O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 57

8ª SESSÃO DA JUNTA PREPARATORIA EM 15 DE JANEIRO DE 1879

Presidencia do ex.mo sr. José Paulino de Sá Carneiro (decano)

Secretarios - os srs.

Ernesto Redolpho Hintze Ribeiro

Caetano Augusto de Sousa Carvalho

SUMMARIO

Nomeação da deputarão para assistir á trasladação dos restos mortaes do marquez de Sá da Bandeira, apresentação de pareceres e discussão do parecer sobre a eleição do circulo de Villa Real.

Abertura — Ás duas horas e um quarto da tarde.

Presentes — 77 srs. deputados eleitos.

Acta — Approvada.

Declaração

Declaro que por motivo justificado não tenho podido assistir a algumas sessões da junta.

Lisboa, 13 de janeiro de 1879. = O deputado eleito, Manuel Thomás Nobre de Carvalho.

O sr. Presidente: - A deputação que ha de assistir ámanhã em Santarem á trasladação dos restos mortaes do venerando marquez de Sá da Bandeira é composta:

Da mesa:

José Paulino de Sá Carneiro.

Domingos de Sousa Moreira Freire.

Antonio Pessoa de Barros e Sá.

Dos auctores da proposta:

Alberto Osorio de Vasconcellos.

Antonio Augusto Pereira de Miranda.

Antonio José Teixeira.

Hermenegildo Gomes do Palma.

Luiz Adriano Magalhães Menezes e Lencastre.

E mais dos seguintes srs. deputados eleitos:

Anselmo José Braamcamp.

Mariano de Carvalho.

Francisco Joaquim da Costa e Silva.

José Joaquim Rodrigues de Freitas.

Visconde de Andaluz.

Manuel Pinheiro Chagas.

José Maria de Almeida Teixeira de Queiroz.

Os srs. deputados encontrarão carruagens á sua disposição no comboio ordinario da linha do norte, mas não sei a que horas elle parte.

O sr. Adolpho Pimentel: - Mando para a mesa, por parte da segunda commissão de verificação de poderes, o parecer relativo á eleição do circulo de S. Pedro do Sul.

Mandou-se imprimir.

O sr. Bernardo de Serpa: - Mando para a mesa o parecer da primeira commissão de verificação do poderes, relativo á eleição do circulo n.º 6, Vianna do Castello.

N'esta eleição houve alguns protestos, e o parecer, por consequencia, tem do ser impresso. Por essa rasão peço a v. ex.ª que dê as suas ordens para que a impressão se faça com a maior urgencia.

Mandou-se imprimir.

O sr. Agostinho Fevereiro: — Mando para a mesa o meu diploma de deputado eleito pelo circulo n.º 109, Niza.

A commissão de poderes.

O sr. Visconde de Andaluz: — Pedi a palavra para declarar a v. ex.ª e á junta que não estive presente na sessão do dia 11, quando foi apresentada uma proposta para ser nomeada uma commissão a fim de assistir em Santarem á trasladação dos restos mortaes do sempre chorado marquez de Sá da Bandeira, para o seu jazigo, e se tivesse assistido a essa sessão, teria pedido aos illustres signatarios da proposta a fineza de consentirem que eu a subscrevesse tambem, não só porque sou representante d'aquelle circulo, como tambem porque sempre prestei homenagem em vida áquelle prestante cidadão, (Apoiados.) áquelle estadista distincto, (Apoiados.) áquelle homem illustre; (Apoiados.) e depois da sua morte queria significar-lhe a gratidão que, como portuguez, tenho pelos grandes serviços prestados por aquelle valente soldado á causa da liberdade e ao meu paiz. (Apoiados.) São estes os motivos por que eu pedi a palavra. Como, porém, me fizeram a honra de incluir o meu nome na lista dos srs. deputados que fazem parte da commissão que ha de assistir á trasladação dos restos mortaes do nobre marquez de Sá, caducaram em parte os motivos por que eu tinha pedido a palavra; entretanto, entendi dever dar esta explicação á junta.

O sr. Manuel d'Assumpção: - Mando para a mesa o diploma do sr. Fortunato Vieira das Neves, deputado eleito pelo circulo n.º 59, a fim de que v. ex.ª se sirva mandar dar-lhe o destino conveniente.

Aproveito a occasião para declarar que o mesmo sr. deputado eleito não tem comparecido ás sessões d'esta junta por incommodo de saude.

O diploma remetteu-se á commissão de poderes.

O sr. José Maria Borges: — Mando para a mesa o parecer da primeira commissão de verificação de poderes ácerca do diploma do sr. deputado eleito pelo circulo n.º 16, Celorico de Basto.

O sr. Fonseca Pinto: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a junta sobre se dispensa o regimento, a fim de entrar já em discussão o parecer relativo á eleição do circulo n.º 23, Villa Real, o qual já está impresso.

Consultada a junta, resolveu affirmativamente.

O sr. Presidente: — Este parecer refere se ao circulo do Villa Real, por onde eu saí eleito, e portanto um certo melindre impõe-me o dever de me retirar d'este logar. Convido por isso o sr. Francisco Costa a occupar esta cadeira.

(Occupou a cadeira da presidencia o sr. Francisco Costa.)

Leu se na mesa o seguinte

Parecer

Senhores. — Á vossa primeira commissão de verificação de poderes foi distribuido o processo eleitoral relativo ao circulo n.º 23, (Villa Real) e tendo-o a vossa commissão examinado com a attenção e escrupulo que demanda a importancia do assumpto, tem a honra de submetter á vossa apreciação o seguinte parecer.

Mostra o processo que este circulo eleitoral se compõe das assembléas de S. Diniz, Lordello, Torqueda, S. Thomé do Castello e Constantim.

Na assembléa de S. Diniz entraram na urna 817 listas, sendo igual o numero das descargas em um dos cadernos, e no outro de 819, e obteve o cidadão José Paulino de Sá Carneiro 642 votos, o cidadão Bento Teixeira de Figueiredo Amaral 174, e o cidadão João Alves 2 votos, que perfaz o total de 818, apparecendo um voto a mais do numero de listas entradas na urna, o qual foi de 817. Na acta dá-se como explicação do facto ter-se encontrado na occasião do escrutinio uma lista dentro de outra, circumstancia que faz desapparecer a irregularidade notada, que em todo o caso era de tão curto alcance que não podia, nem ligeiramente, influir na validade da eleição. Tambem n'esta assembléa foram rejeitadas tres listas, que vem juntas ao processo, contendo duas dellas o nome do candidato Bento Teixeira de Figueiredo Amaral, e uma o nome do deputado eleito, José Paulino de Sá Carneiro, mostrando-se da acta assas justificada a rejeição das falladas listas, que íam envolvidas dentro de outras.

Sessão de 13 de janeiro de 1879

8

Página 58

58

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Na assembléa de Lordello entraram na urna 486 listas, sendo o numero de descargas 485, tendo votado o presidente da mesa, e n'esta assembléa obteve o cidadão José Paulino de Sá Carneiro 383 votos e o cidadão Bento Teixeira 103.

Na assembléa de Torqueda o numero das listas entradas na urna foi de 369, sendo uma do presidente da mesa, e por isso conferem com o numero das descargas, que foi de 368, recaíndo no cidadão José Paulino de Sá Carneiro 290 votos, e 73 no cidadão Bento Teixeira de Figueiredo.

Na assembléa de S. Thomé do Castello entraram na urna 443 listas, incluindo a do presidente da mesa, sendo o numero das descargas 442, e obteve o cidadão José Paulino de Sá Carneiro 390 votos, contra 53 que obteve o cidadão Bento Teixeira.

Na assembléa de Constantim as listas entradas na urna em numero de 583, sendo duas listas brancas, conferem com o numero das descargas, recaíndo no cidadão José Paulino de Sá Carneiro 526 votos e no cidadão Bento Teixeira 55. D’onde resulta que o deputado eleito obteve em todas as assembléas de que se compõe o circulo 2:605 votos e o seu adversario 458.

Mostra-se ainda do processo que, nem nas assembléas primarias, nem na de apuramento, foi apresentado protesto ou reclamação alguma contra a validade da eleição, resultando do exame das differentes actas e cadernos, que tudo foi detidamente visto e confrontado, o convencimento de que o acto eleitoral correu regularissimo, com a mais pontual observancia das prescripções legaes.

Considerando porém que já depois de elaborado o respectivo parecer foi apresentado um protesto contra a validade da eleição, a vossa commissão, depois de o examinar detidamente e com a maxima circumspecção, passa a expor os fundamentos do protesto e os motivos em que se funda para o rejeitar por improcedente.

Allega-se no protesto apresentado pelos cidadãos Manuel Cerqueira, barbeiro, e Francisco de Oliveira, de officio soqueiro, trasladado na nota do escrivão e tabellião do juizo de direito de Villa Real, Pantaleão Pinto de Carvalho Osorio, em 22 de outubro do anno preterito, que os eleitores do circulo não votaram livremente, porque entre elles exerceram violenta pressão as auctoridade ecclesiastica e administrativa superior do districto, que por si e seus agentes ameaçaram os eleitores e os corromperam com promessas, vexando os povos, e intimidando os eleitores o escrivão de fazenda, conjuntamente com empregados fiscaes de fóra da comarca, chegando os agentes da auctoridade, na assembléa de Constantim, a mandar expulsar do templo, onde se procedia ao acto eleitoral, por homens armados de bacamartes, rewolvers, facas e punhaes os eleitores da opposição, que n'aquella assembléa constituiam numerosa maioria. Que a alteração das mesas não foi publicada nos cadernos do recenseamento, achando-se inscriptos no ultimo recenseamento como eleitores individuos que se não achavam no recenseamento anterior. E que finalmente a eleição não começou á hora marcada na lei, principiando na assembléa de Constantim ás sete horas e meia e nas outras assembléas depois das dez horas.

A vossa commissão, considerando que o protesto é improcedente, porque não fornece elementos de prova de nenhum dos factos arguidos.

Considerando que se taes intimidações ou violencias se tivessem praticado, sem duvida se teria usado da acção criminal contra os auctores de taes violencias, o que se não mostra;

Considerando que, se um simples protesto, tomado fóra das actas, e desacompanhado de prova com relação aos factos n'elle adduzidos, fosse bastante para invalidar uma eleição, poucas ou nenhumas eleições estariam ao abrigo de qualquer suspeita, e a força probatoria dos documentos authenticos em que se firma a validade do acto eleitoral seria facilmente illudida contra a expressa disposição da lei;

Considerando que das actas das assembléas primarias consta que a eleição começou ás nove horas da manhã, que é a hora marcada na lei;

Considerando que pelo exame minucioso de todos os processos das assembléas primarias se verifica que em todas ellas se procedeu á eleição com inteira liberdade e com a maxima legalidade;

Considerando que nem na acta do apuramento, nem nas acta das respectivas assembléas primarias se faz menção do protesto de que se trata;

Considerando que o deputado eleito obteve a maioria absoluta dos votos, e apresentou o seu diploma em devida fórma:

A vossa commisão é de parecer que seja proclamado deputado pelo circulo n.º 23 (Villa Real) o cidadão José Paulino de Sá Carneiro.

Sala da primeira commissão de verificação de poderes, 10 de janeiro de 1879. = Visconde de Sieuve de Menezes = Manuel Correia de Oliveira = Antonio Telles de Vasconcellos = Bernardo de Serpa Pimentel = Luiz de Lencastre = José Maria Borges = Agostinho José da Fonseca Pinto, relator.

Foi approvado sem discussão.

Occupou novamente a cadeira da presidencia o sr. Sá Carneiro.

O sr. Presidente: — Ha sobre a mesa cinco pareceres; tres impressos e dois que ainda o não estão. Não os posso pôr em discussão sem que algum membro da junta peça a dispensa do regimento.

Ha unicamente um parecer que póde entrar em discussão, mas os outros não podem entrar sem que a junta resolva.

Leu se na mesa o seguinte

Parecer

Senhores. — Á vossa primeira commissão de verificação de poderes foi presente o diploma do deputado pelo circulo n.º 16, Celorico de Bastos; e

Considerando que a eleição por aquelle circulo já foi approvada em sessão de 7 da corrente;

Considerando que o diploma apresentado está em fórma legal e em tudo conforme aos documentos que existem na commissão:

É de parecer que seja approvado o mesmo diploma e proclamado deputado da nação portugueza o cidadão Avelino de Sousa, eleito por aquelle circulo.

Sala da commissão, 13 de janeiro de 1879. = Visconde de Sieuve de Menezes = Bernardo de Serpa Pimentel = Agostinho José da Fonseca Pinto = Luiz de Lencastre = José Maria Borges.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para quarta feira é a discussão dos pareceres que estão impressos, e, se houver tempo, proceder-se-ha á proclamação dos srs. deputados.

Está levantada a sessão.

Eram tres horas e um quarto da tarde.

Documentos relativos á eleição pelo circulo n.º 76. (Ceia)

Ill.mo e ex.mo sr. - Ponho nas mãos de v. ex.ª o processo de syndicancia a que procedi no concelho de Ceia, em cumprimento do alvará do v. ex.ª de 16 do corrente e na conformidade da portaria do ministerio do reino de 8 do referido mez.

Desejando corresponder á confiança com que v. ex.ª me distinguiu e desempenhar dignamente a missão honrosa, embora ardua, de que v. ex.ª se dignou encarregar-me, esforcei-me por averiguar escrupulosamente e com a maior imparcialidade a verdade dos factos apontados no protesto do capitão do exercito Francisco Antonio Pinheiro Bayão.

No auto de syndicancia formulei em resumo e reduzi a

Página 59

59

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

quesitos, segundo v. ex.ª terá occasião de ver, todos os pontos de accusação contra a mesa eleitoral e administrador do concelho de Ceia, narrados no alludido protesto, e sobre elles ouvi e inquiri as testemunhas constantes do processo.

Pertencem as testemunhas inquiridas ás duas parcialidades era que o circulo se dividiu para a eleição de deputado, como consta dos proprios depoimentos, e algumas ha ainda que na luta eleitoral guardaram completa neutralidade. Não só me pareceu este o meio mais seguro de averiguação, pois que o conhecimento da verdade resultará mais facil e naturalmente da comparação d'estes diversos elementos de prova e da critica serena e imparcial exercida sobre elles, mas tambem reconheci a difficuldade, se não impossibilidade, de encontrar o numero suficiente do testemunhas idoneas que não houvesse tomado parte na luta eleitoral em um circulo onde ella se generalisou tanto e assumiu proporções tão desusadas.

É sabido que as ultimas luctas eleitoraes em differentes circulos do paiz foram caracterisadas pelo desenvolvimento de uma actividade expansiva que tendia a saír muitas vezes dos limites da ordem, do justo e da legalidade.

Não me compete avaliar a significação d'estes symptomas, nem discutir ou apreciar, sob um ponto de vista geral, as causas em que porventura elles possam filiar-se; mas não é indifferente na hypothese da questão registar o facto e acrescentar que elle se accentuou no circulo de Ceia, talvez mais do que em nenhum outro.

Com effeito a opposição n'este circulo tomou, durante a luta eleitoral, uma attitude tão desesperadamente hostil, que se tornava evidente para os que observavam os acontecimentos com animo mais despreocupado, que a sua idéa fixa era vencer a todo o custo; e este estado extraordinario de cousas teria infalivelmente originado conflictos e desordens graves, se aos excessos apaixonados do partido opposicionista não correspondesse por parte da auctoridade e dos que a apoiavam uma bem entendida tolerancia e prudencia.

Em todo o caso é certo que o procedimento do grupo da opposição tinha exaltado uns pela propaganda ousada, e provocado em outros por tal modo o espirito de reacção, que havia justo fundamento para receiar alguma cousa grave nas assembléas eleitoraes.

As ameaças de toda a ordem que a opposição aventara imprudentemente e as idéas insidiosas que pregava tinham creado nos espiritos uma exaltação pouco vulgar; e em vista d'este estado de cousas a presença da força militar parecia não só á auctoridade mas tambem ás pessoas mais cordatas uma medida prudente e até necessaria para manter a ordem e evitar conflictos. Em abono do que levo exposto poderia citar muitos factos, alguns dos quaes são geralmente conhecidos, mas abstenho-me de o fazer, principalmente porque não desejo afastar-mo demasiado do objecto immediato d'esta syndicancia.

Não devo passar em silencio uma circumstancia importante, qual é a parte activa que o chamado partido legitimista tomou em favor do candidato da opposição. O concelho de Ceia, foi um dos que mais celebres se tornaram outr'ora nas lutas travadas entre a liberdade e o despotismo, e é ainda hoje notavel pelo grande numero de sectarios daquelle partido.

Ou fosse por que o nome do candidato governamental e dos cidadãos que lhe prestavam apoio representavam accentuadamente o que póde chamar-se o partido popular e liberal do concelho de Ceia, ou fosse por outro motivo qualquer, a verdade é que aquelle elemento constituiu a parte mais importante da opposição no circulo de Ceia, e a sua intervenção directa, e demasiadamente pronunciada na luta eleitoral contribuiu muito para dar a esta a feição particular que todos lhe notaram.

Pareceu-me que esta exposição, aliàs resumida, do estado de cousas anterior aos acontecimentos da assembléa de Ceia não seria mera divagação.

Mal se poderiam comprehender e explicar estes acontecimentos sem os relacionar com os que os precederam e em que mais ou menos directamente se filiem.

Eu poderia terminar aqui, abstendo-me de quaesquer commentarios ácerca do auto de syndicancia, o qual será devidamente apreciado pela critica illustrada de v. ex.ª

Farei, no emtanto, ainda que succintamente, algumas observações baseadas nos depoimentos das testemunhas e nas informações fidedignas que pude colher.

A accusação principal e de maior gravidade contida no protesto do capitão Bayão é sem duvida o roubo violento da uma.

Antes de passar adiante deve notar-se que ha aqui inexactidão de phrase ou pouco rigor de linguagem, o que poderia dar logar a suppor-se que o capitão Bayão quiz denunciar um facto mui diverso do que realmente teve em vista. Mas a narração subsequente do protesto mostra claramente que esta accusação consiste em atribuir-se á mesa a falsificação ou viciação do acto eleitoral na leitura das listas e durante o escrutinio que se fez no dia 15 de outubro.

Todos são concordes em que até este acto a eleição correu com toda a legalidade, e até a suspeita que a opposição parece ter manifestado de que a uma fosse arrombada e viciada na noite de 14 para 15 desappareceu completamente em vista do exame que se lhe fez n'este dia, e a que assistiu até o poder judicial, bem como os cidadãos da opposição que haviam sellado a uma.

O auto de syndicancia, e nomeadamente a narração circumstanciada da 7.ª testemunha que por confissão propria foi um dos caudilhos da opposição, não deixou duvida alguma a este respeito.

A questão reduz-se, pois, a saber se o acto eleitoral foi ou não viciado durante o escrutinio a que se procedeu no referido dia 15.

Das vinte e uma testemunhas inquiridas nenhuma affirma que tal viciação tivesse logar. Apenas a 7.ª testemunha faz uma longa narração que parece ter por fim chegar a esta conclusão; mas não affirma que o escrutinio fosse viciado, nem o podia affirmar sem contradicção, pois que declara ter se retirado da igreja ao começar este acto.

O unico facto que cita e diz ter presenciado é ter o presidente da assembléa começado a extracção tirando uma mão cheia de listas da uma, facto que no dizer da testemunha se repetiu, segundo foi informado por algumas pessoas, sem que todavia cite o nome de uma unica.

Ha ainda tres testemunhas que dizem ter-lhes constado o facto por via de terceiras pessoas, cujos nomes citam, e é de notar que estas referencias dizem sempre respeito a algum dos caudilhos da opposição.

Em contraposição a isto depozeram quasi todas as outras testemunhas e nomeadamente a 9.ª, 12.ª, 13.ª, 20.ª e 21.ª, que foram presentes ao escrutinio desde o seu começo até ao fim, e que affirmam ter perfeito conhecimento, por ver e presencear, de que esta operação correu com toda a regularidade e n'ella foram observadas as disposições legaes.

É claro que as declarações mais ou menos vagas que fazem aquellas testemunhas em vista simplesmente do que lhes constou perdem toda a importancia e valor comprobativo diante das affirmações categoricas em contrario das testemunhas presenciaes.

Todos sabem como é facil em geral, e mormente em assumptos d’esta ordem, fazer correr um boato; e se a boa critica manda pôr em prudente reserva os factos e circumstancias que revestirem aquelle caracter, muito menos deve acceitar estes quando, como no caso presente, versam sobre um assumpto em que entram em jogo as paixões partidarias, e em que portanto é facil fazer correr circumstancias menos fundadas.

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 60

60

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

É de notar que, suppondo mesmo que se provava, o que não acontece, que o presidente havia com effeito praticado o acto de tirar da uma uma mão cheia de listas, a existencia d'este facto só por si, comquanto constituisse uma irregularidade, não seria sufficiente para demonstrar a viciação ou falsificação do acto eleitoral, cuja genuidade podia dar-se apesar d'aquella circumstancia; para se atacar aquella genuidade seria necessario demonstrar que deixaram de ser contados os votos que cada um tinha realmente na urna.

Ora nenhuma testemunha affirma, nem ao menos por lhe constar, que esta circumstancia tivesse logar, e bem pelo contrario muitas dellas, taes como as cinco já citadas, dizem ter perfeito conhecimento de que o escrutinio foi a fiel expressão da verdade, o que attestam por ver e presencear.

O proprio capitão Bayão no seu protesto não diz saber directamente que a leitura e contagem das listas deixasse de ser a expressão da verdade; limitando-se a dizer que «a opposição sabia que tinha mettido na urna pouco mais um certo numero de listas, mas os escrutinadores não... consentiram que ellas de lá saíssem». Isto reduz se, pois, a concluir para a falsificação do escrutinio, pelo facto de não ser contado ao candidato da opposição o numero de votos que este calculava e dizia ter na urna!

Evidentemente este argumento como meio de prova não merece ter longa discussão. A arguição que se refere á collocação da mesa e posição da uma cae completamente em face das attestações de quasi todas as testemunhas inquiridas.

Vê-se que a mesa estava collocada no sitio em que sempre foi costume collocar-se para taes actos, e que era facil o accesso a ella bem como a fiscalisação dos actos eleitoraes, é tanto que um grande numero de testemunhas estiveram junto d'ella presenceando o escrutinio, bem como muitas outras pessoas, segundo declaram as mesmas testemunhas.

Apenas a 7.ª testemunha diz que a elle e outros cidadãos da opposição foi prohibido estar junto da uma em sitio em que podessem fiscalisar bem os actos do escrutinio, e que por isso se retirára com os alludidos cidadãos.

Mas o que resulta claramente do auto é que o presidente, receiando actos de violencia contra a sua pessoa e contra a mesa, tomou algumas medidas de policia, taes como mandar revistar certos individuos para verificar se vinham armados, e não consentir que ninguem se collocasse por de traz d'elle; mas não admitte duvida que designasse local onde se podia perfeitamente ver e examinar o escrutinio.

A circumstancia de ser vista a uma em posição horisontal é cabalmente explicada por grande numero de testemunhas que attestam que, em rasão de ficar a uma muito alta, o presidente se via obrigado a inclinal-a sempre que extrahia d'ella uma lista. Mostra igualmente o auto que nenhum cidadão foi preso pelo administrador do concelho, e apenas a 7.ª testemunha diz que aquella auctoridade chegára a dar a voz de prisão a um cidadão.

Não admitte duvida alguma que a força militar foi postada dentro da igreja e disposta em duas alas, conservando-se ali durante o escrutinio. Mas não está averiguado, nem se prova que o administrador fizesse a requisição em nome do presidente; antes pelo contrario parece fóra de duvida, em face de muitos depoimentos, que o capitão Bayão entrou na igreja com a força do seu commando, em virtude de se haver entendido directamente com o presidente e julgar que as circumstancias demandavam aquella medida.

Quanto ás circumstancias que poderiam dar logar a esta medida é incontestavel que havia fortes fundamentos para receiar attentados e violencias graves por parte de alguns individuos da opposição.

Basta ler attentamente e com animo despreoccupado as narrações de muitas testemunhas inquiridas no auto de syndicancia para se chegar a este resultado.

Eu já tive occasião de fazer notar em geral qual era o estado de cousas anterior á eleição. A altitude ousada e até aggressiva da opposição durante a luta eleitoral, e os rumores de projectadas violencias e attentados que correram com uma certa verosimilhança, a julgar pelos precedentes, tinham sobresaltado bastante os espiritos e dado logar a fortes suspeitas de que com effeito se tramasse e pozesse em execução algum plano criminoso na assembléa de Ceia.

Os acontecimentos da assembléa de Sameice, e principalmente o attentado contra a vida do administrador na de S. Gião, factos a que se referem muitas testemunhas, tinham concorrido poderosamente, e com rasão, para alarmar os espiritos e incutir fortes receios.

A tudo isto veiu juntar-se a circumstancia de na noite de 14 para 15 de outubro se reunir nas proximidades do templo em que se achava a uma da assembléa de Ceia, guardada, por um diminuto numero de soldados, um numeroso concurso de influentes da opposição acompanhados de varios individuos, sentindo-se por essa occasião dois tiros disparados ao pé da igreja.

Todas as testemunhas que mencionam este acontecimento são concordes em attribuil-o a individuos da opposição, e acrescentam que elle teve por fim incutir terror na guarda para realisarem o roubo da uma. Só a 7.ª testemunha referida n'esta exposição já mais de uma vez, attribue o facto ao partido contrario.

