32 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
a todas as exigencias do illustre deputado. (Muitos apoiados.)
Permitta-me agora o illustre deputado, já que respondi tão categoricamente quanto pude ás suas perguntas, que eu me refira á sua censura extraordinariamente clamorosa do principio do seu discurso.
S. exa. estranhou muito que eu, que vinha aqui ser o campeão acerrimo dos guardas fiscaes opprimidos pelo sr. ministro da fazenda, não soubesse n'este momento qual o estado da questão dos guardas fiscaes, o não respondesse de modo a acudir a essas victimas da oppressão do sr. ministro da fazenda; e o illustre deputado, depois de nos apresentar as provas do modo como trata dos interesses d'aquellas infelizes victimas do sr. ministro da fazenda, e depois de ter sido encarregado de apresentar á camara uma representação d'essas victimas, esquece-se d'essa representação e deixa-a ficar em casa. (Riso.)
O illustre deputado, que vem aqui censurar-me asperamente, porque eu disse que não tinha conhecimento exacto de um facto que não corre pelo meu ministerio, sabe perfeitamente que eu não posso occupar-me de outros negocios, nem pensar nos negocios dos guardas fiscaes, que eu tenho em muita consideração, mas que estão entregues aos cuidados do sr. ministro da fazenda (Muitos apoiados - Vozes: - Muito bem.)
Já que estou com a palavra, devo dizer ao illustre deputado, apesar de não ter recebido communicação official de que o sr. Elvino de Brito me annuuciára varias interpellações, que por deferencia para com s. exa. me declaro habilitado desde já a responder ás suas interpellações.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas do seu discurso).
O sr. Elvino de Brito: - V. exa. não respondeu a todas as perguntas.
O sr. Ferreira de Almeida - Como está presente o sr. ministro da marinha, vou usar da palavra para fazer uma pergunta a s. exa., e que tem por fim simplificar o expediente da remessa dos documentos que tenho a pedir pelo seu ministerio. Desejo saber se o illustre ministro mantém a auctorisação que me foi concedida no anno passado para ver na secretaria a seu cargo quaesquer documentos que possam interessar á discussão parlamentar, deixando assim de requerer a remessa de originaes que muitas vezes são volumosos, ou as copias que levariam muito tempo a preparar, limitando por esta fórma os pedidos.
O sr. Ministro da Marinha: - Estão plenamente auctorisados, tanto v. exa. como qualquer sr. deputado, para ver no meu ministerio todos os documentos que desejarem.
O Orador: - Continuando no uso da palavra, permitta v. exa. que eu não deixe sem reparo a resposta que s. exa. deu ao sr. Consiglieri Pedroso, que representa tambem aqui a opposição, quando este cavalheiro reclamava a presença do governo na camara.
Disse o sr. ministro que a opposição, se não tinha na camara os membros do gabinete quando carecesse da sua presença, era porque não queria, por isso que tinha meio expedito de o fazer, qual o de prevenir o ministro por meio do telephone. Lastimo que s. exa. insista n'este expediente já apresentado na sessão passada e ampliando-o agora aos seus collegas do ministerio.
Por esta fórma o parlamento passaria a ser uma especie de restaurant, em que cada deputado pediria ao continuo um copo de agua, e pelo telephone o sr. ministro da marinha ou ao sr. ministro dos negócios estrangeiros um capilé. (Riso.)
Se os membros do gabinete têem a consciencia do logar que occupam, têem obrigação de vir ao parlamento para dar explicação dos seus actos, sem que para isso sejam compellidos por expedientes mais ou menos irrisorios.
Pondo de parte este assumpto jocoso, provocado pela resposta de s. exa. o ministro da marinha, peço licença para me dirigir a s. exa. sobre um assumpto que não é do ramo da administração a seu cargo, e sim do ministerio do reino, esperando que s. exa. quererá communicar as minhas observações ao seu collega.
Quero pedir ao governo que olhe pelo triste estado em que se encontram os pescadores portuguezes presos na ilha Christina, e que se póde dizer são mais victimas do abandono do que da epidemia.
No districto de Faro uma grande parte da população do litoral vive da industria da pesca.
A exploração da pesca por meio de galeões usada nas costas da Hespanha leva ali muitos individuos pela melhoria de retribuição que encontram ou lhe promettem.
Tendo sido suspensa a reciprocidade da pesca, nas aguas territoriaes dos dois paizes, facilidade esta, que era principalmente explorada pelos armadores hespanhoes, diz-se que resultou d'ahi que a temporada não désse os lucros precisos, e os armadores hespanhoes se vissem em difficuldade para satisfazer os contratos, e que a invenção de uma supposta epidemia na ilha Christina teve em vista levantar a população hespanhola para a levar a expulsar os pescadores portuguezes contratados, como liquidação completa d'esses contratos.
Acalmada a primeira effervescencia, suscitaram-se varios alvitres.
Um d'elles, o mais infeliz, deu em resultado ficarem os pescadores desterrados, sem meios para occorrer á sua subsistencia e sem abrigo, a ponto de muitos terem morrido de fome e ao abandono, como nos informaram.
Melhor teria sido repatrial-os para Sagres onde poderiam fazer quarentena sob vigilancia das auctoridades portuguezas, e podendo prestar-se-lhes mais directamente qualquer auxilio do que por intermedio das auctoridades estrangeiras.
Consta-me que os ultimos casos fataes que ali se deram occorreram em 10 de dezembro, e se este facto é verdadeiro, penso que o governo deveria facilitar o regresso á patria áquelles infelizes, desde que os que têem podido obter das suas familias pequenos recursos para se transportarem ás suas localidades o têem feito, por via de Badajoz, sem que por isso a epidemia tenha invadido o nosso paiz.
N'este sentido solicito do governo as mais rapidas providencias para que se repatriem áquelles infelizes que por falta de recursos o não têem podido fazer, adoptando-se as precauções hygienicas indispensáveis, indicadas pela sciencia. (Apoiados).
Se alguns d'aquelles individuos, collocados em condições de vida as mais detestaveis, porque dispõem de alguns meios, têem podido voltar para o Algarve sem terem trazido comsigo o cholera, porque não hão de vir todos os mais?! (Apoiados.)
Desde que o governo entendeu justo soccorrer em paiz estrangeiro os nossos compatriotas, melhor fôra ter enviado para ali pessoal que providenciasse as necessidades d'aquelles infelizes, uma vez que os não repatriam, o que podia ter feito com as necessarias precauções, em vez de deixar áquelles infelizes sujeitos a morrerem mais por effeito do abandono e falta de recursos, que em bom direito os nossos vizinhos deviam dispensar-lhes, do que da epidemia. (Apoiados.)
Com estas observações não é intenção minha armar ao sentimentalismo. As cousas são o que são.
Logo que se manifestaram os primeiros casos fataes de epidemia consentiu-se que muita gente fosse para Hespanha acompanhar uns os irmãos, outros os maridos, os pães, os filhos, etc.; de maneira que o numero de emigrantes augmentava ali extraordinariamente.
A auctoridade administrativa devia ter-se opposto a essa emigração que ía engrossar o numero de portuguezes que ali estavam faltos de todas as condições de vida.