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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

6.ª SESSÃO

EM 9 DE MAIO DE 1908

SUMMARIO: — Approvada a acta e tendo-se dado conta do expediente, teve segunda leitura, sendo admittido, um projecto de lei do Sr. Brito Camacho para se abolir o juramento politico. Em seguida, tambem em segunda leitura, foi rejeitada uma proposta do mesmo Sr. Deputado para que se nomeasse uma commissao de onze Srs. Deputados para proceder a um inquerito sobre os acontecimentos de 5 de abril em Lisboa. — O Sr. Presidente communica ter sido recebida por El Rei a deputação que lhe participou a constituição da Camara, o voto de sentimento e a lista quintupla para supplentes á presidencia. — Prestaram juramento os Srs. Queiroz Ribeiro, D. Thomaz de Vilhena e Manuel Fratel. — Approvam-se propostas de accumulação dos Srs. Ministros do Reino, da Guerra e da Marinha, e participa-se a constituição da commissão de resposta ao discurso da Coroa.— O Sr. Pinto dos Santos define a attitude da dissidencia progressista perante o Governo, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Justiça. — O Sr. Pinheiro Torres, em nome do partido nacionalista, felicita o Sr. Presidente pela sua elevação áquelle cargo, associa-se ao voto de sentimento pelos Deputados fallecidos, especialmente Hintze Ribeiro, e pede que se faça completa luz sobre o attentado de 1 de fevereiro.—O Sr. Estevam de Vasconcellos apresenta e justifica um projecto de lei regulando á assistência nos accidentes do trabalho. — O Sr. Arthur Pinto Basto pede providencias contra a carestia de milho e apresenta um projecto de lei concedendo uma pensão á viuva do Conde de S. Januario. Responde-lhe o Sr. Ministro das Obras Publicas. — Os Srs. Claro da Ricca, Moreira de Almeida e Brito Camacho annunciam avisos previos e os Srs. Archer da Silva e Affonso Costa requerem vários esclarecimentos.

Na ordem, do dia elegem-se as commissões de regimento e disciplina, agricultura e administração.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. Libanio Antonio Fialho Gomes

Secretarios — os Exmos. Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
João Pereira de Magalhães

Primeira chamada — Ás 2 horas da tarde.

Presentes — 10 Srs. Deputados.

Segunda chamada — Ás 2 e 45 da tarde.

Presentes — 55 Srs. Deputados.

São os seguintes: — Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, Alfredo Carlos Le Cocq, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio de Almeida Pinto da Mota, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Hintze Ribeiro, Antonio Rodrigues Costa da Silveira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Vidal de Castilho Barreto e Noronha, Conde de Azevedo, Conde de Castro e Solla, Conde de Mangualde, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia, Diogo Domingues Peres, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Emygdio Lino da Silva Junior, Ernesto Jardim de Vilhena, Fernando de Sousa Botelho e Mello (D.), Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Miranda da Costa Lobo, Henrique de Mello Archer da Silva, João Henrique Ulrich, João Ignacio de Araujo Lima, João Pereira de Magalhães, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Soares Branco, João de Sousa Tavares, José Bento da Rocha e Mello, José Cabral Correia do Amaral, José Caeiro da Mata, José Estevam de Vasconcellos, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim da Silva Amado, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Vieira Ramos, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Oliveira Mattos, José Mathias Nunes, José Paulo Monteiro Cancella, José dos Santos Pereira Jardim, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luis Filippe de Castro (D.), Manuel de Brito Camacho, Manuel de Sousa Avides, Miguel Augusto Bombarda, Rodrigo Affonso Pequito, Sabino Maria Teixeira Coelho.