Mas a versão das outras testemunhas offerece mais garantias de verdade, alem de outras rasões, por ser mais natural.

A este tempo já se tinha concluido a eleição nas outras assembléas e era sabido o resultado d'ella que dava á opposição uma certa maioria obtida n'essas assembléas. Bastava só verificar a votação na assembléa da villa do Ceia, e onde todos sabiam que o candidato governamental obteria grande maioria.

A propria opposição confessava isto mesmo, e as declarações da 7.ª testemunha, que n'este ponto não póde ser suspeita, attestam que era esta a opinião do partido opposicionista, e chega mesmo a dizer que elle contava que esta maioria fosse de mais de 200 votos.

Sem ser preciso explanar os motivos, pois que são obvios, é natural, dadas aquellas circumstancias, que o partido governamental tivesse todo o cuidado e interesse em que as cousas corressem na assembléa de Ceia com ordem e legalidade; ao passo que, e por uma rasão contraria, a opposição devia pensar de modo diverso, pois é certo que nada tinha a perder se um acontecimento qualquer viesse pôr em duvida ou mesmo annullar a eleição d'esta assembléa. Alem de que, se o acontecimento dos tiros deve ser attribuido a alguem do partido governamental com o fim de afugentar das proximidades do templo a gente da opposição para conseguirem o roubo da uma; como é que se explica que tendo o administrador com effeito, depois de tal acontecimento, feito retirar d'esse local, com o auxilio da pequena força que então tinha á sua disposição, a gente que estava em volta do templo, como se explica, repito, que, apesar de se haver conseguido isso, a uma estava no dia seguinte intacta, como foi verificado por todos?

Continuando na apreciação das circumstancias que precederam a entrada da força na igreja, é incontestavel que uma grande multidão, composta dos chefes da opposição, acompanhados do individuos suspeitos e de outros conhecidos por maus precedentes, entrou tumultuariamente na igreja.

Pretenderia a opposição por este meio provocar medidas que dessem logar aos seus protestos, ou incutir terror e introduzir a desordem, com o fim de inutilisar ou viciar a eleição d'esta assembléa?

As testemunhas vão mais alem, como póde ver-se do auto,

Página 61

61

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

e é certo que este manejo da opposição não póde rasoavelmente ser attribuido a uma simples precaução de defeza pessoal, pois que o procedimento anterior da auctoridade e dos que a apoiavam, não justificava a necessidade de se fazer acompanhar por gente d'aquella ordem. O proprio capitão Bayão confessa no seu protesto, que a prudencia e cordura que notou na auctoridade, lhe inspirou a maior confiança e lhe mereceu o melhor conceito.

Foi n'aquella conjunctura que a força entrou na igreja.

É fóra de duvida que nem a auctoridade nem o presidente da assembléa fez uso da força, e que ella tomou posição por fórma a deixar livre o accesso á uma, e bem longe de concorrer com a sua presença para afugentar os eleitores, fez restabelecer a confiança e socegar os espiritos sobresaltados de muitos eleitores, que só então entraram na igreja, segundo as declarações das testemunhas.

Se alguns chefes da opposição se retiraram, não foi porque a isso fossem coagidos com ou sem o auxilio da força publica, mas sim pelos motivos já expostos e que constam circumstanciadamente dos depoimentos.

Se os individuos que os acompanharam tiveram de saír, é porque não quizeram sujeitar-se a ser revistados, para ver se vinham armados, como se suppunha.

Com relação ao procedimento do capitão Bayão, depõem muitas testemunhas cousas graves, como v. ex.ª terá occasião de ver; e em vista d'esses depoimentos e das informações que colhi, fiquei convencido de que elle andou imprudentemente e faltou á missão que lhe incumbia como commandante da força militar.

Ao terminar esta exposição, cumpro um dever, fazendo aqui menção do zêlo e desinteresse com que o digno escrivão da administração de Ceia, Antonio Saraiva da Costa Ribeiro, me prestou os seus bons serviços e me auxiliou nos trabalhos de syndicancia a que procedi.

Deus guarde a v. ex.ª Guarda, 27 de novembro de 1878. = Ill.mo e ex.mo sr. governador civil do districto. = O administrador syndicante, José Pereira Monteiro.

Copia do auto de syndicancia, ordenado por portaria do ministerio do reino de 8 de novembro de 1878

Alvará

O visconde de S. Pedro do Sul, governador civil do districto da Guarda, etc...

Em harmonia com as determinações da portaria do ministerio do reino, de 8 do corrente mez, mando que o administrador do concelho da Guarda, bacharel José. Pereira Monteiro, se apresente no concelho do Ceia, e proceda ali a uma syndicancia minuciosa, ácerca dos actos de violencia que o capitão do exercito Francisco Antonio Pinheiro Bayão, em um protesto publicado no n.º 1:472 do Jornal de Vizeu, diz terem-lhe sido exigidos, e que se praticaram na assembléa eleitoral de Ceia, por occasião da eleição de deputados por aquelle circulo, devendo levantar auto em que sejam inquiridas todas as testemunhas que possam, com verdadeiro conhecimento de causa, depor sobre os factos mencionados no referido protesto.

Ordeno portanto ao administrador substituto do concelho do Ceia, e a quaesquer auctoridades administrativas do mesmo concelho a que este for presente, que satisfaçam a qualquer requisição que o funccionario syndicante lhes fizer, e lhes prestem toda a coadjuvação de que carecer no desempenho da commissão do que vae encarregado.

Dado e passado na Guarda, sob meu signal e sêllo das armas do governo civil, aos 16 de novembro de 1878. = Visconde de S. Pedro do Sul.

Apresentado n'esta administração no dia 18 de novembro de 1878, e entregue ao ex.mo administrador syndicante para os devidos effeitos.

Portaria

Ministerio do reino - Direcção geral de administração politica e civil — 1.ª Repartição — N.° 10 — N.° 250. — Manda Sua Magestade El-Rei remetter ao governador civil do districto da Guarda o n.º 1:472 do Jornal de Vizeu, de 31 de outubro ultimo, em que vem publicado um protesto do capitão do exercito Francisco Antonio Pinheiro Bayão, pelos actos de violencia que diz terem-lhe sido exigidos, e que se praticaram na assembléa eleitoral do Ceia por occasião da eleição do deputado por aquelle circulo, a fim de que o mesmo magistrado faça proceder por um administrador de concelho de sua confiança, a uma syndicancia minuciosa ácerca dos factos mencionados n'aquella correspondencia, em que deverão ser inquiridas todas as testemunhas que possam, com verdadeiro conhecimento de causa, depor sobre similhante assumpto. Determina outrosim o mesmo augusto senhor, que visto ser o administrador do concelho de Ceia o principal syndicado, o governador civil lhe designe logar fóra dos limites do respectivo concelho, emquanto durarem as diligencias da mesma syndicancia, e isto sem prejuizo de procedimento criminal que por taes factos tenha sido ou deva ser instaurado.

Paço da Ajuda, em 8 de novembro de 1878. = Antonio Rodrigues Sampaio.

Protesto que, em nome da classe militar, faz o capitão do exercito Francisco Antonio Pinheiro Bayão, pelos actos de violencia que lhe foram exigidos na assembléa eleitoral de Ceia.

Quando o codigo militar me não impozesse o dever do pugnar pelo decoro da classe militar, impunham-me esse dever a minha consciencia e a minha dignidade. Os factos que vou narrar, succedidos quando eu era commandante de uma força isolada, são de tal e tão extraordinaria gravidade, que me justificam de empregar este meio publico e solemne para me desaggravar.

Sobre o meu nome pésa n'este momento uma accusação gravissima, que se repete em todos os pontos do paiz, e para me justificar da qual não seria sufficiente a decisão de qualquer tribunal ordinario. Em casos tão excepcionaes como aquelles que vou relatar, só a opinião publica do paiz é tribunal competente.

Fui nomeado commandante da força que se julgou ter sido pedida para manter a segurança publica no concelho do Ceia, durante a ultima eleição; e é voz publica em todo o paiz que a uma foi roubada violentamente, e que o foi com o auxilio da força do meu commando. E é verdade que assim aconteceu. Commetteu-se em Ceia uma inaudita violencia, com o apoio da força publica que eu commandava, succedendo assim que, mau grado meu, quando suppunha ter sido nomeado para o cumprimento de um dever, foi-me exigido, e em circumstancias taes que não podia esquivar-me, que representasse o mais indigno papel n'aquelle escandaloso acto da eleição em Ceia.

E em nome da classe militar, cujos brios foram offendidos pelo administrador do concelho de Ceia, Elisiario Vaz Preto Casal e pelo presidente da assembléa eleitoral, Amandio da Motta Veiga, que eu venho protestar perante a opinião publica.

A guia de marcha que me fôra dada dizia que eu marchava em diligencia a Ceia — «a fim de auxiliar o administrador do concelho, ás ordens de quem me conservaria, na manutenção da ordem publica, por occasião da eleição de deputados». Chegado a Ceia, e achando ausente o administrador do concelho, apresentei-me a quem o substituiu.

O administrador do concelho tinha requisitado 100 homens!... Não se contentava com menos para poder... manter a ordem publica. A minha força, de 50 praças sómente, pareceu pequena, e disseram-me mesmo que ella apenas bastaria para uma das assembléas eleitoraes do circulo. Forçoso foi, porém, contentarem-se com tão pouco, e foi-me requisitado que dividisse a força do meu commando em quatro fracções, uma para a freguezia de S. Gião, outra para a de Sameice, outra para ficar na cabeça do concelho; e exigiu-se como cousa urgente que marchassem na

Sessão de 13 de janeiro de 1879.

Página 62

62

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mesma noite. A força já tinha tres dias de marcha e tinha direito a um dia de descanso, segundo o regulamento; as circumstancias do paiz foram-me, porém, descriptas com coros tão lugubres, que entendi do meu dever satisfazer a tal requisição. Não me competia commandar em pessoa nenhuma das fracções que foram destacadas, mas não querendo ficar ocioso emquanto as praças do meu commando iam prestar serviços talvez arriscados, offereci-me a auxiliar o administrador do concelho, na freguezia onde fosse julgada mais ameaçada a segurança publica. Sendo me dito que na freguezia de S. Gião, onde já se achava o administrador do concelho, havia mais rasão para receiar grave perturbação da ordem, para lá me encaminhei, acompanhado por 13 praças commandadas por um sargento.

Chegado a S. Gião na madrugada do dia 13 do corrente, depois de uma marcha nocturna, apesar de cansados eu e os meus soldados, por termos feito duas marchas em vinte e quatro horas, puz-me com a melhor vontade á disposição do administrador do concelho para o auxiliar. Devo dizer que o acto eleitoral correu com exemplar regularidade, e que nem dentro nem fóra da igreja houve um só successo que justificasse os receios da auctoridade administrativa. Não foi pedido nem preciso o auxilio nem de um só soldado. O procedimento do administrador do concelho pareceu-me a tal ponto serio, circumspecto e digno, que me fez conceber da sua pessoa o mais elevado, conceito.

De noite, porém, havendo reciprocas suspeitas de más intenções, entre os partidarios do candidato ministerial e os do grupo opposto, foi me requisitada a força toda para ficar de guarda n'uma casa perto da igreja, e fornecer sentinellas para guarda da uma, a qual alem d’essa guarda ficou vigiada por pessoas escolhidas em ambos os partidos, as quaes pernoitaram na igreja, cujas portas foram fechadas. Eram tão pronunciados os receios do administrador do concelho com relação á perturbação da ordem publica, que eu rondei toda a noite nas immediações da igreja, e só succumbi á fadiga pelas tres horas da manhã. Antes d'isso, á uma hora da noite, o administrador recebeu denuncia de que por parte da opposição se projectava arrebatar a uma. Sendo-me requisitado o auxilio de toda a força, entrei com ella e com o administrador do concelho dentro da igreja, e mandei cruzar bayonetas em defeza da uma que se julgava ameaçada. Por essa occasião empreguei todos os meios possiveis para aquietar os animos das pessoas presentes dentro e fóra da igreja; e depois que reciprocas explicações puzeram fim a este incidente, mandei retirar a força, deixando sómente as sentinellas. Um conflicto mais serio que tivesse tido logar n’aquella occasião poderia ter tido graves consequencias que se sentiriam em todo o concelho de Ceia. Julgo-me, portanto, feliz em ter contribuido para que tal conflicto não succedesse.

Receei que aquelle acto por mim praticado na igreja, sendo mal interpretado pelas pessoas do grupo opposicionista, contra o qual mandára cruzar bayonetas quando suspeito de querer violar a uma, me trouxesse odios immerecidos. Por isso resolvi-me a não passar pela freguezia de Sandomil, que é o caminho mais seguido de S. Gião para Ceia, por ser n’aquella freguezia que predominava o partido opposicionista, que me diziam estar exaltado até aos ultimos excessos, e que poderia, julgava eu, insultar a força na sua passagem. O proprio administrador do concelho que regressou a Ceia antes de mim, não quiz passar por aquella freguezia com receio de que o maltratassem. Quando, porém, me achava occupado em tomar informações ácerca do melhor itinerario a seguir, dirigiu-se a mim um cavalheiro que me disso estar incumbido pelas principaes pessoas de, Sandomil, interessadas na opposição, as quaes me agradeciam a maneira como tinha procedido, e me convidavam a que na minha passagem por aquella freguezia procurasse algum d’elles para me renovarem pessoalmente o seu agradecimento. Em vista d'isto resolvi-me a passar por Sandomil, e ali procurei ver uma das indicadas pessoas, á qual disse que nenhum agradecimento merecia, porque não tinha feito senão cumprir o meu dever.

Tinha combinado com o administrador do concelho o partir de S. Gião no dia 15 ás seis horas da manhã, a fim de ir ainda assistir ao apuramento eleitoral na assembléa do Ceia. Seriam porém, tres horas da manhã, quando, acordado bruscamente, recebi da parte do administrador do concelho, que já se achava em Ceia, a seguinte requisição laconica e concisa, como costumam sel-o os escriptos desta natureza em circumstancias urgentes.

«...Sr. É preciso que a força esteja aqui ás oito horas da manhã. Dê v. as suas ordens para aquelle fim.

«Ceia, 14-10-78. De v. etc.... O administrador, E. V. Casal. »

Em vista d'esta requisição, e impressionado pelo que ouvira dizer a respeito do estado revolucionario de Ceia, julguei que tinha soado a hora da guerra civil, e puz-me em marcha immediatamente, acompanhado pela pequena força que tinha á minha disposição. O alto conceito que o administrador do concelho me tinha merecido pelos seus actos em S. Gião impediam-me de ver n'esta requisição de tropa algum outro motivo que não fosse serio e digno. Pensei que só graves acontecimentos poderiam ter inspirado uma reaquisição tão urgente.

Chegado a Ceia encontrei já formada á porta da igreja toda a força que ali existia, a qual era constituida pela pequena guarda de um cabo e sete soldados que nunca havia saído de Ceia onde tinha ficado para guardar a uma de noite, se fosse preciso, e mais força que havia já recolhido da assembléa de Sameice. A força toda commandada por um sargento achava-se com as armas carregadas, precaução que tinha sido exigida, segundo me disseram, por ter havido durante a noite antecedente indicios de tentativa de assalto á uma, e até mesmo alguns tiros de espingarda. A força que ía commigo aggregou-se á que já lá estava, e tomei o commando de toda ella. Alem da força de infantaria do meu commando achava-se proximo da igreja uma força de cavallaria n.º 8, composta de um sargento e dez praças montadas. Eram oito horas da manhã pouco mais ou menos, quando cheguei e encontrei as cousas n'esta disposição.

Dentro da igreja estavam já reunidas as pessoas que constituiam a mesa eleitoral para procederem á abertura da uma e leitura das listas; estavam dentro e fóra da igreja muitos individuos. O administrador do concelho entrava e saía da igreja em diligencias, suppuz eu, do seu serviço. Quando eu estava, ainda procedendo a informações sobre os acontecimentos anteriores que tinham dado causa a um tal apparato de precauções, que me levava a crer que de um momento para o outro se esperavam graves acontecimentos; = quando ora entrava na igreja para ver o que lá se passava, ora saía fóra a colher informações do sargento meu immediato, recebi inesperadamente do administrador do concelho, em plena assembléa eleitoral, dentro da igreja, na presença do presidente, da mesa, e em nome d’elle, requisição para entrar immediatamente na igreja com toda a força que se achava postada junto á porta. Recebendo uma requisição de tal ordem, na presença de uma assembléa numerosa, dada por um magistrado administrativo, que pelo seu cargo, e pelo modo como havia procedido em S. Gião, me inspirava o maior respeito, entendi que algum acontecimento já conhecido que eu ignorava, ou alguma suspeita seriamente fundada exigia aquella demonstração de força. Eu ignorava todos os acontecimentos succedidos ou esperados, não tinha noticia da força que tinha ido a Loriga, e a qual não tinha ainda recolhido, sendo possivel que n'aquella freguezia, que me haviam pintado como extremamente agitada, tivesse havido algum conflicto. Confiado, porém, nas qualidades pessoaes que julgava ter visto no administrador do concelho, e sem suspeitar das suas malevolas intenções, pareceu-me que qualquer hesitação da minha parte seria perigosa para a segurança publica, e por

Página 63

63

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

isso mandei entrar na igreja toda a força. Uma parte d'ella tinha ainda as armas carregadas, mas desde a noite antecedente e pelos motivos já expostos.

Eu estava, segundo dizia a minha guia de marcha, á disposição do administrador do concelho. Este, ao intimar-me tal requisição, invocou a auctoridade do presidente da assembléa que o ouviu e o não desmentiu. A ordem não me foi dada por escripto nem eu a exigi, porque a urgencia das circumstancias me pareceu dever ser tal, que o tempo gasto n'essa formalidade seria perdido. Alem d'isso as instrucções militares insertas na ordem do exercito n.º 48 de 1870 dizem expressamente que a ordem por escripto se dispensa quando for dada diante de testemunhas, e ali havia como testemunhas as pessoas que constituiam uma numerosa assembléa. Não me pareceu essencial portanto a ordem por escripto, e mesmo que o fosse era ao administrador que competia pedil-a ao presidente da assembléa, de quem recebêra a ordem e m'a transmittíra a mim, que tinha sido posto á sua disposição.

Perguntar lhe quaes eram os acontecimentos graves succedidos ou esperados, que justificavam a entrada da tropa na igreja pareceu me n'aquelle momento poder ser tomado como interferencia no desempenho dos seus deveres. Entrei portanto na igreja, e mandei collocar a tropa conforme o administrador do concelho lhe indicou que era necessario. Só muito mais tarde, quando mais socegadas no meu espirito as perturbações da rasão, que acontecimentos d’esta ordem sempre produzem, é que percebi que o fim a que se destinavam estas precauções militares era não o satisfazer a qualquer necessidade de ordem publica, mas a proteger um acto fraudulento, criminoso e indigno, qual era a falsificação do acto eleitoral.

O escrutinio não tinha principiado ainda quando me foi requisitado que mandasse entrar a força. Nem dentro nem fóra da igreja havia indicios de desordem. Havia simplesmente grupos de individuos, mas em attitude pacifica; perto da mesa alguns individuos, que mais tarde soube serem eleitores, discutiam com o presidente da assembléa e administrador do concelho; e só mais tarde soube que o assumpto da discussão era o quererem elles conservar-se junto da mesa, para fiscalisar os actos eleitoraes, e não lhes ser isso consentido.

Ao entrar a força na igreja requisitou-me o administrador, sempre em nome do presidente da mesa, que collocasse duas fileiras, uma de cada lado da igreja. Estas fileiras entre as quaes ficava quasi todo o corpo da igreja, eram destinadas a impedir que qualquer individuo estranho á mesa ultrapassasse uma certa linha que se achava perto da porta principal, a qual se conservou sempre fechada, estando aberta sómente uma lateral. O espaço vedado comprehendia toda a igreja menos uma estreita zona junto á porta principal. Um eleitor, que insistia em conservar-se junto á mesa, foi preso pelo administrador do concelho. Preparadas assim as cousas, e tendo-se dirigido varias pessoas ao administrador do concelho protestando pelos seus direitos, este lhes respondeu que cumpria as ordens do presidente da mesa.

Alguns eleitores, ao verem frustradas as suas diligencias para conseguirem o approximar-se da mesa, clamaram em voz alta contra aquella violação que se fazia aos seus direitos e declararam que abandonavam a igreja e a eleição, e que iam protestar. Este acto pacifico e legal, assim praticado por gente que eu ouvira classificar como revolucionaria, e n'um estado de exaltação que ameaçava a ordem publica; este acto nobre e digno, praticado pela gente da opposição, foi para mim um raio de luz que entrou no meu espirito perturbado. Comecei a desconfiar de que os unicos revolucionarios em Ceia eram o administrador do concelho e os seus amigos, e que eu estava ali em nome da obediencia passiva representando um indigno papel, o papel de sicario.

Subiu-me a côr ao rosto, envergonhei-me por mim, pela classe militar e pelo paiz, ao achar-me ali inesperadamente, eu official do exercito, investido no commando de tropa, forçado a assistir a um acto criminoso, e dar-lhe o auxilio da força, publica, que é só destinada a defender as leis.

Lembrei-me de protestar ali mesmo contra este facto inaudito saíndo da igreja, e abandonando em seguida o concelho do Ceia, indo protestar perante os poderes publicos contra os que de mim tinham exigido, em nome da obediencia passiva, que me tornasse cumplice n’uma acção criminosa. Cheguei a perguntar ao meu immediato, o segundo sargento Aguiar, se os soldados tinham ali todos os artigos do seu uniforme e equipamento para uma marcha immediata. Felizmente respondeu-me que não, e por isso resolvi-me a deixar continuar o acto, e protestar contra elle depois de consummado. Lembrou-me tambem que a minha saída da igreja poderia ser causa de alguma perturbação. Quem me assegurava, com efeito, que os individuos que tinham abandonado a igreja para irem protestar, diziam elles, se tinham ou não ido armar, e que vendo a igreja desguarnecida entrariam n'ella para commetterem algum desacato? Seria enorme então a minha responsabilidade. Só mais tarde, e depois d'estes acontecimentos, é que soube que elles tinham com effeito ido protestar, e que não tinham sequer pensado em resistir por meio da força a tão solemnes actos de provocação!

Nos primeiros momentos, quando vi a insistencia de alguns eleitores em quererem approximar-se da uma, ainda procurei fazer ver ao administrador do concelho que aquella exigencia era legal, mas elle respondeu-me bruscamente, que eram aquellas as ordens do presidente da mesa, que a opposição tinha suspeitado os eleitores governamentaes de quererem de noite roubar a uma, e que por isso «a uma provocação se respondia com outra»; poderia ter-lhe respondido, que a força publica não era destinada a provocar ninguem, mas no estado de perturbação em que me achava, nem isso me lembrou. Entreguei-me á sorte dos acontecimentos.

Durante cinco horas a força do meu commando esteve condemnada a permanecer a pé firme, assistindo á perpetrarão de um escandalo inaudito. A mesa estava collocada em sitio onde era impossivel a fiscalisação que aos eleitores incumbe. A uma em vez de estar de pé, esteve deitada, e com a bôca virada para o peito do presidente. Alem da uma, e encobrindo-a toda, estava sobre a mesa um grande caixão, o que tinha servido para conter a uma de noite. Este caixão de grandes dimensões, interceptava completamente a vista e impedia que fossem vistas pelo publico a uma e as operações que com ella se faziam. A minha indignação n'um certo momento foi tal, que não pude conter-me. Aproximei-me do presidente da mesa, e disse-lhe pouco mais ou menos o seguinte: «A força publica não serve para isso. A uma está deitada, e ninguem póde ver se as listas saem d’ella ou da sua algibeira». O presidente respondeu-me não me lembra o quê, e poz então a uma em pé. O acto eleitoral correu, pois, n'estas circumstancias, e teve por conclusão o que era de esperar. A opposição sabia que tinha mettido na urna pouco mais ou menos um certo numero de listas, mas os escrutinadores não consentiram que ellas de lá saíssem. E esta enormissima fraude, este indigno attentado contra as liberdades publicas, esta provocação á desordem, foi commettida com o auxilio e a protecção da força armada, commandada por mim e em nome da obediencia passiva!

Fechadas e lidas as actas falsas d'aquella escandalosa sessão e consummado aquelle audacioso ultrage á decencia publica, retirei com a força do meu commando, resolvido a protestar immediatamente e por qualquer fórma contra o acto, a mim requisitado, de criminosa cumplicidade n'um crime publico. Eu era hospede do administrador do concelho, e o brio militar, por elle tão gravemente insultado na minha pessoa, não me permittia continuar a sel-o. Mandei,

Sessão de 13 de janeiro de 1879.

Página 64

64

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

pois, buscar tudo quanto tinha no quarto que estivera á minha disposição.

Logo que saí da igreja e mandei dispersar a força, dirigi-me á residencia do juiz da comarca, a fim de protestar perante elle contra aquelles que tinham usado da força do meu commando para os auxiliar em tão ignominioso acto. Ia tambem pedir-lhe que me hospedasse, visto que a minha dignidade não permittia que continuasse residindo em casa do administrador do concelho.

