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em uma materia que já está decidida, e a respeito da qual he desnecessarianova decisão.
O Sr. Margiochi:- Eu creio que se deve seguir esta idea do Sr. Possanha: se nós admitimos declarações a Constituição damos com a Constituição em terra; os mesmos que a fizerão a interpretarão autenticamente. Por ventura qual he a duvida; não está claramente decidido na acta o sentido daquellas palavras? Não he este conhecido pela Nação, sanccionado por nós mesmos, e approvado pelo Congresso? Para que pois estas declarações? Se vamos a duvidar de cousas tão claras, então pouco durará a Constituição, então vamos a fazer outra: fazendo essas declarações quer dizer que estamos autorizados para fazer outra Constituição, ou renovar o extenso trabalho que se fez. De maneira, que a primeira cousa he ver se este principio tem lugar quando há um artigo da Constituição claramente entendido por uma acta approvada pelas Cortes Constituintes, se outras Cortes hão de entrar na duvida desse mesmo artigo da Constituição!
O Sr. Presidente:- Tres opiniões se tem manifestado a este respeito: que se deve ler com urgencia a indicação de que se trata: que se deve reservar para Segunda leitura: e que, não considerando-se incursa em nenhum processo legal, deve dar-se para ordem do dia de á manhã. Assim irei propondo por sua ordem. Os que forem de opinião que a indicação tenha já Segunda leitura, declarando-se urgente, levantão-se. Resolveu-se que não.
Os que sejão de opinião que deve Ter Segunda leitura, queirão levantar-se. Decidiu-se que sim, e o mesmo Sr. Presidente disse: fica pois prejudicada a terceira opinião.
O Sr. Prior da Messejuna leu uma indicação requerendo, que se diga ao Governo, que mande para o Campo de Ourique um regimento de infanteria, ou batalhão de caçadores, a fim de ministrar braços a agricultura, que ali muito soffre por falta delles: a qual ficou para Segunda leitura.
Propoz o Sr. Presidente que a ultima meia hora das sessões das segundas, quartas, e sextas feiras, seria destinada para a leitura das indicações, e sendo chegado o fim da sessão deu para a ordem do dia a leitura dos projectos, que os Srs. Deputados quizessem offerecer; e levantou a sessão depois das duas horas.- Basilio Alberto de Sousa Pinto, Deputado Secretario.
SESSÃO DE 4 DE DEZEMBRO.
Aberta a sessão, sob a presidencia do Sr. Moura, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando
1.º Por officio do Ministro dos negocios do Reino, dirigido á Deputação permanente em data de 30 de Novembro, e incluindo outro officio da junta provisória do governo do Pará. Passou á Commissão do Ultramar.
2.º Um officio do Ministro da fazenda, concebido nestes termos: Illustrissimo e Excellentissimo Senhor.- Exigindo os Secretarios dos governos, que vão para o Ultramar, gratificações e adiantamentos de ordenados; e não podendo o Governo conceder-lhos por não estarem expressamente comprehendidos no § 4.º da lei de 28 de Julho de 1821, e decreto de 12 de Julho ultimo, por isso que não tem patentes militares, não obstante a identidade de razão, com que argumentão, de se concederem aos governadores; tenho a honra de rogar a V. Exca. Queira Ter a bondade de o levar ao conhecimento das Cortes para resolver o que houverem por bem. Rogo porém a V. Exca. Me permitta accrescentar o quanto he urgente a decisão deste negocio, para o Governo poder deferir aos requerimentos dos Secretarios, que estão a sair para a África.
Deus guarde a V. Exca. Palacio de queluz em 3 de Dezembro de 1822.- Illustrissimo e Excellentissimo Sr. João Baptista Felgueiras.- Sebastião José de Carvalho.
Passou á Commissão de fazenda com urgencia.
3.º Uma carta do Sr. Deputado Manoel Zejyrino dos Santos, participando não Ter comparecido por falta de saude, mas que julgava que dentro em tres dias estaria em estado de poder apresentar-se. Ficarão as Contas inteiradas.
4.º Uma participação que fez o Sr. Deputado Trigoso, de que tendo por molestia deixado no dia antecedente o Congresso, antes de finalisar a sessão, julgava se acharia impossibilidade de comparecer naquelle dia, e talvez ainda no seguinte. Ficarão as Cortes inteiradas.
5.º Uma memoria sobre a reforma, e secularisação dos regulares, que offereceu o Sr. Deputado Galvão Palma, para ser distribuida pelo Congresso, o que assim se verificou.
6.º Uma carta do Sr. Deputado Borges de Barros, participando achar-se doente, e pedindo licença para tratar da sua saude. Ficarão as Cortes inteiradas, e reservarão para a Commissão respectiva a parte relativa á licença.
7.º Uma carta de Antonio Julio de Frias, Deputado substituto pela divisão eleitoral de Trancoso, participando que brevissimamente se apresentaria ao Congresso. Ficarão as Cortes inteiradas.
Mencionou mais o mesmo Sr. Secretario uma felicitação que dirigia ao soberano Congresso o cidadão, José Januario Collaço, consul da Nação portuguesa em Tanger, pelo motivo de se Ter concluido a Constituição, a qual foi tambem ouvido com agrado.- Outra felicitação que pelo mesmo motivo fizerão os cidadãos, Jorge José Collaço, e António Cornelio Collaço, a qual teve igual consideração.- Outra felicitação do cidadão Francisco de Madureira Pará, dando parte de haver estabelecido uma officina typografica no Pará, e de haver feito sobre aquella provincia duas memorias que offerecia ao Congres-
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So: recebeu-se com agrado a felicitação, e se mandarão distribuir os exemplares das memorias.- Outra felicitação, que pela conclusão da Constituição, faz a camara constitucional da villa de Barqueiros, protestando a sua adhesão, e a do povo daquelle concelho, ao systema constitucional, e mencinando o muito que o paroco daquella freguezia se tem esforçado em fazer ver ao povo os beneficios que da nossa Constituição lhe resultão: mandou-se fazer menção honrosa da felicitação.- Outra felicitação do juiz de fora da villa de Mourão, por motivo da instalação das Cortes ordinarias: foi ouvida com agrado.
Mandou-se remetter á Commissão de petições uma representação do mesmo juiz de fora, na qual expõe que ficando reduzido a quazi nenhum rendimento pela creação das novas camaras, não pode subsistir com o que lhe resta; e pede que do abundante celeiro publico daquella villa lhe mande o Governo dar uma ajuda de custo com que possa manter-se, com a dignidade que lhe corresponde.
Ouviu-se com agrado, e se mandou remetter ao Governo para o fazer verificar, o offerecimento que fez António Faustino de Andrade, da 3ª. Parte do importe dos medicamentos que fornece aos hospitaes dos regimentos 3.º de infantaria, 4.º de artilharia, e 11.º de caçadores.