Entraram durante a sessão os Srs.: — Affonso Augusto da Costa, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alberto Pinheiro Torres, Alfredo Candido Garcia de Moraes, Alvaro Rodrigues Valdez Penalva, Amadeu de Magalhães Infante de La Cerda, Antonio Alves Oliveira Guimarães, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Centeno, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José de Almeida, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Nogueira Antonio Zeferino Candido da Piedade, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Augusto Pereira do Valle, Aurelio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, Carlos Augusto Ferreira, Conde da Arrochella, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, Fernando de Almeida Loureiro e Vasconcellos, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, João Carlos de Mello Barreto, João Duarte de Menezes, João de Sousa Calvet de Magalhães, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim Pedro Martins, Jorge Vieira, José de Ascensão Guimarães, José Augusto Moreira de Almeida, José Malheiro Reymão, José Maria Joaquim Tavares, José Maria de Oliveira Simões, José Maria Pereira de Lima, José Maria de Queiroz Velloso, José Osorio da Gama e Castro, José Ribeiro da Cunha, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luis Vaz de Carvalho Crespo, Manuel Affonso da Silva Espregueira, Manuel Joaquim Fratel, Manuel Nunes da Silva, Manuel Telles de Vasconcellos, Roberto da Cunha Baptista, Thomaz de Almeida Manuel de Vilhena (D.), Vicente de Moura Coutinho de Almeida d’Eça, Visconde de Coruche, Visconde de Oliva, Visconde da Torre, Visconde de Villa Moura.

Não compareceram á sessão os Srs.: — Abel de Matos Abreu, Abel Pereira de Andrade, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alexandre Braga, Alfredo Pereira, Antonio Bellard da Fonseca, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Tavares Festas, Eduardo Burnay, Francisco Cabral Metello, Francisco Joaquim Fernandes, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, João Correia Botelho Castello Branco, João Joaquim Isidro dos Reis, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Caetano Rebello, José Coelho da Motta Prego, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Luis da Gama, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Francisco de Vargas, Mariano José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Matheus Augusto Ribeiro de Sampaio, Paulo de Barros Pinto Osorio, Visconde de Reguengo (Jorge).

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SESSÃO N.° 6 DE 9 DE MAIO DE 1908 3

ABERTURA DA SESSÃO — Ás 3 horas da tarde

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do Presidente da Camara dos Deputados da Hungria, pedindo para estabelecer entre as duas Camaras a troca dos impressos respectivos.

Para a secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. — Submetto á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É abolido, em todas as instancias, o juramento politico.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario. = Manuel de Brito Camacho.

Foi admittido e enviado á commissão de legislação civil.

Proposta

Tendo-se produzido factos da mais alta gravidade em Lisboa, no dia 5 de abril passado, nas assembleias eleitoraes de Alcantara e S. Domingos, dos quaes resultou a morte para 14 individuos, sendo superior a cem o numero dos que receberam ferimentos de maior ou menor importancia.

Não devendo taes crimes ficar impunes, seja quem for que nelles tenha responsabilidades de qualquer ordem;

E sendo certo que ao Parlamento cabe especial competencia e suprema autoridade para de taes factos inquirir com largueza no supremo interesse da justiça, que é a melhor garantia da ordem social;

Visto o artigo 14.° do Acto Addicional de 1852: Proponho que ,a Camara, autorize o Sr. Presidente a nomear uma commissão de onze membros, escolhidos de entre todos os agrupamentos politicos que nella teem representação, a qual proceda, pelos meios que achar convenientes, a um rigoroso inquerito sobre os factos occorridos em Lisboa, no dia 5 de abril, em Alcantara e S. Domingos, devendo essa commissão dar conta a esta Camara do resultado dos seus trabalhos. = Manuel de Brito Camacho.

Foi rejeitada.

O Sr. Presidente: — Communico á camara que a grande deputação que foi ao Paço participar a constituição da Camara, apresentar a lista quintupla para supplentes á Presidencia e Vice-Presidencia e o voto de sentimento da mesma Camara, foi recebida por Sua Majestade El-Rei e pela Familia Real com toda a deferencia.

(Pausa).

O Sr. Presidente: — Estão nos corredores da Camara, para prestarem juramento, os Srs. Deputados Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos é D. Thomaz de Almeida Manuel de Vilhena.

Convido os Srs. Augusto Cesar Claro da Ricca e Rodrigo Affonso Pequito a introduzi-los na sala.

Foram introduzidos, prestaram juramento e tomaram assento.