Quando ía em caminho fui encontrado por um official de diligencias, portador de um officio do meritissimo juiz, no qual eu era intimado para comparecer no dia seguinte como testemunha d'aquelles acontecimentos, acompanhado dos sargentos meus subordinados. Apesar d'isso continuei no meu caminho até á residencia daquelle magistrado, e declarei-lhe que a minha intenção fôra sempre protestar eu mesmo, em nome da classe militar, contra o ultrage que me havia sido feito, mas que visto haver já em juizo um requerimento no qual eu era citado como testemunha, compareceria como tal, reservando me para mais tarde protestar por outra fórma. Não podendo aquelle magistrado hospedar-me em sua casa, por não ter quarto disponivel, fui procurar o delegado da comarca, a quem fiz igual pedido, o qual tendo sido satisfeito, estabeleci a minha residencia em sua casa. Não quiz procurar hospedagem em nenhuma casa particular, porque não conhecendo ali ninguem, poderia succeder que fosse ter a casa de alguma pessoa que não fosse insuspeita, como o eram aquelles dois magistrados. Á maneira obsequiosa como fui tratado por um e outro d'estes funccionarios publicos, o ex.mo juiz dr. Eduardo Coelho e o ex.mo delegado dr. Toscano, quando eu funccionario publico tambem, collocado em circumstancias excepcionaes, lhes fui, sem que os conhecesse, pedir asylo, não é esta a occasião de agradecer. Espero, porém, que ainda viverei o tempo sufficiente para poder provar lhes o meu reconhecimento.

Logo que me achei installado, escrevi ao administrador do concelho um officio n'estes termos:

«Ill.mo e ex.mo Sr. - Rogo a v. ex.ª se sirva de me dispensar de continuar a acceitar a hospedagem official que me ofereceu, e da qual me tenho utilizado. A maneira como o acto eleitoral correu hoje na igreja, exigindo-se que a força publica, só destinada a manter a ordem, protegesse um acto de coacção aos eleitores, obriga-me a rogar-lhe, em nome da classe militar, que não requisite de mim mais actos da mesma especie, e me permitta o retirar-me amanha com a força do meu commando. — Acantonamento em Ceia, 15 de outubro de 1878. - (A) F. A. Pinheiro Bayão.

No dia seguinte fui depor no tribunal, e depozeram os meus immediatos. O que eu declarei, e que elles declararam, e que terá sido de certo confirmando por todas as testemunhas inquiridas em seguida é sufficiente, creio eu, para que os tribunaes imponham aos réus uma pena tão grave como os seus crimes. Estamos, porém, n'um paiz, onde taes sentenças se não cumprem, porque o poder moderador cobre sempre os criminosos d'esta especie com o seu manto de misericordia; e isso explica o ponto a que chega a audacia d'aquelles que têem a impellil-os ao crime, alem da perversidade natural, a certeza da impunidade.

No dia seguinte recebi do quartel-general um telegramma, ordenando-me que recolhesse ao corpo immediatamente, deixando em Ceia dezoito praças e um sargento; e recebeu ordem de marchar para Ceia o tenente de cavallaria 8, Antonio Baptista Lobo, com vinte e cinco praças e outros tantos cavallos que commandava em Gouveia, para onde, como eu, tinha sido mandado em serviço eleitoral. Contei a este official que me ficou substituindo tudo quanto havia succedido, e retirei-me. Não sei o que se passou depois. Sei sómente que tambem aquelle official foi mandado retirar de Ceia, provavelmente porque não quiz satisfazer a alguma exigencia absurda. Ficaram portanto em Ceia sómente dois sargentos, um de infanteria, outro de cavallaria, e a historia não diz ainda se elles conseguiriam ou não ser honrados com a confiança do administrador de Ceia.

Protestando perante a opinião publica contra os factos mencionados, que são de escrupulosa verdade, o meu fim não é requerer o castigo dos culpados. Sei que seria baldado empenho. Não é tambem concorrer para que seja annullada a eleição de Ceia, pois sei que as normas de honra e decencia pelas quaes se regulam os parlamentos não são as mesmas que regulam a vida commum. O meu fim é sómente desaggravar a classe militar do vexame que soffreu na minha pessoa e na dos meus commandados.

Ao meu officio já citado, escripto ao administrador do concelho, respondeu-me elle o seguinte:

«Envio devidamente assignada a guia que acompanhou o officio inconveniente de v. que hontem ao anoitecer recebi, e a que não devo responder.» — Mas apesar de «inconveniente» esse officio estava bem longe de exprimir a indignação de que me achava possuido. Bem pouco disse eu n'um caso de tanta gravidade, mas se tão pouco disse então, foi porque me reservava dizer o resto de algum modo mais publico e mais solemne.

Guarda, 20 de outubro de 1878. Francisco Antonio Pinheiro Bayão, capitão de infanteria 12.

Auto de syndicancia

Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 19 dias do mez de novembro, n'esta villa de Ceia, e na secretaria da administração do concelho, aonde se achava o dr. José Pereira Monteiro, administrador do concelho da Guarda, em commissão regia n'este de Ceia, commigo escrivão de seu cargo, para o fim de proceder a este auto de syndicancia ácerca dos actos de violencia que o capitão do exercito, Francisco Antonio Pinheiro Bayão, em um protesto publicado no Jornal de Vizeu n.º 1472, e que com a portaria do ministerio do reino, que ordenou esta syndicancia, e alvará do governo civil d'este districto, fica fazendo parte d'este mesmo auto, diz lhe foram exigidos na assembléa eleitoral d'esta dita villa, por occasião da eleição de um deputado por este circulo n.º 76; sendo os factos mais importantes mencionados no alludido protesto os seguintes:

1.º Que a uma fôra roubada violentamente com o auxilio da força publica, commandada pelo capitão do exercito Francisco Antonio Pinheiro Bayão.

2.° Que o referido capitão Bayão recebêra do administrador d'este concelho, o dr. Elisiario Vaz Preto Casal, sem o esperar, em plena assembléa eleitoral, na presença do presidente da mesa, e em nome d'este, ordem para entrar immediatamente na igreja com toda a força do seu conluiando, que se achava postada á porta da mesma igreja.

3.° Que aquella ordem ou requisição fôra feita nos termos legaes, e em circumstancias que o mesmo capitão commandante da força não póde eximir-se ao seu cumprimento.

4.º Que na occasião em que a força armada entrou na igreja, aonde se achava reunida a assembléa eleitoral, não havia indicios de desordem.

5.° Que a força armada, depois de entrar na casa da assembléa eleitoral, occupára a posição que lhe foi indicada pelo administrador do concelho, conservando-se n'ella até que terminaram os trabalhos eleitoraes.

6.º Que durante o acto eleitoral, e depois da força armada se achar na casa da assembléa, fôra ali preso um cidadão eleitor que insistia collocar-se junto da mesa.

7.° Que depois d'estes factos alguns cidadãos se dirigiram ao administrador do concelho, protestando contra elles; porém que esta auctoridade os desattendêra, dizendo-lhes que sómente cumpria as deliberações do presidente da mesa, em virtude do que, e vendo frustradas as suas diligencias, os mesmos cidadãos clamaram em voz alta contra uma tal violação dos seus direitos, e declararam que abandonavam a eleição, saíndo em seguida da igreja.

Página 65

65

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

8.° Que a mesa se achava collocada em sitio que era impossivel aos eleitores exercerem a fiscalisação precisa durante o escrutinio a que se procedia; estando a uma em posição horisontal sobre a mesa, em logar da posição perpendicular em que devia estar.

9.° Que o referido capitão commandante da força armada fôra sempre solicito no cumprimento dos seus deveres, tanto na assembléa eleitoral d'esta villa como na do S. Gião, aonde estivera nos dias 13 e 14 do mez de outubro ultimo, satisfazendo todas as requisições que lhe foram feitas por parte das auctoridades; dando sempre provas de ser um militar imparcial, desapaixonado e sem pertencer ou fazer parte de qualquer dos grupos politicos que se debatiam. - E para descobrimento da verdade, mandou elle administrador syndicante vir á sua presença as testemunhas abaixo mencionadas, que inquiriu pela fórma que segue:

1.ª

Luiz de Albuquerque do Amaral Cardoso, casado, proprietario, de trinta e dois annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado pelo assumpto d'este auto que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disso ao primeiro que nada vira e presenceára, e que apenas este facto lhe fôra contado pelo dr. Hortensio um dos influentes da opposição. Ao segundo disse que tambem nada víra e presenceára, e que apenas este facto lhe consta por intermedio dos drs. Hortensio e Cunhal. Ao terceiro disse que não sabe se a requisição fôra ou não feita em termos legaes, e que apenas lhe consta que o administrador a fizera em presença de algumas testemunhas. Ao quarto disse que sabe não haver indicios de desordem na occasião em que a força armada entrára na igreja. Ao quinto disse que nada sabe. Ao sexto disse que sabe fôra preso um eleitor por nome dr. Hortensio, por este lhe contar o facto e mais algumas pessoas; mas que em seguida fôra posto em liberdade. Ao setimo disse que sabe, pelo ouvir dizer ao dr. Hortensio, que protestára contra este acto, e que não lhe sendo admittido ía protestar perante o poder judicial. Ao oitavo disse que nada sabe. Ao nono disse que nada sabia. E por ultimo, perguntado pelo administrador syndicante, disse que havia votado com a opposição nas ultimas eleições de deputados. E mais não disse, e sendo-lho lido o seu depoimento, o ratificou e vae assignar. = Pereira. = Luiz de Albuquerque do Amaral Cardoso.

2.ª

José Mendes Diniz Belem, viuvo, negociante, de trinta e cinco annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes d'este auto, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que nada sabe por ver e presencear, mas que lhe constára por alguns individuos, e entre estes José Antonio Rodrigues Ferreira, de Pinhanços, que as listas eram rasgadas ás mãos cheias. Ao segundo disse que nada viu e presenceou, e que apenas sabe d'este facto por lhe haver sido contado pelo dr. Agostinho Thomás dos Santos Viegas. Ao terceiro disse que não sabe em que termos fôra feita a requisição da força armada, mas que alguem lhe contára que a requisição havia sido feita pelo administrador do concelho a pedido do presidente da mesa. Ao quarto disse que não lhe consta ter havido indicios de desordem. Ao quinto disse que a força armada fôra disposta dentro da igreja pelo capitão Bayão, segundo a ordem do administrador do concelho, e que soube isto apenas pelo ouvir dizer a Joaquim Manuel da Silveira, de Sandomil. Ao resto disse que sabe, pelo ouvir dizer, que fôra preso o dr. Hortensio, sendo assim conduzido até á porta lateral da igreja, onde fôra posto em liberdade. Ao setimo disse que alguns eleitores protestaram contra este acto, saíndo em seguida para fazerem igual protesto perante o poder judicial. Ao oitavo disse que sabe, por ouvir dizer, que este facto se dera. Ao nono disse que durante a residencia do capitão Bayão n'esta villa não lhe notou acto algum pelo qual podesse dar mostras de pertencer a qualquer dos grupos politicos que se debatiam, e isto tambem lhe consta que elle fizera na assembléa de S. Gião, aonde tambem estivera. E perguntado por elle, administrador syndicante, ácerca de que grupo politico elle depoente, fez parte na ultima luta eleitoral, disse que tinha feito parte do partido da opposição, com cujo candidato havia votado. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = José Mendes Diniz Belem.

3.ª

Antonio Mendes Diniz, viuvo, proprietario, de sessenta e dois annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado pelos factos constantes d'este auto que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse quanto ao primeiro que nada podia dizer por não ter presenceado. Ao segundo disse que sabe, pelo ouvir dizer, que a força armada entrára na igreja. Ao terceiro disse que, pelo ouvir dizer, sabe que a requisição da força para entrar dentro da igreja fôra feita por escripto. Ao quarto disse que não estava n'aquella occasião na igreja, mas que alguem lhe dissera que não havia desordem. Ao quinto disse que depois da força armada entrar para a igreja occupára ali a posição que lhe fôra indicada pelo capitão commandante, segundo tambem ouvira dizer. Ao sexto disse que nada lhe constava a tal respeito. Ao setimo disse que em seguida a estes actos saíram alguns eleitores para fóra da igreja, e foram em seguida protestar perante o poder judicial. Ao oitavo disse que, pelo ouvir dizer, sabe que a uma estava deitada sobre a mesa, não sabendo, porém, se assim foi conservada durante todo o escrutinio. Ao nono disse que sabe, pelo ouvir dizer, que o capitão Bayão se mostrára sempre neutral durante todos os actos eleitoraes. E perguntado por elle administrador syndicante, ácerca de que grupo politico elle, depoente, fez parte na ultima luta eleitoral, respondeu que havia votado com o candidato da opposição. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = Antonio Mendes Dias.

4.ª

Antonio de Miranda Brandão, casado, proprietario, de cincoenta e quatro annos de idade, morador n'esta villa, testemunha ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes d’este auto, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que lhe consta apenas pelo ouvir dizer. Ao segundo disse que sabe, pelo ouvir dizer, que a força armada penetrára na igreja a requisição do administrador do concelho e do presidente da mesa. Ao terceiro disse que lhe consta, como já depoz, que a requisição fôra feita pelo administrador e ratificada pelo presidente da mesa. Ao quarto disse que ouvíra dizer que na occasião em que a força armada entrou na igreja não havia desordem. Ao quinto disse que a força armada dentro da igreja fôra disposta pelo capitão commandante, segundo as ordens que lhe haviam sido dadas pelo administrador do concelho. Ao sexto disse que tambem lhe consta, pelo ouvir dizer, que fôra preso pelo administrador um cidadão eleitor por este não querer saír da igreja. Ao setimo disse que alguns eleitores saíram da igreja para protestarem perante o poder judicial, por o presidente da mesa se negar a receber-lhes o protesto, mas que isto o sabe, não pelo presencear, mas sómente pelo ouvir dizer. Ao oitavo disse que sabe que a uma estivera algum tempo deitada sobre a mesa, constando lhe isto igualmente por o ouvir dizer. Ao nono disse, que tambem sabe, pelo ouvir dizer, que o capitão commandante da força armada, se mostrára neutral durante a eleição. E perguntado por elle administrador syn-

Sessão de 13 de janeiro de 1879.

Página 66

66

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

dicante ácerca de que grupo politico fez parte durante a ultima lucta eleitoral, respondeu que foi completamente neutral, não se declarando pró ou contra qualquer dos dois partidos que se debatiam. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira Antonio de Miranda Brandão.

5.ª

André Cunhal, casado, proprietario, de sessenta e um annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes d'este auto que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse, ao primeiro que lhe não consta, nem mesmo acredita que a uma fosse roubada, nem o podia ser em presença de tanta gente que se achava na casa da assembléa eleitoral. Ao segundo disse que nada sabia a tal respeito. Ao terceiro disse que a ordem dada ao capitão commandante da força armada para entrar com esta na casa da assembléa eleitoral não fôra feita nos termos legaes, constando-lhe, apenas, que a referida força effectivamente entrára na igreja aonde tinha logar a eleição. Ao quarto disse que lhe consta, por ouvir dizer, que havia indicios de desordem, e tanto que, na noite anterior, já se tinham disparado tiros nas proximidades da casa da assembléa. Ao quinto disse que nada sabia por não ter estado na casa da assembléa. Ao sexto disse que lhe não consta similhante facto. Ao setimo disse que lhe consta que alguns cidadãos foram protestar perante o poder judicial, não sabendo comtudo os motivos que se deram para ter logar um tal acto. Ao oitavo disse que a mesa se achava collocada no local em que sempre tem sido collocada para actos de tal natureza, e era vista e dominada de qualquer ponto da igreja. Ao nono disse que, por ouvir dizer, sabe que o capitão Bayão na freguezia de S. Gião estivera em casa do padre José Lopes Freire, emquanto duraram ali os trabalhos eleitoraes, pertencendo aquelle padre ao partido da opposição. Disse, por ultimo, que embora votasse na ultima eleição, segundo a sua consciencia, é certo que não tomára parte na lucta. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = André Cunhal.

6.ª

Antonio Vieira de Figueiredo, reitor da freguezia d'esta villa e n'ella morador, de quarenta e nove annos de idade, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes d'este auto, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse, ao primeiro que é falsissimo que a uma fosse roubada; e tanto que procedendo se a exame n'ella, por parte do poder judicial, foi encontrada intacta, e o que igualmente verificaram os caudilhos dos dois partidos que se debatiam, não lhe constando que as listas fossem tiradas da uma ás mãos cheias, ou que, na leitura d’ellas houvesse substituição de nomes, não julgando o presidente da assembléa capaz de praticar um tal acto, e nem d'elle havia necessidade, pois é certo que o grupo politico affecto ao governo tinha a certeza de ter a eleição segura por uma grande maioria. Ao segundo disse que ouvíra dizer que a força armada entrára na casa da assembléa, porém que ninguem víra nem presenceára por quem fôra feita a requisição, ouvindo tambem dizer que o presidente da assembléa, constando-lhe que se pretendia assassinal-o, combinára com o capitão commandante para este entrar com a referida força do seu commando na casa da assembléa, logo que houvesse qualquer indicio de alteração da ordem publica. Ao terceiro disse que não sabe se houve requisição, nem em que termos fôra concebida, por isso que, como já depoz, ninguem a presenceára. Ao quarto disse que no dia em que tivera logar o escrutinio, houvera na casa da assembléa todos os indicios de desordem, apresentando se muitos individuos ali de uma maneira ameaçadora, o que deu logar a que o presidente da mesa tivesse o fundado receio de se tentar contra a sua vida, e já na noite anterior se tinham disparado tiros nas proximidades da casa da mesma assembléa. Ao quinto disse que lhe consta que a força armada, depois de entrar na igreja, occupára posições que lhe foram indicadas pelo seu capitão commandante, sendo o administrador do concelho estranho a este acto. Ao setimo disse que sabe que alguns cidadãos foram protestar perante o puder judicial, mas não lhe consta que elles fizessem o seu protesto perante a mesa. Ao sexto disse que lhe não consta fosse preso algum dos eleitores durante o acto eleitoral, presenceando que o administrador tratou a todos sempre bem, e é incapaz de commetter qualquer violencia. Ao oitavo disse que a mesa se achava no sitio em que sempre se collocou para actos identicos, e que a uma se alguma vez esteve tombada sobre a mesa não deve admirar porque, sendo muito alta e achando se sobre a mesa, impossivel era ao presidente, em rasão da altura d'esta, extrahir as listas d’ella sem que a tombasse ou inclinasse para elle, mas isto é só por algum tempo e não durante todo o escrutinio, o que elle depoente declara por lhe constar. Ao nono disse que lhe consta, que o capitão Bayão não fôra solícito, como diz, no cumprimento dos seus deveres, pois que, sendo chamado pelo administrador do concelho, quando este na povoação de S. Gião se viu ameaçado de morte, se difficultára a levantar se da cama, aonde já se achava deitado, dando n'aquella assembléa e na d'esta villa mostras de pertencer ao partido da opposição, sendo publico e notorio que elle recebêra dinheiro para fazer o protesto que publicou. Por ultimo disse mais que, na lucta eleitoral que passou, votara conforme a sua consciencia, sem opposição a qualquer dos partidos. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = O padre Antonio Vieira de Figueiredo.

E não podendo ser inquiridas mais testemunhas n'este dia, elle administrador mandou encerrar este auto, que vae assignar depois de lido por mim Antonio Saraiva da Costa Ribeiro, escrivão que o escrevi e assignei. = José Pereira Monteiro Antonio Saraiva da Costa Ribeiro.

Anno do nascimento do Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 20 dias do mez de novembro, n'esta villa de Ceia e na secretaria da administração do concelho, aonde se achava o dr. José Pereira Monteiro, administrador do concelho da Guarda; em commissão regia n’este de Ceia, commigo, escrivão de seu cargo, para o fim de proceder a este auto em continuação do antecedente, e para averiguação da veracidade dos factos n'elle mencionado. E para isto mandou vir á sua presença as testemunhas abaixo indicadas, que continuou a inquirir pela fórma que segue.

7.ª

Agostinho Thomás dos Santos Viegas, viuvo, bacharel formado em direito e proprietario, de cincoenta e nove annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que tendo sido expulso pelos soldados que estavam de guarda á uma collocada dentro da igreja e com as portas fechadas alguns individuos opposicionistas que estavam vigiando exteriormente da igreja a mesma uma, conjuntamente com a força armada mandada collocar externamente pela auctoridade administrativa, em virtude de ordens do presidente da mesa, e isto em virtude de ordem que a tropa recebêra n'aquelle mesmo acto do administrador d'este concelho, Elisiario Vaz Preto Casal, que conjuntamente com seu cunhado o bacharel Amandio Eduardo da Motta Veiga, presidente da mesa eleitoral, deram á tropa que estava de guarda no adro da igreja, e que ali vieram em virtude de lhe constar que se tinham dado dois tiros na rua, junto da igreja e defronte do platano, cujos tiros se diz e é voz publica foram dados por um grupo de tres indivi-

Página 67

67

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

duos governamentaes, Antonio de Mello e Silva, Antonio da Silva Minamó e Miguel Saraiva, os quaes, sem immediatamente tratarem de averiguar quem tinha dado os tiros, ordenaram e fizeram evacuar por meio da tropa o adro da igreja aos opposicionistas que ali se achavam, levando os até ao fundo da rua da Igreja ao arco, e não obstante as queixas d’estes, que supplicavam lhe deixassem vigiar e guardar a uma como o tinham feito na noite antecedente de 13 para 14; não lhe foi isso permittido nem o poderam conseguir da auctoridade administrativa os cavalheiros opposicionistas, que para isso o foram procurar a sua casa os bachareis Francisco Pinto Ribeiro de Moraes, Antonio Hortencio Ferreira da Fonseca e o cidadão Antonio de Frias Eça Ribeiro, a quem o administrador, com ares algum tanto desabridos, lhe dissera que não se revogavam as ordens que estavam dadas. E em virtude de uma resposta d’estas vieram esses cavalheiros para minha casa, aonde me contaram o que exposto fica, e em virtude de tudo isto, eu com os mesmos e alguns outros senhores que ali tambem estavam em minha casa, tratámos de socegar os individuos opposicionistas que tinham sido expulsos do adro da igreja, e que tinham ido a minha casa na maior parte dar parte do que lhes tinha acontecido, os quaes sossegaram e trataram de se deitar, como deitaram cada um por onde pôde, saíndo ainda alguns para irem ficar á casa das obras e participarem pelo telegrapho o occorrido, e pedindo providencias assim para o ministro do reino como para o governo civil da Guarda. Passada assim a noite do dia 14 e amanhecendo para o dia 15, alguns dos individuos que em minha casa tinham pernoitado, saíram e foram ver o que havia no adro da igreja, aonde os guardas que estavam postados ás differentes entradas do mesmo os não deixaram entrar, e d’isto vieram dar conhecimento em minha casa, e se espalhou logo por todos os individuos que da opposição se achavam em differentes partes, que a entrada no adro da igreja estava prohibida mesmo de dia. Em virtude de tudo isto resolveu-se entre alguns opposicionistas o requerer se ao ex.mo juiz de direito d'esta comarca exame judicial na urna antes d'ella ser aberta para o que se apresentou requerimento ao ex.mo juiz de direito, e deferindo ao mesmo mandou que se procedesse ao exame com assistencia do ministerio publico, e, em seguida, não sendo ainda nove horas da manhã, se dirigiu para o local da assembléa para proceder ao exame na urna; porém quando ía subindo com os empregados do juizo, que mandára chamar pelas escadas da entrada do lado do norte, a sentinella que ali estava collocada não o deixou entrar, em virtude do que desceu as escadarias e veiu para a rua que está ao fundo, e ahi se conservou até que dando nove horas appareceu saíndo de sua casa, que é contigua, o presidente da mesa Amandio Eduardo da Motta Veiga, e o administrador do concelho, e todos subiram então aquella entrada e se aproximaram com os mais individuos que os seguiam na retaguarda, e entre os quaes eu ía, e todos nos approximámos á porta lateral da igreja do lado do norte. N'essa mesma occasião toda a tropa que estava no adro da igreja e que então estava commandada por um official inferior, formou em frente da dita porta lateral; e n'este estado o presidente da mesa, que tinha na mão as chaves da porta, a mandou abrir, e disse que não consentia que entrassem para dentro da igreja com o ex.mo juiz, a quem franqueou a porta para com os seus empregados irem proceder ao exame já mencionado, Ayres de Albuquerque e Luiz Ribeiro Sotto Maior que ali se achavam, porque não eram eleitores n'esta assembléa, ao que estes lhe disseram em altercação que entre uns e os outros houve, que deviam entrar, por isso mesmo que elles tinham em seu poder alguns sinetes com que tinham no dia antecedente ajudado a lacrar a sellar a uma. N'este acto o ex.mo juiz em voz alta e intelligivel, e voltando se com especialidade para o presidente da mesa: «aqui agora quem manda sou eu, hão de entrar todos os senhores que tiverem os sinetes e as mais pessoas que julgar necessarias para o exame, pois os mando intimar», dirigindo-se para o escrivão que ali estava. Em virtude d’estas ordens do ex.mo juiz entraram para dentro da igreja alem do presidente da mesa o ex.mo juiz com os empregados, dr. delegado, o dr. Hortencio, Ayres de Albuquerque, Thiago de Albuquerque, Luiz Ribeiro Bacellar, estes quatro por terem sinetes, e tambem Antonio Ribeiro Sedrim e Antonio Rodrigues Prata, para servirem de testemunhas, segundo me parece. Procedeu o ex.mo juiz ao exame, e fóra da igreja, durante o tempo que durou o exame, esteve á porta lateral da igreja do lado do norte formada toda a tropa que ali se achava, a qual foi mandada carregar armas pelo official inferior que então a commandava, e pôr bayonetas em bôca das armas, e n'esta attitude se conservou até que se concluiu o exame dentro da igreja, havendo fóra perfeito socego, a não serem algumas palavras em voz alta e desabridas que Manuel Borges da Silva, residente em Lisboa, e que n’aquella occasião se achava no adro da igreja, e que de proposito viera de Lisboa, segundo ouvira dizer, para coadjuvar a eleição governamental do dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, dirigira ao cidadão eleitor d'esta villa, Francisco de Almeida Mello, o qual teve toda a prudencia n'essa occasião e por isso não deu logar a haver tumulto algum ou desordem, para provocar a qual lhe foram dirigidas as expressões e palavras que dirigiu o dito Manuel Borges da Silva, no meu entender e de outras pessoas. Terminado o exame, o ex.mo juiz saíu, e á porta por onde tinha entrado disse para mim e outras pessoas que tambem ali se achavam a pouca distancia da mesma: «a uma está intacta, agora vigiem os votos», e saíu; e após d’elle apparece immediatamente o administrador do concelho, trazendo expulsos para fóra da igreja os dois cidadãos que tinham entrado para dentro com os sinetes, Ayres de Albuquerque e juiz Ribeiro Bacellar, e mandou entrar a tropa que estava formada em frente da mesma porta só meia aberta, a qual toda entrou para dentro da igreja conforme estava, com bayonetas em bôca da arma e armas carregadas, e acabando esta de entrar, appareceu á porta o administrador Casal, dizendo: «os eleitores podem entrar, mas hão de ser revistados»; eu, que estava já encostado á porta do lado de fóra, e bem assim Antonio de Frias Eça Ribeiro, pozemos immediatamente os pés no degrau da porta, entrando primeiro Antonio de Frias, que foi revistado e apalpado pelo administrador, bem como eu, estando a este acto uma sentinella á porta; seguiram-se após de mim outros, mas que não sei quem foram, e eu o Antonio de Frias entrámos pelo corpo da igreja acima e chegámos á mesa onde estava a uma, tendo passado por meio de duas alas da tropa, e ao chegarmos, observei eu e vi que havia do lado direito do presidente e ao cimo da mesa altercação entre elle presidente e o dr. Hortensio, que ali estava, desde o exame á uma, bem como tambem estava do lado esquerdo o eleitor Thiago de Albuquerque, que tambem ali tinha ficado desde aquelle acto. A altercação que havia e se estava fazendo ao dr. Hortensio e Thiago de Albuquerque por parte do presidente e administrador Casal, que para aquelle sitio já tinha regressado da porta onde estava quando eu entrei, era a ordenar a saída do local da mesa ao dr. Hortensio e Thiago do Albuquerque para d'ali saírem, bem como eu o Antonio de Frias, a fim de não observarmos nem vermos detrás dos escrutinadores os bilhetes e a leitura dos nomes que elles continham. O dr. Hortensio, eu e os mais supramencionados, redarguimos que nós estavamos ali em virtude do nosso direito, por isso que a lei eleitoral permitte a nossa estada junto á mesa, bem como a todo e qualquer eleitor. N'essa occasião reparei, e acho junto a mim um official, que suppuz ao vel-o ser o capitão que tinha vindo com a força armada requisitada pela auctoridade administrativa, e vendo a illegalidade que o presidente da mesa e administrador do concelho estavam commettendo, e querendo eu e os mais que ali nos achavamos, que o acto do escrutinio a que es-

Sessão de 13 de janeiro de 1879.