Feita a chamada, acharão-se presente 105 Deputados, faltando com causa os Srs. Bastos, Borges de Barros, Branco, Trigoso, Zefyrino dos Santos; e sem ella os Srs. Aguiar Pires, Assis Barbosa, Moniz Tavares, Villela, Ferreira da Silva, Lyra, Fernandes Pinheiro, Alencar, Martins, Filippe Gonsalves, Frauzini, Vergueiro, Araujo Lima, e Rivaleira.
Antes de passar-se á ordem do dia, disse o Sr. Palo Moniz que desejava se tratasse, com preferencia a qualquer outro objecto, de um projecto sobre a administração da fazenda, apresentado pelo Sr. Rebello da Silva a uma das ultimas sessões das Cortes Constituintes.
O Sr. Freire:- He preciso saber que este projecto he importantissimo: elle consta de duzentos e tantos ou trezentos artigos, e de certo que ninguém sem o ler, e examinar, poderá adoptalo como seu, e seja capaz de o sustentar, apezar dos bem sabidos conhecimentos de seu illustre autor. Por tanto se alguém o quer adoptar como seu, e unir-se á Commissão, o projecto pode Ter 1.ª leitura desde já: o projecto, torno a dizer, he muito bem, mas he um arranjamento geral de fazenda, e isto exige muita circunspeção, e exame da parte de todos os membros da Commissão, os quaes assim mesmo o apresentarão em poucos dias.
O Sr. Presidente:- Devo lembrar ao Congresso que aquelle projecto já está destinado a uma Commissão. Eu lhe darei a ella a palavra quando convier.
Passando-se á ordem do dia leu o Sr. Borges Carneiro um projecto de decreto para a extincção do desembargo do paço, que ficou para Segunda leitura.
O Sr. Lopes da Cunha leu uma indicação para se por em vigor a lei de 9 de Setembro de 1769, e se declarar que ninguém seja obrigado a rejeitar ou mostrar cumprido o encargo de missas ou outro onus pio imposto sobre fundos de raiz. Ficou para Segunda leitura.
O Sr. Sá, tendo obtido a palavra, disse:- Na sessão de Segunda feira apresentou-se uma moção sobre fazenda, e responsabilidade de ministros, porque estão em contacto com a mesma Nação; porém não sei porque fatalidade, dando-se a primazia a estes objectos, não se há de Ter falado em outro que he da mesma urgencia, e he o da instrucção publica. Está determinado em um artigo da Constituição que dentro de um certo tempo os cidadãos que não souberem ler e escrever não terão voto, e deveremos demorar-lhe a instrucção? Esta he o único alimento da razão; e he necessario dar-se á Nação portugueza dotada felizmente de qualidades as mais aptas para o receber. Quando pois se não dê a este ponto a primazia, requeiro que entre a par com aquelles dois objectos. Lembro-me de que diz Platão, que a virtude he o único apoio da Nação, e virtude não se adquire sem a instrucção publica. He necessario que cada um dos cidadãos conheça que deveres, e que obrigações tem; porque a falta deste conhecimento produz males incalculaveis, procurando cada um aumentar o numero de seus direitos, e diminuir o de suas obrigações. E quem pode dar este conhecimento a não ser a instrucção publica? Em consequencia eu passo a ler a indicação que trago por escrito. Confesso que não he um projecto completo de instrucção publica: mas eu desejo que sirva de despertar-nos a lançar mão de objecto de tanta importancia. Advirto que não deve parecer estranho que eu fale em cousas que não são da minha immediata profissão. Li alguns compendios, e consultei homens de toda a confiança em taes materias. Passo a ler.
Leu o mesmo Sr. Deputado o projecto mencionado, o qual ficou para 2.ª leitura.
O Sr. Girão leu um projecto de lei para regulamento das provas de vinho do Douro.
Terminada a leitura, disse o mesmo illustre Deputado: Este projecto he muito urgente: os lavradores do Douro o desejão, a mesma companhia pede a sua pronta resolução. Eu peço por tanto a maior brevidade, porque então ainda terá effeito este anno. Os provadores actuaes, não digo que abasão, mas podem abusar se quizerem, porque só tem a lei do arbitrio para se regularem.
O Sr. Bernardo da Silveira:- Peço que este projecto se declare urgente.
O Sr. Possanha:- O projecto sobre as provas dos vinhos do Douro não admitte demora: he um desenvolvimento do § 7 da lei da reforma da companhia, e o objecto talvez mais importante dessa lei, porque vai tolher pela raiz a arbitrariedade dos provadores que punha á mercê de dois homens a fortuna de todos os proprietarios do alto Douro. O tempo das provas está chegado: a uma palavra, esta materia não admite demora.
O Sr. Annes de Carvalho:- Reconheço que he muito urgente admitir á discussão o projecto que apresentou o Sr. Girão, porém assento que ainda que se ponha á discussão de nenhum modo se pode satisfazer ao que pertende o seu autor. He em Janei-
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ro que se fazem as provas do vinho; vamos ver agora se he possivel fazer a lei até o meado de Janeiro. He necessario que ella se discuta, depois de discutida he preciso que se proponha á sancção regia. Para isto he necessario um mez. Por mais que se apresse esta discussão não pode estar concluida a lei senão para o fim de Fevereiro, e como a feira há de Ter lugar no fim de Janeiro não pode servir para este anno. Logo sou de parecer que não se considere urgente por isso que se não pode por em execução.
O Sr. Girão:- O illustre Preopinante que acabou de falar diz que he necessario um mez para se obter a sancção regia: a ser assim tinha muita razão; mas he muito provavel que não leve um mez: e ainda mesmo que a lei não servisse para este anno, servia ao menos de consolação aos lavradores o saber que ella estava feita, e que lhes poderia aproveitar para os annos futuros.
O Sr. José de Sá:- Levanto-me para apoiar o parecer do illustre membro que acabou de falar. Nós devemos declarar este projecto urgente, por isso que elle he do interesse publico. Lembrar-mo-nos de dificuldades que pode haver, não he razão attendivel. Não devemos deixar de pôr em pratica aquillo que faz o bem publico, até mesmo porque eu confio em que ElRei não deixará de dar o seu beneplacito a uma cousa que tanto interessa os povos. O perigo da Nação pode ser interno, ou externo creio que he um dos perigos da Nação não terem os povos que comer. E se nós vamos fazer a felicidade de muitas familias com esta lei, não devemos deixar de o fazer quanto antes, e se isto se não pode fazer com sessões ordinarias, façasse com sessões extraordinarias. As sinto por tanto que se deve declarar urgente o projecto.
O Sr. Borges Carneiro:- Eu pedi a palavra somente para responder á objecção feita pelo Sr. Annes de Carvalho, que tem facil resposta: o artigo 111 da Constituição, o qual autoriza as Cortes para nos casos de leis provisorias feitas em consequencia de serem os casos urgentes poderem assignar um prazo breve dentro do qual o Rei haja de sanccionar a lei: o que parece dever entender-se, quando assim se julgue necessario, pois no estado de união que agora felizmente subsiste entre o poder legislativo e executivo, e em que a vontade do Rei he que logo se execute tudo o que o bom da Nação exige, talvez seja desnecessario tratar de fixar prazo algum para a sancção. Ora que o caso seja urgente, se evidencia pela simples consideração de se deverem fazer as feiras dos vinhos a 2 de Fevereiro seguinte conforme a lei, e depender a fortuna de tantas familias do Alto Douro de se regular o melhodo das provas, de modo que o genero fique tendo o preço que merecer. Por tanto ainda que serei de opinião contraria á declaração de urgencia, sempre que não haja um fortissimo motivo, a fim de não se alterarem as regras geraes, com tudo agora e julgo haver, nem se deve confundir caso urgente com perigo da patria: aquelle tem uma significação muito mais ampla.