O Sr. Ministro da Justiça (Campos Henriques):— Por parte do Sr. Ministro do Reino, mando para a mesa a seguinte

Proposta

Na conformidade do artigo 3.° do Primeiro Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, o Governo de Sua Majestade pede á Camara dos Senhores Deputados da Nação a precisa permissão para que possam accumular, querendo, as funccões legislativas com as dos empregos dependentes do Ministerio do Reino, que exercem em Lisboa, os Senhores Deputados:

Conselheiro Abel Pereira de Andrade, vogal do Supremo Tribunal Administrativo;

Conselheiro José Maria de Queiroz Velloso, e Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, chefes de repartição no dito Ministerio;

Conselheiro Arthur Pinto de Miranda Montenegro, vogal do Conselho Superior de Instrucção Publica;

Augusto Cesar Claro da Ricca, professor;

Aurelio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, director do Asylo D. Maria Pia;

Eduardo Burnay, delegado de saude, e professor;

Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, director do Conservatorio;

Emygdio Lino da Silva, commandante do corpo de bombeiros municipaes;

Conselheiro João de Sousa Tavares, professor;

Conselheiro José Joaquim da Silva Amado, professor;

Conselheiro José Joaquim de Sousa Cavalheiro, ajudante do procurador geral da Coroa e Fazenda junto do Supremo Tribunal. Administrativo;
Conselheiro Manuel Antonio Moreira Junior, professor;

Manuel Telles de Vasconcellos, primeiro official da Secretaria do Supremo Tribunal Administrativo;

Fernando de Almeida Loureiro e Vasconcellos, repetidor da Escola Polytechnica;

Mariano José da Silva Prezado, professor;

Sabino Maria Teixeira Coelho, professor;

Miguel Augusto Bombarda, professor e director do hospital de alienados.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 9 de maio de 1908. = Francisco Joaquim Ferreira do Amaral.

Foi approvada.

O Sr. Ministro da Marinha (Augusto de Castilho): — Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Senhores. — Em conformidade do disposto no artigo 3.° do Primeiro Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, o Governo pede á Camara dos Senhores Deputados da Nação permissão para que possam accumular, querendo, o exercicio das suas funcções legislativas com as dos seus empregos ou commissões dependentes d’este Ministerio, os Srs. Deputados:

Alvaro Rodrigues Valdez Penalva.
Ernesto Jardim de Vilhena.
Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos.
João Pinto Rodrigues dos Santos.
José Augusto Moreira de Almeida.
José Maria Pereira de Lima.
José Paulo Monteiro Cancella.
Manuel Joaquim Fratel.
Vicente Maria de Moura Coutinho de Almeida de Eça.

Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha e Ultramar, em 9 de maio de 1908. = Augusto de Castilho.

Foi approvada.

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Sr. Ernesto de Vasconcellos: — Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte

Participação

Está constituida a commissão de resposta ao Discurso da Coroa, tendo nomeado para seu relator o Sr. Conselheiro Pereira dos Santos, e para secretario Ernesto de Vasconcellos, que faz a communicação. = Ernesto de Vasconcellos.

Para a acta.

O Sr. Presidente: — Acha-se nos corredores da Camara, para prestar juramento, o Sr. Deputado Manuel Joaquim Fratel. Convido os Srs. Deputados João Carlos de Mello Barreto e. Augusto César Claro da Ricca a introduzirem-no na sala.

Foi introduzido, prestou juramento e tomou assento.

O Sr. João Pinto dos Santos: — Tinha pedido á palavra na sessão anterior para, em nome do partido que representa nesta Camara, definir a attitude do mesmo partido perante o Governo.

O facto de ter hontem mandado para a mesa uma interpellação ao Governo não quer dizer que o seu partido esteja disposto a levantar constantemente questões irritantes ou politicas, embaraçando a marcha governativa ou fazendo obstruccionismo; significa apenas que, sendo o Parlamento uma assembleia politica, é nelle que se deve fazer a apreciação dos actos do Governo e apurar as suas responsabilidades; liquidadas estas, longe de lhe embaraçar a marcha, pelo contrario o seu partido está disposto a dispensar-lhe a sua coadjuvação, se, como espera, se orientar nas necessidades e interesses do país.

