções, o que desde 30 de junho do 1900 se não tem feito.

A constituição do fundo do reserva da circulação fiduciaria consiste na capitalização annual de 100:000$000 réis, que se vão accumulando com os seus juros em titulos de credito de primeira ordem o representativos de ouro. Da taxa do juro d'esses titulos, cuidadosamente escolhidos, e do giro doa cambios, dependo a importancia da quantia capitalizada com o decurso do tempo. Essa quantia será em todas as hypotheses, avultada, o deve efficazmente contribuir para augmentar o credito e a valia dos notas, conforme; aos interesses publicos convem.

A desistencia da juros de 592:000$000 réis, enfraquecendo os dividendos do Banco do Portugal, abateria o credito das suas acções, que, sem duvida, contribuo em proporções consideraveis para manter e augmentar a confiança que o publico deposita nas notas. Para manter o dividendo, sacrifica o Thesouro uma parte da participação nos lucros a que tem actualmente, direito, sem que, na peor hypothese, deixe, na operação planeada, do lucrar cada anno 430:000$000 réis em juros, alem de não começar em epoca proxima o encargo pesado das amortizações devidas e sem que a segurança do Banco em cousa nenhuma seja arriscada. Mas, principalmente, a compensação se encontra na mobilização das reservas.

6. - Reforma do serviço do recrutamento militar; auctorização a applicar algumas quantias do fundo das commissões a melhoramentos do material do guerra, bem como a adquirir armamento para a defesa dos portos de Lisboa o Porto; regulamento da reforma, por equiparação, dos officiaes do exercito; plano da reorganização do exercito (5 decretos de 19 de outubro do 1901).

O Governo publicou varias providencias tendentes a melhorar os serviços do exercito, e, por consequencia, a defesa nacional.

Um dos serviços, que ultimamente tem recebido mais cuidados e attenções, é o do recrutamento militar, pois que elle constitue a base fundamental da constituição da força publica. Não tinha o serviço do recrutamento attingido a perfeição que era para desejar, nem mesmo ainda o presente decreto satisfaz por completo a todos ou principios defendidos pelos profissionaes e pela moderna comprehensão dos exercitos nacionaes. Representa, porem, um progresso notavel sobre os diplomas anteriores e remenda-se á esclarecida attenção do Parlamento.

O alargamento das attribuições das auctoridades militares a fim de imprimir aos respectivos serviços mais unidade e disciplina; a reducção dos casos do recurso em materia de inspecção sanitaria, facilitando o serviço e evitando abusos que a pratica demonstrava; a constituição e o funccionamento das juntas districtaes traduzindo-se numa commodidade para os povos e numa economia para o Thesouro; as vantagens concedidas aos mancebos em determinadas condições do instrucção tendentes a desenvolver o tiro nacional e o gosto pelas instituições militares, alem de outras disposições, representam um progresso notavel na nossa legislação do recrutamento.

Ainda subsistem as remissões; até se facilitam. Mas só tal principio não é recommendado pela sciencia militar, por contrario á constituição dos exercitos nacionaes, justifica-se pelas nossas condições financeiras e pelo destino do seu producto: a defesa nacional.

Se é importante para as instituições militares do país uma boa lei de recrutamento, não são menos de ponderar os estabelecimentos destinados á producção do material de guerra, principalmente, quando, como hoje, os progressos das industrias são rapidos e as nações, para conservar na concorrencia internacional o logar que lhes pertence e a independencia de que necessitam, carecem de estar sempre precavidas com todos os elementos do defesa.

Não só sob o ponto do vista economico, mas ainda e principalmente sob o ponto de, vista militar, era indispensavel imprimir aos nossos estabelecimentos fabris o desenvolvimento necessario para, ao menos, só produzir o municiamento das armas portateis e das bocas de fogo, preparando nos para supprir as necessidades da defesa nacional com os recursos proprios, tornando-nos assim independentes da industria estrangeira.

Para fazer face a estas despesas recorro o Governo a parte do fundo das remissões dos recrutas que, neste destino, encontra patriotica applicação.

Se é certo que o valor de um exercito depende principalmente das qualidades moraes e profissionaes do seu pessoal, não é menos certo que esse valor augmenta consideravelmente com todos os recursos materiaes de que pode dispor. É por isso que a maioria das nações procura augmentar a força dos seus exercitos, cada uma nos limites dos seus recursos, ou escalonando fortificações desde as fronteiro a até ao interior, ou fortificando especialmente os pontos que, pela sua importância militar, commercial ou politica, lhe merecem especiaes cuidados.

Não tem esta momentosa questão sido descurada nem pelos nossos estadistas, nem pelos nossos profissionaes. Entretanto as circumstancias do Thesouro teem impedido a realização de muitas obras reputadas necessarias. Não podem, porem, por mais tempo continuar sujeitas a uma surpreza a capital, e, depois d'ella, a mais importante cidade do país, á espera que um desastre, que se não pode prever, nos venha mostrar um desleixo, que bem poderá classificar-se de crime do lesa-patria.

Reconhecida a necessidade da defesa dos portos do Lisboa e Leixões, não admitte delongas a sua execução, bom merecendo o Governo o applauso do Parlamente por tão necessaria obra para a nossa defesa nacional.

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O decreto de 19 de outubro ultimo, que regula as reformas por equiparação, insere ligeiras alterações á carta de lei de 26 de julho de 1899 sobre o mesmo assumpto, alterações impostas pelo necessario acordo com os principios fixados pela carta de lei de 12 de junho, que regula o accesso dos officiaes.

Da comparação d'estes dois diplomas claramente se deduz a justificação do decreto agora sujeito á sancção parlamentar.

Pelo decreto de 19 do outubro ultimo foi o Governo auctorizado a rever e modificar o decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899, de acordo com as exigencias da defesa nacional.

Os progressos successivos operados em todos os ramos da sciencia militar e social impelem uma natural evolução na maneira de ser dos exercitos, tanto na sua organização, como no seu funccionamento. É por isso, que a todos os militares e estadistas tem o exercito merecido os maiores cuidados e interesse, procurando dar-lhe a organização que melhor se coadune com as exigencias da defesa nacional, tendo porem todos de sujeitar-se á insufficiencia das verbas orçamentaes que as outras necessidades do Estado não permittem augmentar.

A organização, desenvolvida no decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899, representa sobre a organização anterior um progresso notavel. É certo, porem, que, passado pouco tempo, veiu impor-se a necessidade de se proceder a alterações, para tornar mais effectiva a defesa do país. D'ahi o decreto agora sujeito á sancção parlamentar.

7. - Isenção temporaria do imposto de exportação a favor do algodão produzido na provincia de Angola e estabelecimento de premios para os agricultores, concedendo o beneficio da restituição do imposto de producção do alcool e aguardente, produzido nas provincias de Angola e Moçambique e exportado para portos nacionaes ou estrangeiros (3 decretos de 2 de setembro de 1901).

O grande incremento, nos últimos annos, do commercio com o gentio, na provincia de Angola, determinou um correspondente progredimento das industrias algodoeiras, desenvolvendo fabricas no país e criando outras novas.

Devido a crises, ou antes, a difficuldades peculiares ao commercio de permuta em Africa, mas ultimamente aggravadas, senão motivadas pelo imprevidente uso da capacidade consumidora dos mercados do interior, aquellas industrias tanto se ressentiram de tal situação que foi necessario acudir-lhes para que a meio se não detivessem as naturaes disposições expansivas de uma vida colonial mais activa, pelo esmorecimento, ou pela desvalorização, que o desanimo pudesse acarretar aos recursos que, ao seu progresso e ao do país, as colonias offerecem. Deve comtudo dizer-se, que aquella imprevidencia ou precipitação do commercio da borracha desculpavel é, se attendermos á consequencia dos primeiros impulsos de uma actividade, que, mercê de causas varias, nos ultimos tempos se teem manifestado entre nós. Reconhecendo-se que a cultura do algodão é susceptivel de grande desenvolvimento na provincia de Angola, o que ella offerece hm recurso valioso, tanto pela relativa facilidade e beneficio derivado da exploração, como pela qualidade do producto, a protecção do Estado impôs-se ao Governo, e tanto mais que, pelo auxilio pratico d'essa protecção, se remediaria o estado anormal em que essa provincia, em parte, se encontrava, estimulando-se, ao mesmo tempo, uma exploração que, se não é incipiente em Angola, é, comtudo, mui restricta, relativamente á importancia que os seus productos adquirem, quando transformados no principal artigo do commercio de permuta com o gentio. A concessão d'esse auxilio visou o decreto de 2 de setembro de 1901, e por taes motivos elle se justifica.

Devido a cansas bera conhecidas, a cultura da canna sacharina tomou nos ultimos annos uma crescente actividade de tal forma importante, tanto no litoral como no interior da provincia de Angola, que chegou a ser quasi a unica exploração agricola d'essa extensa provincia. Como consequencia d'essa actividade, resultou um desequilibrio perturbador entre a producção e a capacidade consumidora dos mercados. Por outro lado uma nova tributação de todo o alcool produzido, derivada do convencionado no Acto Geral de Bruxellas, de 8 de junho de 1899, apresentou-se ao Governo com todo o poder de um ponto urgente a providenciar. Tornando-se, portanto, necessario, attender á normalidade da vida economica d'aquella provincia, e regular, por processos justos e sem vexames, a cobrança do imposto de producção, foram pelo Governo tomadas as medidas constantes do decreto de 2 do setembro de 1901: - medidas tendentes a facilitar a saida do excesso da producção, desafogando assim o fabrico do alcool e aguardente e a respectiva exploração agricola, e assentar em bases conformes á economia da provincia, aos interesses do Estado e ao intuito de facilitar o progredimento da colonia, a, forma da cobrança do imposto d'aquella producção. São estes os fundamentos explicativos d'aquelle referido decreto.

Conjugada com a questão do alcool colonial, apresenta-se a do assucar de extracção da canna sacharina. A solução, porem, sendo igualmente urgente e necessaria, mostrava-se difficil, desde que, por imprevidente auxilio, poderiam ser affectados os interesses do Thesouro publico. Com effeito, o problema apresentava assim uma resolução que poderia collidir com a justiça das reclamações, a necessidade de não entravar a actividade colonial, o do receio do prejuizos advindos ás receitas do Estado. Inspirado, porem, o Governo no puro intento, que lhe é systema, de proteger e auxiliar o desenvolvimento das colonias, e valorizá-las ante a iniciativa nacional, por meio de facilidades animadoras que sejam comportadas nas mais rasgadas, nas mais justas idéas de progresso colonial, e attendendo, por outro lado, ás condições especiaes que caracterizam a industria da extracção do assucar da canna sacharina, condições que, para o caso, só reduzem á lentidão da sua exploração, adoptou, como medida conciliatoria de todos os interesses: - limitar, durante o periodo do quinze annos, a 6.000:000 de kilogrammas, em cada uma das provincias de Angola e Moçambique, todo o assucar produzido, para beneficio do differencial de 50 por cento, elevando o imposto de importação do assucar, quando branco e refinado, de 40 a 80 réis. Assim se justifica a medida tomada por decreto de 2 do setembro de 1901, no duplo fim de favorecer e auxiliar uma exploração valiosa, a qual, em crescente desenvolvimento, pode preparar ura futuro largo á vida economica do país, e reduzir ao minimo, por meio de justa compensação, os prejuizos do Thesouro publico.

8. - Reorganização das forças militares do ultramar (Decreto de 14 de novembro de 1901).

A reorganização das forças militares coloniaes impôs-se ao Governo como trabalho inadiavel, urgente. Decretada a organização da força armada no ultramar pelo decreto de l de dezembro de 1869, que devo, principalmente, reputar-se, uma transacção com o estado de quasi esta-

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cionamento que então caracterizava a nossa vida colonial, foi ella successivamente transformada por ulteriores providencias que, embora solicitadas pelo reconhecimento de que em impropria tal organização, e pelo intuito de adequá-la ás condições do desenvolvimento das extensas regiões a guarnecer, nunca chegaram a satisfazer proficuamente o fim que se tinha um vista. Por isso tal organização ainda ha pouco se apresentava insufficiente, cahotica mesmo, contrabalançando sempre os recursos financeiros das colonias e da metropole com largas verbas de despesa, ordinarias e extraordinarias. É certo, que, nas vastas possessões tropicaes, como aquellas que o país possue, a força armada, convenientemente organizada e distribuida, é a unica base solida em que repousam as garantias e a tranquillidade necessarias ao desenvolvimento das riquezas exploradas pelo commercio o pela agricultura de alem-mar. Promover, por consequencia, nas colonias, um estado de guarnição militar capaz de assegurar a manutenção da paz ou acudir rapidamente, e sem esforços nem gravames extraordinarias para o Thesouro, a todos os pontos onde as populações sertanejas, porventura, alterem a ordem e segurança necessarias; dotar essa guarnição militar, nos seus varios serviços, de officiaes de boa vontade, instruidos, seleccionados e periodicamente substituidos por um equitativo systema do recrutamento; remunerá-los condignamente o nelles enquadrar os elementos nativos; distribuir aã tropas de acordo com as necessidades locaes e a mais sensata satisfação ás exigencias da occupação militar; fornecer os commandos em chefe do um nucleo de forças, facilmente mobilizaveis e praticamente já habituadas ao clima e ao meio, e, sobretudo, aligeirar nos orçamentos coloniaes, num das suas mais importantes verbas de desposa, o ao Thesouro da metropole alliviá-lo das volumosa despesas extraordinarias com as expedições militares, foram esses os pontos visados pelo Governo e a justificação do decreto de 14 de novembro de 1901.

9. - Providencias reclamadas pela crise da viticultura (decreto do 14 do junho de 1901).

Outro diploma para o qual o Governo vem ao Parlamento pedir o bill de indemnidade é o que se refere ás providencias adoptadas por decreto de 14 de junho do passado anno, tendentes a debellar a crise da não venda dos vinhos.

É sabido que, unicamente devido aos factos que motivaram o encerramento inesperado da passada sessão, não se discutiram no parlamento duas propostas do iniciativa governamental tendo em vista o mesmo fim do mencionado decreto.

Essas propostas foram maduramente estudadas nas commissões de fazenda e de agricultura d'esta Camara e o projecto que elaboraram e relataram foi apresentado á apreciação das Côrtes que o discutiria logo que chegasse a sua vez na ordem por que são submettidos á discussão os projectos entregues na mesa.

Encerrado, porem, inesperadamente o periodo parlamentar e continuando a fazer sentir-se a necessidade de promulgar medidas que favorecessem a viticultura patria o contidas naquelle projecto, o Governo não duvidou decretar, na ausencia dos Côrtes, a serie do providencias, que, bem evidentemente, queria submetter á sancção das Camaras.

Decretou, porem, só aquellas que julgou, em seu criterio, mais urgentes e sobre as quaes não se manifestara divergencia de opiniões na classe a que eram destinados, deixando para o Parlamento a discussão das que a opinião publica recebeu com ardentes debates.

Neste caso estava a parto do projecto referente á restricção do plantio de vinha, que reservou para exame e discussão no Parlamento.

No relatorio, que antecede o decreto de 14 de junho, é synthetizado d'este modo o proceder ministerial no respeitante á questão dos vinhos: «Não hesitou o Governo em proceder ato aonde julgou indispensavel para acudir á viticultura; não quer, nem julga preciso, substituir pela sua acção a do Poder Legislativo, quando a liberdade do cultura se encontra em litigio».

Promulgou, pois, em dictadura o projecto, que as commissões de fazenda e de agricultura apresentaram á sancção do Parlamento, extrahindo-lhe apenas a parte referente á restricção de plantio e substituindo a reducção permanente até o minimo de 67 por cento das taxas actuaes dos impostos do consumo e de barreira sobre os vinhos em Lisboa e no Porto, por uma providencia mais larga ainda que temporaria: a reducção de 50 por cento durante dois meses e meio nos ditos impostos, medida esta instantemente reclamada junto do Governo pela Direcção da Real Associação de Agricultura, á qual os vinicultores confiaram, numa das suas assembléas geraes, plenos poderes para tratar do assumpto.

O Governo convenceu-se do que realmente era esse um processo de esvasiar, antes das novas colheitas, as adegas dos vinhateiros que, tendo cheio o seu vasilhame com os vinhos de 1900, não possuiam vasilhame onde arrecadar a producção de 1901.

A vossa commissão, encarregada de dar parecer sobre o bill de indemnidade, entende não dever demorar-se mais em considerações justificativas do diploma a que ao tem referido, por isso que a Camara dos Senhores Deputados tem no relatorio e projecto n.° 126, da ultima sessão, documentos parlamentares explicativos dos providencias tomadas, que tinham o teem por fim:

Promover o fabrico aprimorado e economico de bons vinhos regionaes pela associação dos productores nas adegas sociaes e pelo estabelecimento dos depositos;

Confiar a companhias commerciaes a missão de lhes abrir mercado, tornando-os recommendaveis pela pureza e constancia dos typos e modicidade dos preços;

Facilitar o aproveitamento dos vinhos de baixa graduação e dos residuos da vinificação no fabrico do alcool vinico e de boas aguardentes proprias para a beneficiação dos vinhos o promover a producção de aguardentes finas para copo, mediante o estabelecimento do estações de distillação que sirvam de incentivo á industria particular o lhe sejam entregues logo que ser possa, e ainda pelos favores tributarios concedidos á distillação de vinho e seus derivados em alambiques;

Conceder auxilio á implantação de novas industrias, hoje rudimentares ou por criar entre nós, que augmentarão, pela preparação do passas, pela extracção do tartaro e pela concentração dos mostos, os redditos da viticultura;

Permittir beneficiações dos mostos, que, longe do constituirem falsificação, corrigem a sua pobreza saccharina;

Normalizar o commercio da aguardente pela intervenção de mercados reguladores do preço e por medidas fiscaes que o mantenham entro limites rasoaveis;

Promover mais larga applicação do alcool a usos industriaes e evitar a concorrencia crescente que ao alcool vinico é feito pelo de outras proveniencias, mediante restricções postas á industria, sem offender os interesses criados;

Aligeirar encargos e vexames que recaem sobre o commercio, tanto na exportação, como no mercado interno, pela reducção de direitos e concessão de bonus aos primeiros e pelas reformas fiscaes mais convenientes, precedidas, em relação ao mercado interno, de uma providencia de caracter temporario, destinada a proporcionar um beneficio immediato á lavoura.

Taes são, em resumo, os pontos fundamentaes do decreto de 14 de junho, que pelo seu singelo enunciado bastam para demonstrar a importancia do assumpto o a cuidadosa e intelligente attenção que lhe consagrou o Go-

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verno a tempo e horas, quando evidentemente a situação tensa da viticultura não permittia que esperasse as providencias decretadas até á abertura da nova sessão legislativa.

10. - Reforma do ensino a cargo do instituto de agronomia e veterinaria (decreto de 11 de outubro de 1901).

Ha mais de dez annos que o conselho escolar do Instituto de Agronomia e Veterinaria pedia com instancia aos governos, quer por delegações do lentes, quer em successivas representações, a restituição de duas cadeiras que a reforma d'aquelle estabelecimento em 1891 havia supprimido, com incontestavel prejuizo do ensino, por certo bem maior do que a economia auferida pelo Thesouro publico com a suppressão da minima despesa feita com dois lentes cathedraticos a mais no quadro do Instituto..

Mais uma vez este assumpto foi trazido a pêlo no decurso do anno transacto por meio do uma representação dirigida a Sua Majestade El-Rei pelos alumnos d'aquella escola superior pedindo o desdobramento da 7.ª cadeira, vaga naquelle momento pela infausta morte do notavel professor Mendia, em duas cadeiras, ministrando-se numa o ensino da silvicultura e noutra o da arboricultura e viticultura, disciplinas estas que no systema anterior ao decreto de 11 de outubro eram regidas alternadamente de dois em dois annos. Este systema causava grave transtorna aos alumnos, quando tivessem a infelicidade de não merecer approvação da primeira vez que se apresentassem ao jury: perdiam dois annos presos á escola pela falta de um exame.

Em documento, perfilhado por todo o Conselho Escolar do Instituto de Agronomia e Veterinaria, o eximio professor Henrique de Mendia, cuja competencia e auctoridade em assumptos agronomicos ninguem contesta, escrevia contra a reforma de 1891, depois de mostrar a importancia da viticultura em Portugal:

«É no entanto, porem, nestas circumstancias e nesta opportunidade, que o ensino superior de uma materia da importancia da viticultura em Portugal é infelizmente reduzido ás exiguas e deficientissunas proporções de uma simples terça parte da cadeira, quando, hoje em dia, a regencia de tal disciplina em todo um anno de condensadas e methodicas lições não seria demasiado para assentar em solidas bases no espirito dos alumnos d'esta escola, dos futuros agronomos e dos proprietarios de amanhã, bem preparados para a lucta productiva e intelligente, como tão necessaria seria para credito da escola e para bem do país, os fundamentos de tão importante, tão vasta e tão complexa disciplina».

O Conselho Escolar do Instituto de Agronomia e Veterinaria mandado ouvir sobre a doutrina da representação dos alumnos do Instituto não só fortaleceu os argumentos com novas justificações dando uma consulta favoravel a este ponto, como explanou diversas outras reclamações urgentes para bem do ensino e entre ellas todas aquellas medidas que o Governo entendeu dever adoptar desde logo para que se aproveitassem no anno escolar que ia principiar, não só por estar convencido da necessidade do assim proceder emquanto não propõe uma remodelação assás larga d'aquelle Instituto, como para testemunhar a sua consideração por uma escola que tantos serviços tem prestado á agricultura nacional e tanto tem honrado o nome scientifico do nosso país.

Na consulta mencionada indicava-se tambem a necessidade de desdobramento de outra cadeira no ramo do ensino veterinario. A largueza da materia condensada nessa cadeira era tal, que nunca o professor conseguia dar mais de metade da disciplina no anno escolar, com serio prejuizo dos conhecimentos d'aquelles que hão de sair da escola para se occuparem da riqueza pecuaria do reino.

O ensino ganha sempre com a sua explanação, condição necessaria do seu maior grau de elevação e utilidade. Contrahir, pois, o ensino, que a tanto equivalia o distribui-lo por um menor numero de agentes, como no caso sujeito, era amesquinhá-lo, e, ensino mesquinho, incompleto, de fraco proveito é para o individuo que o recebo e para a nação que o mantem.

Desdobrou, pois, o Governo as duas cadeiras reclamamados pelo conselho de professores; assentou em bases definidas a missão que no ensino teem a cumprir os chefes de serviço d'aquella escola, entregando-lhes a regencia dos cursos auxiliares - o que desafogou sobremodo os lentes cathedraticos que nas secções theorica e pratica das suas cadeiras não teem sobejos de tempo que justifiquem a obrigação em que estavam de professar os mencionados cursos; prepara, por este modo, muito proficuamente, os ditos chefes de serviço a occuparem mais tarde uma cadeira com beneficio do ensino e brilho do professorado; marcou positiva e claramente a organização do ultimo anno escolar do curso de agronomia com um estagio na Escola Pratica Nacional de Agricultura, sob fiscalização mais directa do professorado do instituto, quando até aqui a forma como se entendia este anno pratico era em absoluto deficiente e improficuo.

E, assim, melhorado e enriquecido o ensino da nossa Escola Superior do Agricultura, o Governo mais demoradamente poderá estudar uma remodelação completa do Instituto de Agronomia e Veterinaria que espera apresentar ao Parlamento.

Senhores: Por todas estas considerações, muito fundamentadas e lucidamente desenvolvidas nos relatorios dos respectivos decretos, que examinou reflectidamente, a commissão por vós eleita, vem, com a mais profunda convicção, propôr-vos que approveis o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É relevado o Governo da responsabilidade em que incorreu com a promulgação das providencias de caracter legislativo, expedidas desde 14 de junho até 31 de dezembro, inclusivamente, de 1901, as quaes continuarão em vigor, emquanto por lei não forem alteradas ou revogadas.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 11 de janeiro de 1902. = João Marcellino Arroyo, presidente = Affonso Xavier Lopes Vieira = Alfredo Cesar Brandão = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães = Alvaro Froes Possollo de Sousa = José Maria de Oliveira Simões = José Nicolau Raposo Botelho = Luiz Gonzaga dos Reis Torgal = Rodrigo Affonso Pequito = José Maria Pereira de Lima = Abel Pereira de Andrade, relator.

N.º 1-A

Senhores. - Depois de encerrada a ultima sessão das Côrtes Geraes da Nação pareceu ao Governo indispensavel expedir, a bem do serviço publico, algumas providencias de caracter legislativo, parte das quaes tinham já sido propostas ao Parlamento.

Foi assim que na administração politica e civil se reformou em 8 de agosto de 1901 o processo da eleição e a organização da Camara dos Senhores Deputados, e se estabeleceram as bases da reorganização da administração e serviços municipaes de Lisboa; em 27 de outubro seguinte foi approvado o contrato da Camara Municipal do concelho de Bouças para abastecimento de aguas; e em 24 de dezembro ultimo se auctorisou a gerencia municipal de Lisboa a contrahir um emprestimo de 400:000$000 réis para as obras das avenidas e ruas comprehendidas na segunda das zonas, a que se refere a carta de Lei de 9 de agosto de 1888.

No que respeita á Fazenda Publica fo auctorizada p o

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decreto do 22 de novembro a modificação do contrato com o Banco do Portugal um determinadas condições.

Pelo que toca aos serviços dependentes do Ministerio doa Negocios da Guerra, foi, em 19 de outubro ultimo, decretado o plano da reorganização do exercito, reformado o serviço do recrutamento militar, regulada a reforma, por eqiparação, dos officiaes do exercito, e auctorizada a applicação de algumas quantias do fundo das remissões a melhoramentos do material de guerra, bem como a acquizição de armamento para a defesa dos portos do Lisboa e Porto

Na administração das possessões ultramarinas foram tambem adoptadas algumas medidas do caracter legislativo em 2 do setembro e em 14 do novembro do anno findo, isentando temporariamente do imposto do exportação o algodão produzido na provincia de Angola e estabelecendo premios para os agricultores, concedendo o beneficio da restituição do imposto de producção do alcool e aguardente, produzido nas provincias de Angola o Moçambique e exportado para portos nacionaes ou estrangeirou; assegurando por quinze annos a manutenção do differencial de 50 por cento em favor do assucar produzido nas mesmas provincias; e reorganizando as forças militares do ultramar.

Tambem nos serviços da competencia do Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, foram tomadas em 11 de julho de 1901 diversas providencias reclamadas urgentemente pela crise da viticultura e destinadas a promover o fomento vinicola, e em 10 de outubro seguinte só reorganizou o ensino a cargo do Instituto do Agronomia o Veterinaria.

No relatorio, que precedeu os respectivos decretos, expressou e desenvolveu o Governo os motivos ponderosos, que o determinaram a expedir as mencionadas providencias, o porque as considerâmos de todo o ponto justificadas no seu conteudo e opportunidade, temos a honra de submetter á vossa illustrada approvação a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.º É relevado o Governo da responsabilidade em que incorreu com a promulgação das providencias de caracter legislativo, expedidas desde 14 do junho ato 31 de dezembro, inclusivamente, do 1901, as quaes continuarão em vigor, emquanto por lei não forem alteradas ou revogadas?.

Ari. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Presidencia, do Conselho de Ministros, em 8 de janeiro de 1902. - Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Artur Alberto de Campos Henriques = Fernandes Mattoso Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Documentos

N.º l

Senhor. - Ao abrir se a ultima sessão legislativa, affirmava o Governo, no discurso que Vossa Majestade se dignou do ler perante as Côrtes, o proposito que tinha do apresentar á consideração do Parlamento uma reforma da lei eleitoral, modelada conforme as reclamações da experiencia; e se o Governo se não deu pressa em desobrigar se de compromisso tão solemnemente tomado, foi porque a urgencia de outras providencias legislativas demandava que se antepusesse o exame d'ellas ao da organisação eleitoral vigente, o qual, sem inconveniente grave, poderia ser espaçado para mais adeantado periodo da legislativa que se iniciava. Sobrevieram, porem, no decurso da menina sessão, o na Camara dos Senhores Deputados, acontecimentos em face dos quaes o Governo entendem que nesta Camara lhe faltava o apoio indispensavel para proseguir no desempenho da sua missão como Governo parlamentar, que, tendo a sua origem na confiança da Coroa, precisa igualmente da plena confiança do Parlamento, traduzida não somente na votação dos projectos indispensaveis para a proficua administração dos negocios publicos, mas tambem na homogeneidade de pensamento politico entre o Governo o a maioria da Camara, delegada do suffragio popular, pois que, o trabalho dos corpos legislativos necessariamente se resentirá, com damno da administração do Estado, da discrepancia de intuitos entre o poder executivo e a maioria dos representantes da nação. Por isso o Governo se viu obrigado a propor a Vossa Majestade a dissolução da Camara electiva, a qual Vossa Majestade se dignou do conceder por decreto de 4 de junho ultimo, convocando as Côrtes Geraes para o dia 2 de, janeiro do proximo futuro anno, o devendo, portanto, fixar-se o dia em que os collegios eleitoraes hão do reunir-se para a escolha do novos Deputados.

Perante a situação criada pelas circumstancias que succintamente ficam expostas, entende o Governo que, respeitando-se a constituição do corpo eleitoral como está definida pela legislação vigente, é de instante necessidade alterar immediatamente o modo de eleger, substituindo-se á eleição por circulos uninominaes a eleição por circules plurinominaes, com representação do minorias, o adoptando-se conjuntamente, sobre outros assumptos concernentes ao processo do recenseamento o ao da eleição, providencias efficazes que assegurem a inscripção eleitoral a todos os cidadãos a que a lei reconhece o direito de votar e garantam a genuina o livro manifestação da vontade doa eleitores na escolha dos representantes da nação.

Senhor. - O decreto de 28 do março do 1895, inspirando-se no pensamento liberal das leis de 23 do novembro de 1859 o de 8 de maio de 1878, fixou os indicadores da capacidade eleitoral, facultando o direito de suffragio a uma grande massa do cidadãos, em consequencia da exiguidade da quota censitica exigida e em virtude da admissão, ao eleitorado, de todos os que sabem ler e escrever; e a doutrina d'aquelle diploma, tendo sido sanccionado pela lei do 21 de maio de 1896 o mantida pela lei do 20 de julho de 1899, recebeu do duas situações politicas differentes uma consagração, que é valioso motivo para que não seja alterada. Sem duvida que alguns reparos podem fazer-se sobre os inconvenientes resultantes de tão larga generalização do direito de votar e para alguns espiritos são elles do tal monta que reclamariam providencias restrictivas d'este direito.

Parece, porem, no Governo que esses inconvenientes podem ter correctivo nas disposições que regulem o exercicio do suffragio, bem que hajam do cercear-se franquias reconhecidas na nossa legislação e conformes com a corrente de idéas, que, em todos os paises do instituições representativas, chama ao gozo dos direitos politicos um numero cada vez mais accrescido de cidadãos.

A definição dos elementos substanciaes da capacidade eleitoral devo ser, quanto possivel, estavel como as normas fundamentaes em que assenta a estructura do organismo politico; e se os processos e modos do eleger podem variar consoante as multiplas contingencias da vida politica das nações livres, a intima constituição do eleitorado, pela sua connexão com a organização de um dos poderes publicos, deve estar ao abrigo de incertezas e somente soffrer modificações, quando circumstancias poderosas, que para tanto não occorrem no actual momento, imponham a sua urgente remodelação.

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Mantidas as bases actuaes da capacidade eleitoral, não ha que providenciar sobre a organizado de recenseamentos novos; mas para a regular revisão dos recenseamentos existentes importa introduzir na legislado diversas modificações salutares. Tendo sido extinctas pelo decreto de 28 de março de 1895 as commissões de recenseamento, eleitas pela assembléa dos quarenta maiores contribuintes da contribuição predial, porque a experiencia dos ultimos tempos havia demonstrado que não davam as garantias de imparcialidade necessaria e deixavam de corresponder aos intuitos, com que o legislador as havia criado, foram substituidas por commissões de tres membros, formadas por nomeação do juiz de direito, da camara municipal e da commissão districtal; delimitaram-se e precisaram-se as atribuições d'ellas; conferiram-se aos secretarios das camaras municipaes e das administrações dos bairros de Lisboa e Porto attribuições especiaes para preparar o trabalho das oommissões e para organizar o livro do recenseamento; e chamou-se o poder judicial a garantir a publicidade das relações de eleitores, coordenadas pelas commissões, e a assegurar a authenticidade do resultado final das operações do recenseamento.

A lei de 26 de julho de 1899 alterou a organização das commissões, ampliou as attribuições dos secretarios, encarregando-os de todo o serviço de organização o revisão do recenseamento, confiou ás commissões o trabalho de rever o serviço feito pelos secretarios, e de dar publicidade ás relações dos eleitores inscriptos ou eliminados; conferiu lhes ainda a faculdade de resolver, com recurso para o poder judicial, as reclamações perante ellas apresentadas, continuando, porem, a ser da exclusiva responsabilidade do secretario a organização definitiva do recenseamento, em estricta conformidade com as resoluções e decisões das commissões, e com as sentenças dos tribunaes.

Se as commissões criadas pelo decreto eleitoral de l895 motivaram reparos porque, entregando-se ao poder judicial a escolha dos respectivos presidentes, se lhe confiava uma attribuição meramente discricionaria e de significação politica, menos conforme com a indole d'este poder o com o prestigio de imparcialidade que os magistrados judiciaes devem sempre manter no exercicio das suas funcções; se á interferencia da commissão districtal e da camara municipal na constituição das commissões, se apontaram inconvenientes para a administração local; ás commissões organizadas pela lei de 1899 podem irrogar se ignaes defeitos; e não ficaram melhoradas porque ao vogal de nomeação da commissão districtal se substituiu e conservador da comarca e porque se transferiu do vogal nomeado pelo juiz de direito, para o presidente da camara municipal, á presidencia das commissões.

Ellas continuaram eivadas do espirito de facção, que, segundo os caprichosos accidentes da vida local, influe no animo dos seus vogaes; e a pratica demonstrou que, na generalidade dos casos, o trabalho de revisão que lhes compete a respeito do serviço dos secretarios, em vez de corrigir as imperfeições d'este serviço, principalmente tende a amolda-lo ao sabor das conveniencias partidarias, assumindo as commissões, na inscripção e eliminação dos eleitores, responsabilidades que os secretarios declinam, por se não ajustarem aos rigorosos preceitos legaes e serem prejudiciaes á sua situação profissional. Conferidas aos secretarios plenas attribuições para a organização das relações, que servem de base ao recenseamento, é inteiramente dispensavel o serviço das commissões, porque a rectificação dos erros, omissões ou irregularidades que nellas hajam, deve entregar-se exclusivamente ao poder judicial, procedendo reclamações da auctoridade publica ou dos cidadãos interessados.

For estes motivos parece ao Governo que, com manifesta vantagem, poderão supprimir-se as commissões de recenseamento eleitoral, simplificando se o processo administrativo da revisão do recenseamento e alargando-se o prazo, hoje mesquinho, dos recursos para o poder judicial, a fim de que os recorrentes disponham do tempo conveniente para obterem os documentos que devem instruir as suas petições.

Importa, porem, definir com rigoroso, precisão as attribuições e responsabilidades do secretario recenseador, tanto a respeito da inscripção de novos eleitores, como da eliminação dos eleitores inscriptos ou da alteração dos dizeres referentes aos eleitores que transitam do recenseamento de um anno para o immediato. As resoluções do secretario devem ser sempre baseadas em documento ou informação official, tolhendo-se-lhe todo o arbitrio damnoso e facilitando-se a verificação das irregularidades e desmandos, que pratique, para serem promptamente corrigidos e reprimidos.

A indevida omissão de eleitores no recenseamento pode supprir-se por via de reclamação para o poder judicial, com tanto que se assegura a conveniente publicidade das relações que lhe servem de base; mas a capacidade eleitoral, depois de reconhecida em recenseamento regularmente processado, sem que fosse opportunamente contestada, ou quando o fosse, depois de firmada em decisões dos tribunaes, deve ter garantias de estabilidade, poupando-se aos eleitores os incommodos e despesas de repetidas reclamações para manutenção dos seus direitos.

A capacidade politica, tendo sido declarada officialmente, deve presumir-se permanente como a capacidade civil; e as circumstancias, que a podem illidir, só devem, em regra, considerar-se procedentes, depois de comprovadas perante o poder judicial, com recurso aberto ao interessado para as instancias superiores. É, portanto, indispensavel fixar taxativamente os casos, em que o funccionario encarregado da revisão do recenseamento deverá eliminar os eleitores inscriptos, e esses casos devem restringir-se ao obito, mudança ou transferencia do domicilio politico e perda da quota cositica necessaria, sendo estes factos comprovados por doducmentos officiaes. Faltando ao funccionario recenseador esta prova, não poderá motivar em taes factos a eliminação dos eleitores inscriptos, aliás incorrerá na responsabilidade penal comminada pela infracção de lei expressa; ás auctoridades e cidadãos que fiscalizam o serviço do recenseamento impende o dever de supprir, perante o poder judicial, em reclamação ou recurso convenientemente instruido, a falta da prova d'esses factos na secretaria competente. Para a primeira inscripção do eleitor não pode denegar-se áquelle funccionario a faculdade de averiguar se no cidadão, de cuja inscripção se trata, concorre qualquer circumstancia que a prejudique; o abuso d'esta faculdade tem remedio na reclamação do interessado, da auctoridade publica ou de terceiro contra a omissão indevida. Mas a verificação de factos que acarretem interdicção do direito de votar só deve ser confiada ao poder judicial, quando esse direito já esteja reconhecido em recenseamento vigente.

As disposições da lei actual sobre a inscripção de eleitores, com o fundamento de saber ler e escrever, demandam tambem algumas modificações. Para evitar abusos, é conveniente exigir-se que os requerimentos dos interessados sejam feitos perante o notario ou o parocho, que authentica estes documentos, podendo assim dispensar-se a intervenção de testemunhas na authenticação, comtanto que o notario certifique ou o parocho atteste, sob juramento, que na sua presença foram escritos e assignados os requerimentos. A semelhança do que dispunha a legislação anterior, deve permittir-se a contestação, perante o juiz de direito, do facto de saber ler e escrever, uma voz que a contestação seja corroborada com documentos que a tornem plausivel, para que assim se evitem os inconvenientes a que realmente dava logar a simples contestação, desacompanhada de qualquer prova. E embora a inscripção por saber ler e escrever não exija, para

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se manter, renovação annual do documento que lhe serviu de base, deverá permittir-se a contestação d'ella nos annos subsequentes á primitiva inscripção, para que a eleitores indevidamente inscriptos não aproveite a garantia de estabilidade só justificavel em favor dos que forem recenseados conforme as prescripções legaes.

Sobre incompatibilidades parlamentares, decretaram as Côrtes recentemente uma lei de caracter provisorio, reservando-se regular definitivamente o assumpto, tanto a respeito da Camara dos Senhores Deputados como acêrca da Camara dos Dignos Pares. Acatando esta resolução das Côrtes, não propõe o Governo disposições novas sobre incompatibilidades, em diploma que somente visa á organização da Camara electiva, sem que todavia este procedimento signifique pleno assentimento á doutrina em que assenta a legislação vigente.

Com as alterações expostas, o processo de revisão do recenseamento, que nas suas linhas geraes foi estabelecido pelo decreto eleitoral de 1895 o acceito pelas leis eleitoraes de 1896 e 1899, assegurará mais efficazmente a genuidade dos recenseamentos e obstará a que se regresse ao deploravel regime a que o referido decreto tão acertadamente pôs cobro.

O ponto que urge reformar na nossa legislação eleitoral é o que respeita ao modo de eleger.

Tendo sido decretado em 1895 o escrutinio de lista, por circulos districtaes, sem representação de minorias, a lei eleitoral de 1896 restabeleceu, e a de 1899 conservou, o regime dos circulos uninominaes, exceptuando apenas os circulos de Lisboa e Porto, constituidos por estas grandes agglomerações urbanas.

As vantagens e inconvenientes de um e de outro modo de eleger teem sido largamente debatidas e são sobejamente conhecidas; no nosso país, como em outras nações, a legislação tem adoptado era um, ora outro systema; e esta fluctuação demonstra que a determinação do modo de eleger, ao contrario da constituição do eleitorado, depende das variaveis circumstancias da vida politica, sendo util ou nocivo um e outro regime, consoante as peculiares condições do tempo, que a respeito de cada um podem valorizar-lhe as qualidades ou dar relevo aos seus defeitos. A adopção ou rejeição de um ou de outro regime não pode constituir dogma, que extreme partidos ou escolas politicas; ao legislador impende inquirir qual dos systemas seja o melhor accommodado, em determinada epoca, á proficua organização das assembléas legislativas, com todos os elementos necessarios ao seu duplo fim de cooperarem com o Governo na superior direcção da vida nacional e fiscalizarem os actos da administração publica.

Vigorou entre nós o escrutinio de lista durante o primeiro periodo da nossa historia constitucional, em que as affirmações doutrinarias separavam e oppunham os agrupamentos partidarios em lutas vehementes e por vezes tumultuarias e sangrentas.

Apaziguadas as paixões que convulsionaram essa epoca e aberto um periodo de desenvolvimento economico, favorecido e instigado pelas theorias de fomento, que seduziam a opinião e inspiravam os governos, adoptou-se o escrutinio uninominal, que melhor se apropriava a interessar a vida local em todos os melhoramentos materiaes e a promover a distribuição d'elles pelas diversas regiões do país, conforme os encargos tributarios que lhes traziam e a importancia industrial, agricola ou commercial por que ellas se faziam valer. Remodelada mais de uma vez a divisão dos circulos eleitoraes, alargou-se ou restringiu-se a sua arca, consoante á vida local se attribuia menor ou maior preponderancia na escolha dos representantes da nação. Pela diuturnidade d'este regime, a tal ponto se subalternisou a vida politica das circumscripções eleitoraes perante a acção do poder central, que em duas eleições geraes successivas, presididas por gabinetes de differente feição partidaria, as opposições não lograram obter proporcionada representação na camara electiva. Uma excessiva complacencia do suffragio com as indicações do partido dominante, obstava e que no Parlamento tivessem ingresso eximios estadistas e individualidades respeitadas pelo seu saber e pelo seu caracter, cuja voz auctorizada poderia ser aviso e conselho numa assembléa politica.

Estabeleceu-se, por isso, em 1884, o regime mixto de circulos uninominaes e plurinominaes, tendo estes a sua sede nas capitães dos districtos e fazendo-se nelles a votação por lista incompleta para dar logar á representação das minorias. Generalizando-se em 1895 o escrutinio de lista, para a eleição de todos os deputados, com excepção dos eleitos pelo ultramar, é notorio que as vantagens d'essa reforma foram frustradas, porque circumstancias de occasião motivaram a abstenção eleitoral de um dos partidos de governo.

As eleições realizadas, com os circulos uninominaes, em 1897, 1899 e 1900, demonstraram que elles já não soffrem hoje tanto dos defeitos que os condemnaram em parte na reforma eleitoral de 1884, porque em todas ellas as opposições conseguiram trazer á Camara elementos valiosos pelo numero e pela qualidade; e para este resultado por certo efficazmente contribuiu o robustecimento do corpo eleitoral, pela melhoria dos recenseamentos, iniciada com a reforma de 1895 e felizmente mantida na legislação subsequente. Mas as mesmas eleições puseram em evidencia outros graves inconvenientes d'estes circulos; a escolha de representantes da nação, que deve inspirar-se nos superiores intuitos da alta funcção politica que elles são chamados a desempenhar, é embaraçada pela imposição de estreitas conveniencias locaes, e a luta entre as parcialidades politicas torna-se tão viva e intensa, que perturba a acção da administração publica.

Affirmada nestas eleições a energia, cohesão e disciplina dos partidos para obterem a devida representação parlamentar, urge decretar o meio mais apropriado, não só para que a escolha de deputados se determine por considerações de interesse nacional, mas tambem para que os partidos se não fraccionem ou degenerem em clientelas, e para que se mantenham á altura da missão que lhes cumpre desempenhar nos paises de instituições representativas. O regime dos circulos plurinominaes, com lista, incompleta, não significa, nestas condições, um artificio legal para favorecer determinada parcialidade politica, desamparada do elementos de vitalidade; traduz o reconhecimento das organizações partidarias existentes, traçando lhes meio adequado ao desenvolvimento da sua acção pela forma mais consentanea com os superiores interesses do Estado. Remediados pela adopção da lista incompleta os inconvenientes que em 1890 prejudicaram a efficacia do escrutinio de lista, então decretado, com inteira verdade se poderá dizer, como se affirmava no relatorio do decreto eleitoral d'aquelle anno, que elle á verdadeiramente liberal, disciplinador dos partidos e harmonico com a indole que deve ter o Parlamento.

Para a divisão dos circulos eleitoraes deverá aproveitar-se a circumscripção districtal, que não pode averbar-se de suspeita por melhor convir a determinada parcialidade com detrimento de outra e que era seu favor tem a communhão de interesses criados e de tradições já radicadas.

A esta regra só poderá abrir se excepção nos poucos districtos em que, pela sua avultada população, mais dilatada area e maior numero de concelhos, é mais elevado o numero de deputados que hão de eleger; nesses districtos a divisão dos circulos deverá accommodar-se quanto possivel ao agrupamento e solidariedade dos interesses regionaes. A actual distribuição dos deputados pelos diversos districtos somente demanda leves correcções para melhor

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a proporcionar á população respectiva e facilmente se fazer a transição do regimen dos circulos uninominaes para o dos circulos plurinominaes. O numero total dos deputados poderá ter, por tal motivo, um pequeno augmento.

As reformam eleitoraes que se teem succedido, ordenaram novas divisões das assembléas em que os eleitores hão de reunir-se para a votação; e as regras a que a divisão deveria subordinar-se, segundo a legislação vigente, não carecem de ser alteradas. Todavia a applicação d'essss regras em diversos concelhos do país deixou de ser feita, por occasião da ultima remodelação das assembléas eleitoraes, em inteira conformidade com as commodidades dos eleitores, motivando queixas, que não chegaram no conhecimento do Governo e que tiveram echo na Camara dos Senhores Deputados, onde foram apresentados varios projectos de lei com o fim de melhorar, em alguns concelhos, a divisão estabelecida.

É portanto de grande conveniencia que, embora se não ordene uma revisão geral das assembléas eleitoraes, se faculte aos eleitores e ás corporações locaes interessadas o direito de reclamar contra a divisão em vigor, quando nella não tenham sido devidamente consideradas as diversas circumstancias que a podem tornar mais ou menos commoda para o accesso o reunião dos eleitores, segundo as vias de communicação, a distribuição da população, mais ou menos agglomerada ou dispersa, os edificios disponiveis para sede das assembléas, e outras condições que mereçam ser ponderadas.

As leis anteriores confiavam este serviço de revisão das assembléas ás commissões do recenseamento, com recurso para o poder judicial; mas a natureza discricionaria de um assumpto, em que principalmente se apreciam interesses de ordem publica e em que as prescripções legaes, pela sua vaga generalidade, dão margem a largo arbitrio na sua execução, mal se compadece com a indole do poder judicial, que tem por fim principal applicar as disposições das leis ás controversias suscitadas pela offensa de direitos. Melhor cabe tal assumpto na competencia dos tribunaes administrativos; por isso, opportuno parece que aos auditores administrativos se entregue a decisão das reclamações apresentadas, regulando-se summariamente o processo de instrucção das reclamados, e permttindo-se recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, que em ultima instancia, com jurisdicção plena e sem homologação do Governo, resolva como for justo.

Muito para desejar seria que em todo o país houvesse o necessario numero de edificios civis, para nelles se reunirem as assembléas eleitoraes, e que pudesse prohibir-se a constituição d'ellas dentro dos templos; obteriam assim inteiro deferimento as repelidas representações que teem dirigido no Governo os prelados das dioceses, instando por que se removem, dos edificios votados ao culto religioso, reuniões que por vezes occasionam tumultos e desacatos.

A escassez da edificios apropriados não permitte que desde já se adopte providencia tão radical; mas deve preceituar-se que, somente na falta d'esses edificios, as assembléas eleitoraes possam reunir-se dentro dos templos.

E embora a divisão de assembléas tenha caracter permanente, deve facultar-se a todo o tempo a transferencia das respectivas sedes para edificios civis, quando se reconheça que, sem prejuizo da divisão estabelecida, nelles concorrem as cpndições exigidas rara o acto eleitoral. A decisão das reclamações do clero parochial a tal respeito pode ser confiada aos governadores civis, com recurso para o Governo.

A escolha de presidentes das assembléas eleitoraes é ponto capital que demanda novas providencias, desde que são extinctas as commissões do recenseamento, ás quaes pertencia nomeá-los, e que, no exercicio d'esta attribuição, se não mostraram mais imparciaes do que nas proprias operações de recenceamento. As attribuições privativas dos presidentes das assembléas acêrca da manutenção da ordem e da garantia da liberdade dos eleitores, sendo funcções de auctoridade administrativa e policial, logicamente levariam a conficar a nomeação d'elles ao Governo ou aos seus delegados nos districtos. Não propõe o Governo que se abrace esta conclusão; não se arreceia, por certo, das responsabilidades que lhe adviriam do exercicio d'essa faculdade, porque nas ultimas eleições politicas e administrativas deu mostras de que não sacrificava a interesses do partido os deveres de velar pela segurança publica e pela liberdade individual e politica dos cidadãos;, mas rejeita um alvitro, que logo poderia ser malsinado com a suspeição de ter em mira conveniencias mesquinhas de facção.

Sendo a circumscripção districtal a base da organização dos circulos eleitoraes, a commissão districtal, que é electiva na maioria dos seus vogaes, e até na sua totalidade, nos districtos de organisação especial, está naturalmente indicada como sendo a estação administrativa, que melhor se recommenda para a escolha dos presidentes das assembléas nas eleições politicos. A sua situação na hierarchia dos corpos administrativos liberta-a de preoccupações, que actuam mais intimamente nas corporações municipaes, e a jurisdicção que exerce sobre todo districto permitte-lhe designar para as presidencias pessoas estranhas aos concelhos a que pertencem as assembléas. A pratica tem sobejamente demonstrado quanto é benefica, para a tranquillidade e boa ordem do acto eleitoral, a interferencia de pessoas alheias ás paixões locaes, que muitas vezes dividem os eleitores em facções acerbamente hostis. A nomeação de delegados especiaes de Governo para as assembléas em que a luta é mais renhida, tem, em muitos casos, contribuido efficazmente para acalmar os animos irritados, cohibindo fraudes o violencias, e deixando concluir em socego um acto, em que a explosão de odios e malquerenças a cada momento se receava, provocada pelo mais leve incidente.

Não procedem já idênticas razões para a escolha das presidencias das alambicas nas eleições municipaes o parochiaes. Nas primeiras as presidencias podem ser designadas de entre os cidadãos, que em determinado periodo foram chamados pelo suffragio ao serviço da vereação, fazendo-se a designação por meio de sorteio, perante o juiz de direito da comarca: nas segundas, attenta a sua menor importancia, as presidencias podem ser de nomeação das camaras municipaes.

Para substituir os presidentes, que por qualquer circumstancia deixem de comparecer nas assembléas, para que forem designados, muito convem que haja supplentes previamente escolhidos. A nomeação dos presidentes pelas assembléas eleitoraes pode occasionar conflictos, que importa evitar, e só deve ser facultada no caso extremo em que simultaneamente deixem de comparecer o presidente nomeado a quem deva substitui-lo.

Tem difficuldades a solução do problema, mas ao Governo parece que a intervenção dos corpos administrativos neste acto, não obstante os reparos que ella possa soffrer, é preferivel ao chamamento dos magistrados e funccionarios judiciaes ao exercicio de funcções de natureza politica, encarregando-se de presidir ás assembléas eleitoraes ou de fazer as nomeações de presidentes.

A constituição das mesas eleitoraes, com representantes das parcialidades que se debatem, está desde muito regulada na nossa legislação, e é um meio de fiscalização das operações eleitoraes, evitando muitas fraudes e falsificações. Exige-se, porem, actualmente que, para a representação de um grupo politico na constituição das mesas, em

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competencia com outro grupo que dispõe de maior numero de votos, a minoria exceda a quarta parte dos eleitores presentes na occasião da formação das mesas. Para facilitar ás minorias a fiscalização a que teem direito, é de vantagem que se reduza á sexta parte dos eleitores presentes nesse acto o limite minimo, perante o qual a representação d'ellas fica legalmente prejudicada.

Prevê a actual legislação o caso em que os eleitores sejam coagidos a abandonar o local das assembléas e inhibidos de exercer ali os seus direitos politicos, permittindo-lhes que se reunam noutro local, sob presidente da sua escolha, para livremente manifestarem o seu voto. Mas é omissa acêrca das formalidades, a que deve subordinar-se este desdobramento das assembléas, não define os motivos que o legitimam e nada dispõe acêrca do processo de apuramento da votação das assembléas assim desdobradas. É indispensavel preencher estas lacunas. Ao tribunal de verificação de poderes competirá declarar, em vista dos elementos de apreciação que lhe offerecer o processo eleitoral, qual a votação que legitimamente se deva apurar; mas a assembléa que se constituir fora do local competente deve subordinar-se a todos os preceitos que regulam a votação e o escrutinio; em ambas as assembléas deve intervir a auctoridade publica; numa e noutra devem salvaguardar-se as formalidades necessarias para que os actos eleitoraes sejam devidamente comprovados; e na assembléa de apuramento, acatando se a presumpção de legitimidade em favor da que funccionou no edificio para esse effeito designado legalmente, devem receber-se os documentos relativos a assembléa formada fora d'esse edificio, apurando-se em separado os votos que nella realmente tiveram os candidatos e sobre cuja validade ou nullidade haverá de pronunciar-se o tribunal julgador da eleição.

Apesar das alterações que foram feitas pela lei de 26 de julho de l899 ao artigo 59.° da lei de 21 de maio de 1896, que regulava a comparencia da força armada nas assembléas eleitoraes, continuou sendo objecto de duvida só a policia civil era equiparada á força militar para somente ser chamada nos casos e com as formalidades e effeitos previstos para a força militar. A duvida deve resolver-se no sentido mais liberal, estatuindo-se iguaes preceitos acêrca da comparencia de qualquer força armada, quer seja civil, quer seja militarmente organizada, pois que uma e outra podem exercer a mesma intimidação no animo dos eleitores.

No regime dos circulos uninominaes ou plurinominaes, com area restricta, as operações do apuramento podem completarão todas na sua sede, sem grande incommodo para os portadores das actas das assembléas primarias, que só por excepção terão de percorrer grandes distancias. Porem, com os circulos districtaes, seria muito oneroso para, os portadores das actas obrigá-los a comparecer na sede do circulo, causando-lhes incommodos e despesas, a que procurariam esquivar-se, com prejuizo do serviço da assembléa de apuramento. Estes inconvenientes podem remediar-se, fazendo-se em cada concelho o apuramento da votação nelle realizada e effectuando se na sede do circulo o apuramento geral da votação de todo elle. Para o primeiro apuramento, pode constituir-se a assembléa com os portadores de actas das assembléas primarias; quanto ao segundo, basta que nelle tome parte um representante de cada uma das assembléas encarregadas do apuramento da votação de cada concelho.

Ás assembléas reunidas nas sedes dos concelhos para os apuramentos parciaes podem competir todas as attribuições que actualmente pertencem ás assembléas do apuramento, com excepção da proclamação dos deputados eleitos. Ás assembléas das sedes dos circulos somente incumbirá sommar as votações apuradas nos concelhos, publicar o resultado geral da votação no circulo e, conforme este resultado, proclamar os deputados eleitos, conferindo-lhes o diploma da eleição.

Segundo a legislação actual deve repetir-se a eleição em todo o circulo, quando seja annullada por irregularidades occorridas em mais de uma assembléa eleitoral, repetindo-se os actos eleitoraes apenas numa assembléa, quando somente ahi haja nullidades que influam no resultado geral da votação do circulo. Este principio, applicado aos circulos districtaes, importaria incommodos desnecessarios para grande numero de eleitores inteiramente estranhos aos factos perturbadores da boa ordem da eleição; por isso convirá determinar-se, á semelhança do que prescreveu o decreto eleitoral de 28 de março de 1895, que a repetição do acto eleitoral em todo o circulo, em consequencia de nullidades que influam no resultado final da eleição, somente se verificará quando essas nullidades prejudiquem a votação de assembléas, cujo numero de votantes exceda um terço do numero de eleitores que realmente votaram em todo o circulo.

Nos actos eleitoraes repetidos observar-se-hão todas as formalidades estabelecidas para a eleição geral; porem, quando a repetição occorra numa unica assembléa e não haja, portanto, assembléa, de apuramento, preciso é regular o destino que hão de ter os respectivos papeis, acabando com as incertezas a que deixa logar a deficiencia da lei actual.

Com a restauração da representação das minorias, deverá renovar-se o vigor de diversas disposições, que segundo a lei de 21 de maio de 1884 regulavam o escrutinio de lista incompleta.

Em harmonia com as propostas alterações da legislação actual, precisam de ser revistas as respectivas disposições penaes; e em alguns pontos de somenos, importancia a redacção da lei demanda aclarações, para evitar duvidas de interpretação.

A estes intuitos procurou attender o projecto de decreto que o Governo tem a honra do submetter á approvação de Vossa Majestade e com o qual entende bom servir os interesses do país e contribuir para o aperfeiçoamento das nossas instituições representativas.

Paço, em 8 de agosto do 1901. - Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro =Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos - Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa - Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que Me representaram os Ministros e Secretarios de Estado de todas as Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

CAPITULO I

Dos eleitores

Artigo 1.° São eleitores de cargos politicos e administrativos todos os cidadãos portugueses, maiores de vinte e um annos e domiciliados em territorio nacional, nos quaes concorra alguma das seguintes circumstancias:

1.° Ser collectados em verba não inferior a 500 réis de uma ou mais contribuições directas do estado;

2.º Saber ler e escrever.

Art. 2.º Não podem ser eleitores:

l ° Os interdictos, por sentença, da administração de sua pessoa ou de seus bens, e os fallidos não rehabilitados;

2.° Os indiciados por despacho de pronuncia com transito em julgado, e os incapazes de eleger para funcções publicas, por effeito de sentença penal;

3.° Os condemnados por vadios ou por delicio equiparado, nos cinco annos immediatos á condemnação;

4.° Os indigentes; os que não tiverem meios de vida conhecidos; os que se entregarem á mendicidade, ou que

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para a sua subsistencia receberem algum subsidio da beneficencia publica ou particular;

5.º Os criados do galão branco da Casa Real, e os criados de servir, considerando se como taes os individuos obrigados a serviço domestico, na forma definido, pelo Codigo Civil;

6.° As praças de pret do exercito e da armada, e os assalariados dos estabelecimentos fabris do estado.

CAPITULO II

Dos deputados

Art. 8.° Todos os que teem capacidade para ser eleitores são habeis para ser eleitos deputados, sem condição de domicilio ou residencia.

Art. 4.° São absolutamente inelegiveis para o logar de deputado:

1.° Os estrangeiros naturalizados;

2.° Os membros da Camaras dos Pares;

3.º Os que, nos termos do artigo 7.° do Primeiro Acto Addicional á Carta Constitucional, não forem habilitados com um curso de instrucção superior, secundaria, especial ou profissional, ou que não tiverem de renda liquida annual 400$000 réis, provenientes de bens de raiz, capitães, commercio, industria ou emprego inamovivel.

Art. 5.° São respectivamente inelegiveis e não podem por isso ser votados para deputados nas divisões territoriaes a que respeitar o exercicio das suas funcções;

1.° Os magistrados administrativos, judiciaes e do Ministerio Publico, os conservadores do registo predial e os notarios publicos;

2.° As auctoridades militares;

3.° Os empregados dos corpos administrativos e os dos governos civis e administrações dos concelhos ou bairros;

4.° Os empregados fiscaes e de justiça;

5.° Os directores e chefes de serviços technicos dependentes do Ministerio das Obras Publicas e os empregados que lhes forem subordinados.

§ l.° A inelegibilidade prevista neste artigo subsiste ainda durante sessenta dias, depois que, por qualquer motivo, cessou na respectiva circumscripção o provimento no cargo.

§ 2.° A mesma inelegibilidade abrange os substitutos e interinos que exerçam o cargo em todo ou em parte do tempo da eleição.

§ 3.° Para todos os effeitos eleitoraes considera-se tempo da eleição o que decorro desde a publicação do diploma que designar o dia da eleição até á conclusão de apuramento.

§ 4.º A inelegibilidade prevista neste artigo não comprehende os funccionarios cujas attribuições abrangem todo o continente do reino, ilhas adjacentes ou provincias ultramarinas.

Art. 6.° É incompativel o logar de deputado:

1.º Com qualquer emprego da Casa Real, estando o empregado em effectivo serviço;

2.º Com o logar de concessionario, contratador ou socio de firma contratadora do concessões, arrematações ou empreitadas de obras publicas ou de operações financeiras com o Estado;

3.° Com o logar de director, administrador, gerente ou membro dos conselhos administrativos ou fiscaes de quaesquer companhias ou sociedades, que recebam subsidio do Estado ou administrem por conta d'este alguns dos seus rendimentos, excepto com o logar dos que, por delegação do Governo, representarem nellas os interesses do Estado;

4.° Com o logar de governador civil e secretario geral e com outro emprego dos governos civis;

5.° Com os logares de administrador do concelho ou bairro, e com os lugares das secretarias das administrações de concelho ou bairro, e das secretarias das camaras municipaes;

6.º Com os logares de delegado ou sub-delegado do procurador regio;

7.º Com os logares de governadores das provincias e districtos ultramarinos, respectivos secretarios e chefes de repartições ou serviços; com os logares de juizes de l.ª e 2.ª instancia, o quaesquer empregos militares das mesmas provincias;

8.° Com os logares das repartições de fazenda dos districtos e dos concelhos ou bairros;

9.° Com os logares do quadro do serviço interno das alfandegas;

10.° Com as funcções do Corpo Diplomatico ou Consular;

11.° Com o logar do commandante da estação naval.

Art. 7.° Os empregados comprehendidos nas disposições do artigo 6.º podem optar, depois de eleitos, pelo logar do deputado ou pelo emprego ou commissão.

Art. 8.° Julgadas as eleições e reunida a Camara doe modo que possa começar legalmente a funccionar, os individuos que houverem de optar não poderão prestar juramento sem que declarem, estando presentes, que optam pelo logar de deputado,

§ l.° Se estiverem ausentes, a Camara lhes fixará logo um prazo razoavel para darem conta da sua opção, sob pena de se entender que resignam o logar de deputado.

§ 2.° Os cidadãos comprehendidos nas disposições dos n.ºs 2.º e 3.º do artigo 6. não poderão ser admittidos a prestar juramento sem que mostrem, nos referidos prazos, ter cessado legalmente o motivo da incompatibilidade.

Art. 9.° Perde o logar do deputado:

1.° O que acceitar do Governo titulo, graça ou condecoração que não lhe pertença por lei;

2.º O que tomar ausento na Camara dos Pares;

3.° O que perder a qualidade de cidadão português;

4.° O que, por sentença com transito em julgado, incorrer em interdicção ou incapacidade prevista no n.º 1.° e na ultima parte do n.º 2.º do artigo 2.°;

5.º O que acceitar emprego, commissão, serviço ou situação que o torne incompativel com o logar do deputado;

6. O que acceitar lugar mencionado no n.° 5." do § 2.° do artigo 11.º;

7.º O que não comparecer a tomar assento na Camara na primeira sessão da respectiva legislatura;

8.° O que abandonar o logar nos termos do artigo 105.°

§ l.° Todos os deputados que perderem os seus logares em virtude da disposição do n.° 1.°, somente poderão ser reeleitos passados seis meses.

§ 2.° Somente á Camara dos Deputados compete declarar a perda do logar em que incorrer algum dos seus membros, fundando-se, salvo nos casos dos n.°s 7.° e 8.°, em documento authentico comprovativo do facto que a motivar.

Art. 10.° A disposição restricta do artigo antecedente cessa no caso regulado nu artigo 33.° da Carta Constitucional; de modo que, só por algum caso imprevisto, de que dependa a segurança publica ou o bem do Estado for indispensavel que algum Deputado saia para outra commissão, ainda que subsidiada, ou emprego retribuido amovivel, a respectiva Camara o poderá determinar sem que elle por isso perca o seu logar.

§ unico. Se a Comara não estiver reunida daterminá-lo-ha o Governo, dando depois conta ás Côrtes.

Art. 11.° Nenhum Deputado, depois do proclamado na assembléa de apuramento, pode ser nomeado pelo Governo, durante o tempo do legislatura, para cargo, posto retribuido ou commissão subsidiada a que não tenha direito por lei, regulamento, escala, antiguidade ou concurso.

§ 1.º Para os effeitos d'este artigo a legislatura termina

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logo depois do encerramento da ultima sessão ordinaria ou da dissolução da Camara.

§ 2.° Exceptuam-se: 1.°, os cargos de ministro de estado e de conselheiro de estado, cuja acceitação não importa a perda do logar de deputado, e cujo exercicio não é incompatavel com este logar; 2.°, as commissões auctorizadas pela Camara, sem prejuizo do logar de deputado, nos casos previstos no artigo 33.° da Carta Constitucional; 3.°, o cargo de governador civil; 4.°, as transferencias ou nomeações de funccionarios para logares de igual categoria ou que não tenham maior vencimento; 5.°, as nomeações do funccionarios para logares que por ellas possam ser exercidos em commissão, segundo a lei organica dos quadros a que pertencem.

CAPITULO III

No recenseamento eleitoral

Art. 12.° O direito de votar é verificado em cada concelho ou bairro pelo recenseamento eleitoral, no qual se apurará tambem a elegibilidade absoluta para cargos administrativos.

Art. 13.° O recenseamento eleitoral é annualmente revisto, tornando-se por base o recenseamento vigente na epoca da revisão.

Art. 14.° A idade para a inscripção no recenseamento eleitoral deverá completar-se até o dia 30 de junho do anno em que se effectuar a revisão.

Art. 15.° Os eleitores deverão ser recenseados no concelho ou bairro onde residirem a maior parte do anno; os empregados publicos naquelle onde exercerem as suas funcções na epoca do recenseamento, e os militares naquelle em que na mesma epoca estiver o seu quartel de habitação.

§ 1.° O eleitor que, em concelho ou bairro differente d'aquelle onde estiver residindo, for collectado era alguma das contribuições do Estado, predial, industrial, de renda de casas ou sumptuaria, poderá, não sendo empregado publico ou militar, ser inscripto no recenseamento d'esse conselho ou bairro, se assim o declarar perante o funccionario encarregado do recenseamento de um e de outro, instruindo a sua declaração com documento comprovativo da collecta que tiver pago.

§ 2.° Em Lisboa e Porto poderão ser recenseados no bairro da sua residencia, quando noutro exerçam as suas funcções, os empregados publicos que assim o declarem perante os secretarios das administrações dos dois bairros.

Art. 16.º São despesas obrigatorias das camaras municipaes todas as que só fizerem com o expediente do recenseamento eleitoral e das eleições, comprehendendo umas, cofres e mais objectos indispensaveis.

Art. 17.° As operações do recenseamento serão feitas em cada concelho pelo secretario da camara municipal, auxiliado, sem prejuizo do serviço a que estiverem obrigados, pelos empregados da respectiva secretaria ou pelos da administração do concelho, que elle requisitar.

§ l.° Noa bairros de Lisboa e Porto o recenseamento será organizado pelos secretarios das administrações, coadjuvados, sem prejuizo do serviço a que estiverem obrigados, pelos empregados das secretarias respectivas ou pelos das camaras municipaes, que elles requisitarem.

§ 2.° Os secretarios e os seus auxiliares vencerão a gratificação que a camara lhes arbitrar, dentro da verba orçada para este fim como despesa obrigatoria.

Art. 18.º O secretario da Camara Municipal ou da Administração dos bairros de Lisboa e Porto, por editaes affixados com quinze dias do antecedencia, tornará publico o praso dentro do qual são recebidos os documentos e requerimentos que para a revisão do recenseamento lhe queiram entregar os interessados, mediante recibo.

Art. 19.° Para a revisão do recenseamento o secretario deverá convocar os parochos e regedores para dar informações, e requisitará das citações officiaes os esclarecimentos necessarios.

§ unico. As informações serão reduzidas a termo assignado pelo secretario e por quem as prestar.

Art. 20.º O administrador do concelho ou bairro fiscalizará as operações do recenseamento, promovendo que sejam pontualmente cumpridas as disposições legaes, emittindo o seu parecer acêrca da resolução de todas as duvidas suscitadas, rubricando, sempre que o entender conveniente, os documentos relativos á revisão do recenseamento, e interpondo as reclamações e recursos devidos, nos prazos e termos competentes.

Art. 21.º A inscripção no recenseamento eleitoral terá por base os seguintes documentos:

1.º Relações, por freguesias, organizadas pelo escrivão de fazenda do concelho ou bairro, contendo os nomes de todos os contribuintes que no lançamento immediatamente anterior foram collectados pelo Estado em qualquer verba de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros;

2.º Documentos apresentados pelos interessados, provando que, pelo lançamento immediatamente anterior, effectuado em qualquer concelho ou bairro, foram collectados em alguma das contribuições designadas no numero antecedente ou que, no anno immediatamente anterior, foram tributados em imposto mineiro ou de rendimento;

3.° Declarações de transferencia do domicilio, em conformidade do disposto nos §§ l.° e 2.° do artigo 15.°;

4.° Relações, por freguesias, organizadas pelos parochos, contendo os nomes de todos os que tiverem qualquer curso de instrucção especial ou superior;

5 ° Relações organizadas por todos os chefes de serviços publicos do concelho, contendo os nomes de todos os seus empregados, residentes no mesmo concelho, que estiverem nas condições do artigo 1.°;

6.° Relações organizadas por todos os commandantes de forças militares, contendo os nomes de todos os officiaes que tiverem residencia no concelho;

7.° Requerimentos dos interessados pedindo a propria inscripção no recenseamento pelo fundamento de saber ler e escrever, quando sejam por elles escritos e assignados na presença do notario publico, que assim o certifique e reconheça a letra e a assignatura, ou na presença do parocho, que assim o atteste sob juramento, sendo a identidade do requerente corroborada por attestado jurado do regedor de parochia.

§ l.° Nas collectas a que se referem os n.ºs 1.° e 2.º comprehendem-se os addicionaes, que não pertençam aos corpos administrativos.

§ 2.° Para o apuramento da quota censitica exigida pelo artigo 1.° sommam-se as verbas das diversas contribuições mencionadas nos n.ºs 1.° e 2.° do presente artigo.

§ 3.° A contribuição predial sobre foros, censos ou pensões será attendida em favor d'aquelle por conta de quem for paga.

§ 4.° O imposto de rendimento sobre titulos somente será levado em conta quando estiverem averbados ha mais de um anno, ininterruptamente, a favor do seu possuidor.

§ 5.° Ao marido se levarão em conta os impostos correspondentes aos bens da mulher, posto que entre elles não haja communhão de bens, e ao pae os impostos correspondentes aos bens do filho, quando por documento authentico se provar que lhe pertence o usufructo d'elles.

§ 6.º A contribuição directa paga por uma sociedade, companhia ou empresa será attendida para o recenseamento dos socios ou accionistas, em proporção do interesse que cada um provar, por documento authentico, ter na mesma sociedade, companhia ou empresa. A mesma disposição só observará achando-se o casal indiviso, por viverem em comutam os membros da mesma familia.

§ 7.° A inscripção por saber ler e escrever não depende

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do novo requerimento para ser mantida no mesmo concelho ou bairro.

Art. 22.º O secretario somente pode eliminar do recenseamento eleitoral:

1.° Os fallecidos, sendo o obito comprovado por certidão ou pelas relações que os parochos e officiaes do registo civil devem remetter no mesmo secretario, relativamente aos obitos occorridos no ultimo anno;

2.° Os quo ha mais do um anno se ausentaram do concelho ou bairro, segundo constar de informações conformes do parocho o da regedor;

3.º Os que declararam a transferencia do seu domicilio politico, segundo o disposto noa §§ 1.° o 2.º do artigo 15.º

4.° Os que deixaram do ser tributados na indispensavel quota censitica, segundo se mostrar dos documentos a que se referem os n.os 1.° e 2.º do artigo 21.°

§ unico. A eliminação motivada por quaesquer outras circumstancias só poderá ser ordenada pelo poder judicial, precedendo reclamação ou recurso, nos termos d'este decreto.

Ari. 23.° Na inscripção dos eleitores recenseados nos anãos anteriores e mantidos no recenseamento revisto, somente serão feitas, precedendo informação do parocho ou do regedor, as alterações indispensaveis acêrca da idade, estado, morada ou profissão.

§ unico. Os mesmos eleitores poderão sor inscriptos de novo como elegiveis para cargos administrativos, sendo a elegibilidade comprovada nos termos do artigo l9.º

Art. 24.° Ás relações officiaes, a que se referem os artigos 21.° e 22.°, deverão ser enviadas ao secretario recenseador, até o decimo dia anterior ao começo das operações de revisão do recenseamento.

Art. 25.° O secretario recenseador, tomando por base o recenseamento vigente, que em Lisboa o Porto será requisitado do funccionario competente, examinando todos os documentos colligidos paru as operações de revisão o ouvindo os parochos o regedores, organizará por freguesias relações avulsas de todos os eleitores que de novo devam inscrever-se, dos eliminados do recenseamento e dos que no mesmo eito mantidos por inscripção feita nos annos anteriores.

