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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mesma noite. A força já tinha tres dias de marcha e tinha direito a um dia de descanso, segundo o regulamento; as circumstancias do paiz foram-me, porém, descriptas com coros tão lugubres, que entendi do meu dever satisfazer a tal requisição. Não me competia commandar em pessoa nenhuma das fracções que foram destacadas, mas não querendo ficar ocioso emquanto as praças do meu commando iam prestar serviços talvez arriscados, offereci-me a auxiliar o administrador do concelho, na freguezia onde fosse julgada mais ameaçada a segurança publica. Sendo me dito que na freguezia de S. Gião, onde já se achava o administrador do concelho, havia mais rasão para receiar grave perturbação da ordem, para lá me encaminhei, acompanhado por 13 praças commandadas por um sargento.

Chegado a S. Gião na madrugada do dia 13 do corrente, depois de uma marcha nocturna, apesar de cansados eu e os meus soldados, por termos feito duas marchas em vinte e quatro horas, puz-me com a melhor vontade á disposição do administrador do concelho para o auxiliar. Devo dizer que o acto eleitoral correu com exemplar regularidade, e que nem dentro nem fóra da igreja houve um só successo que justificasse os receios da auctoridade administrativa. Não foi pedido nem preciso o auxilio nem de um só soldado. O procedimento do administrador do concelho pareceu-me a tal ponto serio, circumspecto e digno, que me fez conceber da sua pessoa o mais elevado, conceito.

De noite, porém, havendo reciprocas suspeitas de más intenções, entre os partidarios do candidato ministerial e os do grupo opposto, foi me requisitada a força toda para ficar de guarda n'uma casa perto da igreja, e fornecer sentinellas para guarda da uma, a qual alem d’essa guarda ficou vigiada por pessoas escolhidas em ambos os partidos, as quaes pernoitaram na igreja, cujas portas foram fechadas. Eram tão pronunciados os receios do administrador do concelho com relação á perturbação da ordem publica, que eu rondei toda a noite nas immediações da igreja, e só succumbi á fadiga pelas tres horas da manhã. Antes d'isso, á uma hora da noite, o administrador recebeu denuncia de que por parte da opposição se projectava arrebatar a uma. Sendo-me requisitado o auxilio de toda a força, entrei com ella e com o administrador do concelho dentro da igreja, e mandei cruzar bayonetas em defeza da uma que se julgava ameaçada. Por essa occasião empreguei todos os meios possiveis para aquietar os animos das pessoas presentes dentro e fóra da igreja; e depois que reciprocas explicações puzeram fim a este incidente, mandei retirar a força, deixando sómente as sentinellas. Um conflicto mais serio que tivesse tido logar n’aquella occasião poderia ter tido graves consequencias que se sentiriam em todo o concelho de Ceia. Julgo-me, portanto, feliz em ter contribuido para que tal conflicto não succedesse.

Receei que aquelle acto por mim praticado na igreja, sendo mal interpretado pelas pessoas do grupo opposicionista, contra o qual mandára cruzar bayonetas quando suspeito de querer violar a uma, me trouxesse odios immerecidos. Por isso resolvi-me a não passar pela freguezia de Sandomil, que é o caminho mais seguido de S. Gião para Ceia, por ser n’aquella freguezia que predominava o partido opposicionista, que me diziam estar exaltado até aos ultimos excessos, e que poderia, julgava eu, insultar a força na sua passagem. O proprio administrador do concelho que regressou a Ceia antes de mim, não quiz passar por aquella freguezia com receio de que o maltratassem. Quando, porém, me achava occupado em tomar informações ácerca do melhor itinerario a seguir, dirigiu-se a mim um cavalheiro que me disso estar incumbido pelas principaes pessoas de, Sandomil, interessadas na opposição, as quaes me agradeciam a maneira como tinha procedido, e me convidavam a que na minha passagem por aquella freguezia procurasse algum d’elles para me renovarem pessoalmente o seu agradecimento. Em vista d'isto resolvi-me a passar por Sandomil, e ali procurei ver uma das indicadas pessoas, á qual disse que nenhum agradecimento merecia, porque não tinha feito senão cumprir o meu dever.