Isto, porem, não quer dizer que estejam dispostos a ensarilhar armas. O seu partido tem um programma defendido no Parlamento, na imprensa e em comicios e d’elle não se afastará nem um apice. Batalhará em defesa das liberdades publicas, de uma sã administração e do rigoroso cumprimento da lei. Seguindo o Governo este caminho, pode contar com todo o seu apoio.

A situação é deveras excepcional, e mal irá ao Governo - se, em uma conjuntura difficil como esta malbaratar o tempo em byzantinices. A situação é grave sob todos os aspectos, economico, moral e financeiro, pelas perturbações que de toda a parte surgem, pela situação em que o país se encontra perante o estrangeiro; e é tão grave, que o entretenimento com cousas futeis lançaria grandes responsabilidades sobre o Governo e mostraria que o Parlamento não tinha razão de ser.

Não ha de ser o partido a que pertence que contribua para o desprestigio do Parlamento ou para que o Governo deixe de fazer o que deve fazer. O que é preciso é que o Governo se compenetre da sua missão.

Muita gente não quer ver nesta situação senão a desordem; elle, orador, pelo contrario, vê uma epoca de emancipação. O que é necessario é que seja o Governo quem a dirija.

O tempo não vae nem para o despotismo, nem para os ditadores.

Os partidos que tenham razão, ainda que sejam pequenos, como o d’elle, orador, hão de sempre triunfar contra todas as oligarchias, porque não ha maneira de lutar contra quem tem razão.

A intenção do seu partido, portanto, não é criar difficuldades ao Governo, mas estimular a sua acção para que faça obra util.

Não quer os dinheiros publicos sacrificados aos interesses dos corrilhos, mas applicados no bem do país.

Estes são os principios pelos quaes o seu partido batalhará sempre no Parlamento e sobre os quaes não deixará saltar sem protesto.

Se o Governo não seguir por outro caminho, encontrará sempre, como já disse, todo o seu apoio.

Tem pelo Sr. Ferreira do Amaral muita sympathia e consideração; conhece-lhe as qualidades, porque já serviu com elle como governador civil; ha outros Ministros de quem é amigo, e de todos espera que, compenetrados da situação, governem como as circunstancias exigem.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Ministro da Justiça (Campos Henriques): — Pedi a palavra para agradecer ao Sr. Deputado Pinto dos Santos as referencias amaveis que fez não só ao Sr. Presidente do Conselho, mas tambem a alguns membros do Gabinete. E aproveito o ensejo para affirmar a S. Exa. e a toda a Camara que o desejo do Governo é apresentar propostas que sejam uteis ao país.

O momento é bastante difficil e bastante grave para que o Governo não careça da collaboração e do apoio de todos os grupos do Parlamento, e, portanto, não lhe pode ser indifferente o apoio do grupo a que S. Exa. pertence.

O Governo, pela sua parte, fará todo o possivel para corresponder á espectativa do illustre Deputado e dos seus amigos.

O Sr. Pinheiro Torres: — Tem, em nome do partido nacionalista, de cumprir dois deveres: o primeiro, de felicitar o Sr. Presidente pela sua elevação a esse cargo, convencido como está de que ha de contribuir para o aumento do prestigio do Parlamento, mostrando assim lá fora quanto é falsa a accusação de que não temos tradições parlamentares, quando de facto contamos da nossa historia figuras brilhantes, como aquella que disse a um poderoso Monarcha Português: - Senão, não.

O segundo dever que tem a cumprir é o de associar-se ao voto de sentimento pelos Deputados fallecidos no interregno parlamentar, entre os quaes se contavam personalidades como Dias Ferreira e Barbosa du Bocage.

De entre todos, porem, destaca Hintze Ribeiro, cuja vida é uma lição proveitosa.

Fontes disse ao morrer que sentia que fazia falta; a seu ver, melhor o poderia dizer, Hintze Ribeiro, porque os tempos são mais perigosos.