Página 68

68

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tava para se proceder fosse feito com toda a legalidade, e maxime porque havia a certeza de que a eleição por parte da opposição com a votação que tinha entrado para a uma d'esta assembléa estava vencida approximadamente por oitenta e tantos votos de maioria para o candidato o bacharel José de Abranches Homem, porque os bilhetes foram n'esta assembléa dados aos eleitores á bôca da uma, imitando a opposição ao partido governamental, que assim começou a praticar com os eleitores da freguezia do Sabugueiro, pela qual começou a votação e da qual nem um só eleitor recebeu lista da opposição, mas sim todos do encarregado pelo partido governamental de entregar as listas que extrahia de uma saca em que as tinha, sabendo se desde a vespera já o resultado das assembléas ruraes, o qual vinha supplantar a maioria que o deputado governamental obtivesse na assembléa de Ceia, e que pelos calculos feitos devia andar por 215 votos approximadamente, pois que eu tambem tive o cuidado de fazer na occasião da votação o apontamento dos votantes que entregaram os bilhetes que recebiam, assim do partido governamental como do partido opposicionista, que depois os entregavam ao presidente da mesa, recebendo-os os votantes (na generalidade) os votos do governo ao lado direito da presidencia e os da opposição ao lado esquerdo, e foi então que eu e tambem os eleitores votantes Frias e Thiago de Albuquerque nos dirigimos para o official capitão Bayão a pedir-lhe que comnosco se dirigisse ao presidente da mesa e administrador do concelho a ponderar-lhes a illegalidade do acto como se estava procedendo, e que nos deixassem ali estar detrás dos escrutinadores a vermos e observarmos o escrutinio. Annuiu o capitão, e dando alguns passos para a cadeira onde estava o presidente, e a cujo lado esquerdo n'aquella occasião tambem estava o administrador Casal, ponderou a estes o que exposto fica, e recebeu em resposta de prompto dada pelo presidente e administrador, que elle capitão estava ali ás ordens da presidencia e só para executar as suas ordens, que essas estavam dadas, e por isso pozesse fóra d'aquelle local as pessoas que ali estavam, como lhe tinha sido ordenado. Em vista d'esta determinação do presidente e administrador, dirigiu-se o capitão Bayão para nós tres que ali estavamos em volta da mesa ao lado esquerdo (pois aquelle sitio da mesa os soldados que estavam formados em duas alas de vinte soldados, pouco mais ou menos, cada uma, não deixavam approximar-se á mesa outros eleitores), e nos disse que não havia remedio senão sairmos para o fundo das alas, proximo ao guardavento da igreja. Em virtude d'esta intimação tivemos de saír do local onde estava postada a mesa, e o mesmo aconteceu ao bacharel Antonio Hortensio, que estava do lado direito, o qual foi posto fóra, dando-lhe o administrador voz de preso por elle não querer saír, e aos empurrões o conduziu quasi para o fundo da ala direita da tropa, e postos assim violentamente fóra do local da mesa os supramencionados, e não se podendo approximar da mesa nem estes, nem outros quaesquer, estando junto á mesa sómente o presidente, administrador, escrutinadores e secretarios, tendo tambem saído n'essa occasião o bacharel Sebastião Fernandes Costa, que tambem estava á direita do presidente quando este e administrador Casal altercaram com o dr. Hortensio, e ainda ficára quando o administrador punha fóra do local da mesa e empurrava o dr. Hortensio; lançou mão o presidente da uma e rasgando com ar de zangado o papel que estava tapando a bôca da uma, e inclinando-a para si, começou a extrahir as listas, e vi que entregou as primeiras aos escrutinadores para as lerem e ainda ouvi pronunciar por algumas vezes o nome dos candidatos governamental e opposicionista, e vi que tirou para a mão logo em seguida algumas listas juntas, e ao ver isto, como do sitio onde estava não podesse nem ver, nem observar a leitura das listas, levantei algum tanto a voz ao fundo da igreja onde estava e disse: «saiamos d'aqui para fóra, pois que não podemos, por nos não deixarem, nem ver nem observar a leitura das listas»; e assim immediatamente sai, Frias e Thiago, Hortensio e outros, ouvindo depois a varias pessoas que entraram na igreja, que durante o escrutinio o presidente, tendo a uma algum tanto tombada sobre si, tirava della listas ás mãos cheias, rasgando-as sem as dar a ler. Quando saí da igreja continuava a tropa a estar formada em duas alas, ouvindo dizer e sendo publico e notorio que ella assim se conservàra dentro da igreja até finalisar o acto eleitoral, que duraria apenas cinco horas, quando, se fosse feito com regularidade e legalidade, talvez senão concluisse o escrutinio n'aquelle dia 15. Quando saí da igreja encontrei no adro da igreja soldados de cavallaria com as espadas desembainhadas e trotando em roda da igreja, ouvindo dizer que esta cavallaria chegára ao adro da igreja pouco depois da tropa de infanteria ter entrado para dentro da igreja, e que logo que chegára se postara n'aquella altitude bellica, e n'esta attitude ouvi dizer ella se conservára até ao fim do escrutinio. Que por observar soube, e por ver em todo o tempo que assisti ao acto eleitoral n'esta assembléa de Ceia, que quasi que vi principiar os trabalhos eleitoraes no dia 13, e que não os vi principiar porque o relogio da torre da igreja foi obrigado a dar nove horas, não sendo ainda oito e meia, o que do proposito se fez por ordem do presidente da mesa, Amandio Eduardo da Motta Veiga, para que na mesa eleitoral não houvesse um só vogal opposicionista, pois que estando parado aquelle relogio e dando horas o da misericordia quando este deu meia hora para as nove, e com o qual eu tinha acertado o meu relogio de algibeira quando saí da missa de almas d'aquella igreja, tinha ha poucos minutos dado nove horas o da igreja a cujo som eu corri á igreja, que não dista muito longe da minha casa, e quando cheguei já a mesa estava constituida, estando o secretario Brito a escrever; digo nem no dia 13, nem 14, nem 15, em que eu estive quasi sempre presente aos actos eleitoraes, não vi, nem observei, nem me constou que houvesse desordem alguma, ou facto que indicasse promover desordem, á excepção d’aquelles que já relatei, e isto promovido por pessoa alguma por parte da opposição. E perguntado por elle administrador syndicante ácerca de que partido politico havia feito parte durante a ultima lucta eleitoral, respondeu que havia trabalhado e votado com a opposição, seguindo sempre os meios de honra e legalidade. E mais não disse por ter respondido em globo a todos os factos, e sendo lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar, sendo por elle redigido. = Pereira = Agostinho Thomás dos Santos Viegas.

8.ª

Luiz Candido Soares de Albergaria Cabral, solteiro, proprietario, de vinte e nove annos de idade, morador em Maceira, freguezia de S. Thiago, testemunha devidamente ajuramentada prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que é falsissimo que a uma fosse roubada, sendo porém certo que a força armada entrára para a igreja aonde se achava reunida a assembléa eleitoral d’esta villa sómente para proteger o presidente da mesa e evitar o roubo da mesma uma, pois sabe positivamente e até por lhe ser dito por alguns individuos que fazem parte do partido da opposição n'este concelho, que havia antecipadamente o plano de assassinar o dito presidente e roubar depois a uma, por saberem que a eleição estava perdida para o candidato opposicionista; tendo-lhes sido dito a este respeito por Thiago de Albuquerque, João Cabral e Luiz de Mello Machado, que eram uns dos principaes caudilhos do partido da opposição, que esta bem sabia tinha a eleição perdida, mas que tinha ainda uma votação rasoavel, e por isso dava a batalha, para mostrar a sua preponderancia. Ao segundo disse que assistira a todos os actos eleitoraes na assembléa d'esta villa, e por isso sabe, por ver e presencear, que o capitão Bayão, na assembléa do dia 15 de outubro ultimo, entrára com a força do seu com-

Página 69

69

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mando na casa da mesma assembléa, por seu arbitrio, e sem que para isso lhe fosse dada ordem pelo presidente da mesa ou pelo administrador d'este concelho; ouvindo dizer que anteriormente ao acto eleitoral o presidente da mesa, tendo conhecimento do plano formado contra a sua vida e roubo da uma, havia combinado com o referido capitão para este entrar com a força de seu commando na igreja, logo que julgasse opportuno este facto e ao momento de perigo. Ao terceiro disse que, como já depoz, não presenceára fosse dada ordem ao capitão Bayão para entrar com a força na casa da assembléa, e mesmo sabe que tal ordem não existira, á excepção da combinação do segundo artigo ou facto. Ao quarto disse que quando a força armada entrára na igreja achavam-se ali alguns dos principaes caudilhos do partido da opposição acompanhados de individuos suspeitos e de conducta irregular, e pela maneira ameaçadora que apresentavam deram a conhecer logo que tramavam desordem, e foi talvez por este motivo que o capitão mandára entrar ali a força. Ao quinto disse que por ver e presencear sabe que as posições que a força armada tomára dentro da casa da assembléa eleitoral foram-lhe indicadas pelo seu capitão commandante, sem que n'isto tomasse a menor parte o administrador do concelho ou o presidente da mesa, e foi o mesmo capitão que ordenou a um sargento seu subordinado que a força armasse bayoneta e carregasse armas, e era elle tambem que mandava pôr fóra alguns eleitores que pertendiam approximar-se do presidente da mesa. Ao sexto disse que presenceando todo o acto eleitoral, tambem presenceára que não fóra dada voz de prisão a qualquer dos eleitores que ali se achava, sendo o contrario d'isto uma invenção e falsidade do auctor do protesto. Ao setimo disse que não fôra feito ao presidente da mesa ou ao administrador do concelho protesto algum pelos eleitores do partido opposicionista; e sómente ouvira dizer a um d'estes que sáiam da igreja, como effectivamente saíram, constando-lhe que depois haviam feito seu protesto perante o poder judicial. Ao oitavo disse que a mesa se achava no sitio em que sempre foi collocada para actos de tal natureza, e que assim como elle depoente via e presenceava o escrutinio, pela mesma fórma podiam ver e presencear os individuos que haviam saído da igreja e que a saída havia sido um pretexto para o seu protesto; sendo certo que o presidente da mesa algumas vezes inclinára para elle a uma pela difficuldade que tinha em extrahir d'ella as listas, por isso que sendo a mesa alta, e alta tambem a uma, como muito bem se póde verificar, o mesmo presidente em rasão de ser baixo não podia fazer a extracção das listas sem que a inclinasse para si. Ao nono disse que os actos praticados pelo capitão Bayão durante a sua residencia n'esta villa, provam exuberantemente que elle é um militar faccioso pertencente ao partido da opposição, pois é certo que elle só convivia e acompanhava com os caudilhos d'ella, indo conferenciar algumas vezes com o doutor Agostinho Thomás dos Santos Viegas, testemunha que já depoz, e que como é geralmente sabido pertence ao partido miguelista, como quasi todos os da opposição n'este concelho, e que fôra por combinação feita com estes que elle entrára e fizera estar a força armada na igreja até ao fim do acto eleitoral para terem motivo para poderem requerer a annullação da eleição, á parte a combinação anterior com o presidente da mesa e ácerca da qual tambem já depoz; ouvindo tambem dizer que o mesmo capitão Bayão recebêra avultada quantia em dinheiro para fazer e publicar o seu protesto, sobre o qual elle testemunha depõe. Disse mais que este seu depoimento não envolve animosidade contra qualquer dos partidos que se debateram na ultima lucta eleitoral, em ambos os quaes conta amigos e parentes, mas que é a fiel expressão da verdade e da sua consciencia. E mais não disse e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou, e vae assignar. = Pereira = Luiz Candido Soares de Albergaria Cabral.

E não podendo ser inquiridas mais testemunhas n’este dia, ordenou elle administrador se encerrasse este auto e vae assignar depois de lido por mim. Antonio Saraiva da Costa Ribeiro, escrivão que o escrevi e assignei. = José Pereira Monteiro = Antonio Saraiva da Costa Ribeiro.

Anno do nascimento do Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 21 dias do mez do novembro n'esta villa de Ceia, e da secretaria na administração do concelho, aonde se achava o dr. José Pereira Monteiro, administrador do concelho da Guarda, em commissão regia n’este de Ceia, commigo escrivão do seu cargo, para o fim de proceder a este auto em continuação ao antecedente, para descobrimento da veracidade dos factos que n’elle se mencionam. E para este fim mandou vir á sua presença as testemunhas abaixo indicadas, que continuou a inquirir pela fórma que se segue.

Simão do Almeida Mello, casado, proprietario, de cincoenta e seis annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que, por ver e presencear, sabe que a uma não fôra roubada; que assistira ao escrutinio e observára que fôra feito nos termos da lei, sem que na leitura das listas houvesse substituição de nomes, sendo portanto falsissimo o que a este respeito allega em seu protesto o capitão Bayão, nem os caudilhos do partido governamental tinham necessidade de praticar um tal crime, porque de vespera tinham a certeza de haverem vencido a eleição por uma grande maioria; pois é certo que muitas freguezias, que compunham a assembléa eleitoral d'esta villa, votaram de chapa no candidato do governo, o que não póde, em boa fé, ser contestado. Ao segundo disse que estivera quasi sempre, durante o acto eleitoral, junto do administrador d'este concelho, o dr. Elisiario Vaz Preto Casal, e por isso sabe que elle não dera ordem alguma ou por escripto ou vocal ao referido capitão Bayão para este entrar com a força do seu commando na casa da assembléa eleitoral; sabendo comtudo que anteriormente ao acto eleitoral, o presidente da mesa fôra avisado de que os caudilhos da opposição, que se achavam n'esta villa, e que de proposito se tinham feito acompanhar por individuos suspeitos de irregular conducta e de precedentes pouco honrosos, e que na noite do dia 14 já haviam disparado tiros nas proximidades da casa da assembléa com o fim de incutirem terror ás sentinellas que ali se achavam e estas abandonarem o seu posto, para com facilidade levarem a effeito o roubo da uma; tinham combinado o roubo da mesma uma ainda que para isto fosse preciso assassinal-o; e por isso o mesmo presidente chamára o dito capitão Bayão e lhe patenteou este plano da opposição, fazendo-lho ver que no momento em elle capitão presenciasse alguma cousa n'este sentido, entrasse immediatamente na casa da assembléa com a força do seu commando, para com ella proteger a vida d'elle presidente, e evitasse o roubo da uma. Que a força entrára effectivamente na casa da assembléa e occupára n'ella as posições que ali lhe foram indicadas pelo mesmo capitão; convencendo-se o presidente e administrador do concelho n'essa occasião que havia chegado o momento de perigo, e que o mencionado capitão tinha observado alguma cousa com relação á execução do plano do partido opposicionista, e foi por este motivo que nem o presidente nem o administrador mandaram logo saír d'ali a força armada. Ao terceiro disse que o capitão Bayão podia muito bem eximir-se a entrar com a força do seu commando na casa da assembléa eleitoral, por isso que esta lhe não foi requisitada formalmente, e sómente pela fórma que já depoz. Ao quarto disse que no momento em que a força armada entrára na casa da assembléa eleitoral havia ali indicios de desordem, e alteração do socego publico, por isso que os caudilhos do partido opposicionista, em companhia dos seus assalariados, se achavam ali com ares ameaçadores e provocantes e fa-

Sessão de 13 de janeiro de 1879.

Página 70

70

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

zendo barulho. Ao quinto disse que, por ver e presencear, sabe que a força armada, depois de entrar na casa da assembléa eleitoral, occupára, como já depoz, as posições que lhe foram indicadas pelo seu capitão, sendo o administrador do concelho completamente estranho a este facto. Ao sexto disse que é falsissimo ter sido preso algum cidadão eleitor durante o acto eleitoral; pois que, assistindo sempre a este, tal facto não presenceára, e a ter existido por certo o devia presencear, pois, como já disse, estivera durante todo o tempo dos trabalhos eleitoraes junto do administrador do concelho, e que este facto fôra uma pura invenção da gente da opposição, com o fim unico de comprometterem a auctoridade administrativa. Ao setimo disse que a opposição não protestára perante a mesa, e que declarando o administrador do concelho que ía apalpar os caudilhos d'ella para verificar se se achavam armados, saíram logo da igreja para não se sujeitarem a ser apalpados, e foram logo protestar perante o poder judicial. Ao oitavo disse que a mesa se achava collocada no sitio em que sempre esteve e é costume para actos de tal natureza, podendo ser vista de qualquer ponto da igreja, podendo-se observar sem difficuldade a legalidade do escrutinio como elle, depoente, observára. Que a uma se achava sobre a mesa, e que sendo esta alta, e alta igualmente a uma, o presidente, em rasão de ser de baixa estatura, não podia extrahir d'ella as listas sem que a inclinasse para si, e por isso é que se diz que estivera deitada sobre a mesa. Ao nono disse que o capitão Bayão não fôra tão solícito no cumprimento dos seus deveres como diz, por isso que consta a elle, depoente, por pessoas de inteiro credito, que na assembléa eleitoral de S. Gião, quando o administrador do concelho, que tambem ali se achava, fôra ameaçado de morte, sendo-lhe posto ao peito um revolver, lhe fôra pedir o seu auxilio para evitar qualquer crime e o roubo da uma, o mesmo capitão, que estava já deitado na cama, se difficultára em levantar-se d'ella, dando logar com isto a que a uma fosse roubada se não fôra a coragem de alguns soldados, que a ella se achavam de guarda, que obstaram a isso, tendo de cruzar as bayonetas contra os individuos que a pretendiam roubar. Que lhe consta igualmente que o referido capitão fôra a casa do padre José Lopes Freire, da dita povoação de S. Gião, e ali, pedindo um copo de vinho, declarára que bebia ao triumpho da opposição, e que sendo correligionario politico d'esta podia contar ella com o seu apoio, e que estivesse certo havia de empregar os meios ao seu alcance para que podesse alcançar a victoria. Que n'esta villa dera sempre provas de pertencer ao partido da opposição, pois é certo que elle conferenciára com os caudilhos d'ella, indo algumas vezes a casa do dr. Agostinho Thomás dos Santos Viegas, onde os mesmos caudilhos estiveram sempre em sessão permanente, e de onde elle, depoente, o vira saír no dia 15 de outubro findo, já de noite. Que o referido dr. Agostinho Thomás é um dos principaes influentes da opposição, inimigo da actual situação politica por ser do partido miguelista, e inimigo figadal do candidato governamental o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, e que em casa d'elle estiveram sempre os individuos assalariados pela opposição, inclusivamente um que já havia sido condemnado como assassino, sendo ali tambem que se achava depositado todo o armamento para a desordem que projectavam. Que apenas o referido capitão chegou a esta villa no seu regresso de S. Gião, foi-lhe entregue uma carta, por Thomás de Sousa, creado de Luiz de Albuquerque, testemunha que já depoz, influente da opposição e, como os demais d'ella, pertencente ao partido miguelista, havendo na entrega da mesma carta todo o empenho e cuidado, e foi depois d'este facto que o capitão fôra conferenciar com os ditos caudilhos da opposição. Que o mencionado capitão Bayão tanto não é, como diz, imparcial e desapaixonado, que no dia 15 do referido mez de outubro, de manhã, disse no adro da igreja d’esta villa que «a guerra civil estava por momentos a rebentar no nosso desgraçado paiz, e que a responsabilidade do primeiro tiro pesava toda sobre El-Rei». Que consta a elle, depoente, e é publico e notorio que o mesmo capitão Bayão recebêra avultada quantia em dinheiro para fazer e publicar, como publicou, o seu protesto, e ácerca do qual elle, testemunha, acaba de depor. Disse mais que o dito capitão fôra portador de 500$000 réis para José Mendes Diniz Belem, testemunha que tambem já depoz, e que é um dos caudilhos da opposição. E perguntado por elle, administrador syndicante, ácerca de qual dos partidos politicos tinha acompanhado na ultima lucta eleitoral, respondeu que, não sendo influente, apenas tinha dado o seu voto ao candidato do governo, conforme lhe aconselhou a sua consciencia. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira. = Simão de Almeida Mello.

10ª

Francisco Roque da Silva, solteiro, escrivão da camara municipal d'esta villa, de sessenta e cinco annos de idade, morador n'esta mesma villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse que foi completamente entranho ás eleições de deputados a que ultimamente se procedeu n'esta villa nos dias 13, 14 e 15 de outubro findo, e que não tendo assistido aos actos eleitoraes nada póde dizer com relação aos factos occorridos n'aquella occasião. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = Francisco Roque da Silva.

11.ª

Francisco de Assis Augusto de Sousa, viuvo, amanuense da camara municipal d'esta villa, de sessenta e oito annos de idade, morador n'esta mesma villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse que foi completamente estranho á lucta eleitoral que ultimamente teve logar n'este concelho, e por isso não sabe as occorrencias que tiveram logar durante os trabalhos eleitoraes; ouvindo comtudo dizer a Antonio Augusto de Oliveira Santos e dr. Luiz Henriques Cunha, d'esta villa, e a outras mais pessoas de cujos nomes agora se não lembra, que a casa da assembléa eleitoral havia sido occupada na manhã do dia 15 de outubro findo pela força armada do commando do capitão Bayão, e que ali não era consentida qualquer pessoa da opposição. Que este facto causou estranheza a elle depoente, e por isso muito lhe custára a acreditar n'elles, porquanto entendia que á exigencia do administrador do concelho e do presidente da assembléa não devia o commandante da força armada annuir, porque a lei é bem clara a tal respeito. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = Francisco de Assis Augusto de Sousa.