§ 1.° A relação dos eleitores inscriptos da novo deverá declarar a respeito de cada eleitor o seu nome, idade, estado, profissão o morada, o fundamento da sua inscripção, nos termos dos n.os 1.º e 2.º do artigo 1.°, mencionando-se no caso do n.º l.º a collecta respectiva, o se é elegivel para cargos administrativos, sondo esta elegibilidade apurada segundo as informações prestadas na conformidade do artigo 19.°; apelação dos eleitores eliminados deverá conter a copia exacta do todos os disseres do recenseamento e mencionar acêrca do cada eleitor o facto motivante da eliminação; a relação dos eleitores que transitam dos annos anteriores deverá indicar, em columna especial, as alterações feitas acerca do estado, morada ou profissão dos eleitores; o todas as relações porão datadas, assignadas o rubricadas pelo secretario recenseador, podendo rubricadas tambem o administrador do concelho ou bairro.

§ 2.° Quando algum dos contribuintes comprehendidos nas relações do escrivão do fazenda não deva ser recenseado, embora se mostre collectado em verba sufficiente para a inscripção, o secretario lançará, nas mesmas relações ou em folha addicional, nota declarando o motivo da exclusão, a qual sova rubricada pulo parocho ou regedor, se for fundada em informação de um ou outro.

Art. 26.º As relações a que se refere o artigo antecedente estarão expostas a exame e reclamação na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro, desde as novo horas da manhã até ás tres horas da tardo, e copias manuscriptas ou impressas, devidamente authenticadas, serão affixadas nas igrejas das freguesias respectivas, o que tudo se tornará publico por editaes anisados nos logares do estylo.

§ 1.º Da affixação dos editaes e relações do recenseamento, ficarão certidões na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro.

§ 2.° O secretario mandará imprimir as relações a que se refere o artigo 25.º, e as distribuirá aos parochos, regedores e pessoas quo as exigirem.

§ 3.° Uma copia das mesmas relações, manuscripta ou impressa, devidamente authenticada, será remettida ao juiz de direito da comarca a que pertencer a sede do concelho, o nas comarcas do Lisboa e Porto ao juiz da primeira vara civel, para ficar archivada era juizo. O juiz, sempre que lhe seja requerido por qualquer eleitor, facultará o exame d'estas relações.

Art. 27.° Contra a indevida ou inexacta inscripção e contra a omissão de algum cidadão no recenseamento poderá reclamar, perante o competente juiz de direito, o proprio interessado, qualquer cidadão ao circulo recenseado como eleitor no anno antecedente, com relação a terceiro, e o administrador do concelho ou bairro, e num só requerimento se poderá reclamar por muitos ou por todos os quo se julgarem prejudicados.

g 1.° Estas reclamações serão sempre feitas por escrito, assignadas pelo reclamante ou por sou procurador, sendo a assignatura devidamente reconhecida se o reclamante não for a auctoridade publica, e serão logo instruídas com quaesquer documentos que lhes sirvam de prova.

§ 2.º As decisões doo juizes de direito serão motivadas e notificadas aos reclamantes, reclamados o secretario recenseador. As notificações dos cidadãos residentes fora da comarca serão requisitadas por officio ao juiz da comarca onde residirem. Os officiaes de diligencia serão coadjuvados neste serviço pelos agentes administrativos que o juiz requisitar da camara municipal ou da administração do concelho ou bairro.

§ 3.º Os processos de reclamação não serão em caso algum entregues aos reclamantes.

Art. 28.º A reclamação contra a inscripção fundada no facto de sabor ler e escrever será instruida com documento comprovativo da contestação e o juiz de direito fará intimar o eleitor inscripto para que, no prazo de tres dias, compareça perante elle a fim de escrever e assignar um requerimento solicitando a inscripção no recenseamento eleitoral. Não comparecendo, será julgada procedente a reclamação, excepto se o eleitor provar justo impedimento, e neste caso lhe será assignado novo prazo.

§ unico. Esta reclamação poderá ser apresentada contra os eleitores já inscriptos nos annos anteriores, mas sondo julgada improcedente não poderá interpor-se de novo.

Art. 29.° Em conformidade com as decisões do juiz de direito, o secretario recenseador addicionará ás relações respectivas o nome doo eleitores incluidos no recenseamento, eliminará d'ellas o nome dos que forem excluidos, e fará todas as mais alterações ordenadas, publicando por editaes affixados nas portas das igrejas todos os addicionamentos, eliminações e alterações feitas. Da affixação dos editaes se passará certidão, que ficará archivada na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro.

§ l.° As relações do recenseamento, assim modificadas, estarão patentes, durante o prazo legal, na secretaria da camara municipal ou da Administração do bairro desde as nove horas da manhã até ás tres horas da tarde, a todas as pessoas que as queiram examinar, as quaes poderão d'ellas tirar copias e fazê-las authenticar pelo secretario da camara, da administração do concelho ou bairro ou por notario publico.

§ 2.° Dos addicionamentos, eliminações e outras alterações, relativas a cada freguesia, enviará o secretario recenseador relações authenticadas ao juiz do direito da comarca a que pertencer a Bode do concelho ou ao juiz do direito da primeira vara civel que comarcas do Lisboa e

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Perto, para ficarem archivadas em juizo. O juiz, sempre que lhe for requerido por qualquer eleitor, facultará exame d'estes documentos.

Art. 30.º Das decisões do juiz de direito poderão recortar para a relação do districto os mesmos que são habeis para recorrer para o juiz de direito, sendo o recurso interposto perante aquelles magistrado, independentemente do termo, por meio de petição em que se exponham os seus fundamentos, instruida com os documentos convenientes, podendo ainda juntar-se outros dentro de tres dias, findos os quaes o processo será officialmente enviado ao tribunal superior.

$ 1.º O recurso será. distribuido na relação como os feitos da 6.ª classe, e o relator o mandará com vista ao ministerio publico, que responderá no prazo improrogavel de vinte e quatro horas.

& 2 º Findo esse prazo,o escrivão cobrará o feito, fa-lo ha concluso ao relator, e este o proporá logo em sessão publica com cinco juizes, sendo a decisão tomada em conferencia por tres votos conformes.

$ 3.º Para o julgamento d'estes feitos poderá haver sessão todos os dias, ainda em tempo de ferias.

Art. 31.º Do accordào da relação podem recorrer para o supremo tribunal de justiça as pessoas designadas no artigo anterior, sendo o recurso interposto, independentemente de termo, por meio de petição, que poderá ser instruida, com documentos, e dentro de quarenta e oito horas officialmente enviado, sem ficar traslado, áquelle tribunal, onde será decidido sem mais termos que os determinados para o julgamento nas relações nos §§ 1.°, 2.. 3.º do artigo antecedente.

Art. 32.° Não são admissiveis sobre o recenseamento eleitoral outras reclamações ou recursos alem dos estabelecidos neste decreto.

Art. 33.° Do supremo tribunal de justiça e da relação, logo que transitem em julgado, baixarão oficiosamente, sem ficar traslado, todos os recursos eleitoraes: as respectivas decisões serão notificadas ao secretario da camara municipal ou da administração do bairro; e este funccionario, tendo em vista as mesmas decisões e as relações do renseceamento devidamente organizadas e modificadas segundo as, decisões do juiz de direito, procederá, sob sua responsabilidade, á organização do livro do recenseamento, seguindo se na inscripção a ordem alphabetica dos nomes em cada freguesia e agrupando-se ou dividindo-se as freguesias comforme a divisão das assembleas. A respeito de cada eleitor se mencionarão todas as circumstancias de Mentidade exaradas nas relações, nos termos do § 1.º do artigo 215.º

Art. 31.º O livro do recenseamento será numerado e rubricado em todas as suas folhas pelo presidente da camara municipal, e terá lermos de abertura e encerramento, subscriptos pelo -secretario da camara municipal ou da administracão dos bairros de Lisboa e Porto, e assignados pela camara municipal, declarando-se no termo de encerramento o numero de eleitores inscriptos em cada freguesia. Nenhuma alteração poderá ser feita no mesmo livro por ordem de auctoridade alguma.

Art. 35º.0 O secretario da camara municipal é obrigado a guardar e conservar, sob sua responsabilidade, o livro do renseceamento eleitoral, e d'elle, no prazo de vinte dias depois de encerrado, remetterá copia authentica ao governador civil, por intermedio do administrador do concelho ou l airro, e ao juiz de direito da comarca a que pertencer a sede do concelho, e nas comarcas de Lisboa ou perto ao juiz da primeira vara civel, para ficar archivado em juizo.

& 1.º Dentro de oito dias, e independentemente de despacho, o secretario da camara passará, sem sêllo, todas as certidões que Ihe forem pedidas do recenseamento, me diante o emolumento de 5 réis por cada nome transcripto, e conferirá e authenticará, tambem sem sêllo, todas as copias impressas ou lithographadas que para esse effeito lhe forem apresentadas, mediante a emolumento de 1 real por cada nome conferido.

§ 2.° Da copia do recenseamento archivada no governo civil, o secretario geral, nos mesmos termos do paragrapho antecedente e mediante igual emolumento, passará certidão e authenticará, depois de conferidas, as copias impressas ou lithographadas que lhe forem apresentadas. Da mesma forma procederá o competente escrivão de direito em relação á copia do recenseamento archivada em juizo.

§ 3.° Todos os documentos relativos ás operações do recenseamento ficarão archivados na secretaria da camara municipal ou da administração do bairro, sob responsabilidade do respectivo secretario.

Art. 36.° Todo o processo eleitoral, comprehendendo o recenseamento, as reclamações, os recursos, os documentos com que forem instruidos, as petições ou requerimentos que a tal respeito se fizerem, o que nos tribunaes se ordenar, conforme as disposições d'este decreto, e os reconhecimentos de assignaturas das mesmas petições, requerimentos ou documentos, é isento do imposto do séllo e de quaesquer emolumentos ou salarios.

§ Unico. Os documentos a que se refere este artigo deverão declarar o fim para que são passados e para nenhum outro poderão utilizar-se.

Art. 37.° Todas as auctoridades, funccionarios e repartições publicas são obrigados a passar impreterivelmente, dentro de tres dias, as copias, certidões e attestados que lhes sejam requeridos, para o effeito do recenseamento eleitoral, das reclamações ou dos recursos sobre o mesmo objecto. A mesma obrigação incumbe aos parochos.

Art. 38.° Os prazos para as diversas operações do recenseamento eleitoral são os fixados no quadro junto ao presente decreto.

§ 1.° Quando em algum concelho ou bairro as operações do recenseamento se não effectuarem nos prazos legaes, poderá o Governo, ouvidos os fiscaes da Coroa e Fazenda, em conferencia, fixar novos prazos, analogos aos designados na lei, para a realização das mesmas operações.

§ 2.º As operações de revisão do recenseamento effectuadas fora dos prazos legaes serão annulladas pelo Governo, precedendo consulta dos fiscaes da Coroa e Fazenda, em conferencia,

Art. 39.° Só é considerado legal para o acto da eleição o recenseamento eleitoral encerrado no dia 30 de junho, immediatamente anterior ao da mesma eleição, ou na data competente, quando os prazos do recenseamento hajam sido prorogados.

§ Unico. No caso de força maior, devidamente comprovado, e na falta de copias authenticas, será considerado legal o recenseamento original ou copia authentica, immediatamente anterior.

CAPITULO IV

Dos circulos eleitoraes, das assembléias primarias e dos actos preparatorios da eleição.

Art. 40.° A eleição de deputados é directa e feita pelos circulos eleitoraes, designados no mappa junto a este decreto, elegendo cada circulo o numero de deputados, que no mesmo mappa é fixado.

§ Unico. A circumscripção dos circulos eleitoraes e o numero de deputados que devem eleger só por lei podem ser alterados.

Art. 41.° Contra a actual divisão de assembléas eleitoraes poderão reclamar perante o auditor administrativo, a camara municipal, as juntas de parochia respectivas e os eleitores interessados, mostrando que no agrupamento das freguesias que constituem as assembléas ou na designação das sedes d'estas não se attendeu convenientemente á melhor commodidade dos povos.

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§ 1.° A reclamação será entregue, mediante recibo, no prazo do dez dias, a contar da publicação do presente decreto, e sobre ella será immediatamente ouvida A camara municipal, se não for parte reclamante, o u administrador do concelho ou bairro, que procederá de averiguações convenientes, inquirindo testemunhas ou ordenando vistorias por peritos da sua nomeação. Nas ilhas adjacentes o prazo da reclamação contar-se-ha desde a data em que na capital do districto for recebida a folha official com a publicação do presente decreto.

§ 2.° O auditor julgará a reclamação no prazo improrogavel do quinze dias, a contar da data da apresentação, considerando-se para todos os effeitos como indeferimento a falta de decisão dentro do referido prazo; o a decisão proferida será logo communicada á camara municipal o ao administrador do concelho ou bairro, que a publicará por editaes affixados nos logares do estylo, e será notificada á junta de parochia ou eleitores reclamantes.

§ 3.° Dentro de dez dias, a contar da publicação por editaes, poderão recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo as corporações e eleitores habeis para reclamar, sendo entregue a petição, com a assignatura authenticamente reconhecida, se não for do corporação publica, ao auditor, que passará recibo o immediatamente a remetterá para aquelle tribunal, acompanhada do processo da reclamação e com a informação que houver por conveniente.

§ 4.° O recurso não tem effeito suspensivo o será julgado no Supremo Tribunal Administrativo com as formalidades e nos prazos estabelecidos para o julgamento dos recursos eleitoraes, sendo a decisão logo participada ao governador civil, para ser communicada, publicada o notificada nos termos do § 2.º Fará o julgamento não haverá ferias.

§ 5.º A reclamação o recurso, de que trata o presente artigo, e os documentos com que houverem de ser instruidos, são isentos do imposto de sêllo e do emolumentos ou salarios.

§ 6.° Na divisão que houver do se ordenar em deferimento das reclamações o recursos, as assembléas eleitoraes deverão ficar compostas de 300 a 800 eleitores approximadamente, agrupando-se na razão directa da nua proximidade as freguesias que de per si não possam formar uma assembléa, podendo, porem, constituir-se com mais do 800 eleitores uma só assembléa, quando pertençam á mesma freguesia, e devendo constituir sempre uma assembléa os eleitores de um concelho, quando sejam em numero inferior a 300.

§ 7.° As decisões das reclamações c recursos somente serão tomadas em consideração nas eleições que se effectuarem quinze dias depois da sua publicação, nos termos do § 2.º

§ 8.° Á constituição do assembléas fixada para as eleições politicas vigorará igualmente para na eleições municipaes.

§ 9.° A constituição das assembléas eleitoraes, depois do fixada na forma do presente artigo, é permanente o só por lei pode ser modificada; porem, quando haja de soffrer alteração por causa da que se fizer na circumscripção do algum circulo eleitoral ou de algum concelho, o Ministerio Publico promoverá perante o auditor administrativo as modificações indispensaveis, observando-se na parte applicavel as disposições do mesmo artigo.

Art. 42.° As assembléas eleitoraes deverão reunir-se em edificios civis, publicos, municipaes ou parochiaes, preferindo-se os que forem centraes, e somente na falta de edificio civil com as indispensaveis condições do capacidade, segurança e commodo accesso poderão reunir se nos templos, preferindo-se porem quaesquer dependencias d'elles, quando sejam convenientemente apropriadas.

§ 1.º Na decisão das reclamações o recursos a que se refere o artigo 41.º será sempre designado o edificio onde devem reunir-se as assembléas eleitoraes.

§ 2.° Contra a reunião das assembléas nos templos poderá reclamar a todo o tempo, perante o governador civil, o parodio da respectiva freguesia, mostrando que, sem prejuizo da divisão das assembléas, poderão estas reunir-se em edificio civil com as condições necessarias para o acto, observando-se na instrucção o julgamento da reclamação as disposições applicaveis do artigo 41.°

§ 3.° Da decisão do governador civil cabe recurso para o Governo dentro do prazo de dez dias, a contar da publicação d'ella, sendo habeis para recorrer, alem do reclamante, a camara municipal, a junta do parochia ou qualquer eleitor interessado. Á petição de recurso, cuja assignatura será authenticamente reconhecida se for de moro eleitor, será entregue, mediante recibo, ao governador civil, que a remetterá logo, com o processo da reclamação e a sua informação, ao Ministerio dos Negocios do Reino.

§ 4.º As decisões do governador civil o do Governo é applicavel o disposto no § 7.º do artigo 41.°

Art. 43.° As assembléas eleitoraes serão convocadas por decreto do Governo, que designará o dia em que deve proceder-se á eleição, e, no domingo immediatamente anterior ao fixado para esto acto, o presidente da camara municipal por editaes affixados nos logares do estylo e lidos pelos parochos á missa conventual, tornará publicas as assembléas em que o concelho se divide, os seus limites e os logares do reunião, declarando tambem o dia o a hora em que as assembléas devem reunir-se e a ordem das freguesias pela qual deve fazer-se a chamada dos eleitores, nos termos do artigo 63.°

Art. 44.º As assembléas primarias serão presididas por cidadãos residentes no circulo o recenseados como elegiveis para cargos administrativos, que a commissão districtal nomeará na penultima quinta feira anterior ao dia da eleição, sondo a nomeado immediatamente communicada aos nomeados, aos presidentes das camaras municipaes e aos administradores dos concelhos ou bairros respectivos, o designando-se pela mesma forma para cada presidente o sou supplente.

§ unico. Os presidentes nomeados poderão reclamar a sua escusa até á segunda feira immediata, perante A commissão districtal, que, no prazo do vinte e quatro horas, resolverá a reclamação, nuncio motivo de escusa a doença ou outro impedimento comprovado; e quando obtenham escusa simultaneamente, o presidente e o seu supplente, a commissão fará logo novas nomeações, communicando-as immediatamente aos nomeados, ao presidente da camara municipal o ao administrador do concelho ou bairro respectivo.

Art. 45.º Nas eleições municipaes as assembléas primarias serão presididas por cidadãos designados á sorte de entro os vereadores effectivos definitivamente eleitos nas tres ultimas eleições ordinarias ou extraordinarias, sendo da mesma forma designado para cada presidente e seu supplente de entre os vereadores substitutos definitivamente eleitos nas mesmas eleições.

§ 1.º Com a precisa antecedencia se organizarão nos governos civis, em vista dos processos eleitoraes e mais documentos ali archivados, listas alphabeticas, em triplicado, dos vereadores effectivos e substitutos do cada concelho, as quaes serão remettidas ao juiz do direito da comarca ou vara, a que pertencer a sede do concelho, ao respectivo administrador e ao presidente da camara municipal, para lhes darem publicidade no penultimo domingo antes da eleição municipal, e até á quarta feira seguinte poderão reclamar, perante o mesmo juiz, o administrador do concelho ou bairro, qualquer eleitor do concelho ou o proprio interessado, contra a omissão de algum nome nas listas ou contra a inscripção feita, sendo a reclamação formulada e instruída nos termos do § l.º do artigo 27.°

§ 2.º Contra a inscripção só poderá reclamar-se por erro do nome ou categoria, obito, ausencia do concelho ha

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mais do um anno ou superveniente incapacidade prevista no artigo 2.°

§ 3.º A decisão das reclamações será motivada o publicada no dia do sorteio, fazendo-se as necessarias rectificações nas listas dos vereadores, cujos nomes serão numerados por algarismos.

§ 4.° Na penultima quinta feira anterior ao dia da eleição, em audiencia publica, com a assistencia do respectivo administrador de concelho e presidente da camara municipal, para este fim convocados, se procederá perante o juiz de direito ao sorteio dos presidentes das assembléas primarias, lançando-se em duas urnas tantas espheras numeradas quantos os vereadores effectivos o substitutos inscriptos nas listas; e é medida que se for lendo o nome de cada assembléa na relação, que o administrador do concelho ou bairro deverá entregar, o escrivão extrahirá das urnas competentes as espheras, que designarão o presidente da mesma assembléa e o sou supplente, segundo os correspondentes numeros d'aquellas listas, assentando-se nestas, em frente de cada nome sorteado, a assembléa que lho pertencer.

§ 5.º Ao administrador do concelho ou bairro, ao presidente da camara municipal c a qualquer eleitor do concelho é permittido fazer sobro o sorteio breves reclamações verbaes, que sorrio logo resolvidas pelo juiz.

§ 6.° Do sorteio se lavrará auto circumstanciado, em que se mencionarão as reclamações apresentadas o resoluções proferidas, entregando-se copias do auto ao administrador do concelho ou bairro o ao presidente da camara municipal; á porta do tribunal só affixará relação dos presidentes designados e dos seus supplentes, o a todos elles o juiz expedirá immediatamente officio de communicação. O expediente do sorteio compete ao escrivão de semana.

§ 7.° Os presidentes designados poderão reclamar a sua escusa ato á segunda feira immediatamente seguinte ao dia do sorteio perante o juiz do direito, que em vinte e quatro horas proferirá despacho, sendo motivo de reclamação a doença ou outro impedimento comprovado: e a de cisão será logo notificada ao reclamante, ao administrador do concelho ou bairro e ao presidente da camara municipal.

§ 8.° Quando hajam obtido escusa o presidente da assembléa e o seu supplente, o juiz escolherá immediatamente, do entre os cidadãos recenseados como elegiveis para cargos administrativos o residentes no concelho pessoas idoneas para a presidencia, communicando-lhes nomeação, que tambem participará ao administrador do concelho ou bairro e ao presidente da camara municipal. Semelhantemente procederá o juiz a respeito da assembléa para que simultaneamente faltar presidente e supplente por insuficiente numero de vereadores para a designação por sorteio.

§ 9.° Nos municipios de Lisboa e Porto o sorteio será feito perante o juiz do direito da 1.ª vara civel, com assistencia do presidente da camara municipal e dos administradores dos bairros.

§ 10.° Para as eleições parochiaes, os presidentes das assembléas o seus supplentes serão nomeados pela camara municipal, do entre os cidadãos residentes no concelho e recenseados como elegiveis para cargos administrativos, competindo á camara conhecer das escusas que apresentarem.

Art. 46.º O secretario da camara municipal enviará aos presidentes das assembléas eleitoraes, pelo menos dois dias antes do domingo em que devo effectuar-se a eleição, dois cadernos dos eleitores que podem votar n"s assembléas, a que elles tiverem de presidir, e cobrará recibo da remessa.

§ l.° Estes cadernos, que poderão ser impressos ou lithographados, serão a copia fiel do recenseamento original, terão termos de abertura e encerramento assignados pela camara municipal e serão rubricados em todas as suas folhas pelo secretario da mesma camara.

§ 2.° O administrador do concelho ou bairro, e bem assim qualquer eleitor que verbalmente ou por escrito o requeira, poderão assignar e rubricar os mesmos cadernos.

§ 3.º O secretario da camara municipal enviará tambem aos presidentes das assembléas, dentro do prazo fixado neste artigo, quatro cadernos com termo de abertura e rubricas, na forma por que acima se dispôs, para nelles se lavrarem as actas da eleição.

CAPITULO V

Da eleição

Art. 47.° No domingo designado por decreto especial do Governo para se proceder á eleição, pelas nove horas da manhã, reunidos os eleitores no local competente, lhes proporá o presidente dois de entre elles para escrutinadores, dois para secretarios e dois para supplentes, convidando os eleitores que approvarem a proposta a passar para o lado direito d'elle e para o esquerdo os que a rejeitarem.

§ 1.° Para a approvação da proposta são necessarias cinco sextas partes dos eleitores presentes.

§ 2.º Se a proposta do presidente for approvada por menos de cinco sextas partes, mas por mais da sexta parte dos eleitores presentes, ficará a mesa composta do escrutinador, do secretario e do supplente, que o presidente primeiro indicar na ordem da sua proposta, e dos restantes membros indicados por um eleitor do entre os que rejeitarem, se nessa indicação acordar per acclamação a maioria dos eleitores d'esta parte da assembléa. Se esta não concordar, procederá á eleição dos respectivos vogaes por escrutinio secreto em quo ella só votará, considerando-se eleitos os que obtiverem a maioria relativa. Servirão de vogaes da musa d'esta eleição os vogaes que já fazem parto da mesa eleitoral pela proposta do presidente.

§ 3.° Quando a proposta do presidente for rejeitada por cinco sextas partes ou por mais de cinco sextas partes dos eleitores presentes, os vogaes da mesa serão eleitos por acclamação, sob proposta de um dos eleitores, que a tenham rejeitado, ou por escrutinio secreto, conforme os casos indicados no paragrapho antecedente. Quando tenha de proceder-se á eleição por escrutinio secreto, a mesa para esta eleição será composta do presidente, de um escrutinador o de um secretario por elle nomeados, cada um de differente lado da assembléa.

§ 4.º A sexta parto do numero dos eleitores presentes, não incluindo o presidente, quando este numero não for multiplo de 6, é a sexta parte do multiplo de é immediatamente inferior, sommada com a unidade.

§ 5.° Se em alguma assembléa eleitoral, até duas horas depois da fixada para a eleição, não comparecerem eleitores em numero suficiente para comporem a mesa, o presidente lavrará ou mandará lavrar auto em que se declare esta falta, o que gora assignado por elle, pelo parodio e pela auctoridade administrativa, e logo remettido ao presidente da assembléa de apuramento do concelho ou bairro.

Art. 48.° Da formação da mesa se lavrará acta, e o secretario que a lavrar a lerá immediatamente á assembléa.

§ unico. Uma relação contendo os nomes dos cidadãos approvados ou eleitos para comparem a mesa, assignada pelo presidente e por um dos secretarios, será logo affixada na porta principal do edifficio em que a assembléa estiver reunida.

Art. 49.° A mesa eleita antes da hora fixada no artigo 47.° é nulla, e nullos serão todos os actos eleitoraes em que ella interferir.

Art. 50.° Se uma hora depois da fixada para a reunião da assembléa o presidente ainda não tiver apparecido, ou

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se apparecer e se ausentar antes de constituida a mesa, e não estiver presunto o seu supplente, tomará a presidencia o cidadão que paro isso for escolhido pelo maior numero dos eleitoras presentes.

§ 1.° Presume-se legal a eleição feita no local competente o sob a presidencia do cidadão para esse fim designado. Esta presumpção cessa nos casos do tumultos e violencias, quo, impedindo a regular constituição da mesa ou tolhendo o accesso á urna, obrigaram uma parte dos eleitores a escolher outro local e presidencia pura manifestarem livremente o seu voto, devendo observar-se nesta eleição as mesmas disposições que regulam as operações das assembléas primarias.

§ 2.° O presidente da assembléa que se constituir fora do local competente participará a formado da respectiva mesa ao representante da auctoridade administrativa na outra assembléa, no parocho o ao regedor, os quaes se farão immediatamente representar, junto da referida mesa, por eleitores da sua livre escolha, não significando, porem, esta representação o reconhecimento da legitimidade d'aquella assembléa.

Art. 51.° Se á mesma hora se não tiverem recebido na casa da assembléa nem os cadernos do recenseamento dos eleitores, nem os cadernos para só lavrarem as actas, que o secretario da camara municipal devia ter remettido ao presidente da assembléa, a eleição poderá fazer-se por quaesquer copias authenticas do recenseamento, que houverem sido extrahidas dos livros competentes, e quo qualquer cidadão apresentar, e as actas poderão lavrar-se em cadernos com termo do abertura e rubrica da mesa quo a assembléa escolher.

Art. 52.° A mesa da eleição será collocada no corpo do edificio, do maneira quo todos os eleitores possam por todos os lados ter livre accesso a ella o observar todos os actos eleitoraes.

Art. 53.° Constituida a mesa, serão validos todos os actos eleitoraes que legalmente forem praticados, estando prementes, pelo menos, tres vogaes. O presidente será substituido, nos sons impedimentos, polo respectivo supplente e na falta d'este pelo escrutinador eleito ou approvado pela maioria da assembléa, preferindo o mais velho, quando ambos hajam sido eleitos ou approvados pela maioria. Os escrutinadores e secretarios serão substituidos, sempre que for possivel, pelo supplente escolhido pelo mesmo lado da assembléa que os elegeu.

Art. 54.° Os parochos o os regedores das freguesias, que constituirem a assembléa eleitoral, assistirão á eleição para informar sobro a identidade dos votantes. Nas freguesias divididas por duas assembléas, o parodio e o regedor assistirão á eleição da assembléa a que pertencer a sede da freguesia, assistindo á outra os respectivos coadjuctor e substituto, ou na falta d'estes os eleitores quo o parocho e o regedor nomearem.

§ 1.° Faltando o parocho ou o regedor o quem legalmente os substituir, a mesa nomeará pessoas idoneas que façam os vezes d'elles.

§ 2.° As mesas eleitoraes não começarão o acto da eleição sem que o parocho e o regedor da freguesia chamada a votar, ou quem os substituir, estejam presentes.

§ 3.° O parocho, ou quem suas vozes fizer, terá logar na mesa ao lado direito do presidente em quanto se estiver procedendo á chamada da respectiva freguesia.

§ 4.° Se houver uma só assembléa no concelho, assistirá ahi á eleição o administrador respectivo; se houver duas, assistira a uma o administrador e a outra o sou substituto; se houver mais de duas, ou algum d'elles estiver impedido, escolherá o administrador em exercicio pessoa ou pessoas que o representem e em quem delegue as attribuições conferidas por este decreto.

§ 6.° A falta da auctoridade Administrativa não impede os actos eleitoraes.

Art. 55.° As mesas decidem provisoriamente as duvidas que se suscitarem acêrca das operações da assembléa.

§ 1.° Todas as decisões da mesa sobre quaesquer duvidas ou reclamações, verbaes ou escritas, serão motivadas.

§ 2.° As decisões garfo tomadas á pluralidade de votos. No caso de empate, o presidente tem voto de qualidade.

§ 8.° Qualquer eleitor pode apresentar verbalmente ou por escrito, com a sua assignatura ou com outras, se toas forem de eleitoras do circulo, protesto relativo aos actos do processo eleitoral o instrui-lo com os documentos convenientes.

§ 4.° O protesto e documentos, numerados o rubricados pela mesa, que não poderá jamais negar-se a recebê-los, com o parecer motivado d'esta ou com o contra-protesto do qualquer outro cidadão ou cidadãos tambem eleitores, se assim o tiverem por conveniente, serão appenso ás actas, mencionando-se nestas simplesmente a apresentação dos protestos e contra-protestos, o sou numero e o nome do primeiro cidadão quo os assignar, bem como os pareceres da mesa nas meninas condições. Os protestos, contra-protestos e documentos que os acompanhem poderão ser, immediatamente á sua apresentação, assignados e rubricados por qualquer eleitor que o requeira verbalmente ou por escrito.

Art. 56.º Nas assembléas eleitoraes não se pode discutir ou deliberar sobre objecto estranho ás eleições. Tudo que alem d'isso se tratar é nullo e do nenhum effeito.

Art. 57.° Aos presidentes das mesas incumbe manter a liberdade dos eleitores, conservar a ordem, regular a policia da assembléa e providenciar para quo esta seja livremente accessivel.

Art. 58.° Nenhum individuo pode apresentar-se armado nas assembléas eleitoraes e, ao que o fizer, ordenará o presidente que se retire.

Art. 59.° Be o presidente da assembléa eleitoral o julgar conveniente, para a ordem da mesma assembléa, poderá mandar sair do local, onde estiver reunida, todos ou alguns dos individuos presentes, não recenseados, declarando na acta o motivo d'esse procedimento.

Art. 60.° A nenhuma força armada, militar ou civil, é permittido, sob pretexto algum, apresentar-se no local onde só reunirem as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, demarcada por um raio de 100 metros, excepto a requisição feita pelo presidente.

§ 1.° Estando constituida a mesa, o presidente a consultará antes de fazer a requisição.

§ 2.° A força só podará ser requerida quando seja necessario dissipar algum tumulto ou obstar a alguma aggressão dentro do edificio da assembléa ou na proximidade d'elle, no caso de ter havido desobediencia de ordens do presidente, duas vezes repetidas.

§ 3.° Apparecendo força armada no edificio da assembléa ou na sua proximidade, suspendem-se os actos eleitoraes, e só pondera proseguir-se nelles meia hora depois da sua retirada.

§ 4.° Nas terras era que se reunirem as assembléas eleitoraes, a força militar, com excepção dos militares recenseados, conservar-se-ha noa quarteis ou alojamentos, durante os actos das assembléas.

Art. 61.° A nenhum cidadão é permittido votar em mais de uma assembléa.

Art. 62.º A votação é por escrutinio secreto, de modo tal que de nenhum eleitor se conheça ou possa vir a sabor o voto.

§ unico. Não serão recebidas listas em papeis de cores ou transparentes, ou que tenha qualquer marca, signal, designação ou numeração externa.

Ari. 63.° Os vogaes das mesas votam primeiro que todos os eleitores; o, tendo ellos votado, mandará o presidente fazer a chamada dos outros, principiando pelas freguessia

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distantes e sempre em harmonia com a publicação feita nos editaes a que se refere o artigo 43.º

Art. 64.º Ninguem pode ser admittido a votar se o sen nome não estiver inscripto no recenseamento dos eleitores.

Exceptuam-se:

l.º O presidente da mesa, que pode votar na assembléa a que presidir, ainda que não esteja ali recenseado;

2.º O administrador do concelho ou bairro, ou seu representante, que pode votar na assembléa a que assistir, ainda que não esteja recenseado no concelho;

3.º Os cidadãos que se apresentarem munidos de accordãos das Relações ou do Supremo Tribunal de Justiça, mandando-os inscrever como eleitores, e que não foram inscriptos antes do encerramento do recenseamento, devendo juntar-se á acta o documento que apresentarem.

§ 1.º Qualquer eleitor inscripto no recenseamento tem o direito de requerer bilhete de identidade até quinze dias antes do acto eleitoral.

§ 2.º Verificada a identidade do requerente, este bilhete será passado polo secretario da Camara Municipal, no prazo de tres dias, a contar da data da entrega do requerimento, e deverá conter e nome, idade, estado, profissão e morada do requerente, mencionando todos os seus signaes caracteristicos, e sendo pelo mesmo requerente assignado, se elle souber escrever.

§ 3.° Só o secretario da camara municipal se negar a passar o bilhete, será este, nas mesmas condições, passado pelo escrivão da comarca, depositario da copia do recenseamento eleitoral, depois de verificada por elle a identidade. No caso de recusa do escrivão, o eleitor recorrerá ao juiz do direito, que mandará logo passar o bilhete nas devidas condições.

§ 4.° O bilhete de identidade poderá ser adquirido por um na por varios eleitores no mesmo requerimento.

§ 5.º Á mesa eleitoral não poderá, em hypothese alguma, negar-se a acceitar o voto de qualquer cidadão que, para esse effeito, se apresentar com bilhete de identidade.

§ 6.° O eleitor quo se apresentar com bilhete de identidade deverá entregá-lo com a sua lista ao presidente da mesa.

Art. 65.° Nenhum cidadão, qualquer que seja o seu emprego ou condição, pode ser impedido de votar quando se achar inscripto no respectivo recenseamento, excepto se, contra elle, se apresentar sentença judicial, passada em julgado, que o exclua do recenseamento, ou certidão de despacho de pronuncia, com transito em julgado.

Art. 66.° Ao passo que cada um dos eleitores chamados, se approximar á mesa, os dois escrutinadores descarregarão o nome d'elle nos dois cadernos dos eleitores, de que se faz menção no artigo 46.°, escrevendo o próprio appellido ao lado do nome dos votantes. O eleitor só então entregará ao presidente a lista da votação, dobrada e sem assignatura, e o presidente a lançará na urna.

Art. 67.° Concluida a primeira chamada, o presidente ordenará uma chamada geral dos que não tiverem votado.

§ 1.º Duas horas depois d'esta chamada, o presidente perguntará se ha mais alguem que pretenda votar, recebendo as listas dos que, immediata e successivamente, se apresentarem. Recolhida qualquer lista, considerar-se-ha encerrada a votação, quando dentro da assembléa não haja eleitor algum que se apresente a votar.

§ 2.° Durante as duas horas a que se refere o paragrapho antecedente, serão admittidos a votar todos os eleitores que se apresentem para esse fim.

Art. 68.° Nos circulos que elegerem mais de um deputado as listas conterão tantos nomes quantos respectivamente estiverem designados no mappa annexo ao presente decreto; nos que elegerem um só deputado conterão um só nome; e o presidente da mesa assim o communicará á assembléa antes de começar a votação.

Art. 69.° Encerrada a votação, o presidente fará contar devidamente o numero das descargas postas no caderno do recenseamento e immediatamente o publicará por edital affixado na porta principal da casa da assembléa.

§ 1.º Feita a contagem a que se refere este artigo, serão os cadernos immediatamente fechados o lacrados cada um em seu maço, devendo este ser rubricado pelos membros da mesa e por qualquer eleitor que verbalmente ou por escrito o requeira, o qual igualmente o poderá sellar com o seu sêllo.

§ 2.° A mesa é obrigada a certificar immediatamente o resultado da contagem das descargas a todo o eleitor que verbalmente ou por escrito o requeira.

§ 3 ° Depois de feito o que neste artigo e seus §§ l.° e 2.° se prescreve, proceder-se-ha á contagem das listas e o seu resultado será tambem immediatamente publicado por edital affixado na porta principal da casa da assembléa.

§ 4.° Do resultado obtido pela contagem a que se refere o paragrapho antecedente, é a mesa obrigada a passar immediatamente certidão, nos termos do § 1.° d'este artigo.

§ 5.° Na acta se mencionará o resultado da contagem das descargas e das listas.

Art. 70.° Seguir se-ha o apuramento dos votos, tomando o presidente successivamente cada uma das listas, desdobrando-a e entregando-a alternadamente a cada um dos escrutinadores, o qual a lerá em voz alta e a restituirá ao presidente; o nome dos votados será escrito por ambos os secretarios, ao mesmo tempo que os votos que forem tendo, numerados por algarismos e sempre repetidos em voz alta.

§ unico. O resultado do apuramento de cada dia, até se concluir o escrutinio, será publicado por edital, affixado na porta principal do edificio da assembléa.
Do mesmo resultado a mesa é obrigada a passar certidão a qualquer eleitor que a requeira verbalmente ou por escrito.

Art. 71.º São validas as listas dos votantes, ainda que contenham nomes de mais ou de menos do que os exigidos pelo artigo 65.°, mas consideram-se como não escritos os ultimos nomes excedentes, se os houver, na ordem das listas, o não será contado mais de um voto a cada nome repetido na mesma lista.

Art. 72.° As mesas eleitoraes apurarão os votos que recairem em qualquer pessoa, sem que hajam de verificar se essa pessoa é absoluta ou relativamente inelegivel, e sem embargo dos protestos que sobre este assumpto podem ser apresentados, nos termos dos §§ 3.° e 4.° do artigo 55.°, excepto se os votos forem contidos em listas não conformes ao disposto no § unico do artigo 62.° Neste caso serão taes listas declaradas nullas.

§ unico. Os nomes contidos nas listas annulladas por este ou por outro fundamento legitimo não se contam para effeito algum.

Art. 73.º As listas que as mesas declararem viciadas ou nullas serão rubricadas pelo presidente, e juntar-se-hão ao processo eleitoral, sob pena de nullidade das operações de apuramento. A mesma disposição, e sob a mesma pena, se observará quanto ás listas declaradas validas contra a reclamação de algum dos cidadãos que formarem a assembléa.

§ 1.° As listas a que se refere este artigo serão tambem rubricadas por qualquer eleitor que o reclame.

§ 2.º Os votos que se contiverem nas listas annulladas serão era todo o caso apurados, mas em separado e separadamente escritos nas actas.

Art. 74.º Se houver duvida sobre a numeração dos votos, ou se o numero total d'elles não for exactamente igual á somma dos que as listas contiverem, e uma quarta parte dos eleitores presentes reclamar a verificação d'elles, proceder-se-ha a novo exame ou leitura das listas.

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Art. 75.º A constituição das musas, a votação, a contagem das listas e o escrutinio são operações eleitoraes que se praticarão sempre antes do sol posto.

§ 1.° Se a votação se não concluir no primeiro dia, o presidente da mesa eleitoral mandará pelos dois secretarios rubricar nas costas as listas recebidas, o fa las-ha depois fechar com os mais papeis concernentes á eleição num cofre do tres chaves, das quaes ficará uma na sua mão e as outras na do cada um dos escrutinadores. Este cofre deverá ser sellado pelo presidente o por qualquer doa eleitoras presentes que assim o roqueira, sondo depois guardado com toda a segurança no mesmo edificio em quo se procedeu & votação, em logar exposto á vista o guarda dos eleitores, só vinte destes, pelo menos, o exigiram, e aberto no dia seguinte, pelas nove horas da manha, em presença da assembléa, e depois do examinado pelos eleitores que o quizerem fazer, para se proseguir nos actos eleitoraes.

§ 2.º Não havendo reclamação de qualquer eleitor da assembléa, as listas, em vez de rubricadas uma a uma, poderão ser reunidas em um só maço ou em mais, conforme a capacidade do cofre onde teem de ser depois encerradas, nos termos d'este artigo, e fechadas por um involucro do papel lacrado e sellado, no qual os secretarios lançarão as suas rubricas, sendo facultativo a qualquer dos eleitores presentes rubricar tambem o involucro e imprimir-lhe algum sêllo ou sinete.

§ 3.° A rubrica das listas ou dos maços do listas e sou encerramento no cofre poderão effectuar-se depois do sol posto.

Art. 76.° Terminando o apuramento, uma relação do todos os votado! será publicada por edital, affixado na porta principal da casa da assembléa; em presença da mesma serão queimadas as listas que não estiverem no caso declarado no artigo 73.°, e d'estas circumstancias se fará expressa monção na acta.

§ unico. Dos votos que obtiver cada votado a mesa devora passar sempre certidão, a requerimento verbal ou escrito de qualquer eleitor.

Art. 77.° Da eleição se lavrara acta em um dos quatro cadernos referidos no § 3.° do artigo 46.º, a qual será assignada e rubricada pela mesa, e nella se mencionarão, alem das mais circumstancias relativas a eleição:

1.° Todas as duvidas que occorrerem o reclamações quo se fizerem, pela ordem em que foram apresentadas, o decisão motivada que sobre ellas se haja tomado, observando-se acêrca dos protestos escritos o disposto no § 4.° do artigo 55.º;

2.° Quantos dias a eleição durou, e quaes as operações eleitoraes effectuadas em cada um d'elles;

3.° O nome do todos as votados e o numero de votos que cada um teve, escrito por extenso;

4.º Os votos annullados e o motivo por que o foram;

5.° A declaração de que os cidadãos que formam a assembléa outorgam, aos deputados que, em resultado dos votos de todo o circulo eleitoral se mostrarem eleitos, os poderes necessarios para que, reunidos com os dos outros circulos eleitoraes da Monarchia Portuguesa, façam, dentro dos limites da Carta Constitucional e dos actos addicionaes á mesma tudo quanto for conducente ao bom geral da nação.

§ 1.º As actas poderão ser lithographadas ou impressas nos seus dizeres geraes, e a sua redacção poderá realizar-se depois do sol posto.

§ 2.º Terminada a acta a requerimento verbal ou escrito de qualquer eleitor, a mesa será obrigada a passar por certidão o numero de votos obtido por qualquer candidato, segundo o que da mesma acta constar.

§ 3.º A acta será assignada e rubricada por todos os eleitores que verbalmente ou por escrito o requeiram.

Art. 78.º D'esta acta tirar-se-hão tres copias authenticas, escritas nos outros cadernos do quo trata o § 8.° do artigo 46.º, igualmente assignadas e rubricadas pela mesa

§ 1.° Uma d'estas copias será logo remettida ao presidente da assembléa do apuramento do concelho ou bairro, com um dos cadernos dou eleitores, e mais papeis relativos á eleição, acompanhados do uma relação escrita por um dos secretarios da mesa, de onde conste especificadamente quaes elles são. A remessa far-se-ha pelo seguro do correio, havendo-o, ou por proprio, que cobrara recibo de entrega.

§ 2.º A outra copia será tambem logo entregue, com outro dos cadernos dos eleitores, ao administrador do concelho ou bairro a que a assembléa pertencer, ou ao seu delegado que assistir a essa assembléa, para que tudo remetta com a devida segurança ao mesmo administrador, do qual cobrará recibo.

§ 3.º A terceira copia será remettida ao presidente da camara municipal do concelho a que a assembléa pertencer, para ahi ser archivada.

§ 4.º Os papeis remettidos ao presidente da assembléa de apuramento serão entregues no secretario da camara municipal, quo os guardará sob a sua responsabilidade até o dia do apuramento, em que os apresentará ao presidente da mesma assembléa.

Art. 79.° Tanto as actas originaes, como as copias a que se refere o artigo antecedente, serão assignadas por todos os vogaes da mesa, effectivos e supplentes, devendo, comtudo, julgar-se validas quando forem assignadas, pelo monos, por tres de entre elles. Se algum deixar de assignar, o secretario mencionará esta circumstancia.

Art. 80.º A qualquer cidadão e permittido pedir, o os secretarios das camaras municipaes são obrigados a passar, independentemente de despacho, gratuitamente, sem sêllo e doutro de tres dias, certidões authenticas das actas o mais documentos relativos ás eleições quo estiverem guardados nos archivos das respectivas camaras. Todos estes documentos serão, para os effeitos d'este decreto, considerados originaes e authenticos, e dar-se-ha inteiro credito a qualquer certidão legal que d'elles se extraia.

Art. 81.º Os dois escrutinadores serão os portadores da acta original da respectiva assembléa e apresentá-la-hão, no dia designado, na sede do concelho.

§ 1.° Quando os escrutinadores, ou quem os substituir, não acordarem sobre qual d'elles ha de conservar a acta original em seu poder, será isso decidido pela sorte. , § 2.° Se algum dos escrutinadores tiver motivos quo o estorvem de ir á sede do concelho será substituido pelos secretarios ou pelos supplentes.

§ 3.º Tanto as actas originaes, que são entregues nos portadores, como os copias authenticas e mais papeis que, na conformidade do artigo 78.°, são remettidos para a assembléa do apuramento por via do presidente da assembléa e do administrador do concelho ou bairro, serão fechadas e lacradas, e alem d'isso levarão no reverso do sobrescripto os appellidos dos membros da respectiva mesa, postos por letra de cada um.

CAPITULO VI

Do apuramento

Art. 82.° No domingo immediato ao da eleição, pelas nove horas da manhã, reunir-se-hão nos paços municipaes os portadores das actas de todo o concelho, servindo do presidente da assembléa o da camara municipal ou quem legalmente o estiver substituindo; proceder-se-ha logo á formação da mesa, conforme o disposto nos artigos 47.º o seguintes, e observar-se-hão todas as mais disposições applicaveis com respeito á formação das mesas das assembléas primarias e ao modo de manter ahi a liberdade o fazer a policia, competindo para este fim ao presidente e mesa das assembléas do apuramento as mesmas attribui-

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ções que pelos citados artigos competem aos presidentes e metias d'aquellas assembléas.

§ 1.° Para os effeitos d'este artigo o concelho que constituir uma ao assembléa eleitoral ficará agrupado ao do mesmo circulo que tiver a sede mais proxima.

§ 2.° As assembléas de apuramento dos bairros de Lisboa e Porto serão presididas pelos vereadores em exercicio, que a camara municipal designar, até á quinta feira precedente á reunião das mesmas assembléas.

§ 3.° Se o presidente não comparecer á hora fixada neste artigo, prover-se-ha á sua falta pela forma indicada no artigo 50.°

§ 4.° O administrador do concelho ou do respectivo bairro assistirá a todos os actos da assembléa de apuramento.

§ 5.° Verificando-se pela reunião dos portadores de actas que não estão ainda concluídos todos os trabalhos de alguma assembléa primaria, ficará adiada para o domingo immediato a constituição da assembléa de apuramento, lavrando-se auto da occorrencia, que será assignado pelo presidente, portadores presentes e auctoridade administrativa.

§ 6.° Os portadores da acta da assembléa constituída fora do local competente, na conformidade do artigo 50.°, assistem á assembléa de apuramento, com mero voto consultivo acêrca das operações d'aquella assembléa.

Art. 83.º Constituida a mesa, o presidente da assembléa lhe apresentará, fechadas e lacradas, as copias das actas que, na conformidade do artigo 78.° § 1.° lhe devem ter remettido as assembléas eleitoraes do concelho ou bairro; os portadores das actas apresentarão tambem os originaes que lhes tiverem sido entregues, e o administrador do concelho ou bairro apresentará tambem as outras copias legaes que, na forma do § 2.º do mesmo artigo, lho devem ter remettido os seus delegados.

Art. 84.° Feita esta apresentação, nomear-se-hão, pela forma indicada no artigo 47.°, para a formação das mesas das assembléas primarias, as commissões que se julgarem necessarias para a mais prompta expedição dos trabalhos, e por estas commissões se distribuirão proporcionalmente as actas das diversas assembléas do concelho ou bairro, de maneira, porem, que o exame das actas de uma assembléa não seja nunca encarregado a uma commissão de que sejam membros cidadãos recenseados na mesma assembléa.

Art. 85.° Estas commissões procederão immediatamente ao exame das actas que lhes forem distribuidas, e ao apuramento dos respectivos votos. Do resultado darão conta á assembléa.

Art. 86.° Os pareceres das diversas commissões serão lidos e approvados ou reformados pela assembléa geral dos portadores das actos.

Art. 87.° Approvados ou reformados os pareceres, a mesa procederá immediatamente ao apuramento geral, na conformidade d'elles, a fim de averiguar o numero total de votos que cada um dos cidadãos votados teve em todo o concelho ou bairro, e sobre isto lavrará um parecer, que será tambem lido e approvado ou reformado pela assembléa.

Art. 88.° As funcções dos assembléas de apuramento reduzem-se exclusivamente a examinar, pela comparação das actas originaes trazidas pelos portadores com as copias authenticas subministradas pelo presidente da assembléa e respectivo administrador do concelho ou bairro, e tambem com os cadernos do recenseamento, se aquellas actas originaes suo realmente as mesmas que foram confiadas aos portadores pelas mesas, e se os votos que d'ellas consta haver tido cada cidadão na respectiva assembléa são realmente os que elles ahi tiveram, e bem assim a apurar esses votos. De maneira nenhuma, porem, deixarão de os contar a qualquer cidadão ou poderão annullar as actas das quaes elles constam, com o fundamento de que houve alguma nullidade no recenseamento, na formação das mesas, no processo eleitoral, com o fundamento de quo alguns dos cidadãos votados é absoluta ou relativamente inelegivel ou com qualquer outro que não seja a falta de authenticidade ou genuidade expressamente especificadas neste artigo.

§ 1.° Quando, por qualquer caso imprevisto, deixar de ser apresentada á assembléa de apuramento alguma acta original ou alguma das copias a que se referem os artigos antecedentes, far-se-ha o apuramento pelas que apparecerem.

§ 2.° Tendo havido nalguma assembléa primaria eleição feita na conformidade do § 1.° do artigo 50.°, deverão apurar-se em separado os votos que constarem da respectiva acta, e pelo confronto dos cadernos de eleitores que votaram nessa eleição com os dos eleitores que votaram na assembléa reunida no local competente, deverá apurar-se o numero de votantes repetidos, se os houver, competindo somente ao tribunal de verificação de poderes conhecer da legalidade d'aquella eleição, e fazer o apuramento definitivo da respectiva votação, se for validada.

Art. 89.º Concluido o apuramento, escrever-se-ha em dois cadernos, assignados e rubricados pela mesa, o numero de votos que teve cada cidadão e do apuramento se lavrará acta com menção do numero de votos apurados para cada candidato, o qual será logo publicado por edital affixado na porta principal da assembléa, passando-se certidão ao eleitor do circulo ou candidato que a requeira verbalmente ou por escrito. Na acta se declarará que pelas actas das assembléas primarias consta que os eleitores d'ellas outorgaram aos cidadãos, que se mostrassem haver sido eleitos deputados, os poderes de que falla o artigo 77.°

Art. 90.° Qualquer eleitor do circulo poderá apresentar protestos, nos mesmos termos determinados para as assembléas primarias, perante a assembléa de apuramento, que será tambem obrigada a receber os protestos ou contra-protestos que as mesas das assembléas primarias não tenham querido acceitar.

§ unico. Se os protestos apresentados nas assembléas de apuramento tiverem por objecto as operações das assembléas primarias, o presidente da assembléa ouvirá immediatamente os cidadãos que compuseram aã mesas das mesmas assembléas e que estiverem presentes, para que informem o que se lhes offerecer acerca dos protestos, e a resposta que derem será junta ao processo eleitoral.

Art. 91.° Da acta do apuramento se tirarão tres copias, sendo uma entregue ao presidente da assembléa, outra remettida ao presidente da assembléa do apuramento geral do circulo e a outra enviada ao administrador do concelho ou bairro da sede do circulo, e todas serão fechadas e lacradas, levando no reverso do sobrescripto os appellidos dos membros da mesa postos por letra de cada um.

§ 1.° O presidente da assembléa de apuramento parcial apresentará na do apuramento geral do circulo a copia que lhe foi entregue, devendo ser substituido, no caso de impedimento, por um vogal da mesa, á escolha d'elle.

§ 2.° A acta de apuramento, conjuntamente com as actas originaes, cadernos e mais papeis que tiverem vindo das assembléas primarias, serão immediatamente remettidos ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça, dando-se logo da remessa conhecimento ao Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino.

§ 3.° As copias authenticas das actas, que houverem sido apresentadas pelo presidente, ficarão guardadas no archivo da camara municipal, e aquellas que tiverem sido apresentadas pelo administrador do concelho ou bairro serão remettidas ao respectivo governador civil, para serem por elle archivadas; excepto no caso em que umas ou outras tenham servido de fundamento para sobre ellas assen-

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tar alguma decisão da assembléa de apuramento, porque, neste caso, terão o mesmo destino do processo eleitoral, ao qual serão juntas.

Art. 92.° Na quinta feira immediata ao apuramento dos concelhos ou bairros, os presidentes das respectivas assembléas se reunirão, pelas nove horas da manhã, noa paços municipaes da sede do circulo, sob a presidencia do cidadão a que se refere o artigo 82.º e nos circulos de Lisboa e Porto sob a presidencia do vereador designado para este fim, na conformidade do § 2.° do mesmo artigo, procedendo-se logo á formação da mesa, segundo o disposto nos artigos 47.° e seguintes, e competindo á mesa e seu presidente as faculdades declaradas no citado artigo 82.°

§ 1.° Constituida a mesa, o presidente e membros da assembléa e o administrador do concelho ou bairro lhe apresentarão, fechadas o lacradas, as copias das actas do apuramento parcial que tiverem em seu poder; e verificada, pelo confronto, a authenticidade d'estes documentos, a mesa procederá por elles ao apuramento geral da votação no circulo, lavrando parecer, que será lido perante a assembléa e por ella approvado ou reformado, publicando-se por edital affixado na porta principal da assembléa o numero total dou votos de cada candidato e passando-se certidão do mesmo numero aos eleitores do circulo ou aos candidatos que a requeiram verbalmente ou por escrito.

§ 2.° A este apuramento são applicaveis as disposições dos §§ 1.° o 2.° do artigo 88.º

§ 3.° Somente aos candidatos é permittido apresentar perante esta assembléa reclamações ou protestos, verbaes ou escritos, acêrca das operações que lhe competem, observando-se na porte applicavel o que fica disposto para as reclamações ou protestos perante as assembléas primarias.

§ 4.º Nos circulos de Lisboa a auctoridade administra-trativa será representada na assembléa do apuramento geral pelos administradores do l.° e 8.° bairros respectivamente.

Art. 93.º Em cada um dos circulos constantes do mappa annexo, que faz parte integrante d'este decreto, ficarão eleitos deputados os cidadãos mais votados em numero igual ao dos deputados que por elle houver a eleger.

§ 1.° Quando dois ou mais cidadãos tiverem o mesmo numero de votos, preferirá:

1.° O que tiver mais tempo de deputado;

2.° O mais velho;

3.° O que a sorte designar.

§ 2.° Os nomes dos deputados eleitos publicar-se-hão por editaes affixados na porta principal da assembléa, e o presidente proclamá-los-ha tambem em voz alta deante du toda ella.

Art. 94.° Do apuramento se lavrará acta, na qual se declarará o nome dos deputados eleitos, o numero de votos que tiverem, e como pelas actas das assembléas primarias de todo o circulo eleitoral consto que os eleitores d'elle outorgaram aos cidadãos que se mostrassem haver sido eleitos deputados os poderes de que fala o n.º 5.º do artigo 77.º

§ 1.° A acta original será immediatamente remettida ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça, com todos os papeis relativos ás operações do apuramento geral, dando-se logo conhecimento da remessa ao Ministro o Secretario de Estado dos Negocios do Reino.

§ 2.º As copias de actas apresentadas pelo presidente da assembléa do apuramento geral ficarão archivadas no archivo da camara municipal da sede do circulo; o as copias do actas apresentadas pelo administrador do concelho ou bairro serão remettidas ao governador civil do districto, para serem por elle archivadas; excepto quando a respeito do umas ou de outras se tenham levantado duvidas sujeitas á apreciação da assembléa de apuramento geral, porque neste caso acompanharão a acta do apuramento do circulo.

§ 8.° Da acta do apuramento geral se entregarão copias assignadas por toda a mesa, a cada um dos deputados que presentes estiverem; aos ausentes enviar-se-hão com participação official do respectivo presidente.

CAPITULO VII

Do Tribunal de Verificação de Poderes

Art. 95.° O Tribunal de Verificação de Poderes tem por fim conhecer do rodos os processos das eleições de deputados, julgando as reclamações ou protestos apresentados, e, independentemente de reclamações ou protestos, declarando validas ou nullas as mesmas eleições.

§ unico. Contra os actos eleitoraes das assembléas primarias ou de apuramento, e contra a elegibilidade dos deputados eleitos, qualquer eleitor do respectivo circulo pode apresentar reclamação ou protesto escrito o documentado, perante o presidente do tribunal, até á distribuição do processo eleitoral.

Art. 90.° O Tribunal de Verificação do Poderes será composto:

1.° Feio presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que será presidente do Tribunal de Verificação de Poderes, e por tres juizes do mesmo Supremo Tribunal designados pela sorte;

2.° Por tres juizos da Relação de Lisboa e dois juizes da Relação do Porto, tambem designados pela sorte.

§ 1.° Quando algum dos magistrados, de que tratam os n.os 1.° e 2.° d'este artigo, faltar ou estiver impedido, será chamado, para substituir o presidente, o juiz mais antigo do Supremo Tribunal, e, para substituir os restantes juizes, os que lhes forem immediatos em antiguidade.

§ 2.° O sorteio, a que se referem os n.os 1.° e 2.º d'este artigo, será feito em sessão publica perante o Supremo Tribunal de Justiça.

§ 3.° O tribunal constituir-se-ha por iniciativa do seu presidente, no dia immediato ao do apuramento da eleição geral do deputados no continente do reino.

Art. 97.° Os processos eleitoraes, contra os quaes não houver protestos ou reclamações, serão julgados no prazo maximo de quinze dias, contados desde a sua recepção no tribunal, e os restantes deverão ser julgados no prazo maximo de trinta dias, contados de igual data.

Art. 98.° As sessões do Tribunal de Verificação de Poderes serão publicas e anteriormente fixadas em hora e dia por aviso do presidente, publicado na Folha Official.
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§ 1.° As discussões são oraes.

§ 2.º O dia do julgamento será notificado com tres dias de antecedência, por aviso publicado na Folha Official, aos candidatos, que poderão comparecer pessoalmente, fazer-se representar por advogados, ou produzir novos documentos até vinte e quatro noras antes do dia fixado para o julgamento. Se algum processo não puder ser julgado na sessão prefixada, ser-lhe-ha no fim d'esta determinado novo dia do julgamento, sem necessidade de outra notificação.

§ 3.° Será sempre facultada aos candidatos, ou aos seus advogados, a inspecção directa, na secretaria do tribunal, dos processos eleitoraes o do quaesquer documentos que lhes digam respeito, não estando com vista aos juizes.

§ 4.° O tribunal poderá requisitar de todas as estações officiaes os documentos que entender convenientes e que urgentemente lhe serão remettidos, e no continente poderá mandar proceder a inqueritos, dentro do prazo fixado para o julgamento, delegando para esse fim as suas attribuições em magistrados judiciaes, que terão direito do fazer citar testemunhas, nomear peritos e deferir-lhes juramento, corresponder-se com todas as auctoridades o requisitar-lhes as diligencias necessarias para o desempenho da sua commissão, e que enviarão sempre ao tribunal um relatorio em quo exponham imparcialmente o sou pensar sobre os factos sujeitos ao inquerito. O magistrado ou magistrados

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delegados o os empregados que os coadjuvarem vencerão, a titulo do ajuda do custo, a retribuição que lhes for arbitrada pelo tribunal e que não excederá para todos a somma do 6$000 réis por dia.

§ 5.° O inquerito, quando soja requerido por qualquer dos candidatos nas eleições contestadas, só poderá ser recusado por accordão fundamentado.

Art. 99.° O Tribunal do Verificação do Poderes é competente para reconhecer da legalidade do todas as operações eleitoraes dos processos que lhe são sujeitos e da elegibilidade absoluta ou relativa dos deputados a que os mesmos processos respeitam.

§ 1.º Os candidatos teem a seu favor a presumpção legal do elegibilidade, a qual somente cessa pela prova em contrario.

8 2.° São causas de nullidade da eleição as infracções de lei e as faltas de formalidade, bem como os actos de violência ou corrupção, devidamente comprovados, que possam influir no resultado geral da votação em todo o circulo.

§ 3.° Os actos eleitoraes repetir-se-hão em todo o circulo quando as irregularidades que possam influir no resultado da eleição invalidarem as operações de assembléas primarias cujos votantes excedam um terço do numero de votantes em todo o circulo; aliás somente se repetirá o acto eleitoral na assembléa ou assembléas primarias em que hajam occorrido taes irregularidades.

4.° As decisões do tribunal designarão individualmente todos os cidadãos votados no circulo e o numero de votos obtidos, qualquer quo elle seja, o concluirão sempre por declarar valida ou nulla a eleição dos deputados eleitos, ou por declarar a necessidade de repetição dos actos eleitor aos, consoante os casos previstos no paragrapho antecedente.

§ 5.° As decisões do tribunal serão sempre motivadas e d'ellas não haverá recurso.

§ 6.° Os processos definitivamente julgados, depois de registados as decisões proferidas, terão remettidos á Camara dos Deputados, dentro de quarenta e oito horas desde o julgamento, se a Camara estiver funccionando, ou logo que se reuna; o as decisões, que determinarem por qualquer motivo a repetição do actos eleitoraes, serão immediatamente communicadas ao Governo, que, no prazo designado no artigo 106.°, contado da data da decisão, convocará as respectivas assembléas.

§ 7.º As decisões proferidas nas eleições contestadas serão sempre publicadas na Folha Official.

§ 8.° O tribunal conhecerá das questões relativas á sua constituição e organizará o seu regulamento.

CAPITULO VIII

Da junta preparatoria, da constituição da Camara dos Deputados e modo de preencher as vacaturas

Art. 100.° Todos os deputados eleitos deverão concorrer no dia e logar aprazado para a reunião das Côrtes Geraes.

Art. 101.° Logo que se tenha reunido metade e mais um dos deputados eleitos pelos circulos do continente do reino, não se contando para cada deputado a eleição por mais de um circulo, constituir-se-hão em junta preparatoria, á qual serão presentes todos os processos, com os respectivos julgamentos, enviados do Tribunal de Verificação de Poderes.

§ unico. Os deputados serão proclamados em conformidade com os julgamentos do tribunal.

Art. 102.° A eleição por circulo plurinominal prefere sempre á eleição por circulo uninominal.

§ unico. O deputado eleito por mais de um circulo eleitoral da mesma natureza representará o da naturalidade; não sendo eleito por este, o da residencia; na falta d'este, o circulo em que tiver obtido maior numero de votos, e em igualdade de votos, o que a sorte designar.

Art. 103.° O deputado eleito pode livremente renunciar o seu logar de deputado, antes de tomar assento na Camara, fazendo-o assim constar por escrito á mesma Camará.

Art. 104.° O deputado, depois de tomar assento na Camara, não pode renunciar o seu logar sem approvação d'ella.

Art. 105.º O deputado, depois de tomar assento na Camara, não pode escusar se a desempenhar as funcções do mesmo logar senão por causa legitima ou justificada perante a Camara.

§ 1.° Se contra o disposto neste artigo, deixar de comparecer ás sessões por quinze dias consecutivos, será primeira e segunda vez convidado por officio do presidente, precedendo para esse fim deliberação da Camara.

§ 2.° Se ainda, apesar d'isso, não se apresentar ou não justificar motivo que o impossibilite de comparecer, resolver-se ha que perdeu o logar de deputado, o qual será declarado vago.

§ 8.° Esta vacatura não poderá ser declarada pela Camará sem que, primeiramente, pelo exame de uma commissão, á qual o assumpto seja commettido, se verifique terem-se pontualmente observado todas as solemnidades d'este artigo e seus paragraphos.

Art. 106.º Declarada a vacatura de qualquer logar de deputado, será este facto immediatamente communicado ao Governo, para que mande proceder á eleição supplementar no prazo de quarenta dias, desde a data da resolução da Camara, se o circulo pertencer ao continente do reino, ou no mais breve prazo que for compativel com as distancias e meios de communicação, se o circulo pertencer ás ilhas adjacentes ou ao ultramar.

§ 1.° Nos actos eleitoraes, que houverem de repetir-se, observar-se-hão as formalidades estabelecidas neste decreto, para a eleição geral de deputados.

§ 2.° Repetindo-se o acto eleitoral numa só assembléa, o presidente remetterá ao presidente do Supremo Tribunal do Justiça a acta da eleição, acompanhada dos cadernos dos eleitores o mais papeis relativos ao acto eleitoral, dando immediata conta da remessa ao Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino. Da acta da eleição se tirarão duas copias, sendo uma remettida ao presidente da camara municipal e outra ao administrador do concelho ou bairro, para terem o destino fixado no § 3.° do artigo 78.° e no § 3.° do artigo 91.°

OAPITULO IX

Disposições especiaes

Art. 107.° Continua em vigor, para as provincias ultramarinas, o disposto no artigo 118.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, e em decretos especiaes serão designadas as contribuições directas das mesmas provincias, que deverão levar-se em conta para o calculo da quantia exigida pelo artigo 1.°, alem das contribuições mencionadas no artigo 21.°

§ unico. Aos conselhos de provincia competirá a livre escolha dos presidentes das assembléas primarias.

Art. 108.° Os governadoras das provincias ultramarinas são auctorizados a fixar, com os indispensaveis intervallos o attendendo ás distancias e meios de communicação, os prazos para as operações de revisão do recenseamento eleitoral e para os diversos actos das eleições.

Art. 109.° No caso de annullação da eleição de algum circulo do ultramar, será chamado a representá-lo o mesmo cidadão que o representava na legislação anterior, até que se apresente á Camara, devidamente julgado, o processo eleitoral do respectivo circulo.

Art. 110.º As funcções dos deputados pelas provincias

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ultramarinas cessam logo quo finde a legislatura para que foram eleitos ou em quo tomaram assento.

§ 1.° No caso, porem, da dissolução da Camara, os deputados das provincias ultramarinas continuarão a representa-las unicamente até que seja apresentado á Camara, devidamente julgado, o processo eleitoral dos respectivos circulos.

§ 2.º Quando soja reduzido o numero de circulos das mesmas provincias, serão chamados a representa-las, nos termos do paragrapho antecedente, os deputados da anterior legislatura nela ordem designada nos n.os 1.°, 2.º o 3.° do § l.° do artigo 98.°

Art. 111.° Os governadores civis dos districtos insulanos designarão para as reclamações o recursos eleitoraes, quando os haja, para os subsequentes autos do recenseamento e para a reunido das assembléas do apuramento, os prazos o dias que forem compativeis com os meios de communicação.

CAPITULO X

Disposições penaes e geraes

Art. 112.° Os parochos, officiaes do registo civil e escrivães de fazenda que deixarem do remetter, nos prazos devidos, aos secretarios das camaras municipaes ou aos secretarios das administrações dos bairros de Lisboa e Porto as relações e informações a que são obrigados por este decreto para a revisão do recenseamento eleitoral, incorrerão na multa do 40$000 a 100$000 réis.

Art. 113.° Todas as pessoas, auctoridades ou funccionarios que deixarem do prestar qualquer esclarecimento ou informação exigido por este decreto para a revisão do recenseamento eleitoral, incorrerão na multa do 40$000 réis a l00$000 réis por cada vez que o fizerem.

Art. 114.° Os parochos, funccionarios e mais pessoas a que se referem os dois artigos antecedentes, no caso do prestarem falsas declarações, incorrerão na pena de suspensão temporária dos direitos politicos e na de prisão até seis meses.

§ unico. Incorrerá na pena de suspensão o escrivão de fazenda que omittir p nome de qualquer contribuinte nas relações quo é obrigado a fornecer para a revisão do recenseamento eleitoral e, no caso de reincidencia, será demittido.

Art. 115.° Os portadores das actas que deixarem de comparecer nas assembléas do apuramento parcial ou geral no local, dia e hora marcados por este decreto, ou que, comparecendo, abi deixarem de cumprir as obrigações que esta lei lhes impõe, incorrerão em uma multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 116.° As auctoridades administrativas ou ecclesiasticas que deixarem de comparecerias assembléas eleitoraes primarias ou do apuramento, para ou fins indicados por este decreto, e os cidadãos eleitos para vogaes effectivos ou supplentes da mesa que se recusaram a servir ou cumprir alguma obrigação, que lhes for incumbida, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 117.° Os presidentes de quaesquer assembléas eleitoraes primarias ou do apuramento que não comparecerem para presidir ás respectivos assembléas no dia, hora e local competente, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis.

§ 1.° E se, deixando de comparecer por impossibilidade absoluta, não mandarem entregar no mesmo local, do presidente que legalmente os substituir, todos os papeis concernentes á eleição que lhes houverem sido entregues, em virtude da lei, uma hora depois d'aquella a que se refere o principio d'este artigo, incorrerão na multa de 100$000 a 200$000 réis.

§ 2.º Serão punidos com a mesma pena aquelles que começarem ou interromperem os actos eleitoraes antes das horas marcadas neste decreto.

Art. 118.° As auctoridades do qualquer ordem ou jerarchia que se negarem a passar, dentro do prazo competente, as copias, certidões ou attestados que lhos forem pedidos, para demonstração do algum direito garantido por este decreto, ou por qualquer pretexto doutorarem a passagem desses documentos ou a entrega do quasquer outros que lhos hajam tudo confiados, incorrerão na multa de 50$000 a 200$000 réis e soffrerão a pena de suspensão do emprego pelo espaço de sois meses a um anno.

§ unico. Se d'este procedimento da auctoridade resultar para algum cidadão a perda do exercicio do direito eleitoral ou do elegibilidade, a multa seria duplicada e a pena será do prisão do seis meses a um anno.

Art. 119.° O secretario da camara municipal ou da administração do bairro que deixar de cumprir as obrigações prescriptas neste decreto incorrerá na multa de 100$000 a 200$000 réis, e suspensão de um a seis meses; e, no caso do reincidencia, na pena de demissão, som prejuizo das penas que lhe sejam applicaveis pelo crime de falsificação de documentos, ou por qualquer outro previsto neste decreto.

Art. 120.º Os juizes de qualquer ordem ou jerarchia, que deixarem de cumprir, dentro dos prazos fixados por este decreto, as obrigações que elle lhes impõe, incorrerão na multa do 60$000 a 100$000 réis o soffrerão a pena de dois a seis meses do suspensão.

Art. 121.º Todas a quaesquer pessoas particulares ou auctoridades, ás quaes, individual ou collectivamente, peja imposta por esto decreto alguma obrigação, só deixarem de a cumprir, incorrerão na multa do 40$000 a 100$000 réis quando outra pena lhes não seja comminada por alguma disposição especial d'elle.

Art. 122.º Todos aquelles que se fizerem inscrever a si ou n outros, ou concorrerem para que elles proprios ou esses outros sejam inscriptos no recenseamento com falso nome ou falsa qualidade, ou encobrindo ou concorrendo para que se encubra uma incapacidade prevista na lei, ou tiverem feito ou concorrido para que se faca a inscripção de um mesmo eleitor em duas ou mais relações de recenseamento, incorrerão na pena de suspensão dos direitos politicos por tempo não inferior a seis minou o na multa do 50$000 a 200$000 réis.

§ unico. O funccionario encarregado por este decreto do rever o recenseamento dos eleitores e elegiveis, quo inscrever ou deixar do inscrever indevidamente o com dolo no recenseamento qualquer cidadão, será punido com a pena duplicada.

Art. 123.° Todo aquelle que, tendo perdido o direito de votar por algum dos motivos indicados neste decreto, votar não obstante isso, será punido com a puna do prisão de quinze dias a tres mosca e multa de l0$000 a 50$000 réis.

Art. 124.° Todo aquelle que votar em qualquer assembléa eleitoral, quer seja em virtude de uma inscripção obtida illegitimamente pelo modo previsto 110 artigo 122.º, quer seja tomando fatuamente, os nomes e as qualidades de um outro eleitor inscripto, será punido com a pena do prisão de um mês a um anno e multa do 20$000 a 100$000 réis.