Disse alguem que Hintze Ribeiro morreu a tempo; elle, orador, pelo contrario, entende que não, pois senão tivesse morrido, talvez se tivessem evitado muitas desgraças que caíram sobre o país.

Como estadista, foi a primeira força dentro das instituições, e, como Ministro, deixou a sua passagem fundamente assinalada nos Ministerios do Reino, Obras Publicas, Fazenda e Estrangeiros.

E, neste momento, folga lembrar que a Augusta Soberana, a Senhora D. Amelia, quis ser das primeiras a confundir as suas lagrimas com as da virtuosa viuva. Mas não foram só os grandes, tambem o povo se inclinou respeitoso ante o seu feretro, num movimento de justiça.

E, a proposito, dirá que o partido nacionalista protesta indignado contra o nefando crime que enlutou todo o país e pede que sobre esse horrivel attentado se faça inteira luz.

Desde esse, dia uma apprehensão terrivel invadiu todos os espiritos.
É preciso acabar com essa atmosphera de suspeições e unirem-se todos, sem distincção de partidos, para trabalharem pela salvação do país.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Estevam de Vasconcellos: — Sr. Presidente: Já na sessão de hontem, que foi a primeira da actual legislatura em que me seria possivel usar da palavra, eu tive occasião de a pedir e porque ella não me chegou tor-

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nei a pedi-la hoje. O meu desejo de usar da palavra explica-se pelo seguinte motivo.

Elaborei um projecto de lei e desejo apresentá-lo a esta Camara precisamente no inicio da actual legislatura, tal é o interesse que elle me inspira e o dever moral que perante a minha consciencia contrahi de o apresentar o mais cedo possivel nesta casa do Parlamento.

Esse projecto de lei refere-se á grave questão dos accidentes de trabalho, materia que já se encontra legislada, por uma forma immediatamente exequivel, em todos os países cultos e que apenas se comprehende que ainda o não esteja entre nós por uma deploravel incuria ou talvez antes pelo proposito firme de não se resolverem assuntos, que são de grande interesse publico, mas que podem levantar embaraços á politica verdadeiramente nefasta de expedientes, palliativos e covardias com que a monarchia nos ultimos annos se tem sustentado em Portugal.

Sr. Presidente: Eu. tenho nesta questão compromissos muito formaes, responsabilidades muito assentes.

Em cerca de vinte annos de propaganda, sem nunca abandonar a questão politica, porque sempre tenho entendido e continuo a entender, que ella está posta neste país por umaforma fundamental e inilludivel, e sem me deixar arrastar pela corrente das grandes reformas sociaes, por que as considero uma formula superior da civilização, que os povos apenas podem assimilar e resolver, quando primeiro tenham resolvido o problema da sua administração pelo seu equilibrio financeiro e pela moralização dos seus costumes politicos, nesses vinte annos de propaganda eu nunca deixei, Sr. Presidente, de insistir pela necessidade inadiavel de se attender á situação precaria das classes trabalhadoras (Apoiados).

Neste, país ellas são forçadas a viver com um salario menor e com uma alimentação mais cara que em qualquer outro país da Europa, em bairros manifestamente insalubres.

E para que a sua situação ainda se torne mais desoladora encontram-se até privadas dos mais rudimentares direitos e regalias, que a legislação estrangeira de ha muito garante por forma effectiva e regular.

Outro motivo me leva a apresentar este projecto logo no inicio d’esta legislatura.

O meu partido, que de tudo tem sido accusado pelos monarchicos, até das coisas mais absurdas e inverosimeis, tambem o tem sido de não possuir, segundo dizem, um programma de governo e de não ter ainda manifestado ideias definidas e soluções concretas acêrca dos assuntos que mais preocupam e interessam o país. Sr. Presidente: Esta accusão é capaciosa, é desleal, é falsissima!

O partido republicano tem um programma que foi elaborado pelo seu Directorio de 1891, ao qual pertencia a poderosa mentalidade de Theophilo Braga (Apoiados), e esse programma é uma exposição concisa, é uma sumrnula perfeita de exposições, principies e doutrinas, devidamente concretizadas e detalhadas, que se amoldam ás condições do nosso país.