12.ª

Antonio Ferrão, solteiro, negociante, de trinta e oito annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que é falso ter sido roubada a uma, e que tendo assistido a todos os actos eleitoraes, sabe por ver e presencear que elles correram sempre com toda a legalidade, e que no escrutinio não houvera substituição de nomes na leitura das listas, dando-se a cada dos dois candidatos o numero exacto de votos que cada um d'elles tinha effectivamente obtido, e se achavam dentro da mesma uma, e que nem o partido governamental tinha necessidade de roubar a uma, pois que era sabido desde a vespera que tinha obtido uma grande maioria, e que por isso tinha a eleição segura. Ao segundo disse que, por ver e presencear, sabe que a força armada entrára na casa da assem-

Página 71

71

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

bléa eleitoral por ordem do capitão commandante, e nem que para isso lhe fosse feita requisição por qualquer fórma pelo presidente da assembléa ou pelo administrador do concelho; sabendo comtudo que o mesmo presidente, antes de no dia 15 principiarem os trabalhos eleitoraes, fôra avisado de que se tentava contra a sua vida, e por isso chamára o referido capitão e lhe dissera que no caso de perigo, pois lhe narrára o plano que havia, entrasse na casa da assembléa para o proteger de qualquer ataque ou contra a sua vida ou contra a uma; e que havendo depois de principiar o escrutinio tumulto dentro da igreja promovido pelos caudilhos da opposição e seus assalariados, a força entrára na casa da mesma assembléa, não sabendo porém se o tumulto foi a causa verdadeira da entrada da força ou se o capitão teve outro motivo para praticar tal facto. Ao terceiro disse que, como já depoz, não existira ordem legal para a entrada da força na casa da assembléa, mas presumindo-se mesmo a existencia do tal ordem, muito bem o referido capitão podia eximir-se ao seu cumprimento; pois tendo á sua disposição approximadamente cincoenta praças suas subordinadas, podia facilmente, resistir e deixar de cumprir a dita ordem, e tanto mais que nunca esteve coagido. Ao quarto nada disse por já ter respondido. Ao quinto disse que a força armada occupára na casa da assembléa as posições que n'ella lhe foram indicadas pelo seu capitão, sendo completamente estranhos a este facto o presidente da mesa e o administrador do concelho. Ao sexto disse que é falso e destituido de fundamento o facto allegado da prisão de um cidadão eleitor na casa da assembléa eleitoral. Ao setimo disse que não houvera protesto algum perante a mesa ou administrador do concelho, por parte da opposição, e que esta saíra da casa da assembléa por o administrador declarar que pretendia verificar se os individuos que ali se achavam se faziam ou não acompanhar de armas prohibidas, o que, receiando os mesmos individuos serem apalpados e que lhes fossem encontradas as armas de que se achavam munidos, saíram da casa da assembléa, indo protestar, segundo lhe constou, perante o poder judicial d'esta comarca. Ao oitavo disse que a mesa estava aonde sempre foi collocada para actos identicos aquelle a que se estava procedendo, sendo certo que o presidente não praticára acto algum que a elle depoente parecesse irregular e menos legal. Ao nono disse que o capitão Bayão durante o tempo que esteve n'esta villa se mostrára sempre affecto ao partido opposicionista, constando até que d'elle recebêra avultada quantia em dinheiro; e que na assembléa eleitoral de S. Gião, sabendo que o administrador do concelho era ameaçado de morte, com difficuldade se levantára da cama aonde já estava deitado, sendo os paizanos que valeram para o dito administrador não ser assassinado. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = Antonio Ferrão.

E não podendo ser inquiridas mais testemunhas n'este dia, elle administrador syndicante mandou encerrar este auto, que vae assignar depois de lido por mim Antonio Saraivada Costa Ribeiro, escrivão, que o escrevi e assignei. = José Pereira Monteiro = Antonio Saraiva da Costa Ribeiro.

Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 22 dias do mez de novembro n'esta villa de Ceia e na secretaria da administração do concelho, onde se achava o dr. José Pereira Monteiro, administrador do concelho da Guarda em commissão regia n’este de Ceia, commigo escrivão de seu cargo, para o fim de proceder a este auto, ácerca da veracidade dos factos indicados no auto retrò, do qual este faz parte. E para isto mandou elle administrador syndicante vir á sua presença as testemunhas abaixo mencionadas, que passou a inquirir pela fórma que segue:

13.ª

Luiz de Almeida Mello, casado, escrivão de direito, de quarenta e oito annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntada ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que a uma não fôra roubada, e que assistindo ao escrutinio presenceára que as listas, sendo extrahidas conforme a lei, eram entregues aos escrutinadores que as liam sem substituição de nomes, dando-se por isso a cada um dos candidatos o numero exacto de votos que realmente tinham obtido. Ao segundo disse que não presenceára que o administrador do concelho ou presidente da mesa dessem ordem ao capitão Bayão para entrar com a força do seu commando na casa da assembléa eleitoral, e é geralmente dito que o mesmo capitão praticára este facto arbitrariamente; sendo certo que anteriormente ao acto eleitoral o presidente da mesa, tendo sido avisado de que se tentava contra a sua vida, e se projectava o roubo da uma e mesmo pelo que se havia passado na noite antecedente, pois já tinham disparado alguns tiros nas proximidades da casa da mesma assembléa, e mesmo pelos individuos por quem os caudilhos da opposição se faziam acompanhar, porque a maior parte eram suspeitos, e muitos tinham já respondido em processo crime, conferenciára com o mencionado capitão e lhe dissera que logo que desconfiasse de qualquer cousa n'este sentido, e no momento de perigo fizesse occupar a casa da assembléa pela força do seu commando, e foi esta talvez a rasão por que o mesmo presidente e administrador do concelho não deram ordem para a força saír, e consentiram que ella estivesse na igreja por se convencerem que o capitão Bayão tinha suspeitas do tumulto e desordem. Ao terceiro nada disse por já ter respondido. Ao quarto disse que na occasião em que a força armada entrára na igreja, na manhã do dia 15, achavam-se já ali os principaes caudilhos da opposição acompanhados dos seus assalariados, e que todos se apresentavam com maneiras provocantes e ameaçadoras. Ao quinto disse que depois da força armada entrar na casa da assembléa eleitoral, presenceára elle depoente occupar as posições que lhes foram indicadas pelo capitão Bayão, sendo a isto completamente estranhos o presidente da mesa e administrador do concelho. Ao sexto disse que é falso ter sido preso um cidadão eleitor na casa da assembléa eleitoral e durante os trabalhos da eleição, porque assistindo a todos os actos eleitoraes não presenceou tal facto, nem mesmo lhe consta que elle se dera. Ao setimo disse que não houvera protesto algum por parte da opposição perante a mesa ou administrador do concelho, e se os caudilhos d'ella saíram da casa da assembléa eleitoral foi em virtude do administrador declarar que pretendia apalpal-os para verificar se estavam armados, e elles, que não quizeram sujeitar se a isto para que lhes não fossem encontradas as armas por que se faziam acompanhar, retiraram d'ali, indo em seguida protestar perante o poder judicial. Ao oitavo disse que presenceára e vira que a mesa estava collocada no sitio em que sempre esteve para actos identicos aquelles a que se estava procedendo; que sobre ella se achava a uma, de pé, e que o presidente apenas a inclinava para si quando tinha de fazer a extracção das listas, collocando-a em seguida na primitiva posição, e isto fazia o mesmo presidente, porque sendo de baixa estatura, e a mesa alta, e alta tambem a uma, como muito bem ainda se póde verificar, impossivel lhe era extrahir d'ella as listas sem que a inclinasse para elle. Que pela posição em que se achava a mesa e a uma podia o escrutinio ser observado de qualquer ponto da igreja. Ao nono disse que é menos verdadeiro o que o capitão Bayão affirma no protesto sobre que depõe ácerca do seu comportamento, pois que consta a elle depoente que na assembléa de S. Gião, onde o administrador do concelho fôra ameaçado de morte, tendo-lho sido posto ao peito um resolver, o referido capitão que fôra immediatamente chamado para prestar auxilio ao mesmo administrador, se difficultára a levantar-se da cama onde já

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 72

72

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

se achava deitado, sendo o administrador salvo pelos paizanos. Que o dito capitão Bayão, chegando a esta villa no seu regresso de S. Gião, dera aqui sempre provas exuberantes de pertencer ao partido da opposição, não só porque na manhã do dia 15 de outubro findo disse no adro da igreja que, «a guerra civil estava proxima a rebentar no nosso desgraçado paiz, tocando toda a responsabilidade do primeiro tiro sobre El-Rei», mas tambem porque acompanhava constantemente com os principaes caudilhos d'ella, tendo com elles conferencias em casa do dr. Agostinho Thomás dos Santos Viegas, testemunha que já depoz, e d'onde elle depoente o vira saír no referido dia 15 já noite. Que o referido dr. Agostinho pertence ao partido miguelista, como quasi todos os que n'este concelho formavam a parcialidade da opposição, e por isso inimigos do actual governo, sendo inimigo figadal e rancoroso do deputado governamental o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, e do administrador d'este concelho, Elisiario Vaz Preto Casal, e foi em casa d'elles que se acharam reunidos sempre e alojados os individuos assalariados pela opposição e os caudilhos d’esta, saíndo d'ali todos os planos de desordem, e tanto que o mesmo dr. Agostinho, anteriormente ao acto eleitoral, precorrendo algumas povoações d'este concelho a pedir votos, dizia aos eleitores que para o mez de janeiro tinham de pegar em armas contra o actual governo. Disse mais que lhe consta que o mencionado capitão Bayão recebêra dinheiro para fazer e publicar o seu protesto, e é certo que elle trouxera 500$000 réis para José Mendes Diniz Belem, testemunha que tambem já depoz, e que foi um que mais se distinguiu por parte da opposição na ultima lucta eleitoral. E mais não disse, e sendo-lhe lido o depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira. = Luiz de Almeida Mello.

14.ª

Francisco Saraiva da Costa, solteiro, pharmaceutico, de trinta e seis annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que, por ver e presencear, sabe que a uma não fôra roubada; e que, assistindo ao escrutinio, tambem presenceára que elle fôra feito pela fórma que a lei determina, não havendo na leitura das listas substituição de nomes; dando-se a cada um dos dois candidatos o numero exacto de votos que haviam obtido em resultado da votação, e se continham dentro da mesma uma; e nem os que representavam o partido do governo tinham necessidade de praticar um tal facto, por isso que já desde a vespera tinham a certeza de terem a eleição vencida a favor do seu candidato por uma grande maioria, e isto por antecipadamente se terem contado as listas que entraram na urna, e que ali foram entregues aos eleitores; mas tambem porque sendo as listas, que continham o nome do candidato governamental, de formato muito maior e muito differente das que continham o nome do candidato da opposição, nenhuma difficuldade houve em saber o numero exacto das que tinham entrado na urna a favor de um e de outro candidato. Ao segundo disse que desde o exame a que por parte do poder judicial se procedeu na urna para se verificar se havia sido arrombada, se conservára sempre na casa da assembléa eleitoral, até muito depois da força armada ali entrar, e que conservando-se sempre proximo do administrador do concelho e do presidente da mesa, não presenceára, nem vira, nem lhe constára, fosse por estes dada alguma ordem ou vocal ou por escripto ao capitão Bayão, para entrar com a força do seu commando na mesma casa, da assembléa, e se ella ali entrou, foi por mero arbitrio do mesmo capitão; e talvez porque, apresentando-se os caudilhos da opposição com grande numero de individuos assalariados, suspeitos e de má fama dentro da igreja, com ares e maneiras provocantes e ameaçadoras; e tendo-lhes sido dito anteriormente ao acto eleitoral pelo presidente da mesa, que se tentava contra a sua vida, e se projectava o roubo da uma, conforme aviso que lhe havia sido feito, seria bom e até conveniente fizesse occupar a casa da assembléa, no momento de perigo, pela força do seu commando, que o mesmo capitão praticára este facto; e é certo que o presidente da mesa e o administrador do concelho, em vista da combinação que haviam feito com o capitão, convencendo-se que este alguma cousa tinha observado, no sentido que deixa exposto, e que por isso o momento de perigo era proximo, não deram ordem para que a força saísse da casa da assembléa, e consentiram que ella ali permanecesse Ao terceiro nada disse, por ter já respondido. Ao quarto disse que na occasião em que a força armada entrára na casa da assembléa eleitoral, estavam ali os caudilhos da opposição com toda a sua gente, e pela maneira que se apresentaram, e como já disse, mostravam bem pretendiam alterar a ordem publica, sendo necessaria toda a prudencia que os eleitores do partido governamental tiveram, para que hoje não houvesse muitas desgraças a lamentar. Ao quinto disse que viu e presenciou que a força armada depois de entrar na igreja, occupou ali as posições que lhe foram indicadas pelo seu capitão commandante, e a que foram completamente estranhos o presidente da mesa e administrador do concelho, e tanto que o referido capitão, depois da collocação da força nas posições que por elle lhe foram indicadas, voltou-se para a assembléa e disse: «fica assim para que a uma fique desaffrontada». Ao sexto disse que, durante o acto eleitoral, o administrador do concelho tratára a todos os eleitores, tanto governamentaes como opposicionistas, com a maior delicadeza e urbanidade, e é falso que elle prendesse algum d’elles. Ao setimo disse que, perante a mesa, ao administrador do concelho não fôra feito protesto algum por parte da opposição, e se esta saíu da igreja, foi porque não quiz sujeitar-se a que os seus caudilhos fossem revistados pelo administrador do concelho, que pretendia verificar se estavam armados, como o mesmo administrador já tinha feito a muitos do partido do governo; constando-lhe a elle depoente que a saída da opposição da casa da assembléa eleitoral tambem tivera por fim irem planear a fórma de entrarem á força dentro da igreja, e saberem a gente que para isto seria precisa, sendo certo que se mandára vir de Sandomil muita gente, e em numero de mais de cem pessoas; que na estrada real, junto a Torrozello, foram detidas por uma senhora, que de proposito e para este fim ali se achava, e que a mesma opposição, conhecendo as inconveniencias d'este plano, fôra depois protestar perante o poder judicial. Ao oitavo disse que a mesa estava collocada dentro da igreja, e no sitio aonde sempre esteve e para actos identicos áquelle a que se estava procedendo, e que os eleitores podiam muito bem verificar a legalidade do acto eleitoral se quizessem, pois que sómente era prohibido a qualquer d’elles o collocar-se na retaguarda do presidente da mesa, pelo receio que este tinha de ser assassinado, como lhe tinham dito, e elle depoente já declarou; que sobre a mesa estava a uma de pé, e que se algumas vezes o presidente a inclinava para elle, era pela muita difficuldade que tinha em extrahir d’ella as listas, em rasão de ser de baixa estatura, e alta a mesa e a uma, como se póde muito bem verificar. Ao nono disse que o capitão Bayão não teve o comportamento que allega em seu protesto, durante a lucta eleitoral, porque em S. Gião, como elle testemunha foi informado, vendo que se projectava o roubo da uma, se deitára na cama, allegando que estava muito enfadado, e depois sendo chamado para prestar auxilio ao administrador do concelho, que se viu ameaçado de morte, sendo-lhe posto um rewolver ao peito, se difficultára em se levantar e prestar o auxilio que lhe era requisitado; e na mesma povoação entrando em casa do padre José Lopes Freire, pedíra ali um copo de vinho, e brindara ao triumpho do partido opposicionista, e que sendo como era seu correligionario politico, havia de empregar os meios ao seu alcance para que podesse alcançar a victoria.

Página 73

73

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Que depois que regressára a esta villa, o mesmo capitão Bayão mostrára sempre o seu affecto ao partido da opposição, acompanhando sempre com os caudilhos d'ella e conferenciando com elles; constando-lhe tambem que para isto fôra algumas vezes a casa do dr. Agostinho Thomás dos Santos Viegas, um dos principaes influentes da mesma opposição, e aonde se achavam sempre os correligionarios em sessão permanente, e aonde eram formados todos os planos; sendo certo que o mesmo dr. Agostinho pertence, como quasi todos os influentes do partido da opposição n'este concelho, á parcialidade miguelista, e como tal, inimigos do actual governo, e inimigo capital do candidato governamental o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, e do administrador Elisiario Casal. Que consta e é publico e notorio que o capitão Bayão recebêra dinheiro da opposição para fazer e publicar, como publicou, o seu protesto; e na manhã do dia 15 de outubro findo, disse o mesmo capitão no adro da igreja d'esta villa, que: «a guerra civil estava proxima a rebentar no nosso desgraçado paiz, e que a responsabilidade do primeiro tiro pesava toda sobre El-Rei». E mais não disse, e sendo-lho lido o seu depoimento, o ratificou e vae assignar. = Pereira = Francisco Saraivada Costa.

15.ª

Luiz José Ferreira, viuvo, negociante, de cincoenta e cinco annos de idade, morador n'esta villa, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado pelo assumpto do auto retrò, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, e com relação aos factos no mesmo auto mencionados, disse ao primeiro que é falso ter sido roubada a uma na assembléa eleitoral d'esta villa, á parte os esforços que os influentes da opposição empregaram para a roubar na noite do dia 14 de outubro findo e no dia 15. Ao segundo disse que a força armada entrára na casa da assembléa eleitoral, sem que para isso houvesse ordem ou requisição do presidente da assembléa ou do administrador do concelho, sabendo com tudo que estes a consentiram ali, por se convencerem de que a sua vida e a uma corriam perigo, por isso que tendo sido avisados de que estava formado o plano de os assassinarem e roubarem a uma, tinham combinado anteriormente ao acto eleitoral com o capitão Bayão, que este entrasse com a força do seu commando na casa da assembléa, quando visse chegado o momento de perigo; presenceando elle testemunha que alguns individuos da opposição soltaram n'aquella occasião vozes de «morra o administrador». Ao terceiro disse que já havia respondido. Ao quarto disse que havia tambem respondido na ultima parte do seu depoimento, com relação ao segundo facto. Ao quinto disse que as posições que a força armada occupára dentro da igreja, foram-lhe indicadas sómente pelo seu commandante o capitão Bayão, sendo estranhos a este facto o administrador do concelho e presidente da mesa. Ao sexto disse que é falso e destituido de fundamento o dizer-se que fôra preso um cidadão eleitor na casa da assembléa eleitoral; e não póde dizer-se de boa fé que o administrador do concelho tratára a todos bem, não praticando a menor violencia, e se elle não fôra tão bom como é, talvez que não se praticassem muitos factos que se praticaram. Ao setimo disse que ninguem protestára perante a mesa ou administrador do concelho, e que se a opposição saíu da igreja para protestar perante o poder judicial, foi porque se não quizeram sujeitar a serem revistados pela auctoridade administrativa, que pretendeu verificar se estavam armados, como já tinha feito a alguns eleitores que tinham votado com o candidato governamental. Ao oitavo disse que a mesa estava no mesmo sitio em que sempre foi collocada para aquelles actos, e de qualquer ponto da igreja se podia verificar a legalidade do escrutinio, e tanto mais que se podia chegar até ella, sendo sómente prohibida a estada de qualquer pessoa por detrás da cadeira da presidencia, porque o presidente receiava, como já disse, ser assassinado. Que a uma estava de pé sobre a mesa, e sómente o presidente a inclinava para elle, quando tinha de fazer a extracção das listas, collocando-a em seguida na primitiva posição. Ao nono disse que é publico e notorio que o capitão Bayão, na assembléa eleitoral de S. Gião, sendo chamado para prestar auxilio ao administrador do concelho, que se viu ameaçado de morte, se difficultára a levantar-se da cama em que já estava deitado, acompanhando ali com Joaquim Manuel da Silveira, de Sandomil, um dos influentes da opposição, e em casa de quem depois estivera quando regressava para esta villa. Que durante a residencia do mesmo capitão n'esta villa, fôra elle algumas vezes conferenciar com os caudilhos da opposição a casa do dr. Agostinho Thomás dos Santos Viegas, que, como bem sabido é, pertence ao partido miguelista, sendo por isso inimigo do actual governo, como tambem o é rancoroso e figadal do candidato governamental o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, e do administrador do concelho, Elisiario Casal. Que tambem lhe consta que o referido capitão recebêra uma porção de libras para fazer e publicar o seu protesto, e ácerca do qual depõe. E perguntado por elle administrador syndicante a que grupo politico pertenceu durante a ultima luta eleitoral, respondeu que foi completamente neutral. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e não assigna, por dizer que não sabia escrever. = José Pereira Monteiro.

E não podendo ser inquiridas mais testemunhas n'este dia, elle administrador mandou encerrar este auto, que vae assignar, sendo primeiro lido por mim, Antonio Saraiva da Costa Ribeiro, escrivão, que o escrevi o assignei. = José Pereira Monteiro = Antonio Saraiva da Costa Ribeiro.

Anno do nascimento do Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 23 dias do mez do novembro, n ella villa de Ceia, e na secretaria da administração do concelho, aonde se achava o dr. José Pereira Monteiro, administrador do concelho da Guarda, em commissão regia n'este de Ceia, commigo escrivão de seu cargo, a fim de proceder a este auto para conhecimento da veracidade dos factos mencionados no auto retrò, e do qual este fica fazendo parte. E para isto mandou elle administrador vir á sua presença as testemunhas abaixo mencionadas, que continuou a inquirir pela fórma que segue.

16.ª

Bernardo Augusto de Abranches Pinto e Pina, presbytero, parocho da freguezia de S. Gião, aonde é morador, de quarenta e seis annos de idade, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos indicados no auto retrò, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse que sabe, por ouvir dizer, que durante o tempo que o capitão Bayão esteve na freguezia de S. Gião, declarára ali algumas vezes que não era affecto ao partido do governo, por pertencer ao da opposição, presenceando elle depoente, na noite de 13 para 14 de outubro findo, e na occasião em que houve tumulto na casa da assembléa, promovido pela gente pertencente ao partido opposicionista que ali se achava, ouvindo dizer que este tumulto fôra feito de proposito para assaltarem a uma; o furriel da força militar ordenára á sentinella que se achava postada á porta lateral da igreja, que chamasse ás armas, porém esta não satisfizera a tal ordem, que lhe foi dada primeira e segunda vez pelo mesmo furriel, e sómente satisfez a ella quando á terceira vez foi ameaçado pelo dito furriel, chamando então ás armas, mas em voz baixa e voltada para o lado opposto aquelle em que se achava a guarda, não sabendo porém elle depoente se a dita sentinella fizera isto de proposito, e talvez por instrucções que lhe fossem dadas pelo referido capitão Bayão. Que sabe tambem que o mencionado capitão fôra por mais de uma vez avisado de que se planeava algum mau acontecimento, e por isso que para o prevenir seria bom que elle se aproximasse da casa da assembléa eleitoral, e elle nunca dera importancia a tal cousa, mostrando-se sempre indifferente e negligente. E mais não disse, e sendo-lhe lido o depoimento

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 74

74

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

o ratificou e vae assignar. = Pereira = Bernardo Augusto de Abranches Pinto e Pina.

17.ª

Francisco do Gouveia e Cunha, casado, proprietario, de cincoenta e cinco annos de idade, morador em S. Gião, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse que o capitão Bayão durante a sua residencia na freguezia de S. Gião dera ali sempre mostras de pertencer ao partido da opposição, e sómente mostrava agrado aos influentes d'esta. Que na noite do dia 13 para 14 de outubro findo houvera tumulto na casa da assembléa eleitoral d'aquella freguezia, promovido pela gente da opposição, com o fim de assaltarem e roubarem a uma, e que, pretendendo o furriel da força armada obstar a elle, ordenára á sentinella que estava postada á porta travessa ou lateral da igreja que chamasse ás armas, porém esta não satisfizera tal ordem senão depois de lhe ser intimada com ameaças pela terceira vez pelo mesmo furriel, chamando então ás armas com voz fraca e quasi inintelligivel e voltando-se para o lado opposto aquelle em que se achava a guarda, ouvindo elle depoente dizer que a mesma sentinella obrára por esta fórma em virtude de instrucções que anteriormente lhe haviam sido dadas pelo dito capitão Bayão, mostrando-se este sempre negligente no serviço que lhe estava incumbido. E que nada mais tinha a dizer, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = Francisco de Gouveia e Cunha.

18.ª

João Diogo Galvão, casado, proprietario, de trinta e oito annos de idade, morador em S. Gião, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse que, pelo presencear, sabe que o capitão Bayão durante a sua residencia em S. Gião fôra sempre negligente no cumprimento dos seus deveres, dando sempre mostras de pertencer ao partido da opposição, sendo publico e notorio que estivera em casa do padre José Lopes Freire, d'aquella povoação, e ali dera vivas ao mesmo partido. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e não assigna por dizer que não sabia escrever. = José Pereira Monteiro.

19.ª

José Mendes de Abreu, casado, proprietario, de sessenta e quatro annos de idade, morador em S. Gião, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse que o padre José Lopes Freire, da sua freguezia, que foi influente da opposição na ultima lucta eleitoral, dissera a elle depoente que o capitão Bayão estivera em sua casa e ali bebera vinho, dando vivas ao partido opposicionista, e declarára que a elle pertencia. Que o mesmo capitão durante o tempo que estivera n'aquella freguezia fôra sempre negligente no cumprimento dos seus deveres. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e vae assignar. = Pereira = José Mendes de Abreu.