§ unico. Será punido com a mesma pena todo o cidadão que se aproveitar de uma inscripção multipla para votar mais de uma vez.

Art. 125.° Todos aquelles que falsificarem ou concorrerem para que seja falsificado o escrutinio: aceitando listas declaradas illegaes por este decreto ou contando es votos que ellas contiverem; pondo ou consentindo que se ponha nota do descarga em eleitores que não votaram; introduzindo illegalmente listas na urna, tirando ou substituindo as que nella tiverem sido legalmente lançadas; trocando na leitura das listas o nome dos votados, ou diminuindo votos a uns e accrescentando-os a outros no acto de os assentarem; ou falsificando por qualquer modo a

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verdade da eleição, serão punidos, em qualquer d'estes casos, com a pena do prisão não inferior a dois annos e multa do 200$000 a 1:000$000 réis.

Art. 126.º Incorrerão na pena comminada pelo artigo anterior todos aquelles que, por qualquer maneira, falsificarem o recenseamento nos cadernos que forem enviados aos presidentes das assembléas eleitoraes primarias, ou quaesquer outros documentos que nos mesmos forem officialmente remettidos; todos aquelles que falsificarem os cadernos, actas e mais papeis respectivos á eleição, que pelas diversas vias estabelecidas por este decreto devem ser remettidos ás assembléas de apuramento, e, em geral, todos aquelles que falsificarem, concorrerem para que se falsifique ou consentirem que se falsifique o livro do recenseamento eleitoral ou qualquer documento respectivo ao recenseamento ou ás eleições, e ainda aquelles que deixarem extraviar o dito livro ou estes documentos, havendo-lhes sido confiados.

Art. 127.° Todos os portadores das actas das assembléas primarias que na assembléa de apuramento, contra a disposição do artigo 88.°, as annullarem, por quaesquer motivos que não sejam os de falta de genuidade e authenticidade expressamente marcados neste decreto; que deixarem, com qualquer fundamento, de contar os votos aos cidadãos votados ou do se conformar com as disposições do mesmo artigo em que lhes são taxativa, restricta o expressamente marcadas as suas funcções, ou que, por qualquer modo, adulterarem a verdade da eleição, incorrerão na pena de prisão não inferior a dois annos, na multa de 200$000 a l:000$000 réis e na inhabilidade para todas os funcções publicas por espaço de seis annos. Na mesma pena incorrem os membros da assembléa de apuramento geral do circulo, que por qualquer motivo excederem os restrictos poderes que lhes confere o § l.º do artigo 92.° ou deixarem de contar votos aos cidadãos votados.

Art. 128.° A cada um dos membros da assembléa primaria ou de apuramento que se oppuser ao exacto cumprimento das disposições dos §§ 3.° o 4.° do artigo 55.°, dos preceitos do § 5.° do artigo 64.°, do artigo 69.°, dos §§ 1.° e 2.° do artigo 75.°, do § unico dos artigos 70.° e 76.°, do § 2.° do artigo 77.° e do disposto nos artigos 89.°, 90.°, e §§ 1.° o 3.° do artigo 92.°, será applicada a pena de prisão de quinze dias a seis meses e multa de 50$000 a 200$000 réis. O maximo da pena será sempre applicado nos mesmos casos ao presidente da assembléa.

Art. 129.° Aquelles que por via de noticias falsas, boatos calumniosos, promessas ou quaesquer outros artificios fraudulentos, surprehenderem ou desviarem votos, determinarem ou tentarem determinar um ou muitos eleitores a abster-se de votar, um ou muitos portadores de actas a deixar de cumprir as obrigações que lhe são impostas por este decreto, serão punidos com a multa de 20$000 a 200$000 réis.

§ unico. Se o delinquente for empregado publico, a pena será, alem da multa, a suspensão de direitos politicos de um mês a um anno.

Art. 130.° Aquelles que, por via de factos, violencias ou ameaças contra um eleitor, fazendo-lhe recear algum damno para a sua pessoa, familia ou fortuna, o determinarem ou tentarem determinar a votar ou a abster-se de votar, influirem ou tentarem influir sobre o seu voto, serão punidos com a pena de prisão de dois meses a dois annos e multa de 20$000 a 20$0000 réis.

§ 1.° Se as vias de facto e violencias foram taes que mereçam pena maior que o maximo aqui estabelecido, ser-lhes ha applicada essa pena.

§ 2.° Se o delinquente for funccionario publico, a pena será de prisão de dois meses a dois annos e suspensão dos direitos politicos até tres annos.

Art. 131.° Todo aquelle que entrar armado em uma assembléa eleitoral primaria ou de apuramento será punido com a pena do prisão de um a tres meses e multa de 10$000 a l00$000 réis.

Art. 132.° A auctoridade militar, por cuja ordem alguma força armada se apresentar no local onde estiverem reunidas as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, sem requisição do respectivo presidente, contra o disposto no artigo 60.° d'este decreto, será punida com a pena de presidio militar até um anno.

§ 1.° Nenhuma ordem vocal auctorizará a infracção do referido artigo.

§ 2 ° Nenhuma ordem por escrito relevará o infractor, excepto a original requisição do presidente da mesa.

Art. 133.° Todos aquelles que, por via de tumultos, vozerias ou quaesquer outras demonstrações ameaçadoras, pretenderem ou tentarem perturbar as operações das assembléas primarias ou de apuramento, ou attentarem contra o exercicio do direito eleitoral ou contra a liberdade de votar, e bem assim todos aquelles que em tumulto entrarem ou tentarem entrar com violencia na assembléa eleitoral, com o fim de impedir a eleição de qualquer cidadão, ou de impor a de um outro, serão punidos com a pena de prisão de seis meses a dois annos e multa do 100$000 500$000 réis.

§ unico. Se os delinquentes forem armados ou se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis

Art. 134.º Todos aquelles que, durante a reunião das assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, insultarem ou violentarem a mesa, ou lhe faltarem á devida obediencia, insultarem ou violentarem algum dos membros da assembléa, serão punidos com a pena de prisão de tres meses a dois annos e a multa de 50$000 a 500$000 réis.

§ 1.° Se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será do 200$000 a 1:000$000 réis.

§ 2.º Se as violencias forem taes que mereçam, pela legislação commum, pena maior, ser-lhes-ha essa applicada.

Art. 135.° Aquelle que roubar a urna com as listas recebidas, mas ainda não apuradas, ou roubar algumas listas, será punido com a pena de prisão de seis meses a dois annos annos e multa de 100$000 a 500$000 réis.

§ unico. Se o roubo for effectuado em tumulto e com violencia, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será do 200$000 a 1:000$000 réis, e se maior pena, pela legislação commum, couber ás violencias perpetradas, essa deverá applicar-se.

Art. 136.° Todas as auctoridades administrativas e policiaes que, por negligencia, deixarem de empregar todos os meios a sua disposição, para obstarem a que se pratiquem as contravenções e delictos prevenidos por este decreto, dentro da area da sua jurisdicção, serão punidas com a pena de demissão ou suspensão do emprego, conforme o grau da culpa.

§ unico. Se o fizerem por malicia, reputar-se-hão cumplices nessas contravenções ou delictos e, como taes, serão punidas com as penas que estiverem comminadas aos próprios delinquentes.

Art. 137.° Todos os magistrados, auctoridades e empregados que nas circumscripções territoriaes, pelas quaes forem respectivamente inelegiveis, espalharem cartas, proclamações ou manifestos eleitoraes, ou angariarem votos, serão punidos com a pena de prisão de um mês a um anno e suspensão de direitos políticos até seis annos.

Art. 138.° Será punida com a pena de prisão de seis meses a dois annos e inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro a seis annos, toda a auctoridade, seja qual for a sua classe ou categoria, que no dia das eleições fizer, sob qualquer pretexto, e ainda mesmo por motivo de serviço publico, sair do seu domicilio ou permanecer fora d'elle qualquer eleitor, para que não possa votar.

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Art. 139.° Será igualmente punida com a mesma pena toda a auctoridade que conduzir, por si ou por intermedio doe seus subordinados, os eleitores ao local da eleição para darem o açu voto ou os impedir ali do communicarem e tratarem com os outros para acordarem no melhor modo do exercerem o seu direito.

Art. 140.° E prohibido aos administradores do concelho, sob pena de inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro annos o multa da 50$000 a 200$000 réis, nomear cabos de policia quinze dias antes das eleições. Durante o mesmo tempo o sob igual pena é prohibido aos regedores de parochia deferir juramento aos cabos do policia nomeados.

Art. 141.º As auctoridades administrativas ou policiaes que deixarem do participar aos agentes do Ministerio Publico as contravenções e delidos previstos neste decreto e os agentes do Ministerio Publico que deixarem de immediatamente os perseguir, incorrem na pena de demissão o inhabilidade para qualquer emprego publica por cinco a dez annos, alem da responsabilidade que, por qualquer omissão ou negligencia, lhos caiba para com a Fazenda Publica.

Art. 142.° Todas as contravenções o delictos que ofenderem as disposições d'este decreto ou o direito eleitoral e o exercicio d'elle, comprehendidos nos diversos artigos d'este capitulo, serão sempre perseguidos, perante os tribunaes competentes, pelos respectivos agentes do Ministerio Publico, e tambem o podem ser por qualquer eleitor inscripto no recenseamento, instaurando-se o processa devido segundo a legislação em vigor.

Art. 143,° O procedimento criminal por contravenções ou delictos previstos neste decreto proscreve no prazo do seis meses desde que forem commettidos.

§ unico. Somente prescreve no prazo de tres annos o procedimento pelo delicto previsto no artigo 132.° a o procedimento contra as auctoridades administrativas ou policiaes o contra os agentes do Ministerio Publico que para a punição do mesmo delicto deixarem do cumprir o preceito do artigo 141.º

Art. 144.° Para se perseguir um funccionario de qualquer ordem ou categoria, ou qualquer agente da auctoridade publico, pelos crimes previstos no presente decreto ou pelos quo contra o exercicio dos direitos politicos estão previstos no Codigo Penal, não é necessaria auctorização do Governo.

Art. 145.° Os processos por estes crimes não suspendem em caso algum as operações eleitoraes nem podem prejudicar o segredo do escrutinio.

Art. 146.° A condemnação, quando for pronunciada, não importará nunca a annullação da eleição declarada valida pelo tribunal competente.

Art. 147.º Continuam a ser permittidas todas as reuniões para objectos eleitoraes, tanto públicos como particulares, nos termos da legislação respectiva.

Art. 148.º Fica revogada a lei de 26 de junho de 1809 o toda a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho do Ministros e os Ministros e Secretario de Estado de todas as Repartições assim o tenham entendido a façam executar. Paço, em 8 de agosto de 1901. = REI = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa =. Manuel Francisco de Vargas.

Quadro dos prazos para as operações do recenseamento eleitoral, no qual se refere o artigo 38.° ao presente decreto

[Ver tabela na Imagem]
Operações Datas Prazos

Paço, em 8 do agosto de 1901, = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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Mappa dos circulos eleitoraes a que se refere o decreto d'esta data

[Ver tabela na imagem]
Numeração dos circulos Sedes dos circulos Concelhos de que se compõe Numero de deputados dos circulos Numero de nomes que devem ter as listas eleitoraes Representação da minorias

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[Ver tabela na imagem]
Numeração dos circulos Sedes dos circulos Concelhos de que se compõe Numero de deputados dos circulos Numero de nomes que devem ter as listas eleitoraes Representação da minorias

Paço, em 8 de agosto de 1901. = Ernesto Rodolpho Ribeiro

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N.º 2

Senhor. - Na proposta de lei apresentada á Camara dos Senhores Deputados da Nação, com data de l5 do abril, concedia-se ao Governo auctorização para reformar nalguns pontos a organização doa serviços municipaes do Lisboa, e no relatorio, que o precedeu, se exposeram desenvolvidamente as razoes de ordem publica e conveniencia administrativa, quo as justificam.

A resolução de outros assumptos, cuja importancia não ora menor, e em que largamente se empregou a actividade parlamentar, tomou todo o periodo da ultima sessão legislativa, não chegando por isso a discutir-se aquella proposta, que aliás obteve parecer favorável da competente commissão parlamentar.

Subsiste porem toda a força dos seus fundamentos, e o decurso do tempo, longe de minguar, aggrava a necessidade de quo o Governo esteja habilitado a tomar as providencias indispensaveis em harmonia com as auctorizações definidas na mencionada proposta de lei; e por isso temos a honra de submetter á approvação de Vossa Majestade o seguinte projecto de decreto.

Paço, ora 8 de agosto de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luis Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao quo Me representaram os Ministros e Secretarios do Estado de todas as Repartições: Hei por bom decretar o seguinte:

Artigo 1.° É auctorizado o Governo a reformar os serviços municipaes de Lisboa, em conformidade com as seguintes bases:

l.ª

O serviço de extincção de incendios ficará subordinado ao Ministerio dos Negocios do Reino, sob a immediata dependencia do Governo Civil do districto do Lisboa, e o seu pessoal superior será escolhido pelo Governo de entre pessoas de comprovada idoneidade, sendo preferidos os officiaes do exercito.

1.° E fixada em 20:000$000 réis a quantia com que as companhias e agencias seguradoras de moveis ou immoveis ao Municipio de Lisboa, contribuirão pana as despesas d' este serviço.

2.º A dotação do serviço de extincção de incendios continuará sendo despesa obrigatoria do municipio, não podendo exceder a quo actualmente se faz.

Para o serviço de abastecimento do carnes verdes, alem das faculdades conferidas pela legislação vigente á Camara Municipal, poderá o Governo:

a) Limitar o numero de talhos particulares;

b) Prohibir a venda de carne de gado não abatida no matadouro municipal;

c) Alterar os direitos do consumo e os do importação sobre carnes conservadas por qualquer processo do arrefecimento;

d) Adoptar sobro o commercio o fornecimento de carnes quaesquer outras providencias tendentes a baratear o preço o assegurar a boa qualidade d'ellas.

3.ª

Sei ao reformados os quadros do pessoal de todos os serviços, que ficarem pertencendo á Camara Municipal, reduzindo-se, quanto possivel, o numero do empregados vitalicios, o fixando-se verbas certas para retribuição de funcções, quo possam ser confiadas a pessoal contratado, de forma, quo a despesa com um e outro pessoal não exceda a que está auctorizada no orçamento ordinario do anno corrente, e antes seja diminuida em proporção compativel com o regular desempenho doa serviços.

a) As vagas que occorrerem no quadro do pessoal technico das obras municipaes, que não poderem prover-se por promoção dos actuaes empregados ou por collocação de empregados addidos, serão preenchidas com empregados requisitados no Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria;

b) Proceder-se-ha immediatamente, na repartição technica municipal, á elaboração de um plano geral de melhoramentos da capital, ao qual serão subordinadas todas as obras de construcção.

4.ª

A Camara Municipal de Lisboa será composta de onze vereadores, dividindo-se para este effeito o município em circulos, por cada um dos quaes será eleito determinado numero de vereadores effectivos e substitutos.

5.ª

Ao Governo competirá nomear de entre os vereadores o Presidente da Camara Municipal, podendo substituil-o neste cargo por outro vereador da sua escolha, quando assim o julgar conveniente.

Art. 2.° Para a eleição da Camara Municipal do Porto, que será quadrienal, procederá o Governo a nova divisão dos respectivos circulos eleitoraes, designando o numero do vereadores, que a cada um d'elles compete eleger.

§ unico. São applicaveis á Camara Municipal do Porto as disposições da base 3.ª do artigo 1.° d'este decreto.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho de Ministros e os Ministros e Secretarios de Estado de todas as Repartições assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 8 de agosto de 1901. = REI.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.° 3

Senhor. - Na ultima sessão legislativa foi pela Camara dos Senhores Deputados da Nação, votado um projecto de lei, approvando o contrato provisorio de 2 de abril de 1897, entre a Camara Municipal do concelho de Bouças e a empresa representada pela "Compagnie Générale des Eaux pour l'Etranger", para abastecer de aguas as freguesias do Mattosinhos o Leoa da Palmeira. Este projecto, que em 22 do maio do corrente anno obteve parecer favoravel da commissão de administração publica da Camara dos Dignos Pares do Reino, importa, como foi reconhecido em ambas as Casas Legislativas, um melhoramento instantemente requerido pela hygiene e commodidade dos povos d'aquellas freguesias e dos forasteiros que em muito avultado numero as frequentam. Accresce, que a realização do sobredito contrato interessa actualmente não só ás condições sanitarias das referidas povoações, mas tambem ás industrias metallurgicas da cidade do Porto, que estão correndo o risco de reduzir a sua laboração com gravo prejuizo dos operarios e consequente gravame do Thesouro Publico.

Por estes motivos toem subido ao Governo diversas reclamações, apoiados pelas informações officiaes, impetrando a execução d'esse melhoramento. Nestas circumstancias, e não tendo a mencionada camara municipal outro meio de o realizar, parece-nos de incontestavel opportunidade o provada conveniencia publica, quo tenhamos a honra de submetter á superior approvação de Vossa Majestade o seguinte projecto de decreto.

Paço, em 27 do setembro do 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattoso Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

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Attendendo ao que mo representaram os Ministros e Secretarios de Estado de todas as repartições:

Hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° É approvado, para que só torno definitivo, o contrato provisorio para abastecer de aguas as freguesias de Mattosinhos o Loca da Palmeira, que constituem a villa de Mattosinhos, celebrado entro a Camara Municipal do concelho de Bouças e a empresa representada pela companhia francesa denominada "Compagnie Générale des Eaux pour l'Étranger", por escriptura de 2 de abril de 1897, e que fica fazendo parte d'este decreto.

Art, 2.° Ficam revogadas as disposições em contrario.

O Presidente do Conselho de Ministros e os Ministros e Secretarios de Estado do todas as repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, era 27 do setembro de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Escriptura de contrato para o abastecimento de aguas da villa de Mattosinhos, celebrado entre a Gamara Municipal e a empresa representada pela companhia francesa denominada "Compagnie Générale des Eaux pour 1'Ètranger" em 2 de abril de 1897, approvado por decreto de 27 de setembro de 1901.

Saibam os que esta escriptura virem que, no anno do nascimento do Nosso Senhor Jesus Christo de 1897, aos 2 dias do mês de abril, nesta villa de Mattosinhos e Paços do Concelho de Bouças onde se achavam presentes de uma parte o Ilmo. Sr. Affonso da Veiga Faria, na qualidade de presidente e representante da Ilmo. Camara Municipal, na conformidade da lei, o da outra o Ilmo. Sr. Carlos do Pezerat, engenheiro, como procurador a representante da Compagnie Générale des Eaux pour l'Étranger, o que fez certo pela procuração que neste acto apresentou o fica guardada na secretaria da municipalidade para ser inserida nos traslados e certidões que se passarem d'esta escriptura, pessoas reconhecidas pelas proprias de mira, escrivão, e das testemunhas abaixo designadas, do que dou fé; ahi polo Ilmo. Presidente da Illmo. Camara outorgante foi dito que, tendo a Compagnie Générale des Eaux pour l'Étranger, com sedo em Paris, proposto em conformidade com o programma do concurso publicado no Diario do Governo n.° 209, do 17 do setembro de 1893, fazer o abastecimento do aguas potaveis na villa de Matosinhos, e havendo a proposta, depois de modificada, sido acceita pela Camara, por isso vinha hoje elle, Presidente, em nome da Camara e por auctorização da mesma, realizar por esta escriptura o contrato provisorio com as condições abaixo declaradas, visto que a referida Companhia satisfez ao disposto no artigo 14.° do mesmo contrato, depositando a quantia de 6:000$000 réis na Caixa Geral de Depositos, como mostrou por documento legal que neste acto apresentou e ficou archivado.

Condições do contrato

Artigo 1.° A Companhia obriga-se a abastecer com agua potavel a villa do Matosinhos, situada no concelho de Bouças, districto do Porto, por sua conta, encargos e riscos, em conformidade com as condições estipuladas nos diversos artigos da presente proposta.

§ 1.° A palavra "Companhia" todas as vezes que for empregada na presente proposta, significará a Compagnie Générale des Eaux pour l'Étrnnger cuja sedo é em Paris Rua d'Anjou Saint Honeré, n.° 62, concessionaria do abastecimento de agua da cidade do Porto, ou qualquer outra sociedade particular ou companhia a quem a concessionaria, na conformidade das leis e previa auctorização da Camara Municipal de Bouças, tiver transferido os direitos adquiridos, assim como as obrigações resultantes da presente proposta.

§ 2.° As ruas a canalizar, para todos os effeitos da presente proposta, estão determinadas nas plantas annexas á dita proposta, da qual fazem parte integrante.

§ 3.° A Companhia fica obrigada a canalizar as ruas, raças e viellas não incluidas nas ditas plantas, mas só quando o valor das assignaturas contratadas pelos seus moradores por um prazo de quatro annos representar a quarta parte da despesa a fazer para estabelecer a dita canalização e isto nas ruas, praças e viellas onde a pressão do reservatorio da Foz puder attingir.

No caso do contestação sobre a importancia das despezas das canalizações, o valor das obras a executar será calculado em conformidade com a serie de preços estabelecida no regulamento annexo ao contrato, os quaes preços são identicos aos do regulamento da cidade do Porto, approvado por decreto do 2 do dezembro de 1886.

Dado o caso das sobreditas extensões da canalização geral, a Camara Municipal de Bouças, os assignantes, assim como a Companhia, ficarão sujeitos a todas as condições obrigações da presente proposta.

§ 4.° A Companhia e somente obrigada a fornecer agua até á altitude que a pressão do reservatorio da Foz puder attingir nas condições actuaes.

Art. 2.° O abastecimento será feito pela companhia com a agua dos Rios Sonsa e Ferreira, ou com agua vinda de fora da villa, adquirida por qualquer forma ou proveniente de exploração directa; porem, em caso algum a Companhia poderá emprehender obras das quaes resulte alteração ou reducção das aguas das fontes destinadas actualmente ao publico.

§ 1.° As aguas quo não forem provenientes dos rios tansa o Ferreira, já approvadas, não poderão ser introduzidas nos reservatorios ou canalizações da distribuição, em serem previamente examinadas por peritos nomeados pela Camara Municipal de Bouças, e por elles reconhecidas de boa qualidade e potavel; a Companhia deverá prevenir com antecipação quaes as aguas que destina aos reservatorios para o abastecimento da villa.

§ 2.° A Companhia empregará os meios convenientes o indispensáveis para que as aguas que circularem nos canos de distribuição não sejam insalaubres, obrigando-se, alem d'isso, a mesma Companhia a fazer as descargas necessarias para que as aguas não sejam demasiadamente coloradas.

Art. 3.º A Companhia obriga-se a executar as obras necessarias para abastecer desde já a villa de Matosinhos com 250 metros cubicos de agua por vinte o quatro horas, augmentando o dito abastecimento na proporção da importancia das assignaturas subscriptas sobre a fede das canalizações a estabelecer no futuro.
A Companhia poderá dispor, como melhor entender, da agua que não for empregada no abastecimento da villa.

§ 1.° O volume de agua, a que se refere o presente artigo, comprehende tanto a destinada aos usos publicos, como a destinada aos usos particulares.

§ 2.° Quando as assignaturas particulares, sem contar o abastecimento maximo gratuito do 70 metros cubicos por vinte e quatro horas, concedido á Camara Municipal de Bouças, em conformidade com as letras A e B do § 4.º do artigo 4.°, representarem 100 metros cubicos por vinte e quatro horas, a Companhia será obrigada $ construir no alto de Leça da Palmeira, ou em qualquer outro ponto elevado, abastecido pelo reservatorio da Foz, um deposito ou reservatorio de agua, da capacidade de 1:000 metros cubicos, para supprir a falta de abastecimento que possa sobrevir, por uma circumstancia qualquer, no reservatorio da Foz. A capacidade do dito reservatorio será elevada a 2:000 metros cubicos quando as assignaturas particulares, como acima está determinado, representarem 200 metros cubicos por vinte e quatro horas.

Art. 4.° A Companhia é ainda obrigada:

1.° A executar nus ruas e praças da villa as obras ne-

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cessarias para a canalização e distribuição geral designada na planta junta á presente proposta;

2.° A canalizar as aguas do Rio Sousa, fornecidas pela canalização geral da cidade do Porto, ligando o conductor de Carreiros, na Foz do Douro, com a de Matosinhos por meio de um cano de ferro fundido, de 120 millimetros de diametro interior, assente na estrada de Carreiros a Matosinhos. Para atravessar o Caminho de Ferro de S. Gen a Leça da Palmeira, a conducta será assente num tubo de ferro fundido, de 10 metros de comprimento, de maneira, que, no caso de ruptura da dita conducta, não passa a via, ferrea soffrer damno algum, ficando por essa forma perfeitamente garantida;

3.º A installar por sua conta trinta e cinco bocas de incendio na villa de Matosinhos, nos logares indicado pela Camara Municipal de Bouças, unicamente, porem nas ruas já canalizadas. Caso a Camara Municipal de bouças queira augmentar o numero das ditas bôcas, estas novas installações serão feitas á custa da mesma Camara.

§ 1.° A Camara Municipal de Bouças terá direito ao abastecimento gratuito, por cada dia ou por cada vinte e quatro horas, dos seguintes metros cubicos de agua:

A) Desde o mês de novembro, inclusive, até ao fim de abril, 20 metros cubicos de agua por cada vinte e quatro horas;

l B) Do mês de maio, inclusive, até ao fim de outubro 70 metros cubicos por cada vinte e quatro horas.

Sendo os volumes diarios, acima indicados, as quantidades maximas que a Camara Municipal de Bouças pode comsumir em cada vinte e quatro horas, fica entendido que os metros cubicos economizados num dia não poderão ser juntos ao consumo dos dias seguintes.

Esta agua gratuita será unicamente empregada nos uso: publicos seguintes:

a) Rega das ruas, praças ou jardins publicos;

b) Incendios;

c) Lavagem dos urinoes e latrinas publicas.

Tudo em conformidade com um regulamento especial elaborado pela Companhia e approvado pela Camara, assegurando á Companhia toda a fiscalização necessaria e o direito de repressão dos abusos, quando os houver.

Art. 5.° As obras a que a Companhia é obrigada, conformidade com os artigos 3.º e 4.°, serão executadas segundo o projecto apresentado pela Companhia e que faz parte integrante da presente proposta.

§ 1.° Caso a Companhia tencione modificar o projecto, para o tornar mais vantajoso, ella poderá propor essas modificações á Camara Municipal de Bouças, que as acceitará ou recusará, conforme o que lhe parecer justo.

§ 2.° Os trabalhos, salvo qualquer caso de força maior devidamente comprovado, começarão no prazo de tres meses e serão concluidos no de dois annuos, a contar da data da approvação do contrato pelo Governo, sob pena de annullação do contrato e sem que a Companhia fique com direito a indemnização de especie alguma.

Os atrasos provenientes dos pedidos de auctorizações de resoluções por parte das auctoridades ou do Governo, os quaes dariam em resultado a paralysação ou o atraso dos trabalhos, prolongarão de outro tanto os prazos concedidos para a sua conclusão.

As extensões da canalização geral poderão ter logar em qualquer epoca, mas serão executadas no prazo de dois meses, a contar da data das assignaturas dos proprietarios interessados em promover a dita extensão, em conformidade com as condições do artigo 1.°, § 3.° da presente proposta.

A construcção do reservatorio começará dois meses depois da constatação do limite fixado no artigo 3.°, § 8.° da proposta e será concluida por cada tanque de 1:000 metros cubicos, no prazo de oito meses, a contar da data do começo dos trabalhos, salvo caso de força maior, ou de atrasos por parte do Governo em declarar de utilidade publica e urgentes as expropriações necessarias para execução dos trabalhos; neste caso o prazo começará a vigorar a contar da data do julgamento da questão de expropriação pelos tribunaes competentes.

§ 3.° O reservatorio será concluido nos prazos fixados no paragrapho anterior, quando as condições estabelecidas para a sua construcção tiverem sido realizadas. Ultrapassando estes prazos, a Companhia pagará á Camara uma multa de 50$000 réis por cada mês de demora.

Art. 6.° A concessão acabará no dia 27 de julho de 1981, como a da cidade do Porto, e, no caso que esta data seja prorogada pelo municipio do Porto, será igualmente prorogada para a villa de Matosinhos. A expiração da concessão, a Camara Municipal de Bouças entender-se-ha directamente com a da cidade do Porto a respeito do volume de agua destinado ao abastecimento de Matosinhos, sem que a Companhia seja responsavel em cousa alguma pela continuação do dito fornecimento.

Caso a Camara do Porto venha a aproveitar-se do direito do resgate da concessão antes do prazo fixado para a sua expiração, e que esta cidade continue a fornecer á villa de Matosinhos a agua que for objecto da presente proposta, a Companhia terá a faculdade de conservar a concessão do abastecimento de agua da villa do Matosinhos até á data de 27 do julho de 1981, salvo indemnização á Camara Municipal do Porto, se esta a exigir, do valor da agua concedida a Matosinhos, excepto se a Camara Municipal de Bouças preferir resgatar a concessão ao mesmo tempo que a Camara Municipal do Porto e nas mesmas condições.

Art. 7.° O Governo e a Camara Municipal de Bouças concedem á Companhia, até á expiração de contrato, segundo está determinado no artigo 6.°:

l.° O direito exclusivo de estabelecer nas ruas da villa, nas praças e nas estradas publicas, canalizações de abastecimento e distribuição de aguas. Este direito é gratuito. Para collocar, substituir ou reparar a sua canalização, poderá a Companhia levantar o pavimento das ruas, largos e praças e outras vias publicas, mediante licença da Camara, gratuita e sem deposito; mas nos casos extraordinarios e imprevistos o pedido da licença será substituido por uma simples participação motivada, devendo a Companhia, em qualquer caso, proceder á sua custa, no mais curto prazo, á reconstrucção da parte do pavimento que levantar e sempre sob a fiscalização da Camara;

2.° O direito gratuito de installar a conducta de adducção que deve levar as aguas de Carreiros, da Foz do Douro, pela estrada que liga estas duas localidades e por onde passa a via dos americanos;

3.° O direito de vender, fora da villa de Matosinhos, a agua que a Companhia tiver introduzido na sua canalização e que não for exigida para o consumo da mesma villa;

4.° O direito consignado no artigo 451.º do Codigo Civil Português.

§ 1.° Os direitos exclusivos de que tratam os n.º 1.°, 2.° e 3.º do presente artigo não abrangem o caso em que os proprietarios de aguas já exploradas, em exploração, ou que do futuro se explorem, d'ellas queiram dispor para seu proprio uso ou mesmo para as venderem a outros individuos, contanto que neste ultimo se prove que a Companhia lhes não pode fornecer a sua agua.

§ 2.° A Companhia exercerá estes direitos exclusivos principalmente por meio das suas canalizações parciaes que da canalização geral conduzem a agua á entrada ou linha exterior dos predios.

Art. 8.º A Camara Municipal de Bouças conservará a posse, administração e usufructo de toda a agua que possue actualmente; porem, não poderá aproveitá-la senão para usos publicos e municipaes, e isto gratuitamente.

§ 1.° São considerados como usos publicos ou municipaes o abastecimento dos edificios do Estado, do districto

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e Municipio, os estabelecimentos publicos de instrucção, de caridade ou de beneficencia, bebedouros para gados, rega das ruas, praças, urinoes e latrinas publicas, assim como para o serviço, de incendios e enfim para a alimentação das fontes actuaes.

§ 2.° Se durante o periodo d'esta concessão sobrevier, em qualquer das nascentes que possue a Camara Municipal de Bouças, uma tal estiagem que torno aquellas nascentes insuficientes para os usos publicos, como anteriormente, a Companhia será obrigada a fornecer á dita Camara, se esta o exigir, o volume de agua necessario até ao maximo de 50 metros cubicos por vinte e quatro horas, para melhorar a falta de agua. O preço convencionado para todos os consumos municipaes, em excedentes aos metros cubicos gratuitos designados no artigo 4,° da presente proposta, é de 100 réis por cada metro cubico.

Art. 9.° A Companhia não poderá vender a sua agua a mais de 200 réis o metro cubico.

§ 1.º A tabella dos preços da agua para os abastecimentos particulares, fornecidos por meio de contadores ou torneiras reguladoras conforme as necessidades do serviço que se tratará de installar, será conforme com o regulamento estabelecido pela Companhia o approvado pela Camara Municipal de Bouças.

§ 2.° A Companhia fornecerá a agua de que dispõe, em conformidade com as circumstancias especiaes ao serviço que se tratará de installar, pelos meios que melhor convier, os quaes serão determinados por ella o acceites pelos consumidores.

§ 3.° Todas as obrigações que a Companhia contrahir, em conformidade com o paragrapho precedente, serão consideradas sem efeito para a Camara Municipal de Bouças, logo que, por qualquer motivo que seja, cesse a administração d'esta mesma Companhia, nos termos do artigo 20.° do contraio da cidade do Porto approvado por lei de 27 de julho de 1882.

Art. 10.° O regulamento para as canalizações particulares e para o consumo da agua será estabelecido pela Companhia e approvado pelas auctoridades competentes.

§ 1.° As canalizações interiores serão facultativas, mas o Governo concede e garante á Companhia, durante o prazo da concessão, e direito de obrigar os proprietarios dos predios da villa de Mattosinhos, do concelho de Bouças, a fazerem á sua custa a canalização para a agua no interior dos mesmos predios e nas condições de se prestarem ao abastecimento da agua da Companhia, para os usos domesticos dos inquilinos moradores no predio, quando estes a reclamem.

§ 2.° são isento d'esta obrigação Os proprietarios dos predios cujo valor da renda annual for inferior a 45$000 réis. Este valor poderá ser verificado por todos os meios de prova, sem que a sua fixação seja sujeita ás indicações do valor locativo lançado na matriz de renda de casas.

§ 3.° O direito concedido á Companhia por esta concessão não obriga os habitantes a receberem agua da mesma Companhia nos seus domicilios.

Art. 11.° A Companhia será isenta dos direitos municipaes para a entrada do material destinado ao uso da sua concessão.

Art. 12.° O Governo declarará de utilidade publica o urgente, reguladas pelas leis em vigor, as expropriações de qualquer natureza, que sejam necessarias para a execução do contrato, ficando a cargo da Companhia o pagamento das despesas e indemnizações respectivas.

§ 1.° Os terrenos do dominio do Estado ou do municipio, necessarios para a execução dos trabalhos, .e que sem inconveniente, puderem ser utilizados, serão cedidos gratuitamente á Companhia, revertendo ao Estado ou ao municipio no fim da concessão.

Art, 13.º A Camara Municipal de Bouças concede á Companhia o direito exclusivo de canalizar as ruas da villa para o abastecimento de agua do "Porto de Leixões"
quando o dito abastecimento estiver contratado entre o Governo e a Companhia.

Art. 14. O deposito definitivo de 6:000$000 réis em dinheiro ou era titulos da divida publica portuguesa, ao preço do mercado, que a Companhia é obrigada a fazer na Caixa Geral de Depositos, á ordem da Camara Municipal de Bouças, antes da assignatura do contrato, servirá de canção ao seu fiel e exacto cumprimento em todas as suas clausulas a condições.

l.º A Companhia receberá os juros do dinheiro ou dos titulos que constituirem o deposito, durante o tempo que durar o mesmo deposito.

& 2.º O deposito definitivo de que trata o presente artigo será restituido logo que o valor dos trabalhos executados e dos materiaes ao pé da obra, representar o dobro do valor do deposito.

& 3.° Quando o deposito for restituido como está indicado no presente artigo, os trabalhos executados e o material empregado servirão de caução para o cumprimento do contrato.

Art. 15.° Emquanto durar a concessão a Companhia fica obrigada a conservar em perfeito estado todas as obras e material.

Art. 16.° Se das obras municipaes executadas era qualquer ponto da villa de Matosinhos, resultar a necessidade de modificar a canalização que a Companhia ali tiver installado ou a assentar nova canalização, a Companhia será brigada a executar as ditas modificações quando assim lhe for exigido, mas a Camara Municipal de Bouças, neste caso, será obrigada a indemnizá-la das respectivas despesas.

Art. 17.º A Companhia pagará á Camara como multa a quantia de 6&0000 réis por cada dia em que, salvo o caso de força maior devidamente comprovado, houver interrupção completa do abastecimento em Matosinhos ou Loça, e a quantia de 12#000 réis por cada dia em que houver interrupção completa era toda a villa, não podendo esta multa ser applicavel a mais de vinte dias consecutivos da dita interrupção.

§ 1.° se dentro de um anno, a contar do ultimo d'aquelles vinte dias, a Companhia se não mostrar habilitada a continuar o abastecimento, entender-se-ha que abandonou a concessão e o contrato se haverá como rescindido, apossando-se a Camara de todo o material empregado para o abastecimento, comprehendendo canalização, reservatorios quaesquer outras obras de arte sitas no concelho, sem que a Companhia tenha direito a indemnização alguma.

§ 2.º Cessa porem o direito d'essa rescisão se o impedimento for motivado por caso de força maior devidamente comprovado.

Art. 18.º Para os effeitos do contrato, seja qual for a nacionalidade da Companhia, esta será considerada como portuguesa; e, tanto ella como os seus empregados agentes ou operarios ficarão sujeitos ás leis portuguesas, e, seja qual for o seu domicilio considerar-se-ha domiciliada na cidade do Porto e aqui responderá para todos os effeitos do contrato, podendo ser citada na pessoa d'aquelles que na mesma cidade exercerem a direcção superior das obras ou administração da Companhia.

Art. 19.° O credito por despesas de encanamentos e seus concertos goza do privilegio immobiliario do artigo 883.°, n.° 2.° do Codigo Civil é o credito pelo preço da agua goza do privilegio immobiliario do artigo 883.°, n.º l.°, 2.° e 3.° e artigo 882.°, n.º 3.° e 4.° e seus paragraphos do mesmo Codigo. Estes privilegios comprehendem os juros respectivamente.

Art. 20.º As contestações que se suscitarem entre a Camara Municipal de Bouças e a Companhia, sobre a interpretação ou execução do contrato, serão decididas por arbitros.

§ 1.° O Tribunal Arbitral será composto de tres arbitros, sendo um nomeado pela Camara e outro -pela Com-

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panhia e o terceiro, que será o de desempate para o effeito do § 4.° do artigo 56.° do Codigo do Processo Civil, será escolhido por acordo das partes, e, á falta d'esse acordo, pelo presidente do Tribunal da Relação do Porto.

§ 2.° Os arbitros julgarão sempre pelos termos do contrato e na mais ex aque et bono as questões que lhe forem submettidas. Das suas decisões não haverá recurso.

Art. 21.° Todas as despesas resultantes do contrato serão a cargo da Companhia.

Art. 22.° Para o abastecimento da villa de Matosinhos o Governo concederá á Companhia os privilegios outorgados ás Companhias das Aguas de Lisboa e Porto, tornando-lhe igualmente applicaveis as leis e regulamentos que regem estas Companhias relativamente aos seus direitos, garantias de creditos, por venda de agua e policia, na parte que estiver em harmonia com o contrato.

Art. 23.º O contrato será submettido á approvação do Governo, da qual fica dependente para ser considerado definitivo.

Art. 24.° A Camara Municipal de Bouças compromette-se a obter das administrações competentes, no interesse dos concessionarios, as auctorizações necessarias para execução dos trabalhos e as garantias indispensaveis para a sua conservação, ficando todas as despesas a cargo dos mesmos concessionarios.

Declaro que o imposto do sêllo d'esta escriptura foi pago por meio de uma estampilha no valor de 1#5000 réis, que vae no fim, collatada e por mim devidamente inutilizada. Assim o disseram, outorgaram e acceitaram de parte a parte, na minha presença e das testemunhas Arthur Soares Rodrigues e Francisco Antonio de Oliveira, casados, empregados publicos, moradores nesta villa de Matosinhos, os quaes todos vão assignar depois d'esta lhes ser lida por mim, Guilherme Augusto Ferraz, Secretario e Tabellião da Camara Municipal, que a escrevi, subscrevo e assigno, resalvando as, rasuras a fl. 23, lin. 7.º e 8.º , que dizem "primeiro, a executar" e "da villa ", a entrelinha a fl. 26, lin. 27, que diz "cubicos" e a entrelinha a fl. 29, lin. 7.º, que diz "outras", Affonso da Veiga Faria, Carlos de Pezerat, Arthur Soares Rodrigues, Francisco Antonio de Oliveira, Guilherme Augusto Ferraz, Secretario e Tabellião da Camara.

Acha-se collada uma estampilha no valor de l $000 réis, do imposto do sêllo, e duas estampilhas de contribuição industrial na importancia de 170 réis, todas devidamente inutilizadas.

Está conforme o original, resalvando a entrelinha a fl. 3, lin. 10, que diz "nos" e a rasura a fl. 7 v., lin. 18, que diz "conservará".

Bouças, e Secretaria Municipal, 11 demarco de 1901.= O Secretario, Guilherme Augusto Ferraz.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 27 de setembro de 1901.=Arthur Fevereiro.

N.º 4

Senhor.-Na ultima sessão legislativa foi apresentado á camara dos Senhores Deputados da Nação um projecto de lei, auctorizando a Camara Municipal de Lisboa a contrahir em determinadas condições um emprestimo de réis 400:000&5000 para ser applicado na abertura de ruas e avenidas da segunda zona, a que se refere a carta de lei de 9 de agosto do 1888.

Este projecto, da iniciativa dos illustres representantes do circulo eleitoral de Lisboa, fundado na manifesta necessidade de se concluirem os importantes melhoramentos iniciados em execução da citada lei, não só obteve parecer favoravel da competente commissão, em 10 de maio do corrente anno, mas foi approvado em 21 do mesmo mês pela Camara dos Senhores Deputados, havendo tambem o assentimento da respectiva commissão da Camara dos Dignos Pares do Reino, de cuja approvação ficou pendente pelo encerramento da sessão legislativa.

Ultimamente, a commissão administrativa do Municipio de Lisboa, no zel so empenho de promover a realização de tão grande e util melhoramento para a capital, veiu impetrar auctorizacào extraordinaria a fim de contrahir o sobredito emprestimo, pondo em relevo, que a satisfação dos respectivos encargos não affectará a fazenda municipal, por serem compensados pela renda dos terrenos sobejos das expropriações, nos termos da citada lei.

Todas as considerações attendiveis neste assumpto aconselham o deferimento do pedido pelo muito que importa ao engrandecimento da capital do reino, ao desenvolvimento das receitas do Estado e do municipio e não menos á hygiene publica pela consequente desaccummulação da população de Lisboa e construcção de saudaveis habitações.

A experiencia da citada lei de 9 de agosto de 1888, na parte, em que já tem sido executada, é fiador de que a referida operação financeira em nenhum modo prejudicará a satisfação das actuaes despezas obrigatorias da Camara Municipal Lisboa, e antes contribuirá para augmento das receitas do municipio, uma vez que na determinação do preço das expropriações se observe escrupulosamente o preceito do § 3.° do artigo 3.° da mesma lei, que nem sempre tem sido bem interpretado, convindo por isso que se repita nos mais precisos termos.

Por estas considerações e convencidos de que é de todo o ponto ajustada ao interesse publico a breve realização das mencionadas obras, temos a honra de submetter á elevada sabedoria e approvação de Vossa Majestade o seguinte projecto de decreto, que reproduz o que já foi votado pela Camara dos Senhores Deputados da Nação.

Paço, em 24 de dezembro de l90l.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro - Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos= Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa - Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que Me representaram os Ministros e Secretarios de Estado de todas as repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.º É auctorizada a Camara Municipal de Lisboa a contratar com a Caixa Geral de Depositos um emprestimo, até á quantia de 400:0005000 réis, que será exclusivamente applicado aos trabalhos de abertura de avenidas e ruas na segunda das zonas, a que se refere a carta de lei de 9 de agosto de 1888, conforme os projectos approvados por decreto de 4 de outubro de 1889.

§ 1.° Este emprestimo será de juro não superior a 5 por cento ao anno, amortizado em trinta annos e garantido pela consignação dos addicionaes ás contribuições directas do Estado, a que se refere o artigo 68.° do Codigo Administrativo, devendo o Governo descontar mensalmente no respectivo producto de taes addicionaes o duodecimo da annuidade necessaria para juro e amortização da quantia mutuada.

§ 2.° As expropriações dos predios comprehendidos no plano das mencionadas obras serão feitas estrictamente pelo valor actual dos mesmos predios, e nos termos da legislação vigente, sem que possa na fixação da respectiva indemnização, attender-se, nem directa nem indirectamente, ao augmento de valor, que para os mesmos predios poderia resultar dos melhoramentos e que se refere este decreto.

Art. 2.° Ficam revogadas as disposições em contrario.

O Presidente do Conselho de Ministros, e os Ministros o Secretarios do Estado de todas as repartições, assim o tenham entendido o façam executar.== Paço, em 24 de dezembro de l901.= REI,=.Ernesto Rodolpho Hintze Ri-

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SESSÃO N.º 6 DE 17 DE JANEIRO DE 1902 45

beiro - Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.° 5

Senhor. - A proposta de lei, que, em maio do corrente anno, foi apresentada ao parlamento, proposta na qual se definiam as bases em que o Governo Ficava auctorizado a remodelar o actual contrato com o Banco de Portugal, teve a approvação da commissão de fazenda da Camara dos Senhores Deputados.

No relatorio que precede a proposta diz-se que, nas referidas bases, se procuraram conciliar os interesses do publico, os do Estado e os do Banco, por forma a não prejudicar o mercado, antes favorecê-lo, e a tirar para o Estado, em troca do privilegio usufruido pelo Banco, o maximo de lucros, sem perigo para o credito d'este estabelecimento de credito intimamente ligado ao do paiz.

O modo d'isto se conseguir explica-o o mesmo relatorio. Nesta ordem de idéas, acudia logo ao espirito mobilizar valores que porventura estivessem paralyzados no Banco. A prata amoedada, que, como reserva metallica, restricta importancia pode ter, tem-na como quantia não aproveitada pelo commercio, nem aproveitavel para o Banco, Inutil seria, porem, pretender violentar o mercado a receber mais moeda de prata do que elle queira receber. Propositadamente se diz queira, porque a receptividade dos mercados para os diversos valores é tão variavel; parece, por vezes, obedecer a factos tão alheios, pelo menos apparentemente, ás leis da troca, que á primeira vista. Justificado seria tê-la por filha do capricho. Não è certamente assim, mas não é menos certo, que se quasi sempre se pode explicar o que sucedeu, quasi nunca se pode prever o que succederá.

E indubitavel que uma voz satisfeito aquelle querer, toda a moeda de prata a mais, lançada na circulação, refluirá ao Banco, e. ahi estagnará, independentemente e apesar de todos os esforços para a collocar. Necessario era, pois, usar de meio que, emquanto essa collocação se não effectuasse, o commercio não ficasse privado do auxilio d'aquelle capital, e o Estado e o Banco dos respectivos lucros.

Impõe-se, porem, empenhar todos os esforços para garantir efficazmente a nossa emissão fiduciaria. A capitalização annual de 100:000&000 réis, visa a iniciar, com os proprios recursos do Banco, o reforço d'essa garantia em valores, ouro, de facil realização. Substitue-se o incerto "prata" pelo certo "ouro. O valor da garantia será assim real e, portanto, realizavel com segurança. Estabelece-se o principio. Começa-se modestamente, mas começa-se.

Ainda assim, não se esqueça o grande poder da capitalização; no fim de trinta annos, com a entrada annual de 100:000$000 réis e a capitalização dos correspondentes juros, ter-se-ha mais que triplicado o valor actual da garantia, a qual se agora corresponde a 1/17 da importancia das notas em circulação, attingirá, no fim do periodo referido, cerca de 1/6 d'essa importancia.

O juro dos dois emprestimos que passam á conta corrente do Estado, representa hoje 597:000$51000 réis, dos quaes abatendo 163:000$0000 réis, participação do Estado nos lucros do Banco conforme o ultimo relatorio, ficam desde já a inscrever a menos no orçamento da despesa 434:000$000 réis.

Mas todos sabem como a cotação dos titulos de capital se subordina ao valor da capitalização, isto é, á relação entre o dividendo que se lhe distribue e o preço de compra, e como aquella cotação se toma, em. regra, para aferir do credito do estabelecimento que os emittiu. Era, consequentemente de elementar prudencia manter garantido o actual dividendo das acções do Banco, o que não
seria facil, dadas as novas clausulas, conservando-se a participação do Estado nos termos do contrato vigente.

A estas considerações justificativas da proposta alludida, juntou a commissão de fazenda da Camara dos Senhores Deputados as seguintes.

As intenções da lei proposta consistem na diminuição dos actuaes encargos que pesam sobre o Thesouro e no augmento da segurança da circulação fiduciaria por meio da constituição de um fundo de reserva rapidamente crescente.

Consegue-se o primeiro fim incorporando na conta corrente gratuita os dois emprestimos de 1891 e 1893, na importancia de 14.000:000$000 réis, e supprimin-do os encargos resultantes dos respectivos contratos de 4 de dezembro de 1891 o de 14 de janeiro de 1895.

Importam os encargos de juros desses dois empresem 597:000$000 réis, alem da amortização do empréstimo de 8:000 contos do réis a qual, suspensa provisoriamente, começaria a impor ao Thesouro o dispendio de 400 contos de réis annuaes, a contar do anno economico de 1902-1903, e igualmente da amortização do emprestimo de 7:000 contos de réis do 1891, realizavel ao menos pela venda annual de 150 contos do réis de inscripções, o que, desde 30 de junho de 1900 se não tem feito.

A constituição do fundo de reserva da circulação fiduciaria, conforme da proposta nitidamente se deduz, consiste na capitalização animal de 100 contos de réis, que se vão accumulando com os seus juros em títulos de credito de primeira ordem e representativos do ouro. Da taxa do juro desses titulos, cuidadosamente escolhidos, e do giro dos cambios, dependo a importancia da quantia capitalizada com o decurso do tempo. Essa quantia será, em iodas as hypotheses, avultadas e deve efficazmente contribuir para augmentar o credito e a valia das notas, conforme aos interesses publicos convem.

A desistencia de juros do 592 contos do réis, enfraquecendo os dividendos do Banco de Portugal, abateria o credito das suas acções, que, sem duvida, contribue em proporções consideraveis para manter e augmentar a confiança que o publico deposita nas notas. Para manter o dividendo, sacrifica o Thesouro uma parte da participação nos lucros a que tom actualmente direito, som que, na peor hypothese, deixe, na operação planeada, de lucrar cada anno 430 contos do réis em juros, alem de não começar em época proxima o encargo pesado das amortizações devidas e sem que a segurança do Banco em cousa nenhuma seja arriscada. Mas, principalmente, a compensação se encontra na mobilização das reservas.

Por estes motivos crê o Governo que o novo contrato com o Banco, vantajoso para o Thesouro, em nada prejudicará a situação d este estabelecimento de credito, e por isso temos a honra de submetter á apreciação de Vossa Majestade o seguinte projecto do decreto.

Paço, aos 22 de novembro de l901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que Me representaram os Ministros e Secretarios de Estado das diversas Repartições: hei por bem decretar o seguinte;

Artigo 1.° É o Governo auctorizado a modificar o actual contrato com o Banco de Portugal nos termos dos artigos seguintes.

Art. 2.° O capital social do Banco de Portugal será definitivamente fixado em 13:500 contos de réis.

Art. 3.° A partir do anno economico de 1901-1902 o credito do Governo, em conta corrente, será do 41:000 contos de réis, sem encargo algum para o Thesouro, ficando incorporados nesta conta os dois debitos do Estado: um de 8:000 contos de réis por contrato de 14 de janeiro da

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1893; outro de 5:950 contos de réis, saldo actual do contrato de 4 de dezembro de 1891.

Art. 4.° Parte do ouro que constitue a reserva metallica do Banco poderá, com previa auctorização da assembléa geral do mesmo Banco, ser invertida em títulos de primeira ordem representativos de ouro; não podendo, porem, a reserva metallica, ouro, ser, em caso algum, inferior a 3:000 contos de réis.

Art. 5.° O Banco empregará annualmente a quantia de 100 contos de réis, tirados do seu activo, para reforçar o fundo de garantia da emissão fiduciaria pela acquisição da titulos de natureza igual á dos mencionados na base anterior.

§ unico. Os juros e as amortizações d'estes titulos, quando as haja, serão annualmente capitalizados e empregados em titulos de semelhante natureza, pela mesma forma e para o mesmo fim indicados neste artigo.

Art. 6.° Os titulos adquiridos nos termos dos artigos 4.° e 5.° do presente decreto nunca poderão ser alienados sem expressa auctorização da assembléa geral do Banco.

Art. 7.° O Banco poderá empregar, conforme o entenda e seu conselho geral, quer nas transacções ordinarias, quer na compra de titulos de credito, uma quantia igual á da prata que actualmente possuo, ou representá-la por notas sempre convertiveis em prata, até á importancia de 6:000 contos de réis.

§ unico. As notas auctorizadas por este decreto serão de 2$500 réis ou de typo superior.

Art. 8.° As notas de 500 e l$000 réis, bem como as actuaes de 2$500 réis, serão retiradas da circulação, sendo pagas em prata aos respectivos portadores.

Art. 9.° as notas do Banco de Portugal continuam a ser isentas do imposto do sêllo, sendo tambem o Banco isento da contribuição de imposto de juros pelas suas operações.

Art. 10.° O Banco não poderá elevar a taxa do juro das suas operações, em Lisboa e Porto, acima de 5 1/2 por cento ao anno, sem expressa auctorização do Governo.

Art. 11.° A contagem de juros pelo emprestimo de 8:000 contos do réis, de que trata o artigo 3.°, cessará desde a data da assignatura do respectivo contrato; a dos juros relativos á quantia de 5:950 contos de réis, designada na mesma base, terminará quando findar o prazo para a troca de notas a que se refere o artigo 7.° Este prazo não poderá ser superior a seis mezes.

Art. 12.° A participação do Governo, por metade, nos lucros do Banco, será sobre o saldo que ficar, deduzidas as quantias necessarias para encargos, honorarios dos corpos gerentes, fundos de reserva, constituição do fundo de garantia, nos termos do artigo 5.° e sen paragrapho, e 8 por cento de dividendo para os accionistas.

Art. 13.° As despesas feitas pelo Banco com o fabrico cias notas e por motivo da sua falsificação serão, no fim de cada anno, rateadas entre o Governo e o Banco, na proporção da importancia do debito d'aquelle pela conta corrente e da restante parte da circulação fiduciaria, no ultimo dia do dezembro.

Art. 14.º O Governo fixará, de accordo com o Banco, todas as demais disposições relativas á sua organização, ao exercicio das funcções do delegado do Governo junto do mesmo Banco e á fiscalização da emissão fiduciaria.

Art. 15.º As disposições do novo contrato e as dos contratos de 10 de dezembro de 1887,4 de dezembro de 1891, 9 de fevereiro de 1895 e 14 de dezembro de 1897, não alteradas por estas bases, não poderão ser modificadas nem soffrer revisão alguma durante o prazo do dez annos, a contar da data da assignatura do futuro contrato, e depois d'este prazo só por acordo entre o Governo e o Banco, sem que isso importe alteração do periodo do privilegio exclusivo da emissão de notas, que continuará a ser o fixado no contrato organico de 10 de dezembro do 1887, conforme a lei do 29 de julho do mesmo anno.

Art. 16.° Se o Governo não chegar a acordo com o Banco, deverá exigir-lhe o cumprimento de todas as condições que pelos contratos vigentes lhe são impostas.

Art. 17.° Fica revogada toda a legislação contraria a esta.

O Conselheiro de Estado, Presidente do Conselho de Ministros, e os Ministros e Secretarios de Estado de todas as Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, aos 22 de novembro de 1901.= REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.° 6
Senhor. - É da mais fundamental importancia para a solida constituição da força armada uma boa legislação sobre recrutamento militar que, assegurando ao exercito e á marinha de guerra os effectivos de que carecem para o desempenho da sua elevada missão social, ao mesmo tempo procure distribuir, com a maior equidade e sem desnecessarios gravames, os encargos do serviço militar.

Por isso, desde alguns annos, se tem diligenciado aperfeiçoar a nossa legislação referente a este ramo da administração publica, accentuando-se successivamente, de um modo cada vez mais effectivo, o principio de entregar á auctoridade militar, tanto quanto possivel, os serviços do recrutamento, com o fim de dar mais unidade e mais disciplina á sua execução.

Obedecendo a esta orientação, o projecto de decreto que temos a honra de submetter á apreciação de Vossa Majestade:

alarga as attribuições das auctoridades militares e favorece os mancebos inscriptos no recenseamento, pois que lhes poupa incommodos, proporciona vantagens e facilita o encargo que, por um alto dever civico, sobre elles pesa;
allivia os juizes de direito de resolver as reclamações e petições sobre materia de recrutamento, passando a decisão, tanto de umas como de outras, a ser dada pelos commandantes superiores das circumscripções militares territoriaes, depois de recolherem o voto consultivo de uma commissão do officiaes, e de ouvirem o auditor do conselho de guerra, quando o julgarem necessário;

substituo a dispensa do serviço activo e do de l.ª reserva, que era concedida aos mancebos que apresentavam documentos provando serem amparo, pela instrucção militar de cem dias nos regimentos de infantaria, tão somente aos que, achando-se naquellas condições, forem pelo sorteio obrigados ao serviço activo. A troco d'esta simples modificação evitam-se desigualdades que, ha muito, são de todos conhecidas;

estabelece vantagens aos mancebos que provarem ser bons atiradores, concorrendo assim para desenvolver o tiro nacional, de tão grande importancia nas guerras modernas;

altera e modifica a constituição das juntas districtaes de inspecção e o seu modo de funccionamento, estabelecendo que os mancebos sejam inspeccionados no concelho em que foram recenseados, sem necessidade de se fazerem transportar á sede dos districtos de recrutamento e reserva, ou das suas sub-divisões, o que se traduz em commodidade dos mancebos e em economia para a Fazenda;

elimina o apuramento para os serviços auxiliares do exercito em tempo de guerra;
reduz os casos de recurso em materia de inspecção sanitaria, simplificando assim este serviço e evitando alguns abusos que se teem dado;

facilita o pagamento das remissões, permittindo que este seja feito em prestações semestraes;

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elimina a classificação do desertores de recrutamento dada aos mancebos que faltarem á apresentação nas unidades activas do exercito ou da armada, substituindo-a pela do "refractarios";

torna menos onerosa a concessão para os mancebos maiores do quatorze annos se ausentarem para país estrangeiro, substituindo a caução ou hypotheca de 250$000 réis pela remissão antecipada de 160$000 réis, attenuando assim uma das causas da emigração clandestina;

facilita a organização da defesa territorial pelo prolongamento da inscripção noa registos do serviço militar;

finalmente, outras disposições se encontram no projecto, todas tendentes a aperfeiçoar os serviços do recrutamento.

Senhor: Convencidos de que a legislação relativa ao recrutamento militar fica bastante melhorada com as alterações que acabamos do enunciar a Vossa Majestade, não só sob o ponto de vista dos altos interesses do Estado, como sob o da justa commodidade dos povos; o ponderando que a commissão de guerra da Camara dos Senhores Deputados, na ultima sessão legislativa, dou o seu voto favoravel á proposta de lei referente ao recrutamento, elaborada pelo Governo de Vossa Majestade, sob a forma de bases cuja doutrina era, na essencia, a do presente diploma, temos a honra do submetter á approvação de Vossa Majestade o seguinte projecto do decreto.

Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, em 19 de outubro de l90l, = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que Me representaram os Ministros e Secretarios de Estado das diversas Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° O serviço militar continua a ser pessoal e obrigatorio, sendo unicamente permittido:

l.° A substituição entre irmãos;

2.º O adiamento de um irmão durante o tempo que, segundo a natureza do sou alistamento, outro estiver servindo nas unidades activas;

3.° O adiamento, até nos vinte e seis annos, dos mancebos que frequentarem com aproveitamento qualquer curso theologico com destino á carreira ecclesiastica;

4.° O adiamento, em annos successivos, doa marítimos que servirem como patrões ou tripulantes dos barcos salva-vidas pertencentes as estações do Instituto de Soccorros a Naufragos, não podendo os adiamentos, a contar do segundo anno, ser concedidos sem que os mancebos tenham servido nos mencionados barcos ininterruptamente;

5.° A remissão do serviço cativo o da 1.º reserva.

§ unico. Os mancebos que se naturalizarem cidadãos estrangeiros depois do recenseados o que, á data da naturalisação, não tenham cumprido os preceitos da lei do recrutamento, são obrigados ao pagamento da quantia do réis 300$000, que terá a mesma applicação que o producto das remissões, sob pena de execução nos seus bens.

Art. 2.º São excluidos do serviço militar:

1.° Os clerigos de ordens sacras;

2.° Os maritimos a que só refere o n.º 4.° do artigo anterior, depois de terem realmente servido quatro turnos consecutivos nos barcos salva-vidas.

Art. 3.° Os mancebos que forem amparo exclusivo de pae, mãe ou irmão pobres e os sustentarem só coro o seu trabalho, e o exposto, abandonado, ou orphão, que nas mesmas condições amparar a mulher pobre que o criou, se, pelo sorteio, lhes pertencer a obrigação do serviço activo do exercito ou da armada, serão transferidos para a 2.º reserva depois de promptos da instrucção da arma de infantaria, a que sempre serão destinados, tão podendo comtudo servir efectivamente menos do com dias.

§ unico. Serão, nos mesmos termos, transferidos para a 2.º reserva os mancebos quo satisfizerem as seguintes condições:

l.ª Terem praticado regularmente o tiro ao alvo ora qualquer carreira militar durante tres annos, pelo menos, alcançando a classificado de atiradores de l.ª classe;

2.ª Satisfazerem a uma prova pratica perante um jury nomeado pelo commandante da brigada a que a carreira de tiro pertencer. Esta prova será dispensada aos mancebos que, em concurso do tiro nacional, alcançarem a primeira classificação.

Art 4.° Todos os mancebos que, até 31 de dezembro, já tiverem completado dezanove annos de idade e que ainda não tenham sido recenseados, serão obrigados a participar no mês do janeiro, á commissão do recenseamento correspondente ao concelho ou bairro em que legalmente se achem domiciliados, que estão nas condições de ser inscriptos no recenseamento militar. Igual participação será feita pelos pães ou tutores a respeito de seus filhos ou tutelados que se encontrem naquellas condições. A commissão do recenseamento é obrigada a recensear os referidos mancebos o a entregar aos interessados um certificado que lhes sirva de documento com que possam provar o cumprimento d'esta disposição.

§ 1.° Aos individuos que faltarem ao cumprimento do disposto neste artigo será imposta, em processo correccional, a pena de multa de 20$000 réis a 50$000 réis.

§ 2.° Os parochos, durante os meses de dezembro e janeiro, farão saber aos seus parochianos, por occasião da missa, que lhos assiste esta obrigação.

Art. 5.° Não será admitida aos mancebos, como justificação do falta nos preceitos da lei de recrutamento, a allegação de que ignoravam a sua inscripção no recenseamento.

Art. 6.° Para os serviços da inspecção sanitaria doa mancebos recenseados, do sorteio e da revisão dos documentos que serviram do base á organização do recenseamento, haverá em cada districto de recrutamento e reserva uma junta de recrutamento composta do commandante do districto, do tenente do mesmo districto, e de um capitão do regimento activo correspondente. Para consultar sobre a aptidão physica dos mancebos, ser-lhe-ha adjunto, como perito, um dos medicos do referido regimento, e, para o serviço do escripturação, ajunta será acompanhada por um sargento do districto do recrutamento e reserva.

§ l.º A junta de recrutamento exerce as suas funcções percorrendo successivamente os concelhos pertencentes ao districto de recrutamento, começando por solicitar dos parochos das freguesias, administrador do concelho e secretario da commissão do recenseamento as informações de que careça, para conhecer o modo como foi organizado o recenseamento, seguindo-se a inspecção sanitaria, e por fim o sorteio.

§ 2.º Os membros da junta de recrutamento e o medico adjunto terão os vencimentos marcados no artigo 83.° do regulamento do 6 do agosto de 1890, desde o dia em que começarem os seus trabalhos até áquelle em que os terminarem, exceptuando somente o tempo em que funccionarem na localidade da sua, residencia. Estes vencimentos poderão ser recebidos por adiantamento mensal e não serão abonados por mais de quatro mezes era cada anno. O sargento vencerá, nos mesmos termos, n gratificação diaria de 500 réis.

Art. 7.° O commandante do districto de recrutamento e reserva é competente:

1.° Para incluir no livro do recrutamento, mediante proposta motivada, remettida ao ministerio da guerra pelas vias competentes, todos os mancebos que, por qualquer causa, deixaram de ser inscriptos no livro do recenseamento, communicando depois o facto á commissão respectiva, que os recenseará;

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2.° Para eliminar do livro do recrutamento os individuos indevidamente recenseados, procedendo semelhantemente ao disposto no numero anterior;

3.º Para, quando o julgar conveniente, ou quando lhe for ordenado superiormente, solicitar directamente dos administradores do concelho, parochos, regedores, chefes dos departamentos maritimos e directores de hospitaes, asylos, misericordias e outros estabelecimentos similhantes, copia das relações que, para se organizar o recenseamento militar, tenham enviado ás commissões de recenseamento;

4.° Para chamar á sede do concelho em que residam, a fim de serem ouvidas por elles proprios ou por delegados seus, nos termos e com a sancção estabelecida na legislação geral do reino para os tribunaes judiciaes, quaesquer pessoas, a fim de lhes solicitar informações sobre assumpto de recrutamento militar, que as referidas pessoas são obrigadas a prestar debaixo de juramento. Esta faculdade poderá ser delegada em qualquer official do exercito, que transmittirá as informações, reduzidas a auto.

Art. 8.° Os mancebos que não comparecerem perante a junta de recrutamento, para serem inspeccionados, serão incorporados nas unidades activas ou de reserva, conforme o serviço que lhes pertencer, independentemente de inspecção, salvo se tiverem lesão consideravel, como cegueira completa de um ou de ambos os olhos, perda de mão ou pé, perda consideravel de qualquer dos labios, perda de uma parte consideravel do nariz, escorbuto, tumores malignos bem visiveis, ulceras de mau caracter, estrabismo permanente muito pronunciado, mudez, lepra, nanismo, gigantismo, gibosidade pronunciada, ou se apresentarem certidão authentica de terem sido tratados de psychoses graves nos hospitaes de alienados do pais, o que tudo será apreciado pela junta regimental, ou pela junta hospitalar, quando for necessária observação que aquella não possa fazer.

Art. 9.° Ás juntas de recrutamento tomarão alguma das seguintes resoluções com relação á aptidão physica dos mancebos:

Apurados:

Defintivamente.

Condicionalmente.

Isentos:

Definitivamente.

Temporariamente.

§ 1.° Nenhuma praça do activo pode ter baixa por incapacidade physica nos primeiros seis meses de incorporação na unidade activa e sem estar prompta da instrucção, salvo caso de lesão ou deformidade consideravel que absolutamente impossibilite de trabalho ou faça correr risco á collectividade.

§ 2.° Semelhantemente se procederá com relação ás praças da 2.º reserva no primeiro anno de alistamento.

Art. 10.° Os mancebos que se acharem em estado de anemia e de fraqueza geral, os que tiverem menos de l centimetro da altura exigida para o serviço activo e os que estiverem comprehendidos em condições pathologicas de natureza curavel, ou remediarei, não poderão ser isentos definitivamente senão depois de terem sido isentos temporariamente em tres annos consecutivos na época das inspecções, qualquer que seja a sua idade.

Art. 11.° Nenhum mancebo poderá ser isento temporariamente por mais de duas vezes, tomando a junta, na terceira inspecção, uma decisão definitiva.

art. 12.° Ás tabellas para uso das juntas de inspecção sanitaria aos mancebos recenseados, serão revistas de modo a tornar mais restrictas as condições de isenção do serviço militar e a eliminar as que são compatíveis com os serviços auxiliares do exercito em tempo de guerra.

Art. 13.° O commandante do districto do recrutamento e reserva recorrerá sempre que não se conformar com a decisão da junta, em materia da inspecção sanitaria.

§ unico. Poderão recorrer da referida decisão:

1.° Qualquer vogal da junta;

2.° O medico;

3.° O mancebo, somente quando o voto consultivo do medico divergir da opinião da junta.

Art. 14.° A reclamação contra o sorteio só pode ser feita por qualquer dos recenseados do mesmo anno e da mesma freguesia no proprio dia em que se realizar esta operação do recrutamento.

Art. 15.° Os mancebos que tenham de comparecer á junta de recrutamento ou do recurso, quando a freguesia em que foram recenseados esteja a mais de 10 kilometros da sede do respectivo concelho, teem direito a 120 réis diarios abonados pelo recebedor do concelho, por conta do Ministerio da Guerra, e ao transporte em via ferrea, fluvial ou maritima que lhes possa aproveitar. Aquelle abono não pode ser feito no continente por mais de quatro dias, ida e volta.

Art. 16.° A incorporação do contingente effectuar-se-ha dentro de cinco dias.

§ unico. Os supplentes serão chamados em prazo muito curto e obrigados a preencher somente as vacaturas resultantes da falta de apresentação dos recrutas, supplentes ou não, a quem, pela ordem da numeração, caiba completar o contingente activo. A obrigação dos supplentes se apresentarem para o serviço activo só prescreve depois dos mancebos, completarem trinta annos de idade.

Art. 17.° É revogado o artigo 8.° do decreto de 23 de março de 1899.

Art. 18.° Serão reduzidos ao indispensavel os documentos exigidos aos mancebos para se alistarem como voluntarios.

Art. 19.° Os voluntarios não serão eliminados do recenseamento e só serão contados no contigente da sua freguesia quando, pelo numero do sorteio, lhes caiba a obrigação do serviço activo.

Art. 20.° A remissão a que se refere o n.° 1.° do artigo 133.° do regulamento de 6 de agosto de 1896, poderá ser paga em tres prestações semestraes. Ás praças com seis meses de serviço effectivo nas unidades activas do exercito ou da armada e promptas da instrucção podem remir-se por 60$000 réis, ou 100$000 réis sendo refractarios. São supprimidas as remissões a que se refere o n.° 3.° do artigo 133.° do regulamento de 6 de agosto de 1896.

Art. 21.° Serão notados como refractarios, pelos commandantes do districto de recrutamento e reserva, os recrutas que faltarem á apresentação nas unidades activas ou de reserva, conforme o destino que lhes competir, no prazo que, segundo a sua situação, lhes for marcado para a encorporação. Igualmente terão a nota de refractarios os supplentes que faltarem á apresentação nas unidades activas no prazo que lhes for marcado, e as praças que faltarem ao pagamento de alguma prestação de remissão no fim do semestre.

Art. 22.° Se o refractario a quem pertença o serviço activo não se apresentar no prazo de dez dias, a contar da data em que devia ser incorporado na unidade activa, o commandante do districto de recrutamento e reserva solicitará do agente do Ministerio Publico da comarca em que o refractario foi recenseado, que promova a execução nos bens d'este até á quantia de 300$000 réis, a qual dará entrada na respectiva Recebedoria e será considerada como remissão. Os agentes do Ministerio Publico participarão ao commandante do districto de recrutamento e reserva a entrada d'esta quantia na Recebedoria da comarca, logo que ella se effectue.

Art. 23.º O refractario que for julgado incapaz do serviço militar dentro de um anno, contado da data da encorporação na unidade activa do exercito ou da armada,

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não terá baixa sem que soffra a pena de trinta dias do prisão correccional, a qual poderá remir pelo pagamento de 50$000 réis.

Art. 24.° Os commandantes dos districtos de recrutamento e reserva requisitarão dos chefes superiores da policia civil, dos administradores dos concelhos, dos delegados do procurador regio e do chefe da policia do emigração clandestina, a captura dos refractarios, cumprindo a estas auctoridades satisfazer a requisição no mais curto praso possivel, e, quando estas diligencias forem infructiferas, poderão promover a sua captura por praças do qualquer corpo de tropa militarmente organizado, ainda que dependente do Ministerio estranho ao da Guerra.

Art. 25.° Os agentes policiaes o as praças de pret que capturarem qualquer refractario, terão direito á quarta parte do producto da execução a que ao refere o artigo 22.°, ou da remissão se o refractario se remir, recebendo o seu supplente, de outra quarta parte, quantia proporcional ao tempo que tiver servido no activo. Se o supplente for o captor, receberá tambem a parte que competia aos agentes policiaes. O refractario que prestar p serviço que pela ordem do sorteio lhe compete, terá direito a receber o remanescente do producto da execução.

Art. 26.º Os mancebos maiores de quatorze annos e as praças da 2.º reserva sujeitas a serem chamadas ao serviço activo como supplentes, não poderio sair para o estrangeiro sem que apresentem documento passado pelo commandante do districto de recrutamento e reserva, era que provem que se remiram antecipadamente por 150$000 réis, ou que se acham livres do serviço activo, ou quo, sendo praças da 2.ª reserva, já não estão sujeitas a ser chamadas como supplentes.