É certo que de 1891 até hoje o movimento de ideias sobre a questão social tem sido tão intensivo e agitado que novos problemas se teem posto á consideração de todos os sociologos e economistas.

Mas mesmo neste periodo, que tem sido de luta accidentada para o meu partido, sujeito ás mais violentas repressões, os propagandistas republicanos não teem deixado de tratar na imprensa, conferencias e comicios os assuntos de maior oppurtunidade para, a situação economica e para a vida social do novo português.

Simplesmente subsiste a accusação feita aos deputados republicanos, que teem vindo ao Parlamento nas raras legislaturas em que não tem sido cerceada a representação parlamentar do partido, de não apresentarem projectos de lei.

Sr. Presidente: Como é descabida e absurda uma tal accusação! Nos estamos num país em que 5 Parlamento tem sido uma verdadeira ficção pelos constantes atropelos constitucionaes, pela absorpção do poder legislativo por todos os outros poderes do Estado. (Apoiados).

Nós estamos num país em que os proprios partidos monarchicos da opposicão se teem abatido de collaborar nas obras dos Governos, apresentando quaesquer projectos de lei, muito naturalmente porque teem julgado a sua apresentação inutil ou contraproducente.

Pois é num país nessas condições que se censura os Deputados republicanos, hostilizados pelo mais negro facciosismo, de não apresentarem projectos de lei que de antemão tinham a certeza que não chegariam a ser discutidos!

Hoje a orientação parece outra; com o inicio de novo reinado os partidos monarchicos fazem as mais categoricas promessas de vida nova reclamando mesmo a collaboração dos republicanos.

Eu não quero dizer á Camara a confiança que me inspiram essas promessas; o facto pertence mesmo ao foro intimo da minha consciencia, que ninguem tem o direito de devassar.

Mas comprehendo bem que, antes de ser Deputado republicano, sou Deputado da Nação e que não contrahi apenas responsabilidades perante o meu partido, porque tambem as contrahi perante os meus eleitores e perante o país.

Por isso, Sr. Presidente, se os partidos inonaTchicos representados no Governo desejam a collaboração dos republicanos em quaesquer medidas de utilidade para o país eu estou pronto a dar-lhes essa collaboração.

Como membro da minoria republicana, entendo mesmo que ella deve proceder d’esta forma para que se ponha á prova a sinceridade, o altruismo e o patriotismo dos nossos adversarios, para que se veja bem até onde chega essa vida nova tão annunciada pelos monarchicos. (Apoiados).

Passo a ler o projecto de lei, que envio para a mesa, não lendo o relatorio que o acompanha por ser muito longo e a sua leitura levar decerto mais tempo do que aquelle em que me é permittido falar.

O projecto ficou para segunda leitura.

O Sr. Arthur Pinto Basto: — É seu costume, no começo de qualquer sessão legislativa, fazer referencia aos. Deputados fallecidos no intervallo parlamentar, mas o adeantado da hora não lhe permitte hoje cumprir esse dever.

Tambem pelo mesmo motivo não se referirá ao horrivel attentado que cobriu de sangue e vilipendio este país, digno de melhor sorte.

Ha poucos dias dirigiu uma representação a El-Rei, pedindo-lhe a sua acção, como primeiro magistrado do país, para que fossem dadas providencias no sentido de se fazer acquisição de milho em quantidade bastante para se abastecerem os mercados do norte do país. Sua Majestade, comprehendendo bem a sua missão, respondeu que tinha lido a representação attentamente e que a mandara entregar ao Sr. Ministro das Obras Publicas, recommendando-lhe que lhe desse toda a attenção.

Conhece apenas de hontem o Sr. Ministro das Obras Publicas, e consignando aqui o seu desejo, espera que S. Exa. tomará providencias era ordem a serem abastecidos os mercados do norte, que são os que conhece melhor, com a quantidade de milho necessario para evitar a fome, porque de contrario aquelle cereal, que, não obstante não ter sido muito escassa a colheita, se tem vendido a 700 réis, em julho ou agosto subirá á 1$000 réis, o que representaria um verdadeiro horror.