20.ª

Antonio Alves da Rocha, solteiro, negociante e proprietario, de trinta e quatro annos de idade, morador em S. Romão, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verdade. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò, que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que, pelo ver e presencear, sabe que a uma não fóra roubada na assembléa eleitoral d'esta villa, apesar dos esforços que a gente pertencente ao partido da opposição fizera e empregára durante a noite do dia 14 e no dia l5 de outubro findo para o conseguir, e que assistindo ao escrutinio presenceára tambem que elle fóra feito pela fórma que a lei determina, não havendo na leitura das listas substituição de nomes, dando-se a cada um dos candidatos o numero exacto de votos que tinham obtido, e se continham dentro da mesma uma. Disse mais que o partido do governo nenhuma necessidade tinha em praticar o roubo da uma, por isso que logo que a votação terminou sabia que a eleição estava vencida por uma grande maioria a favor do seu candidato; e por este motivo empregou a gente do mesmo partido toda a attenção e cuidado em não deixar roubar a uma. Ao segundo disse que não houvera ordem legal para que a força armada entrasse na casa da assembléa eleitoral, e se ali entrou foi por arbitrio do capitão commandante, e que o presidente da mesa e administrador do concelho o consentiram por se convencerem que se tramava contra suas vidas como anteriormente tinham sido avisados, e do que tinham tambem prevenido o referido capitão. Ao terceiro nada disse por ter já respondido. Ao quarto disse que a força armada entrára na casa da assembléa quando ali havia indicios de tumulto, promovido pelos caudilhos da opposição que ali se achavam rodeados de gente assalariada, suspeita e de má fama, apresentando-se todos com maneiras provocantes e ameaçadoras. Ao quinto disso que as posições que a força armada tomára na casa da assembléa eleitoral depois de ali entrar foram-lhe indicadas pelo capitão, sendo completamente estranhos a este facto o presidente da assembléa e administrador do concelho. Ao sexto disse que assistiu a todo o acto eleitoral, e por isso sabe que é falso ter sido preso na casa da assembléa um cidadão eleitor. Ao setimo disse que perante a mesa e o administrador do concelho não houvera protesto algum, e se a opposição saíu da casa da assembléa foi em virtude do administrador do concelho declarar que pretendia apalpar a todos para, verificar se sim ou não estavam armados, e que não querendo elles lhes fossem encontradas as armas por que se faziam acompanhar, se retiraram indo depois protestar perante o poder judicial; ouvindo elle depoente dizer que o verdadeiro motivo da saída não fôra este, mas sim para irem combinar o plano de assaltarem á força a casa da assembléa e conhecerem os meios de que podiam dispor para isto, tendo-se ainda mandado vir gente do Sandomil, que em numero superior a cem pessoas fôra retida por uma senhora, irmã do candidato da opposição, nas proximidades da catraia de Torrozello, que lhes applicára que não viessem a esta villa porque davam cabo de seu pae. Ao oitavo disse que a mesa estava aonde sempre esteve para actos identicos, que de qualquer ponto da igreja podia ser vista, podendo qualquer eleitor chegar até ella, sendo sómente prohibida a estada de qualquer pessoa por detrás da cadeira do presidente pelo motivo d'este receiar ser assassinado. Que a uma estivera sempre de pé sobre a mesa, e sómente era inclinada pelo presidente quando tinha de extrahir d'ella as listas, collocando-a em seguida na primitiva posição. Ao nono disse que o capitão Bayão, pelo que elle depoente presenceára, mostrára bem que não era imparcial e desapaixonado, e pelo contrario deu sempre mostras de pertencer ao partido da opposição, com cujos caudilhos privava, constando lhe que com elles conferenciava em casa do dr. Agostinho Viegas, d'esta villa, e do padre José Freire, de S. Gião. E perguntado por elle administrador syndicante ácerca de que partido politico tinha feito parte durante a ultima lucta eleitoral, respondeu que havia seguido o partido do governo, mas sem a menor animosidade para com o da opposição. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou o vae assignar. = Pereira. = Antonio Alves da Rocha.

21.ª

Emygdio José de Pina, casado, proprietario, de cincoenta e tres annos de idade, morador em S. Romão, testemunha devidamente ajuramentada, prometteu dizer a verda-

Página 75

75

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

de. E perguntado ácerca dos factos constantes do auto retrò que lhe foi lido por elle administrador syndicante, disse ao primeiro que é falso ter sido roubada a uma, apesar dos esforços que, para o conseguirem, empregaram muitos individuos que faziam parte do partido da opposição, na noite de 14 e no dia 15 de outubro lindo; e que, tendo assistido ao escrutinio presenceára que elle fôra feito com toda a legalidade, não havendo na leitura das listas substituição de nomes. Ao segundo disse que tendo assistido a todo o acto eleitoral, não presenceára que o presidente da mesa desse ordem alguma ao capitão Bayão para que entrasse com a força do seu commando na casa da assembléa eleitoral, e se entrou ali a mesma força foi por arbitrio do referido capitão; sendo tambem estranho a este facto o administrador do concelho, e que esta auctoridade e o presidente da mesa a consentiram ali porque tendo sido avisados de que se tentava contra suas vidas, e que a gente da opposição rodeada por individuos assalariados, de má fama e suspeitos, se apresentára na casa da assembléa com maneiras provocantes e ameaçadoras, e por isso que estava chegado o momento do perigo. Ao terceiro nada disso por já ter respondido. Ao quarto disse que na occasião em que a força armada entrava na assembléa havia indicios de tumulto, promovido pela gente de Santa Comba, aonde dos mais salientes se tornavam uns chamados Francezes e Bastos, que ali se achavam ás ordens de Thiago de Albuquerque e que elle alcunhava de seus caceteiros, e talvez fosse por esse motivo que a tropa entrou na igreja. Ao quinto disse que as posições occupadas na igreja pela força armada foram a esta indicadas pelo capitão commandante, sendo estranhos a este facto o presidente da mesa e administrador do concelho, sendo certo que elle depoente ouvira dizer que antes de começarem os actos eleitoraes o presidente da mesa expozera ao commandante da força as suspeitas que tinha ácerca da sua segurança pessoal por avisos que particularmente lhe tinham feito, e é possivel e presume elle depoente que a entrada da força, sómente dependente da vontade do capitão, como já disse, nessa occasião fosse motivada por qualquer circumstancia extraordinaria que o mesmo capitão observasse, mas o que é fóra de duvida é que o administrador Elisiario Casal fôra estranho a esse acontecimento. Ao sexto disse que é redondamente falso ter sido preso um cidadão na assembléa eleitoral pelo administrador do concelho, e que este facto é uma pura invenção da opposição para armar ao effeito. Ao setimo disse que não houvera protesto algum perante a mesa ou administrador do concelho, e que se a opposição saíu da casa da assembléa eleitoral foi em virtude do administrador pretender verificar se estavam ou não armados, e que em seguida fôra protestar perante o poder judicial; ouvindo elle testemunha dizer que não fôra este o verdadeiro motivo da saída, mas sim o de combinarem entrar á força dentro da igreja, e roubarem a uma, para o que tinham mandado vir gente de fóra, sendo retidas mais de cem pessoas, que de Sandomil vinham n'essa occasião para esta villa, nas proximidades da catraia de Torrozello, por D. Constança, irmã do candidato opposicionista, que para este fim ali fôra de proposito. Ao oitavo disse que a mesa estava collocada aonde sempre esteve para actos identicos, podendo chegar a ella qualquer pessoa, e que a uma se achava de pé sobre ella, sendo sómente inclinada pelo presidente quando fazia a extracção das listas. Ao nono disse que o capitão Bayão dava mostras exuberantes de pertencer e apoiar o partido da opposição, e tanto que n'esta villa é publico e notorio que elle recebêra dinheiro do partido opposicionista, com cujos caudilhos conferenciava em casa do dr. Agostinho Viegas, miguelista, inimigo do actual governo, e rancoroso e figadal do candidato governamental o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga e de sua familia. E perguntado por elle, administrador syndicante ácerca de que grupo politico tinha feito parte durante a ultima lucta eleitoral, respondeu que havia votado com o governo, porém sem a menor animosidade para com a opposição. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o ratificou e Vae assignar. = Pereira = Emygdio José da Silva.

Por esta fórma houve elle administrador syndicante este auto por concluido, e que vae assignar depois de lido por mim Antonio Saraiva da Costa Ribeiro, e escrivão, que o escrevi e assignei. = José Pereira Monteiro = Antonio Saraiva da Costa Monteiro.

Instrumento de protesto

Traslado do instrumento de protesto que fazem os outorgantes abaixo mencionados

Saibam os que este publico instrumento de protesto virem, que no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 15 dias do mez de outubro, n'esta villa de Ceia e meu escriptorio, compareceram pessoalmente os cidadãos os ex.mos bacharel José de Abranches Homem da Costa Brandão, solteiro, de maior idade, proprietario, de Torrozello; bacharel Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, viuvo, proprietario, de S. Romão; bacharel Agostinho Thomás dos Santos Viegas, viuvo, proprietario, de Ceia; bacharel João Cabral Soares de Albergaria, casado, proprietario, de Santa Marinha; Thiago do Albuquerque Amaral, casado, proprietario, de Santa Comba; Antonio de Frias Eça Ribeiro, casado, proprietario, de Pinhanços; Luiz de Mello Machado Albuquerque Côrte Real, viuvo, proprietario, de S. Martinho; Antonio de Almeida Azevedo e Castro, viuvo, proprietario, de Santa Marinha; Francisco Rodrigues de Bastos, casado, proprietario, de Santa Comba; Antonio Rodrigues de Bastos, casado, proprietario, da aldeia, de S. Miguel, freguezia de Santa Comba; Manuel Gomes de Almeida, casado, proprietario, de Santa Marinha; Manuel Cabral Tavares de Carvalho, casado, proprietario, de Santa Marinha; Antonio José Alves, casado, proprietario, de Santa Comba; Antonio Correia Ganilha, casado, proprietario, do logar do Eirô, freguezia de Santa Marinha; Pedro Alonso Ponces Nogueira, solteiro, de maior idade, proprietario, do logar do Eirô, freguezia de Santa Marinha; José Fernandes Alves, casado, negociante, de Santa Comba; Antonio Rodrigues Ferreira, casado, proprietario, de Santa Comba; Manuel Alves de Carvalho Marques, casado, proprietario, de Vodra, freguezia de Ceia; Antonio de Padua da Costa Nogueira, casado, proprietario, do Eirô, freguezia de Santa Marinha; Luiz de Albuquerque do Amaral Cardoso, casado, proprietario, d'esta villa; José Mendes Diniz Belem, viuvo, proprietario e negociante, d'esta villa; Luiz Ribeiro Pinto Guedes Bacellar, solteiro, de maior idade, proprietario e juiz ordinario do julgado de Torrozello, morador em Santa Eulalia; Antonio Augusto Mendes Borges, solteiro, de maior idade, pharmaceutico, de Torrozello; Albano Mendes da Fonseca e Cunha, solteiro, de maior idade, proprietario, de Torrozello; Francisco Pereira de Azevedo Hortas, casado, proprietario, de Pinhanços, e José de Mello Borges e Silva, solteiro, de maior idade, proprietario, de S. Thiago, todos d'esta comarca, aos quaes reconheço pelos proprios e são conhecidos das testemunhas ao diante nomeadas e assignadas, que igualmente conheço, do que tudo dou minha fé. E perante mim e testemunhas, por elles outorgantes foi dito:

Que vinham protestar contra a validade da eleição d'esta assembléa de Ceia, Circulo n.º 76, pelos fundamentos seguintes:

1.º Por no dia 13 do corrente mez se ter constituido a mesa eleitoral antes das nove horas da manhã, para o que, de proposito, se adiantou o relogio da misericordia d'esta villa, por onde tinham de regular-se, visto estar parado o da igreja matriz, local designado para a assembléa eleitoral.

2.º Por se não ter cumprido a disposição do § 1.° do ar-

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 76

76

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tigo 74.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, visto não se ter concluido a votação no primeiro dia, e não terem sido rubricadas as listas que entraram na urna.

3.° Por o presidente da assembléa, o bacharel Amandio Eduardo da Motta Veiga, e os membros da mesa Antonio de Almeida Mello e Senna, José Luiz Marrão, Antonio de Brito Freire e Vasconcellos e Fernando José da Silva, secretarios e escrutinadores d'esta mesma assembléa, e todos de Ceia, bem como o administrador do concelho o bacharel Elisiario Vaz Preto Casal, mandarem, quando se estava para dar principio ao escrutinio, cercar por soldados de infanteria n.º 12, em duas fortes alas, com armas carregadas e bayoneta em bôca dellas, a mesa eleitoral, obrigando violentamente a afastarem-se para distancia d'onde não podiam vigiar e ver os nomes contidos nas listas, aos differentes cidadãos que se apresentaram na assembléa no dia de hoje 15 do corrente, coarctando-lhes assim a sua liberdade.

4.° Por o presidente tirar da uma as listas ás duzias, rasgando-as sem serem lidas, o que continuou a ser praticado por toda a mesa na presença da força armada, até que os differentes cidadãos se viram forçados a abandonar o logar da assembléa, por lhes ser vedado o livre accesso á uma para verificarem a leitura e numero dos votos contidos em cada uma das listas extrahidas, e por terem sido d'ali expulsos aos empurrões.

5.° Por se ter empregado n'este acto a força armada; sem que se suspendessem os actos eleitoraes, como determina o § 3.º do artigo 59.° do citado decreto, não havendo motivo para o emprego da força, porque não houve tumulto nem aggressão, a que houvesse de obstar, nem mesmo tendencia para isso.

6.° Por todas as prepotencias e arbitrariedades praticadas pela auctoridade administrativa e seus agentes, quando da parte dos eleitores presentes houve a maxima circumspecção e cordura para evitar desordens e derramamento de sangue, que era inevitavel se assim não procedessem, retirando-se do local da assembléa.

E portanto; em vista da lei, se acha nulla esta eleição e como tal deve ser julgada pela camara dos senhores deputados; e por isso rogaram a mim tabellião que lavrasse o presente protesto nas minhas notas, e lhes entregasse o competente traslado.

Assim o disseram e outorgaram e vão assignar com as testemunhas a todo o acto presentes. — Ayres de Albuquerque do Amaral Cardoso, casado, proprietario, morador em Pinhanços, e Joaquim Manuel da Silveira Castello Branco, solteiro, de maior idade, proprietario, de Sandomil, d'este concelho, depois de lhes ser lido este instrumento em voz alta, clara e intelligivel por mim Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, tabellião que o escrevi e vou assignar em publico e raso, e vae ser collada no fim e inutilisada uma estampilha de quinhentos réis para pagamento do sêllo. — José de Abranches Homem da Costa Brandão — Antonio Hortencio Ferreira da Fonseca — Agostinho Thomás dos Santos Viegas — João Cabral Soares de Albergaria — Thiago de Albuquerque Amaral — Antonio de Frias d'Eça Ribeiro — Luiz de Mello Machado Côrte Real Antonio de Almeida Azevedo e Castro — Francisco Rodrigues de Bastos — Antonio Rodrigues de Bastos — Manuel Gomes de Almeida — Manuel Cabral Tavares de Carvalho — Antonio José Alves — Antonio Correia Ganilha — Pedro Alonso Ponces Nogueira — José Fernandes Alves — Antonio Rodrigues Ferreira — Manuel Alves de Carvalho Marques — Antonio de Padua da Costa Nogueira — Luiz de Albuquerque do Amaral e Cardoso — José Mendes Diniz Belem — Luiz Ribeiro Pinto Guedes Bacellar. — Antonio Augusto Mendes Borges — Albano Mendes da Fonseca e Cunha — Francisco Pereira de Azevedo Hortas — José de Mello Borges da Silva — Ayres de Albuquerque do Amaral Cardoso — Joaquim Manuel da Silveira Castello Branco.

Em fé. Signal publico de verdade. O tabellião, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo. Segue-se a estampilha de 500 réis assim inutilisada, 15 de outubro de 1878 e oito. — Figueiredo.

Não se contém mais no dito instrumento que bem e fielmente para aqui transcrevi do original, com que este conferi e concertei, e ao respectivo livro de notas n.º 25 me reporto em meu poder e cartorio.

Ceia, 15 de outubro do anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, tabellião que o escrevi, conferi e vou assignar em publico e raso.

Em fé de verdade. O tabellião = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conferi e concertei — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Ex.mo sr. — Diz o bacharel José de Abranches Homem da Costa Brandão, solteiro, de maioridade, proprietario, de Torrozello, que para o que lhe convier precisa se lhe passe certidão, em vista dos cadernos do recenseamento eleitoral d'este concelho, se o supplicante se acha recenseado como eleitor, bem como os individuos seguintes: Antonio Hortencio Ferreira da Fonseca, de S. Romão; Agostinho Thomás dos Santos Viegas, Luiz de Albuquerque do Amaral Cardoso, José Mendes Diniz Belem, estes de Ceia; Manuel Alves de Carvalho Marques, do logar de Vodra, freguezia de Ceia; João Cabral Soares de Albergaria, Antonio de Almeida Azevedo o Castro, Manuel Gomes de Almeida, Manuel Cabral Tavares de Carvalho, estes de Santa Marinha; Antonio Correia Ganilha, Pedro Alonso Ponces Nogueira e Antonio de Padua da Costa Nogueira, estes do logar do Eirô, freguezia de Santa Marinha; Thiago de Albuquerque e Amaral, Francisco Rodrigues de Bastos, Antonio José Alves, José Fernandes Alves, Antonio Rodrigues Ferreira, estes de Santa Comba; e Antonio Rodrigues de Bastos, do logar de Aldeia de S. Miguel, freguezia de Santa Comba; Luiz de Mello Machado Côrte Real, de S. Martinho; Antonio de Frias de Eça Ribeiro, Francisco Pereira de Azevedo Hortas, estes de Pinhanços; Luiz Ribeiro Pinto Bacellar, de Santa Eulalia; Antonio Augusto Mendes Borges e Albano Mendes da Fonseca e Cunha, de Torrozello; e José de Mello Borges e Silva, de S. Thiago; e como esta se não possa passar sem despacho

Pede ao ex.mo presidente da camara municipal d'esta villa de Ceia, mande se lhe passe. — E. R. M. cê

Em 25 de outubro de 1878. = José de Abranches Homem da Costa Brandão.

Deferido. — Travancinha, 26 de outubro de 1878. O vice-presidente, Castro.

Certidão

Francisco Borges da Silva, escrivão da camara municipal do concelho de Ceia, por nomeação da mesma camara e confirmação regia.

Certifico que compulsando o livro do recenseamento eleitoral d'este concelho, revisto no corrente anno de 1878, e o do recenseamento supplementar feito por effeito da lei de 8 de maio do dito anno, que se acham archivados na secretaria da camara, n'elles encontrei inscriptos e recenseados como eleitores, os cidadãos abaixo mencionados a saber:

Na freguezia de Torrozello, o bacharel José de Abranches Homem da Costa Brandão, Antonio Augusto Mendes Borges e Albano Mendes da Fonseca e Cunha, moradores em Torrozello.

Na freguezia de S. Romão, o bacharel Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, morador em S. Romão.

Na freguezia de Ceia, o bacharel Agostinho Thomás dos Santos Viegas, Luiz de Albuquerque do Amaral e Cardoso, José Mendes Diniz Belem, moradores em Ceia, e Manuel Alves de Carvalho, morador em Vodra.

Na freguezia de Santa Marinha, o bacharel João Cabral Soares de Albergaria, Antonio de Almeida Azevedo,

Página 77

77

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Manuel Gomes de Almeida, Manuel Cabral Tavares de Carvalho, moradores em Santa Marinha; Antonio Correia Ganilha, Pedro Soares Nogueira e Antonio de Padua da Costa Nogueira, moradores no logar de Eirô.

Na freguezia de Santa Comba, Thiago de Albuquerque, Francisco Rodrigues de Bastos, Antonio José Alves, José Fernandes Alves, Antonio Rodrigues Saraiva, moradores em Santa Comba, e Antonio Rodrigues de Bastos, morador, em Aldeia de S. Miguel.

Na freguezia de S. Martinho, Luiz de Mello Machado Côrte Real, morador em S. Martinho.

Na freguezia de Pinhanços, Antonio de Frias de Eça Ribeiro e Francisco Pereira de Azevedo Hortas, moradores em Pinhanços.

Na freguezia de Santa Eulalia, Luiz Ribeiro Bacellar, morador em Santa Eulalia.

Na freguezia de S. Thiago, José de Mello Borges e Silva, morador em S. Thiago.

E para assim constar e em virtude do despacho que antecede, passei a presente certidão á face dos referidos livros, a qual vae por mim assignada.

Ceia, aos 11 dias do mez de novembro do anno de 1878. = Francisco Roque da Silva.

Instrumento do contra-protesto

Instrumento do contra-protesto que fazem os outorgantes infra indicados e no fim assignados com outros

Saibam os que este publico instrumento de contra-protesto virem, que no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 18 dias do mez de outubro, n’esta villa de Ceia e morada do ex.mo dr. Amandio Eduardo da Motta Veiga, onde eu tabellião a seu rogo vim, ahi sendo presentes os cidadãos eleitores da assembléa d'esta villa de Ceia, o bacharel José da Motta Veiga, viuvo, proprietario, o reverendo Antonio Vieira de Figueiredo, parocho d'esta freguezia, o mesmo bacharel Amandio da Motta Veiga, solteiro, o bacharel Sebastião Fernandes da Costa, o bacharel Antonio Saraiva da Costa Ribeiro, reverendo José Carlos de Moura, Antonio de Brito Freire e Vasconcellos, Antonio Joaquim Marques Perdigão, todos d'esta villa de Ceia, com os demais cidadãos eleitores no fim d'este instrumento assignados, e cujos nomes aqui se hão como reproduzidos para todos os effeitos, todos meus conhecidos e das testemunhas ao diante nomeadas e assignadas, que igualmente reconheço, do que tudo dou minha fé, e por todos elles em minha presença foi dito: Que com a lealdade que os caracterisa, vem solemnemente contra-protestar o protesto apresentado por alguns individuos que na lucta eleitoral, que acaba de travar-se n’este circulo, se mostraram hostis e fizeram opposição á auctoridade constituida.

Não podendo descer a muitas especialidades que este documento não comporta e que se reservam apresentar n'outro logar, para tornarem bem patentes as intrigas e calumnias de que a opposição se serviu para obter votos, estes cidadãos possam desmentir redondamente os fundamentos do protesto apresentado contra a validade da eleição, a que n'este circulo se procedeu.

1.° É redondamente falso que a mesa se constituisse antes da hora legal.

Ninguem, em boa fé, póde deixar de affirmar que o relogio da torre da igreja matriz onde a assembléa eleitoral se reuniu trabalhasse regularmente durante o dia 13 do corrente, e a mesa só se constituiu depois de terem soado n'este relogio as nove horas da manhã.

Nenhum dos signatarios do protesto póde apresentar prova de sua asserção; e tanto mais que na occasião em que se constituiu a mesa varias pessoas, que tinham relogio, verificaram ser hora legal.

2.º As actas da eleição demonstram o contrario do que affirmam os protestantes.

As listas foram todas rubricadas pelos secretarios da mesa em cumprimento da lei, e tanto que ninguem protestou n'essa occasião contra a falta d'esse acto, que foi presenceado por muita gente, e praticado perante toda a assembléa.

O terceiro fundamento do protesto é o lamento dos condemnados.

A opposição, tendo luctado tenazmente para se apoderar da uma onde tinha a sua derrota, pertendendo embriagar as sentinellas para assaltar, de noite, a igreja, chegando a tentar seduzir com oiro soldado fiel que serviu de guarda, e vendo que nenhum d'estes meios lhe era propicio, desvairada vociferou contra a mesa e auctoridade administrativa, que religiosamente tinham cumprido os seus deveres, alcunhando-as de facciosas.

Não lhe valendo de cousa alguma o grande numero de sequazes, de que se fez cercar, e com quem apertava cordealmente as mãos para que estes amedrontassem com seu caracter e precedentes os habitantes d'esta villa, e vendo que não podia conseguir seus fins, lembrou-se de recorrer a outro argumento, imaginando a coacção empregada pela auctoridade administrativa com a força armada. É falso. Os rostos desconhecidos de que o presidente da assembléa se viu cercado, as demasias praticadas nas outras assembléas, onde muito valeu a prudencia dos representantes da auctoridade, os factos praticados de noite em volta da igreja d'esta villa pela gente que os chefes da opposição tinham assalariado, foram motivo assas forte para que dentro do templo entrasse a força indispensavel para o serviço regular da assembléa, e que salvaguardasse a mesa de quaesquer aggressões e vias de facto, em que porventura se podessem traduzir as ameaças dos dias anteriores.

Ninguem foi impedido de votar, nem coarctado na sua liberdade, e se houve excessos n'esta parte foram elles praticados pela gente da opposição, que mesmo á bôca da uma ameaçava os pobres caseiros, seus e até alheios, de lhes tirarem propriedades se contra elles votassem.

É uma triste realidade, mas é um facto.

Finda a votação e quando se procedia ao escrutinio, ninguem foi impedido de ver e observar o que se passava dentro da igreja, e os signatarios do protesto, affirmando o contrario, só mostram pretender encobrir com esta asserção a derrota que soffreram na sua vaidade e interesses.

E se não é isto, para que pediram elles um exame á uma antes do escrutinio?

Qual era o facto positivo que fundamentou tal pedido?

Sempre a desconfiança na auctoridade que durante os actos eleitoraes, e sempre, mostrou sentimentos nobres e muito superiores ás calumnias contra ella assacadas! Baldado intento, porque a verdade saíu da uma.

Durante os actos eleitoraes concorreu ao templo grande numero de pessoas, e todas tiveram occasião de observar que havia todas as garantias individuaes e facil accesso á uma.

O quarto fundamento está nas mesmas circumstancias.

O presidente cumpriu a lei, como as actas asseveram; as listas foram lidas regularmente e eram rasgadas depois da leitura. Dizer o contrario é faltar á verdade, e isso é improprio de cavalheiros, como dizem ser os signatarios do protesto.

Os restantes fundamentos do mesmo protesto acham-se já respondidos.

A prudencia, de que os seus signatarios se vangloriam, não lhes pertence.

A auctoridade administrativa, que tão nobremente cumpre a sua missão n'este concelho, dando verdadeiros exemplos de senso e cordura, é que impediu os tenebrosos projectos de alguns individuos da opposição, que ainda hoje não cessam de ameaçar com desordens e tumultos, chegando a promover nas povoações ruraes ataques violentos ás casas de cidadãos inoffensivos e pacificos, que acompanharam

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 78

78

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

a auctoridade, para o que já foi preciso empregar a força armada. Eis a verdade.