O Sr. Seixas:- Digo que o objecto ou he util ou não he util, se he util como está demonstrado, não devemos adoptar nada que nos afaste deste mal; nós temos dois meios optimos para a pronta decisão; primeiro um Monarca tão constitucional como he e bem fazejo, que não deixará de dar em poucos dias a sua sancção; e o segundo porque temos este artigo III que determina o que se deve fazer nestas circunstancias. Consequentemente temos dois recursos a tomar; e por isso não devemos hesitar em fazer um beneficio a uma grande parte da Nação.
O Sr. Bettencourt:- Voto pela urgencia deste negocio por ser consequencia de uma lei já feita. Esta lei da reforma da companhia he sem duvida uma das que mais dependem os interesses dos povos. Isto de companhia tem sido um objecto que nos tem levado muito tempo, e muitas duvidas; daqui se prova a importancia desta materia. Esta parte das provas he muito essencial para o seguimento dessa lei; negocios de muita transcendencia fizerão com que se não decidisse na legislatura passada; por consequencia parece que nesta se deve tratar della com urgencia. Este projecto foi combinado com todos os homens intelligentes do Douro. Eu estou bem certo que he daquelles que há de levar muito pouco tempo a passar. Está feito a contento de todos os experientes; e por conseguinte voto pela sua urgencia.
O Sr. Serpa Machado:- Eu não duvido da importancia da materia; mas daqui mesmo (...) uma opinião contraria á dos Preopinantes. Foi isso mesmo que elle he de muita ponderação deve tratar-se com muita madureza; até mesmo porque segundo o que acabo de ouvir, o projecto da Commissão não he tão claro como o querem fazer; elle deve seguir os meios ordinarios dos mais projectos; e até mesmo porque a experiencia das Cortes Constituintes me tem feito vêr que a celeridade com que se decidirão certas cousas fizerão com que ellas na pratica não tivessem o effeito que se desejava. He por isso que eu quero que antes se gaste mais tempo com esta lei, e se faça para servir daqui a um anno; mas que seja boa. Voto por tanto contra a urgencia.
O Sr. Pinto da França:- Pelos mesmos principios do honrado membro que acaba de falar he que eu voto pela urgencia; diz elle que o negocio ou a materia he muito importante; mas importante a individuos que correm o risco de soffrer os effeitos do suborno, e da arbitrariedade, e importante por isso mesmo a esta augusta assemblea, que pela sabedoria, e providencia da legislação deve evitar um tal risco; este perigo está proximo, o espaço de dous mezes medeia apenas; a providencia que se der por meio da lei tem transitos que absorvem alguns dias. Por tanto a importancia do negocio, e o não poder ser elle espaçado o tornão assás urgente.
O Sr. Barreto Feio:- Se nós admittissemos os principios que acabou de expender o Sr. Serpa, deveriamos dissolver as Cortes, e ir cada um para sua casa; porque sendo todas as materias que se discutem, susceptiveis de serem bem, ou mal decididas, e não podendo nós dar jamais uma decisão que possa dizer ser perfeitamente boa, deveriamos estar sempre em uma perfeita inacção, e não determinar cousa alguma. Este objecto não he complicado como parece ao
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illustre membro, antes he simplicissimo. Trata-se de provas de vinhos, isto he, trata-se de saber se o vinho he bom ou não; e isto não se pôde saber se não por meio do paladar, ou por meio de alguma operação de chymica; mas a operação de que se trata he a do paladar, para a qual todo o homem he apto, e nenhumas regras temos a dar a este respeito. Só temos a providenciar sobre o modo de evitar o suborno, e o modo melhor he aquelle que possa constituir os provadores na maior impossibilidade de conhecerem os donos dos vinhos, para que não possão deixar-se corromper. Ora o methodo que propõe o illustre autor do projecto parece-me que preenche plenamente o fim a que se propõe. E sendo este negocio de grande urgencia, e o projecto tão simples que quasi não admitte discussão, o meu voto he que elle he urgente, e que se deve admittir já á discussão.
O Sr. Derramado:- Está já mostrada a possibilidade de se dar esta medida ainda para este anno, e de mais a medida he boa, e sendo expedida a tempo muito se ganha com ella, e se não vai a tempo não se perde; e eu sempre apoiarei a urgencia com medidas relativas ao melhoramento da nossa agricultura, porque nesta base se apoia a força, e independencia do Estado.
O Sr. Castello Branco:- Eu não tenho receio algum de expender as minhas ideias quando ellas são ainda mesmo contrarias aos pareceres dos honrados membros que me precedem a falar. A meu ver há um engano, há uma especie de preocupação quando se quer alterar as formas sabiamente estabelecidas na Constituição. Trata-se de um projecto de decreto cuja utilidade he bem conhecida, mas isto he uma utilidade particular e não utilidade geral. Eu bem vejo que o bem geral se compõe de muitas differentes porções do bem particular e que quando os particulares não estão bem a nação não o pode estar tambem; mas do que se trata agora he de um objecto particular e para o qual se pretende apropriar um artigo da Constituição; o artigo da Constituição he o artigo 107 que diz (leu). Eu entendo que este artigo não deve ser applicado se não áquelles cazos em que se trata do bem publico da patria, quando ella se acha em perigo, que he de uma tal natureza que o não se tratar delle traria logo o perigo e a queda da patria, a queda da sociedade. He para este caso que eu applico esta parte da Constituição, se nós a podessemos extender a cazos particulares eu não deixaria de dizer que era um laço que nós tinhamos armado na Constituição. A nação portugueza deve toda entender que a sua felicidade depende da fiel observancia deste codigo sagrado, e que nós o devemos entender como convem a utilidade publica; que perigo há em que se não possão já remediar os abusos que se praticão nas provas do vinho do Douro? Por ventura resultaria desta medida prompla um bem geral? Demais o não ser approvado todo o vinho isso mesmo convem porque o approvado todo para o comercio estrangeiro iria fazer baratejo quando mesmo he preciso que essa companhia faça por assim dizer uma especie de escacez para sustentar o preço desse mesmo genero; já se ve que o vinho por ser reprovado não diminui de qualidade; o vinho existe tal qual elle está; o que he bom existe como bom, e sempre se há de vender. Nisto há o prejuizo de alguns particulares que são obrigados a vender o seu vinho por um preço menor; isto he um pequeno prejuizo e só este anno, e até mesmo não he provavel que agora que ella está proxima a soffrer uma reforma, se a balize a commetter os mesmos despotismos que antes commettia.