E, estando no uso da palavra, deseja, apresentar um projecto de lei que, no seu entender, representa um acto

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de justiça, por isso que o país não deve esquecer aquelles que bem o serviram.

Dedica á memoria do Conde de S. Januario tanto respeito, como consideração lhe prestou em vida, mas nunca lhe deveu um favor, pois, como ninguem ignora, militou sempre em partido opposto.

Com a Sra. Condessa de S. Januario não tem a honra de ter relações. É filha de um cavalheiro de Oliveira de Azeméis, de quem seu pae foi muito amigo.

Faz este projecto porque lhe consta que S. Exa. se encontra em precaria situação, e porque, como já disse, representa o reconhecimento de serviços prestados por seu marido.

O projecto ficou para segunda leitura.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Calvet de Magalhães): — Pedi a palavra para declarar que, pelo Ministerio das Obras Publicas, foram dadas as necessarias providencias para obstar á falta de milho nos mercados portugueses, e foi já hoje publicada no Diario do Governo uma portaria autorizando a importação de 20.000:000 de kilogrammas de milho.

O Sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles):— Tenho a honra de mandar para a mesa as seguintes:

Propostas

Senhores. — Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do Primeiro Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, o Governo pude á Camara dos Senhores Deputados da Nação permissão para que accumulem, querendo, o exercicio das funcções legislativas com as das suas commissões de serviço, os membros da mesma Camara abaixo designados:

Alfredo Candido Garcia Moraes, capitão medico do regimento de infantaria n.° 16.

Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, major do serviço de estado maior em serviço na respectiva direcção geral.

Antonio Augusto Pereira Cardoso, capitão medico, do regimento de engenharia.

Antonio Hintze Ribeiro, tenente de artilharia, adjunto ao serviço de torpedes lixos.

Antonio Rodrigues Ribeiro, coronel do serviço do estado maior, chefe do estado maior na respectiva direcção geral.

Antonio Rodrigues Nogueira, capitão de engenharia, lente da Escola do Exercito.

João Soares Branco, capitão de engenharia, lente da Escola do Exercito e adjunto á Manutenção Militar.

João de Sousa. Tavares, major de infantaria, professor do Real Çollegio Militar.

José de Ascensão Guimarães, capitão de engenharia, em serviço na Inspecção das Fortificações e Obras Militares.

José Gonçalves Pereira dos Santos, tenente-coronel de engenheria, lente da Escola do Exercito.

José Jeronymo Rodrigues Monteiro, tenente-coronel de engenharia, lente da Escola do Exercito e em serviço na Manutenção Militar.

José Joaquim Mendes Leal, capitão de infantaria, lente da Escola do Exercito.

José Maria de Oliveira Simões, major de artilharia, lente da Escola do Exercito.

José Mathias Nunes, coronel de artilharia, commandante de artilharia n.° 1.

Mariano José da Silva Prezado, coronel de cavallaria, defensor officioso no Supremo Conselho de Justiça Militar.

Roberto da Cunha Baptista, segundo capitão de artilharia e do serviço do estado maior, ajudante de campo do Ministro da Guerra.

Paço, em 9 de maio de 1908. = Sebastião Custodio de Sousa Telles.

Senhores. — Conforme o disposto no artigo 3.° do Primeiro Acto Addicional á Carta Constitucional da Monarchia, o Governo de Sua Majestade pede á Camara dos Senhores Deputados da Nação permissão para que o Sr. Deputado Eduardo Valerio Augusto Villaça, engenheiro, lente da Escola do Exercito, accumule, querendo, o exercicio das funcções legislativas com o da sua commissão de serviço.

Paço, em 9 de maio de 1908. = Sebastião Custodio de Sousa Telles.

Foram approvadas.

O Sr. Presidente: — Vae passar-se á ordem do dia. Os Srs. Deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa podem fazê-lo.