Art. 27.° Fica sendo unicamente da competencia dos juizes de direito: a decisão das reclamações sobre a nomeação dos vogaes da commissão de recenseamento, a execução nos bens dos refractarios e dos individuos a quo se refere o § unico do artigo 1.°, e a applicação das penas e multas de que trata o capitulo XIV do regulamento de 6 de agosto de 1896 e artigo 4.° d'este decreto. Todas as outras reclamações e petições sobre materia de recrutamento serão examinadas em cada circumscripção militar territorial por uma commissão de officiaes, que se denominará commissão militar de recrutamento, composta de tres membros, que apresentará a sua consulta por escrito ao commandante da respectiva circumscripção, a fim d'esta auctoridade, ouvido o auditor, se o julgar necessário, dar a sua resolução. Das decisões d'essa auctoridade ha recurso em ultima instancia para o Ministro da Guerra.

Art. 28.° Nas ilhas adjacentes será adoptado um regimen especial em materia de recrutamento, em harmonia com as condições geographicas e com o serviço do pessoal militar de guarnição nas mesmas ilhas.

Art. 29.° O regulamento do 6 de agosto de 1896 será revisto e alterado em harmonia com o presente decreto, e nelle serão marcados os prazos em que devem realizar-se as diversas operações do recrutamento.

Art. 30.° O tempo de serviço a que são obrigados os aprendizes de musica, de ferrador, corneteiro, tambor ou de clarim será augmentado de tres annos na 2.ª reserva.

Art. 31.º Todas as praças de pret, findo o tempo pelo qual são obrigadas a fazer parte da 2.ª reserva, permanecerão inscriptas nos registos do serviço militar até completarem quarenta e cinco annos de idade, simplesmente para, em caso de guerra, poderem ser utilizadas na defesa local, e som encargo algum era tempo de paz.

Art. 32.° Os mancebos que, á data d'este decreto, estiverem residindo em pois estrangeiro, poderão remir-se por 150$000 réis, sendo depois levantada a canção ou hypotheca áquelles que as prestaram.

Art. 33.° Aos recrutas autuados desertores de recrutamento, nos termos do artigo 107.º do regulamento de 6 do agosto de 1896, que não tiverem sido julgados, serão archivados os respectivos processos, sendo-lhes porem dada a qualificação de refractarios se a não tiverem já por terem faltado á junta districtal.

Art. 34.º As disposições d'este decreto são applicaveis aos mancebos de qualquer contingente com as restricções especialmente determinadas na legislação sobre recrutamento que não foram alteradas pelo presente decreto.

Art. 36.º Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das outras Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 19 de outubro de 1901 = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luis Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Senhor. - Na sessão da Camara dos Senhores Deputados do 15 de março do corrente anno foi apresentada á consideração do Parlamento uma proposta de lei pedindo auctorisação para applicar, do fundo das remissões de recrutas, as quantias absolutamente indispensaveis para acquisição de machinas e sua conveniente installação, a fim de que o Arsenal do Exercito pudesse não só produzir o municiamento das armas portateis e bocas de fogo, mas tambem, se as circumstancias o aconselharem, desenvolver e aperfeiçoar o fabrico da artilharia de campanha e demais artigos de material de guerra precisos para o serviço do exercito.

Os trabalhos parlamentares não permittirem que esta proposta fosse discutida, obtendo comtudo parecer favoravel da commissão do guerra da Camara dos Senhores Deputados, que num bom elaborado relatorio justifica cabalmente a necessidade de dotar o Arsenal do Exercito com uma. verba extraordinaria para estabelecer em condições convenientes as officinas d'este importante estabelecimento do Estado.

Impondo-se por todas as razões a urgente necessidade de se organizar a defesa do pais em bases solidas e seguras, cumpre aos poderes constituidos, como representantes da vontade nacional, empregar os meios indispensaveis para se tornar effectiva e efficaz essa defesa, e é indiscutivel que, sem material de guerra, tudo o que se fizesse seria improfícuo e inutil.

E como, infelizmente, as circumstancias do Thesouro não permittem prover aos melhoramentos necessarios pelas verbas orçamentaes, temos a subida honra de solicitar do Vossa Majestade a approvação do seguinte projecto de decreto.
Secretaria do Estado dos Negocios da Guerra, em 19 de outubro do 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que me representaram os Ministros e Secretarios de Estado das diferentes Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° E o Governo auctorizado a applicar, do fundo das remissões de recrutas do exercito, as quantias absolutamente indispensaveis para a acquisição e installação do machinas e ferramentas convenientes para aperfeiçoar e desenvolver o fabrico de artilharia de campanha e do municiamento, tanto do bocas de fogo como de armas portateis, e demais artigos de material de guerra que forem precisos para o serviço do exercito.

Art, 2.° Fico revogada a legislação em contrario,

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50 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Presidente do Conselho do Ministros, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das outras Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 19 de outubro de 1901. - REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Senhor. - Em 15 de março do corrente armo foi apresentada á consideração do Parlamento uma proposta de lei auctorisando o Governo a contratar a acquisição do armamento que falta para completar a organização defensiva do porto de Lisboa e de todo o necessario para a defesa do porto de Leixões e da cidade do Porto pelo lado de oeste, em conformidade dos respectivos projectos e pareceres da commissão das fortificações do reino, devendo a sua importancia ser paga pelo fundo das remissões de recrutas nos quatro primeiros annos economicos futuros.

Por falta de tempo não teve o Parlamento occasião para discutir essa proposta, apesar do ter obtido parecer favoravel da commissão do guerra da Camara dos Senhores Deputados.

E certo, porem, que devendo ser considerada como base indiscutivel da nossa autonomia politica a boa organização da defesa nacional, não deve por mais tempo preterir-se esta proposta, que o Governo reputa essencial para a honra do pais o integridade do seu territorio.

O projecto elaborado em 1805, destinado unicamente a collocar o porto de Lisboa ao abrigo do um golpe de mão tentado por um limitado numero de vasos de guerra, importa, ainda assim, numa verba consideravel que, pelas circumstancias do Thesouro, não pode figurar no orçamento das despesas geraes do Estado.

Por outro lado, embora a barra do Douro, de aliás difficil accesso, não permitta a entrada no rio a navios de grande lotação, a segunda cidade do reino está indefesa e ámercê de um bombardeamento, sem que de terra seja possivel incommodar, sequer, os navios que o tentarem.

Leixões, hoje um importante porto de abrigo e mais tardo, talvez, um importante porto commercial, que em todo o caso pode justamente ser considerado o verdadeiro porto da segunda cidade do reino, está nas mesmas condições, isto é, sem defesa.

Urge, portanto, e sem mais delongas, acudir ao presente estado de cousas, concluindo as obras já começadas da defesa do porto de Lisboa e completando o seu armamento, como tambem urge, executar as obras necessarias para a defesa de Leixões e da cidade do Porto, dotando-as com o conveniente armamento.

As despesas a fazer com estas obras de fortificação e com a acquisição do respectivo armamento tinham primitivamente sido distribuidas em parcellas iguaes e annuaes durante o periodo de quatro annos, mas, com o intuito de tornar mais suave esse pagamento e do dar margem ao mesmo tempo a poder acudir-se a outras despesas de interesse immediato, o que devem sair do mesmo fundo das remissões, propõe o Governo agora ao alto criterio de Vossa Majestade que se dilate o periodo de integral pagamento d'essas despesas, levando-o até junho de 1907.

Só recorrendo a este meio, que aliás não contraria o espirito da lei de 1896, é que se póde pôr em pratica o plano de defesa elaborado pela commissão das fortificações do reino e approvado pela commissão superior do guerra.

Convencido, pois, o Governo, por todas estas razões, da excepcional importancia que tem para a defesa do pais o projecto de decreto que submette á apreciação de Vossa Majestade, confiadamente solicita para elle a sua approvação.

Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, em 19 de outubro de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campas Henrique = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que Me representaram os Ministros e Secretarios do Estado das diferentes Repartições: Hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° E o Governo auctorizado a contratar a acquisição do armamento que falta para completar a organização defensiva do porto de Lisboa e de todo o necessario para a defesa do porto do Leixões e da cidade do Porto pelo lado do mar, em conformidade dos respectivos projectos c pareceres da commissão das fortificações do reino, devendo a importancia da compra ser paga pelo fundo das remissões do recrutas do exercito e ficar saldada no anno económico de 1906-1907.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das outras Repartições, assim o tenham entendido o façam executar. Paço, em 19 de outubro de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto - Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Senhor. - A carta de lei de 26 de julho de 1899, que criou a reforma por equiparação, representa indubitavelmente a introducção de um principio justo na nossa legislação militar; ha, porem, entre as suas disposições algumas que ao Governo de Vossa Majestade se afigura devorem ser modificadas do acordo com os princípios fixados na carta de lei de 12 de junho de 1901.

O primeiro dos citados diplomas estabeleceu a comparação de official para official, e, para os do mesmo anno, recorreu á classificação obtida pelos aluamos dos differentes cursos da Escola do Exercito, o que se não justifica, pois equivale a conferir direitos de prioridade baseados em elementos heterogeneos, como evidentemente são os valores obtidos em cursos de differente duração, com diversas disciplinas, frequentados por aluamos sem a mesma preparação scientifica e obtidos, por ultimo, em provas dadas em differentes annos e perante jurys diversos. Em boa logica, só ha atraso quando é promovido um official que pertença a um curso do anno immediato, e tanto assim é que, na redacção definitiva da base 17.ª da auctorização para a reorganização do exercito de 1899, se abandonou essa classificação escolar, que primitivamente fora tambem proposta como bom criterio para regular a antiguidade relativa dos coroneis na escala para o generalato.

A duração variavel dos cursos nas diversas organizações da Escola do Exercito explica e justifica o numero de annos differentes, contados depois dos officiaes terminarem os cursos das respectivas armas, para serem considerados tenentes, applicando-se por este modo a todos os officiaes, no acto da passagem á reserva ou reforma, o principio fundamental da lei do promoções.

Um outro principio nos pareceu justo introduzir no presente diploma: o de contar ao official, para a equiparação, o tempo de serviço militar do mesmo modo que lhe ó contado para a reforma ordinaria ou extraordinaria.

Sendo a passagem á reserva ou reforma uma recompensa concedida pelos serviços prestados ao país, não se comprehende que outro deva ser o criterio adoptado.

Convictos de que, com as alterações indicadas, o presente projecto de decreto aperfeiçoa a lei da equiparação, corrige o que nella se pode considerar menos justo,

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e produz evidente economia para o Thesouro, confiadamente o submettemos á approvação de Vossa Majestade. Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, em 19 de outubro de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henrique = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimenta Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que me representaram os Ministros e Secretarios de Estado das differentes Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° Para compensar as desigualdades do promoção que existam entre os officiaes do exercito, será concedida a passagem á reserva ou reforma por equiparação a todos os officiaes combatentes o não combatentes, sendo lhes liquidada como se tivessem o mesmo posto que os calcines mais adeantados que sejam considerados tenentes de um anno civil posterior, nos termos dos artigos seguintes.

Art. 2.° Para a passagem á reserva ou reforma por equiparação, os officiaes serão considerados como tendo o posto de tenente do anno fixado em harmonia com as seguintes regras:

1.º Os officiaes do extincto corpo do estado maior, dois annos depois d'aquelle em que terminaram o respectivo curso.

2.º Os officiaes do engenharia habilitados com os cursos estabelecidos nas organizações da Escola do Exercito do 12 de janeiro de 1837, 24 de dezembro de 1863, 23 do agosto de 1894 e organizações posteriores, um anno depois d'aquelle. em que completaram o respectivo curso; os habilitados com os cursos estabelecidos nas organizações de 38 de outubro de 1891 e 30 de outubro de 1892, dois annos depois d'aquelle em que o terminaram.

3.ª Os officiaes de artilharia habilitados com os cursos estabelecidos nas organizações da Escola do Exercito de 24 do dezembro de 1863, 28 de outubro do 1891 e 30 de outubro de 1892, tres annos depois d'aquelle em que completaram o respectivo curso; os habilitados com os cursos estabelecidos nas organizações do 12 de janeiro do 1837, 23 de agosto de 1894 e organizações subsequentes, dois annos depois d'aquelle em que o terminaram.

4.º Os officiaes de cavallaria e infantaria habilitados cora os cursos da Escola do Exercito estabelecidos nas diversas organizações da dita escola até á do 28 de outubro de 1891, inclusive, seis annos depois d'aquelle em que completaram o repectivo curso; os habilitados com o curso estabelecido na organização de 30 de outubro de 1892 e organizações posteriores, cinco annos depois d'aquelle em que o terminaram.

5.º Os officiaes do extincto corpo do estudo maior e das armas de engenharia e artilharia que foram promovidos a alferes nas armas do cavallaria ou infantaria, por primeiro se habilitarem com os cursos d'estas armas, sento considerados tenentes da data em que o seriam, nos termos do numero anterior, se não houvessem mudado de arma. Estes officiaes não dito direito a equiparação.

6.º Os officiaes de cavallaria e infantaria, provenientes da classe de sargentos, serão considerados tenentes com o mesmo numero de annos do permanência, no posto de alferes que os officiaes da mesma arma" habilitados com o respectivo curso, que lhos estejam immediatamente a direita.

7.ª Os medicos e pharmaceuticos serão considerados tenentes do anno em que lhes foi conferido o respectivo posto.

.º Os restantes officiaes não combatentes, promovidos a alferes anteriormente a 12 de junho do 1901, serão considerados tenentes com o mesmo numero de annos de permanencia no posto de alferes que os officiaes do infantaria, cuja antiguidade do referido posto seja immediatamente superior a que tiverem os ditos officiaes não combatentes.

Os officiaes de que trata este numero, promovidos a alferes posteriormente a 12 de junho do 190], serão considerados tenentes do anno em que forem promovidos a este posto, em conformidade do disposto no artigo 56.° da carta de lei d'esta data.

9.º Os officiaes, combatentes ou não combatentes, cuja situação na respectiva escala tenha, por qualquer causa, sido alterada, serão considerados tenentes da mesma data que o official da sua arma ou serviço que lhes ficar immediatamente á direita depois da sua nova collocação na escala.

Art. 3.° No acto da passagem A reserva ou reforma ordinaria ou extraordinaria, qualquer official pode optar pelas vantagens que lho pertencerem, em conformidade com a corta de lei de 22 de agosto do 1887, ou pelas da equiparação, obtendo, neste caso, as vantagens da reforma ordinaria ou extraordinaria que, em relação ao posto, segundo a mesma carta de lei, podem ser concedidas no official combatente de qualquer arma ou serviço mais adoentado na promoção, e que seja considerado tenente de um anno posterior, segundo aã regras fixadas no artigo 2.°

§ 1.° A equiparação não poderá conceder vantagens superiores áquellas que o official podo obter pela reforma ordinaria no posto de maior graduação do quadro a que pertencer.

§ 2.° O official que, na occasião de ser chamado a dar as provas de competencia profissional exigidas para a promoção ao posto immediato, desistir do as dar, não pode aproveitar as vantagens da equiparação alem da data da desistencia.

§ 3.° A contagem do tempo de serviço para a equiparação far-se-ha do mesmo modo quo para a reforma ordinaria ou extraordinaria.

Art. 4.° Para occorrer ao augmento de despesa proveniente da applicação do principio da equiparação, o desconto de 2 por cento estabelecido polo artigo 13.º da carta de lei de 22 do agosto de 1887 será applicavel a todos os officiaes que se aproveitarem das vantagens da equiparação.

Art. 5.° Será annualmente incluida no orçamento do Ministerio da Guerra uma verba destinada para o pagamento da differença do vencimentos entre a reforma ordinaria ou extraordinaria o a de equiparação, que competir aos officiaes que optarem por esta ultima.

§ unico. Quando a verba inscripta no orçamento for despendida na totalidade, só poderá ser concedida a reforma ordinaria ou extraordinaria; mas, dentro dos limites da mesma verba, poderão ter passagem d'esta situação á de reserva ou reforma por equiparação os officiaes que, ao mudarem da situação, hajam optado pela equiparação, sendo as passagens concedidas pela ordem da antiguidade da data da referida mudança.

Art. 6.° No Almanach do Exercito mencionar-se-ha, para cada official, o anno de quo ó considerado tenente para os effeitos da equiparação.

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho do Ministros, Ministro o Secretario do Estado dos Negocios do Reino, o os Ministros o Secretarios de Estado das outras Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 19 de outubro de 1901.= REI.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luis Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Senhor. - A proposta do lei que era março do corrente, anno foi apresentada no Parlamento, relativa á auctoriza-

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ção pedida pelo Governo para rever e modificar o decreto com força de lei de 7 do setembro do 1899, teve a approvação da commissão de guerra da Camara dos Senhores Deputados.

Não era intuito do Governo, como facilmente se deprehende da leitura da referida proposta de lei, tentar uma nova reorganização do exercito, de modo que do existente tudo fosse alterado o modificado. Tambem essa não é hoje a sua intenção.

Pelo contrario, o Governo entende que em questões technicas e da mais alta gravidade, como todas as que dizem respeito ao exercito, se torna indispensavel que haja espirito de sequência; e, portanto, outro pensamento não poderia haver que não fosse o de modificar apenas aquellas diposições que a experiencia mostrou já não corresponderem ao criterio que as inspirou, introduzindo no citado decreto de 7 de setembro disposições tendentes a dar satisfação ás indicações dos commandos superiores e chefes dos differentes serviços militares, ás reclamações justas dos povos, aos principios da moderna sciencia da guerra e aos ensinamentos da historia.

E porque o Governo está convencido da importancia e opportunidade d'este projecto de decreto, que fortalecerá o exercito, tanto na sua organização como na parte essencial da sua instrucção profissional, sem aggravar o Thesouro Publico, razão de sobra tem para solicitar a sua approvação, certo de que por este modo cumpre um dever civico, indeclinavel perante o Rei e perante o pais.

Se fosse possivel, razoavelmente, pedir mais recursos ao Thesouro para dotar convenientemente o Orçamento do Estado no respeitante aos negocios da guerra, outra por certo seria a orientação do Governo, e mais largas e amplas seriam as propostas que submetteria á alta apreciação de Vossa Majestade. Forçoso é, porem, resolver o problema dentro da estreiteza imposta pelas circumstancias actuaes, o que por sem duvida difficulta e complica a solução.

Ainda assim, crê o Governo que todo o funccionamento do exercito, e ainda a sua constituição organica, muito hão de lucrar com o seguinte projecto de decreto, se elle merecer a approvação de Vossa Majestade.

Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra, em 19 de outubro de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que me representaram os Ministros e Secretarios de Estado das diversas Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° É o Governo auctorizado a rever e a modificar o decreto com força de lei de 7 de setembro de 1899 de accordo com as exigencias da defesa nacional, e dando conta ás Côrtes do uso que fizer d'esta auctorização.

§ 1.° Nesta auctorização comprehende-se a faculdade concedida ao Governo de:

a) Alterar a divisão militar do pais, pondo-a mais de harmonia com as conveniências do exercito e com os interesses dos povos;

b) Agrupar mais convenientemente as unidades das differentes armas do exercito activo;

c) Melhorar a organização das reservas e facilitar o recrutamento dos respectivos quadros;

d) Criar para cada uma das armas uma direcção superior com attribuições especiaes;

e) Separar o serviço dos torpedos moveis do dos torpedos fixos, passando este para o Ministerio da Guerra;

f) Aperfeiçoar os serviços do estado maior, de saude e os de administração militar;

g) Modificar algumas das disposições relativas á situação militar dos officiaes empregados em commissões não dependentes do Ministerio da Guerra;

h) Desenvolver no país a instrucção do tiro;

i) Assegurar em melhores condições a remonta para os corpos e officiaes montados.

§ 2.° A auctorização, concedida ao Governo por este artigo, é limitada pela condição de não ser excedida a despesa votada para o Ministerio da Guerra no anno economico de 1901-1902, accrescida da que o orçamento do Ministerio da Marinha consigne para o serviço de torpedos fixos.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das outras Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 19 de outubro de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = António Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.º 7.

I

Senhor. - Os projectos de decretos que temos a honra de submetter á apreciação de Vossa Majestade visam a beneficiação economica da provincia de Angola e das relações d'ella com a metropole. São providencias instantemente reclamadas, e quanto o Governo da metropole deve e pode fazer para evitar o estacionamento economico, ou ainda para impedir que aquella provincia - promessa de um grande império colonial - illuda as nossas fagueiras esperanças, voltando ao estado em que se encontrava antes de 1890. É, porem, justo que se diga que não deriva de má vontade ou de erros praticados na metropole a necessidade da intervenção ostensiva de hoje; bem pelo contrario, da acção doa governos centraes resultou, na sua maior parte, o progredimento economico de Angola, o intenso desenvolvimento das suas relações economicas com a metropole, o caminhar accelerado de algumas industrias do reino.

Examinando as estatisticas publicadas, vê-se que o movimento geral do commercio na provincia de Angola se desenvolve notavelmente a partir de 1893. Emquanto que nos annos de 1890,1891 e 1892 foi no valor approximado de 9.000:000$000 réis, em 1893 foi de 12.405:784$000 réis, attingindo 16.147:000$000 réis em 1899. Para demonstrar que no consideravel incremento do commercio gorai de Angola tomaram parte as industrias da metropole, basta referir os algarismos que representam os valores de tecidos de algodão, importados na provincia. Emquanto que os tecidos de algodão crus e branqueados, de procedência nacional, importados pelas alfândegas de Angola foram no valor de 3:012$000 réis em 1890, em 1893 já chegaram á cifra de 124:2875000 réis, para attingirem 630:608$000 réis em 1898.
Os tecidos tintos ou estampados passaram de 29:638$000 réis, valor de 1890, para 1.597:004$000 réis, valor de 1898.

Tão notavel foi o impulso dado á industria algodoeira, que ella obteve consideraveis lucros, tendo como consequencia um grande incitamento ao augmento da producção, sem, todavia, se estudar cuidadosamente até aonde podia ira capacidade consumidora dos mercados.

O regime proteccionista adoptado nas alfandegas do reino para as nossas industrias, se os productos d'ellas ficassem confinados dentro dos limites de Portugal no velho continente, não teria sensivel influencia no seu desenvolvimento. Foi a pauta de 16 de abril de 1892 que lhes abriu as portas das nossas colonias e que os levou á prosperi-

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dade que accusavam em fins de 1899, e que se manteria se a criação do novas fabricas e o desenvolvimento das antigas fossem cuidados com prudente criterio, E não pequeno sacrificio fez o Thesouro pura fomentar o desenvolvimento industrial, pois pode computar-se era quantia não inferior a 400:000$000 réis o prejuizo que, em onda uni dos annos desde a vigencia da pauta de 1892, tem havido no rendimento das alfandegas de Angola.

Ha, por isso, hoje a corrigir, não erros ou faltas praticadas poios governos centraes, mas as consequencias da imprudente orientação por vezes tomada poios directamente interessados na prosperidade da provincia.

Examinemos em primeiro lagar a actual situação economica de Angola, e indaguemos se uma crise gravo, de caracter permanente, a affecta, ou se, na verdade, se trata de um incidente economico, do caracter transitorio, embora do moldo a receber correctivo que possa reduzir-lhe a duração pois que nem convirá esconder a crise, se ella é grave, nem exagerar o incidente economico. O exagero poderia entibiar a acção doa que se propõem a emprehendimentos quo tenham relação com Angola, levar o desanimo aos que nelles estão já empenhados, e ainda determinar providencias que, sem serem absolutamente necessarias, poderiam affectar mais as nuanças do Thesouro e prejudicar a realizado de melhoramentos materiaes da mais incontestada utilidade.

Ha difficuldades economicas na provincia de Angola e nas industrias da metropole que com ella teem relação? Sem duvida. Uma grave o perigosa crise affecta aquella provinda? Não.

Em Africa ha, crises commerciaes quasi periodicas, devidas a causas nem sempre faceis de apreciar. Num anno o commercio afflue a determinado ponto, assumindo consideravel desenvolvimento todas as transacções, e no anno immediato toma rumo diverso, e a prosperidade commercial é substituida por notavel afrouxamento, que arruinará os commerciantes se elles não estão prevenidos contra a possibilidade do desvio. Deu-nos Loanda, não ha muitos annos, um exemplo das contingencias do commercio com os indigenas. De Loanda chegaram a exportar-se 1.415:932 kilogrammas de borracha, para em 1886 a exportação ser do 883:234 kilogrammas, e 283:395 em 1888,

Mas a borracha retomou, a partir de 1888, o antigo logar na escala da exportação, sem que o ruidoso alarme produzido fizesse com que a crise deixasse do ser resolvida petos leis economicas, que são, em ultima analyse, as que resolvem as crises d'esta natureza.

Como em 1888, as difficuldades economicas accentuam-se agora no districto de Benguella, pela queda na exportação da borracha, duvida a causas que, por serem inter-correntes, tiram aos seus effeitos o caracter do permanencia. Ao dizermos isto não queremos significar que não haja necessidade do adoptar medidas que evitem uma crise economica, e essa seria o do larga duração.

Procuremos determinar o facto economico que embaraça a provincia, começando por apreciar os elementos estatisticos que traduzem o movimento commercial do Angola, não comprehendendo o districto do Congo:

Annos Contos de réis

1895 8:903

1896 8:064

1897 11:473

1898 11:907

1899 14:620

1900 12:441

Pelo quadro precedente só vê:

a) Que o movimento commercial cresceu consideravelmente até 1899;

b) Que em 1899 para 1000 revê uma queda no valor e 2:079 contos.

Para maior clareza da exposição vão em seguida quadro estatistico, de que o anterior é o resumo:

Importação, exportação e respectivos direitos nas alfandegas de Loanda, Benguella, Mossamedes e Ambriz, nos annos de 1895 a 1900

[Ver Tabela na imagem]

Annos Alfandegas Importação (Valores) (Direitos) Exportação (Valores) (Direitos)

Vejamos como se pode saber se o movimento commercial da provincia mantem a baixa do 1900, ou se, pelo contrario, retomou a escala ascencional. Não são conhecidos ainda os elementos estatisticos que representam os valores commerciaes importados e exportados pelas quatro alfandegas acima referidas no primeiro semestre do anno corrente, mas são conhecidos os rendimentos que estas produziram ato 30 de junho.

Annos Valores commerciaes (Contos) Rendimentos das alfandegas (Contos de réis)

1898 11:907 1:030

1899 14:520 1:140

1900 12:441 908

Rendimento das quatro alfandegas, de janeiro a 30 de junho do 1901 (excluido o alcool) 539

Calculando o segundo semestre com igual rendimento, anno de 1901 1:078

Adoptando esta previsão como approximada da verdade, vê-se:

l.° Que o rendimento das alfandegas excederá em 48 contos de réis o quo produziram no anno de 1898, em 170 contos de réis o que produziram em 1900, o ainda em 52 contos do réis a media do rendimento dos tres ultimos annos;

2.º Que os valores commerciaes correspondentes ao rendimento das alfandegas no anno corrente se approximarão do 1898 pontos de réis, tomando 12:956 contos de réis para media dos valores commerciaes dos tres ultimos annos. A media será excedida, e com excepção de uma pequena diminuição com relação ao anno de 1899, os valores commerciaes excederão os de 1888 o 1900.

O movimento commercial mantem-se, pois, na escala ascencional; o valor quo representa o movimento commercial do 1899 prendo com a maior exportação da borracha, que em 1899 foi no poso de 2.802:876 kilogrammas, com

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o valor de 5:235 coutos de réis, para em 1900 descer a 1.995:934 kilogrammas com o valor do 3:604 contos de réis, como se vê do quadro seguinte:

Borracha exportada de Luanda, Benguella, Mossamedes e Ambriz, em 1895, 1896, 1897, 1898, 1899 e 1900

[ver tabela na imagem]
Annos Precedencia Quantidades - Kilogrammas Total - Kilogrammas Valor EM Lisboa - Contos Total - Contos

(c) Mossamedes o Ambriz não figuram nas estatisticas até 1898.

Onde se tem dado as dificuldades economicas? Manifestamente no districto de Benguella, como se infere da apreciação dos seguintes elementos estatisticos:

Importação Exportação Total

Contos de réis Contos do réis Contos de réis

1898 3:429 4:042 7:471

1899 2:918 3:987 6:925

1900 2:612 2:515 4:127

Como se vê, de 1899 para 1900, o movimento commercial total de Benguella diminuiu na importancia do 2:798 contos de réis, o que inclue 1:472 contos de réis do diminuição nos valores da exportação.

É o que corresponde approximadamente á queda no valor representativo da borracha exportada de Benguella, do 1899 para 1900:

Quantidades Valores

Kilogrammas Contos de réis

1899 1.882:000 3:570

1900 1.184:000 2:241

Para menos em 1900 698:000 1:329

D'esta maneira se chega ás seguintes conclusões:

l.ª Que não ha crise geral em Angola;

2.ª Que as difficuldades economicas se dão em Benguella, como consequencia da queda na exportação da borracha.

Resta saber se essa queda obedece a causas permanentes, que tornem permanentes os seus effeitos, ou se é devida a causas fortuitas do duração passageira, vista a differença consideravel sob o ponto de vista economico, de umas para as outras.

Não é indifferente para apreciar a questão o conhecer-se as quantidades da borracha exportada de Benguella nos ultimos seis annos, e o valor attribuido:

Quantidades Valor total Valor

Kilogrammas Contos de réis do Kilogramma

1895 1.350:357 11:660 1$230

1896 1536:558 2:120 1$380

1897 l.703:025 2:385 1$400

1898 2.250:000 4:956 2$200

1899 1.882:000 3:570 1$890

1900 1.184:000 2:241 1$892

Do valor (attribuido em Lisboa) de l £400 réis por cada kilogramma passou a 2$200 réis, o que fez subir a exportação de 1.703:695 kilogrammas para 2.250:000 kilogrammas, e o valor total de 2:385 contos de réis para 4:956 contos de réis.

Do augmento da quantidade não podia resultar a elevação de preço; mas a inversa é inteiramente exacta. A subida do preço da borracha, e por maneira tão insolita, trouxe como consequência a sua excepcional affluencia ao mercado, por maneira a attingir os valores que figuram na exportação referida aos annos de 1898 e 1899; e, como a borracha era trocada por mercadorias offerecidas pelos commerciantes, evidente se torna que o consumo das mercadorias de permuta, entre as quaes figuram os algodões em primeira linha, havia de augmentar, como augmentou com effeito.

Não se manteve a alta da borracha; desceu para baixo de 1$500 réis, até ao ponto de os commerciantes de Benguella, no começo do anno corrente, resolverem em cominam não a comprar por preço excedente a 1$000 réis. O valor attribuido á borracha em Lisboa, 10892 réis por kilogramma, e que figura no quadro que acima fica como sendo o preço de venda em 1900, é o da borracha de l.ª qualidade, quo é em pequena quantidade, e é com este valor que os commerciantes não concordam e contra o qual teem reclamado, polo motivo do servir de base ao imposto de exportação.

Da consideravel alta resultou:

l.° Os indigenas baterem o mato á procura da borracha, trazerem-na ao litoral em maior quantidade, recolhendo com generos obtidos em troca em quantidade superior ás suas necessidades, como consequencia da maior venda e do maior preço. E por costume, o indigena em quanto tiver os generos de que precisa não são do mato. É uma verdade por todos reconhecida.

2.° Os indigenas habituados aos grandes preços que a borracha teve em 1898 o 1899, quando lhes offerecem preços muito inferiores julgam-se ludibriados, e, por isso, não trazem o genero á venda. Mais de uma vez tem acontecido nos ultimos tempos, caravanas de indigenas com borracha para permuta chegarem ás portas de Benguella, o voltarem com ella para o interior pela razão de lhes não servirem os preços.

Assim se explica a diminuição na exportação da borracha, que não pode ser permanente. E as informações, dia a dia recebidas no Ministerio da Marinha, mostram quo a borracha está chegando em larga escala ao litoral, e que, no interior, ha importantes depositos esperando a alta.

O que representaria difficuldade grave, por ser de caracter permanente, era a deslocação do commercio da borracha para pais estrangeiro, o mais de uma vez se tem affirmado que ella tem logar para o Estado Independente do Congo, achando-se nisso a explicação para a falta de borracha em Benguella. Não é exacto, e é preciso que essa correcção se faça. O commercio que ordinariamente vem aos centros de Angola, não deriva para o Congo. As difficuldades de navegação do Cuango o Cassai, os trasbordos que deviam ter logar, as desposas do transporte até Matadi, obstam á sua derivação.

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Alem d'isso, no" mercados do Congo os pretos não encontram aguardentes nem a qual, segundo os commerciantes de Angola, se não podo fazer negocio. É o que a priori se deve concluir, e o que os factos confirmam. É da Lunda, das proximidades do Congo, que tem vindo quasi toda a borracha chegada nos ultimos meses a Benguella. Esto facto, que é indiscutível, afasta quaesquer duvidas.

Não quer isto dizer que não haja necessidade do facilitar a penetração no interior, a chegada aos centrem de commercio indigenas; bem pelo contrario, tudo aconselha a quo assim se proceda, e o Governo, activando a construcção do caminho do ferro de Benguella para rapidamente chegar com elle, pelo menos, á Cacenda, mostra, não só o seu empenho em promover o progresso material da provincia do Angola, mas ainda quo comprehendo a vantagem e a urgencia do chegar depressa ao interior.

Do que fica exposto devo concluir-se que o commercio da borracha esta a attingir n normalidade, não devendo, porem, esperar-se que rapidamente chegue á importância que teve em 1808 o 1809, a não ser que nova alta tenha logar, ao contrario do que é dado prever. O que é indispensavel, e d'isso trataremos separadamente, é proteger o indigena que vem ao litoral com artigos do commercio, o que, infelizmente, nem sempre tem acontecido.

Cremos haver demonstrado quo a alta quo n borracha teve em 1898 o 1899 justifica as dificuldades economicas do Benguella. Não houve a providencia precisa. Os commerciantes fizeram consideraveis lucros, é certo; mas, sua imprevidencia os prejudicou dopais. Não seguiram exemplo do Congo, onde não subiram o preço do compra da borracha ao indigena, motivo por quo ali se não fizeram sentir as difficuldades do Benguella; polo contrario os negociantes disputavam em especies do leilão, as cargas de borracha que o indigena trazia ao mercado, quando um momento do reflexão bastaria para se convencerem de quo cavavam a mina do commercio que li casso o durante alguns annos.

A imprevidencia de Benguella foi mais alem. Todos queriam estar habilitados para largas transacções; todos queriam ter os seus armazens replectos de mercadorias para permuta, pensando que a alta da borracha se manteria o que os indigenas continuariam a descer ao litoral em numerosas caravanas. Em Angola os negociantes enchiam os armazens, faziam grandes encommendas; na metropole, os fabricantes, para dar vasão ás encommendas feitas e para estarem preparados para novos pedidos, augmentavam a producção, augmentavam as fabricas, novas fabricas ao montavam. A borracha desceu de preço, como consequencia faltou no mercado do Angola, e o resultado foi: dificuldades em Africa resultantes dos seus exagera dos abastecimentos, do algodões sobretudo, que tinham de pagar o que não vendiam; na metropole difficuldades resultantes da falta do encommendas do Africa.

O seguinte quadro, indicativo do valor da importação de tecidos do algodão na provincia do Angola (exceptuado o Congo), nos annos de 1899 e 1900, é bom expressivo:

1899 1900

Ambriz 1:445$742 4:139$998

Loanda 723:238$700 787:890$100

Benguella 726:009$700 1.109:046$020

Mossamedes 30:774$000 82:418$700

otal l .501:468$142 22.043:493$818

Benguella, em 1900, importou tecidos de algodão em tal quantidade, que excedeu a importação do 1899 em 443:535$320 réis!

Fazia-se esta importação quando a borracha já havia descido de preço e quando o retrahimento do indigena já era manifesto! E assim os negociantes viram os seus armazens replectos de mercadorias, com pequena saida, e os fabricantes da metropole as suas fabricas sem encommendas que correspondam ao desenvolvimento que lhes deram, porque uns e outros foram imprevidentes, não querendo medir o apreciar o alcance dos lucros de occasião. Algumas fabricas algodoeiras adquiriram tal expansão que se podem laborar em cheio, o que a situação do mercado de Benguella já não comporta, o cremos bem até que tão depressa não terão consumo para a sua laboração em cheio, tão grande é a sua producção. E, todavia, melhor caminho teriam seguido se, adoptando novos processos, fabricassem tecidos de algodão para estampagem, com o quo, beneficiando-se a si proprias, grande serviço prestariam ao pais, evitando a compra d'elles no estrangeiro.

Se considerarmos os valores respectivos dos tecidos de algodão destinados á estampagem, desde logo se abrange a conveniencia da sua fabricação no reino, o quo melhoraria a situação dão fabricas e evitaria a saída do ouro:

Annos Sarjas e crepes ... sem reparo preparo para estampar Sarjas e eropes branqueador para estampar Total

1899 120:975$000 156:978$000 277:953$000

1900 119:483$000 172:186$000 291:669$000

Não vale o argumento de quo estes tecidos"de algodão, importados do estrangeiro, estão favorecidos com o drawback auctorizado pelo decreto de 27 do maio de 1868, não podendo por isso as fabricas do reino lutar com tal beneficio concedido aos tecidos estrangeiros. Reconhece-se que é inconveniente o drawback contra productos similares do reino, o que, quando fossem produzidos na quantidade precisa, não devia manter-se; mas a verdade é que não são senão incipientemente fabricados, e a falta d'elles, pela abolição do drawback annullaria uma parte importantissima da nossa exportação para as colonias, abrindo nestas as portas á importação estrangeira.

Não regateamos uma palavra do elogio nem aos industriaes do reino, nem aos negociantes de Angela. Uns o outros teem trabalhado com vigor, toem dado desenvolvimento ao commercio português, embora, com prejuizo proprio, se tenham enganado nas suas provisões.

O que deixamos dito visa á demonstração de quo as difficuldades economicas da provincia do Angola são do caracter passageiro, por maneira que nenhuma actividade deve affrouxar, nenhuma energia deve esmorecer.

Reconhece, todavia, o Governo quo algumas providencias devem ser adoptadas para promover a prosperidade crescente da província e para evitar que a imprevidencia torne em gravo e permanente o que ato agora tem sido apenas passageiro e leve nos seus officios.

II

Consideremos agora o problema do algodão colonial.

Importação do algodão, em rama e caroço no continente do reino

Annos Kilogrammas Valor

1899 15.673:104 3.485:926$000
1900 15.944:627 4.475:926$000

Lançando os olhos sobro os dados estatisticos que ahi ficam não será legitimo perguntar se Portugal, no seu vastissimo domínio colonial, não poderá produzir o algodão que tão quantiosas sommas desvia para o estrangeiro?

Trata-se, pois, de saber se a cultura do algodão se pode desenvolver na provincia do Angola, se essa cultura pode constituir um valioso recurso, só o Estado a devo auxiliar e proteger, e se esse auxilio e protecção deve visar apenas a producção e a exportação ou ir até ás primeiras transformações do casulo ou caroço. É importante sabê-lo, pois é bastante conveniente que a província de Angola se

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não mantenha quasi exclusivamente adstricta á cultura da canna saccharina.

Não é esta uma questão nova; vem desde longo tempo sendo debatida. Ás opiniões mais auctorizadas e competentes foram sempre favoraveis á cultura do algodão em Angola, e nenhuma duvida pode restar de que ao districto de Mossamedes ella é particularmente apropriada.

Lopes de Lima, citando um relatorio do coronel Fortunato de Mello, dizia na sua Estatística: "O algodão de Angola é do tão boa qualidade como o melhor do Brasil, dando-se em todo o terreno e com particularidade nas proximidades do mar, não exigindo trabalho algum alem da sementeira no primeiro anno e da colheita em cada um dos seguintes, duas vezes; os algodoeiros chegam a grande altura e grossura e por isso duram uns poucos de annos, fornecendo sempre algodão em abundancia sem que com elle se faça desposa".

Sustentando a mesma opinião, Capello e Ivens, no seu notavel livro, itinerario da sua gloriosa travessia, De Angola á contra-costa referem que a cultura do algodão tinha tal intensidade só no extincto concelho do Bambo, do districto de Mossamedes, que já se exportavam corça de 30:000 arrobas por anno.

Depoimento de singular valor, acerca do algodão de Angola, é o dado no inquerito industrial do 1881 pelos fabricantes e industriaes, cujas opiniões foram colleccionadas pelo Sr. Augusto Ribeiro em um excellente trabalho sobre algodão colonial. A fabrica de Santa Martha entendia que o algodão das colonias rivalizava com o do Brasil, tendo este apenas, algumas vezes, a vantagem de ter a fibra mais comprida; a fabrica de Santo Amaro affirmava que o algodão das nossas colonias, como o que vinha de Mossamedes, era de excellente qualidade, rivalizando com os melhores algodões da America do Norte o do Sul; a falta do limpeza e de escolha obrigava, porem, infelizmente, o consumidor a comprar algodão do Brasil; a fabrica de Xabregas estendia que o algodão em rama só podia obter nas colonias logo que se aperfeiçoassem os processos da escolha; a fabrica de Thomar dizia: "Como se vê, produz-se nas nossas possessões africanas uma grande quantidade d'esta nossa materia prima, a qual julgamos poder produzir-se nas possessões asiaticas e até na metropole, principalmente na provincia do Angola". Accrcscentava: "Mas o melhor algodão que das nossas possessões temos empregado é o de Mossamedes". Dizia mais: "Ainda com referencia á industria da cultura do algodão nas colonias portuguesas devemos dizer que a que tem logar em diversos pontos de Africa é susceptivel de maior desenvolvimento, o que permittirá que aquelle producto possa num futuro mais ou monos remoto competir vantajosamente com outros similares estrangeiros". E, confirmando estas auctorizadas opiniões, os governadores teem lamentado mais de uma voz que a cultura do algodão não tenha tido o desenvolvimento que é justo que tenha onde pode constituir uma parto importante da riqueza de Angola.

Vejamos o que tem sido a exportação do algodão e que modificação ella tem experimentado.

Exportação de algodão em rama pelas alfandegas do Loanda, Benguella e Mossamedes em kilogrammas

[Ver tabela na imagem]

Annos Loanda Benguela Mossamedes

Como se vê, a cultura do algodão não é nova na provincia de Angola, chegando a ter algum desenvolvimento nos districtos de Loanda e Mossamedes nos annos de 1890 e 1891, para descer consideravelmente no anno de 1897. A partir do 1897 mais enfraqueceu ainda, devido á falta de protecção e á febre de plantação da canna saccharina. Mossamedes abandonou a cultura do algodão, que hoje está reduzido á producção silvestre, entregando-se á cultura de materias primas para producção do alcool, concorrendo d'esta maneira para as difficuldades economicas que resultam da abundancia das bebidas distilladas.

E, todavia, pela inspecção dos algarismos que traduzem a importação no reino de algodão em rama e caroço, e que ficam expostos no começo d'este capitulo, reconhece-se como a cultura do algodão pode poderosamente concorrer para a riqueza da provincia que deve constituir a nossa maior esperança.

Tem detractores a exploração agricola de que nos temos occupado. Não podendo contestar quanto é eminentemente apta para a cultura do algodão a provincia de Angola, soccorrem-se esses do argumento de que ella demanda o emprego de muitos braços, já difficeis de obter!

A provincia de Angola é populosa, e embora a variola e a doença do somno tenham diminuído a densidade da população, ella é grande, muito grande mesmo, embora por circumstancias assas conhecidas o gentio se haja afastado para o interior. E quem sabe que são frequentes as caravanas de 2:000 e de 3:000 indigenas que vêem ao litoral com generos para permuta, arreda de si a idéa errada de que Angola não tem trabalhadores para os seus emprehendimentos agricolas.

Para a cultura do algodão é tanto mais facil obter trabalhadores, quanto é certo que de poucos ella precisa, como o affirmam os que conhecem esto ramo de exploração agricola.

São de uma noticia official sobre o Brasil destinada a dar conhecimento geral d'aquelle país na China e no Japão, os periodos que se seguem e que são extremamente elucidativos no que diz respeito á exigencia de numerosos braços para a cultura do algodão:

"Por tal forma é a producção do algodão no Brasil, que em l hectare ha espaço para 4:545 algodoeiros, que podem produzir mais ou menos 2:160 kilogrammas de algodão em caroço; um trabalhador podo folgadamente tratar de 3 hectares plantados de algodão e cereaes ao mesmo tempo e obter a renda media annual de 200 libras sterlinas, calculando-se uma media razoavel por cada kilogramma".

Nenhuma duvida, pois, pode haver de que Angola pode fornecer todo o algodão que as nossas fabricas precisam, e obtido esse desideratum, aquella provincia verá notavelmente melhoradas as suas condições de riqueza.

Resta conhecer a influencia que nas condições do Thesouro poderia ter qualquer modificação pautal relativa ao algodão, em rama ou caroço, importado.

O algodão nestas condições paga actualmente:

Pela pauta de 17 de junho de 1892 - 4 réis por kilogramma

Pela lei de 17 de agosto de 1899, e pelo algodão empregado nas fabricas - 10 réis por kilogramma.

A receita da pauta entra no cofre geral; a criada pela lei do ]7 de agosto é, com outras receitas especiaes, destinada á construcção do caminho do ferro de Benguella.

A primeira terá produzido em 1900 a importancia de 63:778$508 réis. É quanto o Thesouro encorpora na receita geral, e quo corresponda a algodão importado com o valor de 4.475:926$000 réis. Quando o Estado prescindisse d'aquella receita a lavor do algodão importado de Angola, que alto serviço se prestava á nossa colonia é á economia nacional! E facilmente só comprehende, sem maior explicação, que da melhoria economica da provincia o da acção que sobre os cambios havia do resultar de não exportarmos em ouro aquella somma, o Thesouro tirava uma consideravel compensação.

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Actualmente já o algodão colonial, como todas as mercadorias da mesma procedência, goza, do differencial de 50 por cento.

O beneficio novo a conceder, tornando livro a importação do algodão em rama ou caroço importado do Angola, não iria, caluniando pelo rendimento da 1900, alem do 31:889$254 réis.

A pauta de 16 de abril do 1802 fixou os seguintes direitos para o algodão em rama exportado pelos alfândegas do Loanda, Benguella e Mossamedes:

Para portos estrangeiros, l5 por cento ad valorem.

Para portos portugueses, 3 por conto.

O que representa esta receita? Em 1897 exportaram se pelas tres alfandegas para o reino 62:148 kilogrammas. Calculado o valor por kilogramma em 170 réis, o valor da exportação foi de 10:565$160 réis. O imposto foi de 3l6$954 réis. Vale a pena considerar esta receita? Não, evidentemente. E, todavia, a abolição do imposto, quando a producção seja de 5.000:000 do kilogrammas, ou a terça parte da importação no reino um 1900, já daria beneficio sensivel, pois seria no valor do 1:500$000 réis.

Não devo limitar-se a estes dois beneficios a protecção ao algodão do Angola.

Uma das maiores difficuldades com quo teem de lutar os exportadores de algodão em Angola consiste em encontrar facilidade do transporto para o reino. Ao grande volume correspondo pouco peso, e tanto basta para, sob qualquer protexto, ser recusado o transporte, acontecendo que o exportador vê por muito tempo demorada a remessa, por vezos abandonada nos cães, tendo como consequencia a deterioração. Tudo aconselha que, em contrato do navegação que porventura se faça, aquella difficuldade se acautele, e quo todos os esforços se empreguem no sentido de obter um bonus para o algodão do Angola, que não devera ser inferior a metade da tarifa estabelecida para o transporte de generos coloniaes.

O estimulo directo deve ser efficaz. Foi, é, e será sempre o meio de fomentar as industrias nascentes. O premio é um incentivo sempre seguro na sua acção. Esse premio deverá consistir no quo o Tintado cobra pela importação de algodão estrangeiro, ou sejam 4 réis por cada kilogramma, e distribuido nos que exportem, pelo monos, em cada anno 5:000 kilogrammas, devendo os premios conter-se dentro do imposto cobrado, estabelecendo-se rateio quando, em virtude do desenvolvimento da exportação colonial, o imposto cobrado não corresponda ao premio do 4 réis.

Convindo facilitar-se as primeiras transformações do casulo em rama devo proteger-se a acquisição dos machinismos proprios.

É livre a sua importação, mas essa isenção, estabelecida no artigo 15.º da tabella B de 10 de abril do 1892, deverá ser mantida pelo mesmo tempo da isenção do direitos para o algodão de Angola.

Adoptada esta protecção o feitas novas edições, ao corrente dos modernos trabalhos o conhecimentos, das memorias e guias da cultura o exploração do algodão, trabalhos do propaganda gratuitamente distribuidos, cremos bem que se terá concorrido para a prosperidade do Angola, quo é o mesmo que dizer para a prosperidade do reino, cujas riquezas naturaes é preciso aproveitar.

Com o mesmo intuito do protecção, pelo periodo de quinze annos não serão na província de Angola applicados impostos de qualquer natureza, quer á cultura do algodão, quer á industria da sua transformação de caroço em rama. A lei de 17 do agosto do 1899 criou um addicional A contribuição industrial, no valor de 10 réis por cada kilogramma de algodão em rama ou em caroço entrado nas fabricas.

Este addicional era destinado a premios de exportação ou algodão do producção das provincias ultramarinas, que fosse transportado em navios nacionaes para o continente do reino e ilhas adjacentes, e ainda ao pagamento de encargos resultantes do melhoramentos materiaes da provincia de Angola. Não devo ser confundido com o imposto de 10 réis por kilogramma de algodão em rama ou caroço consumido pelas fabricas do reino e ilhas adjacentes, o destinado por uma lei da mesma data, ao fundo especial para a construcção do caminho de ferro do Benguella á fronteira leste da provincia do Angola.

Como temos demonstrado, as fabricas de tecidos de algodão no reino lutam hoje com dificuldades, o que as leva ato a solicitarem a abolirão do segundo dos impostos acima referidos, como condição de melhoria para a sua situação economica. Não pode attender o Governo esta reclamação, pelo motivo de tudo aconselhar que aquelle caminho de erro seja construido o mais rapidamente que seja possivel, não devendo, por isso, ser sacrificada qualquer receita para esse fim criada, tanto mais quanto é certo, que as rubricas algodoeiras partilharão notavelmente do beneficio economico que ha do resultar da penetração no hinterland do Angola; mas, tomando em consideração a actual situação das fabricas, entende o Governo dever propor a Vossa Majestade a suspensão do addicional á contribuição industrial já referido.

Esse imposto não foi cobrado, sem que todavia fosso revogada ou suspensa a execução da lei. Se o tivera sido, as fabricas haveriam pago 150:944$620 réis pelo addicional em 1900, o approximada importancia pagariam nos annos subsequentes.

Suspender, ou melhor, não dar nesta occasião execução lei, é um beneficio junto concedido ás fabricas em virtude das suas circumstancias economicas actuaes, ficando para melhor opportunidade a applicação do novo imposto. Taes são, Senhor, os fundamentos do projecto do decreto n.º 1, que temos a honra de propor a Vossa Majestade.

III

A questão do alcool tem consideravel importancia para a provincia do Angola. A industria do fabricação de aguardente mereceu especial attenção ao serem formuladas as pautas do 1892, no intuito de evitar que a concorrencia das bebidas distilladas estrangeiras fizesse estiolar a principal industria da provincia. Na verdade, aos distilladores de Angola era impossivel concorrer com o alcool importado de Hamburgo, que chegava ao mercado por preço não superior a 40$000 réis por cada pipa de 450 litros, foi por isso adoptado o principio de protecção pautal ás bebidas alcoolicas do Angola, que permittindo elevar os preços dos productos da industria local, tornaria remuneradora a cultura da canna saccharina.

A protecção dada pela pauta de 1892 foi reforçada pelo decreto do 25 do abril do 1895, augmentando-a de 50 por cento, o desde então as bebidas distilladas estrangeiras encontraram quasi fechadas as alfandegas de Angola, como se vê do seguinte quadro referente á importação de alcool o aguardente na provincia:

Quantidades Valores
(Litros) (Réis)

[Ver tabela na imagem]

Com a queda consideravel na importação do alcool e aguardente estrangeiros, devido á protecção pautal, a industria animou-se extraordinariamente, as phantações de canna desenvolveram-se, as fabricas augmentaram a sua capacidade productora, sem que ninguem se lembrasse do perguntar se o consumo comportava a producção, se não haveria, emfim, um perigo grande em orientar a economia da provincia no sentido de á cultura da canna sacrificar

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quasi todo o rosto da, sua agricultura. Ninguem pensou na verdade, que consiste em a crise economica ser fatal quando a produção excede a capacidade consumidora. A Producção augmentou notavelmente, quer no litoral, onde a grandes fabricas, quer no interior, em pequenos alambiques, profusamente espalhados. Tão grande foi o incremento que a producção de alcool e aguardente tomou nu província, que um illustre homem de Estado escrevia em 1899: "Combinando todos os elementos de informação, ficar-se-ha muito aquém da verdade, se avaliarmos a producção em 12:000 pipas ou 6.400:000 litros. E cremos bem que. nos distanciamos muito da producção effectiva, porque, pelos calculos feitos na provincia era presença dos esclarecimentos a que temos alludido, não se julga inverosimil que essa producção exceda 30:000 pipas ou 13.500:000 litros".

Assim se chegou a exceder a capacidade do consumo interno.

Ao mesmo tempo sacrificaram-se á cultura da canna, culturas importantissimas como o algodão, que já tomara consideravel desenvolvimento no districto de Mossamedes e que promettia fazer a sua riqueza.

Comprehendia-se nessa época que, dada a situação corographica da provincia, para evitar a sua ruina economica, era indispensavel construir vias de penetração do interior, chegando os regiões salubres e colonizaveis e aos logares onde mais facilmente se poderia fazer a permuta commercial com os indigenas.

Uma linha ferrea, que, partindo do litoral, nas proximidades de Benguella, seguisse para a fronteira leste, foi considerada da maxima conveniencia e da mais indiscutivel urgencia.

Os agricultores e commerciantes de Angola, levados por um impulso patriotico digno de todo o elogio, offereceram ao Governo varias receitas destinadas á construcção d'aquelle caminho de ferro, e, entre outras, a da tributação do alcool e aguardente da provincia, o qual, pela lei de 17 do agosto do 1899, passou a pagar 80 réis por litro do 24º Cartier.

Passava-se isto em uma época de grande prosperidade para o commercio da provincia. A borracha havia attingido uma alta nunca vista, do que resultava a sua affluencia ao litoral, os commerciantes osvasiavam os seus armazens, as fabricas de tecidos de algodão, na metropole, viam augmentadas consideravelmente as suas encommendas, não só preoccupando ninguem com o augmento de producção do alcool nem com o cerceamento do consumo devido á elevação de preço, consequencia de maior tributação. E tão verdadeira é esta affirmação, que a discussão do Acto Gera) da Bruxellas de 8 de junho de 1899, que elevou o imposto do alcool a 126 réis por litro até 50° centesimaes, crescendo 2,52 por cada litro o grau, seguiu, sem que, quer na discussão em Bruxellas, quer na discussão parlamentar, os directamente interessados fizessem ouvir as suas reclamações. E que a brilhante prosperidade do commercio da borracha, devida a excepcionaes preços, dominava todos os negocios da provincia.

Havia obrigação internacional de cumprir o convencionado em Bruxellas, e foi elle cumprido no decreto de 7 de julho de 1900, mandando cobrar o novo imposto do todo o alcool produzido, tendo em vista defender os interesses da provincia, porquanto:

a) Estando estabelecido na lei que á construcção do caminho de ferro de Benguella fosse applicado o producto do imposto de 50 réis por litro, o Governo mandou addicionar no fundo do caminho de ferro todo o producto da nova tributação, excluindo o que por lei pertence ás camaras municipaes;

b) O direito da importação do alcool e aguardente do estrangeiro foi augmentado, tornando o prohibitivo, a fim de ser mantido a protecção á producção local. E, nestas circumstancias e, tende em attenção as difficuldades economicas da provincia, tem-se procedido á cobrança directa do imposto, sem rigor nem vexame, aguardando a opportunidade para definitivo regimen de cobrança.

É certo que as circumstancias da fabricação no litoral differem muito das do interior. Emquanto que a cobrança do imposto nas grandes fabricas do litoral é relativamente facil, no interior é difficil. E assim, qualquer que seja o systema de cobrança, o alcool produzido no interior será mais favorecido. É a remediar este inconveniente, tanto quanto é possivel, que visa o presente projecto de decreto.

O Acto Geral do Bruxellas fixou a tributação já referida, devendo ser cobrada, tanto quanto possivel, pelo alcool produzido na area visada pela conferencia e destinado a consumo. Trata-se evidentemente do alcool destinado a consumo dentro da area visada na conferencia, e, sendo assim, como parece fora de duvida, do pagamento da taxa de producção deverá ser excluido o alcool exportado. Como poderá, porem, sem risco de consideraveis prejuizos, distinguir se nas fabricas o alcool destinado a consumo do destinado á exportação? Difficil e perigosa selecção para os rendimentos publicos.

E, todavia, justo e legal é dar saida ao excesso do alcool, salvando assim os capitães empregados nas fabricas e na agricultura da canna, e evitando o absurdo, inteiramente iniquo, de obrigar a pagar imposto como se fosse destinado a consumo as sobras do alcool que não pode ser gasto na região onde foi produzido. Só por meio de indirecta restituição dos direitos pagos é que, sem prejuizo consideravel para o Thesouro, pode ser beneficiado o alcool exportado.

D'esta maneira se impede que o que vae para a Guiné, por exemplo, pague o imposto em duplicado, pois tendo pago o imposto de producção em Angola iria pagar o direito de importação na Guiné.

Vejamos qual pode ser o destino do alcool saido dos portos da provincia, e como deve ser modificada a legislação. O alcool pode destinar-se a outro porto da mesma provincia, a provincia differente, ao continente de Portugal ou a pais estrangeiro.

No primeiro caso dever-se-ha fixar a maneira de não impedir a circulação do alcool dentro da mesma provincia e assegurar a integral execução do compromisso de Bruxellas.

Deve permittir-se que o alcool da provincia possa ser enviado de um porto para outro? Sem duvida, tanto mais quanto é certo que, se em Benguella, por exemplo, a producção é excessiva relativamente ás necessidades do consumo, em Mossamedes é deficiente. Pode distinguir-se nas fabricas o alcool nessas circumstancias, sem risco de prejuizos para o Thesouro, que resultariam de o alcool, dispensado do direito para o pagar em outra alfandega, ser empregado subrepticiamente no consumo do local onde foi produzido? Não.

Pode o alcool produzido na provincia, quando entra em alfandega diversa, pagar o imposto fixado para o alcool estrangeiro? Não.

Parece haver um só processo de cobrança, de facil execução, que assegura o cumprimento do convencionado em Bruxellas, e que põe o Thesouro a coberto de prejuízos. Consiste elle no deposito ou garantia do imposto de producção.
Neste caso, o álcool deve ser isento do imposto de exportação, que, pelas pautas de 1892 é de 3 por cento ad valor em, visto ser já consideravelmente tributado.

Consideremos o caso da exportação do alcool para possessão ultramarina portuguesa.

O processo a adoptar neste caso, prende intimamente em o regimen pautai das diversas colonias, na parto referente ás bebidas destilladas.

Pelo decreto de 7 de julho de 1900, que deu execução ao Acto do Bruxellas, o regimen de tributação do alcool

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importado, não é o mesmo para todas aã possessos portuguesas da Africa, variando conforme as circumstancias economicas do cada uma, nem é uniforme na mesma provincia. Assim, emquanto quo no districto do Congo e no Ambriz o direito 6 de 126 róis por cada litro de alcool ou aguardente ato 50° centesimaes, augmentando de 2,52 réis por cada grau e litro, nos districtos de Loanda, Ambriz exceptuado), Benguella o Mossamedes, cada litro de alcool paga o direito de 251 róis ato 50° centesimaes e 578 réis o de graduação superior; na provincia de Moçambique o direito ó de 207 réis de 50º centasimaes e 450 réis quando de graduação superior. Na provincia da Guiné o direito é de 120 réis por litro ato 50° contesimaes, augmentando de 2,52 réis por litro e grau.

Na provincia do S Thomé o Principe, por estar fora da area visada na conferencia de Bruxellas, a tributação do alcool não foi modificada, mantendo-se a fixada na pauta do 1892 e no decreto do 25 do abril de 1895, ou seja:

a) Alcool e aguardente simples nacional, 900 réis o decalitro;

i) Alcool e aguardente simples ou preparada, 6$000 réis o decalitro;

c) Bebidas distilladas não especificadas, 4$000 réis o decalitro.

Na provincia de Cabo Verde a pauta de 1892 e o decreto de abril de 1895 fixam os seguintes direitos:

a) Aguardente simples com menor de 24° Cardar, 1$800 réis o decalitro;

b) Alcool e aguardente simples de 24° Cartier ou do graduação superior, 6$000 réis o decalitro;

c) Aguardente preparada, 4$500 réis o decalitro.

A hypothese que figuramos é a da importação do alcool ou aguardente produzidos em possessão portuguesa. Esta hypothese está também prevenida nos preliminares da pauta de 1892, e por maneira que reduz u direito acima indicado.

Assim, as instrucções preliminares relativas a Cabo Verde, reduzem a 60 por cento o direito do alcool e aguardente simples quando produzidos ou nacionalizados nas provincias ultramarinas.

O imposto fixado na pauta para o alcool estrangeiro, applicado com o differencial de 40 por cento ficava reduzido da seguinte maneira para o alcool produzido em possessão portuguesa:

inferior a 50° centesimaes, 112 réis o litro;

Superior a 50° centesimaes, 352 réis o litro.

Restituidos os direitos pagos na provincia, o alcool entrava em Cabo Verde pagando um imposto inferior ao da producção quando inferior a 50º contesimaes, e maior do que o de producção quando de graduação superior.

Como, porem, a provincia de Cabo Verde está fora da area da Convenção de Bruxellas, não lia necessidade do modificar a pauta.

Alcool e aguardente simples de origem nacional, 60 réis o litro.

Não está S. Thomé dentro da area visada pelo Acto Geral de Bruxellas, não havendo, por isso, obrigação de elevar o direito. Mas pergunta-se: Haverá conveniencia era facilitar a entrada de alcool barato em S. Thomé? Nenhuma: nem financeira, nem economia. Não ha conveniencia financeira, porque o Thesouro cobraria menos imposto; não ha conveniencia economica, por duas ordens de razões; porque sacrificaria a agricultura da canna saccharina em S. Thomé, o quo á importante, o porque o barateamento do álcool iria augmentar ainda a nefasta influencia que sobre o preto exercem as bebidas distilladas.

A provincia de S. Thomé tem já difficuldades do trabalho. Tudo aconselha providencias que obstem a que o preto definhe ou se depaupere, e essas consistem essencialmente na restricção do não do alcool. Os uberrimos terrenos de S. Thomé, tão ricos na producção do cacau e de café, deviam excluir o cultura da canna saccharina.

Nem alcool importado, nem alcool produzido na provincia, talvez venha a ser esta, em curto periodo de tempo, medida radical a tomar. Por agora, mantem-se o imposto fixado na pauta de 1892 e no decreto de 25 de abril de 1895 para o alcool e aguardente simples de origem nacional.

Vejamos o caso da exportação do alcool das colonias para o reino. Nas alfandegas do continente cada litro de alcool puro estrangeiro paga 250 réis. As mercadorias produzidas nas provincias ultramarinas são beneficiadas nas mesmas alfândegas com um differencial de 50 por cento. Resulta d'ahi que, não sendo modificado o actual regime, o alcool estrangeiro é mais protegido do que o produzido nas colonias portuguesas, o que nada o justifica. Na verdade, pagando l litro de alcool puro, produzido em Angola ou Moçambique, 226 réis, e sendo-lhe addicionados 175 réis, ou metade do direito applicavel ao alcool estrangeiro, cada litro de alcool nessas circumstancias ficaria pagando 401 réis, contra 250 réis quo paga o alcool estrangeiro.

Comprehende-se que, dadas as difficuldades da agricultura viticola do reino, se não deva facilitar a concorrencia de alcool industrial á aguardente de vinho; mas, favorecer mais o alcool estrangeiro do que o produzido nas nossas colonias, é coima que não deve manter-se quando se trato de as alliviar do excesso da sua producção.

O direito hoje fixado para o alcool estrangeiro é verdadeiramente prohibitivo; mas, quando a aguardente do vinho falte no reino e haja por isso necessidade do baixar os direitos, como é facultado pelo decreto de 14 de junho ultimo, justo é dar ao alcool colonial o mesmo regimen pautai do alcool estrangeiro.

Por dever ser assim, é igualado o imposto do alcool produzido nas colonias e importado no reino ao do alcool estrangeiro o sujeito a variação pautal estabelecida no decreto de 14 de junho de 1901. A restituição do direitos na alfândega expedidora vigorará ato se estabelecer a igualdade e eliminando-se o imposto do exportação.

A exportação para país estrangeiro do alcool produzido nas provincias ultramarinas deve ser facilitada, restituindo-se os direitos de producção contra documento comprovativo de que teve aquelle destino.

D'esta maneira fica facilitada a saida do excesso do alcool e aguardente produzidos na provincia de Angola, e na de Moçambique, attendendo-se assim as reclamações que teem sido feitas o cuja justiça o Governo reconheceu.

E estes são os fundamentos do projecto de decreto n.° 2, que tomos a honra de submetter á approvação de Vossa Majestade.

IV

Apreciando as circumstancias economicas geraes da provincia de Angola, ficou dito que o alcool proveniente da cultura da canna saccharina estava excedendo as necessidades do consumo legal. É uma verdade, já prevista pelo Sr. Conselheiro Antonio Eduardo Villaça, e que serviu de andamento a uma proposta de lei da sua iniciativa, apresentada ao Parlamento em. 20 de março de 1899, a qual ora destinada a manter por quinze annos o differencial de 50 por cento applicado ao assacar produzido nas provincias ultramarinas.

O illustre homem do Estado foi guiado pelos principios de boa e sã economia, que aconselham a transformação das nossas colonias de padrões do glorias passadas em elementos poderosos de riqueza publica. Essa transformação não se oporá sem o emprego de capitaes, e estos não ao lançam nas aventuras das explorações coloniaes sem a garantia o protecção que necessitam as industrias incipientes.
Assim o comprehendeu o legislador, que na lei do 27 de dezembro do 1870, estabeleceu um differencial de 50 por conto a favor dos productos nacionaes importados das colonias, quando transportados em navios portuguezes. Não

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havia ali a exclusiva preoccupação de proteger a marinha mercante portuguesa, concorrendo para o seu desenvolvimento; havia tambem o mesmo intuito protector para os productos commerciaes enviados das colonias, condição essencial e indispensável para o seu progresso.

Essa lei está em vigor, mas não basta para determinar a exploração de industrias que demandam consideraveis capitães e que sem razoavel protecção pautal não podem viver. Na verdade, dada a facilidade e frequencia com que no nosso país se fazem leis, revogando hoje como prejudicial o que hontem foi considerado util e proficuo, o capital, sempre suspeitoso e desconfiado, não se abalança a qualquer emprego á sombra de uma lei que, revogada dentro de determinado espaço de tempo, provocaria o seu total e completo prejuizo.

Neste caso está a industria da extracção do assucar da canna saccharina, quo não pode ser feita, em condições de razoavel exploração, sem o emprego de grandes capitães na acquisição de machinismos proprios. E, todavia, a protecção efficaz, para esta industria é insistentemente reclamada, não só como medida de valor para o progresso economico das colonias - valor incontestavel mesmo quando em absoluto considerada - mas ainda para evitar os perigos que resultam do enorme desenvolvimento dado em algumas provincias, especialmente em Angola, á cultura da canna, cuja transformação era alcool luta com a difficuldade do este exceder já as necessidades do consumo.

A justiça de semelhantes reclamações foi reconhecida pelo Sr. Conselheiro Villaça ao apresentar a proposta de lei já referida, e depois d'isso nesse sentido teem sido instantemente repetidas pelos interessados, quer em representações individuaes, quer nos comicios, a despeito da existencia da lei de 17 de agosto de 1899, quo mantem o differencial por dez annos.

A proposta a que se faz referencia foi largamente debatida no Parlamento, e da discussão resultaram algumas alterações feitas ao pensamento inicial, sendo a mais importante a que reduziu de quinze a dez annos a manutenção do differencial.

Parece que se obedeceu á idéa de que o differencial, por dez annos mantido, garantia o emprego dos capitães a empregar na industria da extracção do assucar, não havendo, por isso, necessidade do por maior periodo de tempo prender a liberdade de modificar o regime ordinario. Ficou, porem, bem consignado:

1.° Que ao Parlamento cabe o direito de fixar a duração do direito pautal;

2.º Que é preciso fixar essa duração, como condição indispensavel para fomentar nas colonias a industria da extracção do assucar da canna saccharina.

A lei não modifica o differencial estabelecido na de 27 de dezembro do 1870, e na pauta geral das alfandegas de 1892, mas fixou em dez annos o lapso de tempo, antes de expirado o qual o differencial não seria reduzido.

Ou factos vieram demonstrar que a protecção garantida apenas por dez annos não animou os capitalistas ao estabelecimento do uma unica fabrica na provincia de Angola, o que razão tinha o Sr. Villaça quando propunha a garantia do differencial por quinze annos. É evidente que a lei se destinava essencialmente á provincia de Angola, onde não produziu os resultados que o legislador esperava. A situação economica de Angola mantem-se a mesma, ou modificada no sentido de a protecção ser mais justificada, e como o fim da lei de 17 de agosto de 1809 era fomentar a industria da extracção do assucar, justo é alterá-la no sentido de produzir os resultados que a sua economia pretendeu promover.

Que a lei de 17 de agosto de 1809 visava a provincia de Angola ó de simples demonstração. A lei de 27 de dezembro de 1870 estabelecia o beneficio de metade dos direitos da pauta aos productos coloniaes transportados em navios nacionaes.
Se não tivesse sido alterada, o assucar proveniente de Moçambique não teria obtido o direito differencial de 50 por cento, visto que não é transportado para a metropole em navios nacionaes. Foi, com effeito, alterada pela pauta do 27 de junho de 1892, em cujas instrucções preliminares, artigo 18.° § 1.°, se estabeleceu que as mercadorias de producção das provincias ultramarinas, transportadas directamente em navios nacionaes, e as que, originarias de Moçambique, da India Portuguesa e de Timor, forem transportadas sob qualquer bandeira, paguem nas alfandegas do continente o das ilhas adjacentes metade dos direitos da pauta, com excepção do tabaco.

O que fez a lei de 17 de agosto de 1899? Assegurou o differencial para o assucar originario de Moçambique?

Não, assegurou por dez annos a differencial de 50 por cento, nos termos do artigo 4.° da lei de 27 de dezembro de 1870; isto é, assegurou o differencial de 50 por cento para o assucar colonial quando transportado directamente em navios nacionaes. Como se vê, dadas as condições da navegação para Moçambique, visada era apenas a provincia de Angola.

Nenhuma duvida pode haver do que é da maxima conveniencia não ir buscar ao estrangeiro o que podemos encontrar nas colonias portuguesas, mormente nesta occasião em que o agio do ouro aggrava a nossa economia interna e a situação financeira do Thesouro. Resta apenas saber se as circumstancias d'este permittem providenciar facilitando a acquisição de productos coloniaes, reduzindo as receitas publicas.

Esta á a questão importante ao apreciar uma medida economica tendente a facilitar a producção do assucar nas colonias, pois que o rendimento alfandegario proveniente da sua importação é sobremaneira importante, como se vê do seguinte quadro:

Annos Quantidades em kilogrammas Direitos em réis

1898 26.691:472 3.192:857$660

1899 27.220:528 3.222:170$247

1900 28.735:897 8.881:565$410

É, como se vê, uma receita muito importante, que convem ter em vista ao adoptar-se qualquer medida sobre o regimen pautal do assucar.

Supponhamos que todo o assucar importado provinha das colonias portuguesas. A applicação do differencial estabelecido na lei de 27 de dezembro de 1870, e na pauta de 1892, reduziria as receitas publicas do 1.690:877$000 réis.

Embora a melhoria cambial quo o facto determinaria e o natural augmento de impostos ligado ao exercicio de uma industria tão importante modificassem a influencia que aquelle prejuizo alfandegario traria ás finanças do Estado, é certo que elle seria sensivel, mormente se fosso brusco o seu apparecimento.

Se vissemos reduzidas as receitas publicas naquella importancia, o abalo financeiro seria de molde a preoccupar vivamente os administradores da Fazenda Publica. Mas nem é possivel obter nas colonias todo o assucar importado hoje, nem se obterá uma fracção importante d'elle sem decorrerem bastantes annos, quer para montagem de novas fabricas ou adaptação das fabricas de alcool á extracção de assucar, quer para obter novas e indispensaveis plantações de canna rica do producto de que se pretende fazer a extracção.

Alem d'isso, na provincia de Angola ha de ser produzido todo alcool que for necessitado para consumo. O alcool é indispensavel artigo para negocio com os indigenas, e por ser assim ha de ser sempre produzido na quantidade precisa, á sombra da protecção pautal, mantendo preço remunerador, ficando apenas para a extracção do assucar o excesso de canna que não for preciso transformar em alcool.

A industria da extracção do assucar desenvolve-se mo-

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rosamente, e a verdade d'esta affirmação nota-se bem na provinda do Moçambique.

O differencial da pauta de 1892 não está garantido por tempo determinado, o que não impediu quo nesta ultima colonia a extracção do assucar não tenha já tomado ali sensivel incremento, ao contrario do que se dá em Angola, onde a timidez do capital se não arrojou a seguir o mesmo caminho.