O Sr. José Liberato:- Eu apoio a urgencia, principalmente pelas razões que deu o Sr. Borges Carneiro. Este negocio ainda que seja particular, vai com tudo interessar a uma grande parte da Nação, como são todas aquellas pessoas que se empregão na agricultura. Não pode haver um bem particular, e individual sem estar estabelecido o bem publico; por consequencia approvo a urgencia. Não sou de opinião que nós vamos por este modo violar a Constituição; porque, quem he que declara a urgencia? Diz a Constituição que são as duas terças partes dos membros do Congresso. Feito isto está declarada a urgencia; se pois isto assim se fizer neste soberano Congresso, esta declarada a urgencia, e não se viola a Constituição. Por estas razões não apoio, nem jamais apoiarei o que disse o illustre Preopinante que acabou de falar; pois que de modo nenhum vamos violar a Constituição.
Declarada a materia sufficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente se o projecto se devia declarar urgente:- e vincou-se que sim por 66 votos contra 31, achando-se presentes 37 Srs. Deputados. Em consequencia do que, fez-se logo segunda leitura do projecto, e se mandou imprimir para entrar em discussão.
Fez-se a primeira leitura dos seguintes projectos de decretos, offerecidos pela Commissão das Commissões; 1.º para a extincção do conselho da fazenda; 2.º sobre o registo de hypothecas; 3.º para a extincção da mesa da consciencia e ordens. Ficarão todos para Segunda leitura.
O Sr. Silva Carvalho, por parte da Commissão dos poderes, leu o seguinte
Parecer.
Parecer á Commissão que o diploma do Deputado subsistuto pela divisão eleitoral de Vizeu, João Victorino de Sousa e Albuquerque esta legal, e conforme com a respectiva acta, que pelo presidente da junta da referida divisão foi enviada á Deputação permanente.
Paço dos Cortes 4 de Dezembro de 1822.- João da Silva Carvalho, Roque Ribeiro de Abranches Castello Branco, Francisco Rebello Leitão Castello Branco, Rodrigo de Sousa Castello Branco.
Sendo approvado, foi introduzido na sala o sobredito Sr. Deputado, e depois de prestar o juramento tomou assento ao Congresso.
O Sr. Secretario Felgueiras leu um officio que acabava de receber do Ministro dos negocios do Reino, concebido nos termos seguintes:
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor.- ElRei manda participar ás Cortes ordinarias da Nação, que havendo recusado a Rainha prestar o juramento á
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Constituição politica da Monarquia, a que era obrigada na conformidade da lei, Sua Magestade, ouvido o Conselho de Estado, ordenou que os ministros tomassem as medidas convenientes para a exacta observancia da mesma lei. Como porém a Rainha representasse que no rigor da presente estação, segundo o estado actual da sua saude, não podia emprehender a jornada para fora do Reino sem que a sua vida corresse perigo; Sua Magestade, tendo ouvido o parecer dos médicos, que declararão ser bem fundado este receio, mandou que se differisse o cumprimento da lei na parte que diz respeito a sair do território portuguez, em quanto durar a impossibilidade de assim se cumprir.
Todo o processo deste negocio consta do incluso relatorio que Sua Magestade manda remetter ao soberano Congresso, para seu inteiro conhecimento.
Deus guarde a V. Exca. Palacio da Bemposta 4 de Dezembro de 1822.- Filippe Ferreira d´Araujo e Castro.- Sr. João Baptista Felgueiras.
Relatorio sobre a deliberação negalica da Rainha Fidelissima á prestação do juramento á Constituição politica da Monarquia portugueza, desde 3 de Novembro até 4 de Dezembro de 1822 inclusive.
Constando a ElRei que no dia 3 de Novembro, marcado pela lei para o solemne juramento dos funccionarios publicos, e possuidores dos bens nacionaes, antigamente denominados da coroa, a Rainha havia recusado dar procuração; e estando já proximo a findar o prazo de um mez concedido na mesma lei; julgou Sua Magestade que devia á sua augusta Esposa a communicação do que determinava a lei, para que por falta de conhecimento della não incorresse na sua sancção, e ordenou que tres dos seus ministros no dia 22 de Novembro lhe fizessem conhecer aquella disposisação.
Foi assim executado pelos ministros, mediante a nota verbal (documento n.º 1) a qual contestou a Rainha, dizendo que não jurava, porque uma vez havia dito que não; que bem conhecia a lei, e a tudo estava disposta (documento n.º 2).
Considerando ElRei a necessidade em que estava o Governo, de applicar á Rainha a positiva e terminante sancção da lei, e desejando conciliar a exacta observancia della com o decóro e considerações devidas a pessoa de sua augusta Esposa, mandou ouvir o Conselho de Estado (documento n.º 3).
E porque, segundo o teor da lei, recusando a Rainha jurar, devia perder os direitos inherentes á qualidade de cidadão, e sair immediatamente do territorio portuguez, o que tinha de verificar-se no dia 4 de Dezembro, pois que no dia 3 expirava o prazo assegurado pela lei, cumpria que a Rainha declarasse o paiz onde se dirigia, para que ElRei sem retardar a execução da lei, podesse praticar as attenções que assim me devia como seu augusto Esposo. Neste sentido se escreveu á Rainha a carta n.º 4, a que respondeu e como se vê em n.º 3, gratificando a recusação e prestar o juramento, e indicando o porto de Cadiz ao mesmo tempo representando que o estado da sua saude lhe não permittia emprehender a jornada sem correr perigo de vida.
Sobre a primeira, e Segunda resposta da Rainha, opinou a maioria do conselho de Estado na presença de Sua Magestade que não era claro o sentido da lei, nem ella podia ser applicada senão pelo poder judiciario; e que em ambos estes pontos de vista deveria recorrer-se ás Cortes (Documentos n.º 6.º, e letra C).
Como porém não era duvidoso que a Rainha, por ser chamada o presidir á Regencia no caso do artigo 149 da Constituição, e pela qualidade de possuidora de bens nacionaes, era obrigada a jurar; e por outra parte não se tratava da applicação de pena a facto illicito, mas sim das consequencias naturaes do acto livre de não adherir a Rainha ao pacto social, entendeu o Governo dever prosseguir ao cumprimento da lei, mandando proceder a todos os preparativos necessarios para a saida da Rainha por via de mar, logo que terminasse o prazo da lei (Documento numeros 7, 8, 9, 10, 11, 12, e letras A e B).
Entretanto não sendo licito desattender a representação do imminente perigo de vida, com que a Rainha allegava, se fosse obrigada a fazer jornada no rigor da presente estação, julgou o Governo conforme a direito ouvir o parecer dos facultativos, como arbitros legaes em similhante materia (Portaria n.º 13). Como em uma conferencia de dez medicos, assim effectivos como honorarios, da Iteal Camara, se acordasse que a Rainha no seu actual estado de saude corria imminente perigo de vida se intentasse viagem, ou jornada na presente estação, tornava-se forçoso differir nesta parte a execução da lei, para Ter seu cumprimento logo que sem imminente perigo se possa pôr a caminho por via de mar, ou por terra. (Documentos numeros 14 e 15).