O protesto não tem fundamento.

Na eleição para deputados, por este circulo, cumpriu-se rigorosamente a lei.

E acreditará alguem, em boa fé, que, se da parte da auctoridade tivesse havido metade, sequer, dos abusos que os protestantes apontam, não haveria graves desordens? Pois houve socego completo.

Isto prova que a lei se observou, e que o protesto só tem por fim armar ao effeito e minorar o desgosto da derrota.

E assim os cidadãos abaixo assignados, em nome da ordem e da lei, esperam que o protesto seja julgado sem effeito, e a eleição, a que n'este circulo se procedeu, seja approvada como é de justiça. Assim o disseram e declararam e vão assignar o presente instrumento com as testemunhas presentes a todo o acto, Manuel Borges da Silva, casado, negociante, morador em Lisboa e de passagem n'esta villa, e Simão Marques dos Santos, solteiro, de maioridade, alfayate, d'esta villa, que assignam depois de lhes ser lido em voz alta, clara e intelligivel por mim tabellião, declarando todos em tempo, que n'este seu contra-protesto não vae animo offensivo contra qualquer pessoa das differentes parcialidades politicas, pois que a todas respeitam, e só allegam sua justiça e respondem ao protesto feito, declaração esta que fazem para todos os effeitos. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, tabellião, que o escrevi em publico e raso e vou sellar. — O reitor Antonio Vieira de Figueiredo — Amandio Eduardo da Motta Veiga — Sebastião Fernandes da Costa — Antonio Saraiva da Costa Ribeiro — O padre José Carlos de Moura — Antonio de Brito Freire e Vasconcellos — Antonio Joaquim Marques Perdigão — Simão de Almeida Mello — José dos Santos Ferreira Henriques — Luiz Saraiva da Costa — Antonio de Almeida Mello e Sousa — José Luiz Marrão — Manuel Pereira da Costa — José da Motta Veiga — Francisco Eduardo Lis — Luiz da Motta Veiga — Antonio Fragoso de Abrantes — Aleixo Rebello de Pinho — Antonio Ferrão — José Delfino — Miguel Saraiva da Costa — André Cunhal — Jacinto de Figueiredo Motta — Antonio Ferreira — Antonio Rodrigues Prata — Luiz da Costa — Antonio Pereira Miranda — Francisco Lucas Tavares — José da Silva Marrão — Antonio da Motta Veiga — André Ferreira — Antonio Marques dos Santos — Antonio de Almeida Mello e Silva — José Rodrigues Junior — O padre José Alexandre de Gouveia e Pina, eleitor na assembléa de Sameice — Abilio da Motta Veiga — Simão Marques dos Santos — Manuel Borges da Silva — Luiz de Almeida Mello — José Saraiva, da Costa Ribeiro — Joaquim Lopes — Manuel Antonio Cesar — O bacharel José da Motta Veiga — Agostinho Cardoso de Almeida Mello — Antonio Alves da Rocha — José Pedro Serodio — José da Costa Ferreira — Francisco Saraiva da Costa Ribeiro.

Signal publico.

Em fé de verdade — O tabellião, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Segue-se collada uma estampilha de 500 réis assim inutilisada: 18 de outubro de 1878 e oito. — Figueiredo.

Não se contém mais no dito instrumento, que bem e fielmente para aqui transcrevi do proprio livro de notas, com que este conferi e concertei, e a elle me reporto em meu poder e cartorio.

Passado n'esta villa de Ceia, aos 19 dias do mez de outubro do anno do nascimento de Nosso Senhor de Jesus Christo de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, tabellião, que escrevi, conferi, rubriquei e vou assignar em publico e raso.

Em fé de verdade. = O tabellião, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conferi e concertei. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo,

Instrumento de protesto

Traslado do instrumento de protesto que fazem os outorgantes infra indicados

Saibam os que este publico instrumento de protesto e reclamação virem, que no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 20 dias do mez de outubro n'esta villa de Ceia e meu escriptorio, compareceram pessoalmente os ex.mos cidadãos eleitores d’este circulo eleitoral, n.º 76 (de Ceia) bacharel Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, bacharel Agostinho Thomás dos Santos Viegas, aquelle de S. Romão e este de Ceia; bacharel Albino Freire de Castello Branco Mascarenhas Calheiros, de Vallezim; Luiz Ribeiro Pinto Guedes Bacellar, de Santa Eulalia, e Joaquim Manuel da Silveira Castello Branco, de Sandomil, meus conhecidos, pelos proprios e das testemunhas ao diante nomeadas e assignadas, que tambem conheço, do que tudo dou fé. E por todos elles perante mim e testemunhas foi dito:

Que tendo-se apresentado no dia de hoje, 20 do corrente, pelas nove horas da manhã, perante a mesa de apuramento dos votos, que se reuníra e constituíra na sala das sessões dos paços d'este concelho, lhes requerera houvesse de acceitar seu protesto e reclamação contra a validade da eleição da assembléa que tivera logar no dia 13 d'este mez na igreja matriz d'esta villa. Que pelo presidente da referida mesa, bacharel Amandio Eduardo da Motta Veiga, lhes não fôra recebido o dito protesto diante das testemunhas Luiz Fragoso de Almeida, solteiro, proprietario, e José Carlos Arthur das Neves, casado, escrevente, ambos d'esta villa, cujo teor é o seguinte:

Os abaixo assignados cidadãos eleitores do circulo n.º 76 (Ceia) vem perante a assembléa do apuramento do mesmo circulo protestar contra a validade da eleição a que se procedeu na assembléa primaria d'esta villa de Ceia, pelo viciamento do acto eleitoral praticado no dia 15 do corrente mez, e que é comprovado pelos factos que vamos expor: que na noite de 14 do corrente, a auctoridade administrativa, reconhecendo que era certo o perdimento da eleição do candidato governamental por ella protegido, mandou por dois dos seus agentes disparar dois tiros sobre os cidadãos que se achavam junto do templo, local da assembléa eleitoral d'esta villa, com o fim de justificar o emprego dos meios violentos de que estava disposta, a usar, e tanto isto é verdade, que ordenou á força militar que estava do guarnição ao mesmo templo carregasse á bayoneta sobre os cidadãos inermes, que ali se achavam no uso pleno de seus direitos, obrigando-os assim a retirar d'aquelle local, o que conseguiu por elles não quererem expor as suas vidas a um acto tão brutal.

Dois d'estes cidadãos, os bachareis Francisco Ribeiro Pinto de Moraes e Antonio Hortencio Ferreira, da Fonseca, commissionados pelos seus amigos, foram pedir á auctoridade administrativa explicações d'este acto attentatorio da liberdade, e providencias que garantissem as suas vidas e dos mais cidadãos.

Surdo a taes exigencias, não só tratou com grosseria estes dois cidadãos, mas até lhes disse que não revogava as ordens que tinha dado ao commandante da guarda, de que não admittisse individuo algum no adro da igreja; em virtude do que os cidadãos, que estavam nas ruas proximas do mesmo adro, se retiraram para as differentes casas, aonde se achavam albergados, ficando assim á discrição sómente da força militar a guarda da uma e do templo.

Com taes precedentes a opposição, desconfiada de que n'aquella noite tivesse sido arrombado o cofre e a uma e tivessem sido substituidas por outras as listas n'ella contidas, requereu á auctoridade judicial na manhã do dia 15, antes de principiar a correr o escrutinio, que se procedesse a exame no cofre onde estava encerrada a uma, para se verificar se tinha havido arrombamento ou viciamento.

Feito o exame e declarando o juiz que nada mais ali tinha a fazer, se retirou com os mais empregados judiciaes.

Página 79

79

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Após a sua saída entrou logo no templo, no local da assembléa, a força militar com as armas carregadas e bayoneta em bôca dellas, e postando-se em duas alas ao fundo da mesa entre esta e a porta que dava ingresso aos eleitores, lhes prohibia assim a approximação á mesa, não podendo por isso os eleitores verificar a leitura das listas e a contagem dos votos.

Contra uma tal illegalidade protestaram n'este acto os bachareis Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, Agostinho Thomás dos Santos Viegas e outros cidadãos eleitores d'esta assembléa primaria, mas não lhes foram admittidos pela mesa os seus protestos, e sendo obrigados a saír aos empurrões pela auctoridade administrativa, tiveram de ir lavrar o seu protesto na nota de mim tabellião, protesto que se junta a este e d'elle deve fazer parte.

Que alem da força militar que estava dentro do templo andava em roda do mesmo um troço de cavallaria a todo o trote, afastando assim os eleitores e mais pessoas que queriam vigiar o acto eleitoral.

Que o escrutinio correu com tanta arbitrariedade, que foi observado que o presidente da mesa tirava da uma ás mãos cheias e as rasgava sem serem lidas, ordenando que uns tantos votos fossem contados ao candidato governamental, o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, o que se continuou praticando durante o escrutinio, conseguindo assim um falso vencimento que não podia alcançar pelos meios regulares e legaes.

Que debaixo da pressão da força armada principiou e acabou o escrutinio, continuando sempre a ser vedada aos eleitores a approximação á mesa eleitoral, com o visivel fim de ser subtrahida a votação ao candidato da opposição, o bacharel José de Abranches Homem da Costa Brandão.

Que tanto o presidente da mesa, o bacharel Amandio Eduardo da Motta Veiga, como o administrador do concelho, o bacharel Elisiario Vaz Preto Casal, tinham todo o interesse na viciação da eleição, porque um era irmão e outro cunhado do candidato governamental, e convencidos como estavam de que o resultado do escrutinio, correndo legalmente, era favoravel ao candidato da opposição, trataram de empregar todos os meios de violencia que se indicam, para conferirem o diploma de deputado da nação portugueza ao seu irmão e cunhado.

Que tendo sido entregues, tanto por um como por outro grupo politico, as listas na igreja, local da assembléa, aos eleitores das duas parcialidades, e que vinham bem descriminados; tinha cada uma dellas a certeza do numero de listas que tinham entrado na urna a favor dos seus candidatos, e por isso já era voz constante e geral que o candidato da opposição tinha vencido a eleição por cento e tantos votos, porque a esse tempo já era conhecido o resultado de todas as assembléas ruraes, que com a d'esta villa formam o circulo n.º 76, e que davam ao candidato da opposição a maioria de 298 votos, que o candidato do governo não podia obter n’esta assembléa, porque tendo entrado na urna 1:825 listas, d'estas pertenciam á opposição 825, vindo por isso o candidato do governo a obter n'esta assembléa sómente a maioria de 185 votos, que, descontados na maioria de 298 que o candidato da opposição tinha alcançado nas assembléas ruraes, dava um resultado de 113 votos a favor d'este candidato.

E tanto isto é verdade, que constituindo estes factos um verdadeiro crime, se está procedendo em juizo contra quem os praticou.

Que por todas estas rasões entendem os cidadãos eleitores abaixo assignados que deve ser annullada a eleição da assembléa primaria de Ceia e conferir-se o diploma do deputado da nação portugueza ao candidato o bacharel José de Abranches Homem da Costa Brandão, por ser este que obteve maioria de votos nas assembléas aonde a eleição correu com legalidade.

Sala da assembléa do apuramento em Ceia, aos 20 de outubro de 1878. — Agostinho Thomás dos Santos Viegas — Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca — José Mendes Diniz Belem — Albino Freire do Castello Branco de Mascarenhas Calheiros — Joaquim Manuel da Silveira Castello Branco — Luiz Ribeiro Pinto Guedes Bacellar.

Que é o que continha o dito protesto e reclamação que os outorgantes pretenderam apresentar na assembléa do apuramento com o fim da mesa ter conhecimento d'elle e fazel-a juntar ao respectivo processo eleitoral, mas que, como já fica dito, o dito presidente se recusára a acceital-o perante as testemunhas acima indicadas. E comparecendo n'este acto as mesmas testemunhas Luiz Fragoso de Abrantes e José Arthur Carlos das Neves, que reconheço pelos proprios, declararam perante mim tabellião e testemunhas d'este instrumento, que era verdade que os outorgantes se haviam apresentado no dia de hoje na assembléa do apuramento de votos, pelas dez horas da manhã, pouco mais ou menos, com o alludido protesto de reclamação, e que o presidente da mesa d'esta assembléa, Amandio Eduardo da Motta Veiga, que havia recusado a acceital-o, protesto ou reclamação que era por escripto. E que por isso protestavam para todos os effeitos legaes tambem por esta arbitrariedade, ficando aqui exarado o dito protesto para os mesmos effeitos.

Declara-se que na linha 31.ª da pag. 26 v. onde se diz — José Carlos Arthur das Neves — deve dizer-se — José Arthur Carlos das Neves, e que na linha 32.ª da pag. 27 v. onde se diz — tirava da uma ás mãos cheias e as rasgava — deve dizer-se tirava da uma as listas ás mãos cheias e as rasgava.

Assim o declararam e outorgaram e vão assignar com as testemunhas a todo o acto presentes Francisco Cabral Tavares de Carvalho e Antonino Cabral Tavares de Carvalho, ambos solteiros, de maior idade, proprietarios, de Santa Marinha, depois d'este instrumento lhes ser lido por mim Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, tabellião de notas na comarca de Ceia, que o escrevi e vou assignar em publico e raso. - Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca — Agostinho Thomás dos Santos Viegas — Albino Freire de Castello Branco Mascarenhas Calheiros — Luiz Ribeiro Pinto Guedes Bacellar — Joaquim Manuel da Silveira Castello Branco — Luiz Fragoso de Abrantes — José Arthur Carlos das Neves — Francisco Cabral Tavares do Carvalho — Antonino Cabral Tavares de Carvalho.

Segue uma estampilha de 500 réis, devidamente inutilisada.

Logar do signal publico. Em fé de verdade. — O tabellião, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

E nada mais se continha no dito instrumento ao qual me reporto, e que para aqui fiz extrahir do proprio original, e em meu livro de notas sob o numero 25, com o qual este conferi e concertei.

Ceia, 20 de outubro de 1878. Eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, tabellião que o subscrevi e vou assignar em publico e raso.

Em fé de verdade. = O tabellião, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conferi. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Processo do corpo de delicto por crime de offensa da legislação eleitoral Certidão

Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão do terceiro officio ante o juizo de direito da comarca de Ceia, por Sua Magestade El-rei, etc...

Certifico que no cartorio a meu cargo existe um processo do corpo de delicto pelo crime de offensa da legislação eleitoral, em que são requerentes os ex.mos bacharel José de Abranches Homem da Costa Brandão, solteiro, proprietario, de Torrozello, e o bacharel Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, viuvo, proprietario, de S. Romão, d'esta comarca, do qual processo a sua autuação e mais peças são fielmente do teor seguinte:

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 80

80

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Autuação. — 1878. — Juizo de direito da comarca de Ceia. — Escrivão Figueiredo. — Autos de corpo de delicto. — Requerentes, o bacharel José de Abranches Homem da Costa Brandão, de Torrozello, e o bacharel Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, de S. Romão. — Autuação. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 18 dias do mez de outubro, n'esta villa de Ceia e meu cartorio autuei a petição ao diante por me ser ordenado. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi e assigno. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo. — Segue-se a petição inicial.

Petição. — Ex.mo sr. — Os bachareis em direito José de Abranches Homem da Costa Brandão, de Torrozello, e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, de S. Romão, d'esta comarca de Ceia, têem a expor a v. ex.ª o seguinte:

1.° Que procedendo-se ao acto eleitoral no dia 13 do corrente n'esta assembléa primaria de Ceia, o grupo politico protegido pela auctoridade constituiu a mesa eleitoral composta de individuos exclusivamente da sua parcialidade, e para isto conseguir fez adiantar o relogio, e quando eram apenas oito horas e meia da manhã já ella se achava eleita em ausencia do grupo opposicionista, não obstante achar-se presente para tomar parte na eleição da mesa antes das nove horas da manhã, hora legal.

2.° Que, procedendo-se á votação, e não se tendo concluido esta no primeiro dia, fôra lacrada a uma e encerrada esta no seu respectivo cofre, e expulsos da igreja, local da assembléa, os eleitores que queriam guardar e vigiar a mesma uma, como a lei lhes faculta.

3.° Que continuando no segundo dia a votação, e tendo decorrido as duas horas de espera, se lacrára tambem a uma, e encerrára no competente cofre, e querendo ficar alguns eleitores á roda da igreja, foram mandados expulsar d'aquelle logar por ordem da auctoridade administrativa, dando para esse fim a força militar uma carga de bayoneta sobre os eleitores inermes, que tiveram de abandonar o adro ou terreno que fica á roda da igreja.

4.° Que tendo-se sabido o resultado das assembléas de Loriga, S. Gião e Sameice, e obtendo n’elle o candidato da opposição 298 votos de maioria, e vendo-se o grupo politico protegido pela auctoridade, com a certeza de que se o escrutinio corresse legal, a sua derrota era certa, por isso, lançando mão dos meios extremos, illegaes e attentatorios da liberdade eleitoral, mandou o administrador na manhã do dia 15, logo em seguida á abertura do cofre, em que se achava depositada a uma, entrar a força militar para dentro da igreja, collocando duas filas de tropa á roda da mesa eleitoral, e achando-se esta cercada de soldados com armas carregadas e bayonetas na bôca dellas, foram os eleitores afastados da mesa, e impedidos de vigiarem o acto eleitoral, o qual correu tumultuario e illegalmente, roubando-se indignamente as listas da opposição, extrahindo-as o presidente ás mãos cheias da uma, e rasgando algumas, estando ainda, alem da tropa que cercava a mesa, uma força de cavallaria que externamente cercava a igreja e que fazia afastar os cidadãos eleitores, que pretendiam ir presencear o acto eleitoral; e por esta fórma, e com estas violencias e outras feitas aos eleitores da opposição que foram expulsos da igreja, se ultimou o escrutinio e eleição da maneira a mais inaudita, arbitraria e illegal, propria dos tempos ominosos da maior pressão e barbaro despotismo.

Requerem, pois, a v. ex.ª se digne proceder a corpo de delicto indirecto, inquirindo-se sobre os factos as testemunhas abaixo mencionadas, entregando-se depois aos supplicantes, para fazerem d'elle o uso que lhes convenha e for legal; e por isso:

Pedem a v. ex.ª, meritissimo sr. dr. juiz de direito, deferimento. E. R. M.cê

Testemunhas: Francisco de Almeida Mello, casado, proprietario; José Mendes Diniz Belem, viuvo, negociante; bacharel Agostinho de Abranches Fazenda Viegas, solteiro, advogado; bacharel Luiz Henriques Cunhal, presbytero, todos estes de Ceia; José Antonio Rodrigues Ferreira, viuvo, proprietario, residente em Pinhanços; José Gomes Paulo, viuvo, proprietario, residente em aldeia de S. Miguel, freguezia de Santa Comba; Antonio Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, de maior idade, filho familia, residente em Santa Marinha; Francisco Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, proprietario, residente em Santa Marinha; José Saraiva Claro, casado, sapateiro, residente em Pinhanços; Antonio José Monteiro, casado, albardeiro, residente em Pinhanços; Antonio Alves Ferraz, casado, proprietario, residente em Santa Comba; Francisco Paulo da Cunha, solteiro, sapateiro, de Ceia; Francisco Antonio Pinheiro Bayão, capitão do regimento de infanteria n.º 12, estacionado na Guarda; Joaquim Alexandre Aguiar, segundo sargento da 5.ª companhia do mesmo regimento, Guarda; Germano Ventura, furriel da 6.ª companhia do mesmo regimento, Guarda; Antonio Narciso Nogueira, furriel do dito regimento, Guarda. Requer-se para as de fóra da comarca a competente deprecada. = José de Abranches Homem da Costa Brandão = Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca.

Despacho. — Distribuido o segundo officio. Para o corpo de delicto requerido, designo o dia 22 do corrente, feitas as devidas intimações, incluindo-se o agente do ministerio publico, por se tratar de crimes eleitoraes. Ceia, 18 de outubro de 1878. = Eduardo José Coelho.

Informação. — Ex.mo sr. dr. juiz de direito. — Na petição que antecede, vêem-se mencionados como testemunhas alguns individuos de fóra d'esta comarca, e como v. ex.ª nada ordenou com relação a elles, faço por isso os autos conclusos para os fins convenientes. Ceia, 19 de outubro de 1878. = O escrivão, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conclusão. = Conclusos no dia supra. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Despacho. — Passe a deprecada requerida com dilação de dez dias, e para o dia 22 intime as primeiras cinco testemunhas e as restantes para o dia 23, pelas oito horas da manhã. Fica assim additado o despacho de folhas. Data supra. = Eduardo José Coelho.

Data. — Recebidos com o despacho retrò no mesmo dia da sua data. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Certidão. — Intimei, do que dou fé, n'esta villa em sua pessoa e morada ao ex.mo dr. Toscano, delegado do procurador regio n'esta comarca, que reconheço, o despacho retrò, que leu e ficou sciente e vae assignar. Ceia, 20 de outubro de 1878, de manhã. = Toscano. = O escrivão, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Termo de entrega. — No dia supra entreguei ao official Delfino os mandados para intimação das testemunhas. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Termo de entrega. — No dia 21 de outubro de 1878 entreguei ao auctor o ex.mo dr. Hortensio, que reconheço pelo proprio, a precatoria para inquirição de testemunhas na comarca da Guarda, e de a receber assigna. E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Termo de juncção. — Juntei o mandado em frente no dia 22 de outubro de 1878. Eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, o escrevi.

Mandado. — O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia. Mando sejam intimadas as testemunhas infra indicadas, para no dia 22 do corrente, por dez horas da manhã, comparecerem perante mim, no tribunal judicial d'esta comarca, a fim de deporem sobre o que lhes for perguntado, sob pena da lei faltando.

Cumpra-se. Ceia, 20 de outubro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo escrevi. — Testemunhas, Francisco de Almeida Mello, casado, proprietario, de Ceia; José Mendes Diniz Belem, viuvo, proprietario, idem; Agostinho de Abranches Fazenda Viegas, advogado, idem; Bacharel Luiz Henriques Cunhal, presbytero, idem; José

Página 81

81

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Antonio Rodrigues Ferreira, viuvo, proprietario, de Pinhanços.

Certidão. — Dou fé intimar as testemunhas retrò relacionadas, o bacharel Luiz Henriques Cunhal e José Mendes Diniz Belem d'esta villa, para todo o conteudo no mandado retrò, que lhes li e ficaram scientes de todo o conteudo, e não intimei Francisco de Almeida Mello, nem o dr. Agostinho de Abranches Viegas, por estarem fóra d'esta comarca, e assignam os intimados.

Ceia, na tarde do dia 21 de outubro de 1878. — Luiz Henriques Cunhal — José Mendes Diniz Belem. — O official de diligencias, José Delfino.

Certidão. — Certifico de que dou fé em como vim a este logar de Pinhanços para o fim do cumprimento do mandato retrò, e não intimei a testemunha José Antonio Rodrigues Ferreira pelo não encontrar e ser informado pela sua Familia que a dita testemunha José Antonio Rodrigues Ferreira estava para o logar do Carvalhal, d'esta comarca, e que não regressava a este logar por estes tres ou quatro dias.

E por isto tudo ser verdade passo a presente, que assigno.

Pinhanços, na tarde do dia 21 de outubro de 1878. — O official de diligencias, José Delfino.

Certidão. — Dou fé intimar a testemunha José Antonio Rodrigues Ferreira, viuvo, do logar de Pinhanços, cuja intimação lho fiz n'este logar do Carvalhal, pelo aqui encontrar, para todo o conteudo no mandado retrò, que lhe li e lhe declarei e ficou bem sciente, e assigna commigo o official, cuja entidade reconheço.

Carvalhal, na manhã do dia 22 de outubro de 1878. — O official de diligencias, José Delfino — José Antonio Rodrigues Ferreira.

Auto de corpo de delicto. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 22 do mez de outubro, n'esta villa de Ceia e casas do tribunal judicial d'ella, onde estavam commigo, escrivão do seu cargo, o dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito n'esta comarca, e o dr. Fernando Henriques da Costa Loureiro Toscano, delegado do procurador regio n'esta mesma comarca, se procedeu a corpo de delicto sobre o conteudo da petição de fl. 2; ahi elle juiz passou a inquirir as testemunhas para hoje intimadas, tomando-lhes as declarações juradas pela fórma que ao diante se segue.

1.ª

José Mendes Diniz Belem, viuvo, proprietario e negociante, morador n'esta villa, de trinta e cinco annos de idade, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade, e aos costumes disse nada. E sendo interrogado á materia da petição de fl. 2, cujos artigos elle juiz lhe leu e explicou, disse ao primeiro:

Que concorrendo na qualidade de eleitor á eleição que começou no dia 13 do corrente mez, seriam oito horas e meia da manhã, e dirigindo-se á igreja matriz d'esta villa, encontrou já a mesa constituida, toda composta de partidarios da auctoridade administrativa d'este concelho, sendo o presidente d'ella cunhado d'este e irmão do candidato governamental.

Ao segundo disse que, pelo ver e presencear, sabe que é verdadeira toda a materia d'este artigo, sendo elle depoente um dos eleitores que foi expulso pela fórma indicada.

Ao terceiro artigo disse que, pelo ouvir dizer, sabe que da noite do dia 14 foram expulsos á força de bayonetas do adro e immediações da igreja matriz todos os eleitores da opposição que pretendiam ali conservar-se para auxiliar a guarda da uma, sendo certo que elle depoente se conservou no adro da igreja até ás oito horas da noite, e que por isso as occorrencias já ditas só tiveram logar depois d'essa hora, segundo ouviu dizer. E mais não disse d'este.