Importação para consumo do assucar proveniente de Moçambique

Kilogrammas

1893 221:980

1894 567:364

1895 568:089

1896 230:114

1897 749:912

1898 536:197

1899 1.209:120

1900 1.608:950

Em Moçambique ha duas fabricas importantes, protegidas por valiosos capitaes, a de Mopêa o a do Marromeu. Estes dados estatisticos, se mostram que o desenvolvimento da industria em questão é moroso, evidenciam a hypothese de quo as refeitas do Thesouro, provenientes da importação do assucar estão ameaçadas pelo assucar colonial. A producção do ultimo anno, segundo informações colhidas, attingiu na provincia cêrca de 3.600:000 kilogrammas.

O prejuizo para o Thesouro no assucar proveniente do Moçambique que pagou direitos em 1900 foi de 96:934$215 réis, calculado pela ultima producção sobe a 210:000$000 réis, numeros redondos, com tendencia para augmentar, mas sem que a provincia de Angola partilho por um real do semelhante beneficio, devido á timidez do capital, que e preciso modificar. E não é impertinencia dizer que se resulta proveito para a economia geral do país do desenvolvimento de industrias lucrativas no ultramar, maior é elle quando o facto economico se dor em Angola, onde o comine rei e é na maior parte feito por negociantes portugueses, com capitães portugueses, o cujas relações commerciaes são quaes exclusivamente com as praças do Lisboa o Porto, podendo dizer-se que ou lucros da exploração são obtidos em Angola, mas reflectidos logo sobre a metropole.

Se attendermos apenas á circumstancia do quo o Thesouro não pode supportar desfalque uns receitas quo proveem da importação do assucar, uma cousa ha desde já a fazer: é acabar com o differencial do 50 por cento sobre o assucar, estabelecido na lei do 1870 e na pauta de 1892, pois que o assucar de Moçambique, reduzindo já aquellas receitas de 216 contos, ameaça as com maior desfalque, lento mas progressivo. Do outra maneira encarada a questão, se, como se afigura ao Governo, não convem nem seria justo sacrificar os capitaes empregados nas fabricas o plantações do canna em Moçambique pela annullação do differencial, é preciso que o beneficio se proporcione ás circumstancias de cada colonia. Em Moçambique, o capital das companhias, sempre mais ousado, não se preoccupou com a feito do garantia da duração do differencial; em Angola, o capital, em regra individual a por isso mais timido, não se abalança á nova industria sem a segurança do que uma remodelação da lei de 1870 o da pauta cio 1892 não venha, dentro de curto prazo, modificar as suas condições economicas do exploração.

Por ser assim, temos do um lado a justiça das reclamações de Angola, do outro o receio do que um desenvolvimento consideravel de produção do assucar colonial venha ferir sensivelmente as finanças do Thesouro.

D'ahi a conveniencia do encontrarmos para o problema uma solução que satisfaça a justiça das reclamações o que ponha o Thesouro a coberto de prejuizos que agora não pode comportar. Essa solução deverá ser a da garantia do differencial por quinze annos, mas para determinadas quantidades de assucar, tanto para Moçambique como para Angola, sem falar nas outras colonias, onde a industria assucareira não tem nem pode vir a ter importancia.

Importaram-se no continente, em 1900, 28.735:897 kilogrammas de assucar, pagando direitos na importancia de 8.381:505$410 réis.

Se o differencial incidir sobro 12:000 toneladas, o desfalque nas receitas aduaneiras, quando depois de pessados annos Moçambique e Angola obtenham estas quantidades de assucar, não excederá 720:000$000 réis, até certo ponto compensados com a influencia que o facto economico terá na melhoria dos cambios o no crescimento dos impostos directos, e afasta-se o risco do um desfalque maior. Se, limitada assim a quantidade do assucar, desde já - o que não é possivel - todo osso assucar fosse produzido, a providencia adoptada não custaria ao Thesouro mais de 504:000$000 réis, visto que o assucar de Moçambique, se a ultima producção fui do 3:600 toneladas, custará ao Thesouro 216:000$000 réis.

Quando, depois de alguns annos, houver aquelle desfalque nos rendimentos aduaneiros, o Thesouro estará garantido contra um desfalque maior resultante do incremento que a industria assucareira está tomando em Moçambique. Essa época, para defender o Thesouro, seria preciso atacar interesses legitimamente constituidos á sombra de uma lei, com todas as difficuldades, perturbações economicas de toda a ordem quo se seguiriam; hoje, obtem-se a mesma defesa para o Thesouro, não só foram interesses legitimamente formados, o dá-se satisfação ás justas reclamações do Angola, evitando-lhe uma crise que seria a natural consequencia da superprodução da canoa saccharina.

Entendemos, por isso, quo o differencial do 50 por conto para o assucar produzido nas provincias do Angola o Moçambique devo sor limitado a 6.000:000 kilogrammas para cada uma d'ellas o que, nestas condições, se deve manter por quinze annos.

Como se vê, em nada se altera o regimen pautal contra o Thesouro, pois o differencial assenta em uma lei o para todo o assucar colonial, emquanto que pelo presente projecto de decreto, se se mantem por quinze annos, a sua incidencia é limitada a muito monos do metade do assucar importado no reino.

Fica impedido este fabrico do assucar alem de 12:000 toneladas? Não; fica limitada a quantidade do assucar que recebe o beneficio pautai, devendo ser distribuido por meio do rateio, quando a producção exceda 6:000 toneladas em cada provincia.

Evidentemente, 6:000 toneladas do assucar não augmentam consideravelmente a riqueza de Angola, porque 420:000$000 réis, que approximadamente representam o valor bruto da fabricação, não modificam profundamente a economia de uma colonia tão vasta, e o mesmo dizemos de Moçambique; nina tudo faz suppor que, lançada á industria, livro dos primeiros embaraços, tendo experimentado os progressos quo só o tempo traz e que reduzem sempre as despesas da mão do obra, a producção augmente e que traga ao reino, levo ao estrangeiro e a outras colonias portuguesas o assucar da sua producção augmentada e que não tem o beneficio pautal.

E desde então a industria da extracção do assucar será perenno fonte de riqueza das duas provincias, e economia nacional será beneficamente influenciada, evitando que para o estrangeiro exportemos em cada anno mais de réis 3.200:000$000 em ouro.

Protege-se efficazmente a provincia do Angola e protegida fica ainda a industria assucareira na de Moçambique, porque o limite excede em muito a capacidade productiva das actuaes fabricas.

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Se d'esta maneira conseguimos favorecer as condições economicas do Angola e reduzir os prejuizos do Thesouro, conveniente é ainda procurar obter para elles compensação que lhe diminuam a influencia sobre as finanças geraes do Estado. O assucar produzido em Moçambique não experimenta ali a operação complementar da refinação, motivo por que ao seu consumo é preferido o assucar estrangeiro, como se vê do seguinte quadro:

Kilogramma Valor Direitos

Estrangeiro... 25O:294 18:405$910 9:784$428

Nacional (indigena)... 2:922 210$000 88$328

Em Angola o consumo é quasi exclusivamente feito de assucar estrangeiro, como se vê do seguinte quadro:

Kilogramma Valor Direitos

Estrangeiro... 367:000,540 50:960$042 11:456$590

Português.... 34:198 5:3086112 13l5$972

Pela pauta de 16 de abril de 1892 o assucar importado na provincia de Angola está sujeito ao imposto de 40 réis, quando branco e refinado, e ao mesmo imposto está sujeito em Moçambique, com excepção da alfândega de Cabo Delgado, segundo a pauta de 29 de dezembro do mesmo anno.

Elevar o direito de importação a 80 réis por kilogramma afigura-se justo, não só pela necessidade de obter compensação para o differencial do assucar de producção nas duas provincias, mas ainda para proteger e promover o consumo do assucar indígena, a que se fixa o unico imposto de 20 réis por kilogramma.

A industria da extracção de assucar é ainda protegida, quer no que diz respeito & importação de machinismos a ella destinados, quer ainda relativamente a saccos de grossaria ou canhamaços de linho e seus congeneres destinados á exportação do assumpto.

Assim justificado, temos a honra de apresentar á consideração de Vossa Majestade o projecto de decreto n.° 3.

Paço, em 2 de setembro de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campou Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.º 1

Attendendo ao que Me representarem o Presidente do Conselho de Ministros o Ministro do Reino, e os Ministros o Secretarios de Estado de todas as Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° E isento por quinze annos do imposto de exportação o algodão em caroço ou em rama produzido na provincia de Angola.

Art. 2.° Será concedido a cada agricultor que tenha apurado e exportado mais de 5:000 kilogrammas de algodão em caroço ou em rama, um premio correspondente a 400 réis por cada 100 kilogrammas.

§ unico. A distribuição dos premios não poderá exceder, porem, em cada anno, a importancia dos direitos de importação pagos nesse periodo pelo algodão similar estrangeiro importado pelas alfandegas do reino o ilhas adjacentes, estabelecendo se rateio, quando, em virtude da intensidade da cultura do algodão colonial, decresça a importação estrangeira e o rendimento por ella produzido, destinado a constituir o capital para os premios, os não cubra por completo.

Art. 3.° Nos termos do artigo 1.º do presente decreto é isento de direitos o algodão em caroço ou em rama produzido na provincia de Angola e importado pelas alfandegas do reino o ilhas adjacentes.

Art. 4.º É mantida por quinze annos a isenção com concedida pelo artigo 15.º da tabella B das pautas da provincia de Angola, approvadas pelo decreto de 16 de abril de 1H92 ás machinas e instrumentos para a agricultura e industria e seus pertences, e ampliada por igual prazo para as sementes das diversas especies de algodão que os agricultores importarem do estrangeiro.

Art. 5.° Fica suspenso o addicional á contribuição industrial no valor do 10 réis por kilogramma de algodão em rama ou em caroço manufacturado, criado pelo artigo 4.° o a que se refere o artigo 5.° e seus n.os 1 .° e 2.º da carta de lei de 17 de agosto de 1899, com destino exclusivo a prémios de exportação ao algodão e a melhoramentos materiaes na provincia de Angola.

Art. 6.° É concedida por quinze annos a isenção do quaesquer impostos á exploração agricola e industrial de algodão na provinda de Angola até á sua transformação em rama.

Art. 7.° O Governo fará publicar e distribuir gratuitamente, pelos agricultores da província de Angola, as noticias, informações e instrucções que interessem á cultura e á exploração do algodão.

Art. 8.º Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho e Ministro e Secretario de Estado doa Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado do todas as Repartições assim o tenham entendido e o façam executar. Paço, em 2 de setembro de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz0 Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.º 2

Attendendo ao que Me representaram o Presidente do Conselho de Ministros e Ministro o Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado de todas as Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.º O alcool e aguardente simples produzidos na provincia de Angola e de Moçambique e exportados para quaesquer portos nacionaes ou estrangeiros gozarão do beneficio da restituição do imposto de producção em vigor naquellas provincias por virtude dos decretos do 7 e 19 de julho de 1900.

Art. 2.° O alcool e aguardente destinados a exportação serão previamente manifestados por declaração, com designação da quantidade e da força alcoolica e sairão da fabrica ou distillação acompanhados por uma guia, na qual se especificará o numero e a qualidade dos volumes, respectivas marcas, quantidade e força do liquido nelles contido.

§ 1.° Outro exemplar da guia entregue na fabrica ou distillação será remettido á alfandega por onde tiver de ser feita a expedição, a fim de ser realizada a conferencia do alcool a que ella se referir.

§ 2.° O expedidor depositará a importancia do imposto de producção correspondente á quantidade de alcool ou aguardente a exportar ou garantirá o sou pagamento por meio de letras com firmas de idoneidade reconhecida, a seis meses de vencimento.

§ 3.° A restituição do deposito ou das letras far-se-ha contra a apresentação do documento comprovativo do alcool ou aguardente haver entrado no pais de destino, ou de ter pago em alfandegas portuguesas os direitos de importação em vigor, excepto em Angola, Moçambique e Guiné, onde, para o alcool e aguardente nestas condições, direito será correspondente ao imposto de producção fixado nos decretos de 7 e 19 de julho do 1900. O Governo convencionará com as companhias de Moçambique e do Nyassa a forma de executar a presente disposição na áaea das suas concessões.

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SE8SAO N.º 6 DE 17 DE JANEIRO DE 1902 63

§ 4.° Findo que soja o prazo de seis meses, se o exportador não tiver apresentado o documento a que se refere o § 3.º, ou não justificar a sua falta por caso de torça maior devidamente comprovado, o deposito reverterá para a Fazenda e proceder-se ha á cobrança immediata das letras.

Art. 3.° O alcool e aguardente simples do producção colonial importados na província de S. Thomé e Principe pagarão um direito do importação igual ao imposto que incide sobre o alcool e aguardente simples de origem nacional.

Art. 4.° Fica prohibida a importação na provincia do Angola, nos termos em que já está estabelecida na provincia de Moçambique pelo decreto de 10 de julho de 1900, o nas restantes alfandegas ultramarinas do Africa pelo decreto de 25 de abril do 1896, de materias primas destinadas á distillação de alcool e aguardente, não se comprehendendo nesta disposição as machinas, os apparelhos, os reagentes e as essencias destinadas a preparação do alcool e aguardente, os quaes pagarão, comtudo, os direitos que respectivamente lhes sejam applicaveis pelas pautas vigentes.

Art. 5.° É declarada extensiva á provincia do Angola a isenção de direitos do exportação concedida ao alcool e aguardente produzidos na provincia de Moçambique pelo artigo 8.º do citado decreto de 19 do julho de 1900.

Art. 6.° E concedida aos fabricantes de alcool o aguardente na provincia de Angola a livre reimportação do garrafões e barris do ferro ou madeira em quo exportem o alcool por elles fabricado, sondo, porem, indispensavel:

1.º Que os garrafões o barris entrem pela mesma alfandega por onde saíram;

2.° Que o retorno se faça no prazo de sais meses;

3.° Que sejam reimportados pelo mesmo fabricante;

4.° Que se tenham tomado os devidos signaes na saida para se fazer confrontação na entrada;

5.º Que se apresentem documentos das alfandegas do logar de retorno, attestando a identidade da reexportação, devendo a assignatura d'estes documentos, quando originarios do estrangeiro, ser reconhecida pelo consul de Portugal.

Art. 7.° O alcool e aguardente simples do producção colonial quando importados nas alfandegas do reino o ilhas adjacentes pagarão integralmente os direitos fixados no artigo 73.° do decreto de 14 de junho de 1901 o ficando sujeito ás disposições dos §3 l.º e 2.º do mesmo artigo.

O Presidente do Conselho de Ministros o Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de listado de todas as Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 2 de setembro de ]90l. = REI.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

.º 3

Attendendo ao quo Me representaram o Presidente do Conselhos de Ministros e Ministro e Secretario do Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado de todas as Repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.º É assegurada por quinze annos, o nos termos do artigo 4.° da lei de 27 de dezembro de 1870, a manutenção do differencial do 50 por cento um favor do assucar produzido nas provincias de Angola e do Moçambique.

Art. 2.° A applicação do differencial, a que só refere o artigo antecedente, é limitado, porem, a uma importação maxima de 6.000:000 de kilogrammas, para cada uma das provincias visadas por este decreto.

Art. 3.° Logo que a importação do assucar do Angola e Moçambique exceda, respectivamente, o limite designado no artigo antecedente, o differencial será proporcionalmente reduzido do mudo que a totalidade do favor concedido em caso algum exceda a quantia correspondente a 50 por cento dos direitos pautaes com relação aos 6.000:000 de kilogrammas do assucar produzido em cada uma das duas provincias.

Art. 4.º O assucar produzido nas provindas de Angola e Moçambique e destinado ao consumo na propria provincia de origem, pagará o imposto único do 520 réis por kilogramma, e quando exportado para portos nacionaes ou estrangeiros pagará o direito estatistico do l real por kilogramma.

Art. 5.° São elevados a 80 reis por kilogramma os direitos de importação dos assucares estabelecidos nus pautas vigentes nus provincias de Angola e do Moçambique, do 16 de abril e 29 do dezembro do 1892, para o assacar destinado a consumo nau mesmas provincias.

Art. 6.º É assegurada por quinze annos a manutenção da isenção dos direitos para a importação das machinas, instrumentos e apparelhos e respectivos pertences, que sejam destinados á fabricação do assucar, estabelecida no artigo 15.° da tabella B das pautas de Angola e no artigo 14.° da tabella B das pautas de Moçambique.

Art. 7." É igualmente mantida por quinze annos a isenção de direitos concedida nas pautas vigentes das provincias de Angola e Moçambique (n.os 20 e 18 das tabellas respectivas) aos saccos do grossaria ou canhamaços do linho e seus congeneres, de origem nacional, destinados á exportação de assucar.

Art. 8.º É ainda lixado em 6.000:000 do kilogrammas a quantidade do assucar produzido em cada uma das provincias de Angola e Moçambique a que é applicavel o differencial do 50 por cento nos termos da pauta geral das alfandegas do reino.

§ unico. Quando a producção for maior, proceder-se-ha como fica disposto no artigo 3.º

Art. 9.° Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho do Ministros, Ministro o Secretario de Estado dou Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado de todas as Repartições, assim o tenham entendido e o façam executar, Paço, em 2 do setembro de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.° 8

Senhor. - O projecto do decreto que temos a honra de apresentar á apreciação do Vossa Majestade é do maxima importancia, pois visa a organização de forças militares ultramarinas por maneira a poderem realizar o seu elevado fim.

É urgente resolver esta importante problema, quo desde alguns annos preoccupa ou homens que teem estado a frente da administração dos negocios da marinha o ultramar.

Na verdade, mal ao comprehendo que som exercito regularmente organizado se possa manter illesa a soberania portuguesa, a ordem publica e o respeito á nossa bandeira entre povos selvagens e dados á guerra, alargar a area das explorações commerciaes, porque difficil é penetrar no sertão sem as garantias que dito a força publica o a occupação effectiva.

Ali, nas colonias, a força publica, alem do papel que lhe é inherente nas regiões civilizadas, e que consiste em fazer respeitar a integridade do territorio, a honra nacional e em manter a ordem e o respeito á lei, tem de fazer a occupação effectiva de sertões extensos e do proteger o commercio, garantindo-lho a segurança.

Para realizar um tão importante e complexo papel precisa a organização militar nas colonias de ser cuidadosamente elaborada, reunindo nulla tudo quanto a experiencia

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podo aconselhar. D'ahi o motivo por que o estudo d'este assumpto tem sido commettido a quem reúne todas as qualidades para poder aconselhar com proveito para a nação.

Antes de tudo, conveniente será saber-se se, na verdade, ha urgencia do reorganizar as forças militares no ultramar, para depois vermos se é possivel, sem pezar sobre as finanças publicas, adoptar um regimen que corresponda ás necessidades coloniaes.

Temos exercito ultramarino, de largo dispendio, é certo, mas, pelos defeitos da sua organização, não pode preencher o papel, de gloria para elle e de proveito para o país, que era legitimo esperar, apesar da dedicação e patriotismo com que cada um serve a causa publica.

Só compulsarmos os orçamentos coloniaes, onde largamente figuram as despesas com o exercito ultramarino, poderemos suppor que nenhuma deficiencia ha a fazer desapparecer, nenhum erro ha a corrigir, nenhuma necessidade ha, em fim, de reformar o que está feito, de alterar o quo esta estabelecido; mas, se procurarmos saber o que, na verdade, temos no ultramar, em relação a força publica, se apreciarmos os graves inconvenientes, do ordem politica e economica, que são justamente attendidos á deficiencia e má organização d'ella, convencemo-nos desde logo de que é urgente e inadiavel dar ás colonias uma organização militar que corresponda ao seu desenvolvimento e ás legitimas aspirações de occupar e explorar tão vastos territorios ultramarinos.

O estado em que se encontra o exercito ultramarino avalia-se dizendo que, quando a ordem publica é perturbada, quando a bandeira portuguesa é desrespeitada, quando temos de cumprir os deveres de neutralidade, ha necessidade de recorrer ás expedições extraordinarias, dispendiosissimas, como na Beira em 1891, na India e Moçambique em 1890, como está acontecendo em Lourenço Marques desde o começo da guerra que, ha dois annos, se debato na Africa do Sul.

Nem sequer se pode dizer que, se o exercito ultramarino não está em condições de prescindir das expedições extraordinarias enviadas da metropole quando haja rebellões importantes, como aconteceu na India e em Gaza, ou quando haja necessidade de um serviço de aturada vigilancia, como agora acontece nos Libombos, onde actualmente temos dezasete postos militares, elle preenche outro papel, não menos importante, qual é o da occupação effectiva dos vastos territorios que Portugal possue.

Nem isto, o esse é a falta mais sensivel.

A forma de conseguir unia occupação efficaz dos vastos territorios do ultramar, consiste em escalonar do litoral paru o interior unidades militares independentes, constituindo centros do que irradiem as forças destacadas para os postos militares.

Nada d'isto temos. Os officiaes são empregados em commissões de serviços que não são propriamente militares, e as praças toem uma educação tão incompleta, estão em tal abandono no que respeita a condições militares, que, com raras excepções, pode dizer-se, que não ha forças militares no ultramar, alem das enviadas do reino em expedições extraordinarias. E, todavia, no exercito ultramarino ha officiaes de valor, com importantes folhas de serviços, e as campanhas do Humbe e de Timor são prova de um grande esforço e dedicação das tropas ultramarinas. A organização é má, e com má organisaçao não ha collectividade que valha, embora os elementos constitutivos sejam apreciaveis.

É á defeituosa organização que devemos attribuir o insuccesso da sua acção, e não de certo á exiguidade do despesa que fazemos com o exercito ultramarino.

Com a despesa que é feita pela força publica, no ultramar poderiamos ter muito mais e muito melhor.

O quadro que se segue mostra a desposa que nos ultimos tres annos tem sido descripta nos orçamentos das provincias ultramarinas.

Nota da despesa militares designadas nos orçamentos das provincias ultramarinas dos annos de 1898- 1899, 1899-1900 e 1900-1901, com excepção das despesas feitas com as forças expedicionarias, transporte das mesmas forças e dos officiaes isoladas

[Ver tabela na imagem]
Exercicio de 1898-1899 Exercicio de 1899-1900 Exercicio de 1900-1901

Media da despesa militar durante os exercicios de 1898-1899, 1899-1900, 1900-1901 2.386.833$423

Não é tudo: a esta despesa feita com a parte militar da administração das nossas colonias ha a accrescentar o consideravel dispendio feito com as expedições extraordinarias. O dispendio exacto não pode ser aqui apresentado, pelo motivo de grande parto da despesa respectiva ter sido paga nas provincias, não se podendo, em virtude da falta de contas e do elementos para ellas, na provincia de Moçambique, saber o que ali foi pago até certa epoca.

Os algarismos que constituem o quadro que se segue correspondem apenas a despesas com as expedições pagas no reino, ficando, por isso, muito áquem do dispendio exacto com ellas feito.

Nota das importancias pagas pela 7.ª Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Publica para despesas das expedições, desde 1890 até ao fim do exercicio de 1900-1901

Expedição a Moçambique - 1890-1891 e 1891-1892:

16 de dezembro de 1890:

33 Officiaes e 759 praças de pret 540:831$265

Expedição a Moçambique:

Outubro de 1891:

24 Officiaes e 603 praças de pret

Março de 1895:

66 Officiaes e 2:193 praças de pret

26 de março de 1896:

9 Officiaes e 306 praças de pret 2.273:193$108

6 de junho de 1896:

3 Officiaes e 49 praças de pret

12 de novembro de 1896:

4 Officiaes o 376 praças de pret

Expedição n Moçambique:

Julho de 1897:

23 Officiaes e 733 praças de pret 150:879$966

Expedição a Moçambique em 1898:

Julho;

22 Officiaes e 651 praças de pret

Expedição a Moçambique em 1890:

Julho:

22 Officiaes e 654 praças de pret 644:126$667

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SESSÃO N.º 6 DE 17 DE JANEIRO DE 1902 65

Primeira expedição a Moçambique em 1900:

Março:

20 Officiaes e 710 praças de pret 444:805$614

Segunda expedição a Moçambique em 1900:

Setembro:

55 Officiaes e 1:153 praças do pret 490:782$598

Primeira expedição a Moçambique em 1901:

Janeiro:

17 Officiaes o 371 praças do pret 356:896$585

Expedição á India:

1895:
22 Officiaes e 567 praças pret...

Maio de 1896:

15 Officiaes e 196 praças pret
45:916$039

Expedição á Macau:

Julho do 1900:

11 Officiaes e 368 praças de pret 89:584$028

5.575:168$164

A despesa paga na metropole feita com expedições, sem coutar com a parte que foi paga nas provincias para aonde ellas foram enviadas, foi, até 2 de novembro de 1901, na importancia do 5.575:168$104 réis, o que representa uma media annual do 557:518$816 réis. Á despesa feita com forças militares no ultramar, terá sido, pelo menos:

Media annual da desposa consignada nos orçamentos coloniaes 2.386:833$324

Media annual das despesos feitas com as expedições ultramarinas 557:516$816

Media annual total 2.914:350$140

Como se vê das notas acima transcriptas, a despesa cita com forças militares ultramarinas devia corresponder a urna regular organização, o que, infelizmente, não acontece. Dias de gloria, que immensamente orgulham a patria portuguesa, toem tido os nossos soldados, não só os enviados da metropole em expedições extraordinarias, mas ainda os que fazem parte dos quadros ultramarinos; mas só os factos que nos desvanecem mostram o heroismo de todo o português que é chamado a defender a honra da bandeira da sua patria, tudo aconselha uma aceito extensa, demorada o persistente, que não é possivel obter com a actual organização do forcas militares na maioria das nossas colonias, a não ser que regularmente destacassemos da metropole numerosos contingentes, o que traria um encargo incomportavel para o Thesouro e uma perturbação grande na economia interna.

Na nossa historia colonial abundam os factos que pitara em evidencia os perigos que nos resultam du falta de occupação, condição essencial para, som contestação, ser reconhecida a soberania offectiva.

Se queremos, como é nosso dever, conservar integro o dominio colonial, tomos de proceder com firmeza o decisão, avançar para o interior, submetter os rebeldes, civilizar o proteger a população indigena, não por uma acção ephemera que, quando muito, dá gloria a quem do momento a exerce, mas persistente para ser efficaz.

Como poderá comprehender-se que o nosso commercio possa ser protegido sem os meios do, ao incarno tempo, inspirar respeito e confiança aos indigenas, respeito á auctoridade e a bandeira portuguesa e confiança na justiça do procedimento do dominador? Para isso é indispensavel collocarmo-nos em condições do poder proteger o commercio honesto contra a rapinagem indigena, e os indigenas contra as espoliações!, do que, infelizmente, por vozes não victimas por parte de aventureiros sem escrupulos.

As forças militares das colonias que, como a Guiné, Angola, Moçambique e Timor, podem ser consideradas como um caminho du formação, teem uma dupla acção: militar e moral. A segunda não tem menos valor do que a primeira. É com os elementos militares que as populações indigenas, a grandes distanciais do litoral, se põem era contacto; é por intermedio d'elles que, nos logares remotos do sertão, exercemos soberania. D'ahi a importancia do seu papel moral; d'ahi a conveniencia de entregar as pequenas fracções militares a quem com prebenda o sinta que a força não deve excluir a persuasão. Factos bem conhecidos mostram que, se as expedições são o melhor meio do trazer povoa selvagens á sujeição, o bem comportamento das tropas constituo um dos elementos do successo, e que o desastre é inevitavel, quando se entregam a depredações e á pratica de actos reprehensivos.

Uma regular organização de tropas coloniaes tem, pois, importancia capital, não só no que diz respeito ao poder militar das diversas unidades, mas ainda pelo sou importante papel politico.

O official, sargento ou soldado que, pelas suas qualidades, conquista as sympathias e a confiança dos indigenas, conquista sympathias para o seu pais. D'ahi a conveniencia da occupação militar o a do uma organização de forças, por maneira que, até ás pequenas fracções, o com mando seja entregue ao europeu.

Organizar convenientemente as forças ultramarinas, por maneira u poderem desempenhar cabalmente o complexo papel que lhes incumbe, attendendo-se ao mesmo tempo a que os recursos do Thesouro não são de molde a permittir augmentos de despesa, tem sido preoccupação de todos os estadistas que, nos ultimos annos, teem cotado á frente da administração das calonias.

Com este louvavel intuito foi publicado o decreto de 16 de agosto do 1895, o qual dava ás forças militares ultramarinas uma nova organização, tendo em vista as circumstancias do Thesouro e, principalmente, a constituição de companhias de guerra que, sem inconveniente para a ordem e disciplina, pudessem ser collocadas quasi autonomicamente em diversos pontos do interior.

Diversas causas obstaram a que a organização decretada em 1805 chegasse a ter completa execução, o os factos que decorreram nas colonias ato 1807 fizeram que o Ministro da Marinha e Ultramar, o fallecido Barros Gomes, entregasse o estudo de tão importante questão a uma commissão nomeada por decreto de 30 de abril d'aquelle anno, augmentada por decretos subsequentes, o composta das melhores competencias no assumpto. Ella foi constituida pelos Srs. Conde do S. Januario, Conselheiro Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, João Martins do Carvalho, Conselheiro Francisco Felisberto Dias Costa, José Mathias Nunes, Henrique Mittehell de Paiva Couceiro, Alfredo Augusto José do Albuquerque, Fernando da Costa Maia, Antonio Julio de Sousa Machado, João Carlos Mascarenhas de Mello, João Jorge Cecilia Koll, Joaquim Emygdio Xavier Machado, Firmino José da Costa o Arnaldo Novaes Guedes Rebello.

Constituida assim a commissão, por notaveis competencias profissionais, por quem, na maior parto, tinha prestado relevantes serviços nas colonias, dado as mais exuberantes provas de dedicação pelo seu país, desembaraçou-se ella da tarefa que lhe foi commettida pula maneira a mais distincta, e apresentou o resultado dos sons trabalhos, reduzidos a projecto, em 25 de junho do 1898.

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Inspirado neste trabalho o meu illustre antecessor, o Sr. Conselheiro Eduardo Villaça, apresentou á Camara dos Senhores Deputados, em 20 de março de 1899, uma proposta de ei, auctorizando o Governo a reorganizar as forças militares ultramarinas, a qual teve favoravel parecer, embora com algumas ligeiras modificações, da commissão do Ultramar. Não teve seguimento este projecto, devido certamente ao adeantado da sessão parlamentar.

Reconhecida a urgencia da resolução d'este importante problema de administração colonial, na sessão de 1900 apresentámos á Camara identica proposta do lei, da mesma maneira inspirada no trabalho da commissão especial, que tambem teve favoravel: parecer da commissão do ultramar, mas que, pelo adeantado da sessão, não teve seguimento.

Tratava-se das bases da reorganização das forças militares no ultramar. Hoje trata-se da reorganização em desenvolvimento, trabalho que tem a collaboração de homens competentes e experimentados, e exclusivamente inspirado rio desejo de bem servir a causa publica.

A organização militar proposta tem principalmente por fim melhorar as condições de occupação territorial das provincias ultramarinas e evitar, quanto possivel, o emprego de forças expedicionarias do exercito do reino.

A forma de conseguir uma occupação efficaz dos vastos territorios das nossas provincias ultramarinas é escalonar do litoral para o interior unidades tacticas independentes, as quaes, constituindo centros de occupação de onde irradiem as forças destacadas para os postos militares, formarão as malhas da rede que deve estender-se em todo o territorio occupado.

As unidades que melhor se podem empregar em serviço d'esta natureza são as companhias indigenas de infantaria, mais resistentes que as europeias aos climas tropicaes, comtanto que as praças indigenas sejam fortemente enquadrados com europeus.

Para este fim se criam para as provincias de Angola, Moçambique e estado da India trinta e duas companhias indigenas de infantaria com quadros europeus.

Para os pontos onde haja necessidade de apoiar as forças do infantaria com tropas de artilharia serão destinadas as companhias mixtas, compostas de uma secção de artilharia de montanha e dois pelotões de infantaria indigena. A secção de artilharia deve, em regra, ser servida por praças europeias, por não convir confiar o serviço d'esta arma a pragas indigenas.

Estas companhias podem prestar importantes serviços na organização de pequenas columnas de operações.

São também destinadas ás pequenas guarnições de l.ª linha e onde se não possa dispensar uma força de artilharia.

Alem d'estas unidades, criam-se tambem os pelotões independentes de dragões destinados a auxiliar o serviço de occupação e organização das pequenas columnas de operações.

Com o fim de apoiar as forças indigenas, e para que os governadores disponham sempre de elementos de inteira confiança para a defesa e manutenção da ordem das provincias que administrara, são criadas as unidades europeias de artilharia, cavallaria o infantaria que se julgaram indispensaveis ás necessidades de cada provincia.

Estas unidades, aquarteladas nos pontos mais salubres das provincias de cuja guarnição façam parte, deverão estar sempre promptas a entrar em campanha, não sendo desviadas para o serviço de guarnição senão em casos excepcionaes, e podendo ser deslocadas da provincia quando as necessidades do serviço assim o exijam.

D'esta forma é de esperar que, salvo circumstancias muito extraordinarias, se possa prescindir das expedições de forças destacadas do exercito do reino, que tão dispendiosas são para o país.

Nos quadros das unidades, quer sejam indigenas ou europeus, vão indicados os effectivos minimos e maximos, de modo que, conforme as circumstancias o aconselharem, se poderá passar de um para outro effectivo sem haver necessidade de introduzir qualquer alteração organica na guarnição de cada provincia.
Para satisfazer ás necessidades do serviço policial, são criados seis corpos de policia com organização militar, destinados ás cidades da Praia, S. Thomé, Loanda, Lourenço Marques, Nova Goa e Macau, tendo se procurado dar a cada um a organização que se julgou ser a mais adequada ás necessidade das populações das referidas cidades.

Os batalhões disciplinares das provincias do Angola e Moçambique são uni elemento indispensavel á regeneração dos deportados do exercito do reino e das praças transferidas por motivo disciplinar das unidades das guarnições ultramarinas, e por isso se conservou a actual organização, podendo tambem, em caso do guerra, ser um valioso auxiliar.

Como estimulo e para compensar os incommodos e perigos do serviço no ultramar, é concedido aos officiaes e sargentos ajudantes do exercito do reino, que ali forem servir nas guarnições das provincias ultramarinas e outros, serviços equivalentes, o posto de accesso com prejuizo, mas só d'aquelles que não tenham probabilidades de ser promovidos durante um anno.

Entre os que voluntariamente se offerecerem, terão sempre preferencia os mais antigos de cada classe e arma ou serviço.

Alem d'estas vantagens, é concedida aos officiaes promovidos para o ultramar uma subvenção, que lhes permitta deixar ás suas familias uma pensão não inferior ao respectivo soldo.

Na falta de officiaes que voluntariamente se offereçam, serão nomeados os mais modernos da respectiva classe, que gozarão das mesmas vantagens.

Para assegurar aos officiaes inferiores em serviço no ultramar, que não tenham as necessarias habilitações para ascender ao posto de alferes no exercito do reino, o accesso á classe de officiaes, é criado um quadro especial só de officiaes subalternos, mas com direito a reforma no posto de major, depois de um certo numero de annos de serviço.

Os officiaes dos actuaes quadros do ultramar continuarão a ser empregados no serviço das forças militares do ultramar até á completa extincção dos mesmos quadros, garantindo a promoção aos actuaes sargentos ajudantes, sargentos quarteis-mestres e primeiros sargentos, conforme a legislação em vigor.

Aos officiaes dos quadros do ultramar é augmentado o respectivo vencimento quando servirem em determinadas provincias ultramarinas.

Os quadros dos officiaes inferiores e equiparados serão preenchidos pelos individuos de classe immediatamente inferior, já em serviço no ultramar, que tenham as necessarias habilitações, por voluntarios transferidos do exercito do reino com o posto de accesso, ou por imposição de serviço aos mais modernos da respectiva classe do mesmo exercito.

Os contingentes de forças europeias serão formados pelos que voluntariamente se offereçam do exercito do reino ou suas reservas, e na falta d'estes por imposição de serviço, preferindo os refractários e os compellidos.

O tempo de serviço no ultramar é reduzido a dois ou tres annos conforme as circumstancias em que se acharem as praças, findo o qual as praças ficam isentas de qualquer obrigação de serviço no exercito do reino.

As praças de pret europeias é concedido um premio de alistamento na occasião do embarque, variavel com a provincia onde forem servir, e uma gratificação diaria conforme a sua graduação.

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O recrutamento das praças indigenas assim como a organização das forças do 2.ª linha será regulamentado em diplomas especiaes pura cada província, segundo os principiem geraes estabelecidos nesta organização.

Os quarteis generaes são organizados em harmonia com as necessidades o importancia das guarnições das provindas ultramarinas; para cada um haverá um chefe de estado maior e o pessoal necessario pura a direcção superior dos serviços militares, incluindo os de administração da fazenda militar, que até agora teem estado ligados ás inspecções de fazenda provinciaes.

Estabelece se o pessoal necessario para a regular inspecção e fiscalização das differentes unidades, de modo que a instrucção militar e disciplina d'essas unidades sejam devidamente cuidadas e os interesses da fazenda convenientemente fiscalizados.

O serviço de saude é melhorado, havendo o pessoal medico preciso para as novas unidades e distribuido par forma quo aos officiaes e praças europeias nunca faltem, em qualquer ponto onde sirvam, os soccorros da medicina.

Algumas alterações se fazem as deposições da carta do lei de 26 de maio de 1896, que regulam o serviço da justiça militar no ultramar, no proposito do evitar a demora dos julgamentos em conselho do guerra, para o que, alem de outras providencias, se criam os logares de auditores para os conselhos do guerra das provincias do Angola, Moçambique e estado da India.

Os serviços de administração militar, nos depositos de material do guerra, praças de guerra o deposito de praças do ultramar são convenientemente remodelados.

Não sendo justo quo As praças europeias que servem no ultramar se deem menos vantagens na reforma, do que áquellas que se impossibilitam no serviço do exercito na metropole, tornam-se extensivas áquellas praças as disposições da lei de 19 de outubro de 1900.

A reforma das praças de pret indigenas tambem é devidamente attendida nesta organização.

Para prover á deficiencia dos actuaes aquartelamentos e á necessidade do renovar o armamento o mais material de guerra, são destinadas á reparação do quarteis e acquisição do material do guerra, alem das verbas inscriptas para esse fim nos respectivos orçamentos provinciaes, as sobras dos artigos de despesa relativos á força armada de cada provincia e o producto das remissões das praças do pret.

Pela presente organização as forças militares são constituídas pelo seguinte numero de homens:

Minimo Maximo
Cabo Verde 224 469

Guiné 190 268

S. Thomé o Principe 200 366

Angola 2:682 4:587

Moçambique 2:213 3:722

India 1:055 1:836

Macau 475 707

Timor 224 308

Total 7:263 12:263

Das forças militares de Moçambique fazem parte as seguintes unidades europeias:

Uma bateria mixta de artilharia do montanha e guarnição;

Uma companhia mixta de artilharia do montanha e infantaria;

Uma companhia mixta de artilharia de guarnição o infantaria;

Dois esquadrões de dragões;

Duas companhias de infantaria;

Um corpo do policia.

Quer dizer: alem de dez companhias indigenas na provincia do Moçambique haverá unidades europeias com o effectivo minimo 877 homens e com o maximo do 1:556 homens.

A não ser em casos muitos extraordinarios, Moçambique, donde que se adoptem os effectivos maximos, dispensará as expedirdes.

Tudo leva a crer que só em Moçambique haverá necessidade do effectivo maximo; mas só por uma coincidencia difficil de realizar-se o que as circumstancias poderiam exigir os grandes effectivos em todas as possessões ultramarinas.

Dito isto, é preciso saber até aonde podem chegar os recursos do Thesouro e a influencia que nas finanças publicas pode ter a actual organização.

Não é ella proposta com o fim exclusivo de fazer economias, mas o facto é que ellas resultarão e importantes, e quo teremos forças militares no ultramar em condições do bem servirem o país.

Já vimos quo a media annual das despesas ordinarias que nos orçamentos ultramarinas são inscriptas como destinadas ás forças militares, é de 2.386:833$324

a qual, accrescentada da media annual das despesos com expedições, pagos na metropole 567:615$816

dá para media do despesa 2.944:350$140

Não só incluem, por desconhecidas, muitas despesas pagas nas provincias a expedições.

A actual organisação custa muito menos, como passamos a demonstrar com a orçamento da despesa a fazer com o pessoal dos quarteis generaes, estabelecimentos militares e guarnições, segundo o plano adoptado.

Effectivo minimo:

Cabo Verde 47:368$805

Guiné 58:056$695

S. Thomé o Principe 51:792$110

Angola 565:958$955

Moçambique 628:556$285

India 149:657$704

Macau 89:906$1676

Timor 69:434$400

Total 1.660:731$630

Só Moçambique tiver o effectivo maximo, como deverá ter, a despesa será de l.997:495$595 réis.

Se Angola precisar, juntamente com Moçambique, do effectivo maximo, a despesa será de 2.234:565$925 réis.

Dando ás provincias de Moçambique o Angola os effectivos maximos, a despesa é ainda inferior de 152:000$000 réis á ordinaria, descripta nos orçamentos ultramarinos e em que não entram as despesas feitas com expedições extraordinarias.

A economia é real, positiva e importante, quando compararmos a despesa a fazer pela presente organização com

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a media das despesas feitas com as forças militares no ultramar, comprehendendo as expedições:

Media das despesas feitas com o exercito ultramarino e expedições (despesa paga na metropole) 2 999:350$140

Desposa com o effectivo minimo da organização 1.660:731$630

Para menos 1.333:618$510

Despesa da organização com o effectivo maximo em Moçambique 1.997:495$595

Para menos 996:854$545

Despesa com a organização E com effectivos maximos em Moçambique e Angola 2.234:560$920

Para menos 759:784$215

Supponhamos, o que mal se pode comprehender, que simultaneamente eram exigidos os effectivos maximos em todas as possessões ultramarinas:

A despega seria 2.408:837$784

Para menos ainda 585:512$356

Mas como, quando muito, não haverá necessidade de effectivos maximos que elevem a despesa para alem da calculada para a organização com os maximos de Moçambique o Angola, a economia será de 759:984$215 réis.

Partimos, para obter estes algarismos, de que a despesa feita com as forças militares no ultramar não foi alem de 2.994:350$140 réis; mas a verdade é que as despesas pagas nas provincias, o que não entram neste computo, foram avultadas, e muito maiores do que as que ha a fazer com passagens e ajudas de casto, que não entraram no orçamento da organização.

Tambem no computo da media das despesas feitas até agora não foi incluida a despesa com passagens e com ajudas de custo aos officiaes que, idos do reino, estão em serviço militar no ultramar.

Assim nenhuma duvida pode restar de que, a par de uma conveniente organização e distribuição de forças, o presente decreto realiza uma importante economia.

Com elle foram organizados, em todas as suas minucias, os orçamentos das despesas com as diversas unidades, sendo de esperar que á previsão não haja escapado a despesa mais insignificante; só, porem, alguma correcção houver a fazer, não poderá sensivelmente modificar a consideravel reducção de despesa. Se em cada anno for votada e emquanto for necessaria a verba de 100.000$000 réis para quarteis e para completar o armamento, a redacção da despesa é ainda notavel.

Taes são, Senhor, os fundamentos do presente decreto, elaborado com o exclusivo fim do dar ás colonias uma organisação militar que se cuadune com as necessidades politicas, economicas e de ordem publica, e que alivio o Thesouro do pesados encargos.

Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha e Ultramar, em 14 do novembro de 190l. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa - Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que me representaram o Presidente do Conselho de Ministros e os Ministros e Secretarios de Estado das differentes repartições: hei por bem decretar o seguinte:

Artigo 1.° E approvada a organização militar do ultramar que faz parto d'este decreto e baixa assignada pelos Ministros da Fazenda, Guerra e Marinha e Ultramar.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

O Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario do Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das diversas repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 14 de novembro de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa - Manuel Francisco de Vargas.

Organização militar do ultramar

CAPITULO I

Das forças militares do ultramar

Artigo 1.º As forças militares do ultramar são destinadas á defesa, occupação e segurança das provincias ultramarinas o do districto autonomo de Timor, e estão sob as ordens do Ministro da Marinha o Ultramar.

Art. 2.° As forças militares do ultramar compõem-se:

1.° Dos quarteis generaes das provincias ultramarinas o districto autonomo;

2.° Das guarnições de l.ª linha;

3.° Dos corpos do policia o de guarda fiscal militarmente organizados;

4.° Dos corpos disciplinares;

5.º Dos tribunaes militares;

6.º Dos depositos de material de guerra;

7.° Do estado maior das praças de guerra o pontos fortificados;

8.° Do serviço de saude;

9.° Dos serviços de administração militar;

10.º Dos officiaes em commissão;

11.° Do deposito de praças do ultramar;

12.° Dos reformados;

13.° Das tropas de 2.ª linha.

CAPITULO II

Dos officiaes

Art. 3.º As commissões ordinarias de serviço militar no ultramar serão desempenhadas:

1.° Por officiaes do exercito do reino;

2.° Pelos officiaes do quadro de que trata o artigo 22.°

Art. 4.° São commissões ordinarias do serviço militar no ultramar para os officiaes do exercito do reino:

1.° O serviço nas unidades de 1.ª e 2.ª linha e nos corpos disciplinares, fiscal e de policia militamente organizados;

2.° O serviço nos quarteis generaes o repartições militares das provincias o districto autonomo, com excepção dos cargos de chefe de estado maior e de ajudante de campo;

3.º O serviço nos tribunaes militares;

4.° O serviço nos depositos do material de guerra, nas praças de guerra e nos depositos de condemnados;

5.° Os serviços de administração militar;

6.° O serviço nos com mandos militares, capitaniais-mores e suas dependencias.

§ unico. Os officiaes do exercito do reino, nomeados para desempenhar as commissões de que trata este artigo, não poderão ser encarregados do qualquer commissão extraordinaria durante o tempo obrigatorio de serviço no ultramar a que se refere o artigo 6.°

Art. 5.º As vacaturas que, em cada posto ou classe, o arma ou serviço, occorrerem nas commissões indicadas no artigo precedente, serão preenchidas pelos individuos mais antigos do posto ou classe immediatamente inferior da respectiva arma ou serviço, que estiverem incluidos na lista de que trata o artigo 7.°

§ unico. Quando as vacaturas forem do posto de alferes e não se tiverem offerecido sargentos ajudantes em numero sufficiente, serão preenchidas pelos primeiros sar-

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gentos mais antigos da respectiva arma ou serviço, que estiverem incluidos nu lista a que se refere o presente artigo, o estejam nas condições designadas no § unico do artigo 50.º da carta de lei do 12 do junho de 1901.

Art. 6.° Os officiaes, sargentos ajudantes e primeiros sargentos nomeados nos termos do artigo precedente serão promovidos no ponto immediato, ficando obrigados a servir no ultramar:

Majores o alferes 4 annos

Coroneis, tenentos-coroneis, capitães o tenentes 2 annos

§ 1.º Os officiaes, promovidos nas condições do presente artigo, quando completarem o tempo do serviço obrigatorio no ultramar, serão collocados na escala de accesso da respectiva arma ou serviço, logo A esquerda dos indivíduos do posto anterior, que na mesma escala occupavam o logar n, sendo n a media annual das promoções durante os cinco annos civis que precederem a data da promoção para o ultramar, se, durante o tempo que ali servirem, não tiverem obtido promoção que lhes de collocação mais vantajosa na escala da sua arma ou serviço.

§ 2.° O tempo de serviço, a que se refere esto artigo, será contado desde a data do embarque para o porte do primeiro destino, descontando-se todo o tempo de permanencia, por qualquer motivo, na metropole ou em serviços do ultramar quo não sejam os indicados no artigo 4.°, na inactividade, no cumprimento do pena, ou no gozo do qualquer licença, excepto se esta for concedida por motivo do ferimento ou desastre occorrido em serviço ou por motivo de serviço.

§ 3.° Quando os officiaes estiverem desviados das commissões indicadas no artigo 4.°, por tempo quo exceda a quarta parto d'aquelle a quo são obrigados a servir no ultramar, na conformidade d'este artigo, serão mandados apresentar no Ministerio da Guerra, sendo-lhes applicavel o disposto no artigo 13.° sem prejuizo do deposto na parte final do paragrapho procedente.

§ 4.° Os officiaes que forem mandados servir na provincia da Guiné ou no districto autonomo do Timor, poderão, se assim o solicitarem, conservar-se apenas um anno em qualquer d'aquellas possessões ultramarinas, completando o resto do tempo de serviço: os da guarnição da Guino, nas provincias do Cabo Verde ou Angola, o os da guarnição de Timor, no estado da India ou em Macau.

Art. 7.° Em cada anno os officiaes o sargentos ajudantes que desejarem servir no ultramar, nas condições dos artigos 5.º o 6.º, entregarão até 30 de setembro as convenientes declarações á auctoridade sob cujas ordens servirem, sendo essas declarações enviadas á Direcção Geral da Secretaria do Estado dos Negocios da Guerra, que formulará uma lista dos referidos officiaes o sargentos ajudantes, para ser publicada, autos de l do novembro, na Ordem do exercito o no Boletim Militar do Ultramar.

§ l.º Na referida lista não poderão sor incluidos os officiaes, sargentos ajudantes o primeiros sargentos que, pelas respectivas informações do comportamento, não possam ser promovidos. Serão, porem, incluidos os officiaes que ainda não tiverem dado as provas exigidas para a promoção ao posto immediato, devendo esses officiaes ser desde logo chamados a prestá-las por ordem de antiguidade, e ato ao numero provavel, de vacaturas que for necessario prover. Esto numero será annualmente fixado, ata 30 de setembro, pelo Ministerio da Marinha e Ultramar.

§ 2.° Se os officiaes ou sargentos ajudantes não tiverem satisfeito os tirocinios para a promoção ao posto immediato, quando forem nomeados para servir no ultramar, serão d'elles dispensados.

§ 3.º Emquanto não estiverem nomeados para serviço do ultramar, poderão os officiaes, sargentos ajudantes e primeiros sargentos, a que se refere este artigo, em qualquer epoca do anno, desistir do ir, nesse anno, servir nas provincias ultramarinas.

Art. 8.° As vacaturas, que forem occorrendo nas commissões de que tratei o artigo 4.º durante o anno, serão preenchidas por ordem do antiguidade, em cada classe o arma ou serviço, pelos officiaes e sargentos ajudantes inscriptos na lista formulada no anno anterior.

§ 1.° As vacaturas que se derem nas commissões correspondentes á classe do official superior, quando não esteja especificado o posto, serão preenchidas poios capitães mais antigos da respectiva arma ou servido, inscriptos na referida lista, quo serão promovidos a majores na conformidade do artigo 6.°

§ 2.º As vacaturas que se derem nas commissões que devam sor desempenhadas por officiaes subalternos, serão preenchidas, do preferencia, pelos alferes que se tiverem offerecido.

§ 3.° Para as commissões em que se não designe arma ou serviço, deverão ser escolhidos os officiaes do maior antiguidade no posto ou classe immediatamente inferior ao correspondente a essas commissões.

Art. 9.° Aos officiaes a quem, por antiguidade, tiver competido, no exercito do reino, o posto a que foram promovidos para o ultramar, e que quiserem continuar no mesmo serviço ultramarino, bem como d'aquelles que tiverem terminado o tempo* do serviço e que quiserem nelle continuar, será concedido um augmento de 20 por cento sobre o soldo o gratificação da respectiva patente, a que tenham direito emquanto o desempenharem, o poderão concorrer n novo posto do accesso.

Art. 10.° Quando voltarem ao exercito do reino, depois do terem terminado o tempo de serviço no ultramar designado no artigo 6.°, os sargentos ajudantes das armas do cavallaria ou infantaria, promovidos a alferes para o ultramar, serão colocados nas escalas de accesso das suas armas, de modo quo não fique prejudicada a relação, estabelecida no artigo 49.° da carta de lei de 12 do junho do 1901, entro os officiaes habilitados com o respectivo curso o os provenientes da classe dos sargentos.

Art. 11.° Os sargentos ajudantes das armas do engenharia o artilharia, promovidos a alferes em conformidade com o artigo 6.°, serão empregados nos serviços de engenharia e artilharia das forças ultramarinas, tendo ingresso no corpo do almoxarifes, quando terminarem o tempo obrigatorio do serviço no ultramar.

§ unico. Quando a vacatura for do alferes do artilharia, será preenchida pelo sargento ajudante mais antigo, dos que só tiverem offerecido d'esta arma, embora não seja o mais antigo de todos os inscriptos na lista a que se refere o artigo 7.°, relativa aos sargentos ajudantes das armas de engenharia o artilharia; com esta nomeação, porem, não serão prejudicados os sargentos ajudantes mais antigos da arma de engenharia, que se tenham offerecido na mesma occasião, aos quaes se contará antiguidade igual á do sargento ajudante da artilharia promovido, quando tiverem ingresso no corpo dos almoxarifes. De igual modo se procederá, quando a vacatura for de alferes de engenharia e o sargento ajudante mais antigo inscripto na lista acima citada seja de artilharia.

Art. 12.º Os officiaes, que tenham sido promovidos nas condições do artigo 6.°, quando, por distincção em combate, mereçam a recompensa de um posto do accesso, cantarão a antiguidade do novo posto da data do feito a que deva ser conferida tal recompensa, dando-se-lhe por finda, se assim o solicitarem, a commissão no ultramar.

§ unico. Aos officiaes, de quo trata o proscrito artigo, é applicavel o disposto no artigo 9.°

Art. 13.° Os officiaes que, tendo sido promovidos para o ultramar nos termos do artigo 6.°, desistirem do continuar a servir nas provincias ultramarinas, perderão a promoção quo tiverem obtido, só por antiguidade esta não lhes tiver pertencido, e ficarão na situação que anteriormente occupavam na escala do accesso das respectivas armas ou serviços.

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§ 1.° Quando os referidos officiaes tiverem servido no ultramar menos de metade do tempo fixado no artigo 6.°, indemnizarão a Fazenda das passagens de ida e regresso da ajuda de custo que houverem recebido.

§ 2 ° A desistencia de que trata o presente artigo só poderá ser concedida se o requerente for julgado incapaz de serviço no ultramar pela junta de saude do ultramar ou depois de seis meses de serviço no ultramar.

Art. 14.º Os officiaes do exercito do reino terão no acto da reforma, alem das percentagens sobre o soldo, estabelecidas pela carta de lei de 22 do agosto de 1887, mais õ por conto do soldo da sua patente por cada periodo de tres annos de serviço effectivo no ultramar.

Art. 15.° Quando se não tiverem offerecido officiaes de qualquer posto e arma ou serviço, em numero sufficiente para preencher, num anno, as vacaturas que occorrerem nas commissões a que se refere o artigo 4.°, serão nomeados os officiaes mais modernos do mesmo posto e arma ou serviço, os quaes serão promovidos ao posto immediato nas condições preceituadas no artigo 6.°, o com as demais vantagens estabelecidas neste decreto para os officiaes voluntarios.

§ unico. Fará ser incluido na escala d'estas nomeações é indispensavel que o official esteja na efectividade do serviço do quadro a que pertença, na disponibilidade ou, ha menos de dois annos, com licença illimitada ou na situação de addido, e satisfaça ás condições exigidas para ser inscripto na lista a que se refere o artigo 7.º Não serão incluidos na mencionada escala os officiaes que desempenharem cargos de magisterio do nomeação dependente de concurso.

Art. 16.° Os officiaes do exercito do reino que forem desempenhar quaesquer commissões ordinarias de serviço militar no ultramar terão, alem dos soldos e das gratificações da sua patente e arma ou serviço, a subvenção mensal designada na tabella seguinte:

Coroneis 100$000 réis

Tenentes-coroneis 80$000 réis

Majores 80$000 réis

Capitães 60$000 réis

Tenentes 45$000 réis

Alferes 36$000 réis

§ 1.° Estas subvenções terno o augmento de 50 por cento quando os officiaes servirem na provincia de S. Thomé e Principe e no districto de Lourenço Marques, e o de 30 por cento quando servirem na provincia da Guiné e nos districtos do Congo, Lunda, Zambezia e Timor.

§ 2.° Quando no orçamento de despesa da provincia ou districto autonomo estiverem designados gratificação especial, percentagem de cobrança de impostos ou emolumentos para qualquer das commissões mencionadas no artigo 4.°, o official que a desempenhar poderá optar por esse vencimento, deixando neste caso de ter direito á subvenção de que trata este artigo.

Art. 17.º Os officiaes do exercito do reino em serviço no ultramar que não desempenharem quaesquer dos serviços designados no artigo 4.°, não serão promovidos ao posto immediato, na conformidade do artigo 6.°, mas terão direito, aquelles que tiverem vencimento de soldo, ás vantagens consignadas nos artigos 9.° e 14.°

§ unico. Quando qualquer official do exercito do reino for nomeado para o desempenho da commissão extraordinaria do serviço, terá o vencimento que for estipulado na respectiva nomeação.

Art. 18.º Os officiaes do exercito do reino que forem desempenhar commissões no ultramar, terão direito a uma ajuda de custo de embarque equivalente a dois meses de soldo da patente que tiverem obtido pela sua nomeação para serviço no ultramar.

Art. 19.° Os officiaes do exercito do reino em serviço no ultramar, poderão deixar no reino ás suas familias uma pensão não superior á importancia do respectivo soldo, que será paga pelo Ministerio da Marinha e Ultramar.

Art. 20.° Os officiaes do exercito do reino, que regressarem á metropole por opinião da junta de saude da provincia ou districto em que servirem, não deverão ir continuar o serviço na colonia que deixaram por motivo de doença, salvo parecer em contrario da junta de saude do ultramar.

Art. 21.° O serviço dos officiaes do exercito do reino nas commissões de que trata o artigo 4.º será contado, para os effeitos de promoção ao posto immediato, como prestado nos corpos das armas a que pertencerem os referidos officiaes.

Art. 22.° Os sargentos ajudantes e primeiros sargentos a que se referem os artigos 30.° e 31.°, que não tiverem as condições e habilitações necessarias para poderem ascender ao posto de alferes da sua arma no exercito do reino, e quando satisfaçam ás condições exigidas actualmente para promoção ao posto do alferes nos quadros do ultramar, serão promovidos a este posto, quando tiverem vacatura, para um quadro privativo das forças ultramarinas, o qual constará de setenta e dois officiaes subalternos.

§ 1.° Os alferes, nestas condições, serão promovidos a tenentes quando tiverem, naquelle posto, mais de cinco annos de serviço no ultramar.

§ 2.° Os tenentes do quadro de que trata o presente artigo, quando tenham dez annos de posto, serão considerados capitães para os effeitos de reforma.

Art. 23.° Os subalternos do quadro estabelecido pelo artigo precedente terão direito a mais 50 por cento sobre o soldo, quando servirem em S. Thomé o Príncipe ou Lourenço Marques; a mais 30 por cento, quando servirem na Guiné, Lunda, Congo, Zambezia ou Timor; e a mais 25 por cento, quando servirem, nos restantes districtos de Angola ou Moçambique.

Art. 24.º Os officiaes, sargentos ajudantes, sargentos quartéis-mestres e primeiros sargentos, que fazem actualmente parte dos quadros das provincias ultramarinas, continuarão a ser promovidos nas vacaturas que occorrorem nos respectivos quadros, até completa extincção d'estes, nos termos da legislação vigente, podendo ser mandados servir nas provincias ou districtos que o Governo julgar conveniente.

Art. 25.° Os officiaes dos actuaes quadros das provincias ultramarinas gozarão das vantagens estabelecidas no artigo 23.°, quando servirem nas localidades indicadas no mesmo artigo.

Art. 26.° O commando das forças europeias no ultramar será exercido, de preferencia, pelos officiaes do exercito do reino e pelos officiaes europeus dos quadros do ultramar.

Art. 27.° Os officiaes em serviço no ultramar, quando em virtude de serviço estejam em marcha, ou quando por igual motivo residam eventualmente fora do seu quartel permanente, terão direito, alem dos transportes que lhes devam ser fornecidos em conformidade com a legislação vigente, aos seguintes subsidios diarios de marcha e de residencia:

Officiaes superiores l$500 réis

Capitães 1$000 reis

Officiaes subalternos $800 réis

§ 1.° Os subsidios de marcha terão o augmento de 50 por cento quando o official marche isolado, ato á distancia de 150 kilometros do seu quartel permanente, e de 100 por cento quando exceda essa distancia, nas mesmas condições.

§ 2.° Sempre que se abonarem passagens em barcos que forneçam comedorias, cessará o subsidio durante a viagem.

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§ 8.° Os officiaes que estiverem fora do seu quartel permanente terão direito ao subsidio de residencia eventual, que não poderá exceder quatro meses era cada anno.

Art. 28.º Todos os officiaes em serviço no ultramar teem direito a uma ração de etape em campanha.

Art. 29.° Aos officiaes do exercito do reino, e aos officiaes europeus dos quadros do ultramar, é applicavel o disposto no decreto com força de lei de 11 do agosto de 1900.

§ unico. Os officiaes naturaes das provincias ultramarinas, que estejam nas condições do decreto citado neste artigo, terão atreito as incarnas licenças que os europeus, mas só para serem gostadas nas provincias da sua naturalidade.

CAPITULO III

Officiaes Inferiores, musicos o artifices

Art. 30.° O quadro de sargentos ajudantes das guarnições ultramarinas será preenchido pelos primeiros sargentos mais antigos das referidas guarnições, quando satisfaçam ás condições actualmente exigidas para a promoção ao posto de alferes dos quadros do ultramar.

Art. 31.° Os quadros de segundos e primeiros sargentos das guarnições ultramarinas serão preenchidos:

l.ª Por concurso respectivamente entre os primeiros cabos e segundos sargentos já em serviço nas tropas ultramarinas;

2.° Por transferencia do exercito do reino, com posto de accesso, quando os concorrentes satisfaçam as condições da promoção exigidas no mesmo exercito;

3.° Por imposição de serviço aos mais modernos de cada classe do exercito do reino.

§ 1.º Para a promoção dos segundem sargentos ao posto immediato, nus condições do n.° 2.° d'este artigo, serão preferidos os mais antigos dos que se tenham offerecido e tenham bom comportamento, devendo a antiguidade no posto de primeiro sargento ser contada da data da promoção, logo que completem dois annos de serviço effectivo no ultramar.

§ 2.° Os primeiros sargentos a quem for imposto o serviço nas condições do n.º 3.° do presente artigo, gozarão a vantagem de, terminados dois annos de serviço effectivo no ultramar, subir na escala do accesso, 110 exercito do reino, tantos Jogares quantos der o valor de x na formula

x = 3/2 n, em que n representa a media das promoções annuaes nos ultimos cinco annos immediatamente anteriores áquelles em que a imposição de serviço ao tiver dado.

§ 3.º Os segundos sargentos transferidos para o ultramar, em virtude do disposto no n.° 3.° d'este artigo, o que regressarem ao exercito do reino no fim de dois annos de serviço effectivo no ultramar, serão promovidos a primeiros sargentos, na primeira vacatura, quando tenham as habilitações legaes e sejam approvados no respectivo exame.

Art. 32.° O serviço nos unidades compostas de praças de pret europeias ou nas fracções europeias das unidades mixtas, será feito exclusivamente por sargentos europeus, provenientes do exercito do reino.

Art. 33.° O numero de sargentos não europeu" não poderá nunca exceder, em caria classe, um terço dos que pertençam á guarnição do cada provincia ou districto autonomo.

Art. 34.° As vacaturas do mestres e contramestres de musica serão preenchidas por individuos que satisfaçam ás condições exigidas no exercito do reino para a promoção nas referidas classes.

Art. 35.º As vacaturas de musicos das differentes classes serão preenchidas:

1.° Por concurso entre os musicos da classe inferior áquella em que se der a vaga, ou entre os aprendizes de musica se a vacatura for de musico de 3.ª classe;

2.° Por transferencia do exercito do reino com promoção á classe immediata, quando os concorrentes satisfaçam ao respectivo exame;

3.° Por imposição do serviço aos mais modernos de cada classe do exercito do reino.

Art. 36.° Os aprendizes de musica e musicos de pancada serão praças indianas.

Art. 37.° As vagas do artifices serão preenchidas pelos individuos do classe civil ou militar que voluntariamente se offereçam para servir no ultramar e tenham a necessaria aptidão profissional e, quando se não offereçam em numero sufficiente, por imposição de serviço aos mais modernos da respectiva classe do exercito do reino.

Art. 38.° Os musicos e artifices terão as graduações estabelecidas nos artigos l #9.° o 100.° do decreto com força de lei de 7 de setembro do 1899.

CAPITULO IV

Cubos, soldados, clarins, corneteiros e ferradores

rt. 39.° As vacaturas de primeiros cabos nas unidades das guarnições da" provincias ultramarinas e districto autonomo serão preenchidas:

1.º Por escolha entro os segundos cabos o soldados, que tenham as necessarias habilitações, feita pelo commandante da unidade a que pertencerem os mesmos segundos cabos e soldados;

2.° Por transferencia do exercito do reino, das suas reservas, ou de outras unidades da guarnição da provincia no mesmo posto ou com o posto de accesso, quando tenham as necessarias habilitações;

3.º Por imposição de serviço aos primeiros cabos do exercito do reino escolhidos pela sorte para o serviço do ultramar.

Art. 40.° Em cala bateria, esquadrão, companhia ou pelotão independente, poderão ser promovidos a segundos cabos, soldados era numero igual a metade dos primeiros cabos indicados nos respectivos quadros.

§ unico. Esta promoção é feita por escolha do commandante da respectiva unidade.

Art. 41.° Os contingentes de soldados europeus para o preenchimento dos quadros das unidades das guarnições das provincias ultramarinas e districto autonomo serão formados:

l.º Pelos soldados que voluntariamente se offereçam do exercito do reino ou uns suas reservas;

2.º Pelos soldados do exercito do reino a que for imposto o serviço no ultramar, quando não haja voluntarios em numero sufficiente.

§ unico. Para o preenchimento das vacaturas nos termos do n.° 2.° do presente artigo, serão nomeados:

1.° Os da classe dos refractarios;

2.° Os compellidos;

3.º Os escolhidos pata sorte d'entre as praças promptas no primeiro anno do alistamento.

Art. 42.º Os contingentes de soldados indigenas serão preenchidos pela forma estabelecida no capitulo VI.

Art. 43.° As vacaturas do mestres e contramestres de clarins ou corneteiros serão preenchidos por individuos da classe immediatamente inferior, já em serviço no ultramar, ou do exercito do reino, que satisfaçam ao respectivo exame.

Art. 44.° O preenchimento das vacaturas de clarins, corneteiros o ferradores será feita por individuos d'estas classes transferidos do exercito do reino, que voluntariamente se offereçam para servir no ultramar, ou pela promoção dos aprendizas das referidas classes do exercito do reino, ou das guarnições das provincias ultramarinas e districto autonomo, que satisfaçam ao respectivo exame.

Art. 45.° Os aprendizes de clarins, corneteiros e ferradores serão praças indigenas.

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CAPITULO V

Disposições relativas ás praças do pret europeias

Art. 40.º O tempo de serviço no ultramar para, as praças de pret do exercito do reino é de dois annos, contados da data do desembarque no porto do primeiro destino, excepto para as praças a que se referem, os n.os 1.° e 2.° do § unico do artigo 41.°, as quaes serão obrigadas a servir por tres annos.

Art. 47.º Terminado o tempo obrigatorio do serviço no ultramar, as praças terão direito a transporte para a metropole, quando não queiram readmittir-se por periodos de dois annos, ou fixar-se no ultramar, sendo-lhes, neste ultimo caso, concedidos terrenos, onde os haja disponiveis, o prestados os primeiros auxilies para a sua exploração, conforme for determinado em regulamento especial.

§ 1.° Ás praças que tiverem baixa de serviço por ha verem completado o seu tempo de serviço no ultramar, o regressarem logo á metropole, serão abonados os seus vencimentos ato á data do desembarque em Lisboa.

§ 2.º Perderão o direito a transporte as praças que não regressarem á metropole no prazo de um anno, depois de lhes ter sido conferida a respectiva baixa de serviço.

Art. 48.º As praças de pret que completarem no ultramar dois annos do serviço, ou tres quando estejam nas circumstancias dos n os 1.° e 2.° do § unico do artigo 41.°, ficam isentas de todo o serviço militar a que estiverem obrigadas na metropole, sem prejuizo do disposto no artigo seguinte.

Art. 49.° Depois de terminado o tempo de serviço no ultramar, poderio as praças de pret regressar ao exercito do reino, se assim o solicitarem com a antecedencia de seis meses, e estiverem nas condições de ser readmittidas no mesmo exercito.

Art. 50.° As praças de pret que forem julgadas incapazes de serviço no ultramar, pela junta de saude do ultramar, antes de terminarem o tempo de serviço a que estavam obrigadas, serão mandadas apresentar no Ministerio da Guerra, ficando desde logo desligados do serviço do ministério da marinha e ultramar.

Ari. 51.° As praças do pret poderão ser transferidas de provincia por conveniencia de serviço ou por opinião das juntas dá saude provinciaes ou pela da junta de saude do ultramar.

Art. 52.° As praças de pret europeias terão direito á reforma, quando estiverem nas condições estabelecidas nos artigos 158.º o 159.°

Art. 53.º As praças do exercito do reino, que forem servir no ultramar, terão direito aos premios de alistamento fixados na tabella n.° 1.

Art. 54.° Os vencimentos das praças de pret europeias são os que constam da tabella n.º 2.

Art. 55.º Os mancebos europeus, que assentarem praça de voluntarios nas unidades das guarnições ultramarinas, ficara nas condições d'aquelles a que se refere o n.º 1.° do artigo 41.°

Art. 56.° Os individuos postos á disposição do Governo e compellidos a assentar praça no ultramar, só terão direito no transporte para a metropole depois de terminado o seu tempo de serviço, quando satisfaçam no preceituado no artigo 13.° da carta de lei de 21 de abril de 1892.

Art. 57.° As praças de pret europeias poderão remir se do serviço militar nas condições do artigo 133.° do regulamento dos serviços do recrutamento do exercito o da armada de 6 de agosto de 1896 com as alterações estabelecidas no artigo 20.° do decreto com força do lei de 19 do outubro de 1901, não tendo direito ao transporto de regresso as que não tiverem completado dois annos do serviço no ultramar, e devendo indemnizar a Fazenda do premio de alistamento que houverem recebido as quo não tiverem completado um anno, sendo obrigadas, tanto umas como outras, a satisfazer os seus debitos á Fazenda o aos conselhos administrativos das unidades a que pertencerem.

Art. 58.° As praças de pret transferidas do exercito do reino, antes do nomeadas para serviço no ultramar, serão inspeccionadas pela junta de saude do ultramar, para reconhecer se toem a robustez e aptidão physica necessarias".

CAPITULO VI

Disposições relativas as praças de pret Indigenas

Art. 59.° O recrutamento das praças de pret indigenas será regulado por diplomas especiaes, relativos a cada provincia ou districto autonomo.

Art. 60.º As condições geraes, a que deverá obedecer o recrutamento das praças indigenas, serão em regra as seguintes:

l.ª O recrutamento far-se-ha:
a) Com voluntarios;

b) Com contractados.

2.ª O tempo de serviço, quer para os voluntarios quer para os contractados, será fixado nos regulamentos provinciaes, e não poderá ser inferior a tres annos nem superior a cinco;

3.ª Conceder-se-hão readmissões successivas, com ou sem gratificações especiaes, por periodos de tres annos, conforme for preceituado nos regulamentos provinciaes;

4.ª Na escolha dos recrutas e seu alistamento, deverá ter-se na maior consideração a aptidão physica dos mancebos, a religião que professam, o seu estado, as qualidades moraes da tribu a que pertençam e que tenham pleno conhecimento das obrigações que contrahem;

5.ª Sempre que não haja inconveniente, os contractos serão feitos por intermedio dos régulos ou chefes de tribus;

6.ª No contracto deverão declarar-se os vencimentos do soldado indigena, discriminando: pret, fardamento e ração nas diversas situações. As rações devem ser fixadas em harmonia com os habitos dos indigenas e poderão ser pagas a dinheiro, por um preço estipulado, quando o governo provincial o julgar conveniente;

7.ª Será garantido aos readmittidos indigenas o direito de constituir familia, respeitando-se-lhes os hábitos e principios religiosos;

8.ª Poderá ser permittido aos readmittidos indigenas viver com a familia em sanzallas, nos termos estabelecidos nos regulamentos provinciaes;

9.ª Quando se cozinhar rancho, deverão ser respeitados os principios religiosos dos indigenas;

10.ª As praças indigenas poderão ser reformadas quando estejam nas condições do artigo 161.°;

11.ª Terminado o tempo du serviço, as praças indigena terão direito ao transporte para a terra da sua naturalidade, quando não queiram continuar a residir na localidade onde tenham recebido a baixa.

§ 1.° Nas provincias ultramarinas onde haja recenseamento regularmente organizado du população, poderá o recrutamento ser feito por sorteio entre os mancebos recenseados.

§ 2.° Poderão ser compellidos ao serviço militar os individuos naturaes das provincias ultramarinas ou districto autonomo que estejam nas condições indicadas no artigo 30.° do decreto com força de lei de 24 de dezembro de 1883.