Havendo pois expirado ontem o prazo da lei sem que a Rainha prestasse o devido juramento (Documento n.º 16) tem ElRei declarado por decreto da data de hoje haver ella perdido todos os direitos civis, e politicos, inherentes tanto á qualidade de cidadão, como á dignidade de Rainha; e que outro sim deverá sair immediatamente do territorio portuguez, (Decreto 1.º).
Mas como pela acima referida allegação dos facultativos era impossivel fazer effectiva a immediata saida sem imminente perigo de vida, houve por bem Sua Magestade suspender nesta parte somente a execução da lei, para Ter o seu cumprimento logo que cesse o mencionado perigo, como consta do 2.º decreto da mesma data.
De que tudo mandou Sua Magestade se fizesse participação às Cortes Ordinarias, com a copia dos respectivos documentos, para seu devido conhecimento.
Palacio da Bemposta em 4 de Dezembro de 1822.- Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
1.º
Nota verbal á Rainha.
Senhora - Estando proximo a findar o prazo marcado pela lei de 11 de Outubro proximo passado
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ás pessoas obrigadas a jurar a Constituição politica da Monarquia, que ElRei jurou solemnemente; e não tendo Vossa Magestade ainda prestado o juramento, como cumpria; ElRei nos manda á presença de Vossa Magestade para fazermos saber mui respeitosamente que no caso não esperado de Vossa Magestade não querer jurar até o dia 3 de Dezembro proximo seguinte, como a lei determina, ElRei, e os seus ministros se acharão na dura necessidade de pôr em execução a referida lei, que faz perder a qualidade de cidadão, e sair immediatamente do reino a todo aquelle, que, sendo obrigado a jurar a Constituição politica da Monarquia, recusar cumprir tão religioso dever. Os ministros encarregados por Sua Magestade desta mensagem deixão á sublime consideração de Vossa Magestade calcular os inconvenientes, que resultarião para Vossa Magestade no caso que Vossa Magestade
recusasse cumprir com tão religioso dever. Palacio de Queluz 22 de Novembro de 1822.- Filippe Ferreira de Araujo e Castro, Ministro e secretario de Estado dos negocios do Reino; Silvestre Pinheiro Ferreira, Ministro e secretario de Estado dos negocios estrangeiros; Ignacio da Costa Quintella, Ministro e secretario de Estado dos negocios da marinha.
N.º 2.º
Sua Magestade a Rainha Fidelissima disse em resposta.
" Que já havia mandado dizer a ElRei que não jurava; que tinha assentado de nunca jurar em sua vida nem em bem, nem em mal, o que não era nem por soberba, nem por odio ás Cortes, mas sim porque assim uma vez o tinha dito; pois uma pessoa de bem não se retractava; e por ser uma pessoa doente; que bem sabia a lei, e conhecia a pena que ella impunha; e que estava disposta para isso."
N.º 3.º
Portaria ao Conselho de Estado.
Manda ElRei pela Secretaria de Estado dos negocios do Reino remetter ao Conselho de Estado a intimação, que mandara fazer a S. M. a Rainha Fidelissima sobre a prestação do juramento á Constituição politica da Monarquia, a que era obrigada; bem como a resposta negativa por ella dada sobre este assunto, a fim de que o Conselho, na sessão de 29 do corrente, em que ElRei será presente, interponha o seu parecer sobre o modo de conciliar-se a execução da lei com as considerações devidas a alta jerarquia, e mais circunstancias da Pessoa. Palacio da Bemposta 22 de Novembro de 1822.- Filippe Ferreira d´Araujo e Castro.
N.º 4.º
Carta á Rainha.
Senhora.- Tendo Vossa Magestade declarado formalmente aos Ministros de Estado que não jurava a Constituição Politica da Monarquia, não obstante o conhecimento que tinha da disposição da lei de 11 de Outubro do corrente anno, e sua sancção; e sendo o Governo obrigado a fazela executar; manda ElRei declarar a Vossa Magestade, que terminado no dia 3 de Dezembro proximo seguinte o espaço marcado para a prestação daquelle juramento, e recusando Vossa Magestade até então cumprir aquelle religioso dever, he forçoso nesse caso sair immediatamente do Reino; e desejando ElRei praticar com Vossa Magestade todas as considerações devidas á Augusta Pessoa de Vossa Magestade, cumpre que Vossa Magestade indique o paiz extrangeiro aonde se destina, para que fazendo-se as convenientes disposições, a lei tenha a sua devida disposição no dia 4 do referido mez impreterivelmente. Palacio do Alfeite em 27 de Novembro de 1822.- Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
(A) Manda ElRei pela Secretaria de Estado dos negocios do Reino que o Ministro e Secretario de Estado dos negocios da marinha retenha, e faça preparar a fragata que lhe parecer mais conveniente para a conducção da Augusta Pessoa de S. M. a Rainha, por tempo e destino indeterminado, visto que se depende ainda para a ultima resolução, da resposta de S. M. e parecer do Conselho de Estado. Palacio do Alfeite em 27 de Novembro de 1822.- Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
N.º 5.º
Resposta da Rainha.
Ontem pelas dez horas da noite recebi por mão do marquez de Vallada a intimação que Filippe Ferreira me fez da parte de ElRei, á qual devo responder o seguinte:
1.º Que eu já fiz a minha solemne, e formal declaração que não jurava; e agora torno a ratificala.
2.º Que estou pronta a executar o que ElRei me manda em virtude da lei; porém sou obrigada a representar que eu sou muito doente, como todos sabem e ainda mais do que se pensa, e he de direito natural a conservação da vida. Estou bem certa que ElRei, nem o Governo, não hão de querer que eu vá morrer por esses caminhos, pois estamos no rigor do Inverno, e não me attrevo a emprehender a jornada sem passar a força delle; e para mostrar a todos que eu não entro absolutamente em cousa nenhuma, estou pronta para me retirar para a minha Quinta do Ramalhão com as minhas duas filhas (as quaes sempre hão de ser inseparaveis de mim) até que o tempo permitta principiar a minha jornada para fora do Reino.
3.º A minha intenção he ir para Cadiz por mar, por ser assim mais suave, attendendo á falta de saude e de forças, que tenho. Palacio de Queluz em 28 de Novembro de 1822.- Rainha.
N.º 6.º
Parecer do Conselho de Estado.
No anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus
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Christo mil oitocentos e vinte e dois, aos vinte e nove dias do mez de Novembro, o Conselho de Estado, presidido por Sua Magestade no Palácio do Alfeite, deliberou sobre o modo de conciliar em quanto a Sua Magestade a Rainha Fidelissima, a execução do artigo 12 da lei 236, com as considerações devidas á Alta Jerarquia, e mais circunstancias da sua Real Pessoa; conseguintemente pareceu á pluralidade do Conselho que, sendo distinctoz pela Constituição os tres poderes, sem que qualquer delles possa exercer as attribuições do outro; e pertencendo pela mesma Constituição ao poder judiciario a faculdade de julgar, applicando a lei aos factos particulares, deve ser o caso submettido a um processo regular, logo depois do dia 3 de Dezembro, para ser decidido por sentença, que passando em julgado se execute; parecendo mais á mesma pluralidade, que para se designar o juizo, aonde se deverá tratar este gravissimo negocio, e para se proporcionarem ao Governo os meios necessarios para as despezas indispensaveis da execução; e assim tambem para se tomar em consideração a actual estado da saude da Rainha Fifelissima (que lhe não permitte immediata saída do territorio portuguez), visto acharem-se reunidas, e em exercicio as Cortes Geraes, deve ser levado ao seu conhecimento, para decidirem o que convier. Os Conselheiros Moura, e Braamcamp não concordão na remessa deste negocio ao poder judiciario; porque sendo a lei clara, não póde tergiversar a sua litteral disposição; e o Governo só tem a executar o que ella determina; não tendo lugar a intervenção do referido poder, porque não há delicto, e há tão somente o facto de não querer adherir ao novo pacto social, que faz perder a qualidade de cidadão portuguez; convém todavia com os outros conselheiros pelo tocante á remessa ao corpo legislativo, por o único motivo de molestia, que dá a Rainha Fidelissima para espaçar a saída do territorio, affirmando que periguria até a sua vida; circunstancia ponderosa que parece merecer a consideração das Cortes, a quem compete modificar a lei. A todo o Conselho parece que deve ser livre a Sua Magestade a escolha do lugar da sua ulterior residencia; mas que não he permissivel que leve consigo alguma das Senhoras Infantas. Palacio do Alfeite 29 de Novembro de 1822.- Conde de Sampayo; Conde de Penafiel; Freire; Dantas; Cunha; Oliveira; Braamcamp; Moura.
- V. letra C.
N.º 7.º
Parecer dos Ministros.
A minha opinião he que Sua Magestade a Rainha deve sair no dia 4 de Dezembro impreterivelmente sem mais consideração alguma, a que não tem direito, perdendo aquelle de Cidadão Portuguez; e em quanto ao lugar, que se lhe deixe a seu arbitro; e ultimamente em quanto a levar as Senhoras Infantas suas filhas, conformo-me com a opinião do Conselho de Estado. Palacio do Alfeite 29 de Novembro de 1822.- José da Silva Carvalho.
Tom. L. Lecislat. II.
N.º 8.º
Certo, como estou, de que Sua Magestade a Rainha não tem molestia aguda, que lhe sobreviesse; e que somente padece aquelles incommodos, que se fossem attendidos, ficaria sem effeito o decreto das Cortes, que lhe he applicavel; em consequencia sou de parecer que o Governo, passado o prazo prescrito na lei, deve dar-lhe uma pronta execução. Pelo que devem dar se as necessarias providencias para que no dia 4 do proximo mez Sua Magestade a Rainha saia fora do territorio portuguez, deixando á escolha della o lugar para onde deve ir. Sou tambem de parecer, que a Sua Alteza as Senhoras Infantas não deve consentir-se acompanhem sua Mãi a Rainha. Palacio do Alfeite em 29 de Novembro de 1822.- Manuel Gonçalves de Miranda.
N.º 9.º
Sou do mesmo parecer, á excepção de que tendo Sua Magestade a Rainha allegado o perigo de vida, se fosse immediatamente obrigada a fazer a jornada, podem as leis da humanidade que se não desattenda a pretenção sem que o estado de saude de Sua Magestade seja declarado por peritos. Palacio do Alfeite em 29 de Novembro de 1822.- Sebastião José de Carvalho.
N.º 10.º
Devendo conciliar-se a exacta observancia da lei com os principios de humanidade e decóro respeitados por toda a Nação civilizada, sou de parecer que se verifique peremptoriamente o facto de estar, ou não Sua Magestade a Rainha no caso de perigar a sua vida; e no caso negativo, isto he não havendo perigo imminente, deve executar-se a lei no dia quatro de Dezembro. Feitas as disposições necessarias, deve participar-se ás Cortes a deliberação do Governo sobre um facto tão interessante; pedindo-se a faculdade necessaria somente quanto á despeza; que he livre á Rinha a escolha do lugar do seu destino; porque o Governo não pode fixalo; e finalmente que a Rainha não tem direito a levar consigo as Senhoras Infantas. Palacio do Alfeite 29 de Novembro de 1822.- Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
N.º 11.º
Conformo-me com este ultimo voto. Mas como Sua Magestade já indicou o porto de Caciz, he meu parecer que da escolha de Sua Magestade se excluão os estados de Hespanha. Alfeite 29 de Novembro de 1822.- Silvestre Pinheiro Ferreira.
N.º 12.º
Conformo-me com o voto da pluralidade do conselho de Estado. Palacio do Alfeite 29 de Novembro de 1822.- Ignacio da Costa Quintella.
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N.º 13.º
Portaria.
Manda ElRei pela secretaria de Estado dos negocios do Reino que o marquez mordomo mór faça convocar os medicos effectivos, e honorarios da real camara, para que no dia de amanhã 30 do corrente, pelas onze horas, visitando a Sua Magestade a Rainha, e examinando o estado actual de sua saude, declarem, se a vida de Sua Magestade corre imminente perigo embarcando para Cadiz, ou marchando por terra para fora do Reino, saindo por por qualquer dos modos com todas as commodidades possiveis; e que os referidos medicos escolhão de entre si aquelle, que deve reduzir os votos a um parecer motivado, e por todos assignado, o qual deverá ser remettido immediatamente á mesma secretaria de Estado. Palacio de Alfeite em 29 de Novembro de 1822.- Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
N.º 14.º
Carta á Rainha.
Senhora - Sendo presente a ElRei a resposta de Vossa Magestade de 28 do corrente á intimação, que lhe fora feita por ordem do mesmo Senhor em virtude da lei, dizendo Vossa Magestade que ratificava a sua solemne e formal resposta de que não jurava a Constituição, e que estava pronta a executar a ordem de ElRei; que era a sua intenção ir para Cadiz por mar; e que não permittindo o estado actual da sua saude, nem o rigor do Inverno, emprehender a jornada, propunha que se lhe consentisse differila até que o tempo permittisse ir para fora do Reino, com suas duas filhas; ElRei, querendo conciliar a impreferivel observancia da lei com os principios de humanidade e de decóro; manda declarar a Vossa Magestade que na data de hoje tem ordenado que os medicos da camara, verificando no dia de amanhã, pelas onze horas, o estado da saude de Vossa Magestade não corra perigo imminente, será forçoso sair Vossa Magestade do Reino precisamente no dia 4 de Dezembro proximo seguinte em observancia da lei, devendo Vossa Magestade ficar na indeligencia que não lhe pode ser permittido levar as Senhoras Infantas, por estarem ao abrigo das leis portuguezas, e de seu augusto Pai. Deus guarde a Vossa Magestade. Palacio do Alfeite 29 de Novembro de 1822.- Filippe Ferreira de Araujo e Castro, Ministro e secretario de Estado dos negocios do Reino.