O Sr. Claro da Ricca: — Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Tenho a honra de communicar a V. Exa. que desejo interrogar S.. Exa. o Sr. Ministro do Reino sobre os propositos do Governo respectivamente ás reformas, que se impõem, do ensino secundario e
normal do país. = Claro da Ricca.

Mandou-se expedir.

O Sr. Moreira de Almeida: — Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Desejo interrogar os Exmos. Srs. Presidente do Conselho e Ministro da Justiça sobre a revogação da lei de imprensa, de 13 de abril de 1907. = 7. A. Moreira de Almeida.

Mandou-se expedir.

O Sr. Brito Camacho: — Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Declaro que desejo interrogar o Sr. Presidente do Conselho sobre a marcha do inquerito a que se mandou proceder sobre os successos de 5 de abril em Lisboa. = Manuel de Brito Camacho.

Mandou-se expedir.

O Sr. Archer e Silva: — Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio das Obras Publicas, me sejam enviados os seguintes documentos:

1.° Lista da classificação dos engenheiros no concurso aberto em 10 de junho de 1905;

2.° Relatorio do jury;

3.° Lista da classificação dos agronomos no concurso aberto em 8 de fevereiro de 1906;

4.° Relatorio do jury. = Henrique de Mello Archer e Silva.

Mandou-se expedir.

O Sr. Affonso Costa: — Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

Requeiro, pelo Ministerio da Justiça, com toda a urgencia, copia
completa de todo o processo e do relatorio final da syndicancia feita de 6 a 27 de agosto de 1907 ao juiz de direito Sr. Dr. João Bernardo Xavier de Moraes Cabral. = Affonso Costa.

Requeiro, pelo Ministerio das Obras Publicas, com toda a urgencia, copia de todos os documentos, elementos e

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correspondencia relativos á estrada de serviço de Nine á estrada real n.° 4 (districto de Braga), especialmente os referentes ao lanço em construcção do apeadeiro de Gavião á freguesia de Semelhe. = Affonso Costa.

Mandaram-se expedir.

ORDEM DO DIA

Eleição de commissões

O Sr. Presidente: — Vae proceder-se á eleição da commissão de regimento e disciplina. Convido os Srs. Deputados a formularem as suas listas.

Procede-se á chamada.

O Sr. Presidente: — Convido para escrutinadores os Srs. Sousa Tavares e Mendonça David.

Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna 61 listas, sendo eleitos por igual numero de votos os Srs:

Antonio Rodrigues Costa da Silveira.
Augusto de Castro Sampaio Côrte Real.
Augusto Cesar Claro da Ricca.
Conde de Castro e Solla.
Henrique de Mello Archer e Silva.
José da Ascensão Guimarães.
José Cabral Correia do Amaral.
José Joaquim Mendes Leal.
José Paulo Monteiro Cancella.

O Sr. Presidente: — Vae proceder-se á eleição simultanea das commissões de agricultura e administrativa. Convido os Srs. Deputados a formularem as suas listas.

Procede-se á chamada.

O Sr. Presidente: — Convido para escrutinadores os Srs. José Osorio da Gama e Castro e José dos Santos Pereira Jardim.

Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna 56 listas, sendo eleitos, com igual numero de votos, para a commissão administrativa, os Srs:

Augusto de Castro Sampaio Côrte Real.
Mariano José da Silva Prezado.
João do Sousa Tavares.

Para a commissão de agricultura sairam eleitos, tambem com 56 votos, os Srs.:

Alfredo Carlos Lecoq.
Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho.
Conde de Paçô-Vieira.
Francisco Miranda da Costa Lobo.
João Soares Branco.
José Maria Pereira de Lima.
D. Luis Filippe de Castro.
Luis da Gama.
Visconde de Coruche.
Francisco Limpo de Lacerda Ravasco.
José Jeronymo Rodrigues Monteiro.

(Pausa.)

O Sr. Presidente: — Não ha numero sufficiente para poder continuar a sessão.

Na segunda-feira ha sessão, á hora regimental. A ordem do dia é: eleição de commissões.

Está encerrrada a sessão.

Eram 4 horas e 40 minutos da tarde.

O REDACTOR = Luis de Moraes Carvalho.

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