Art. 61.° Os governadores das provincias e districto autonomo procederão desde já á elaborarão dos regulamentos a que se refere o artigo anterior, para serem submettidos no mais breve prazo á approvação do governo.

Art. 62.° Emquanto não furem decretados os regulamentos sobre o recrutamento das praças indigenas, pertencentes ás guarnições das diversas provincias ou districto autonomo, em que se estipulem vencimentos especiaes paru estas praças, terão ellas os vencimentos designados na tabella n.º 3.

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CAPITULO VII

Organização dos quarteis generaes das provincias ultramarinas e districto autonomo

Art. 63.° Os governadores geraes, governadores do provindas e de districto autónomo do ultramar, serão os commandantes superiores de todas se forças militares da guarnição da respectiva provincia ou districto autonomo, e terão todas as attribuições e competencia conferidas aos generaes commandantes das divisões militares territoriaes o exercito do reino.

Art. 64.° Os governadores dos districtos serão os commandantes das forças da guarnição dos respectivos districtos, com competencia e attribuições do general de brigada, exercendo cominando.

Art. 65.° Os governadores gemeu das provincias ultramarinas terão dois ajudantes de campo, e os governadores de provincias o de districtos terão ura ajudante de campo.

§ 1.° Os ajudantes de campo dos governadores não terão patente superior á do capitão e poderão pertencer ao exercito do reino, á armada ou aos quadros do ultramar.

§ 2.° Os ajudantes de campo estarão sob as immediatas ordens dos respectivos governadores.

§ 3.° Os ajudantes de campo, quando sejam officiaes do exercito do reino ou da armada, terão direito á subvenção mensal a que só refere o artigo 10.°

Art. 66.º Em cada provincia ou districto autonomo, junto ao respectivo governador, haverá um quartel general, com a seguinte composição:

a) Chefe do estado maior;
b) b)Secretaria militar;
c) Conselho de guerra permanente;
d) Chefe do serviço de saude.

Art. 67.° O chefe do estado maior estará, directa e immediatamente subordinado ao governador, com quem despacha todos os negocios militares da provincia ou districto autonomo, e cujas ordens deve transmittir a todas as auctoridades militares.

§ unico. O chefe do estado maior é o chefe da secretaria militar e da 1.ª repartição da mesma secretaria.

Art. 68.° O chefe do estado maior será um official superior ou capitão do serviço do estado maior ou de qualquer arma do exercito do reino, habilitado com o respectivo curso, com preferencia dos quo tiverem o curso de estado maior.

§ unico. Os chefes do estado maior terão direito á subvenção mensal a que se refere o artigo 16.°, correspondente á sua patente, com o augmento do 50 por cento.

Art. 69.° As secretarias militares dividem-se em duas repartições e um archivo geral, com a composição indicada no quadro n.° 1.

§ 1.° A l.ª repartição subdivido-se um duas secções:

a) Incumbe á 1.ª secção: tudo o que diz respeito ao pessoal da respectiva guarnição, sua instrucção, disciplina, collocação, promoções e uniformes; assumptos de justiça; remonta; requisições de material de guerra; publicação da ordem á força armada; escripturação dos registos do matricula o disciplinar dos officiaes, o entrada o saída de toda a correspondencia relativa a assumptos da competencia da repartição.

b) Incumbe á 2.ª secção: tudo que diga respeito á preparação e execução de operações militares; levantamento de plantas, reconhecimentos o trabalhos estatisticos de toda a especie que sejam commettidos a officiaes em serviço militar na provincia ou districto.

§ 2.° Nas provincias do Cubo Verde, S. Thomé e Principe, Macau o districtos da Guiné e Timor, os assumptos da competencia da l.ª repartição estarão classificados por secções, porem, salvo circumstancias extraordinarias, não haverá pessoal privativo para cada uma das secções.

§ 3.° Incumbe á 2.ª repartição: processo, liquidação e fiscalização de todos os vencimentos; contabilidade e escripturação, da carga dos corpos do tropa, praças de guerra e estabelecimentos militares; dividas á Fazenda; ordens de fornecimento e recepção dos artigos; compras de materias primas ou quaesquer artigos; contractos; ordens do receita e despesa aos cofres dos conselhos administrativos; remessa para a Direcção Geral do Ultramar das guias de transferencia dos officiaes que regressam á metropole, e todos os mais assumptos que importam receita ou despesa da fazenda militar e respectiva escripturação.

~

§ 4.° Cada repartição terá o seu archivo a cargo de um amanuense.

§ 5.° Alem dos archivos das repartições haverá um archivo geral, a cargo de um oflieial subalterno dos quadros do ultramar, onde serão convenientemente archivados e catalogados todos os processos findos.

Art. 70.° No Estado da índia e províncias de Angola o Moçambique haverá ura sub-chefe do estudo maior, capitão do exercito do roino habilitado com o curso da respectiva arma, com preferencia dos que tiverem o curso de estado maior.

§ único. O sub-chefe do estado maior, alem de substituir o chefe do estado maior nas suas faltas ou impedimento, desempenhará nu funcçõcs de chefe de uma das secções da l .* repartição.

Art. 71." No Estada da índia e províncias do Angola e Moçambique haverá dois subalternos, adjuntos á 1." repartição da secretaria militar, nas restantes províncias e districto autónomo havwá só um subalterno adjunto.

Art, 72." A 2." repartição da secretaria militar terá por chefe um oíHcinl de administração militar do exercito do reino.

§ 1.° O chefe da 2." repartição será um capitão no Ebtado da índia e províncias de Angola e Moçambique, e um oificial subalterno nas outras províncias e districto. § 2.° Na falta do offioiaes do administração militar, poderá o logar de chefe da 2.a repartição ser desempenhado por um- ofíicial do oxorcito do reino on dos quadros do ultramar.

§ H.0 No Estado da índia e províncias de Angola o Moçambique haverá um adjunto á 2." repartição, oificial subalterno de administração militar ou dos quadros do ultramar.

Art. 73.° Os amanuonsos da secretaria militar serão sargentos; o continuo será um sargento reformado o os serventes cabos ou soldados reformados.

§ único. Quando não haja na província ou districto autónomo praças reformadas para estes serviços, serão nomeadas, cm diligencia, praças do effoctivo das unidades. Art. 74." Em cadu província ultramarina o districto autónomo haverá um conselho de guerra permanente, que funccionará pela forma estabelecida no capítulo ix.

Art. 75.° O chefe do serviço do saúde da província ou districto autónomo ó o chefe do serviço do saúde militar da respectiva província on districto, o como tal tem todas as attribnições u competência que no reino pertencem ao cirurgião em chefe do exercito.

Art. 76." Em cada uma das províncias do Angola o Mo • çambique, adjunto ao quartel general, haverá um oificial superior da arma do artilharia, denominado respectivamente inspector do material de guerra da África Occiden-

o inspector do material de guerra das províncias ultramarinas orientaon, sondo o primeiro encarregado da inspecção do material de guerra nas províncias de Cabo Verde, Guino, S. Thomó e Príncipe e Angola, e o segundo da inspecção do mesmo material no Estado da índia, províncias de Moçambique e Macau e districto de Timor. § único. Servirão de adjuntos ao inspector de material de guerra da África Occidental, nas respectivas províncias, os capitães commandantes da companhia de artilharia do guarnição de Cabo Verde e da bateria de artilharia de Angola, e os officiaes subalternos commandantes das secções de artilharia nas companhias mixtas da Guiné

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71 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

o Principe; e no inspector de material de guerra da provincias orientaes, os capitães commandantes das baterias do Moçambique o India, e companhia de artilharia do guarnição de Macau, e em Timor o official subalterno, commandante da secção de artilharia de uma das companhias mixtas; por este serviço receberão estes officiaes a gratificação mensal de l0$000 réis.

Art. 77.° Em cada provincia ou districto autonomo poderá haver, quando as necessidades do serviço assim e exijam, uma inspecção do engenharia, sob as ordens de um official da arma, de engenharia do exercito do reino.

§ unico Quando o director das obras publicas da provincias ou districto for official, poderá accumular as suas funcções com as de inspector de engenharia, e receberá por este serviço a gratificação mensal de 82$000 réis.

CAPITULO VIII

Das guarnições de 1.ª linha das provincias ultramarinas o districto autonomo

Art. 78.° As guarnições de l.ª linha das provincias ultramarinas o districto autonomo de Timor compõem-se de:

3 Baterias mixtas de artilharia do montanha o guarnição;

l Companhia europeia do artilharia de guarnição;

1 Companhia indigena do artilharia do guarnição;

5 Companhias mixtas do artilharia do montanha e infantaria;

2 Companhia mistas de artilharia do guarnição e infantaria;

3 Esquadrões de dragões;

4 Pelotões independentes de dragões;

6 Companhias européas de infantaria;

32 Companhias indigenas do infantaria;

6 Corroa do policia;

2 Batalhões disciplinares;

8 Companhias de deposito;

9 Bandas de musica.

§ unico. As unidades das guarnições do l.ª linha das provincias ultramarinas o districto autonomo serão distribuidas pelas differentes provincias pela forma indicada no quadro n.° 2.

Art. 79.° Cada uma das baterias mixtas do artilharia do montanha e guarnição (quadro n.° 3), compõe-se de duas secções de artilharia, do montanha e uma secção de artilharia de guarnição.

§ 1.º As duas secções do artilharia de montanha serão commandadas pelo capitão mais moderno da bateria, e poderão constituir, para o serviço de campanha, uma bateria do quatro bocas do fogo, a qual será reforçada com uma secção de duas bocas de fogo; quando as circumstancias o exigirem, para os effeitos de administração, a bateria de montanha será considerada destacada da respectiva unidade.

§ 2.º O commando da bateria mista pertence ao capitão mais antigo d'esta unidade.

§ 3.° Os sargentos da bateria mixta serão provenientes dos corpos de artilharia do exercito do reino; os cabos, soldados serventes, ferradores e corneteiros serão europeus, e indigenas os soldados conductores o auxiliares da secção de artilharia de guarnição.

Art. 80.º A companhia, europeia de artilharia de guarnição terá a composição indicada no quadro n.° 4; os sargentos serão provenientes dos corpos do artilharia do exercito do reino; os cabos, soldados e corneteiros, europeu", o os auxiliares, indigenas.

Art. 81.º A companhia indigena de artilharia de guarnição terá a composição indicada no quadro n.° 5; todas ao praças d'esta companhia serão indigenas, com excepção dos sargentos, que serão provenientes dos corpos de artilheria do exercito do reino.

rt. 82.º Cada uma das companhias mixtas de artilheria de montanha e infantaria (Quadro n.º 6), compõe-se uma secção de artilheria de montanha o dois pelotões de infantaria.

§ 1.° A secção do artilharia de montanha será commandada por um official subalterno de artilharia; os cabos, soldados, serventes e ferradores serão europeus, e indigenas todas as outras praças.

§2.° Metade do numero das praças graduadas dos pelotões de infantaria, pelo menos, será europeia, as outras praças serão indigenas.

Art. 83.° As companhias mixtas do artilharia do guarnição e infantaria (quadro n.° 7), tendo uma composição analoga á das companhias mixtas de artilharia de montanha e infantaria, sendo a secção de artilharia de montanha substituida por outra de guarnição.

§ unico. A secção do artilharia de guarnição será tambem instruida no serviço do montanha, o poderá, quando as circumstancias o exigirem, ser transformada numa secção do artilharia de montanha, para o que serão augmentados ao seu effectivo os soldados conductores e os solipedes necessarios para o transporte do material.

Art. 84.º Cada um dos esquadrões do dragões terá a composição indicada no quadro n.º 8; os sargentos e cabos serão provenientes dos corpos do cavallaria ou artilharia montada do exercito do reino, e os soldados, ferradores o clarins, europeus, havendo os auxiliares indigenas que forem necessarios

Art. 85.° Cada um dos pelotões independentes do dragões (quadro n.° 9), será commandado por um tenente de cavallaria, tendo ás suas ordens um alferes da mesma arma; os sargentos e cabos serão provenientes dos corpos da cavallaria ou artilharia montada do exercito do reino; melado do numero dos soldados, o ferrador e o clarim terão europeus, e indigenas todas as outras praças.

§ unico. Os soldados indigenas são praças apeadas e destinados ao serviço dos postos militares.

Art. 86.° As companhias europeias de infantaria (quadro n.° 10), serão compostas do praças europeias, havendo apenas os auxiliares para o serviço de fachinas e impedidos; os officiaes d'estas companhias serão da arma de infantaria.

Art. 87.º Cada uma das companhias indigenas do infantaria terá a composição indicada no quadro n.° 11, os respectivos officiaes serão da arma de infantaria ou dos quadros do ultramar, o metade, pelo menos, das praças graduadas deverá ser europeia, e indigenas todas as outras praças.

Art. 88.° Os corpos de policia são destinados ás guarnições das cidades da Praia, S. Thomé, Loanda, Lourenço Marques, Nova Goa e Macau.

§ 1.º O corpo do policia da Praia será commandado por um capitão, o terá a composição indicada no quadro n.° 12. Os officiaes serão da arma de infantaria ou dou quadros do ultramar; os sargentos poderão ser provenientes dos corpos do infantaria do exercito do reino ou das forças ultramarinas, e as outras praças indigenas.

§ 2.° Os corpos de policia de S. Thomé e Nova Goa terão uma composição igual á indicada no paragrapho antecedente.

§ 3.º O corpo de policia de Loanda será commandado por um capitão da arma de cavallaria ou de infantaria, o compor-se-ha (quadro n.º 13) do um pelotão de cavallaria e dois do infantaria.

O pelotão de cavallaria será commandado por um official subalterno da arma de cavallaria e todas as praças serão provenientes dos corpos da mesma arma. Os pelotões de infantaria serão commandados por officiaes subalternos da arma do infantaria, e todas as praças de pret, com excepção dos corneteiros, serão européas.

Alem dos tres pelotões, haverá uma secção de auxiliares indigenas, commandada por um official subalterno dos quadros do ultramar, estes auxiliares serão destinados ao serviço policial e do quartel

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SESSÃO N.°6 DE 17 JANEIRO DE 1902

§ 4.° O corpo de policia de Lourenço Marques (quadro n.° 14), terá uma composição analoga á do corpo de policia de Loanda; será, porem, maior o numero de officiaes e praças do pelotão de cavallaria e mais elevado o numero de auxiliares indigenas.

§ 5,° O corpo de policia de Macau será do commando de um major da arma de cavallaria en infantaria, e compor-se-ha (quadro n.° 15) de um pelotão de cavallaria e duas companhias de infantaria, uma europeia e outra indigena.

O pelotão de cavallaria terá composição igual á do pelotão de cavallaria do corpo de policia do Loanda.

A companhia de infantaria europeia será constituida por officiaes e praças da arma de infantaria, provenientes do exercito do reino, e a companhia de infantaria indigena será constituida por mouros naturaes da India e chinas naturaes de Macau; os officiaes d'esta companhia serão da arma de infantaria do exercito do reino ou dos quadros do ultramar, e os sargentos europeus ou macaístan.

Art. 89.º Em cada uma das provincias de Angola e de Moçambique haverá um batalhão disciplinar, onde serão encorporados os deportados do exercito do reino, os individuos que, em virtude das leis vigentes, houverem de ser compellidos a alistamento no ultramar, e as praças transferidas por motivo disciplinar.

§ l,° Os officiaes d`estes batalhões serão da arma de infantaria do exercito do reino ou dos quadros do ultramar, e as praças graduadas serão europeias.

§ 2.° O batalhão disciplinar da provincia de Angola terá quatro companhias e a composição indicada no quadro n.º 16, sendo tres companhias aquartelados em Loanda, destinadas a praças europeias e uma companhia aquartelada em Benguella, destinada a praças indigenas.

§ 3.° O batalhão disciplinar de Moçambique terá analoga composição á do batalhão disciplinar de Angola, tendo, porem, só duas companhias, sendo uma d'ellas destinada a europeus e a outra a indigenas; ambas as companhias serão aquarteladas na cidade de Moçambique, mas em quarteis separados.

§ 4.° As praças transferidas para Angola por motivo disciplinar serão encorporadas no batalhão disciplinar d'esta provincia, e as transferidas para Moçambique no batalhão disciplinar da mesma provincia.

§ 5.° Para o batalhão disciplinar de Angola continua em vigor o regulamento de 19 de outubro de 1900, cujas disposições serão observadas, na parte applicavel, no batalhão disciplinar de Moçambique, emquanto se não formular regulamento especial para este batalhão.

Art, 90.º As companhias de deposito são destinadas a receber as praças que transitarem pelas capitaes dos districtos do litoral das provincias de Angola e Moçambique e ahi esperem transporte. O pessoal permanente de cada uma d'estas companhias é o que está indicada no quadro n.° 17.

§ Unico. As praças em serviço nas mesmas capitaes, que não pertençam ás differentes unidades, e as bandas de musica das provincias de Angola e Moçambique estarão addidas ás companhias de deposito.

Art. 91.° As bandas de musica (quadro n.° 18) poderão ser formadas por musicos provenientes, do exercito do reino, emquanto não houver indigenas em condições de os substituir, ou por musicos indigenas (quadro n.º }9), podendo neste caso o respectivo mestre ser indigena, se o houver, com as necessarias habilitações.

Art. 92.° As unidades europeias são destinadas a reforçar e dar apoio as tropas indigenas; deverão ter os seus quarteis nos pontos mais salubres das provincias de cuja guarnição façam parte, e só serão deslocadas para, o serviço de campanha, ou quando circunstancias especiaes o exijam, não sendo empregadas no serviço de guarnição senão em casos excepcionaes.

Art. 93.º Quando haja conveniencia para o serviço, os esquadrões de dragões poderão reunir-se em grupo de dois ou tres esquadrões, e as companhias de infantaria em grupos de duas a quatro companhias, devendo cada grupo ser commandado por um major ou tenente-coronel da respectiva arma, podendo os grupos das companhias indigenas de infantaria ser commandados por um major ou tenente-coronel dos quadros do ultramar.

§ Unico. Para cada grupo haverá um ajudante, official subalterno da arma de cavallaria ou de infantaria conforme o grupo for de esquadrões ou de companhias europeias de infantaria, e dos quadros ultramarinos se o grupo for de companhias indigenas de infantaria.

Art. 94.° As praças de pret europeias terão aquartelamento e rancho separado das indigenas, ainda que pertençam á mesma unidade.

Art. 95.° As praças indigenas serão agrupadas, tendo em attenção, quanto possivel, a communidade de crenças e de costumes.

Ari. 96.° A todos os officaes em serviço de campanha será fornecido cavallo para sua montada, sempre que seja possivel.

Art. 97.° Quando houver conveniencia para o serviço, serão as muares substituidas por camelos para o transporte de artilharia, e quando não seja possivel remontar cavallos em numero sufficiente para as praças do pret dos esquadrões ou pelotões do dragões, poderão as mesmas praças ser montadas em muares.

Art. 98.° AS diferentes unidades distinguem-se accrescentando á designação que lhes pertencer o nome da provincia ou districto autonomo de cuja guarnição façam parto, e quando houver mais de uma mudado da mesma especie na mesma guarnição, serão essas unidades numeradas seguidamente.

§ unico. Exceptuam se os corpos do policia, que serão designados pelo nome da cidade onde for a sede do seu quartel.

Art. 99.º Em diplomas especiaes serão designadas as localidades para os quarteis da" differentes unidades das guarnições do l.ª linha das provincias ultramarinas e districto autonomo.

Art. 100.º Os effectivos das guarnições das provincias e districto autonomo poderão ser augmentados até ao limito maximo estabelecido nos respectivos quadros, quando circumstancias especiaes assim o exijam e o Governo o auctorize.

Art. 101.º O Governo poderá, em caso de guerra, ou no interesse da manutenção da ordem publica, mandar destacar do uma para outra provincia ou districto autonomo unidades completas ou fracções d'essas unidades, por tempo não superior a um anuo.

§ unico. Os officiaes e praças destacadas nas condições d'este artigo terão dobrados vencimentos do soldo ou pret, emquanto durar este serviço extraordinario.

Art. 102.° Quando se reconheça a necessidade ou conveniencia de augmentar a guarnição das provincias ou districto autonomo do ultramar, e as receitas d'essas provincias ou districto o permitiam, o Governo poderá decretar a criação de novas unidades, assim como poderá reduzi Ias, quando as circumstancias o aconselharem.

CAPITULO IX

Dos tribunaes militares

Ai t. 103.º Os conselhos do guerra permanentes das provincias ultramarinas e districto autónomo de Timor, serão compostos o funccionario pela forma estabelecida na carta de lei de 26 do maio de l896, com as alterações mencionadas nos artigos seguintes.

Art. 104.º O logar do auditor junto dos conselhos de guerra territoriaes será desempenhado:

Nas provincias de Angola, Moçambique o Estado da India, por um juiz de 1.ª instancia com o vencimento de 1:000$000 réis da categoria e 500$000 réis de exercicio;

Nas províncias de Cabo Verde, S. Thomé, Macau e dis-

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tricto de Timor, pelo conservador da comarca onde funccionar o conselho de guerra;

Na provincia da Guino, pelo respectivo auditor.

§ unico. O auditor dos conselhos de guerra da provincia de Moçambique terá um augmento de 30 por conto nos respectivos vencimentos, quando o conselho de guerra funccionar em Lourenço Marques.

Art. 105.° Um dos adjuntos da secretaria militar desempenhará as funcções de promotor de justiça.

§ unico. Quando o conselho de guerra funccionar fora da sede da secretaria militar, será nomeado para desempenhar as funcções de promotor um official subalterno da guarnição do districto onde reunir o conselho.

Art. 106.° O logar de defensor officioso será exercido por um capitão ou subalterno, accumulando este serviço com o de outra commisão na provincia ou districto.

Art. 107.º O logar de secretario será exercido pelo archivista geral da secretaria militar.

§ unico. Quando o conselho de guerra funccione fora da sede da secretaria militar, será nomeado para desempenhar o logar de secretario um alferes da guarnição do districto onde reunir o conselho.

Art. 108.° Os conselhos de guerra funccionarão ordinariamente nas capitaes das provincias ou districto autonomo, mas poderão, quando as circumstancias o exigirem, funccionar na localidade que for superiormente designada.

Art. 109.° Os conselhos governativos das provincias ultramarinas, quando exerçam o governo, os secretarios geraes e os secretarios de governo de provincia e districto autonomo, fazendo as vezes de governadores, o officiaes exercendo governo, teem a competencia e as attribuições estabelecidas na carta de lei de 26 de maio de 1896 para os governadores das provincias ultramarinas.

Art. 110.° A auctoridade a quem compete mandar executar as sentenças, nos termos dos artigos 515.º e seguintes do codigo de justiça militar, é a competente para determinar qual das penas applicadas alternativamente ha de ser cumprida.

Art. 111.° Continuam em vigor as disposições do decreto com força de lei de 22 de dezembro de 1900, relativamente aos conselhos de disciplina dos districtos e provincias ultramarinas.

§ unico. Os conselhos de disciplina da força armada das companhias privilegiadas terão as attribuições indicadas para os conselhos de disciplina dos districtos e provincias ultramarinas, conferidas pelo decreto mencionado n'este artigo.

CAPITULO X

Dos depositos de material de guerra

Art. 112.° Na capital de cada provincia ou districto autonomo haverá um deposito de material do guerra sob a inspecção superior e fiscalização do respectivo inspector do material de guerra ou do seu adjunto.

§ 1.° Cada deposito de material do guerra estará a cargo de um alferes de artilharia ou de um primeiro sargento da mesma arma.

§ 2.° Em cada deposito haverá o numero de sargentos amanuenses, cabos fieis e auxiliares indigenas que for julgado necessario, fixado pelo governador, sob proposta do inspector do material de guerra ou seu adjunto.

§ 3.° Nas praças de guerra haverá um commandante do respectivo material, que será um alferes ou primeiro sargento de artilharia, encarregado especialmente d'este serviço, ou o ajudante da praça.

§ 4.° Sempre que for julgado conveniente, haverá depositos de material de guerra nas capitaes dos districtos, sendo-lhes applicavel o disposto nos paragraphos anteriores.

Art. 113.° Todo o material que não estiver distribuído ás differentes unidades ou ás praças de guerra e pontos fortificados estará a cargo dos depositos de material de guerra.

Art. 114.º Todas as reparações do material de guerra que possam ser feitas no ultramar, serão executadas nos depositos de material de guerra, aos quaes estarão addidos os artífices que forem necessarios.

CAPITULO XI

Do estado maior das praças de guerra e pontos fortificados, e depositos de condemnados

Art. 115.° As praças de guerra das províncias ultramarinas são as seguintes:

a) Na Guiné, a praça de Bissau;

b) Em Angola, as fortalezas de S. Miguel e S. Filippe;

c) Em Moçambique, a, fortaleza de S. Sebastião;

d) Na India, as praças da Aguada, do Damão e Diu;

e) Em Macau, a fortaleza do Monte.

Art. 116.° Os estados maiores das praças do guerra serão constituidos por officiaes em serviço activo, podendo accumular estas funcções com outras commissões.

§ 1.° Os governadores das praças de Damão e Diu serão os governadores dos respectivos districtos.

§ 2 ° O major da praça de Damão será o commandante da companhia de guerra aquartelada em Damão; o major da praça de Diu será o commandante do destacamento; o major da praça da Aguada será o commandante da força ali aquartelada.

Art. 117.° Os commandos dos pontos fortificados não comprehendidos no artigo 115.° serão desempenhados por officiaes em serviço activo, que tenham outras commissões, ou por officiaes reformados.

Art. 118.° Em cada uma das provincias de Angola e Moçambique haverá em uma praça de guerra ou ponto fortificado, depositos de condemnados, sob o commando de officiaes em serviço activo, com a organização estabelecida em regulamentos formulados pelos respectivos governadores geraes e approvados pelo Ministro da Marinha e Ultramar.

CAPITULO XII

Do serviço de saude

Art. 119.° O serviço de saude militar nas provincias e districto autonomo do ultramar continuará a reger-se pela carta de lei de 28 de maio do 1896, sendo augmentados os respectivos quadros de saude pela forma seguinte:

a) Cabo Verde e Quine:

Dois facultativos de 2.ª classe,

b) Angola o S. Thomé e Principe:

Tres facultativos de l.ª classe e seis de 2.ª

c) Moçambique:

Um facultativo de l.ª classe e tres de 2.ª

d) Macau e Timor:

Dois facultativos de 2.ª classe.

Art. 120.° Em caso de urgentes necessidades do serviço militar, poderão ser nomeados para irem fazer serviço nos quadros do saude do ultramar, em conformidade cora o disposto no capitulo II, os medicos do exercito do reino.

Art. 121.º Em todas as localidades em que não haja hospitaes, organizar-se-hão enfermarias regimentaes dirigidas pelos facultativos mais graduados, que desempenharem o serviço clinico das foiças aquarteladas nessas localidades.

§ unico. Compete tambem aos facultativos que desempenharem o serviço medico das unidades organizar, em harmonia com as instrucções do chefe do serviço de saude, o material sanitario de campanha necessario para a sua mobilização, que deverá estar sempre prompto a servir.

Art. 122.° Todas as forças europeias de composição igual ou superior a um pelotão do cavallaria ou de infantaria

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europeias, a nina secção do artilharia ou a uma companhia do infantaria indigena, serão acompanhados, quando marcharam ou destacarem para localidade onde não haja facultativo do quadro do saude, por um facultativo do 2.ª ou 3.ª classe.

Art. 123.° Quando se organizem columnas de operações, alem dos facultativos, pessoal do serviço do saude e material sanitario regimental pertencentes ás unidades que fizerem parte das columnas, constituir-se-ha uma ambulancia do columna de operações dirigida por uni facultativo de l.ª ou de 2.ª classe, coadjuvado por um facultativo de 2.ª ou de 3.ª classe, quando o effectivo da columna seja superior a seiscentos homens da tropa do l.ª linha, com o pessoal do serviço do saude e material estabelecido em regulamento especial.

Art. 124.º Quando a importancia das operações o exigir, poder-se-hão organizar hospitaes moveis e depositos e convalescentes o estropeados.

Art. 125.° Para o serviço privativo dos corpos do tropa, para cuidarem do material sanitario do campanha e desempenharem os mais serviços que lhe forem ordenados pelos facultativos, haverá o pessoal de enfermagem e auxiliar que for julgado necessario, destacado das respectivas companhias de saude, cujos effectivos serão proporcionalmente augmentados.

§ unico. Salvo circumstancias extraordinarias, toda a força com o effectivo indicado no artigo 122.°, quando marchar, será acompanhada, pelo menos, por um enfermeiro e dois soldados serventes.

Art. 126.° Em cada bateria, esquadrão, companhia ou pelotão de cavallaria independente haverá, instruidos como maqueiros, oito soldados para a guarnição do duas macas, commandados por um cabo. Nos grupos de esquadries ou de companhias, haverá um segundo sargento encarregado do cominando das guarnições das macas.

Art. 127.° Nas unidades do tropas montadas haverá os veterinarios indicados nos respectivos quadros.

§ unico. Os veterinarios serão nomeados de entre os veterinarios do exercito do reino, em conformidade com o disposto no capitulo II.

Art. 128.° Em todas as provincias ultramarinas e districto autonomo do Timor, com excepção das provincias da Guiné o do Macau, seroo estabelecidos sanatorios, dirigidos por facultativos de 1.ª classe, podendo ter um facultativo de 2.ª ou 3.ª classe para os auxiliar e o numero de enfermeiros o roais pessoal do serviço do saude quo for julgado necessario o que será augmentado aos effectivos das respectivas companhias de saude.

CAPITULO XIII

Dos serviços de administração militar

rt. 129.° Os serviços do administração militar serão desempenhados sob a direcção o fiscalização da 2.ª repartição da secretaria militar, e comprehendem:

a) A gerencia dos fundos destinados tis desposas militares e sua fiscalização;

b) A acquisição, arrecadação, conservação o distribuição dos viveres e forragens, dos artigos de fardamento, vestuario e calçado, o dos do mobiliario e utensilios.

Art. 130.º Haverá nos districtos das provincias do Angola e Moçambique delegações da 2.ª repartição da secretaria militar, dirigidas por um official subalterno de administração militar, ou por um subalterno dos quadros do ultramar, encarregado da direcção dos serviços da mesma administração nos respectivos districtos.

Art. 131.° A fiscalização da gerencia dos conselhos administrativos será executada pelo chefe da 2.ª repartição da secretaria militar, ou seu adjunto, poios chefes das do legações da referida 2.ª repartição e pelos fiscaes de administração militar.

§ 1.º Em cada uma das provincias de Angola e Moçambique haverá quatro fiscaes para auxiliar o serviço da fiscalização, e no Estado da India dois.

§ 2.° A fiscalização da gerencia dos conselhos administrativos das unidades e estabelecimentos militares será feita pelo menos duas vezes por anno.

Art. 132.° Na sede de provincia ou districto autonomo, sob a direcção e fiscalização do chefe da 2.ª repartição da secretaria militar, haverá os seguintes depositos:

a) Do viveres e forragens;

b) De fardamento, vestuario o calçado;

c) De mobilia e utensilios.

§ 1.° Nas provincias do Angola, Moçambique e estado da India, o adjunto á 2.ª repartição da secretaria militar será o encarregado da escripturação dos depositos.

§ 2.° Em cada província ultramarina o districto autonomo haverá o numero do sargentos amanuenses e chefes de depositos, cabos fieis e auxiliares indigenas que for fixado pelo Governo, sob proposta do governador da provincia ou districto.

§ 3.º Quando só julgar conveniente, poderão estabelecer-se junto dos depositos, officinas de alfaiate o sapateiro, para manufacturarem os artigos de uniforme e calçado necessarios para as forças militares da guarnição da provincia ou districto.

Art. 133.º Nos districtos em que se estabelecerem delegações da 2.ª repartição da secretaria militar, poder-se-tão constituir depositos de viveres e forragens, de fardamento, vestuario o calçado, e de mobilia e usensilios, sob a direcção do chefe da respectiva delegação, sendo-lhes applicaveis as disposições dos paragraphos do artigo anterior.

Art. 134.° Um regulamento especial da administração da fazenda militar no ultramar fixará as regras geraes para o funccionamento dos serviços do administração militar nas provincias a districto autonomo do ultramar.

§ unico. Instrucções especiaes, elaboradas pelos respectivos governadores o approvadas pelo Ministro da Marinha o Ultramar, fixarão as regras especiaes necessarias para o funccionamento dos serviços de administração militar nas diversas provincias e districto autonomo.

CAPITULO XIV

Dos officiaes em commissão

Art. 135.º Consideram-se na situação de commissão na respectiva provincia ou districto todos os officiaes combatentes ou não combatentes que não façam parto dos corpos do tropas e quo desempenhem qualquer commissão de serviço militar, ou algumas das de serviço publico que devam ser desempenhadas por officiaes.

Art. 136.º Nas provincias ultramarinas e districto autonomo haverá os inspectores necessarios para as unidades das guarnições de cada uma d'ellas, os quaes serão distribuidos pela seguinte forma:

) Em Gabo Verde, um major de artilharia ou infantaria do exercito do reino;

b) Na Guino o em Timor, um major de cavallaria ou infantaria do exercito do reino, ou um official superior dos actuaes quadros do ultramar;

c) Em S. Thomé o Principe, um major de infantaria do exercito do reino ou um official superior dos actuaes quadros do ultramar;

d) No Estado da India o em cada uma das provincias de Angola e Moçambique será inspector das unidades europeias o dos grupou do esquadrões ou companhias um coronel de qualquer das armas de artilharia, cavallaria ou infantaria;

c) Por cada duas companhias mixtas ou de infantaria indigena isolados do Estado da India e das provincias do Angola e Moçambique haverá um inspector, quo será major da infantaria do exercito do reino ou official superior dos actuaes quadros do ultramar;

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f) Em Macau será inspector das unidades um tenente coronel do qualquer das armas de artilharia ou infantaria.

§ 1.° Os majores e tenente-coroneis do exercito do reino de que trata este artigo poderão, quando sejam promovidos ao posto immediato, continuar no serviço que estiverem desempenhando.

§ 2.º Os cargos de inspectores das unidades das provincias de Cabo Verde, Guiné, S. Thomé e Macau e Timor, são accumulaveis com os de chefe do estado maior das mesmas provincias, quando os inspectores sejam officiaes do exercito do reino, habilitados com o curso da respectiva arma.

§ 3.º Ou inspectores serão acompanhados nas inspecções por um ajudante e um official do administração militar.

Art. 137.° Os officiaes que desempenharem as commissões abaixo designadas, serão comprehendidos no quadro do commissões da respectiva provincia ou districto:

a) Na provincia da Guiné, commandantes militares;

b) Na provincia de S. Thomé e Principe, secretario do governo da Ilha do Principe;

c) Na provincia do Angola, secretarios dos governos dos districtos subalternos, chefes de concelho, residentes, capitães-mores, commandantes militares o no deposito de condemnados;

d) Na provincia de Moçambique, os secretarios dos governos dos districtos subalternos, capitães-mores, commandantes militares, intendentes, secretarios de intendencias a das capitães-mores;

e) No Estado da India, os secretarios dos governos dos districtos subalternos, commandantes militares o no ser viço de policia de 2.ª linha;

c) Na provincia do Macau, commandante militar da Taipa;

g) No districto do Timor, commandantes militares.

Art. 138.° Os officiaes do quadro do commissões, quando não esteja expressamente determinado no presente decreto o quadro o a arma ou serviço a que devem pertencer, poderão ser officiaes do exercito do reino ou dos quadros do ultramar.

Art. 139.° E permittida a accumulação de commissões sempre que não haja prejuizo para o serviço, percebendo o official pela commissão que extraordinariamente desempenhar a respectiva gratificação do exercicio.

Art. 140.° O Governo poderá nomear os officiaes do exercito do reino que julgar convenientes para o desempenho de qualquer commissão ou inspecção extraordinaria dos serviços militares do ultramar, na conformidade do artigo 17.º

CAPITULO XV

Do deposito de praças ao ultramar

Art. 141.° O deposito de praças do ultramar estará sob as immediatas ordens da Direcção Geral do Ultramar, e é desatinado a receber como addidos todos os officiaes e praças de pret das guarnições das provincias ultramarinas e districto autonomo que, por qualquer motivo, vierem ao reino, ou que do exercito forem servir no ultramar, os que voluntariamente se alistarem para ali servir, e as praças reformadas do ultramar, residentes na metropole.

Art. 142.° O deposito de praças do ultramar tora o seu quartel em Lisboa, havendo para o serviço do mesmo deposito o pessoal permanente indicado no quadro n.° 20.

§ 1.º As praças que fizerem parte do deposito e a elle estiverem addidas, serão distribuidas por tres divisões, que serão commandadas por officiaes subalternos:

a) Na l.ª divisão serão encorporados, as praças do quadro do deposito, os aspirantes a facultativos do ultramar e os praticantes do enfermeiro";

b) Na 2.ª, as praças addidas com destino ao ultramar ou quo d'ali tenham regressado;

c) Na 3.ª, as praças reformadas.

§ 2.º Os sargentos serão distribuidos pelas tres divisões, conforme as necessidades do serviço.

Art. 143.° O quadro dos officiaes do deposito será preenchido por officiaes de infantaria do exercito do reino habilitados com o respectivo curso e que tenham servido no ultramar como officiaes, requisitados ao Ministerio da Guerra para servir em commissão no Ministerio da Marinha e Ultramar.

§ unico. Os vencimentos dos officiaes serão iguaes aos do exercito do reino, tendo o commandante a gratificação mensal de 20$000 réis, os officiaes subalternos commandantes das divisões a de 10$000 réis e os outros officiaes subalternos a do 5$000 réis.

Art. 144.° As praças do pret do quadro de deposito, com excepção dos segundos sargentos e primeiros cabos, serão transferidas dos corpos de infantaria do exercito do reino de entre as que tiverem bom comportamento.

§ 1.° Os segundos sargentos e primeiros cabos serão dos corpos de infantaria do exercito do reino em diligencia no deposito.

§ 2.° Os vencimentos das praças de pret serão iguaes aos das do exercito do reino, em serviço na guarnição de Lisboa, tendo alem crestes vencimentos, o sargento ajudante a gratificação de 200 réis diarios, os primeiros sargentos a de 16O réis, e os segundos sargentos a de 120 réis.

Art. 145.° As praças addidas, só quando sejam nomeadas para serviço, é que receberão gratificação de guarnição, quo será igual á das praças do quadro do deposito.

Art. 146.° Haverá um conselho administrativo presidido pelo commandante do deposito, de que serão vogaes o official mais graduado, e em igualdade de graduação, o mais antigo, e o official de administração militar, que desempenhará as funcções do thesoureiro, servindo de secretario um official subalterno.

§ unico. Por intermedio d'este conselho administrativo se fará a arrematação ou acquisição dos artigos para rancho, do fardamento, vestuario e calçado para as praças do deposito e addidas, e tambem para as guarnições das provincias ultramarinas, quando for determinado pela Direcção Geral do Ultramar, assim como de quaesquer outros artigos destinados aos corpos ou estabelecimentos militares do ultramar.

Art. 147.º Junto ao deposito poderão funccionar casões para a manufactura e concerto do artigos de fardamento e de calçado, para o quo haverá os mestres o operarios necessarios.

Art. 148.° O serviço clinico do deposito será desempenhado por um facultativo dos quadros de saúde do ultramar, em commissão no mesmo deposito.

Art. 149.° No deposito haverá uma enfermaria destinada ao tratamento das praças de pret.

§ unico. Quando, pela gravidade da doença, se não possa fazer ás praças o conveniente tratamento na enfermaria do deposito, serão estas praças tratadas no hospital da marinha ou outro que seja superiormente determinado.

Art. 150.° O serviço do deposito será considerado, para os effeitos de promoção ao posto immediato, como executado nos corpos da arma a quo pertencer o pessoal do respectivo quadro.

Art. 151.º O serviço de fiscalização da escripturação e contabilidade do deposito será desempenhado pelo official de administração militar adjunto á 7.ª Repartição da Contabilidade Publica.

Art. 152.° O deposito terá um regulamento especial; emquanto este regulamento não estiver em execcução, a escripturação, administração e contabilidade o serviço interno do deposito serão feitos em harmonia com os regulamentos o leia decretada para o exercito do reino".

Art. 153.º O uniforme dos officiaes o praças do pret será igual ao que se acha determinado no plano de uniformes do exercito do reino para a infantaria, tendo ape-

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nau em substituição do numero designativo do corpo as iniciaes D U.

Art. 151.° O armamento, correame e equipamento terá o adoptado para a infantaria do exercito no reino.

Art. 155." A despesa feita com o deposito do praças do ultramar será paga pelo Ministerio da Marinha e Ultramar, devendo as provincias ultramarinos o districto autonomo indemnizar o mesmo Ministerio das quantias dispendidas com os vencimentos das praças das guarnições o reformados d'essas provincias ou districto.

CAPITULO XVI Dos reformados

Art. 156.° Os officiaes dos quadros do ultramar serão reformados quando forem julgados incapazes do serviço pelas juntas do bando das provincias ultramarinas o districto autonomo, ou pula junta de saude do ultramar.

§ unico. A classificação da reforma será publicada no Boletim Militar do Ultramar, quando na Direcção Geral do Ultramar se recebam das provincias ultramarinas ou districto autonomo a liquidação do tempo de serviço e necessarios esclarecimentos.

Art. 157.° A reforma doa officiaes doa quadros do ultramar regular-se-ha pelas disposições da carta na lei do 10 de julho do 1889 o decreto com força do lei do 29 do agosto de 1895, com as seguintes alterações:

l.ª Os tenentes pertencentes ao quadro de quo trata o artigo 22.°, quando tenham trinta o cinco annos do serviço o dez no posto de tenente, terão direito a reforma com o soldo do capitão, augmento de 30 por cento sobro o soldo o graduação do major.

2.ª Os mesmos officiaes, quando tenham mais do trinta annos de serviço a menos de trinta e cinco, e dez no posto de tenente, terão direito a reforma com o saldo o graduação de capitão.

3.ª O augmento de tempo do serviço para a reforma, por servido feito no ultramar, será regulado pela forma estabelecida no artigo 178.° para os officiaes europeus, o para os naturaes das provincias ultramarinas, quando servirem em provincia differente d'aquella de onde forem naturaes.

Art. 158.° Os sargentos ajudantes e primeiros sargentos europeus das guarnições ultramarinas com vinte e cinco ou mais annos de bom o effectivo serviço, sendo, pelo menos, vinte nas fileiras, terão direito a ser reformados com a graduação do alferes e o vencimento maximo designado na tabella n.º 4.

§ unico. Esta reforma é ostensiva aos actuaes sargentos quarteis-meatres europeus dos quadros do ultramar.

Art. 159.° Os sargentos ajudantes, primeiros sargentos e sargentos quasteis-mestres europeus das guarnições ultramarinas quo não estejam nas condições indicadas no artigo antecedente, e todas as outras praças do pret europeias das mesmas guarnições, serão reformadas, nos postos ou graduações que tiveram á data da reforma, quando estiverem em qualquer das seguintes circumstancias:

l.ª Terem completado no serviço activo cincoenta e dois annos de idade.

2.ª Terem sido julgados incapazes do serviço activo, com mais de quinze annos de serviço, ou com qualquer tempo de serviço, se a incapacidade tiver resultado:

a) De ferimento ou accidente occorrido em combate;

b) De ferimento ou accidente occorrido na manutenção da ordem publica ou no desempenho do devores militares;

c) De doença chronica adquirida no serviço de campanha, que impossibilite de ganhar os meios de subsistencia.

Art. 160.° O vencimento unico das praças do pret européas reformadas do ultramar será, para as differentes classes, e designado na tabella n.° 4, tendo direito:

a) Ao vencimento total, que constituirá a maxima pensão do reforma, as praças que forem reformadas por terem completado cincoenta o dois annos de idade, as que forem julgadas incapazes, com trinta ou mais annos de serviço, e as que estiverem nas condições da alinea a) do n.° 2.° do artigo antecedente;

b) A 80 por cento da pensão as que forem julgadas incapazes, com vinte e cinco a trinta annos de serviço, e as que estiverem nas condições da alinea b) do mesmo numero e artigo;

c) A 80 por cento da pensão as que forem julgadas incapazes, com vinte a vinte e cinco annos de serviço, e as que estiverem nas condições da alinea c) do mesmo numero o artigo;

d) A 50 por conto os que forem julgadas incapazes com quinze a vinte annos de serviço.

§ unico. Serão accumulaveis com estes vencimentos as pensões estabelecidas pela curta do lei de 8 do junho do 1863 e pelo decreto com força do lei de 17 de fevereiro do 1801, que será applicado ás praças europeias do ultramar.

Art. 16l.° As praças de pret indigenas serão reformadas nos postos ou graduações que tiverem á data da reforma, quando estiverem em qualquer das seguintes circunstancias:

1.ª Terem completado no serviço activo cincoenta e dois annos de idade o trinta ou mais de serviço nas fileiras.

2.ª Terem sido julgadas incapazes do serviço por qualquer dos seguintes motivos:

a) Ferimento ou accidente occorrido em combato;

b) Ferimento ou accidente occorrido na manutenção da ordem publica ou no desempenho dos deveres militares.

unico. Estas praças terão como vencimento unico o pret que recebiam na effectividade do serviço.

Art. 162.° Os sargentos ajudantes, primeiros sargentos e sargentos quarteis-mestres, naturaes das provincias ultramarinas, quo estiverem nas condições indicadas no artigo l58.°, serão, na reforma, graduados no posto do alferes.

Art. 163.° Para effeito de reforma não será contado o tempo de licença registada, nem aquelle em que as praças estiverem detidas, soffrendo prisão disciplinar ou correccional, presas para conselho de guerra, salvo quando houverem sido absolvidas, o cumprindo pena imposta por sentença.

Art. 164.° As praças de pret europeias reformadas serão encorporadas no deposito do praças do ultramar, o as indigenas na companhia ou secção de reformados ou numa unidade da guarnição da provincia do onde forem naturaes. Só as praças preferirem continuar a residir na provincia onde foram reformados, serão nesse caso encorporadas na companhia ou secção do reformados ou na unidade da guarnição d'essa provincia para esse fim designada.

§ unico. As praças reformadas no ultramar terão direito ao transporte de regresso á metropole se forem europeias e á provincia da sua naturalidade se forem indigenas.

Art. 105.° Quando o numero de praças residentes em qualquer das provindas ultramarinas ou districto autonomo for superior a cem, estas praças constituirão uma companhia, se esse numero for inferior a cem mas superior cincoenta, constituirão uma secção, e se ainda forem em menor numero, serão addidas ás companhias do deposito ou a outra unidade da provincia, conforme for superiormente determinado.

§ 1.° Cada companhia ou secção será commandada por um official reformado, um perceberá a gratificação de 5$000 reis, e só na falta de official reformado nas circumstancias do exercer ouse cominando será substituido por um subalterno dos quadros do ultramar.

§ 2.º O pessoal destinado á escripturação o administração será tanto quanto possivel tirado da classe dos reformados.

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Art. 166.° As praças de pret reformadas poderão ser empregadas em serviços militares compativeis com o seu estado physico e aptidão.

§ unico. Quando pelo serviço que desempenharem não tiverem gratificação especial, terão direito a quartel, cama, abono de pão e auxilio para rancho, se estiverem arranchadas.

Art. 167.° As praças que não forem empregadas em serviço militar, será concedida licença para residir na localidade, que mais lhes convenha, da metropole ou provincias ultramarinas, não tendo direito a transporte e devendo apresentar-se periodicamente á auctoridade civil ou militar d'essa localidade nas épocas que lhes forem fixadas.

§ único. As praças que, sem motivo justificado, se não apresentarem durante tres meses consecutivos ás auctoridades a que estiverem subordinadas, perderão o direito á pensão de reforma e serão eliminadas da companhia ou secção de que fizerem parte.

Art. 168.° Só gozarão das disposições do presente decreto, relativamente a vencimentos, as praças que se reformarem depois da sua publicação; todas as outras conservarão os vencimentos que actualmente percebem.

CAPITULO XVII

Das tropas de 2.ª linha

Art. 109.° Nas provincias e districtos autonomos do ultramar são consideradas tropas de 2.ª linha aquellas que, embora regularmente organizadas, só prestam serviço militar remunerado fora das épocas destinadas á sua instruccão, por circumstancias de força maior ou em vista de qualquer revolta, insurreição, guerra interna ou externa.

§ unico. São corpos irregulares de 2.ª linha os formados exclusivamente do elementos indigenas, e cujos quadros dirigentes não estão habitualmente em proporção com a força enquadrada, segundo as regras da tactica.

Art. 170.º Os governadores das provincias ultramarinas e districto autónomo, tendo em vista as disposições do decreto com força do lei de 19 de julho do 1894, proporão ao Governo o numero de unidades, sua organização, composição e vencimentos, que deve constituir a força de 2.ª linha da respectiva provincia ou districto.

§ unico. Emquanto não forem decretadas disposições especiaes relativamente ás tropas de 2.ª linha, continua em vigor o que actualmente só acha estabelecido.

CAPITULO XVIII

Disposições diversas e transitorias

Art. 171.° Pela Direcção Geral do Ultramar continuará a fazer-se a publicação do Boletim Militar do Ultramar, criado por decreto de 19 de junho de 1878.

Art. 17á.° Em cada uma das provincias ultramarinas ou districto autonomo se publicará a Ordem á força armada, na qual serão transcriptas todas as determinações insertas no Boletim Militar do Ultramar, que digam respeito á guarnição e serviços militares da provincia ou districto, e determinações provinciaes relativas á mesma guarnição o serviços, a qual será distribuida a todas as unidades e estabelecimentos militares da provincia ou districto.

§ unico. Fica supprimida qualquer publicação que, sob outro titulo, mas para identico fim, se imprima e distribua em alguma das provincias ultramarinas.

Art. 173.° A promoção dos officiaes dos actuaes quadros do ultramar continuará a regular-se pelo decreto com força de lei de 4 de agosto de 1898, até á completa extincção dos mesmos quadros, sendo as condições de aptidão physica, comporta mento, tempo do serviço e competencia profissional, verificadas segundo as regras estabelecidas no capitulo II do titulo II da carta de lei de 12 de junho de 1901. Sobre preterição e recursos, seguir-se-ha tambem o que se acha preceituado no titulo IV da mesma lei.

§ l.° O conselho superior de disciplina do ultramar é o competente para tomar conhecimento dos recursos contra preterição, apresentados pelos officiaes dos quadros do ultramar.

§ 2.° Quando o conselho superior de disciplina reunir para os fins do paragrapho antecedente, fará parte do mesmo conselho, com voto consultivo, o auditor de marinha ou o seu substituto.

Art. 174.° A doutrina do artigo precedente, na parte que diz respeito ás condições de promoção, preterição e recursos, é applicavel aos subalternos do quadro a que se refere o artigo 22.°

Art. 175.° Os officiaes dos quadros do ultramar poderão ser empregados em commissões civis ou militares nas provincias a que pretençam ou em outra que lhes for designada pelo Governo, podendo, tambem, servir nas companhias privilegiadas, quando para isso sejam requisitados, não deixando, pelo facto de desempenhar essas commissões e serviços, vaga no respectivo quadro.

Art. 176.º Os actuaes sargentos ajudantes, primeiros sargentos e sargentos quarteis-mestres das guarnições do ultramar poderão, quando estejam nas condições de ser promovidos a alferes, segundo a lei vigente no ultramar, e assim o requeiram no prazo de seis meses depois da publicação d'este decreto, ser promovidos a alferes do quadro a que se refere o artigo 22.º

§ unico. A estes sargentos poderá ser dispensada a condição 5.ª designada no artigo 5.° do decreto com força do lei do 4 de agosto de 1898, se satisfizerem a todas as outras condições.

Art. 177.° A collocação ou transferencia dos officiaes nas differentes unidades ou commissões militares da mesma provincia ultramarina ou districto autonomo, será ordenada pelo respectivo governador, excepto quando os officiaes tenham sido especialmente nomeados pelo Governo, para determinadas commissões ou serviços.

§ unico. Os officiaes que forem nomeados pelo Governo para o serviço das unidades das provincias ou districto, não poderão ser desviados para outras commissões.

Art. 178.° Aos officiaes e praças de pret do exercito do reino que forem servir no ultramar, será contado, no tempo que ahi permanecerem, e para o effeito de reforma e outras recompensas, um augmento de:

60 por cento na Guiné, Timor e S. Thomé e Principe;

50 por cento em Moçambique e Angola;

30 por cento na India, Macau e Cabo Verde.

§ 1.° Quando o serviço seja prestado em campanha, será o tempo contado pelo dobro.

§ 2.° O augmento de tempo de serviço, a que se refere este artigo, não aproveita para a contagem dos prazos que tenham de ser passados nos postos ou no serviço effectivo de tropas, designados na carta de lei de 12 de junho de 1901.

§3.° Quando os officiaes sejam naturaes das provincias ultramarinas, só se contará o augmento sobre o tempo de serviço quando sirvam em provincia differente d'aquella do onde são naturaes.

Art. 179.° O disposto no artigo antecedente é extensivo aos officiaes dos quadros do ultramar e aos subalternos do quadro fixado no artigo 22.°, quando sejam europeus, e ás praças de pret europeias que tenham sentado praça nas unidades das guarnições ultramarinas; e o disposto no § 3.° do mesmo artigo aos officiaes e praças de pret naturaes das provincias ultramarinas.

Art. 180.° São unicamente considerados europeus, para os effeitos d'este decreto, os filhos de pae o mãe europeus de côr branca.

Art. 181.º Nas provindas da Guiné, S. Thomé e Principe, Angola, Moçambique, e districto de Timor, será abonado aos officiaes do exercito do reino, em commissão ordinaria do serviço militar no ultramar, quando lhe não possa ser distribuido aquartelamento, um subsidio mensal para renda do casas, não superior a 10$000 réis.

§ unico. Identico abono será feito aos officiaes dos qua-

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dros ultramarinos, quando sirvam nas referidas provincias, e não haja para elles os aquartelamentos necessarios.

Art. 182.° As actuaes pragas do pret europeias das guarnições ultramarinas, que excederem ou quadros das differentes unidades, poderão ser transferidas para as provincias ou districtos que o governo designar.

Art. 183.º As praças de pret europeias que estiverem desempenhando serviços a que correspondam vencimentos superiores aos estabelecidos neste decreto, conservá-los-hão, até serem substituidas, se não preferirem continuar a servir cora os novos vencimentos.

§ unico. As praças indigenas que estiverem nas mesmos circumstancias serão dispensadas do serviço, se não quiserem continuar a servir nas condições estabelecidas n'este decreto.

Art. 184.º O Governo fixará annualmente o numero de praças do pret europeias o indigenas que poderão sor readmittidas nas guarnições das diversas provincias o districto autonomo.

Art. 185.° Ficam revogadas as seguintes disposições:

1.ª Do artigo 21.º do decreto com força do lei de l do dezembro de 1869, que concedo as honras e graduação do coronel do segunda linha aos secretarios geraes dos governos das provincias ultramarinas;

2.ª Do artigo 6.° do decreto com força de lei do 80 de dezembro do 1897, que concedo as honras de major ao secretario do governo de Timor;

3.ª Do § 2.a do artigo 18.° do decreto com força de lei de 2 do dezembro de 1869, que concedo graduações aos officiaes do exercito do reino em serviço no ultramar;

4.ª Dos §§ 1.°, 2.º o 3.° do artigo 84.° do mesmo decreto e portaria de 6 de agosto de 1879, que trata do tempo do serviço no ultramar;

5.ª Do artigo 38.° do mesmo decreto relativo a augmento de pret as praças europeias;

6.ª Do artigo 54.º e sou paragrapho do decreto com força de lei de 19 de julho de 1394, que se refere aos distinctivos e prerogativas concedidas ás praças de pret do ultramar, quando possuam determinados habilitações liberarias.

§ l.° Os officiaes do exercito do reino, graduados no posto immediato ora virtude da disposição citada no presente artigo, actualmente em serviço no ultramar, conservarão a graduação que lhe foi concedida ato completarem a sua commissão.

§ 2.° Depois da publicação d'este decreto nas ordens a força armada das provincias ultramarinas ou districto autonomo, só será permittido o uso dos distinctivos a que se refere a disposição 6.ª do presente artigo ás praças de pret que a elle tenham direito no exercito do reino, ou áquelles que tenham sido declarados cadetes no boletim militar do ultramar, nos boletins das provincias ultramarinas e districto autonomo ou nas ordens á força armada das referidas provincias ou districto.

Art. 186.° Para a nomeação dos officiaes do exercito do reino, era conformidade do artigo 6.°, no anno do 1902, a lista a que se refere o artigo 7.° será organizada até 31 do março do mesmo anno.

Art. 187.º Os officiaes, sargentos ajudantes o primeiros sargentos, actualmente em serviço no ultramar, que desejarem ser nomeados em conformidade do artigo 6.°, entregarão as suas declarações nas secretarias dos governos as provincias ou districtos onde servirem, as quaes serão immediatamente enviadas á Direcção Geral do Ultramar.

Art. 188.° Os officiaes que actualmente fazem parte do quadro do deposito de praças do ultramar, poderão ser conservados nesta situação, até ulterior determinação do Governo.

Art. 189.° Logo que estejam organizados os corpos de policia da Praia e de S. Thomé, serão extinctos os corpos de policia civil de Cabo Verde e do S. Thomé.

Art. 190.° A guarda fiscal do estado da India conservará a actual organisação até ulterior resolução.

Art. 191.º É extincta a colonia penal do Mexico, sondo substituida por uma capitania mór.

§ unico. O governador da provinda de Angola proporá ao Governo o modo do fazer esta substituição e o destino que devem ter os condemnados que actualmente existem na mesma colonia.

Art. 192.° Aos officiaes e mais praças das forças do ultramar, que se impossibilitarem por motivo do desastre occorrido ora acto de serviço, e as familias dos que fallecerem por motivo do desastre em serviço, serão applicaveis as disposições da carta de lei de 12 de junho de 1901.

Art. 193.º Alem das verbas para material do guerra e para a constatação o reparação do quartéis, inscriptas no orçamento de cada provincia ultramarina ou districto autonomo, serão applicadas na acquisição do mesmo material e á construcção e reparação de quartéis, as sobras dos capitulos o artigos do desposa relativos á força armada de cada provincia ou districto autonomo o tambem o producto das remissões das praças de pret.

§ unico. As importancias d'esta proveniencia serão, em cada provincia ou districto autonomo, liquidadas todos os trimestres o transferidas para um fundo especial destinado á acquisição do material de guerra e construcção e reparação de quarteis, conforme for determinado em instrucções especiaes.

Art. 194.º Para os casos não previstos neste decreto regulará, para os officiaes do exercito do reino, o que se acha estabelecido na legislação applicada ao mesmo exercito, e para os officiaes dos quadros do ultramar a legislação que actualmente vigora no ultramar.

Art. 195.º Esta organização será executada sucessivamente nas diversas provincias e districto autonomo, na parte que diz respeito á constituição dos quartéis generaes, respectivas guarnições e nomeação do pessoal correspondente; em tudo o mais considerar-se-ha em vigor desde a sua publicação nas ordens á força armada das provincias ultramarinas e districto autonomo, excepto na parte que dependa do regulamento especial.

Art. 196.° O pessoal da 4.ª Repartição da Direcção Geral do Ultramar será augmentado com quatro capitães ou officiaes subalternos do exercito do reino e quatro amanuenses officiaes inferiores.

§ 1.° Os officiaes que forem empregados neste serviço deverão sor habilitados com o curso das respectivas armas o vencerão o soldo e gratificação da respectiva patente.

§ 2.º Os officiaes inferiores terão a gratificação diaria de 200 réis.

Art. 197.º O Governo publicará os regulamentos necessarios para a execução d'este decreto, na parte que dos mesmos depender.

Paço, em 14 do novembro de 1901. = REI. = Entesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattoso Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

TABELLA N.º l

Premios de alistamento das praças de pret do exercito do reino

[Ver tabela na imagem]
Cabo Verde, India, e Macau Angola e Moçambique S. Thomé e Principe e Timor

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TABELLA N.º 2

Vencimentos das praças de pret europeias

[Ver tabela na imagem]
Postos Pret (Artilheria) (Cavallaria) (Infantaria) Gratificação do serviço no Ultramar

As praças de pret europeias perdem a gratificação de serviço no ultramar, quando não estejam na effectividade do serviço, quando estejam na metropole e quando desempenham qualquer serviço no ultramar que lhes dê direito a outra gratificação.

Quando sirvam na provincia de S. Thomé ou no districto de Lourenço Marques, tem direito ao aumento de 50 por cento sobre esta gratificação e o augmento de 30 por cento quando sirvam na provincia da Guiné ou nos districtos de Congo, Lunda, Zambezia e Timor.

Para fardamento terão o vencimento de 40 réis diarios.

Os artificos terão direito á gratificação de 200 réis em 200 dias ateia em cada anno

TABELLA N.º 3

Vencimentos das praças de pret indigenas

[Ver tabela na imagem]
Postos Provincias de Africa Occidental e Oriental (Artilheria - Réis) (Cavallaria - Réis) (Infantaria - Réis) India Macau

As praças indigenas que servirem nas provincias da Guiné e S. Thomé e Principe, e nos districtos do Congo, Lunda, Zambezia Lourenço Marques o Timor, teem direito a mais 30 por cento sobre o pret, o as que servirem em provincias differentes d'aquellas de onde sejam naturaes, teem direito a mais 50 por cento.

As praças de pret que tiverem direito a usar o uniforme de europeus, na conformidade dos §§ 1.º e 2.º do artigo 5.º do decreto de 8 de novembro de 900, terão 40 réis diarios para fardamento, todos os outros, 20 réis.

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TABELLA N.º 4

Vencimentos das praças de pret europeias reformadas

[Ver tabela na imagem]
Postou o graduações Vencimentos

QUADRO N.º l

omposição dos quarteis generaes das provincias ultramarinas e districto autonomo de Timor

[Ver tabela na imagem]
Chefe de Estado maior Sub-chefe maior Chefe da 2.ª repartição da secretaria militar Adjuntos 2.ª repartição da secretaria militar Activista geral da secretaria militar Inspector de material de guerra Adjunto ao Inspector de material de Guerra (g) Auditor (a) (b) Defensor officioso (s) Chefe de serviço de saude (f) Amanuenses Continuos Serventes

(a) O conservador da comarca onde reuniu o conselho de Guerra.

(b) O auditor do districto.

(c) Um dos adjuntos á 1.ª repartição é o promotor de justiça do conselho de guerra.

(d) O archivista geral é o secretario do conselho de guerra.

(e) O defensor officioso accumula este logar com o desempenho de outra commissão de serviço.

(f) O chefe de serviço de saude é o chefe da provincia ou districto autonomo.

(g) O adjunto inspector de material de guerra nas provincias de Cabo Verde, Angola, Moçambique, India e Macau é o commadante da respectiva bateria ou companhia de artilheria; nas provincias de Guiné, S. Thomé e Principe e districtos autonomos de Timor, é o commandante da secçãp de artilheria da respectiva companhia mixta de artilheira e infantaria.

QUADRO N.º 2

Guarnições de 1.ª linha das provincias ultramarinas e districto Autonomo de Timor

[Ver tabela na imagem]
Baterias mixtas de artilheria de montanha e guarnição Companhia europeia artilheria de guarnição Companhia indigena de guarnição Companhias mixtas de artilheria de montanha e infantaria Companhias mixtas de artilheria de guarnição e infantaria Esquadrões de dragões Pelotões independentes de dragões Companhias europeias de infantaria Companhias indigenas de infantaria Corpos de policia Batalhões disciplinares Companhias de deposito Bandas de musica europeia Bandas de musica indigenas

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QUADRO N.º 3

Composição de uma bateria mixta de artilharia de montanha e guarnição

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

QUADRO N.º 5

Composição de uma companhia indígena de artilharia de guarnição

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

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QUADRO N.º 7

Composição de uma companhia mixta de artilharia de guarnição e infantaria

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

QUADRO N.º 8

Composição de um esquadrão de dragões

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

QUADRO N.º 9

Composição de um pelotão independente de dragões

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

QUADRO N.º 10

Composição de uma companhia europeia de infanteria

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

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86 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

QUADRO N.º 11

Composição de uma companhia indígena de infantaria

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

QUADRO N.º 12

Composição do corpo de policia indigena

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

QUADRO N.º 13

Composição do corpo de policia de Loanda

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

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QUADRO N.º 14

Composição do corpo de policia de Lourenço Marques

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

QUADRO N.º 15

Composição do corpo de policia de Macau

[Ver tabela na imagem]

Effectivo Minimo Effectivo maximo

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QUADRO N.º 16

Composição do batalhão disciplinar de Angola

[Ver tabela na imagem]
Officiaes Praças de pret europeias

O numero de segundos sargentos será elevado até 3 e o de primeiro cabos até 10 por companhia, quando cada uma das companhias tiver mais de 120 soldados e incorporados.

QUADRO N.º 17

Composição de uma companhia de deposito

[Ver tabela na imagem]
Officiaes Praças de pret europeias

QUADRO N.º 18

Composição de uma banda de musica europeia

[Ver tabela na imagem]

Officiaes Praças de pret europeias

QUADRO N.º 19

Composição de uma banda de musica indigena

[Ver tabela na imagem]

Officiaes Praças de pret europeias

N.º 9

Senhor.- Preoccupado com a gravidade da crise que assoberba a viticultura portuguesa, pretendeu o Governo provê-la de remedio, tanto quanto aos poderes públicos é dado contribuir para a solução de crises economicas. Compenetrado das suas responsabilidades, estudou attenta e demoradamente o problema, ouvindo os interessados. Condensou por fim os resultados d'esse estudo em dois projectos de lei, successivamente submettidos á apreciação do Parlamento que não chegaram a ser discutidos após o indispensavel exame critico das commissões respectivas, as quaes se pronunciaram, todavia, favoravelmente acêrca dos alvitres propostos, perfilhando-os e coordenando os num só diploma.

Não se discutiu na sessão legislativa tão complexo e importante assumpto; addiar para outra a sua resolução, quando redobram os clamores da lavoura e do commercio, seria menos justificado procedimento.

De acordo com a doutrina do parecer favoravel das commissões do agricultura e fazenda da Camara dos Senhores Deputados e do projecto por ellas formulado, entende o Governo que a salvação publica, lei suprema, lhe impõe o dever de tomar providencias immediatas, ainda que, para o fazer, haja o poder executivo de supprir a interferencia da representação nacional, decretando o que em circumstancias normaes teria de ser promulgado com a sua approvação. Procedendo assim, está o Governo convencido de que obedece ás exigencias indeclinaveis do

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bem geral. Pedindo a Vossa Majestade se digne sanceionar um decreto que respeita as linhas geraes do projecto de lei, mas que amplia o modifica em proveito da agricultura as concessões nelle feitas, não fogo a responsabilidades, e aguarda o momento em que d'esse acto tenha de dar conta ás Camara?.

Nos relatorios que precederam as propostas de lei n.° 20-F, de 11 de março e n.° 80-E de 8 de maio ultimos foram minuciosamente justificadas as providencias que nellas só continham e que agora são desenvolvidas e completadas, attendendo-se quanto possivel ás reclamações de todos os interesses legitimos, compromettidos em tão intrincada questão.

Permitta Vossa Majestade que em summaria exposição sejam recordadas as razões que determinaram a escolha dos alvitres propostos.

O problema vinicola, posto em termos geraes, pode ser enunciado pela forma seguinte, tal qual o Governo o formulou no relatorio da primeira das propostas citadas, pondo em relevo a difficuldade que a sua resolução offerece:

«... São geraes e instantes os clamores da lavoura, que, vendo-se a braços com uma crise, para muitos angustiosa, pela falta de venda prompta dos seus vinhos, e portanto de recursos para a cultura, intimara os poderes publicos a que a debellem promptamente. Como se na mão dos Governos e dos parlamentos estivesse resolver só pela sua acção os problemas economicos, obviando de prompto a males inveterados, resultantes de causas muito complexas, e alliviando a iniciativa particular do esforço que naturalmente lhe incumbe, em vez de a auxiliarem judiciosa e perseverantemente!

A miragem de soluções radicaes e omnimodas, pedidas ao Estado-Providencia, desvia por vezes as attenções de alvitres praticos e exequiveis, e portanto efficazes, embora modestos e restrictos na apparencia. Comprehende-se que assim succeda aos que encaram o problema apenas sob o ponto de vista, exclusivo e incompleto, do seu interesse pessoal.

Aos poderes publicos, cujas responsabilidades são diversas e mais gravou, cabe o dever de o abranger em toda a sua complexidade, com mais largos horizontes, attendendo equitativamente a interesses encontrados dentro dos limites impostos pelo interesse geral do país, supremo criterio que nos deve orientar.

Não sito iguaes as aspirações e exigencias dos viticultores do norte e do sul. Querem uns o alcool barato para poderem preparar vinhos licorosos, capazes de competir em preço com as imitares grosseiras dos nossos vinhos fabricadas no estrangeiro. Reclamam os outros garantias de venda remuneradora para os vinhos de caldeira pela elevação do preço da aguardente.

Pedem-se, com razão, tratados de commercio que abram novos mercados á viticultura nacional. Contra as concessões que haveriam de ser o preço dos favores obtidos protestariam, porem, as industrias esbulhadas da protecção pautal.

Os agricultores insulanos e os fabricantes de alcool teem interesses difficcis de conciliar com as reclamação dos viticultores. Querem ainda estos que se lhes facilito mais largo aproveitamento do mercado nacional pela remodelação dos impostos que incidem sobre o vinho. Nem todos acceitariam, porem, a compensação tributaria que ao Thesouro é precisa para obviar ao desfalque das receitas.

Se nem falia quem acceitaria com boa sombra a providencia pombalina de se arrancarem vinhas para obstar ao excesso da producção!

Comprehende se, pois, quão difficil é a missão do Estado neste conflicto de interesses de diversas regiões e industrias o ainda do proprio Thesouro, e como é illusoria a espectativa de uma formula magica, na qual só encontre a resolução cabal do conjunto de todos os problemas suscitados pela crise vinícola.

Se o nosso país esta naturalmente fadado para a viticultura o para a vinicultura, é indispensavel que aproveite os recursos do clima e do solo pela cultura aprimorada de castas judiciosamente escolhidas; que fabrique com perfeição e barateza bons vinhos de typos regionaes bem constituidos e equilibrados, materia prima de intelligentes lotações e da criação de typos commerciaes, nitidamente definidos, para consumo directo, que só estudem o conheçam as exigencias de cada mercado e os meios de o conquistar. Cultura judiciosa, fabrico intelligente, commercio organizado: taes são os tres factores da prosperidade da viticultura. Sem elles é illusoria a esperança de só debellarem crises, devidas mais ainda á falta de algum ou de todos, paio menos em certas regiões do país, do que ao excesso de producção».

No seu proficiente parecer, a commissão de agricultura commentava assim a formula em que fora synthetisado o problema:

Fabrico intelligente - quer dizer por feito o economico - e pode ser mais violentamente impulsionado pelas adegas sociaes do que pelos exemplos dos vinhateiros estudiosos e sabios que temos, e não já em muito pequeno numero.

Commercio organizado, poderemos tê-lo, quando as grandes companhias se formem o entrem de actuar no meio a que sito destinadas como ensino, como methodo, como seriedade.

Cultura judiciosa, sim, temo-la, ao a encararmos sob o ponto de vista de cultura esmerada da planta; não, para varios retalhos do país, se a tomarmos no aspecto da indevida applicação de certo terrenos á industria do vinho».

Sem perder de vista na necessidades do momento, que demandam palliativos immediatos e providencias fragmentares, procurou o Governo subordinar estas a um plano geral, que abrangesse em mais larga previsão as exigencias do futuro o encaminhasse a producção e commercio de vinhos e seus derivados para regimen racional e situação prospera, pela conjugarão do esforços dos poderes publicos e da iniciativa privada, fortalecida pelo principio associativo.

Respeitando embora a regra, salutar da divisão do funcções economicas, convem facilitar aos productores, isolados ou reunidos em fecunda cooperação, a possivel interferencia nas operações commerciaes e as relações com os intermediarios que hão de collocar o seu producto.

Por isso mesmo é inserto no decreto um alvitre de indiscutivel utilidade, indicado pela commissão de agricultura da Camara dos Senhores Deputados, permittindo aos lavradores o estabelecimento de depositos fora do local da producção, onde o vinho possa ser envasilhado ao abrigo das avarias causadas pela falta de cuidado dos transportadores, o onde seja conservado, tratado, lotado e preparado convenientemente antes de ser entregue nos intermediarios que o exportam ou o collocam no mercado interno.

A essa faculdade apenas se põem as restricções necessarias para evitar possiveis abusos.

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É ocioso justificar os auxilios e favores concedidos ás adegas sociaes. Todos são accordes em reconhecer a singular efficacia que o fabrico em commum pode ter para o aperfeiçoamento dos processos cenologicos o para a obtenção de bons typos de vinho regionaes, como foi ponderado no relatorio que precedeu a proposta respectiva.

«É preciso, é indispensavel, é urgente melhorar os processos de fabrico, só queremos conservar o adquirir clientela nos mercados externos. Não ha tratados de commercio, não ha premios de exportação, não ha auxilios officiaes, que façam vendavel o mau vinho, communicando-lhe a miraculosa variedade de sabor do biblico maná, consoante o paladar do consumidor. Não damos novidades, repetindo o que ha tantos annos apregoam os competentes Dizer a verdade toda, sem rebuço, é dever indeclinavel.