Tinha combinado com o administrador do concelho o partir de S. Gião no dia 15 ás seis horas da manhã, a fim de ir ainda assistir ao apuramento eleitoral na assembléa do Ceia. Seriam porém, tres horas da manhã, quando, acordado bruscamente, recebi da parte do administrador do concelho, que já se achava em Ceia, a seguinte requisição laconica e concisa, como costumam sel-o os escriptos desta natureza em circumstancias urgentes.

«...Sr. É preciso que a força esteja aqui ás oito horas da manhã. Dê v. as suas ordens para aquelle fim.

«Ceia, 14-10-78. De v. etc.... O administrador, E. V. Casal. »

Em vista d'esta requisição, e impressionado pelo que ouvira dizer a respeito do estado revolucionario de Ceia, julguei que tinha soado a hora da guerra civil, e puz-me em marcha immediatamente, acompanhado pela pequena força que tinha á minha disposição. O alto conceito que o administrador do concelho me tinha merecido pelos seus actos em S. Gião impediam-me de ver n'esta requisição de tropa algum outro motivo que não fosse serio e digno. Pensei que só graves acontecimentos poderiam ter inspirado uma reaquisição tão urgente.

Chegado a Ceia encontrei já formada á porta da igreja toda a força que ali existia, a qual era constituida pela pequena guarda de um cabo e sete soldados que nunca havia saído de Ceia onde tinha ficado para guardar a uma de noite, se fosse preciso, e mais força que havia já recolhido da assembléa de Sameice. A força toda commandada por um sargento achava-se com as armas carregadas, precaução que tinha sido exigida, segundo me disseram, por ter havido durante a noite antecedente indicios de tentativa de assalto á uma, e até mesmo alguns tiros de espingarda. A força que ía commigo aggregou-se á que já lá estava, e tomei o commando de toda ella. Alem da força de infantaria do meu commando achava-se proximo da igreja uma força de cavallaria n.º 8, composta de um sargento e dez praças montadas. Eram oito horas da manhã pouco mais ou menos, quando cheguei e encontrei as cousas n'esta disposição.

Dentro da igreja estavam já reunidas as pessoas que constituiam a mesa eleitoral para procederem á abertura da uma e leitura das listas; estavam dentro e fóra da igreja muitos individuos. O administrador do concelho entrava e saía da igreja em diligencias, suppuz eu, do seu serviço. Quando eu estava, ainda procedendo a informações sobre os acontecimentos anteriores que tinham dado causa a um tal apparato de precauções, que me levava a crer que de um momento para o outro se esperavam graves acontecimentos; = quando ora entrava na igreja para ver o que lá se passava, ora saía fóra a colher informações do sargento meu immediato, recebi inesperadamente do administrador do concelho, em plena assembléa eleitoral, dentro da igreja, na presença do presidente, da mesa, e em nome d’elle, requisição para entrar immediatamente na igreja com toda a força que se achava postada junto á porta. Recebendo uma requisição de tal ordem, na presença de uma assembléa numerosa, dada por um magistrado administrativo, que pelo seu cargo, e pelo modo como havia procedido em S. Gião, me inspirava o maior respeito, entendi que algum acontecimento já conhecido que eu ignorava, ou alguma suspeita seriamente fundada exigia aquella demonstração de força. Eu ignorava todos os acontecimentos succedidos ou esperados, não tinha noticia da força que tinha ido a Loriga, e a qual não tinha ainda recolhido, sendo possivel que n'aquella freguezia, que me haviam pintado como extremamente agitada, tivesse havido algum conflicto. Confiado, porém, nas qualidades pessoaes que julgava ter visto no administrador do concelho, e sem suspeitar das suas malevolas intenções, pareceu-me que qualquer hesitação da minha parte seria perigosa para a segurança publica, e por