N.º 15.º
Parecer das Facultativos.
Os medicos da camara de Sua Magestade, tanto effectivos como honorarios, abaixo assignados, reunindosse no dia 30 do corrente no Palacio de Queluz, a fim de votarem sobre o estado da saude de Sua Magestade a Rainha, e satisfazendo á solução dos quesitos indicados na portaria expedida pelo ministerio dos negocios do Reino em data de 29 do mesmo mez; tendo sido exactamente informados pelos medicos assistentes da historia dos padecimentos de Sua Magestade em differentes tempos, e da natureza dos ataques de que mui repetidamente tem sido acommettida, ainda depois que regressou para Portugal, declarando os mesmos assistentes que muitos dos ditos ataques hão sido da perigo emminente de vida, pelo grande estrago que affecta já o seu pulmão, e pelos longos padecimentos do figado, a ponto tal, que em algumas occasiões, e em alta hora da noite se hão reunido em conferencia.
A vista pois da historia acima referida, os medicos convocados decidirão unanimente: Primo, que Sua Magestade a Rainha deve soffrer um destes ataques logo que se exponha á intemperie da atmosfera e outras muitas inherentes causas, emprehendendo uma viagem ou jornada na presente estação. Secundó, que o ataque, desenvolvido então por causas muito mais vebementes, tanto fysicas como moraes, traria consigo imminente perigo de vida. Palacio de Queluz em 30 de Novembro de 1822.- Barão de Alvaiazere, Fysico mór do Reino; Manoel Luiz Alvares de Carvalho; Doutor João de Campos Navarro de Andrade; José Cardim Manni; Vicente Antonio de Azevedo; Doutor Bernardo José de Abrantes e Castro; Doutor José Marianno Leal da Camara Rangel de Gusmão; João Henriques de Paiva; Doutor Joaquim Xavier da Silva; João Thomas de Carvalho.
Senhora.- Manda ElRei participar a Vossa Magestade, que tomando em consideração o parecer dos medicos, na conferencia a que se mandou proceder no dia de ontem 30 do corrente, affirmando elles, que segundo o estado actual da saude de Vossa Magestade, e o rigor da estação, a vida de Vossa Magestade se exporia a correr imminente perigo fazendo jornada na presente estação; e devendo por este imperioso motivo diferirsse a execução da lei até ao momento em que possa realizar-se nesta parte; ordena que Vossa Magestade seja previnida de que no dia 4 do corrente, em que haverá expirado o prazo da lei para a prestação do juramento, terá ElRei de declarar por seu real decreto, que não sendo possivel executar-se a lei em toda a sua extensão pelo impedimento da molestia de Vossa Magestade, deve Vossa Magestade nesse mesmo dia retirarsse para a Quinta do Ramalhão, unicamente acompanhada das pessoas indispensaveis ao seu serviço, e ahi demorar-se em quanto o estado de sua saude não permitte a Vossa Magestade sair do territorio portuguez; cessando desde esse dia para Vossa Magestade o gozo de todos os direitos, que não podem Ter lugar, uma vez que Vossa Magestade recusa adherir ao pacto social. Deus guarde a Vossa Magestade. Palacio da Bemposta 1.º de Dezembro de 1822.- Filippe Ferreira d´Araujo e Castro, Ministro e Secretario de Estado dos negocios do Reino.
(B) Manda ElRei pela Secretaria de Estado dos negocios da marinha communicar ao Ministro e Secre-
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tario de Estado dos negócios do Reino, em resposta a sua portaria de 27 de Novembro próximo findo, que se acha pronta a fragata Pérola para o destino naquella portaria mencionado; isto he, com os viveres e arranjos necessários para uma viagem ordinária. Palacio de Queluz 2 de Dezembro de 1822 - Ignacio da Costa Quintella,
O Senhor. - Ao Conselheiro de Estado, José Maria Dantas Pereira, parece que deve ainda fazer subir escripto á real presença de Vossa Magestade, relativamente á deportação da Rainha Fidelíssima, que a julga contraria ao bem da Nação nas actuaes circunstancias; e que não encontra muito claro estarem todas as mulheres, e talvez menos a Rainha Fidelissima, incluídas no artigo 13 da lei 236, pois tem razões para lhe parecer que não foi da intenção do Poder legislativo comprehendelas no referido artigo. Portanto procurando conciliar a responsabilidade, que lhe impõe o artigo 169 da Constituição, com o desempenho do seu juramento, e dos que deu em Março de 1821, e em Novembro próximo, parece-lhe, conforme votou no dia 29, e agora ratifica, que convém praticar a este respeito o que tom visto executar em outros casos, e se permitte ainda mesmo na tropa, sem lesão da severíssima disciplina militar; a saber: representar ou officiar ao corpo legislativo, para este decidir o que tiver por mais acertado.
Aos Conselheiros, José de Mello Freire, e Joaquim Pedro Gomes de Oliveira, parece também necessario, pelos motivos acima ponderados, e pelos que expenderão nos seus votos perante V. Magestade, que este negocio seja levado ao conhecimento das Cortes antes da execução, que por fim só poderá ter lugar mediante o exercício do poder judiciário: porque não achão claramente comprehendida a Rainha no referido artigo 13 da lei do juramento, e nem ainda as mulheres possuidoras de bens nacionaes, sendo casadas, e jurando os seus maridos; e porque finalmente a gravidade do negocio, e o grande interesse que nelle se pode considerar a toda a Nação, não lhes parece permittir que seja expedido sem se levar primeiro ao conhecimento dos seus representantes que estão em effectivo exercício da sua representação.
Aos Conselheiros, João António Ferreira de Moura, e Anselmo José Braamcamp, parece dever explicar a ultima parte do seu voto: e declamo que a remessa ao corpo legislativo deverá ser só para participar os motivos provados, que o Governo tiver, para não pôr em immediata execução aquella parte da lei. Ao Conselheiro, Conde de Sampayo, posto que reconheça a gravidade do negocio, e das suas consequencias futuras, assim mesmo ratifica a sua antecedente opinião, por lhe não ser permittido votar contra um artigo da lei que lhe parece claro.
Aos Conselheiros, João da Cunha, e Conde de Penafiel, parece não deverem alterar a opinião que derão no dia 29. Paço da Bemposta 2 de Dezembro de 1822 - Conde de Sampaio, Conde de Penafiel, Freire , Dantas, Cunha, Oliveira , Braamcamp Moura.
N.º 16
Manoel Cypriano da Costa, cavalleiro professo na ordem de Christo, e da ordem de Nossa Senhora da Conceição de Villa Viçosa, e escrivão da camara na meza do senado, como escrivão do auto geral do juramento prestado á Constituição política da Monarquia portugueza: em observância do que, me acaba de ser ordenado da parte de Sua Exca., o Ministro e Secretario de Estado dos negocios do Reino, certifico que ate hoje á noute, recolhendo-me da igreja de S. Domingos, não mandou a Serenissima Senhora Rainha o seu juramento.