Se o fabrico do vinho é uma operação industrial que exige capital e sciencia, teremos de condemnar a pequena propriedade, fazendo perder á viticultura a sua benemerencia economica e social, colonizadora como é, e favoravel á constituição de uma numerosa democracia rural, fundamento insubstituivel da prosperidade do país?

«De modo algum. Importa diffundir por todos os modos a instrucção cenotechnica, para que os fabricantes de vinho, com uvas suas ou compradas, orientem racionalmente o fabrico, e melhorem os respectivos processos o material.

É, sobretudo, necessario fomentar quanto possivel o recurso ao principio associativo, a que, infelizmente, é ainda hoje tão avessa a classe agricola, e que na vinicultura se affirma pela criação das chamadas Adegas Sociaes.

E não se julgue que os boneficios das adegas sociaes se limitam á fabricação em commum, mais perfeita e barata portanto. Constituem modelo e centro de irradiação das boas praticas cenologicas. Ali vem receber instrucção pratica operarios que possam ser mestres de adega. Podem dimanar d'ellas instrucções racionaes, adequadas á rudimentar ínstallação das pequenas adegas e destinadas a aperfeiçoar os processos de fabrico. Podem-se reunir nellas mostos ou vinhos após a primeira fermentação, que ali sejam convenientemente manipulados, São, finalmente, hospitaes para tratamento de vinhos doentes, graças aos apparelhos de que dispõem para os filtrar e pastorizar e ao pessoal technico encarregado de as dirigir».

No relatorio da commissão de agricultura insiste-se, com viva e justificada fé nas virtudes do principio associativo, pela criação das adegas sociaes, attribuindo-se-lhes papel primacial na resolução da críse vinicola.

«A Adega Social, incitada pelos auxilios que propõe o Governo e - de entre os quaes porei em evidencia a faculdade valiosissima de emissão de warrants com desconto obrigatorio -, prestará relevantes serviços á vinicultura patria; e se esta não souber ou não quiser aproveitá-la, quebra por suas proprias mãos um instrumento notabilissimo de progresso e de prosperidade, que as suas irmãs estrangeiras não tiveram nestas condições, o que não impede as suas Adegas Sociaes de viverem e prestarem, em países onde a educação cívica é outra, a iniciativa particular potento e maior talvez a abundancia, a intelligencia e a actividade dos capitães Não succederá, porem, assim, visto que ao conhecimento da vossa commissão chegou a noticia do que se for esta proposta convertida em lei do reino, logo fera aproveitada em varias regiões vinicolas do pais, lastimando-se apenas que as condições do Thesouro forcem a limitação do seu numero, susceptivel dos favores do Estado».

Lastima é com effeito que haja de se limitar esse numero. Todavia, para sanar este inconveniente, julgou o Governo dever ampliar a proposta que foi presente ao Parlamento, facilitando a criação de adegas sociaes mais modestas, que sem demandarem para o seu estabelecimento grandes sacrificios pecuniarios do Estado, serão preciosos factores do progresso vinicola.

Podem sor instituidas em maior numero de localidades, das quaes diligenciarão introduzir as boas praticas cenologicas e unificar os processos de fabrico, aperfeiçoando-os. A estes elementares mas uteis organismos se deverão os typos regionaes do bons vinhos, que irão buscar a uma adega mais bem provida de material as beneficiações complementares, ou, em casos anormaes, os tratamentos que esta se encontra habilitada a effectuar. Constitue-se assim uma como que federação regional que aggremia os viticultores por meio da adega social de cada localidade, completada pela adega regional, centro de irradiação do progresso vinícola o base indispensavel da acção commercial exercida pelas companhias.

A criação de companhias vinícolas, reclamada instantemente pelo congresso agricola de 1900, foi largamente justificada no relatorio da respectiva proposta, procurando-se mostrar, com testemunhos auctorizados, quanto importa á prosperidade do commercio de vinhos a criação e sustentação de marcas ou typos constantes.

«A criação de marcas judiciosamente adaptadas á exigencia de cada mercado presuppõe intelligentes lotações de vinhos regionaes e uma boa orientação dada ao fabrico para assegurar a excellencia e estabilidade dos typos respectivos. Implica ainda a conservação e tratamento desvelado dos vinhos que aguardam momento propicio de serem entregues ao consumo. Para isso precisos se tornam vastos armazens, custoso vasilhame, alfaia apropriada, pessoal competente.

«Criados os typos commerciaes, tem de se lhes abrir caminho por uma larga propaganda, que não olha a sacrifícios, pois sabe que tem de semear para colher. Organizar a venda é o segredo do exito commercial, devido a habeis e honestos intermediarios em cada mercado.

«E emquanto se não conquista clientela, quantas despesas sem compensação immediata ha que fazer! Quanto tempo não esperam collocação partidas de vinho enviadas para varias praças, sujeitas a mil contingencias e oneradas com pesados encargos!

«Se a esses encargos e perigos se procura obviar pela criação de depositos de venda, sobe de ponto a importancia do desembolso.

«O commercio de vinhos não pode, pois, attingir as proporções exigidas pela prosperidade da viticultura, sem importante capital o direcção intelligente, não cabendo assim nas faculdades e recursos do viticultor, por abastado que seja.

«Supponhamos que por habeis negociações se conseguiam vantagens de peso para os nossos vinhos em qualquer mercado externo. Estariamos habilitados para as aproveitar?

«Haverá a necessaria organização commercial, em relação a todas as regiões vinícolas do país?

«Quem ousaria asseverá-lo?

«Começaríamos a exportar vinhos de consumo directo, multiformes como o Protheu da fabula, vendo-nos embaraçados para manter a exportação de um ou outro typo que agradasse ao consumidor. Seriamos a breve trecho supplantados por concorrentes melhor armados para a lucta. E isto, porque a nossa falta de iniciativa fez adiar a expansão commercial para o momento em que, mercê dos tratados de commercio, imaginassemos realizá-la sem esforço».

D'essa expansão commercial devem ser poderoso factor

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as companhias commerciaes, constituídas por Forma que não affrontem o commercio livre e que nonas possam ter larga representação os productores.

A criação das companhias vinicolas conquistou o apoio caloroso das commissão parlamentares.

"É obra de vulto e meritoria esta tentativa de impulsionamento de companhias vinicolas o sobretudo no sul e centro do reino.

"O nosso commercio de vinho de pasto não está em geral organizado por fornia a poder entrar com desafogo e sabedoria no caminho largo do commercio moderno. Não tem posses de iniciativa e de dinheiro, para fazer a necessaria propaganda, estabelecer armazens de venda no estrangeiro e na Africa portuguesa, criar typos commerciaes fixos, perseguir a fraude internacional, pagar bem a agentes bons, emfim, para lutar por todos as formas contra os nossos competidores nos mercados do mundo".

Os beneficios a esporar da acção commercial das companhias são categoricamente affirmados:

"Melhorará pouco a, pouco e formará typos novos de vinhos de pasto que entrem em competencia com os que todo o mundo civilizado prefere, sem abandonar, procurando alargar, é claro, o commercio corriqueiro, que ha de fornecer sempre o consumidor vulgar, não só da metropole, como das colonias o da população baixa portuguesa do Brasil. A companhia criará consumidores novos com typos novos do vinhos e levará mais longo os typos já sabidos. Por ambas AS formas conseguirá dar maior vasão ás adegas do vinhateiro nacional, estimulando o progresso e a perfeição na tachnologia conologica por judiciosas escalas de preços".

Estas affirmações tão categoricas e de tão auctorizada fonte confirmam o Governo na sua opinião acêrca dos beneficios que a agricultura tem direito a esperar da acção commercial das companhias vinícolas.

O segredo da conquista dos mercados está no trabalho intelligente e perseverante, que semeia para colher, acceita os prejuizos inseparaveis do periodo da propaganda para angariar clientela, contenta-se com um pequeno lucro em cada transacção, procurando no grande numero d'ellas o meio de obter sufficiente remuneração. Essa norma de proceder, caracteristica do commercio bem organizado o que dispõe de capitães, é condição indeclinavel da victoria na lucta com temiveis concorrentes; devo ser e será certamente a das companhias. Desde que os agricultores, conscios dos serviços que estas podem prestar, lhes trocam o concurso, avultado ou modesto, de seu capital, terno a devida preponderancia na administração d'ellas, tornando mais intima a solidariedade de interesses da classe agricola e das companhias commerciaes e mantendo-as no seu papel de uteia auxiliares dos productores.

Trabalhos recentes de auctorizados cenologos vieram chamar a attenção dos vinicultores para os beneficos resultados que ha direito a esperar da concentração dos mostos, já para reduzir o volume a transportar, completando-se a vinificação nos mercados em que o vinho tem de sei consumido, já para corrigir e melhorar mostos pobres de assucar pela elevação do grau alcoolico, obtida pela sua concentração ou pela addição de mostos concentrados de outra região, já, finalmente, para determinar novas applicações dos mostos pelo aproveitamento do assucar nelles contido.

Até hoje ninguem preconizara o emprego, entre nós, de processos que, sem constituirem ainda em larga escala pratica industrial corrente, são todavia uma esperança fecunda, o podem, quando saiam de vez dos dominios laboratorio, abrir largos horizontes á viticultura.

Em março ultimo a Sociedade dos Viticultores de França celebrava a sua sessão geral do corrente anno.

Um eminente chimico e especialista, Mr. Roos, director a estação conologica de Moutpellier, apresentou e leu um interessante relatorio acêrca da concentração dos mostos
e dos vinhos. Começou por se referir á crise temerosa da inicultura em França, cansada pelo excesso de producção, cuja gravidade caracteriza na seguinte phrase:

"O remedio mais radical para esta situação seria evidentemente arrancar vinhas ou deixar succumbir os proprietarios menos bem armados para a resistencia, mas antes do recorrer a essa extremidade, devemos procurar meios de lucta menos prejudiciais aos interesses nella compromettidos".

O principal meio apontado á a conquista de mercados externos, em concorrendo, com a Italiu e a Hespanha, recorrendo-se a processos industriaes aperfeiçoados, que permittam augmentar o grau alcoolico dos vinhos mantendo a relação normal dos principios que os constituem, sem e deixar de praticar a cultura intensiva, da qual resultam vinhos de baixissima graduação.

A concentração, que tira ao vinho parte da agua sem o alterar, é um dos processos apontados, e pode ser obtida:

Pela seccação das uvas;

Pela concentração do mosto isolado das balsas;

Pela concentração do mosto sem ser separado d'ellas;

Pela concentração do proprio vinho.

A seccação da uva para enriquecer o vinho quasi não entrou ainda nos dominios da pratica; assim o affirma Roos:

"Vejo grandes difficuldades que vencer; a technica do processo não está estabelecida; não ha a mínima experiencia em apoio da theoria".

A concentração dos mostos, como é usada no fabrico dos vinhos de Malaga, é excellente para obter vinhos d'esse typo, mas raro pode ter applicação no preparo de outros.

epois de se referir a tentativas de ebullição no vacuo, feitas ha quinze annos por Springmuhl, segundo um processo que ao não generalizou, e ao malogro de outras tentativas na California, observa Roos:

"Parece que desde então se renunciou a fazer vinhos fermentados depois de uma concentração previa dos mostos, mas a industria especial nascera o desenvolvera-se um louco com e objectivo de produzir vinhos doces abafados com Alcool, ou simples xaropes de uva".

A industria dos mostos concentrados existe, ora pequena oscula na Italia, sustentando um modesto commercio com a
Allemanha. Em Argel existe igualmente, ha um anno apenas, em exiguas proporções a industria do fabrico de xarope de uvas.

Depois d'esta resenha historica observa Roos:

"Houve já, como vêdes, applicação industriaes da concentração dos mostos, mas em nenhuma d'essas applicações se teve em vista a producção de vinhos de consumo corrente, principalmente do vinhos tintos. Quis preencher esta lacuna; fiz em 1900 algumas experiencias com a mira exactamente nessa producção immediata de vinhos de grande consuma, com melhoria dos productos sob todos os pontoa de vista, e creio o primeiro afazer vinhos tintos fermentados de elevado grau alcoolico, depois da concentração".

O illustre chimico, depois de referir o resultado favoravel das suas experiencias, em que se serviu de mostos concentrados juntamente com as balsas, faz uma rapida resenha dos processos ensaiados, para a concentração dos vinhos feitos, problema que julga complicado e cujas soluções reputa satisfatorias, dando naturalmente a preferencia ao seu, que permitte utilizar melhor a parte solida do fructo.

"Os outros processos acharão sem duvida applicação em casos especiaes; serão mesmo por vezes preferiveis; me-

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lhorarão bastante os vinhos produzidos, mas não me parecem susceptíveis, na maior parte dos casos, de resolver o problema tão bem como a concentração da massa (vendange) completa.

"A disposição dos apparelhos está por determinar, assim como a escolha dos metaes, de modo que não posso, como desejava, ministrar uma solução definitiva, a que posso, porem, dizer é que a installação, por mais que se simplifique, será ainda consideravel, mesmo para uma exploração vitícola media".

Como se vê, a concentração dos mostos mal saiu, por emquanto, da phase do estudo nos laboratorios, salvo applicações restrictas que não influem na questão vinicola.

De um momento para o outro pode, porem, revestir forma eminentemente pratica, e offerecer valiosos recursos á vinicultura.

Referindo-se aos apparelhos necessarios para operar em boas condições a concentração dos mostos sem os separar das balsas, pondera com effeito Roos: "Estes apparelhos ainda não existem, mas posta a questão, não tardará a ser resolvida; estou certo de que na proxima vindima terão os viticultores muito por onde escolher".

Convem, portanto, despertar a iniciativa particular, concedendo-lhe as garantias inherentes á introducção de novas industrias, e permittir a beneficiação dos mostos pobres pelo addicionamento de passas ou de mostos concentrados.

A despeito das condições privilegiadas do nosso clima, o fabrico das passas quasi não existe no país.

Emquanto a Hespanha exportou, em 1899, 35.743:845 kilogrammas de passas de uva no valor de 17.871:922 pesetas, ao par 3.210:945$960 réis, e 24.904:873 kilogramas de uvas frescas, no valor de 8.716:705 pesetas, ao par 1.509:000$900 réis, desprezámos nós esse precioso recurso que, abrindo mercado a quantidades importantes de uva, contribuiria poderosamente para a prosperidade da viticultura. Debalde adquiriu o Governo ha annos apparelhos apropriados e contratou praticos, mandando iniciar o fabrico de passas em escolas agricolas das regiões mais proprias para a implantação d'essa industria. A indiferença e a rotina puderam mais que a louvavel iniciativa dos poderes publicos. Em 1900 exportamos apenas 3.314:871 kilogrammas de uvas e passas, no valor de 116:886$000 réis.

Importa, pois, estimular o interesse privado pela forma que a lei prescieve para a implantação de novas industrias, concedendo o exclusivo, não do producto, mas de processos aperfeiçoados, não executados industrialmente entre nós.

Igual providencia é proposta em relação á extracção do eremor-tartaro.

Em 1900 exportámos l.603:460 kilogrammas de borras de vinho no valor de 73:533$000 réis, e sarro de vinho 361:289 kilogrammas no valor de 52:690$000 réis, emquanto que a Hespanha em 1899 exportou 9.637:050 kilogrammas de tartaro eru e borras de vinho no valor de 4.818:528 pesetas, ao par 867:33$040 réis, e 688:273 kilogrammas de cremor-tartaro no valor de 1.307:719 posetas, ao par 235:389$420 réis.

A concessão dos exclusivos indicados, feita nos termos precisos e restrictos, não representa um monopolio; é revestida de precauções e formalidades minuciosas, que embargam a passo aos abusos e defendem os legitimos interesses criados. Não deriva de solicitações gananciosas, pois que até hoje nenhum exclusivo d'esta natureza foi pedido, a não ser o da concentração dos mostos, requerido em 1897 e negado por despacho de 11 de fevereiro de 1899; constituo uma honesta e patriotica, tentativa, dos poderes publicos, empenhados em abrir novos mercados aos productos da, viticultura nacional, tornando-a mais fructuosa.

Não compete ao Estado o papel de industrial, mormente em relação a productos novos, para os quaes teria de promover collocação, fazendo-se tambem commerciante; não se pode confiar muito na iniciativa privada, falta de fé nos seus proprios recursos; tem pois natural applicação o principio da protecção a novas industrias pelo exclusivo durante certo numero de annos, não da fabricação do producto, como estatuem as leis vigentes, mas do emprego de processos determinados e aperfeiçoados não usados industrialmente no país.

Uma dos principaes causas da crise vinicola é a abundancia do vinhos de caldeira e a difficuldade de collocar, ainda por baixo preço, a aguardente que d'elles provém, affrontada pela concorrencia do alcool industrial. A aguardente nacional nem é empregada na beneficiação dos vinhos na escala que havia direito a esperar, nem disputa os mercados estrangeiros ás aguardentes finas de outros países.

A França, por exemplo, cuja exportação de aguardente de vinho mostra tendencias para diminuir, collocou todavia no estrangeiro, em 1898, hectolitros 140:603, dos quaes 79:615 na Inglaterra.

Não está, porventura, o nosso país em condições de exercer largamente a lucrativa industria da producção do aguardentes finas, do typo cognac?

Allega o commercio, a favor do emprego do alcool industrial neutro, a rapidez da incorporação d'este no vinho beneficiado sem lhe communicar gosto proprio, e a impureza de certas aguardentes de vinho obtidas promiscuamente pela destillação, não só de vinho por vezes estragado, como das balsas e borras, sem soffrerem ao menos uma rectificação perfeita.

No dia em que a industria destillatoria for aperfeiçoada e permitia a rectificação das aguardentes impuras, a producção economica do alcool neutro de vinho e o fabrico de aguardentes finas para copo, estará meio resolvida a crise vinicola.

É preciso, pois, abrir caminho á iniciativa privada, o despertá-la, quando só mostre rebelde á sua natural funcção.

Por isso é proposto o estabelecimento de estações de destillação, cujos beneficos resultados levarão certamente industriaes, hoje avessos a innovações ou tímidos, a estabelecerem outras.

Logo que o Estado haja conseguido a realização d'esse intento, poderá resignar as funcções de industrial, que ao por excepção exercerá, e entregar á industria particular a exploração das estações por elle criadas.

Trata-se de productos conhecidos, que teem mercado certo, logo que sejam convenientemente fabricados. São precisas, para isso, installações a que o agricultor não pode sacrificar importantes capitães.

Tem, pois, natural cabimento a intervenção inicial do Estado, fiel á sua missão de fomento.

A crise que assoberba a viticultura nacional é symptomatica de um estado anormal e transitorio. Abundam os vinhos de caldeira, encontrando a custo collocação para a aguardente em que se transformam. São condemnados á distillação outros, que deveriam alimentar o consumo directo. Os vinhos licorosos vão pedir ao alcool industrial a beneficiação, para a qual encontrariam com vantagem no alcool vinico a materia prima conveniente.

Para facilitar o estabelecimento do regimen mais consentaneo com os dictames da boa economia rural, convém garantir á aguardente de vinho preço quanto possivel re-

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numerador, calculado pelo do grau centesimanl - termo natural de comparação e medida commum a adoptar - sem o deixar ultrapassar limites que prejudicariam a exportação dos vinhos licorosos.

A elevação do imposto de producção do alcool industrial; o estabelecimento de mercados officiaes reguladores do preço do alcool e aguardente, que facilitem as transacções; a elevação do direito do importação do alcool estrangeiro e a sua reducção eventual, quando seja preciso corrigir o exagero do preço da aguardente, constituem um systema que está longe de ser perfeito, mas que ao Governo só affígura util e opportuno, á falta de melhor. Para que os seus resultados correspondam á espectativa, necessario se torna limitar a producção das fabricas de alcool existentes e prohibir o estabelecimento de outras.
Respeitam-se os interesses criados; concedem-se ao alcool desnaturado favores que incitam a industria a empregá-lo em mais larga escala, desaffrontando-se assim quanto possivel a aguardente de uma concorrencia temivel. Coarcta-se por este modo a liberdade de fabrico, sacrificando-a aos interesses da nossa primeira industria.

Pensou-se em restringir, por analogia e igualdade na justiça distributiva, a producção de vinhos do caldeiro, e obstar á invasão, pela vinha, de terrenos naturalmente indicados para a cultura cerealifera.

Dominado pela natural repugnancia de coarctar a liberdade de cultura, não quis o Governo cerceá-la, no formular a proposta de lei de 8 de maio, alem do absolutamente indispensavel para evitar o agravamento de uma tendencia viciosa da nossa economia rural, e por isso limitou a prohibição temporaria de novas plantações de vinha aos terrenos baixos e frescos, do varzes, que não devem ser roubados á cultura cerealifera. Fora d'essas zonas excepcionaes não prohibia a extensão de uma cultura essencialmente colonizadora, como é a da vinha e que na melhoria do regime vinicola encontrará vasão para os seus productos.

Em questão economica de tal modo complexa e relacionada com interesses encontrados do tanta magnitude, era necessario dar a estes ensejo de se pronunciarem, mormente quando se punham á liberdade individual restricções difficeis de conciliar com o espirito e os costumes do nosso tempo. O Governo considerou pois a questão aberta e seguiu attento as correntes de opinião que só iam manifestando. Julgou bastante significativa a judiciosa reserva da Real Associação de Agricultura, que se não quis pronunciar pró ou contra a restricção da cultura da vinha. Viu a questão suscitar ardentes debates tanto na reunião de viticultores ultimamente celebrada em Lisboa, como na imprensa. Pareceu-lhe que o alvitro radical da prohibição generica e absoluta de novas plantações era o que mais adeptos contava. Entendeu, pois, que uma tal restricção dos direitos individuaes, que faz do Estado arbitro das culturas a que pode cada um applicar a sua propriedade, era - em these e na hypothese - grave de mais para se assumir a responsabilidade de a intimar sem interferencia do Parlamento, para o qual é reservado o exame e a solução do problema. Não hesitou o Governo em proceder até aonde julgou indispensavel para acudir á viticultura; não quer, nem julga preciso, substituir pela sua acção a do Poder Legislativo, quando a liberdade da cultura se encontra em litigio.

O preço de 205 réis por litro do aguardente de 78°, resultante do limite fixado para o custo do grau contesimal, representa já sensivel melhoria do situação para os productores de aguardente, e não poderia ser elevado sem gravame do commercio de exportação, ou enorme sacrificio do Thesouro, que pela reducção de direitos e pela concessão de premios procura dar as possiveis facilidades a esse commercio.

Demais, a acção dos Governos pode apenas attenuar os effeitos de crises devidas a causas geraes, cujo influxo se faz sentir alem do ambito, estreito ou largo, de um pais; não cabe nas suas faculdades dominá-las tão victoriosamente que os vinhos obtenham preços em desproporção com as condições economicas do presente.

Nem só a viticultura portuguesa luta com difficuldades graves. A mesma depreciação dos vinhos provoca iguaes clamores em nações mais adeantadas, que disputam entre si os mercados. Resoaram não ha muito no seio da Sociedade Geral dos Viticultares de França, como vimos.

E quanto são justificadas, mostram-no as seguintes cotações de vinhos francosos, relativas ao fim de abril ultimo; os vinhos da encosta de Gard valiam 8 a 12 francos por hectolitro; no Aude os vinhos tintos obtiveram de 5 a 15 francos por hectolitro; no Vaucluse 6 a 1O francos. Áparte os melhores vinhos, os preços eram, pois, diminutos.

Temos de produzir bom e barato, renunciando á miragem dos altos preços de outr'ora. O essencial é que os preços obtidos não deixem de remunerar a cultura.

As aportadas circumstancias do Thesouro demandam a maior circumspecção nas reformas fiscaes exigidas pela lavoura e pelo commercio em beneficio da viticultura.

Não desconhece, porem, o Governo a necessidade de se fazerem resolutamente ou indispensaveis sacrificios para attenuar uma crise, que mesmo sob o ponto de vista dos recursos tributarios é sobremodo grave, visto poder annullar materia collectavel importantissima pelo abandono da cultura de vinhas sem collocação para os seus productos.

A reducção dos direitos de exportação da uva, das passas do vinho e de vinagre, e de importação da aduela, é o primeiro beneficio a conceder.

A mais importante d'essas reducções transforma em direito meramente estatistico a taxa applicavel aos vinhos licorosos, cuja exportação é assim auxiliada pela concessão de um verdadeiro bonus de 2$616 réis por pipa de 534 litros, ou cêrca de 157:000$000 réis para a cifra actual da exportação.

Alem d'este auxilio e em vista da necessidade de baratear a alcoolização d'esses vinhos - condição indeclinavel de concorrencia vantajosa com as imitações que os affrontam nos mercados estrangeirou - sem prejudicar os productores de aguardente, é concedido um bonus de exportação de l$000 réis por pipa aos vinhos de graduação superior a 19º, quando o preço da aguardente do vinho de 78° centesimaes for superior a 70$000 réis por pipa do 534 litros.

Espera o Governo, para tão consideraveis sacrificios do Thesouro, a compensação no augmento da riqueza publica, devido ao incremento de mais importante ramo do nosso commercio de exportação.

Com um ligeiro aggravamento da tributação da cerveja, procura-se criar receita, á custa de uma bebida que bem pode considerar-se de luxo, num país em que abundam os bons vinhos frescos e acidulos, prejudicados no seu consumo pelo da cerveja.

No relatorio da referida proposta de lei accentuava-se, nos termos seguintes, a necessidade de reformar os impostos de consumo, do real de agua, para aliviar a producção e commercio de vinho, de pesados onus e incommodas restricções.

«Não são de hoje nem de hontem os justos clamores da agricultura e de commercio contra os vexames do real de

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agua e o exagero do imposto de barreira, que pesam sobre os vinhos, estorvando o desenvolvimento do consumo. Se aos Governos merece particular desvelo o incremento da exportação, não lhes deve sor indifferente a circulação da riqueza no interior do país, nem lhes é licito desprezar, para a attenuação da crise vinicola, a capacidade de consumo do mercado interno, tanto mais que a respectiva capitarão é muito inferior á dos outros paises vinhateiros.

A manutenção de impostos, cujo rendimento é em boa parte absorvido pelas despesas de cobrança, pois são poderoso incitamento á fraude; que tolhem a liberdade das transacções e da circulação dos productos; que affectam o preço dos generos mais necessarios á vida, pesando principalmente sobre as classes menos abastadas, com prejuizo grave da sua alimentação; cuja taxa se encontra em flagrante desproporção com o preço dos generos tributados, e se oppõe - pela restricção do consumo que determina - ao augmento da materia collectavel, só se justifica pela difficuldade de substituir por outro o rendimento que originam.

É tempo, senhores, de arcar com esses impostos. Importa reduzir a taxa respectiva, pelo menos no que respeita ao vinho, e modificar os processos de cobrança, tornando-os menos vexatorios.

Ouso esperar que o desenvolvimento do consumo determinará mais larga incidencia do imposto, compensando a redacção das taxas.

E a remodelação da forma de cobrança dos impostos, effectuada sob a forma de licença, poderá, com vantagem do publico, torná-los mais productivos».

D'esta doutrina, perfilhada pelas commissões parlamentares, resultou a base 14.ª do projecto de lei, pela qual era o Governo auctorizado a reduzir até o minimo de 67 por cento as taxas actuaes do imposto de consumo sobre o vinho em Lisboa e o de barreiras sobre o vinho no Porto, a substituir o imposto do real de agua em todo o país por um imposto de licença para venda de generos de consumo, revendo este ultimo imposto de forma que na melhoria do lançamento e systema de cobrança se obtivesse compensação e diminuição de receitas provenientes das redacções permittidas.

Para transformar essa auctorização legislativa em providencia de execução immediata eram precisos trabalhos preparatorios, effectuados com a circumspecção exigida pela importancia e delicadeza do assumpto.

Emquanto o Governo elaborasse os preceitos regulamentares por que ha de ser pautada a transformação d'aquelles impostos, deixaria de ser prestado, com a sua reducção, o auxilio de momento que a viticultura reclama e julga encontrar nesse alvitre.

Tendo ouvido a Real Associação de Agricultura, que tão bem representa os interesses agricolas, convenceu-se o Governo de que uma consideravel reducção temporaria e immediata do imposto de consumo em Lisboa e de barreira no Porto, por ella requerida, animará o mercado interno e produzirá beneficos effeitos, dando tempo á indispensavel preparação das reformas fiscaes, que no decreto são annunciadas e hão de procurar conciliar as exigencias do Thesouro e os interesses do contribuinte.

Deve se ainda mencionar, entre outras providencias fiscaes tomadas com o fito de beneficiar a viticultura, a suppressão do imposto de consumo sobre as uvas frescas digna de consideração, não tanto pelo onus tributario, en verdade leve, a que põe termo, como pelas facilidades de circulação resultantes da suppressão das formalidades de despacho.

E d'esta providencia não ha que recear abusos a que a fiscalização se opporia efficazmente pelo fabrico do vinho dentro da cidade. Não era tão elevada a taxa do imposto, que a sua suppressão constitua incentivo a esse fabrico.

Em resumo: a economia do presente projecto de decreto consiste, na essencia:

Km promover o fabrico aprimorado o economico de bons vinhos regionaes pela associação dos productores nas adegas sociaes e pelo estabelecimento dos depositos;

Em confiar a companhias commerciaes a missão de lhes abrir mercado, tornando-os recommendaveis pela pureza e constancia dos typos e pela modicidade dos preços;

Em facilitar o aproveitamento dos vinhos de baixa graduação e dos resíduos da vinificação no fabrico do alcool vinico e de boas aguardentes proprias para a beneficiação dos vinhos, o promover a producção de aguardentes finas para copo, mediante o estabelecimento de estações de distillação que sirvam de incentivo á industria particular e lhe sejam entregues logo que ser possa, e ainda pelos favores tributarios concedidos á distillação de vinho e seus derivados em alambiques;

Em conceder auxílios á implantação de novas industrias, hoje rudimentares ou por criar entre nós, que augmentarão, pela preparação de passas, pela extracção do tartaro e pela concentração dos mostos, os redditos da viticultura;

Em permittir beneficiações dos mostos, que longe de constituirem falsificação, corrigem a sua pobreza saccharina;

Em normalizar o commercio da aguardente pela intervenção de mercados reguladores do preço e por medidas fiscaes que o mantenham entre limites rasoaveis;

Em promover mais larga applicação do alcool a usos industriaes e evitar a concorrencia crescente que ao alcool vinico é feito pelo de outras proveniencias, mediante restricções postas á industria, sem offender os interesses criados;

Em aligeirar encargos e vexames que recaem sobre o commercio, tanto na exportação como no mercado interno, pela reducção de direitos e concessão de bonus aos primeiros e pelas reformas fiscaes mais convenientes, precedidas, em relação ao mercado interno, de uma providencia de caracter temporario, destinada a proporcionar um beneficio immediato á lavoura.

Tem o Governo a consciencia de haver empenhado os maximos esforços para chegar, em tão difficil assumpto, a soluções efficazes e adequadas ás legitimas exigencias de tantos interesses encontrados que se degladiam. Foi o mais longe que pôde no caminho dos sacrificios do Thesouro em prol da agricultura.

Se esses sacrificios serão fructuosos e acertadas as providencias de que dimanam, a experiencia o dirá. O que importa affirmar bem alto, com a auctoridade do dever cumprido, é que a acção dos poderes publicos pouco pode, se não ó secundada pelo trabalho intelligente, methodico, paciente e perseverante da lavoura e do commercio, cheios de confiança na fecundidade da sua iniciativa, sem illusões optimistas nem pessimismos despropositados.

Emquanto o Governo procura facilitar aos nossos vinhos a conquista de novos mercados por tratados de commercio, deve essa expansão ser preparada pela perfeição e barateza do fabrico e pela boa organização do commercio, mercê dos recursos que offerece o principio associativo.

Inspirado por estas considerações, ousa o Governo esperar que Vossa Majestade, que tão desveladamente se interessa pela prosperidade da agricultura nacional, se dignará sanccionar, para ter força de lei, o projecto de decreto a que se refere o presente relatorio.

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Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, em 14 de junho de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto - Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que me representaram o Conselheiro de Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios do Estado das demais repartições: hei por bem decretar, para ter força de lei, o seguinte:

TITULO

CAPITULO I

Deposito de Vinhos dos lavradores

Artigo 1.° Os lavradores que, individualmente ou associados, possuam ou venham a estabelecer, no local ou fora do local da producção, depositos de vinhos e seus derivados, nas condições e para os fins designados nos numeros seguintes, não serão considerados especuladores ou negociantes, e ficarão isentos da respectiva contribuição industrial e do sêllo de licença, contanto que directamente não exportem nem vendam para consumo :

1.º Quando os depositos se destinem exclusivamente á conservação, tratamento, lotação, ou preparação dos vinhos da propria producção e seus derivados, ou ao seu envasilhamento ou engarrafamento e outras operações e processos cenologicos applicaveis aos mesmos producto;

2.° Quando os mesmos estabelecimentos, situados dentro das regiões vinicolas productoras, tenham por fim facilitar a unificação dos typos dos vinhos das mesmas regiões, quer as uvas, os mostes ou os vinhos recolhidos sejam de producção propria, quer alheia, comtanto que provenham da respectiva região ;

3.° Quando sejam situados na região vinicola productora e destinados a receber vinhos e aguardentes, quer de producção propria, quer alheia, para serem respectivamente convertidas em aguardente ou em alcool nos alambiques ou apparelhos de destillação ou de rectificação existentes na mesma região;

4.º Quando sejam destinados á producção, conservação ou acondicionamento, para expedição, de mostos concentrados.

§ 1.° Aguardente, o alcool e o mosto concentrado, indispensaveis para beneficiação, correcção ou tratamento dos vinhos recolhidos nos depositos de que trata este artigo, poderão ser provenientes de diversa região.

§ 2.° Para os fins dos n.º 2.º e 3.° deste artigo as regiões vinicolas productoras considerar-se hão constituidas pelo concelho ou concelhos limitrophes, que produzam determinados typos de vinho.

§ 3.° Os depositos, a que se refere este artigo, não poderão ser situados dentro das barreiras de Lisboa e do Porto, nem em Villa Nova de Gaia.

§ 4.° Quando, em qualquer dos depositos a que se refere o n.° 1.º d'este artigo, sejam recebidas uvas, passas de uva, mostos ou vinhos, que não sejam de producção de lavrador em lavradores, associados, ficará esse deposito desde logo sujeito aos impostos ou contribuições que por tal facto lhe competirem.

§ 6.° Quando, em qualquer dos depositos de que tratam os n.º 2.° e 3.° d'este artigo, sejam recebidos productos designados no paragrapho precedente, sem que provenham da região vinicola a que pertença o deposito, ficará este sujeito desde logo aos impostos ou contribuições que lhe competirem

§ 6.° Os donos .dos depositou que tenham incorrido nas disposições dos §§ 4.º e 5.°, alem de pagarem as respectivas contribuições ou impostos, nos termos dos mesmos paragraphos, ficaráo sujeitos ás penas que lhes sejam applicaveis, segundo as disposições do Codigo Penal, quando não hajam feito a previa decIração para os effeitos legaes.

§ 7.º Para os effeitos d'este artigo e seus paragrapho, só serão considerados lavradores associados os que constituam syndicato agricola, nos termos da lei de 3 de abril de 1896; parceria a sociedade familiar 0u particular, nos termos do Codigo civil; adega social, ou qualquer outra forma de sociedade agricola, estabelecidas nos termos da legislação vigente.

i CAPITULO II

í Adegas Sociaes

Art. 2.° O Governo promoverá o estabelecimento de oito Adegas Sociaes, e auxiliará a sua laboração, a fim de facilitar o aperfeiçoamento do fabrico e tratamento dos vinhos, e a unifição dos seus typos regionaes.

& 1.º As Adegas Sociaes obrigar-se-hão:

1.º A constituir typos definidos de vinhos regionnaes do consumo ou lotação;

2.° A empregar exclusivamente aguardente ou alcool de vinho na adubação dos vinhos;

3.º A produzir annualmente 5:000 hectolitros de vinho, pelo menos, depois de tres annos de funccionamento;

4.° A receber, sem encargo algum para elles, os individuos que o Governo lhes mande, a fim de se instruirem ou aperfeiçoarem na vinificação e na conservação dos vinhos.

§ 2.° O Governo concederá ás Adegas Sociaes :

1.º Isenção de qualquer contribuição geral ou municipal nos primeiros dez annos, a contar da data da sua constituição, não sendo incluidos nesta disposição os impostos de consumo, real de agua, e direitos e imposto de exportação ;

2.° Edificios e terrenos do Estado, se existirem, na sede da Sociedade, disponiveis e apropriados ou apropriaveis para as installações das adegas;

3.º Isenção de direitos alfandegarios durante os primeiros cinco annos. a contar da data da constituição das Sociedades das Adegas Sociaes, para a importação de material vinario fixo ou de interior e de distillação, bem como de quaesquer machinismos necessarios para a sua labora-ção, ficando, todavia, sujeitas ás disposições regulamentares tendentes a evitar o abuso d'esta concessão;

4.° Faculdade de requisitar ao Governo um mostro de adega, cujos vencimentos serão satisfeitos pelo Estado durante cinco annos;

5.° Faculdade de requisitar ao Governo um laboratorio cenologico dotado com os instrumentos, apparelhos, utensilios e reagentes indispensaveis para o estudo das uvas, mostos, vinhos e seus derivados;

6.° Licença de emissão de warrants (conhecimentos de deposito e cautelas de penhor) cuja importancia total não poderá exceder 50 por cento do valor dos vinhos em deposito, ficando as Sociedades Proprietarias 'das Adegas Sociaes depositarias dos mesmos vinhos ou dos respectivos valores;

7.° Faculdade das Sociedades criadoras de Adegas Sociaes se constituirem sob a forma de cooperativa ou outra qualquer das legalmente auctorizadas;

8.° Faculdade de adquirir, não só de associados mas tambem de estranhos, dentro da região vinicola onde funccionem, uvas ou mostos para fabrico, e vinhos para lotação, nos termos applicaveis do capitulo 1;

9.° Permissão, sendo cooperativas, de fabricarem vinhos não só nas Adegas Sociaes, mas tambem nas adegas dos

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, associados satisfazendo as condições impostas nos n.º 1.º e 2.° do § I.° d'este artigo;

10.° Faculdade de requisitar ao Governo os projectos completos dos edificios necessarios á sua installação, os quaes lhes serão fornecidos gratuitamente;

11.° Faculdade de requisitar ao Governo o pessoal technico necessario para dirigir ou fiscalizar a construcção d'esses edificios, correndo por conta do Estado os vencimentos (d'esses funccionarios;

12.° Faculdade, sendo cooperativas, de solicitarem do Governo a construcção ou acquisição dos edificios e fornecimento de mobiliario vinicola necessarios para as suas installações, devendo, das quantias despendidas, ser o Estado embolsado no prazo maximo de vinte annos, a contar do primeiro em que a adega entre em laboração;

13.º Isenção do pagamento de commissão, ou despesas de qualquer outra natureza, excepto corretagem, pelas operações commerciaes dos seus productos, feitas por intermedio do Mercado Central de Productos Agricolas e por meio de amostras;

14.° Isenção do imposto do sêllo e de registo, podendo, portanto, ser escritos em papel commum todos os seus documentos ou diplomas, incluindo as escripturas de constituição ou modificação dos seus estatutos.

§ 3.° Findos os primeiros cinco annos de laboração das Adegas Sociaes, começarão as respectivas sociedades a pagar renda annual de 3 por cento sobre os valores que tiverem sido dados aos predios na epoca em que foram cedidos; poderão, porem, as mesmas Sociedades remir as rendas estabelecidas, vinte annos depois da installação, adquirindo os edificios pelos valores da avaliação feita na referida epoca.

& 4.° Os warrants a que se refere o n.° 6.º do § 2.º d'este artigo serão negociaveis na Caixa Geral de Depositos e no Banco Emissor, conforme, em regulamentos especiaes, ulteriormente se providenciar.

& 5.° O Estado terá o privilegio sobre os haveres das Adegas Sociaes para garantia do embolso a que se refere o n.º 12.° do § 2.° d'este artigo.

§ 6.° O Governo reserva-se o direito de exercer sobre as Adegas Sociaes, que desejarem gozar das vantagens concedidas pelo presente decreto, a fiscalização necessaria para o exacto cumprimento das suas disposições.

& 7.° O disposto no n.° 14.° do § 2.° d'este artigo é applicavel aos syndicatos agricolas, continuando em vigor o disposto no artigo 15.° da carta de lei de 3 de abril de 1896.

Artigo 3.º As Adegas Sociaes de que trata o artigo precedente constituirão propriamente emprezas regionaes de vinificação aperfeiçoada, tendo principalmente por fim fundir em grandes massas de vinho, de typos apropriados ao consumo interno, ou á exportação, as producções individuaes dos seus socios ou dos viticultores das respectivas regiões.

§ 1.º As Adegas Sociaes não poderão funccionar simultaneamente como sociedades viticolas, fazendo em commum operações de cultura da vinha; poderão, porem, fornecer aos respectivos socios, a prompto pagamento, a credito garantido, ou em conta corrente, objectos de alfaia viticola e vinicola, adubos, insecticidas e fungicidas para tratamento das vinhas, o alcool ou aguardente vinicos e outras substancias proprias para tratamento licito e conservação dos vinhos.

§ 2.° As Adegas Sociaes, que forem criadas nos termos e por effeito d'este decreto, não terão caracter exclusivo, e o Governo não obstará a que se fundem outras livremente nas mesmas regiões, sem a sua intervenção ou auxilio directo, salvo o disposto no paragrapho seguinte.

§ 3.° São applicaveis ás Adegas Sociaes, exclusivamente organizadas por associações de viticultores legalmente constituidas, independentemente de intervenção ou auxilio do Governo, as isenções a que se referem os n.º1.°,3.°, 4.°, 5.°, 6.°, 9.°, 10.° e 13.° do § 2.° do artigo 2.°, comtanto que não recebam uvas, mostos ou vinhos que não sejam da producção dos respectivos socios, salvo o disposto no capitulo l, na parte applicavel, e se sujeitem ás disposições do § 1.° do artigo 2.°, excepto quanto á producção annual, que poderá descer ao minimo de 1:000 hectolitros.

Art. 4.º Quando haja mais de um requerimento para criação de uma das oito Adegas Sociaes na mesma região, o Governo fará a concessão mediante concurso, nas condições seguintes:

1.° A base do concurso será o producto do numero do socios garantidos para a Adega Social pelo numero de hectolitros que os socios propostos poderão fornecer, não podendo, comtudo, contar-se para este effeito a cada socio producções superiores a 500 hectolitros.

2.º A proposta, feita em carta fechada, será instruida com o seguinte:

a) Documento que prove ter sido depositada na Caixa Geral de Depositos a quantia de 50$000 réis á ordem do Ministro das Obras Publicas, Commercio e Industria, como garantia de cumprimento da mesma proposta;

b) Relações contendo os nomes, residencias, producções, locaes de producção, e designação das vinhas dos socios propostos, sendo uma relação para cada concelho;

c) Informações dos agronomos dos districtos sobre a veracidade das mesmas relações;

d) Copia authentica da escriptura publica pela qual a maior parte, pelo menos, dos socios propostos, representando a maior parte da respectiva producção de vinho, contada nos termos da parte final do n.° 1.° d'este artigo, se obrigue a constituir a sociedade organizadora da Adega Social, conforme as condições d'este decreto e das que forem determinadas no aviso do concurso;

3.° O prazo do concurso não será inferior a sessenta dias; e o mencionado aviso determinará o dia, hora e local em que será feita, em sessão publica, a abertura das propostas;

4.. O jury que deva proceder á abertura das propostas, de que lavrará o competente auto, será nomeado em portaria pelo respectivo Ministro;

5.° Todo o processo do concurso, comprehendendo propostas, documentos e auto de abertura, será enviado ao Conselho Superior da Agricultura, o qual dará o seu parecer sobre a regularidade do concurso, e fará a classificação das propostas por ordem de importancia, nos termos do n.° 1.° d'este artigo;

6.° O aviso para o concurso fixará os prazos successivos dentro dos quaes, depois de feita a concessão para estabelecimentos da Adega Social, a respectiva Sociedade deverá estar constituida, os estatutos submettidos á approvação do Governo e a Adega Social em laboração;

7.º Se, cumpridos por parte do Governo os seus compromissos, a Sociedade organizadora da Adega Social não se tiver desempenhado de qualquer das suas obrigações no prazo competente, conforme o numero precedente, perderá o deposito de garantia, que reverterá a favor do Estado;

8.° Desde que a Sociedade organizadora da Adega Social haja cumprido as obrigações, a que se refere o n ° 6.° d'este artigo, poderá levantar o seu deposito de garantia;

9.° Os depositos de garantia, relativos ás propostas que não sejam classificadas em primeiro logar, poderão ser levantados pelos interessados logo que o Conselho Superior da Agricultura tenha effectuado a classificação e dado o seu parecer.

Art. 5.° A fiscalização das Adegas Sociaes, á qual se refere o § 6.° do artigo 2.° d'este decreto será exercida em commissão por intermedio de um agronomo do quadro respectivo, nomeado em portaria.

§ 1.° Este agronomo poderá ser coadjuvado na fiscalização das Adegas Sociaes pelos agronomos dos districtos em que as mesmas adegas sejam estabelecidas.

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§ 2.° O Mesmo agronomo informará o Governo sobre A fiscalização a seu cargo, por intermedio da Direcção Geral da Agricultura.

Art. 6.° O Governo encarregará um engenheiro do quadro dos serviços das obras publicas, coadjuvado pelo pessoal auxiliar dos mesmos serviços, que for necessario, da elaboração dos projectos e execução das obras, a que se referem os n.º 10.° e 12.° do § 2.º do artigo 2.º

CAPITULO III

Companhias Vinicolas

Art. 7.° O Governo abrirá concurso para a organização de uma Companhia Vinicola portuguesa, com socio em Lisboa, e capital minimo de 5:000 contos de réis, nos seguintes termos:

1.° O prazo para o concurso não será inferior a trinta dias, contados da data da publicação do aviso no Diario do Governo

2.° Constarão do aviso todas as vantagens que são offerecidas á Companhia, bem como todos os encargos que lhe serão impostos, e as condições e base do concurso;

3.º A base do concurso será o numero de depositos para venda de vinhos portugueses, que os concorrentes se propuserem abrir dentro ao cinco annos, a contar da data da adjudicação, no estrangeiro e nas colonias portuguesas, alem dos tres que vão enumerados no n,° 6 do artigo 8.°;

4.º Será preferida, em igualdade de circunstancias, a proposta que offerecer quaesquer outras vantagens para o Governo, para o país, ou para a agricultura nacional ;

5.º Para serem admittidos a concurso deverão os proponentes ter previamente depositado, á ordem do Governo, na Caixa Geral de Depositos, a quantia de 50 contos de réis em dinheiro, ou em titulos da divida publica portuguesa, representativos de igual valor real pela cotação do dia, como deposito provisorio de garantia;

6.° As propostas serão apresentadas em carta fechada e acompanhadas do documento que prove ter sido feito o deposito a que se refere o numero precedente;

7.° A abertura das propostas effeectur-se-ha, em sessão publica, no dia e hora determinados no respectivo aviso, no Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, perante o jury, que para esse fim for nomeado em portaria pelo Ministro, e que lavrará o competente auto;

8.° O auto do abertura das propostas será enviado com as mesmas ao Conselho Superior da Agricultura, a fim de proceder á respectiva classificação, emtltindo tambem o seu parecer sobre quaesquer vantagens que, nos termos do n.º 4.° d'este artigo, sejam offerecidas por algum dos concorrentes;

9.° Feita a classificação das proposta e preenchidas todas as formalidades e condições do concurso, o Governo fará o contrato com a empresa ou apresentante da proposta preferida, nos termos d'este artigo;

10.° O deposito provisorio de garantia, feito pelo representante da proposta preferida, será convertido em deposito definitivo de caução para exacto cumprimento das clausulas do contrato, logo que este seja assignado;

11.° Este deposito vencerá o juro da lei;

12.° O deposito definitivo poderá ser levantado logo que esteja realizada a primeira serie do capital na importancia de 1:000 contos de réis.

Art. 8.º A Companhia será organizada nas condições seguintes:

1.° Elevará o seu capital a 5;000 contos de réis realizando-o, em series, á medida que as necessidades das installações, stock, movimento e transacções o exijam, sendo a primeira serie de 1:000 contos de réis e as seguintes não inferiores a 500 contos de réis cada uma;

2.° O capital será representado por acções nominativas,ou ao portador, do valor nominal de 20$000 réis cada uma, podendo haver titulos de l, 5, 10 e 100 acções;

.° A duração da Companhia será de noventa e novo annos, podendo o prazo ser prorogado;

4.° A Companhia fará a propaganda dos bons processos cenologicos para o aperfeiçoamento dos vinhos nacionaes, podendo vinificar de conta propria, distribuindo instrucções e publicações tendentes a esclarecer os vinhateiros acerca das preferencias dos consumidores e dos typos de vinho de que a companhia necessite;

5.º Empregará na aguardentação dos seus vinhos, exclusivamente, aguardente ou alcool de vinho, comprados ao productor, ou destillados pela propria companhia na sua sede ou nos centros de producção vinicola nacional que mais lhe convenha;

6.° Promoverá o alargamento da exportação do vinho português por meio do exposições, annuncios, reclames, caixeiros viajantes, agencias, e outros meios, e pelo estabelecimento e manutenção de tres depositos commerciaes de vinhos: um na republica dos Estados Unidos do Brasil ; outro nas colonias portuguesas da Africa Oriental, e o terceiro nas da Africa Occidental, nos portos que mais lhe convenha;

7.° Terá estes tres depositos sempre abastecidos por forma que possam fornecer ao commercio ou ao consumo, em qualquer occasião, 1:000 hectolitros de vinho cada um;

8.° Estabelecerá nessas depositos, e naquelles que se obrigar a fundar noutros pontos, uma exposição permanente das amostras de vinhos para esse fim fornecidos pelos viticultores nacionaes;

9.° Venderá á consignação, quando não prefira outro processo commercial, os vinhos que sejam julgados pela companhia em condições idoneas, e cuja venda lhe seja requerida por qualquer vinhateiro ou commerciante nacional.

Art. 9.º O Governo concederá á Companhia :

1.° Edificios e terrenos do Estado, dentro da area fiscal de Lisboa, por cedencia gratuita durante prazo determinado, por arrendamento, ou por venda;

2.° Isenção de quaesquer contribuições geraes ou municipaes, nos primeiros dez annos, a contar da data da assignatura do contrato de concessão, não sendo incluido o imposto do real de agua.
Todos os vinhos que derem entrada nos seus armazens serão isentos do imposto de consumo, ficando a Companhia sujeita ás disposições regulamentares destinadas a evitar o abuso d'estas concessões. Só pagarão o dito imposto, em Lisboa, os vinhos que sairem dos mesmos armazens para venda na cidade.

3.° Isenção dos direitos de importação, durante os primeiros cinco annos, a contar da data da sua constituição, do material vinario fixo ou de interior e de destillação, bem como de quaesquer machinismos ou apparelhos, de que necessito, para o preparo de vinhos e aguardentes, na sede ou dependencias no continente do reino, ficando todavia sujeita ás disposições regulamentares destinadas a evitar o abuso d'esta concessão ;

4.° Edificios do Estado nas colonias portuguesas, havendo-os apropriados ou apropriaveis e disponiveis, para servirem de deposito de vinhos, emquanto a Companhia não construir armazens seus, para o que lhe será concedido o prazo de cinco annos, a contar da data do estabelecimento do deposito;

5.° Todos os terrenos do Estado que forem necessarios para a construcção dos armazens indicados no n.° 6.° do artigo 8.°, situados nas colonias portuguesas da África, ouvido o respectivo Governador;

6.° Faculdade de requisitar ao Governo um cenologo, um mestre de adega e seus auxiliares technicos, que serão escolhidos por acordo entre o Governo e a Companhia, ficando no cargo do Estado o pagamento dos vencimentos d'estes funccionarios durante cinco annos,

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Art. 10.º Os edificios e terrenos indicados no n.° 1.º do artigo 9.° serão cedidos á Companhia durante o prazo de sua existencia, nos seguintes termos:

l.° Os edificios e terrenos serão avaliados antes de se abrir praça para a constituição da Companhia o cedidos gratuitamente á empresa preferida no concurso, que só começará a pagar ao Estado uma renda annual de 3 ou 5 por cento do valor dos mesmos edificios o terrenos, conforme o dividendo distribuido aos accionistas estiver comprehendido entre 6 e 8 por cento ou for superior a 8 por cento;

2.° A Companhia concessionaria, passados vinte annos do existencia commercial, poderá adquirir os edificios e terrenos ou parte d'elles pelo preço da avaliação feita no acto da constituição da empresa, estipulando-se no contrato primitivo de concessão quaes os edificios ou terrenos que poderão ser vendidos nestes termos.

Art. 11.° No caso em que a Companhia não cumpra as clausulas do contrato e as disposições d'este decreto, nem utilize para o fim a que são destinados os edificios e terrenos cedidos temporariamente pelo Estado, ou quando liquide antes de findo o prazo da concessão, reverterão para a posse do Estado os mesmos edificios e terrenos, quer no continente, quer no ultramar, sem direito a qualquer indemnização pelas bemfeitorias realizadas.

Art. 12.° Junto da Companhia funccionará, em harmonia com o disposto no Codigo Commercial, representando o Governo, um Commissario Regio encarregado de fiscalizar o exacto cumprimento da lei e das condições do contrato de concessão.

Art. 13.° Alem da Companhia Vinicola a que se raferem os artigos precedentes, pode o Governo abrir concursos para a organização de uma companhia na cidade do Porto e outra na Figueira da Foz, adaptando a esse fim a parte applicavel d'este capitulo, e tendo em vista que as mesmas companhias satisfaçam quanto possivel ás conveniencias do país e das respectivas regiões viticolas.

CAPITULO IV

Beneficiação dos mostos

Art. 14.° É permittida a beneficiação dos mostos, durante n trabalho da vinificação, pelo addicionamento de passas ou mostos concentrados de uva do producção nacional.

§ 1.° Não é permittido o addicionamento de agua durante o trabalho da vinificação, quando o mosto tenha sido beneficiado pela forma indicada neste artigo.

§ 2.° A concessão feita neste artigo não poderá aproveitar ao fabrico de vinho dentro das barreiras de Lisboa e Porto.

§ 3.° Salvo o caso previsto neste artigo, continua em vigor o artigo 29.° do decreto de 23 de dezembro de 1899, que não permitte a fabricação de vinho de passa, de bagaço, de assucar ou de mosto concentrado.

CAPITULO V

Patentes de introducção de novos processos Industriaes

Art. 15.º O Governo poderá conceder, nos termos d'este decreto e quando os interesses publicos o aconselharem, em toda a area do continente do reino e das ilhas adjacentes ou dentro de cada zona que for marcada, o direito exclusivo do preparar passas de uvas, de extrahir o tartaro dos residuos da destillação ou da vinificação ou de concentrar mostos e vinhos, por processos aperfeiçoados não executados industrialmente em Portugal.

§ unico. Para os effeitos d'este decreto entender-se-ha por processo aperfeiçoado aquelle que, representando melhoria nos methodos de preparação, extracção ou concentração dos productos de que se trata não for praticado industrialmente no país na data do pedido da concessão.

Art. 16.° O Governo, antes do fazer a concessão, julgará ouvidas as estações competentes:

1.º Se o processo que se pretende introduzir é ou não praticado industrialmente no país;

2.° Se o requerente está habilitado com os fundos necessarios para emprehender o fabrico;

3.° Se a concessão pedida é do interesse publico.

Art. 17.° A concessão será feita pelo Governo, por prazo não excedente a dez annos, em um titulo denominado patente de introducção de novo processo, que deverá ser publicado no Diario do Governo.

§ unico. A concessão poderá ser renovada, mas a sua duração total não excederá, em caso algum, o prazo maximo de dez annos, contados da data da primeira patente.

Art. 18.º A patente de introducção de novo processo só dá direito ao exclusivo da preparação, extracção ou concentração dos productos indicados na patente pelo processo nella designado, ficando livre a todos o exercido da mesma industria por outros processos.

§ unico. As patentes de que se trata não envolvem directa ou indirectamente o exclusivo da venda dos productos respectivos ou da importação dos similares estrangeiros.

Art. 19.° Os estrangeiros poderão obter patente de introducção de novo processo, assignando termo de ficarem sujeitos á legislação portuguesa e á exclusiva jurisdicção das auctoridades e tribunaes portugueses sobre o objecto da patente

Art. 20.° O pretendente a uma patente de introducção de novo processo apresentará, na Direcção Geral do Commercio e Industria, requerimento contendo o nome, nacionalidade e residencia do requerente, designação clara do novo processo que se propõe a introduzir com indicação do tempo por que pede privilegio, e se o podido é feito em relação a todo o país ou só a determinada zona, sem que tal requerimento contenha condições, nem restricções.

Ao requerimento serão juntos quaesquer documentos que o pretendente julgue convenientes ou que a repartição respectiva reclame para justificar e precisar o pedido ou demonstrar os meios de que dispõe o requerente para a execução do novo processo.

Se o requerente for estrangeiro deverá jantar ao requerimento copia authentica do termo de que trata o artigo 19.°

§ 1.° O requerimento será assignado pelo pretendente ou pelo seu representante, devendo este juntar procuração em devida forma ou declaração de que a apresentará no prazo de trinta dias. Se a procuração não for apresentada no prazo de trinta dias, ficará o pedido sem effeito.

§ 2.° Em cada requerimento só pode ser pedida patente de introducção para um determinado processo.

§ 3.° Para assegurar a prioridade do pedido será o requerimento registado em um livro especial, apenas for apresentado na repartição da propriedade industrial, indicando-se na nota de entrada o dia e a hora da sua apresentação. Essa nota será assignada pelo chefe da repartição ou por quem suas vezes fizer, e poderá ser rubricada pelo interessado.

§ 4.° Entre dois registos de requerimentos, pedindo patentes, não poderá haver intervallo algum.

§ 5.° O requerimento para concessão de patente de introducção de novo processo será sempre entregue pelo interessado ou seu representante, na repartição competente, e o registo feito immediatamente depois da apresentação, devendo o requerente naquelle acto ou no prazo maximo de tres dias, a contar da data da entrega do requerimento, apresentar documentos comprovativos de terem sido pagos os emolumentos respectivos e de haver sido prestada na Caixa Geral de Depositos a caução provisoria de 500$000 réis em dinheiro ou em titulos, pelo

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seu valor no mercado. Esta caução será restituida no interessado se lhe for recusada a patente, e será perdida em proveito do Thesouro Publico só, concedida a patente, não for depositada dentro de sessenta dias a caução definitiva que o Ministro fixar.

Art. 21.° Recebido o requerimento era que for podida a patente de introducção de novo processo e verificado que o requerimento esta em condições de ter seguimento, serão publicados no Diario ao Governo o mesmo requerimento e os respectivos documentos, e bem assim o aviso marcando o prazo, nunca inferior a dota meses, para reclamação de quem se julgar prejudicado na sua industria pela referida concessão.

Art. 22.° A reclamação contra pedidos de patente de introducção do novo processo, poderá ser apresentada por qualquer individuo, firma, sociedade em commandita, sociedade anonyma, associação de classe (industrial, commercial ou agricola) ou syndioato agricola legalmente constituido; será formulada em requerimento com assignatura reconhecida por tabellião, e será apresentada na Direcção Geral do Commercio e Industria, até ao ultimo dia util do prazo marcado no aviso publicado no Diario do Governo.

Art. 23.° Da resolução do Ministro, concedendo patente de introducção de novo processo, poderão reclamantes recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo, dentro do prazo de trinta dias, contados da data da publicação da patente. Esto recurso terá effeito suspensivo.

§ unico. A decisão do Supremo Tribunal Administrativo será tomada, dentro do prazo de trinta dias, em accordão devidamente fundamentado, que terá força executiva independentemente de decreto do Governo.

Art. 24.º Na patente indicar-se-ha sempre o numero do ordem, o nome e a residencia do concessionario, os productos ou o processo emprehendidos na concessão, o tempo por que se concede privilegio, o prazo para o completo estabelecimento do novo processo, conforme a sua natureza e fino, o minimo de producção annual a que o concessionario fica obrigado, a canção definitiva que o concessionario devera prestar, a zona respectiva, o quaesquer outras clausulas especiaes quo sejam impostas.

§ 1.° A caução definitiva será fixada pelo Ministro e não poderá ser interior a 500$000 réis nem superior a réis 5:000$000, em dinheiro ou em titulos pelo seu valor no mercado.

§ 2.° A patente não será valida sem que esteja depositada na Caixa Geral de Depositos, á ordem do Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, a importancia da caução definitiva, e sem que na mesma patente esteja lançada, em apostilla, a declaração de haver sido prestada a referida caução. A patente caducará se a caução definitiva não for prestada dentro do prazo de sessenta dias, contados da data do mesmo documento.

§ 3.° No caso de ser interposto recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, o prazo marcado no paragrapho anterior seva prorogado até trinta dias depois da data da accordão do mesmo tribunal.

§ 4.° O Governo determinará nos regulamentos os casos em que poderá ser levantada a caução de que tratam os §§ 1.º e 2.°

§ 5.° A patente poderá sor passada em nome de um individuo ou de uma sociedade commercial (em nome colletivo, em commandita ou anonymo) legalmente constituida e devidamente registada no Tribunal do Commercio respectivo.

Art. 25.° As patentes de introduccão de novo processo não poderão ser transferidas por qualquer titulo, no todo ou em parte, sem previa auctorização do Governo. É applicavel ás transferencias o disposto no § 5.° do artigo anterior.

Art. 26.° As disposições d'este decreto não alterara que ao acha estabelecido nos artigos 613.° a 640.° do Codigo Civil ou nas convenções internacionaes, relativamente, propriedade dos inventos.

Art. 27.° Será estabelecido no Ministerio das Obras Publicas, Commercio o Industria, um registo do patentes, o introducção do novos processos, de que trata este capitulo, e de suas transmissões.

Art. 28.° É nulla a patente de introducção de novo processo:

1.° Se decorrer um anno, contado da data da patente, som que a introducção do novo processo tenha sido realizada;

2.° Se a exploração do novo processo deixar de ser exercida ou não for produzido o minimo designado na patente, ora algum dos annos do periodo da concessão.

Art. 29.° Quem, durante a vigencia da patente de introducção de novo processo, lesar o encartado no exercicio do seu direito, é responsavel pela reparação dos damnos causados, alem do ficar sujeito ás cotnminações do Codigo Penal.

Art. 30.° Em caso de suspeita do sor empregado illegitimamento por outrem o processo a que se referir a patente de introducção, preparando, extrahindo ou concentrando os productos indicados na mesma patente pelos processos nella designados, poderá o encartado, em sou represantante, prostando previamente caução, requerer arresto nos machinismos ou instrumentos que só possam servir para applicação d'esse processo, o nos productos existentes nas officinas ou fabricas onde estiverem esses machinismos ou instrumentos, ou nos armazens ou depositos d'ellas dependentes.

§ unico. São applicaveis a este caso os preceitos estabelecidos no § unico do artigo 637.° o nos artigos 638.º a 640.° do Codigo Civil.

Art. 31.° O Governo poderá fiscalizar, por agentes seus, o modo como os concessionarios cumprem as abrigações resultantes das patentes, podendo esses agentes visitar as fabricas o oflicinas quando se julgar conveniente, verificar a producção o proceder a quaesquer investigações na escripturação e nos archivos das mesmas fabricas o officinas.

TITULO II

Producção de aguardente e alcool vinicos e respectivos mercados

CAPITULO IV

Estações agricolas de distação

Art. 32.º Nas regiões vinicolas mais adequadas á producção de aguardente, poderá o Governo estabelecer estações de distillação e do rectificação, as quaes terão principalmente por fim promover o desenvolvimento o aporfeiçoamento do fabrico de aguardente o do alcool vinicos, e ensinar praticamente o oficio do destillador e serão denominadas Estações Agricolas de Distlllação.

§ 1.º Alem do vinho poderão ser distillados pelas mesmas estações o bagaço de uva, a agua-pé e as borras de vinho.

§ 2.° As Estações Agricolas de Distillação serão situadas por forma que possam aproveitar a regiões vinicolas importantes, e na proximidade do rios navegaveis, ou de caminhos do ferro que sirvam essas regiões.

§ 3.° O Governo poderá auxiliar o estabelecimento de estações do distilação dos syndicatos agricolas ou das adegas sociaes, quando assim lhe seja pedido pelos mesmas associações, não excedendo, porem, a verba que para esse fim for designada no orçamento do Estado, e ouvido o Conselho Superior da Agricultura.

Art. 33.° Cada Estação Agricola de Distillação poderá comprehender:

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1.° Um apparello de distillação-rectificação directa, ou um apparelho de distillação e outro de rectificação, ou só um de rectificação, consoante as conveniencias da respectiva região vinicola;

2.º Um gerador de vapor proporcionado aos apparelhos constantes do numero antecedente;

3.° Um apparelho locomovei de distillação continua;

4.º Um ou mais apparelhos locomoveis do distillação intermittente, de aquecimento directo, ou a vapor, apropriados á destillação do vinho, agua-pé, bagaço de uva o borras de vinho nos logares do producção;

5.º Quaesquer outros apparelhos, instrumentos e utensilios adequados e necessarios as distillarias de vinhos ou de seus derivados.

§ unico. O vasilhame para transporte dos vinhos e seus derivados, ou para regresso dos productos da distillação ou rectificação, será fornecido pelos interessados.

Art. 34.° A installação das Estações Agricolas do Destillação será feita em edificios do Estado, sempre que seja possivel e economico, sem prejuizo dos fins das mesmas estações; ou em edificio adquirido pelo Estado, por compra ou arrendamento, ou mandado expressamente construir, quando não possam verificar-se os outros casos

Art. 35.° Cada Estação Agricola de Distillação ficará a cargo de um regente de qualquer dos quadros dos serviços agricolas, podendo perceber por este serviço, nos dias uteis, alem dos seus vencimentos, uma remuneração equivalente á ajuda de custo que lhe competir por lei, se accumular entras funcções.

Art. 36.° Para cada uma das Estações Agricolas de Distillação será contratado temporariamente um pratico distillador, nacional ou estrangeiro, do reconhecida competencia, ao qual incumbirá, alem do governo e manutenção dos apparelhos, o ensino pratico dos individuos que desejem habilitar-se com o officio do distillador.

§ unico. Alem do pessoal a que se referem os artigos 35.° e 36.°, poderá haver em cada Estação os jornaleiros necessarios para o bom andamento e execução do serviço.

Art. 37.° Os vinhos ou quaesquer dos seus derivados, que se destinem á distillação ou á rectificação, serão entregues nas Estações Agricolas de Distillação pelos interessados, os quaes rceeberão, ali tambem, as aguardentes ou alcooes extrahidos dos mesmos productos.

§ unico. Os productos da distillação o da rectificação, que não forem retirados das respectivas Estações no prazo do dez dias, contados da data do competente aviso, pagarão de armazenagem 20 réis por dia e por hectolitro ou fracção de hectolitro ou fracção de hectolitro

Art. 38.° A distillação e rectificação do vinho e seus derivados, feitas nas Estações do que trata este decreto, deverão ser sempre dirigidas por forma que se obtenha o melhor producto alcoolico possivel, tendo em vista a qualidade da materia prima distillada e do apparelho empregado, e a applicação a que for destinado esse producto.

§ 1.° A distillação do vinho e de seus derivados, e bem assim a rectificação da aguardente serão feitas pela ordem da numeração da entrada dos mesmos productos nas Estações.

§ 2.° As vasilhas que sairem das Estações, contendo alcool ou aguardente vinicos ali produzidos, levarão as respectixas marcas de procedencia e garantia appostas sobre os batoques, por forma que sejam inevitavelmente inutilizadas ao tirar os mesmos batoques.

§ 3.° Os productos, a cujo fabrico se destinam principalmente as Estações Agricolas de Distillação, comprehendem:

1.° A aguardente de copo ou de mesa, da força mínima do 50° e maxima de 70° centesimaes;

2.° A aguardente fina ou redonda, da força de 77° a 78° centesimaes;

3.° A aguardente supérflua, da força do 85° a 86° centesimaes;

4.º O alcool, rectificado da força de 94 a 95° centesimaes;

5.° O alcool extra-refinado, neutro, da força de 96° a 97° centesimaes.

§ 2.° As aguardentes de bagaço e de borras, produzidas nos apparelhos das Estações, serão exclusivamente destinadas á rectificação.

Art. 39.° O preço ou custo da distillação simples o da distillação-rectificação directa do vinho, agua-pé, bagaço e borras, e o da rectificação da aguardente serão fixados nas instrucções regulamentares, tendo em vista, quanto possivel, os interesses da agricultura o os da industria particular da distillação e da rectificação.

Art. 40.° As Estações serão dirigidas pelos agronomos dos respectivos districtos e fiscalizadas e inspeccionadas pelo inspector dos serviços agronomicos, ou por um agronomo do quadro especialmente nomeado para este fim.

Art. 41.° Em cada uma das Estações far-se-ha a contabilidade rigorosa da sua administração e de todas as suas operações, por forma que seja possivel apreciar, com clareza, a sua despesa e receita.

§ 1º Nas instrucções regulamentares se prescreverão os modelos dos livros para a contabilidade a que se refere esto artigo.

§ 2.° A escripturação incumbirá especialmente ao regente da Estação, o qual será coadjuvado pelo pratico distillador.

Art. 42.° Os praticos distilladores para o serviço dos apparelhos locomoveis, quando estes tenham de funccionar fora das respectivas Estações, serão contratados como jornaleiros, e só pelo tempo que durar o mesmo serviço.

§ 1.° Os praticos distilladores, a que se refere o artigo 36.°, serão obrigados a trabalhar com os apparelhos locomoveis nos logares de producção, quando não tenham serviço nas respectivas estações.

§ 2-° Os apparelhos locomoveis poderão ser alugados a distilladores ambulantes, mediante contrato caucionado, ou com fiador idoneo, estipulando-se o aluguer, na importancia de 1 por cento, ao mês, do custo do acquisição de cada apparelho, o a obrigação de pagarem os mesmos distilladores os concertos ou prejuizos dos apparelhos, quando resultem do mau uso que lhes derem.

Art. 43.° Nenhuma das substancias, a que se referem o artigo 32.° e seu § 1.°, poderá ser distillada nos apparelhos das Estações, quando não esteja em estado do conservação, que lhe permitta fornecer um producto alcoolico de qualidade regular.

§ 1.° As substancias em quo haja principio de azedia poderão ser distilladas, comtanto que soaram a previa e conveniente desacidificação.

Art. 44.° Os individuos que desejarem obter a distillação de vinho ou dos seus derivados, ou a rectificação de aguardente nas Estações Agricolas do Distillação, enviarão aos respectivos regentes as suas requisições, conforme o modelo que as instrucções regulamentares determinarem.

Art. 45.° Os individuos que desejarem habilitar-se com o officio de distillador, enviarão os seus requerimentos, indicando a Estação Agricola de Distillação que preferirem, á Direcção Geral da Agricultura.

§ 1.° Os requerimentos deverão ser acompanhados dos seguintes documentos:

l.° Certidão de baptismo que prove maioridade;

2.° Certidão de exame de instrucção primaria elementar ou complementar;

3.° Attestado que prove não soffrer de molestia contagiosa.

§ 2.° Em cada Estação não poderá haver mais de cinco praticantes.

§ 3.° O tirocinio do praticante não poderá abranger menos de dois meses, nem mais de seis meses, de trabalho effectivo.

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§ 4.° Logo que, passado o prazo que determina o paragrapho precedente, o praticante esteja habilitado a dirigir as operações do distillação e rectificação, ser-lhe-ha passado o respectivo attestado de distillador, assignado pelo regente o pelo pratico distillador da respectiva Estação.

§ 5.º O ensino será gratuito e os praticantes terão residencia externa por sua conta, devendo comparecer na respectiva Estação durante as horas do trabalho o coadjuvar o respectivo pessoal.

§ 6.° Nu falta de individuos habilitados com o exame de instrucção primaria, poderão ser admittidos a praticar nas Estações Agricolas de Distillação aquelles a quem falte esse exame, comtanto que saibam ler o escrever, o não seja excedido o numero fixado no § 2.° d'este artigo.

Art. 46.° A receita das Estações poderá ser utilizada no respectivo custeio, conforme for determinado nas instruções regulamentares.

§ l.° Na parto em que o custeio exceda a receita, será a despesa paga pela verba que annualmente for, para esse fim, inscripta no Orçamento Geral do Estado.

§ 2.° Quando, fechadas as contas da gerencia de cada turno, a receita exceder a despesa em alguma das Estações, a Direcção Geral da Agricultura poderá propor a remuneração extraordinaria que convirá conceder ao regente e ao pratico distillador respectivos, como premio e estimulo do bem serviço, não devendo, contudo, a soturna das duas remunerações ir alem de 20 por conto do saldo da receita.

§ 3.º Como base para a proposta a que se refere o paragrapho procedente, o inspector dos serviços agronomicos enviara á Direcção Geral da Agricultura, no fim de cada anno economico, os suas informações sobre os serviços dos regentes e dos praticos distilladores.

