SESSÃO N.° 6 DE 9 DE MAIO DE 1908 5
nei a pedi-la hoje. O meu desejo de usar da palavra explica-se pelo seguinte motivo.
Elaborei um projecto de lei e desejo apresentá-lo a esta Camara precisamente no inicio da actual legislatura, tal é o interesse que elle me inspira e o dever moral que perante a minha consciencia contrahi de o apresentar o mais cedo possivel nesta casa do Parlamento.
Esse projecto de lei refere-se á grave questão dos accidentes de trabalho, materia que já se encontra legislada, por uma forma immediatamente exequivel, em todos os países cultos e que apenas se comprehende que ainda o não esteja entre nós por uma deploravel incuria ou talvez antes pelo proposito firme de não se resolverem assuntos, que são de grande interesse publico, mas que podem levantar embaraços á politica verdadeiramente nefasta de expedientes, palliativos e covardias com que a monarchia nos ultimos annos se tem sustentado em Portugal.
Sr. Presidente: Eu. tenho nesta questão compromissos muito formaes, responsabilidades muito assentes.
Em cerca de vinte annos de propaganda, sem nunca abandonar a questão politica, porque sempre tenho entendido e continuo a entender, que ella está posta neste país por umaforma fundamental e inilludivel, e sem me deixar arrastar pela corrente das grandes reformas sociaes, por que as considero uma formula superior da civilização, que os povos apenas podem assimilar e resolver, quando primeiro tenham resolvido o problema da sua administração pelo seu equilibrio financeiro e pela moralização dos seus costumes politicos, nesses vinte annos de propaganda eu nunca deixei, Sr. Presidente, de insistir pela necessidade inadiavel de se attender á situação precaria das classes trabalhadoras (Apoiados).
Neste, país ellas são forçadas a viver com um salario menor e com uma alimentação mais cara que em qualquer outro país da Europa, em bairros manifestamente insalubres.
E para que a sua situação ainda se torne mais desoladora encontram-se até privadas dos mais rudimentares direitos e regalias, que a legislação estrangeira de ha muito garante por forma effectiva e regular.
Outro motivo me leva a apresentar este projecto logo no inicio d’esta legislatura.
O meu partido, que de tudo tem sido accusado pelos monarchicos, até das coisas mais absurdas e inverosimeis, tambem o tem sido de não possuir, segundo dizem, um programma de governo e de não ter ainda manifestado ideias definidas e soluções concretas acêrca dos assuntos que mais preocupam e interessam o país. Sr. Presidente: Esta accusão é capaciosa, é desleal, é falsissima!
O partido republicano tem um programma que foi elaborado pelo seu Directorio de 1891, ao qual pertencia a poderosa mentalidade de Theophilo Braga (Apoiados), e esse programma é uma exposição concisa, é uma sumrnula perfeita de exposições, principies e doutrinas, devidamente concretizadas e detalhadas, que se amoldam ás condições do nosso país.
É certo que de 1891 até hoje o movimento de ideias sobre a questão social tem sido tão intensivo e agitado que novos problemas se teem posto á consideração de todos os sociologos e economistas.
Mas mesmo neste periodo, que tem sido de luta accidentada para o meu partido, sujeito ás mais violentas repressões, os propagandistas republicanos não teem deixado de tratar na imprensa, conferencias e comicios os assuntos de maior oppurtunidade para, a situação economica e para a vida social do novo português.
Simplesmente subsiste a accusação feita aos deputados republicanos, que teem vindo ao Parlamento nas raras legislaturas em que não tem sido cerceada a representação parlamentar do partido, de não apresentarem projectos de lei.
Sr. Presidente: Como é descabida e absurda uma tal accusação! Nos estamos num país em que 5 Parlamento tem sido uma verdadeira ficção pelos constantes atropelos constitucionaes, pela absorpção do poder legislativo por todos os outros poderes do Estado. (Apoiados).
Nós estamos num país em que os proprios partidos monarchicos da opposicão se teem abatido de collaborar nas obras dos Governos, apresentando quaesquer projectos de lei, muito naturalmente porque teem julgado a sua apresentação inutil ou contraproducente.
Pois é num país nessas condições que se censura os Deputados republicanos, hostilizados pelo mais negro facciosismo, de não apresentarem projectos de lei que de antemão tinham a certeza que não chegariam a ser discutidos!
Hoje a orientação parece outra; com o inicio de novo reinado os partidos monarchicos fazem as mais categoricas promessas de vida nova reclamando mesmo a collaboração dos republicanos.
Eu não quero dizer á Camara a confiança que me inspiram essas promessas; o facto pertence mesmo ao foro intimo da minha consciencia, que ninguem tem o direito de devassar.
Mas comprehendo bem que, antes de ser Deputado republicano, sou Deputado da Nação e que não contrahi apenas responsabilidades perante o meu partido, porque tambem as contrahi perante os meus eleitores e perante o país.
Por isso, Sr. Presidente, se os partidos inonaTchicos representados no Governo desejam a collaboração dos republicanos em quaesquer medidas de utilidade para o país eu estou pronto a dar-lhes essa collaboração.
Como membro da minoria republicana, entendo mesmo que ella deve proceder d’esta forma para que se ponha á prova a sinceridade, o altruismo e o patriotismo dos nossos adversarios, para que se veja bem até onde chega essa vida nova tão annunciada pelos monarchicos. (Apoiados).
Passo a ler o projecto de lei, que envio para a mesa, não lendo o relatorio que o acompanha por ser muito longo e a sua leitura levar decerto mais tempo do que aquelle em que me é permittido falar.
O projecto ficou para segunda leitura.
O Sr. Arthur Pinto Basto: — É seu costume, no começo de qualquer sessão legislativa, fazer referencia aos. Deputados fallecidos no intervallo parlamentar, mas o adeantado da hora não lhe permitte hoje cumprir esse dever.
Tambem pelo mesmo motivo não se referirá ao horrivel attentado que cobriu de sangue e vilipendio este país, digno de melhor sorte.
Ha poucos dias dirigiu uma representação a El-Rei, pedindo-lhe a sua acção, como primeiro magistrado do país, para que fossem dadas providencias no sentido de se fazer acquisição de milho em quantidade bastante para se abastecerem os mercados do norte do país. Sua Majestade, comprehendendo bem a sua missão, respondeu que tinha lido a representação attentamente e que a mandara entregar ao Sr. Ministro das Obras Publicas, recommendando-lhe que lhe desse toda a attenção.
Conhece apenas de hontem o Sr. Ministro das Obras Publicas, e consignando aqui o seu desejo, espera que S. Exa. tomará providencias era ordem a serem abastecidos os mercados do norte, que são os que conhece melhor, com a quantidade de milho necessario para evitar a fome, porque de contrario aquelle cereal, que, não obstante não ter sido muito escassa a colheita, se tem vendido a 700 réis, em julho ou agosto subirá á 1$000 réis, o que representaria um verdadeiro horror.
E, estando no uso da palavra, deseja, apresentar um projecto de lei que, no seu entender, representa um acto