Por certeza do que passei a presente de minha letra, e signal, que vai sellada com o sello das minhas armas, em Lisboa aos 3 de Dezembro de 1822 annos. - (L. Sr. - Manoel Cypriano da Costa.
DECRETO I.
Tendo a Rainha por sua espontanea e livre declaração, feita e assignada do proprio punho em data de 28 de Novembro, ratificado a que havia solemne e formalmente feito em data de 22 do mesmo mez - Que com pleno conhecimento da lei, e sua sancção, havia tomado positiva e firme determinação de não jurar a Constituição politica da Monarquia; e havendo expirado o prazo marcado pela lei sem que tenha prestado o juramento a que era obrigada em execução da mesma lei: Faço saber que pelo facto de não jurar a Constituição a Rainha, tem perdido todos os direitos civis e políticos, inherentes tanto á qualidade de cidadão portuguez, como á dignidade de Rainha; e que outro sim deverá sair i m mediatamente do territorio portuguez. As autoridades, a quem competir, o tenhão assim entendido, e facão executar. Palácio da Bemposta em 4 de Dezembro de 1822. - Com a Rubrica de Sua Magestade. - Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
DECRETO II.
Tendo representado a Rainha, que segundo o estado de sua saude, e o rigor da estação, não podia sem perigo imminente de vida saír immediatamente do territorio portuguez, como devia, em observancia da lei, por não haver jurado a Constituição politica da Monarquia; e havendo declarado os facultativos, que com effeito haveria perigo imminente de vida, se fizesse jornada neste momento: determino que fique ditferida a execução do decreto desta mesma data, até que possa verificar-se sem perigo imminente da vida; devendo retirar-se entretanto para a quinta do Ramalhão, acompanhada unicamente das pessoas indispensaveis para o seu serviço pessoal. As autoridades, a quem competir, o tenhão assim entendido, e fação executar. Palacio da Bemposta em 4 de Dezembro de 1822. - Com a rubrica de Sua Magestade. - Filippe Ferreira d'Araujo e Castro.
Resolveu-se que se mandasse imprimir o officio com os documentos, e que tudo passasse a uma Commissão especial para dar sobre isto o seu parecer.
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O Sr. Soares Franco, por parte da Comissão de Commissões leu um projecto de decreto sobre pescarias, de que se fez primeira leitura.
O Sr. Brandão Pereira apresentou a seguinte
INDICAÇÃO.
O inteiramento da Representação nacional he tão urgente como a nossa presença neste recinto desde o primeiro do corrente Dezembro; aquella he marca pelas divisões Trancoso Aveiro, e Leiria ; e o seu inteiramento ficou para depois da instalação; cumpre pois trate desse assunto declarado urgente desde já. Paço das Cortes 4 de Dezembro de 1822 - O Deputado Brandão Pereira.
Decidiu-se que reduzida pelo seu autor a um projecto de lei, se trataria da urgencia desta maneira.
O Sr. Segurado leu um projecto de decreto para regular o direito de petição, o qual ficou para segunda leitura.
Leu o mesmo S. Deputado uma indicação para se consolidar a divida publica contrahida pela Nação até 24 de Agosto de 1822, e conceder-se um juro aos credores destinado-se-lhes hypotecas. Ficou para segunda leitura.
O Sr. Pereira do carmo offereceu a seguinte
INDICAÇÃO
Havedo as Cortes Constituintesexpedido ordem ao Governo em 18 de Agosto de 1821 para que proporcionasse a Academia das sciencias os meios necessarios para vir á luz publica a copiosa collecção das antigas Cortes portuguezas, e dizendo-se-lhe outrosim, que fiscaliza-se o bom; e fiel desempenho da mesma ordem na outra de 24 de maio de 1822; tendo-se repetido ambas na de 21 de Junho deste anno, não consta que até agora apparecesse a mais pequena amostra de tão proveitoso trabalho.
E por isso proponho se diga ao Governo que faça presente ás Cortes o estado do negocio, que por tantas vezes lhe ha sido recommendado, e de que depende o cabal conhecimento da nossa historia politica, civil, e economica. - O Deputado Preira do Carmo.
Foi approvada, e se mandou expedir a ordem requerida.
Nomeou o sr. Presidente para a Commissão que havia de examinar o relatorio do Ministro da justiça, aos Srs. Trigoso, Pessanha, Xavier Monteiro, Pato Moniz, e Castello Branco.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia a continuação da leitura dos projectos.
Levantou-se a sessão pelas 2 horas da tarde. - Thomaz de Aquino de Carvalho, Deputado Secretario.
RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES
Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes mandão remetter ao Governo as certidões inclusas dos autos do juramento á Constituição prestado pelo empregados publicos da villa de Anadia, e do couto de Lavos para seguirem o destino prescripto pelo artigo do decreto de 10 de Outubro do corrente anno.
Deus guarde a V. Exa. Lisboa Paço das Cortes 4 de Dezembro de 1822.- João Baptista Felgueiras.
Para o mesmo.
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes ordenão que os presidentes das camaras das cabeças das divisões eleitoraes remettão promptamente aos Deputados substitutos os diplomas, que lhes não tiverem sido enviados, em conformidade do artigo 52 do decreto de 11 de Junho do presente anno. O que V. exca. levará ao conhecimento de S. Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Lisboa Paço das Cortes 4 de Dezembro de 1822. - João Bptista Felgueiras.
Para José da Silva Carvalho
Ilustrissimo e Excelentissimo Senhor - As Cortes ordenão que a commissão encarregada de formar e propor os projectos dos códigos do processo criminal e de delictos e penas remetta com urgencia ao Governo a fim de ser transmitida as Cortes informação sobre o estado de seus trabalhos a tempo que ainda lhe será necessário para os concluir. O que V. Exa. Levará ao conhecimento de sua Majestade.
Deus guarde a V. Exa. Lisboa Paço das cortes 4 de Dezembro de 1822 - João Baptista Felgueiras.
SESSÃO DE 5 DE DEZEMBRO
Aberta a sessão sob a presidencia do Sr. Moura leu-se a acta da antecedente que foi approvada.
Mandou-se lançar na acta a seguinte declaração de voto que offereceu o Sr. Pinto de Magalhães e a qual também foi assinada pelos senhores Serpa Machado Novaes e Annes de Carvalho. Na sessão de ontem fui de voto contrario a que se declarasse urgente para se julgar incluido no art. 107 da Constituição o projecto de lei sobre as provas do vinho do Douro.
Mandou-me também lançar na acta outra declaração de voto offerecida pelo Sr. Marcos Antonio e concebida nestes termos. Na sessão de 4 de Dezembro votei que se não imprimissem os documentos relativos á Rainha Senhora D. Carlota.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente mencionado.
1. Um officio do Secretario de Estado dos negocios do Reino acompanhando uma consulta da junta da administração da companhia geral da agricultura dos vinhos do Alto Douro em data de 9 de novembro proximo passado com explicações sobre outra de 29 de Julho acerca da execução do artigo 5º