§ 4.º O saldo da receita das Estações dará entrada na Caixa Geral de Depositos, á ordem do Ministerio das Obras Publicas, Commercio o Industria, para constituir um fundo de fomento vinicola, principalmente destinado a occorrer, com as verbas orçamentaes, ás desposas das mesmas Estações e das Adegas Sociaes, que, nos termos d'este decreto, estejam a cargo do Estado.

Art. 47.º Cada uma das Estações Agricolas do Distillação, quando o Governo julgue conveniente, ouvidas as estações competentes, poderá ser entregue á industria particular, mediante concurso em hasta publica, e a, quem offerecer maior renda o se obrigue o manter o mesmo estabelecimento em regular exploração o boa conservação, para utilidade dos vinicultores, syndicatos agricolas e outros interessados, nos termos applicaveis d'este decreto e das respectivas instrucções regulamentares.

§ 1.º Em igualdade do rondas offerecidns, terão preferencia os concorrentes que propuserem menoros preços do distillação e de rectificação.

§ 2.° Os syndicatos agricolas das respeitavas regiões terão direito de opção, quando declarem usar d'esse direito no prazo de cinco dias a contar da dota do concurso.

CAPITÃO VII

Mercados centraes de alcool e aguardente

Art. 48.° Nas Bolsas do Lisboa e Porto far-se hão transacções e cotações sobre o alcool e aguardente, nos termos do Codigo Commercial, que sejam applicaveis analogamente, o nas condições, seguintes:

1.° Sobre amostras, dos vendedores, representando quantidades, enunciadas ou não, que existam paru venda na posso dos productores, dos negociantes ou do quaesquer outros individuos;

2.° Sobre amostras, dos compradores, representando qualidades ou typos que desejem adquirir;

3.º Sobre typos determinados pelas qualidades fixadas pelo uso, sem amostra, podendo ser determinados pelas seguintes qualidades, condições ou caracteres:

a) A força ou graduação alcoolica centesimal em volume;

b) A materia prima do que procedo o alcool ou a aguardente, o systema legal do fabrico, a localidade, a região ou país do procedencia.

Art. 49.° Quando u transacção tenha por base a amostra do vendedor, este será obrigado o, fornecer genero igual á amostra; a só tiver por base a amostra do comprador, o vendedor deverá fornecer genero commercialmente identico á amostra, pelo menos, em qualidade, força alcoolica, sabor e cheiro.

Art. 50.° Os typos commerciaes do alcool e aguardente são:

l.° Quanto á força alcoólica:

a) Alcool absoluto, ou anhydro, de 100° centesimaes

b) Alcool extra-rufinado, de 96° a 97° centesimaes em volume;

c) Alcool refinado, ou rectificado, do 94° a 95° idem;

d) Aguardente 8up&rfina, de 86° a 86° idem;

e) Aguardente fina, ou redonda, de 77° a 78° idem;

f) Aguardente de mesa, para Envelhecer, do 65° a 70º
idem;

g) Aguardente de mesa, ordinaria, do 59° a 60° idem;

h) Aguardente de mesa, velha, de 49° a 50° idem;

i) Aguardente baixa, do 45° a 46° idem.

2.º Quanto á materia prima e systema legal de fabrico e procedencia:

a) Alcool industrial, produzido nas fabricas respectivas, ou importado, o qual deve ser perfeitamente rectificado e podo ser ou deixar do ser qualificado pela designação da materia prima de que proceda, como milho, batata doce, batata, alfarroba, etc.;

b) Alcool desnaturado, nos termos d'este decreto, poducto ser qualificado pela designação da materia prima, pela do meio do desnaturação, e pela da applicação sob cujo ponto do vista foi desnaturado;

c) Alcool unico, produzido nas fabricas o nas distillarias agricolas e Estações Agricolas de Distillação, munidas de apparelhos rectificadores, podendo proceder do vinho, agua-pé, bagaço do uva, ou borra do vinho, e ser apenas designado pelo nome generico, ou por este acompanhado do nome especifico da materia prima de que provém;

d) Aguardente vinica, produzida nos alambiques ou apparelhos de distillação nem rectificador, e a qual deve ser sempre vendida ou offerecida, com a designação da materia prima de que procedo, designando-se assim: aguardente de vinho, aguardente de agua-pé, aguardente de bagaço, aguardente de borra;

e) Aguardente agricola, do graduação não superior a 60º centesimaes, proveniente da distillação agricola ou domestica, dos productos da Agricultura, e a qual deve ser vendida ou offerecido com a designação especifica da materia prima, como aguardente de figo, de medronho;

f) Aguardente colonial, n quo procede das colonias, podendo ser especificada pela designação da materia prima, como aguardente de canna, ou pela denominação especial commum, como rhum, andaia, cachaça;

g) Quaesquer outros designações do procedencia, país, fabrica ou fabricante especial.

Art. 51.° Quando nu transacções tenham por base os typos e designações commerciaes do alcool ou da aguardente, serão esses typos ou designações determinados nos ajustes ou contratos respectivos.

Art. 52.° Quando as amostras de alcool ou de aguardente sejam enviadas para a Bolsa por intermedio do Mercado Central do Productos Agricolas, serão acompanhadas da respectiva analyse commercial, feita no laboratorio da Inspecção Geral dos Vinhos e Azeites.

§ l.° Quando as amostras sejam entregues directamente nas boinas, ou a estas enviadas por intermedio das associações que respectivamente os administrara superiormente,

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nos termos do artigo 84.° do Codigo Commercial, poderão as referidas associações requisitar a analyse commercial das mesmas amostras ás estações chimico-agricolas de Lisboa ou do Porto, conforme a Bolsa de que provenham ou á qual se destinem.

§ 2.° As analyses, a que se refere este artigo e seu § 1.°, serão feitas gratuitamente.

Art. 53.° O boletim da cotação do alcool de aguardente, abrangerá, pelo menos, o preço ou curso corrente do alcool industrial, do alcool vinico rectificado e da aguardente de vinho, fina ou redonda, exprimindo a graduação typo de cada uma d`estas qualidades, por forma que se possa facilmente calcular o preço por grau centesimal e por litro, para os effeitos do § 1.° do artigo 73.° d'este decreto.

Art. 54.ª De cada boletim da cotação do alcool e aguardente serão tiradas quatro copias, assignadas pelo syndico da camara dos Corretores, uma das quaes será enviada ao Ministerio da Fazenda, outra á Direcção Geral da Agricultura, outra á Direcção Geral do Commercio e Industria, e a quarta affixada no logar mais publico da Bolsa.

Art. 55.º O Governo poderá estabelecer outros mercados centraes de alcool e aguardente em outras cidades do reino, ou criar delegações dos de Lisboa e Porto, conforme julgue mais conveniente aos interesses do país.

TITULO III

Medidas fiscaes

CAPITULO VIII

Impostos sobre o alcool e alambiques

Art. 56.° O alcool e aguardente de qualquer proveniencia, produzidos no continente do reino e ilhas adjacentes, depois da publicação d'este decreto, ficam sujeitos, salvas as excepções nelle estabelecidas, ao imposto de producção de 80 réis por litro de liquido fabricado, não recaindo sobre este imposto addicional algum.

§ Unico. Este imposto será liquidado á saida das fabricas e pago em dinheiro ou em letras garantidas, até tres meses de prazo, vencendo o juro de 6 por cento annual, e pagaveis, quer na localidade onde o alcool for produzido, quer em Lisboa.

Art. 57.° O alcool, convenientemente desnaturado, conforme os preceitos d'este decreto e das respectivas instrucções regulamentares, pagará apenas o imposto de producção de 10 réis por litro de liquido desnaturado.

§ 1.° O alcool só poderá ser desnaturado á saida das respectivas fabricas, ou em armazens alfandegados.

§ 2.° Quando o alcool haja de ser desnaturado em armazem alfandegado, a sua passagem da fabrica para o referido armazem far-se-ha sob a fiscalização da auctoridade competente.

§ 2.° O imposto de producção estabelecido neste artigo será liquidado á saida das fabricas ou dos armazens alfandegados e pago pela mesma forma determinada no § unico do artigo 56.°

Art. 58.ª Exceptua-se do pagamento do imposto de producção:

1.° O alcool rectificado ou não, e aguardente, provenientes da distillação do vinho, borras de vinho, bagaço de uva o agua-pé e o alcool proveniente da rectificação da aguardente de vinho e seus derivados, quer as mesmas substancias sejam de producção propria, quer não;

2.° A aguardente proveniente da distillação de figos, nesperas, medronhos e outros productos da agricultura nacional de graduação não superior a 60° centesimaes, quando feita em alambiques sem rectificador, quer a materia prima seja de producção propria, quer não;

3.° O alcool e aguardente provenientes da distillação de canna de assucar, quer de produção propria, quer não,fabricados no archipelago da Madeira, quando destinados a consumo local; ficando todavia sujeitos ao imposto de 80 réis por litro de liquido, pago na alfandega de saida, quando exportados para o continente ou ilhas dos Açores;

4.° O alcool industrial fabricado no continente e ilhas adjacentes, que saindo da fabrica for exportado, sem ter soffrido transformação alguma, para países estrangeiros ou provincias ultramarinas.

rt. 59.° Ficam sujeitos a um imposto de licença annual os estabelecimentos onde se produzir alcool das proveniencias e nas condições indicadas no n.° 2.° do artigo 58.° d'este decreto, e conforme as taxas seguintes:

a) 2$000 réis por cada alambique, quando a capacidade d'este for inferior a 300 litros;

b) 10$000 réis por cada alambique de capacidade superior a 300 litros, mas que não exceda a 750 litros;

c) De 35$000 réis por cada alambique, quando a capacidade d'este for superior a 750 litros, ou quando, qualquer que seja a sua capacidade, forem de producçao continua.

Art. 60.° Continuam a ser dispensados da contribuição industrial, da licença a que se refere o artigo 24.° do regulamento de 20 de setembro de 1888 e do imposto ou sêllo de licença, os alambiques empregados na distillação de alcool e aguardente das materias primas mencionadas no n.° 1.° do artigo 58.° d'este decreto, quer estas sejam de producção propria, quer não.

§ 1.ª O disposto neste artigo é applicavel a quaesquer fabricas e apparelhos de distillação e rectificação, contanto que se destinem exclusivamente á producção de aguardente, ou de alcool, de qualquer graduação, das substancias a que se refere o mesmo artigo.

§ 2.° Quaesquer que sejam os serviços de fiscalização,que hajam de incidir sobre os alambiques ou apparelhos de distillação de que trata este artigo e seu § 1.°, nenhumas taxas, emolumentos, sêllos ou impostos serão por tal motivo cobrados dos respectivos possuidores, alem do imposto estatistico a que se refere o artigo 62.° d'este decreto.

Art. 61.° Os apparelhos de distillação ou alambiques, a que se referem o artigo precedente e os seus paragraphos, que, alem de aguardente de vinho, de borras de vinho, de bagaço de uva, ou de agua-pé, produzam tambem, nos termos do n.° 2.° do artigo 58.° d'este decreto, alcool e aguardente de quaesquer outros productos da agricultura nacional, continuarão a ser isentos do imposto de producção; ficarão comtudo sujeitos aos impostos industrial e de licença pelo tempo que distillarem estas materias primas, se forem de producção alheia, e tão somente ao imposto de licença, quando sejam de producção propria.

§ Unico. Para os effeitos d'este artigo, consideram-se de producção propria os figos, nesperas, medronhos e outros productos da agricultura nacional produzidos pelos donos ou possuidores dos alambiques ou apparelhos de distillação, por cada um dos lavradores associados, ou pelos socios dos syndicatos agricolas, que estejam de posse dos alambiques ou apparelhos.

Art. 62.° Os alambiques e outros apparelhos empregados exclusivamente na distillaçao de vinho, borras de vinho, agua-pé e bagaço de uva, pagarão apenas um imposto estatistico de 100 réis, qualquer que seja a força alcoolica do producto distillado e a especie de alambique ou apparelho de distillação ou rectificação.

Art. 63.° As instrucções regulamentares prescreverão os meios e processos de desnaturação do alcool a que se refere o artigo 57.°, tendo em vista principalmente e quanto possivel o seguinte:

1.° Que o alcool desnaturado não possa ser regenerado nem utilizado no tempero dos vinhos, ou na preparação de bebidas ou de medicamentos, sem que seja facilmente descoberta a fraude e se tornem repugnantes as bebidas em que tenha sido introduzido;

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2.° Que o alcool desnaturado seja facilmente reconhecido pelo sabor e cheiro repugnantes e pela côr ou, pelo menos, por duas d'estas propriedades;

3.º As substancias empregadas como meios de desnaturação devem, comtudo, ser de natureza e em quantidade que não impossibilitem o emprego do alcool na illuminação, no aquecimento e nos motores respectivos;

4.° Os meios de desnaturação devem ter acção sufficientemente intensa, para que possam ser empregados era diminuta quantidade;

5.° O custo dos meios de desnaturação deve ser relativamente modico para não prejudicar o emprego do alcool desnaturado nas applicações a que é destinado;

6.° As mesmas substancias não devem ser venenosas nem muito prejudiciaes á saude;

7.° Os meios de desnaturação, depois de dissolvidos no alcool, devem resistir aos processos physicos e chimicos de eliminação, e ser de facil verificação a sua presença no mesmo alcool ou nos productos em que este tenha entrado ;

8.ª Nenhum producto que normalmente exista no alcool poderá ser empregado para a desnaturação d'este;

9.° Alem dos meios communs de desnaturação do alcool, haverá meios especiaes, que poderão ser proferidos pelos interessados para determinados fins industriaes, e que só serão applicados a requisição dos mesmos interessados;

10.º O alcool desnaturado para certo fim e determinado interessado, não poderá por este ser cedido, trocado ou vendido, excepto depois de transformado nos productos da sua industria;

11.° Não poderá ser desnaturado alcool que tenha sido aromatizado, ou addicionado de quaesquer substancias, nem alcool de graduação inferior a 83° centesimaes.

Art. 64.° Não é permittido separar do alcool desnaturado, na totalidade ou em parte, qualquer das substancias nelle empregadas como meio de desnaturação, nem tão pouco juntar-lhe qualquer substancia que possa paralysar ou encobrir o effeito d'esse meio, salvo qualquer excepção que seja designada nas instrucções regulamentares.

Art. 65.º A desnaturação do alcool será feita a expensas do interessado, e não poderá incidir em quantidade inferior a 5 hectolitros, quando se empreguem os meios normaes, ou inferior a 1 hectolitro, quando se use dos meios especiaes de desnaturação.

Art. 66.º As contravenções ás disposições dos artigos precedentes, que respeitam no alcool desnaturado, quer importem fraude, quer falsa declaração, quer desobediencia ás disposições legaes, serão punidas nos termos do Codigo Penal, que lhes sejam applicaveis.

Art. 67.° Quem expedir, vender ou puser A venda quaesquer bebidas alcoolicas, ou vinagres, em cuja preparação tenha entrado alcool desnaturado, ou em cuja composição seja encontrada qualquer das substancias que forem adoptadas como meios de desnaturação do alcool, incorrerá nas disposições do artigo 52.° do decreto de 23 de dezembro de 1890, sendo punido com a pena de tres meses a um anno de prisão e a multa de réis 50$000 a 200$0000.

Art. 68.° As fabricas insulanas empregarão exclusivamente na producção do alcool e batata doce, emquanto ella existir nos mercados.

§ 1.° Quando a batata doce, em condições de ser distillada, se esgotar nos mercados, não se offereceá venda, ou attingir preço superior no maximo por que tiver sido contratada, no local da producção, a, sua venda em qualquer dos tres ultimos annos anteriores á lei de 21 de julho de 1893, poderá o Governo auctorizar-lhes a distillacão de qualquer outra substancia.

§ 2.° Fora dos casos previstos no paragrapho antecedente poderão as fabricas insulares distillar milho em quantidade não superior a 3 por cento, em peso, da batata doce necessaria para a laboração das mesmas fabricas ; e alem d´isso aquellas que usarem malt na sua laboração poderão empregar para tal fim a quantidade de materia prima necessaria, com tanto que não exceda em peso 4 por cento da batata doce distillada durante o anno.

§ 3.° As fabricas insulanas não poderão todavia distillar milho nacional sem previa auctorização do Governo.

Art. 69.° As contravenções no disposto no artigo 68.°e seus paragraphos serão punidas com a pena de perda da materia prima e producto fabricado e multa até réis 1:OQO$000, sem prejuizo de qualquer outra penalidade, de que sejam passiveis nos termos das leis geraes.

Art. 70.° O alcool e aguardente produzidos nas fabricas e trambiques, seja qual for a materia prima distillada, serão de boa qualidade, devendo ainda ser perfeitamente rectificado todo o alcool que não for produzido nas condições indicadas nos n.º 1.°, 2.° e 3.° do artigo 58.° d'este decreto, ou que não seja desnaturado.

§ 1.º As transgressões serão puniveis nos termos das disposições legaes e das instrucções regulamentares.

§ 2.° A pureza e perfeita rectificacção do alcool serão verificadas á saida das fabricas e á entrada do genero em qualquer alfandega do continente ou ilhas adjacentes, e ainda poderá ser verificada a sua qualidade e pureza em qualquer local de fabricação, nos depositos e armazens, e nas lojas o estabelecimentos para consumo.

§ 3.° É mantida a forma actual da fiscalização junto das fabricas.

§ 4.° Do resultado das analyses cabe recurso para a Inspecção Technica das Alfandegas e Contribuições Indirectas.

§ 5.° O alcool, a que, em resultado de analyse, for negada a applicação ao consumo alimentar, poderá ser recolhido á fabrica productora para ser convenientemente purificado, ou será desnaturado, nos termos d'este decreto, por forma que seja impossivel a sua regeneração.

Art. 71.° Durante dez annos, a contar da data da publicação d'este decreto, não será permittido, no continente e ilhas adjacentes, o estabelecimento de novas fabricas de alcool industrial, nem ainda a remodelação ou reconstrucção das existentes.

§ 1.° Será, porem, permittida a remodelação ou reconstrucção das fabricas existentes, quando passem a destinar-se exclusivamente a producção de aguardente ou alcool vinicos.

§ 2.º As fabricas, a que se refere o paragrapho precedente, não poderão voltar a produzir alcool industrial.

Art. 72.° Das fabricas de cada districto administrativo não poderá sair em cada anno economico, a contar de l de julho de 1901, quantidade de alcool industrial superior á media annual saida das mesmas fabricas no quinquennio de 1895-1896 a 1899-1900.

§ 1.° Exceptuam-se do disposto neste artigo as fabricas que distillem figo e alfarroba produzidos na região; de cada uma das quaes poderá sair annualmente quantidade de alcool igual ao maximo annual que d'ella tiver saido no mesmo quinquennio.

§ 2.° O quantitativo de cada fabrica será calculado pela sua capacidade productora, havendo rateio, dentro da producção de cada districto, pelas fabricas ali existentes.

Art. 73.° É estabelecida a taxa pautal de 2#500 réis por decalitro de alcool puro, relativa á importação do alcool estrangeiro.

§ 1.° Quando nos mercados centraes do alcool e aguardente, a que se refere o capitulo VII d'este decreto, senão offerecerem á venda ou mesmos productos, de boa qualidade, por preços iguaes ou inferiores a 2,62 réis por grau centesimal e por litro, fica o Governo auctorizado, ouvidos os Conselhos Superiores do Commercio e Industria, da Agricultura e do Serviço Technico Aduaneiro, a baixar os direitos de importação do alcool estrangeiro, de modo que

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o seu preço, no país, não exceda o mesmo limite de 2,62 réis por grau centesimal e por litro.

§ 2.° E o Governo igualmente auctorizado a elevar, sob consulta dos mesmos conselhos, os direitos de importação do alcool estrangeiro, sempre que os premios do exportação concedidos pelas nações exportadoras, ou qualquer outra circumstancia, permitiam essa importação por preço igual ou inferior ao estabelecido no paragrapho precedente.

§ 3.° O Governo dará annualmente conta ás Camaras do uso que houver feito d'estas auctorizações.

Art. 74.° Nas cidades de Lisboa e Porto o alcool e a aguardente, de qualquer proveniencia, ficam sujeitos aos impostos do consumo ou do real de agua, nos termos seguintes:

1.° Aguardente e alcool, simples ou preparados, em garrafas, frascos, botijas ou vasilhas semelhantes:

Em Lisboa e Porto, 400 réis por litro de liquido.

2.º Aguardente e alcool simples ou preparados em outras quaesquer vasilhas:

Em Lisboa e Porto, 400 réis por litro de alcool puro.

§ 1.° A liquidação d'estes impostos far-se-ha nos termos e pela forma da legislação em vigor.

§ 2.º As outras bebidas alcoolicas, taes como genebra, licores, cremes e as não especificadas ficam sujeitas tambem ás taxas do consumo em Lisboa e ás do real de agua no Porto, nos termos dos respectivos diplomas.

§ 3.º O alcool desnaturado fica isento do imposto de consumo estabelecido neste artigo.

Art. 75.º O alcool produzido nas ilhas adjacentes, que não for sujeito a pagar imposto de producção, pagará os direitos ao ser apresentado a despacho em qualquer alfandega do continente, como se fosse alcool estrangeiro.

§ unico. Exceptua se o alcool das proveniencias indicadas no n.º 1.° do artigo 58.° d'este decreto, que fica isento d'esse direito.

Art. 76.° Subsiste o imposto criado pela lei de 12 de abril de 1892 e 5 decimos de real por litro de vinho exportado pela alfândega do Porto.

CAPITULO IX

Impostos diversos

Art. 77.° Os direitos de 2 réis e 3 réis por decalitro estabelecidos nos artigos 12.º e 14.º da pauta de exportação, para o vinagre o para o vinho commum tinto, são respectivamente substituidos pelo direito de l real pela mesma unidade.

Art. 78.° O direito de 50 réis por decalitro, fixado no artigo 15 da pauta de exportação, para o vinho não especificado, é substituido pelo direito de l real pela mesma unidade.

Art. 70.° São incluidos na pauta de exportação os seguintes artigos:

Uvas frescas, l real por 10 kilogrammas;

Passas de uva, l real por 30 kilogrammas.

Art. 80.º O direito de 3 por cento ad valorem, estabelecido para as aduelas no artigo 42 da pauta de importação, é substituido pelo direito de 2 por cento ad valorem.

Art. 81.º Ficam isentos do imposto de consumo estabelecido pelo artigo 32 da respectiva pauta as uvas frescas.

Art. 82.º Ás companhias vinicolas legalmente constituidas será applicavel o que se acha disposto ia tabella A, que faz parte da carta de lei de 31 de março de 1896, com relação ás companhias de viação.

Art. 83.º Em diploma especial se determinará o modo de substituir o altual imposto do real de agua por um imposto de licença para venda de generos de consumo.

Art. 84.º É elevado a 26,6 réis o imposto de 20 réis de fabricação e consumo estabelecido para a cerveja pela carta de lei de 29 de julho de 1899.

CAPITULO X

Disposições transitorias

Art. 85 ° Os vinhos licorosos e do Porto de força alcoolica superior a 19º centesimaes, quando exportados para paises estrangeiros, serão beneficiados com um bonus de 1$000 réis por pipa de 534 litros, independentemente de reducção de direito de exportação a l real por decalitro, estabelecida no presente decreto, e emquanto o preço medio da aguardente de vinho de 78° centesimaes, nos mercados officiaes, exceder o preço do 70$000 réis por pipa do 534 litros.

Art. 86.º A contar de 15 de junho até 3l de agosto do corrente anno é reduzida de 50 por cento a taxa do artigo 17 da pauta dos direitos de consumo em Lisboa para os vinhos de força alcoolica não superior a 13°,5 centesimaes.

§ unico. Para os vinhos de força alcoolica superior á indicada neste artigo serão mantidos os direitos da pauta de consumo mencionados noa artigos 17.° a 20.° da mesma pauta.

Art. 87.º É igualmente reduzido, e durante o mesmo periodo marcado no artigo anterior, de 50 por cento o imposto do real de agua para os vinhos destinados a consumo no Porto.

TITULO IV

CAPITULO XI

Disposições geraes

Art. 88.° O Governo publicará as instrucções especiaes e regulamentares que forem necessarias para o mais cabal desempenho das disposições d'este decreto, que entrará immediatamente em vigor na parte que não dependa das mesmos diplomas.

Art. 89.° Fica revogada a legislação era contrario.

O Conselheiro de Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das demais Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 14 de junho de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro - Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

N.º 10

Senhor. - O Instituto Geral de Agricultura, fundado em 1864, foi, em 2 de dezembro de 1886, reorganizado conforme a moderna orientação scientifica e as necessidades do ensino agricola, dotando-se esse estabelecimento, que passou a denominar-se «Instituto de Agronomia e Veterinaria», com os necessarios elementos para bem poder servir os fins a que se destinava.

Não durou, infelizmente, muito tempo, esta vantajosa situação, pois logo em 1891, com o fundamento na auctorização concedida pela carta de lei de 30 de junho, só promulgou nova organização que, se preenchia o fim que, nesse momento, unicamente se tinha em mira, a reducção das despesas, não attendia, no ponto de vista do ensino, ás regras de uma sabia economia.

Contra essa situação se reclamou, e, mais de uma vez, o Conselho Escolar representou, para obter os necessarios melhoramentos, até que em 4 de novembro de 1897 se decretou a organização que hoje vigora.

Nella se attendeu, em parte, ás deficiencias mais sensiveis da organização de 1891, não permittindo, todavia, as circumstancias satisfazer todas as aspirações do Conselho Escolar, nem dotar o ensino superior de agricultura com os beneficios supprimidos na anterior organização.

E comtudo algumas necessidades do ensino e melhoramentos nos serviços se podem desde já attender sem grande sacrificio.

Nesse sentido tem continuado a reclamar o Conselho Es-

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SESSÃO N.º 6 DE 17 DE JANEIRO DE 1902 105

colar do Instituto de Agronomia e Veterinaria e ainda ultimamente os alumnos do mesmo Instituto, em fundamentada representado, favoravelmente informada pelo referido Conselho, pediram que urgentemente fosse decretado o desdobramento da 7.ª cadeira professada no curso de agronomia.

Deseja o Governo attender a todas estas justas reclamações, mas o projecto de decreto, que tenho a honra de apresentar á sabia apreciação de Vossa Majestade, tem somente por fim supprir ás necessidades mais inadiaveis do ensino, de forma que as disposições tomadas para tal fim possam ser postas já em execução no anno lectivo que vae dentro em pouco iniciar-se.

Não se attende por completo a todas as exigencias que um estabelecimento de ensino agricola superior hoje deve ter, mas attende-se, desde já, ao que exige o regular funccionamento do Instituto, e espero ter occasião do brevemente poder offerecer á consideração de Vossa Majestade um diploma em que definitivamente se organize o ensino geral agricola em todo o país.

É de inadiavel realização o desdobramento das 7.ª e l5.ª cadeiras professadas no Instituto.

A 7.ª cadeira, cultura de plantas lenhosas, de grande importancia para o país, porque nella se estudam a viticultura, a olivicultura, a cultura de arvores fructiferas e a silvicultura, não pode ser desenvolvida pelo professor no curto prazo de um anno lectivo.

Foi por certo isso que levou o auctor da organização de 1891 a dividir em dois annos alternados a materia que nella se lia.

Foi um expediente que, se não augmentou logo a despesa com a creação de uma nova cadeira, teve graves inconvenientes para o ensino.

Assim, um alumno, quo perdesse um anno em uma das materias lidas nessa cadeira, teria que esperar um anno inteiro, para só no outro poder novamente matricular-se, quando voltasse a ser professada a mesma materia.

Era inconveniente para o alumno e inconveniente para a Escola; por isso no projecto de decreto que tenho a honra do apresentar a Vossa Majestade se preceitua o immediato desdobramento d'esta cadeira.

Igualmente sã determina o desdobramento da 15.ª cadeira, em que se professa a pathologia e therapeutica geraes, pathologia interna e clinica medica, que, pelo simples enunciado, se vê como tambem está sobrecarregada.

É completamente impossivel ser lida pelo professor, ou estudada pelo alumno, durante o anno lectivo.

Por isso se restabelece a antiga cadeira de pathologio geral e anatomia pathologica geral.

Não é menos necessario facultar aos chefes de serviço a leccionação das cadeiras auxiliares por isso que actualmente sobrecarregam em demasia o serviço dos lentes cathedraticos prejudicando a regencia das suas respectivas cadeiras.

O tirocinio pratico dos alumnos do curso de agronomia passa a ser feito na Escola Nacional do Agricultura em Coimbra, onde se encontra não só o necessario desenvolvimento cultural, mas ainda reunidos todos os elementos necessarios ao ensino pratico do que os alumnos carecem.

Fixando os prazos necessarios para os diversos actos escolares, em harmonia com a frequencia actual da escola, dando aos chefes do serviço as attribuições que devem ter, exigindo-lhes tambem, por isso, as provas de necessaria capacidade, julgo ter attendido, já no proximo anno lectivo, ás necessidades inadiaveis para o bom funccionamento do Instituto do Agronomia e Veterinaria.

Tal é, Senhor, somente o intuito do projecto de decreto que tenho a honra de apresentar á sabia apreciação de Vossa Majestade.

Secretaria de Estado dos Negocios das Obras Publicas, Commercio e Industria, em 11 de outubro de 1901. = Ernesto Rodolpho Hintze. Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henrigues = Fernando Mattozo Santos = Luiz Augusto Pimentel Pinto = Antonio Teixeira de Sousa = Manuel Francisco de Vargas.

Attendendo ao que Me representaram o Conselheiro de Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario do Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das demais Repartições: hei por bem decretar, para ter força de lei, o seguinte:

Artigo l.° As disciplinas, que constituem os cursos professados no Instituto de Agronomia e Veterinaria, distribuir-se-hão pelas seguintes cadeiras:

1.ª Botanica.

2.ª Mechanica geral e suas applicações ás machinas agricolas. Topographias.

3.ª Hydraulica agricola. Construcções ruraes.

4.ª Physica agricola.

5.ª Chimica agricola e analyse.

6.ª Agricultura geral. Culturas arvenses. Horticultura.

7.ª Viticultura o arboricultura.

8.ª Silvicultura.

9.ª Nosologia vegetal.

10.ª Technologia agricola e florestal.

11.ª Zootechnia. Exterior. Hygiene pecuaria.

12.ª Economia, administração, legislação e contabilidade ruraes e florestaes.

13.ª Anatomia descriptiva. Embryologia. Teratologia.

14.ª Hystologia e physiologia comparada dos animaes.

15.ª Materia medica. Chimica medica. Pharmacologia e pharmacia.

16.ª Pathologia geral e anatomia pathologica geral.

17.ª Patholgia especial interna. Therapeutica geral e clinica medica.

18.ª Pathologia externa. Medicina operatoria. Obstetricia. Clinica cirurgica.

19.ª Pathologia e clinica, das doenças contagiosas. Direito veterinario.

Art. 2.° As cadeiras l.ª a 12.ª constituem os cursos theoricas de agronomia e do silvicultura. As cadeiras 13.ª a 19.ª e mais as 1.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ª e 11.ª constituem o curso do medicina veterinaria.

§ unico. As cadeiras enumeradas no artigo 1.°, bom como os cursos auxiliares, serão distribuidos pelos diversos annos do curso do Instituto, conforme for proposto pelo Conselho Escolar.

Art. 3.° A regencia dos cursos auxiliares professados no mesmo Instituto, o que não podem abranger mais de quarenta lições theoricas, compete aos chefes de serviço, conforme for determinado pelo Conselho.

§ unico. Do jury do exames dos cursos auxiliares farão parte os chefes de serviço.

Art. 4.º O quinto anno do curso de agronomia será de tirocinio pratico durante doze meses, na Escola Nacional do Agricultura em Coimbra.

Art. 5.° A primeira epoca do exames finaes será desde 20 de junho até ao ultimo dia de julho e a segunda durante os primeiros vinte dias de outubro.

Art. 6.º Terminado o tirocinio pratico, haverá um exame final perante tira jury constituido por dois lentes do Instituto o pelo director da Escola Nacional de Agricultura ou pelo silvicultor chefe da 3.ª administração das mattas era Leiria, o qual se realizará nos estabelecimentos onde o tirocinio só tiver effectuado.

§ unico. Este jury será presidido pelo lente do Instituto mais antigo.

Art. 7.° Os agronomos e veterinarios que forem nomeados por concurso chefes de serviço do Instituto serão considerados era actividade fora do respectivo quadro, e só poderão ser destituidos d'esta commissão por faltas ou irregularidades no serviço, devidamente julgadas pelo Conselho Escolar.

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Art. 8.° Os logares de chefes de serviço serão providos em concurso de provas praticas e de um exame oral perante o Conselho Escolar, nos termos regulamentares.

Art. 9.° Os logares de preparador serão providos pelo Governo da seguinte maneira:

1.º Os do chimica, anatomia e cirurgia por concurso de provas praticas perante uma delegação do Conselho Escolar, conforme as condições expressas no regulamento;

2.º Os restantes logares de preparadores serão provi dos mediante concurso documental, perante o Conselho Escolar, entre os regentes agricolas do respectivo quadro do Ministerio das Obras Publicas.

§ unico. Os funccionarios, a que se refere o n.° 2.°, servirão no Instituto nas mesmas condições que preceitua o artigo 7.° d'este decreto para os chefes do serviço.

Art. 10.° O provimento dos lentes do Instituto far-se-ha como se acha preceituado no artigo 51.° do decreto de 4 de novembro de 1897, tendo em vista:

1.º Ás cadeiras enumeradas de l.ª a 12.ª poderão concorrer os individuos habilitados com os cursos de agronomia ou de silvicultura;

2.° Alem dos agronomos e silvicultores, poderão concorrer ás cadeiras 2.ª e 3.ª os engenheiros e á ll.ª cadeira os veterinarios.

3.º As cadeiras enumeradas de 13.ª a 19.ª só poderão concorrer os individuos habilitados com os cursos de veterinaria ou de medicina.

Art. 11.º A primeira nomeação dos lentes das cadeiras de viticultura e arboricultura e de pathologia geral e anatomia pathologica geral recairá no agronomo e no veterinario que, entre os actuaes chefes de serviço, exerçam ha mais tempo funcções de ensino no Instituto.

Art. 12.º Continuam em vigor todas as disposições de decreto de 4 de novembro de 1897 que não forem contrarias ao disposto neste diploma.

O Conselheiro de Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Reino, e os Ministros e Secretarios de Estado das demais Repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 11 de outubro de 1901. = REI. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Arthur Alberto de Campos Henriques = Fernando Mattozo Santos - Luiz Augusto Pimentel Pinto - Antonio Teixeira de Sousa - Manuel Francisco de Vargas.

O Sr. Francisco Beirão: - V. Exa., Sr. Presidente, que já me conhece de ha longos annos, e esta Camara, para uma parte da qual pelo menos eu não serei absolutamente desconhecido, não me farão a injustiça do suppor que me levante para discutir o bill de indemnidade. (Apoiados).

Fiz isso muitas vezes, creio que todos os annos em que tivemos a felicidade de ter como Presidente do Conselho o Sr. Hintze Ribeiro, e em que eu tive a honra de ter voz nesta Camara; e fi-lo sempre com a convicção de que ainda serviria essa discussão para chamar á noção das suas responsabilidades os Gbvernos a que S. Exa. presidia, e para ver se era possivel evitar a repetição periodica e annual de dictaduras. (Apoiados).

Devo dizer que estou completamente desilludido a esse respeito.

Para quê, pois, discutir? Lembra-me o velho proloquio latino: nisi utile est quod facimus... e supprimo o resto porque nunca aspirei á gloria por taes discussões.

Comprehende V. Exa. que eu não venho discutir a dictadura nem o bill, porque estou plenamente convencido que isto de dictaduras é um systema politico do Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro (Apoiados), o qual transformou o seu partido, ou uma parte d'elle, de regenerador, em partido dictatorial. (Apoiados).

É o seu systema. Não sabe, não pode, não quer governar sem dictadura. (Apoiados).

Desde que as dictaduras constituem os meios regulares e ordinarios de governo do Sr. Hintze Ribeiro, acho-me em presença de um systema politico e não de um acto accidental da sua administração. (Apoiados).

Siga, pois, S. Exa. o seu caminho, faça quantas dictaduras quiser... emquanto as circumstancias lh'o permittirem. (Apoiados).

Creio, pela minha parte, que se calasse bem no espirito, sobretudo no dos proprios interessados, que certos actos dictatoriaes, praticados com o vicio original de serem contra a lei constitucional, podem bem vir a durar só o tempo que duram os dictadores (Apoiados); se os proprios interessados chegassem a convencer só d'isso o de que só a lei votada na forma constitucional pode reconhecer incontestavelmente direitos e legitimar os meios para os exercer, pela minha parte, repito, persuado-me que, tendo os interessados chegado a essa convicção, haver-se-hia encontrado, pelo menos, uma das formas de impedir estas successivas dictaduras.

Isto é mera observação pessoal, nem terá importancia alguma; mas o que preciso, e para isso é que me levantei, é de definir bem a attitude do partido progressista em presença d'esta sequencia de dictaduras.

O Sr. Presidente do Conselho pode querer fazer dictaduras, trazendo depois á Camara o respectivo projecto a relevá-lo da responsabilidade, mas o que eu não quero, por mini e pelo meu partido, é seguir no seu cortejo. Isso por forma alguma, nem directa, nem indirectamente. (Apoiados).

S. Exa. vae bem, mas vae só, comnosco é que não (Apoiados); e portanto nem discuto este projecto para não parecer que tomamos quanto a elle qualquer responsabilidade directa ou indirecta. Isso de modo algum.

Nem sequer lhe damos a honra da nossa critica. (Apoiados).

V. Exa. vae bem com a sua maioria... se a maioria o acompanhar. (Muitos apoiados da direita parlamentar). Vae esta praticar o seu primeiro acto politico. Se ella entender dever relevá-lo de tantas responsabilidades vá com ella, mas com a opposição progressista é que não vão. (Apoiados).

Portanto, para não figurar de modo algum nesse cortejo triumphal, e para não tomar a minima responsabilidade com respeito aos actos dictatoriaes do Governo, tenho a fazer a seguinte declaração, em nome do partido progressista:

O partido progressista, não reconhecendo a validade das providencias de caracter legislativo expedidas desde 14 de junho até 31 de dezembro, inclusive de 1901, abstem-se de entrar na discussão d'este projecto, e declara que opportunamente procederá com respeito a ellas pelo modo que julgar mais conveniente aos interesses do Estado. (Apoiados).

Vozes: - Muito bem.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: a opposição não discute, a opposição abstem-se.

Abre se o Parlamento e o primeiro cuidado do Governo e apresentar o bill de indemnidade, quer dizer, é trazer ao criterio, á apreciação, á resolução da Camara todos os actos que haja praticado de caracter excepcional. Este é o seu primeiro cuidado. (Muitos apoiados).

Estão aqui os representantes mais illustrados, mais talentosos, mais experientes do partido progressista; é uma pleiade brilhante e numerosa; o quando o Governo vem dar conta dos seus actos, quando vem justificar o seu procedimento politico, quando abre ensejo a que essa catadupa de arguições venha desfazer-se sobre elle, a opposição parlamentar emmudece, abstem-se, não discute. (Apoiados). Não me cabe a mim apreciar o modo como o partido progressista se desempenha das suas funcções parlamentares; isso é com elle, mas nós estamos perante um tribunal, o tribunal do país.

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SESSÃO N.° 6 DE 37 DE JANEIRO DE 1902 107

Vozes: - Oh!

O Orador: - Se não estamos perante um tribunal, não sei para que pedem contas ao Governo dos seus actos. Desconhecer isto, e, por um lado revoltar-se contra as dictaduras do Governo, porque offendem a Constituição; e por outro lado postergar a Constituição, que reconhece exactamente a soberania do país.

Não me cabe a mim, repito, apreciar a forma por que o partido progressista se desempenha das suas funcções parlamentares; mas reclâmo o confronto entre esta sua entranha linha de proceder, e o procedimento do partido representado no poder, quer quando pratica actos que possam ser diversamente apreciados, e se apresenta com intuirá hombridade e desassombro a justificá-los, no unico logar onde elles podem ser ponderados e discutidos; quer quando em circunstancias extraordinarias que aconselham um determinado caminho, e segue com resolução, sem hesitar, e vem depois perante o Parlamento dizer: aqui está a minha obra; se é má, dizei me que ella é má, mas apreciai-a. Tenho ouvido illustres Deputados da opposição, que eu respeito e estimo pelo seu talento, pelas suas qualidades brilhantissimas, declamar contra a acção politica do Governo, dizerem uns que não têem confiança no Chefe do Governo, no que toca á manutenção da ordem e ainda que tudo quanto o Governo tem praticado defrauda os interesses da nação, os interesses e direitos do contribuinte, tudo, emfim, quanto pode constituir as mais graves accusações, o veredictum mais solemne e condemnatorio do Governo; mas quando esse Governo lhe pergunta - porquê? - calam-se, não têem que dizer. (Muitos e repetidos apoiados. - Vozes: - Muito bem).

Porque é que se calam? É porque a dictadura é um facto tão assombroso, tão extraordinario, tão alheio aos systemas politicos dos partidos militantes, que pela primeira vez se pratica e que é necessario, por consequencia, uma repressão solemne, in limine, para que se não repita?!

Então quem é que lança esse labeu? O illustre Deputado o Sr. Beirão?

Diga o illustre Deputado qual foi o Governo de que S. Exa. fez parte que não fizesse dictadura? E S. Exa. Ministro antigo, e um dos mais considerados da politica portuguesa (Apoiados), ninguem o contesta; mas por isso mesmo tem responsabilidades mais graves do que qualquer outro, por isso mesmo que tem um passado mais longo, tradições mais accentuadas, actos que constituem a sua vida publica o que lhe impõe deveres e responsabilidades.

Diga S. Exa., qual foi dos Ministerios a que S. Exa. pertenceu, aquelle que tivesse governado unicamente com a observancia da lei? Nenhum!

Então os illustres Deputados calam-se, não discutem? Absteem-se, não commentam nem reprovam? Porquê? Porque é o systema do Governo a que tenho a honra do pertencer.

Qual é então o systema do partido progressista? Em nome de que principio, com que auctoridade politica o partido progressista se insurge contra as dictaduras, e quando o Governo está prompto a dar conta dos seus actos, dizem: «Nós, os amigos da legalidade, não discutimos».

O illustre Deputado disse com o applauso, d'esse lado da Camara, justificado pela alta posição que S. Exa. occupa, que se todos se convencessem que as dictaduras duram emquanto duram os dictadores, não haveria mais dictadores.

É S. Exa. o heroe da legalidade, que preza a Constituição como uma estrella brilhante, a cuja fé se não falta. Elle, o leader d'esta Camara, vem dizer que as dictaduras duram o tempo que duram os dictadores; e, portanto, ninguem mais as fará! Elle que nunca deixou de fazer dictadura!

Mas como se desfazem as dictaduras? Como é que cessam com os dictadores? Como acabam com os governos que praticam actos ditactoriaes?

A isto é que S. Exa. não nos deu explicações. (Muitos apoiados. - (Vozes: - Muito bem).

Porque ha uma cousa que se impõe aos olhos e á evidencia de todos: é que podem os actos ser dictatoriaes; mas, desde que o Parlamento os confirma, são leis para todos os effeitos. (Muitos apoiados).

Como é pois que desapparecem com os dictadores?

Acabam porque se annullam? Com a auctoridade de quem? De um governo? Então é a dictadura. (Apoiados). Acabam como? For uma outra lei? Então é o funccionamento normal do Parlamento; e para isto não ora necessaria fazer aqui uma declaração tão solemne, porque uma lei deroga outra, (Muitos apoiados).

E, disse o illustre Deputado, vae bem o Governo, pois vá, uma só.

Só? E se eu quizer chamar á, revelia cumplices que tenho de tempos não remotos. (Muitos apoiados). Não iremos juntos? (Muitos apoiados). Não seremos co-reus, cumplices do mesmo delicto, implicados nos mesmos factos, sujeitos á mesma responsabilidade? (Muitos apoiados).

Se eu tiver de me sujeitar a um julgamento pela minha responsabilidade criminal, não posso dizer ao Sr. Beirão, que eu tanto prezo: venha S. Exa. sentar-se ao meu lado, e vamos prestar contas nós ambos? (Vozes: - Muito bem).

Mas o illustre Deputado foi breve; e eu não desejo ser longo.

O illustre Deputado architectou em phrase sempre primorosa e elevada, como é proprio do seu alto espirito, as bases, em que assenta uma declaração. É a declaração do seu partido. Essa declaração, - oxalá que eu a ouvisse! (Vozes: -Muito bem)- Mas, se a ouvi, foi a seguinte: «que, não reconhecendo a validade dos actos ditatoriaes, se abatem de os discutir, e declara que o seu partido ha do proceder como julgar conveniente».

Creio que é esta a declaração. Muito bem. Não reconhece a validado dos actos da ditacdnra; mas os actos dictatoriaes que nunca foram até hoje confirmados por lei, e alguns posara na balança politica do illustre Deputado, deixaram de ter validado porque nem todos os actos de dictaduras que S. Exa. praticou, estão confirmados pelo Parlamento? Que validade teem esses actos? Se não têem validade e se são nullos, é enorme a responsabilidade do illustre Deputado; só teem validade, em que fica a declaração do illustre Deputado? Até agora entendeu-se sempre que actos dictatoriaes, vigorara emquanto não são annullados ou modificados pelo Parlamento, unico que os pode apreciar. Esta não é só a doutrina constitucional proclamada no Parlamento por todos os homens publicos, esta é a propria doutrina assente nos tribunaes e pelos juizes. Sempre assim se julgou e entendeu. Então não tem validade os actos dictatoriaes? Absolutamente toda, sob a responsabilidade assumida pelo Governo, emquanto elles não forem alterados pelo Parlamento. Mas, ainda assim, depois do confirmados pelo Parlamento, não têem validade? Então uma lei, que o Parlamento approva, que o Chefe do Estado sancciona, que o Diario do Governo publica, uma lei promulgada com todas as formalidades, ainda não é, para o illustre Deputado, um acto valido?

Pois o que é o bill senão a confirmação dos actos dictatoriaes? Approvado que elle seja, o sê-lo-ha tanto mais depressa quanto S. Exas. não o discutirem, fica sendo uma lei do país para o Parlamento e para todos, porque desde que é uma lei, está acima de tudo. É em nome d'isso que se abstem? Então S. Exa., que no exercicio do seu mandato popular julga interpretar o sentimento da nação combatendo o Governo, quando chega o momento de ouvirmos a sua voz augusta, sincera, experimentada, contra o Governo, emmudece e cala se?

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E então que se abstem? Com que auctoridade ficam os Senhores para condenmarem ámanhã o procedimento do Governo na dictadura? Com que prestigio ficam? Prestigio pessoal decerto que o tem; mas collectivo o politico não, porque declararam que tudo o que o Governo tem feito é monstruoso, é uma serie de attentados, e quando o Governo vem trazer á apreciação do Parlamento as contas do seu procedimento e dos seus actos, os Senhores calam-se?! Quando vem justificar-se, os Senhoras emmudecem?! Não pode dizer-se que não tenham a coragem e o animo para sustentar as suas opiniões porque não lhes fallecem; mas quando chega o momento em que no exercicio do seu mandato, e que no cumprimento do seu dever parlamentar teem de se pronunciar sobre a acção do Governo, que dizem que é nefasto, que não tem auctoridade para manter a ordem e desdenham do tudo o que se tem feito, não se animam a defrontar-se com elle para combater as suas medidas, e calam-se, c emmudecem, e absteem-se! E como conclusão das affirmações que fazem, do prurido do ilegalidades que manifestam, da inviolabilidade que reclamam para a Carta Constitucional, das declarações publicas e solemnes que deixam nos archivos parlamentares, como conclusão, emfim, acha o illustre leader do partido progressista, em vista de tudo isto - « que o partido progressista procederá como julgar conveniente!» Amen! (Riso-- Muitos e repetidos apoiados prolongados).

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado por todos os Srs. Deputados da direita).

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Mello e Sousa: - Sr. Presidente: uma parte das medidas a que se refere o diploma que se discute, foram promulgadas no intuito e proposito de afastar d'esta Camara os meus amigos politicos, o que é um facto confessado, indiscutivel, sendo só por mero acaso que me encontro aqui. Não devendo resignar o meu mandato, vim á Camara na intenção de discutir as medidas de administração e as medidas economicas, singelamente, sem preoccupações, e pela fórma que eu entendesse, mas sem a immodesta pretenção de falar em nome do grupo politico a que pertenço, porque esse grupo foi votado ao ostracismo, porque todas as medidas, todas as providencias tomadas foram para o afastar violentamente do logar que justamente devia occupar!

Não vou, porem, metter-me em combates ou lutas politicas, analysando medidas ou providencias que não carecem de critica nem do exame, porque o país as conhece de sobejo e sabe, tambem sobejamente, qual o proposito com que foram promulgadas, não carecendo, por isso, de esclarecimentos. O país julgará!

Vou, acceitando o mandato, como não podia deixar de acceitar, apreciar as medidas economicas que o Governo decretou em dictadura. Economicas!... mascaradas em economicas - (Apoiados) e dizer o que sobre ellas me parecer, sem outra preoccupação que não seja conseguir - se ainda for tempo - alguma modificação, visto que o Governo entende que nada mais ha a fazer nas medidas que promulgou. Entram no numero d'essas medidas a providencia tomada para a crise dos vinhos, que foi apresentada tal qual, sem nenhuma alteração, sem nenhuma observação, dando o Governo a entender que nada mais pensa e nada mais tem a fazer numa crise, cada vez mais tensa e mais grave, que deve preoccupar todo o país e sobretudo aquelles que devem intervir nesta questão pela gravidade que ella pode assumir.

Sr. Presidente: vou, em primeiro logar, referir-me no contrato com o Banco de Portugal.

O Governo auctorizou-se, por decreto de 22 de novembro ultimo, a negociar um contrato com o Banco de Portugal em determinadas bases. A primeira cousa que occorre estranhar é que, a tão curto espaço da abertura da Camara, o Governo entendesse que era urgente auctorizar-se a si proprio a reformar os seus contratos com o Banco de Portugal, o que, escusado será dizê-lo, é uma cousa seriissima e da maior importancia para o credito do país e para as finanças publicas. O Governo, porem, não hesitou, mas a necessidade era tão grave, que estamos com o Parlamento aberto e ainda não ha contrato.

A direcção do Banco de Portugal que é mais respeitadora dos direitos dos seus accionistas do que o Governo é respeitador dos direitos do país; a direcção do Banco de Portugal, que dá mais consideração aos seus accionistas que o Governo dá, ou pretende dar, aos Representantes da Nação, adiando o assumpto de assembléa para assembléa, nomeou uma commissão para o estudar, mas ainda não resolveu se acceita ou não o contrato com o Governo; no entanto, o illustre Ministro da Fazenda disse hoje aqui que estava no proposito do usar da auctorização que lhe foi concedida, e de firmar, portanto, o contrato com estas bases, mesmo com o Parlamento aberto.

Não ha duvida de que não tem hesitações; isto prova o que o Governo pensa sobre as funcções do Parlamento, sobre o que elle pode, sobre o que elle vale.

O illustre Presidente do Conselho teve ha pouco uma phrase feliz. Disse S. Exa. que o bill se approvava tanto mais depressa quanto menos fosse discutido; de onde se conclue que S. Exa. quer, por um lado, que se discuta, mas, diz por outro, que se não discutirem mais depressa será approvado.

Nestas condições, V. Exa. comprehende que é um tanto ingrata a tarefa que me incumbe, mas não posso deixar do fazer estas observações, porque realmente o assumpto, em meu entender, é gravissimo e tem o inconveniente de prejudicar, de annullar quasi, as probabilidades de um restabelecimento da situação financeira do país.

Dizia o illustre Ministro, e repete a commissão, que o pensamento principal da auctorização para o contrato com o Banco de Portugal é o seguinte:

«Impõe-se, porem, empenhar todos os esforços para garantir efficazmente a nossa emissão fiduciaria».

E a forma por que o illustre Ministro empenhou todos os esforços para garantir a emissão fiduciaria foi permittir que o Banco mettesse em circulação a sua reserva ou a empregasse naquillo que lhe interessasse; foi dispor dos lucros d'esse emprego das reservas contados para a distribuição de dividendo, e ainda cortar por completo a amortização que o Estado devia fazer de duas garantias que o Banco tinha. Estranha forma de garantir a emissão!

Neste contrato encontram-se disposições deveras curiosas. Assim, diz-se no artigo 4.° o seguinte:

«Parte do ouro que constitue a reserva metallica do Banco poderá, com previa auctorização da assembléa geral do mesmo Banco, ser invertida em titulos de primeira ordem representativos de ouro; não podendo, porem, a reserva metallica, ouro, ser, em caso algum, inferior a 3.000:000$000 réis».

Em caso algum o Governo pode dispor que a reserva ouro saia do Banco, porque a reserva nem do Banco é, é do portador da nota. Em caso algum o Governo pode dispor do ouro que lá está, porque o Banco emittiu notas representativas d'essa moeda e, se em virtude de circumstancias, suspende a sua troca e não paga ao portador da nota, é porque não ha com quê, mas deve trabalhar para o arranjar. Tem que cumprir este dever.

O Governo não pode mandar semelhante cousa, porque aquillo não é seu, nem é do Banco, e, tanto assim que o Sr. Ministro e a commissão dizem: «Ê preciso garantir a

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nota». Mas, garantir a nota, tirando o valor que lá está, é curioso!

O Banco o que pode e devo é augmentar as reservas e todos os Bancos estrangeiros assim praticam.

Isto assim é mais do que dictadura, é dispor de uma auctorização para realizar um contrato com o Banco, auctorizando o Banco a dispor do que não é d'elle.

Não comprehendo, nem admitto que se dê auctorização ao Banco para diminuir as reservas era ouro.

A seguir ha a providencia que o Sr. Ministro da Fazenda entende dever tomar para reforçar a garantia da nota.

Está no artigo 5.°:

«Artigo 5.° O Banco empregará annualmente a quantia de 100:000$000 réis, tirados do seu activo, para reforçar o fundo de garantia da emissão fiduciaria pela acquisição de titulos de natureza igual á dos mencionados na base anterior.

§ unico. Os juros o as amortizações d'estes titulos, quando as haja, serão annualmente capitalizados o empregados em titulos do semelhante natureza, pela mesma forma e para o mesmo fim indicados neste artigo».

Houve em tempo, no Porto, um Banco, cujas operações consistiam em comprar maços do inscripções, distribuindo depois como dividendos os juros d'essas inscripções; mas capitalizar do activo é uma cousa que eu gostava de ver explicado como se realizava.

O activo que se pode ver no balanço do Banco de Portugal, está designado nas suas diversas contas o não se pode empregar 100:000$000 réis do activo sem que se vão retirar a qualquer outra conta.

Capitalizar do activo é capitalizar o proprio capital, e, portanto, em logar de ter o capital do 13.500:000$000 réis no gyro bancario, aproveitá-lo em comprar titulos.

Mas pergunto eu: qual é a garantia quo resulta (d'ahi?

Como é que por esta capitalização do activo se vae reforçar o fundo de garantia da emissão fiduciaria? Não comprehendo.

É certo que se diz:

«A capitalização annual de 100:000$000 réis visa a iniciar com os proprios recursos do Banco o reforço d'essa garantia em valores ouro, de facil realização. Substitue-se o incerto - prata - pelo certo - ouro -».

Mas qual incerto «prata» e qual certo «ouro»?

Para que precisa o Banco tirar annualmente 100:000$000 réis do activo?

Absolutamente para nada. Não o deve mesmo fazer.

«A constituição do fundo de reserva da circulação fiduciaria, conforme da proposta nitidamente se deduz, consiste na capitalização annual de 100:000$000 réis, que se vão accumullando com os seus juros em titulos de credito de primeira ordem e representativos de ouro».

Mas só o Banco auferisse lucros cora os juros, podia-os empregar no activo e tinhamos sempre a mesma garantia sem haver o erro de determinar a capitalização do activo.

A capitalização dos lucros é que se queria dizer, provavelmente. Assim comprehendia-se. Retirar uma parte dos lucros para o capital, formando uma maior garantia para a nota, mas retirar do proprio activo do Banco, não tem explicação possivel.

«Da taxa dos juros d'esses titulos, cuidadosamente escolhidos, e do gyro dos cambios...»

Desejava muito saber o que quer dizer «gyro dos cambios».

Os 100:000$000 réis accumullam-se com os seus juros em titulos de credito do primeira ordem e representativos de ouro. Do resultado d'esse emprego e do gyro dos cambios depende a importancia da quantia capitalizada com o decurso do tempo, quantia que será, em todas as hypotheses, avultada e que deve efficazmente contribuir para augmentar o credito e a valia das notas.

Empregar do activo, é primeira cousa que desejaria que me explicassem, e, em segundo logar, desejaria saber o que é o gyro dos cambios.

Desejava ainda mais que me explicassem porque esta quantia será, em todas as hypotheses, avultada.

Isto quer dizer que de antemão se sabe que esses titulos nunca diminuem de valor, e que, pelo contrario, hão de augmentar?

Não se admitte sequer a possibilidade de uma guerra europeia, nem de qualquer outro facto que leve o país á bancarota; assegura a illustre commissão que, em todas as hypotheses é avultada o importante a quantia referida.

Sobre a constituição das reservas, o nobre Ministro quasi que não se refere ao assumpto, mas a commissão defende o principio de se apropriarem do que pertence ao proprietario da nota, áquelle que tem uma obrigação de divida do Banco que lho garante o pagamento em ouro.

Isto de lhe tomarem o que é d'elle, é defendido assim:

«Para manter o dividendo, sacrifica o Thesouro uma parte da participação nos lucros a que tem actualmente direito, sem que na peor hypothese deixe, na operação planeada, do lucrar cada anno 480:000$000 réis em juros, alem de não começar em epoca propria o encargo pesado das amortizações devidas o sem que a segurança do Banco em cousa nenhuma seja arriscada. Mas, principalmente, a compensação se encontra na mobilização das reservas».

Isto do Estado retirar ao Banco o juro que lhe deve e até as amortizações do que lhe deve, é compensada pelo emprego ou pela mobilização das reservas, que não são nem do Banco nem do Estado.

Facto deveras curioso: o Estado não se preoccupa com este facto e dá a impressão nitida de que tambem se não preoccupa com a troca das notas, ou com pagar as suas dividas.

É o que resulta d'este projecto de contrato, quo é em si gravissimo, não só pelo que contem, como pela impressão que deixa, que é esta, e que não póde ser outra.

O Estado, não só deixa de pagar o juro das quantias que devo, porque dada a convertibilidade, á força, da nota, não paga juro, mas deixa de pagar as amortizações; isto é, não paga nada.

Declara que se incluem na conta corrente os emprestimos, mas não inclue nada para amortizações nem juros; quer dar a perceber claramente que não pensa no restabelecimento da circulação metallica.

Mas como se isto não bastasse, para que não seja duvidosa a impressão que tal contrato possa produzir no publico, até auctoriza a que se diminuam as reservas metallicas que garantem a nota.

Positivamente, o Governo no que pensa é em ter um encargo a menos a satisfazer, com que pode no Orçamento tapar outros buracos, resultantes, por exemplo, dos nomeações ultimamente feitas.

Eu comprehendo que o Governo tentasse deixar de pagar ao Banco os juros do emprestimo, quando nós estamos no curso forçado e a nota tem o valor dado pelo Governo, mas comprehendo tambem que o Governo deve dar applicação a essa verba, amortizar a sua divida o não fingir um desapparecimento de encargos quando a divida prevalece.

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Essa verba deve, portanto, continuar no Orçamento e ser applicada á amortização das dividas do Estado para com o Banco.

Assim convenciam se todos de que o Governo não queria apenas retirar juros para se apoderar d'elles e emprega-los em cousas menos uteis e menos proprias, e de que pensava em satisfazer as suas dividas.

Julgo isto tão importante, de tanto interesse, e tão justo, - que concordo ora que a verba de juros desappareça, sim, mas que seja empregada na amortização das dividas ao Banco. Nesse sentido vou ter a honra do mandar para a mesa a seguinte proposta:

«Proponho que ao artigo 3.° do decreto n.° 5 relativo ao contrato com o Banco de Portugal, se addite o seguinte paragrapho:

§ unico. A importancia dos juros que o Estado actualmente paga era virtude dos referidos contratos, será applicada á amortização do debito do Estado ao Banco, a começar pelas dividas representadas por bilhetes do Tbesouro e emprestimos das classes inactivas; ficando o Banco obrigado a retirar annualmente da circulação uma quantia, em notas, igual á que perceber por este modo e diminuindo na mesma proporção e successivamente o limite de emissão estabelecido. = Mello e Sousa».

V. Exa. comprehende que o que eu não desejo é que se diga que o Estado não só não paga o juro, mas não quer pagar o que deve.

Assim, esta verba irá servir, não só como amortização da divida que o Estado tem ao Banco, mas diminuirá consideravelmente a circulação fiduciaria, ainda que de uma maneira lenta.

Creio que é a primeira vez que se lança uma idéa neste sentido, porque o Governo só trabalha em sentido opposto, no caminho de lançar no país o papel-moeda, sem recurso de natureza nenhuma.

O que eu proponho tem a dupla vantagem: do Governo dar a impressão de querer pagar a sua divida e de que pousa na convertibilidade da nota.

Este é uni dos lados do plano financeiro tal qual devia realizar-se.

Podem objectar que, diminuida a circulação fiduciaria das notas, poderia isto trazer perturbação na questão da moeda no movimento usual; mas este é um ponto concreto, em relação ao que ha a fazer com respeito ao Banco de Portugal.

É evidente que, assento este ponto com o Banco, outras providencias e outras medidas teem de ser tomadas, que não abranjam só a circulação de moeda e o periodo de transição; mas isto é o essencial.

Sem o Governo cuidar de amortizar a divida ao Banco, sem definir a forma como lhe ha de pagar, nada se pode fazer.

O Governo, porem, aproveita o ensejo para deixar de pagar o juro dos seus contratos e para não applicar esse juro á amortização do seu debito, applicando-o a tapar outros buracos no Orçamento, mostrando assim que não pensa de modo algum no restabelecimento financeiro e na circulação metallica.

V. Exa. quer ter a bondade de me dizer a que horas se encerra, a sessão?

O Sr. Presidente: - Ás seis horas e meia, mas antes d'isso ainda tenho de dar a palavra, para explicações, a um Sr. Deputado; agora, só V. Exa. quiser ficar com a palavra reservada...

O Orador: - Se V. Exa. me dá licença, eu concluo.

Devo lembrar que o artigo 11.° está errado; refere-se á troca de notas, do artigo 7.°, quando este artigo não fala em troca de notas. O que nelle se permitte é a representação em notas de uma quantia igual á da prata que actualmente possuo o Banco; no artigo 8.° é que se manda que a prata seja applicada em troca de notas de 5$00 réis.

Eu desejo que me explique o Sr. Ministro ou o Sr. Relator, ou quem quer que seja, como é que se praticam estes dois actos simultaneamente.

Se a prata sae, para a troca das notas, não pode ficar lá, e então pedia que se redigisse o artigo claramente. Ou isto é a forma de permittir uma nova emissão de réis 6.000:000$000 de notas? (Apoiados).

Sr. Presidente: o país não precisa de maior augmento de circulação, as taxas de juros estão baratas; os bancos teem dinheiro para todas as transacções a uma taxa razoavel; o proprio Banco de Portugal precisa de descontar á uma taxa mais baixa do que a official, portanto, não ha necessidade de uma emissão superior; pelo contrario, nestas circumstancias, o facto de auctorizar um augmento de circulação é uma cousa gravissima, que pôde trazer prejuizos enormes.

Chamo para este ponto a attenção da Camara, e peço que este artigo sejo esclarecido de modo que não possa ser concedido um augmento de circulação.

Não creio que a Camara rejeite a applicação do juro ao pagamento da divida e prefira que figure uma diminuição de despesa, quando essa diminuição se consegue com a declaração primaria de que o Estado não pensa em pagar o que deve!

Que não pague o juro vá, mas que não amortize o seu contrato, não. É faltar a tudo o que está estabelecido, ú annullar a possibilidade do restabelecimento financeiro do país!

Não ha direito de dizer que não se amortiza; tem de se amortizar exactamente com a verba que mais facilmente se pode applicar a isso, que é a verba dos juros que deixa de se pagar.

Não ha direito de não se pagarem esses contratos e de, ao mesmo tempo, se dizer que se dispõe da reserva, porque tudo isso faria notar que não se pensa na circulação metalica, que ninguem quer saber do restabelecimento financeiro do país!

Aproveite-se a verba do juro, mas para se pagar o que se deve ao Banco, para se estabelecer que essa quantia será retirada annualmente da circulação, dando a impressão de que se pensa em ir diminuindo o papel; guardá-la, para a applicar ás nomeações que se teem feito, ú que não pode ser; é criar cada vez mais difficuldades, é tornar cada vez mais embaraçoso o caminho no trabalho que no futuro se tenha de fazer para se conseguir o restabelecimento financeiro do país.

Sr. Presidente: referi-me, creio eu, a todos os pontos do contrato com o Banco de Portugal. Não comprehendo a insistencia num projecto de contrato, que o Governo não pode realizar, visto que tudo depende das negociações, que estão pendentes com o Banco, para a resolução d'este assumpto. O Banco nomeou uma commissão para o estudar, a Camara devia considerar mais largamente este projecto e não apenas no bill, alterá-lo na parte em que devesse ser alterado, como, por exemplo, no que diz respeito á capitalização do activo, que me parece um erro, no augmento da circulação fiduciaria, que chega a ser um crime, e, emfim, em relação á obrigação d'este contrato não poder ser modificado nem soffrer revisão alguma durante o prazo de dez annos.

Se isto fosse uma obra verdadeiramente boa, que não tivesse encontrado opposição, que todos applaudissem, comprehendia-se esta restricção de não se poder tocar no contrato durante o espaço do dez annos; mas não sendo assim, é evidente, e os proprios interessados o dizem, porque todos discutem, todos atacam o projecto de contrato, que nada, absolutamente nada, nem mesmo os

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principios economicos podem ser offerecidos como defesa d'elle, é verdadeiramente incomprehensivel.

Pouco mais tenho que dizer. Mandarei para a mesa a proposta a que me referi e a que espero a Camara não recusara a sua approvação, porque, se não a approvar, isso equivale a dizer que o Estado não quer pagar na suas dividas; e, não é na occasião em que se diz que se não pagam as juros, que se deve chegar ao ponto de se dizer que tambem, não se amortizam as dividas.

Vou mandar para a mesa a minha proposta e direi ainda a V. Exa., em relação á questão vinicola, que me parece que o Governo nenhuma alteração fez ás providencias que julgou adoptar para melhorar a crise da viticultura, providencias que foram de tal natureza, que apenas se resumiram em permittir uma exploração mercantil, e nada mais. Não produziram effeito algum, e não sou só eu que o digo; varios amigos do Governo, que o defendem pela imprensa, o confessam claramente.

As providencias não foram nada; absolutamente nada; traduziram se apenas em permittir que algumas transacções mercantis se realizassem com certo lucro. De todas aquellas disposições, largas, extraordinarias, muito grandes, nada resultou.

A crise está cada vez a aggravar-se mais, e ainda hoje um illustre membro d'esta Camara, o Sr. Alpoim, se queria referir a ella. De toda a parte ha reclamações. Pois bem: o Governo apresenta o decreto tal qual o tinha feito em dictadura, e nada mais tem a dizer.

O Governo, no projecto do anno passado, apresentando outras medidas, dizia que não as promulgava em dictadura por isso que era um assumpto para o Parlamento apreciar, e agora que os vinhos estão nas adegas, o Governo desinteressa-se por completo do assumpto, apresenta o projecto englobado no bill e espera a votação - sem preoccupações. O Governo, na proposta apresentada o anno passado falava em outras providencias, que eu discutirei se for chamado a terreno, mas parece-me que algumas podia promulgar desde já.

Sobre o assumpto vou apresentar a seguinte proposta:

«Proponho que no decreto n.° 9 respeitante a providencias reclamadas pela crise de viticultura, seja inserido o seguinte artigo:

Art. ... Durante cinco annos, contados da data da publicação d'esta lei, não serão permittidas novas plantações de vinha no continente do reino e ilhas adjacentes, com excepção da região denominada do Douro e da Ilha da Madeira. - Mello e Sousa».

Esta medida poderá ter inconvenientes, como teem todas mais ou menos, mas tem a vantagem de representar uma utilidade em curto espaço de tempo, porque não ha duvida de que a nossa crise resulta do excesso de producção que se dá em França e em outros paises, o que colloca em grandes dificuldades o productor.

Poderá esta proposta atacar os orthodoxos principios economicos, mas num país em que não se respeita nenhum principio, parece-me que, se para as outras industrias se exige protecção e se lhe applica todo o cuidado para que ellas sejam augmentadas, para a industria agricola, a primeira de todas as industrias do país, não é extraordinario tambem reclamar protecção de forma a mantê-la á altura em que está, que já não é bastante remuneradora, mas que ainda menos o será se continuarem os excessos de plantação.

Termino, mandando para a mesa as duas propostas.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas).

Lidas na mesa as propostas são admitidas e ficam em discussão conjuntamente com o projecto.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rodrigues Nogueira pediu a palavra para antes de se encerrar a sessão.

Vou consultar a Camara sobre se deve conceder-lh'a.

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. Rodrigues Nogueira (para explicações): - Sr. Presidente: devido ás más condições acustícas d'esta sala, o Sr. Presidente do Conselho disse que os Deputados d'este lado da Camara tinham atacado o Sr. Ministro das Obras Publicas e reclamado a sua presença aqui.

Fui um dos que pronunciei o nome do Sr. Ministro das Obras Publicas, mas com tanto cuidado o fiz, que me referi á sua ausencia nas sessões do anno passado. Propositadamente não me quis referir a esta sessão, porquanto vi quão dolorosa foi para nós a de 1901, por motivos que V. Exa. não desconhece.

Sr. Presidente: não ataquei o Sr. Ministro das Obras Publicas na sua ausencia. Critiquei actos do Governo em phrases vehenientes, porque a primeira responsabilidade nesses actos tinha a o Sr. Presidente do Conselho. (Apoiados).

E fique de uma voz para sempre assente que sou incapaz de atacar ninguem pelas costas. (Apoiados).

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Eu não desejo deixar a Camara sob a impressão de, por umas palavras minhas, o illustre Deputado, o Sr. Rodrigues Nogueira, cujo caracter prezo o respeito, pudesse suppor-se melindrado, na sua forma parlamentar, por se entender que S. Exa. fôra atacar quem não podia vir aqui, o que decerto não era proprio do seu feitio parlamentar, e pessoal.

Não. Eu não era capaz de pronunciar umas palavras que pudessem dar a entender que o Sr. Rodrigues Nogueira se aproveitava da ausencia do Sr. Ministro das Obras Publicas para o atacar. Sei muito bem, porque estou acostumado a terçar armas com o illustre deputado, que S. Exa. gosta de atacar de frente.

Ouvi, talvez ouvisse mal - e oxalá que assim seja - ouvi, repito, dizer que o Sr. Ministro das Obras Publicas estava em casa e não podia vir á Camara. Ora a verdade é que o Sr. Ministro das Obras Publicas pode bem estar em casa, occupando-se dos negocios do seu Ministerio, e todavia não poder comparecer. (Apoiados).

Não é uma cousa que offereça duvida; ao contrario é um facto que se dá, e que nesta occasião impossibilita o Sr. Ministro de vir á Camara. (Apoiados).

Mas folgo muito com as declarações dos illustres Deputados que muito os honram. Assim vamos todos bem neste assumpto. O Sr. Ministro das Obras Publicas de que ninguem duvida, que desde que S. Exa. possa vir ao Parlamento, virá; e os illustres Deputados da opposição, porque não precisam da ausencia do Sr. Ministro para o increparem. (Apoiados). Sabem muito bem atacá-lo e combatê lo, quando elle se nella presente. (Muitos apoiados).

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Tendo pedido a palavra para explicações o Sr. Francisco José Machado, consulto a Camara sobre se permitte que S. Exa. fale.

A Camara resolveu affirmativamente.

O Sr. Francisco José Machado (para explicações): - Sr. Presidente: referiu-se o Sr. Presidente do Conselho a uma phrase que foi pronunciada por um Deputado d'este lado da Camara a respeito do Sr. Ministro das Obras Publicas. Como eu costumo em toda a parte assumir a responsabilidade dos meus actos, declaro que fui eu que proferi essa phrase e agora direi por que a proferi. Porque, vendo nos jornaes que o Sr. Ministro das Obras Publicas estava em sua casa, dando despachos aos seus directores geraes, tratando, portanto, dos negocios do seu

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112 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Ministerio, imaginei que S. Exa. estava com saude para vir ao Parlamento. Foi nesta hypothese que reclamei a presença do Sr. Ministro. Mais nada.

O Sr. Presidente: - A primeira sessão é segunda-feira, 20 do corrente. Antes da ordem do dia lia de ser dado para a discussão o aviso previo do Sr. Ovidio Alpoim.

A ordem do dia é a mesma que estava dada para hoje, eleição de commissões, continuação da discussão do bill de indemnidade e mais a interpellação do sr. José de Alpoim.

Está encerrada a sessão.

Eram seis horas e meia da tarde.

O redactor interino = Albano da Cunha.

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