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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tence-nos como um dever, pertence-nos como um direito, e d'elle temos vaidade.

O rei da Italia deu-nos para rainha a sua filha dilecta, que é o orgulho do throno portuguez, que é a mãe de todos os nossos infelizes! E por isso as dores da rainha de Portugal, as suas magnas são, tem sido e serão sempre as nossas dores, as nossas magnas, o nosso martyrio mais profundo.

Muitos apoiados.

Sr. presidente, n’esta hora funebre não lamento o grande que morreu, chóro os tristes que ficaram; para elle, para o operario intemerato, para o obreiro sem descanso, acabou n’este momento a fadiga, e começa a apotheose da gloria!

Vozes: — Muito bem.

Caiu fulminado e esmagado ao pé dos seus trabalhos titanicos!

Vozes: — Muito bem.

A tarefa não ficaria acabada, mas a epopéa estava completa.

Começou no brilhante soldado de Novara, acabou no rei da Italia, que conseguira assentar o seu throno na antiga capital do mundo.

Um só voto n'este momento solemne, e conto para elle com todos os que estão n’este recinto, porque n’esta hora não ha de certo aqui mais que um coração e um sentimento.

Apoiados geraes.

Deus, em premio das suas virtudes, que foram muitas e grandes, cubra de bençãos a sua descendencia, e encha de felicidades sem fim a sua querida Italia, a nossa querida irmã.

Muitos apoiados.

Vozes: — Muito bem.

(O orador foi comprimentado pelos srs. deputados de todos os lados da camara.)

O sr. Luiz de Campos: — Em má hora pedi eu a palavra, sr. presidente. Se ha sempre muito a esperar do verbo fluente, poetico e apaixonado do illustre deputado que me precedeu, não é menos certo que excedeu elle a minha espectativa, e nada, ou quasi nada, me deixou para acrescentar ao seu sentidíssimo discurso. A elle me associo, como todos nos associâmos á profunda dôr que vae nos paços reaes.

Apoiados.

Rei estranho chamou o illustre orador a Victor Manuel; assim é; mas consinta-me o meu collega que, como nacional, eu considere o principe que tão estreitamente anda ligado aos destinos da nossa patria. Se querem remontar aos tempos afastados em que a nobilissima casa de Saboia deu á corôa portugueza algumas das suas virtuosas princezas, basta considerar os modernos, para ver que o heroe, por nós pranteado, é nosso pelo passado, pelo presente e pelo futuro.

Seu pae, Carlos Alberto, dorme entre nós o seu ultimo somno. Como pae d'aquelle que era já a estrella fulgente a esclarecer os horisontes futuros da unificação e das liberdades italianas, rendia a Deus a alma no Porto, n'esse baluarte onde se mantiveram as liberdades portuguezas, e d'onde saíram os heroes que as implantaram para sempre entre nós.

Apoiados.

Pelo presente, dando-nos, como nos deu, a virtuosa princeza, que é nossa Rainha. (Muitos applausos.) Aquella que, ao esposar o Rei de Portugal, esposava de alma e coração a nova patria, e se fazia mãe de todos os orphãos, consoladora de todas as angustias, protectora de todos os infelizes. (Applausos.) A historia dirá um dia das suas virtudes, que não é durante a vida que ellas se contam, e pareceria adulação, o que outra cousa não é mais que a confissão espontanea dos nossos gratos corações.

Applausos.

Pelo futuro, nos dois penhores que ahi temos, enlevo de seus paes e enlevo nosso: representantes de duas trindades caras a todos nós: D. Maria Pia, Victor Manuel e Carlos Alberto — D. Luiz I, D. Maria da Gloria e D. Pedro IV.

Com taes progenitores, aquelle que Deus guarda para ser um dia nosso Rei, dá-nos a consoladora esperança que ha de imitar-lhes as virtudes; e Deus afaste o funebre dia em que a patria haja de sentir a dôr profunda que actualmente enluta a nossa irmã.

Applausos.

A Italia acaba de perder um grande rei, um habilissimo politico, um bravo soldado e um fervoroso liberal! Associe-mo-nos á sua pungentissima dôr.

Applausos.

Proponho que ao parlamento italiano seja communicado o sentimento profundo e doloroso, com que a camara dos deputados da nação portugueza recebeu a noticia do fallecimento de Sua Magestade El-Rei Victor Manuel II.

Muitos applausos.

O sr. Presidente: — Os desejos que o illustre deputado acaba de manifestar hão de ser plenamente satisfeitos.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Em nome do partido liberal, do grande partido liberal, que é não só a immensa força das sociedades modernas, mas tambem a ardente esperança do futuro; em nome dos principios democraticos que represento, e são, para a humanidade, os laços da confraternidade universal e commum solidariedade, assim nas grandes angustias, como nas grandes alegrias, nas dores lancinantes, como nos jubilos festivos, associo-me ás propostas que v. ex.ª fez, associo-me ás eloquentissimas palavras do sr. Thomás Ribeiro, associo-me ás expressões igualmente eloquentes pronunciadas pelo sr. Luiz de Campos.

É necessario, sr. presidente, que em Victor Manuel não vejamos sómente o representante de uma das casas mais illustres da Europa, d'essa casa de Saboia, que é a heroicidade transmittida através dos seculos, que na boa como na adversa fortuna, ameaçada, ora pelo sacro imperio, ora pela monarchia franceza, soube sempre manter a honra do seu atrevido balsão, sem nunca esquecer a sua missão historica na Italia, dês que dos Alpes baixou ao Piemonte e veiu beijar em Genova, a cidade dos palacios, as vagas sonoras do Mediterraneo; d'essa familia secular, que, pelo vigor e pela energia, conseguiu por fim alar-se ás mais elevadas alturas, consociando, na mesma aspiração, no mesmo ideal, no mesmo anceio, os seus destinos com os da bella Italia, esmagada pelo sapato ferreo dos conquistadores, que vinham, á fronte das suas hostes barbaras, derimir os seus pleitos e as suas contendas n'esse immenso amphytheatro das nações. (Muitos apoiados.) A bella Italia, sim, que perdeu a sua independencia; quando as florescentes republicas da meia idade a perderam, quando a renascensa transformou o ideal da politica pelo ideal da arte; quando, emfim, as ambições dos dynastas ligadas á soffreguidão dos papas a tornaram o joguete da diplomacia. Era essa a Italia de ha trinta annos, quão diversa da Italia de hoje, que na sua assombrosa unidade symbolisa um dos maiores factos da historia, e corresponde, em maravilhoso concerto, ao viver e ao crer do nosso seculo!

Apoiados.

Altos e insondaveis mysterios da evolução humana, aos quaes se prende o nome d'esse homem illustre, cuja morte pranteâmos e sobre cuja campa vimos, piedosos romeiros do progresso, esfolhar as flores da nossa saudade!

Sr. presidente, é este o facto, ou antes é esta a epopéa. Para comprehender Victor Manuel no seu triplice aspecto de rei, de soldado e de estadista, é necessario fazer a historia da regeneração e da unidade, da Italia, historia dramatica, cheia de episodios que Dante, o sombrio Gibelino, houvera entresachado na sua Divina Comedia.

Definir Victor Manuel, o collaborador de Cavour, é postergar os direitos da historia, é attentar contra as regalias da epopéa, qual nós a comprehendemos, que é a apotheose