Ao quarto disse que elle depoente se conservava no adro da igreja matriz na manhã do dia 15, quando elle juiz e agente do ministerio publico foram fazer exame directo á uma, o que apenas estes magistrados se retiraram e constando que a uma estava intacta, elle depoente se retirára para sua casa; que passado pouco mais de meia hora, foi um facto publico e notorio que a tropa, em força de quarenta praças, pouco mais ou menos, deu entrada, por ordem da auctoridade administrativa, a requisição do presidente da mesa, na igreja matriz, e ahi formára em duas filas cercando a uma, e sendo expulsos pela força os eleitores da opposição que estavam junto da uma e queriam vigiar as operações eleitoraes, e que entre estes póde designar os eleitores drs. Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca e Agostinho Thomás dos Santos Viegas.

Que quando se retirou do adro da igreja já estava junto d'esta, e ao lado da porta lateral, formada a tropa de infanteria.

Que no dia 14, á noite, e no dia 15 de manhã, já era publico que a auctoridade administrativa tinha perdido a eleição, pois que já era sabido o resultado das assembléas ruraes, desfavoravel ao governo em cerca de 300 votos, e que o resultado d'esta assembléa era facil verifical-o de antemão, pois que ao lado direito do presidente da mesa esteve sempre um individuo com uma saquita de listas e as entregava ali a cada um dos eleitores, de maneira que quando terminava a votação de uma freguezia, ficava-se logo sabendo a votação que o candidato governamental tinha alcançado.

Que querendo voltar á igreja, e sendo informado ao approximar-se d'ella que a tropa ainda lá estava dentro formada, como já disse, e vendo em roda da igreja girar constantemente uma patrulha do cavallaria, desistiu do seu proposito, e tornou para sua casa. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o achou conforme e o ratificou.

2.ª

O bacharel Luiz Henriques Cunhal, presbytero, morador n'esta villa, de trinta e nove annos, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes disse nada. E sendo interrogado á materia dos artigos da petição de folhas 2, que elle juiz lhe leu e explicou:

Disse ao primeiro que conhece os membros que formaram a mesa na assembléa primaria de Ceia na eleição de deputados a que se procedeu nos dias 13, 14 e 15 do mez corrente, e que presume que todos elles são da parcialidade governamental, e que lhe consta que a mesa fôra formada sem se achar presente o grupo de opposição, ouvindo dizer a esta que o relogio fôra adiantado meia hora, com o fim de se constituir a mesa pela fórma já indicada, assim como ouviu dizer aos do governo, que não foi verdade o fazerem tal adiantamento do relogio, sendo certo que n'esse dia, no acto em que se sellava a uma, presenceára que o irmão do sacristão pedíra a chave da torre, para tocar ás trindades, a José da Silva, escripturario de fazenda, o qual respondeu que era verdade o ter trazido comsigo em todo o dia a chave indicada, mas que a não dava, como fez.

Que no dia seguinte, a pedido da testemunha antecedente, antes da abertura do cofre, onde se achava a uma com as listas, ou durante a abertura do mesmo, fôra elle testemunha pedir a chave ao presidente da assembléa para observar se na torre havia ficado alguma pessoa durante a noite, e n'esta occasião observára que o presidente da assembléa ordenára a José Maria Cunhal, representante do administrador n'esta dita assembléa, para com elle testemunha, e com a testemunha antecedente, irem observar se estava ou não alguem na caixa do relogio, e por essa occasião presenceou elle testemunha que o relogio, apesar de ter muita corda, se achava parado. Que de tudo isto elle testemunha concluíra que a mesa não podia regular-se nos seus trabalhos pelo relogio da igreja matriz. E mais não disse.

Ao segundo artigo disse que no dia 13, depois que terminaram as operações eleitoraes d'aquelle dia, e depois de

Sessão de 13 de janeiro de 1879

8**

Página 82

82

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

fechada e sellada a uma, alguns eleitores da opposição pediram ao presidente da mesa que a uma ficasse guardada por tropa dentro da igreja, e ao mesmo tempo as portas abertas para a vigiar quem quizesse, ao que o presidente respondeu negativamente, ordenando que saísse toda agente da igreja, no que foi promptamente obedecido, e em seguida foram as portas fechadas. E mais não disse d'este.

E ao terceiro disse que em a noite do dia 14, e depois de se ouvirem dois tiros para o lado da igreja matriz, se dirigiu elle depoente, em companhia do presidente da mesa, dr. Amandio e outros, ao adro da mesma igreja, e chegados que ali foram, viu que o dito presidente e administrador do concelho Elisiario Vaz Preto Casal deram ordem á tropa para que expulsassem do adro toda a gente que ali estava, e não foi preciso empregar a força, porque toda a gente saíu.

E mais não disse d'este. Ao quarto artigo disse que no dia 15 de manhã viu entrar na igreja por uma das portas lateraes, unica que então estava aberta, a elle juiz, agente do ministerio publico e alguns individuos, por ordem do juizo, para proceder a um exame directo na urna; que, saíndo o já dito juiz e o delegado, e sem saber quaes os individuos, que tinham ficado na igreja d'aquelles que tinham entrado com a justiça, viu e presenciou elle depoente, que a força armada, em numero de 40 praças pouco mais ou menos, entrou na igreja por ordem da auctoridade administrativa, e depois d'isso é que entraram os eleitores; um por um, que eram revistados á proporção que entravam: que acabando de revistar um eleitor o administrador do concelho, e seguindo-se elle depoente na ordem da entrada, dissera para o administrador, que a unica arma que levava comsigo era uma chibata, e que o administrador o mandára entrar sem o revistar. Entrado que foi na igreja, viu já formada a tropa em duas filas ou alas, que vedavam a entrada para junto da mesa eleitoral, e que, dirigindo-se elle depoente para o sitio da mesa, um cabo ou um official inferior lhe vedou a passagem, dizendo que era ordem que tinha; e em presença d'este facto, se dirigiu ao administrador, que estava no meio da igreja, e lhe perguntou se não era permittido ir para junto da mesa, ao que o dito administrador respondeu, dizendo que não era permittido, por isso que era essa a ordem do presidente da mesa. E por tal motivo, e depois d'esta resposta, se retirou da igreja até ao adro. Que quando elle depoente recebeu ordem ou foi intimado pelo official inferior da maneira que já disse, viu que pelo menos estava junto da uma, á direita do presidente, o bacharel Antonio Hortensio, altercando sobre o direito que tinha d'ali estar com o presidente; mas como elle depoente se retirou logo, como já disse, não presenciou as occorrencias posteriores, mas é um facto publico, sem contestação em contrario, que o dito Hortensio e todos os eleitores, que queriam vigiar as operações eleitoraes junto da mesa, foram d'ali expulsos á força; que, attendendo á collocação da mesa e á distancia que mediava entre esta e os espectadores, que só podiam estar áquem da ala da tropa, lhe parece impossivel a elle depoente, que se podesse fiscalisar a leitura das listas, e até porque os escrutinadores tinham de ler as listas de modo que só se podiam ver se porventura os eleitores podessem approximar-se d'elles pelo lado das costas.

Que, quando a tropa entrou na igreja, como já disse, não houve tumulto nem signal de aggressão a qualquer pessoa, nem lhe consta que se desse a menor occorrencia, que motivasse o emprego da força publica.

Que no dia 15 de manhã os agentes do governo, bem como a opposição, deviam saber com uma quasi exactidão o resultado geral de todo o circulo, porque no dia 14 á noite já toda a gente sabia, ou podia saber o resultado das assembléas ruraes, que tinha sido desfavoravel ao candidato do governo em perto de 300 votos, e o resultado d'esta assembléa era facilimo de calcular de antemão, pois que viu e presenciou elle depoente, que durante todo o acto eleitoral dos dias 13 e 14 as listas pelo lado do governo eram dadas uma por uma á bôca da uma por um individuo, que as tirava de uma saquita do chita, e assim, terminada a votação de uma freguezia, logo se ficava sabendo a votação, que o governo e a opposição tinham alcançado.

Declarou finalmente que, sendo eleitor recenseado n'esta assembléa, se abstivera de votar na presente eleição. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o achou conforme e o ratificou.

3.ª

José Antonio Rodrigues Ferreira, viuvo, proprietario, morador em Pinhanços, de quarenta e nove annos de idade, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade, e aos costumes disse nada. E, sendo interrogado á materia dos artigos da petição de fl. 2, que lhe foi lida:

Disse ao primeiro nada, nem ao segundo, nem ao terceiro. Ao quarto, disse que no dia 15 do corrente, por nove horas da manhã, presenceou elle depoente que a força publica aqui estacionada, em força do quarenta soldados, pouco mais ou menos, deu entrada na igreja matriz d'esta villa, e ahi formára em duas alas e com ordem de não deixar approximar pessoa alguma da uma, o que se passou com elle depoente, pois foi reppellido pela força publica, quando quiz passar as alas d'ella para o lado da mesa, nem póde acreditar que a propria força publica, individualmente interrogada, negue que recebeu esta ordem de expulsão, e que não a cumprisse.

Que elle depoente entrou depois da tropa e foi apalpado, bem como os demais eleitores, á proporção que entravam, um por um, e vendo logo que entrou a tropa formada, como já disse, em duas filas, e que não era permittida a entrada para o pé da uma, demorou-se ainda algum tempo dentro do templo e áquem das alas da tropa, e por isso presenceou, que entre o presidente da mesa e alguns eleitores, e entre estes Thiago Antonio de Frias e drs. Agostinho e Hortensio, havia altercação entre aquelle e estes, ordenando-lhes e intimando-os a que saíssem de ali, e que se não começava a extracção das listas sem isso; e como os já ditos eleitores insistissem em allegar o seu direito, foram então expulsos pela força violentamente, chegando o administrador do concelho Elesiario Vaz Preto Casal a lançar a mão ao eleitor Antonio Hortensio e a empurral-o, dando-lhe a voz de preso, e em virtude d’estas violencias, e assim forçados, saíram de junto da uma os já ditos leitores, protestando em voz alta contra este attentado, e sendo lhes só permittido estarem quasi no fundo da igreja, isto é, áquem das filas da tropa, se retiraram, e o mesmo fez elle declarante logo que viu começar a extracção das listas sem estar junto da uma eleitor algum e sem que fosse possivel approximar-se da mesa qualquer eleitor, porque d'isso era impedido pela forca publica.

Que, saíndo da igreja, não sabe pelo presencear quaes as occorrencias posteriores, mas é um facto publico, e por toda a gente sabido, que a força publica se conservou dentro da igreja e na mesma posição que já disse, durante todo o acto eleitoral.

Que quando começou a eleição, e durante o tempo que elle depoente esteve na igreja viu e presenceou, que a porta principal do templo e outra lateral estavam fechadas, sendo apenas permittida a entrada por uma das portas lateraes meio aberta, e por lhe constar sabe que assim se conservaram fechadas durante todo o acto eleitoral.

Que durante o tempo que elle depoente assistiu ao acto eleitoral, não houve facto ou palavra d'onde podesse deduzir-se intenção aggressiva.

Que estes factos foram praticados no intuito de falsificar o acto eleitoral, nem elle depoente os póde explicar, nem acredita que pessoa alguma o possa fazer, a não ser pelo motivo já dito, e tanto mais quer a mesa e a auctoridade administrativa, de accordo com ella, gastaram todo o dia 14 com a chamada da freguezia de Ceia, quando bem po-

Página 83

83

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

dia completar-se a eleição nosso mesmo dia, senão houvesse má intenção, querendo se por esta fórma ganhar tempo até se saber o resultado das assembléas ruraes.

Declarou finalmente que o presidente da assembléa, dr. Amandio é irmão do candidato governamental, dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, sem que seja presidente da commissão recenseadora, e que o administrador do concelho é cunhado do mesmo candidato governamental. Declarou mais que no dia 14 á noite já era publico n'esta villa que o candidato Abranches tinha nas assembléas ruraes uma maioria de cerca de 300 votos, que não podia ser supplantada por esta assembléa, segundo todos os calculos feitos até pelos proprios governamentaes. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento o achou conforme e o ratificou.

Elle juiz, não havendo mais testemunhas a inquerir pelo motivo constante da certidão do official, houve este acto por terminado, de que fez lavrar este auto, que assigna com o dr. delegado, testemunhas e official assistente, Delfino, depois de lhes ser lido por mim, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão que o escrevi. — Coelho. — Fernando Henriques da Costa Loureiro Toscano — José Mendes Diniz Belem — Luiz Henriques Cunhal — José Antonio Rodrigues Ferreira — José Delfino — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Termo de juncção. — Juntei o mandado em frente no dia 23 de outubro 1878. Eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Mandado. — O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito n'esta comarca de Ceia, mando sejam intimadas as testemunhas infra indicadas para comparecerem perante mim, no tribunal judicial d'esta comarca, no dia 23 do corrente, pelas oito horas da manhã, a fim de deporem sobre o que lhes for perguntado, sob pena de lei, faltando. Cumpra-se. Ceia, 20 de outubro de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi. — Coelho. — Testemunhas, José Gomes Paula, viuvo, proprietario; aldeia de S. Miguel; Antonio Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, filho familia, de Santa Marinha; Francisco Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, proprietario, de Santa Marinha; José Saraiva Claro, casado, sapateiro, de Pinhanços; Antonio José Monteiro, casado, albardeiro de Pinhanços; Antonio Alves Ferraz, casado, proprietario, de Santa Comba; Francisco Paulo da Cunha, solteiro, sapateiro, de Ceia.

Certidão. — Dou fé intimar Francisco Paula da Cunha, da villa de Ceia, e Antonio Alves Ferraz, d'este logar de Santa Comba, para todo o conteudo no mandado retrò, que lhes li, e lhes declarei, e ficaram bem scientes, e assignaram commigo official, cuja identidade reconheço. E não intimei a testemunha José Gomes Paulo, do logar da Aldeia de S. Miguel, e sendo perguntado nas suas moradas no dito logar pelo não encontrar, e nem a sua familia declarou que não sabiam para onde elle fosse. Santa Comba na tarde do dia 21 de outubro de 1878. — Francisco Paulo da Cunha — Antonio Alves Ferraz — O official de diligencias, José Delfino.

Certidão. - Dou fé intimar a testemunha Antonio José Monteiro e José Saraiva Clara, d'este logar de Pinhanços, para todo o conteudo no mandado retrò, que lhes li e lhes declarei dia e hora, local que têem de comparecerem, e ficaram scientes, e foram testemunhas presentes José Vicente e José da Silva, solteiros, jornaleiros, d'este logar, que não assignam por não saberem. Pinhanços; na tarde do dia 21 de outubro de 1878. — Antonio José Monteiro — Official de diligencias, José Delfino.

Certidão. — Dou fé intimar a testemunha Francisco Cabral Tavares de Carvalho, d'esta villa de Santa Marinha, cuja intimação lhe fiz nas suas moradas e doente de cama para todo o conteudo no mandado retrò, que lhe li, e lhe declarei o dia e hora e local que tem de comparecer, e não intimei Antonio Cabral de Carvalho pelo não encontrar e ser informado que fôra para fóra d'esta comarca, e foram testemunhas presentes Christovão de Almeida e Manuel Numes Tendeiro, solteiros, jornaleiros, d'esta villa, e não assignam por não saberem.

Santa Marinha, na tarde do dia 22 de outubro de 1878. — O official de diligencias, José Delfino.

Certidão. — Dou fé intimar José Gomes Paulo, d'este logar de Aldeia de S. Miguel, para todo o conteudo no mandado, que lhe li e ficou sciente e assignou.

Aldeia de S. Miguel, na manhã do dia 23 de outubro de 1878. — José Gomes Paulo — O official de deligencias, José Delfino.

Certidão. — Dou fé intimar a testemunha Antonino Cabral Tavares de Carvalho, de Santa Marinha, cuja intimação lhe fiz n'esta villa pelo aqui encontrar, e sendo a propria de Antonio em logar de Antonino, para todo o conteudo do mandado retrò, que lhe li e ficou sciente e assigna commigo official.

Ceia, na manhã do dia 23 de outubro de 1878. — Antonino Cabral Tavares de Carvalho — O official de diligencias, José Delfino.

Continuação do corpo de delicto. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 23 dias do mez de outubro, n'esta villa de Ceia e casas do tribunal judicial d'ella, onde estavam commigo escrivão do seu cargo o dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito n'esta comarca, e o dr. Fernando Henriques da Costa Loureiro Toscano, delegado do procurador regio n'esta mesma comarca; ahi elle juiz continuou a proceder a corpo de delicto sobre o conteudo da petição de fl. 2, com as testemunhas para hoje designadas, que elle juiz inquiriu, tomando-lhes as declarações juradas pela fórma seguinte:

4.ª

José Gomes Paulo, viuvo, proprietario, de quarenta e nove annos, morador no logar de Aldeia de S. Miguel, freguezia de Santa Comba, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes disse nada. E sendo interrogado á materia dos artigos da petição de fl. 2, que elle juiz lhe leu e explicou. Disse ao primeiro, que, dirigindo-se á igreja matriz no dia 13 na qualidade de eleitor, sendo oito horas da manhã, pouco mais ou menos, pois que o relogio da torre da dita igreja deu nove horas, quando em todos os relogios particulares eram apenas oito horas, a mesa eleitoral já estava constituida com pessoas todas da parcialidade da auctoridade administrativa; que assim constituida a mesa, começou a chamada dos eleitores pela freguezia de S. Martinho, que é a mais proxima. E mais não disse.

Ao segundo disse que, pelo ver e presencear, sabe que no dia 13, depois de findas as operações eleitoraes d'este dia, alguns eleitores da opposição propozeram ao presidente da mesa, que as portas da igreja ficassem abertas e a uma, guardada pela tropa, escolhendo-se igual numero de eleitores de ambas as parcialidades para permanecerem junto da uma, querendo; que a esta proposta respondeu o presidente da mesa, dr. Amandio, negativamente, mandando saír todos os eleitores da igreja e mandando fechar esta, ficando assim baldada a rasoavel proposta dos eleitores da opposição. E mais não disse d'este.

Ao terceiro artigo disse que, pelo ver e presencear, sabe, que no dia 14, á noite, se conservaram alguns eleitores á roda da igreja, bem como toda a tropa aqui estacionada; e que, ouvindo-se dois tiros para o lado do cemiterio, accudiu logo o administrador do concelho Elisiario Vaz Preto Casal, e o presidente da mesa dr. Amandio e deram ordem á tropa para que expulsasse toda a gente, que estava no adro em roda da igreja, e apesar de todas as reclamações a ordem cumpriu-se, de maneira que no adro em roda da igreja não ficou pessoa alguma nem lá podia entrar, porque a tropa a isso obstava. E mais não disse d'este.

Ao quarto artigo disse, que pelo ver e presencear, sabe, que no dia 14 á noite era objecto de todas as conversações o resultado eleitoral das assembléas ruraes, nas quaes o candidato Abranches obteve uma maioria de quasi 300

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 84

84

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

votos, bem como geralmente se dizia, que esta maioria não podia ser supplantada pela votação da assembléa d'esta villa.

Que por este motivo e attendendo ás occorrencias da noite, que já relatou, alguns eleitores da opposição, e entre estes o dr. Antonio Hortensio e dr. Agostinho, se dirigiram com um requerimento no dia 15 de manhã, a casa d'elle juiz, requerendo exame directo na urna, que suspeitavam viciada;

Que igualmente, pelo ver e presencear, sabe, que o juiz da comarca, acompanhado do ministerio publico, se dirigiram á igreja matriz para proceder ao referido exame, e apenas elle juiz saíu da igreja; logo se soube que a uma estava intacta, porque o mesmo juiz no adro disse em voz alta, que a uma não tinha sido arrombada ou viciada;

Que quasi immediatamente á saída d'elle juiz e ministerio publico viu elle depoente, que a tropa, em força de quarenta praças, pouco mais ou menos, e por ordem da auctoridade administrativa, entrou dentro da igreja por uma das portas lateraes, unica que se conservou aberta, e que depois da tropa estar dentro da igreja, é que foi permittida a entrada dos eleitores; mas um por um, e revistados á proporção que entravam;

Que, entrando dentro da igreja, depois de revistado como já disse, viu que a tropa estava formada em roda da uma, com ordem de não deixar approximar ninguem junto d'ella, sendo elle depoente um dos que tentou fazel-o, mas foi pela dita força publica repellido;

Que ao pé da mesa e da uma viu elle depoente os eleitores Antonio Hortensio, Thiago, Frias e Agostinho, que disputavam com o presidente da mesa o direito de ali estarem, e que o seu direito d'elles era igual ao d'elle presidente, ao que este replicava em voz alta, que não começava a extracção emquanto ali estivessem.

Declarou mais que, insistindo os ditos eleitores pelo seu direito, foram a final expulsos pela força, dando o administrador voz de prisão ao dr. Antonio Hortensio, e levando-o aos empurrões para fóra da area da tropa;

Que durante esta occorrencia observou, que o capitão da força se dirigiu, para junto da mesa a fallar com o presidente, e sem saber o que é que elle lhe expoz, o dito presidente disse em voz alta e enfurecido «que elle ali não mandava nada, e que havia de obedecer ás suas ordens d'elle», e por tal motivo o capitão se retirou para o seu posto e disse para o eleitor Thiago, de modo que toda a gente podia ouvir, que não tinham remedio senão saír, porque elle não podia deixar de cumprir as ordens recebidas, mas que podiam dal-o como testemunha;

Que, logo que os ditos eleitores foram expulsos pela fórma dita, começou o presidente a tirar listas da seguinte maneira: tirou primeiro uma que leu e rasgou, e em seguida e por mais de uma vez tirou as listas ás mãos cheias e as rasgou sem as ler; e vendo isto, e que todos os eleitores da opposição foram expulsos violentamente de junto da uma, sem que fosse possivel romper o cordão da tropa, elle depoente se retirou da igreja, e não sabe o que depois se passou pelo ver, mas é voz constante, e um facto geralmente sabido, que a força publica se conservou dentro da igreja na mesma posição já dita, até que terminou o escrutinio.

Declarou que os já ditos eleitores Antonio Hortensio e os outros acima ditos conseguiram approximar-se da uma por estarem já dentro da igreja, por terem acompanhado a elle juiz por intimação d'este, e assim ficaram na igreja depois de terminado o exame, e antes de entrar a tropa, porque de outra fórma não precisava o presidente da mesa e auctoridade administrativa de empregar a força para os expulsar, visto que não lhes seria permittido romper o cordão da tropa.

Declarou mais que a tropa, pelo modo que estava disposta e formada, vedava a entrada e passagem, não só para junto da uma e mesa eleitoral, mas para a maior parte do centro da igreja.

Declarou mais que ao retirar-se da igreja viu, que em roda d'esta andava uma patrulha de cavallaria constantemente, e que a porta principal da igreja e outra lateral estavam fechadas, e é um facto publico que assim se conservaram sempre e durante todo o acto eleitoral. Declarou finalmente que a tropa antes de entrar na igreja estava formada junto da porta lateral, e quando se estava a proceder ao exame judicial, carregou armas, e que na igreja estava formada com as armas e bayoneta calada. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento, o achou conforme e o ratificou.

5.ª

Antonino Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, que é o mesmo mencionado na petição como Antonio Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, proprietario, de quarenta e um annos, morador em Santa Marinha, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes disse nada. E sendo interrogado á materia dos artigos da petição de fl. 2, que elle juiz lhe leu e explicou. Disse ao primeiro artigo, que nada sabia. A segundo disse nada. Ao terceiro disse que no dia 14, depois de fechada e lacrada a uma, alguns eleitores da opposição propozeram á mesa que ficasse dentro da igreja para a guardar a tropa e alguns eleitores de ambas as parcialidades, que se escolhessem, e as portas abertas, o que fui rejeitado pelo presidente e pela mesa; que rejeitada esta proposta pediram que ficasse dentro da igreja a tropa e que ao menos deixassem as portas da igreja abertas para poder vigiar de fóra quem quizesse, o que foi tambem repellido, recebendo todos os eleitores ordem para saír da igreja, aliàs que se empregava a força, em virtude do que toda a gente se retirou da igreja, sendo esta fechada. E mais não disse d'este. Ao quarto artigo disse, que depois das oito horas da noite, pouco mais ou menos, e quando elle depoente se ía deitar, ouviu a detonação de dois tiros, que lhe pareceram dados para o lado da igreja matriz, e, voltando lá, viu que o administrador, Elisiario Vaz Preto Casal, deu ordem á tropa para que fizesse saír do adro e de junto da igreja toda a gente, e foram inuteis todas as reclamações, porque a ordem cumpriu-se, não sendo permittido ficar no adro e em roda da igreja em toda a noite; que, sabendo seja o resultado das assembléas ruraes, muito favoravel ao candidato Abranches, e suppondo-se que não podia ser coberto esse resultado com a votação d'esta assembléa, e attendendo ás occorrencias da noite já ditas, e ainda a que todas as tentativas para vigiar a uma por parte da opposição tinham sido repellidas, suspeitaram alguns eleitores que a uma tivesse sido arrombada ou viciada durante a noite do dia 14, e por isso na manhã do dia 15 se dirigiram a elle juiz com um requerimento para se fazer exame directo na urna antes de ser aberta, e pelo ver e presencear, sabe que elle juiz e agente do ministerio publico entraram na igreja para fazer o exame requerido, ouvindo elle depoente a elle juiz, quando saíu, em voz alta e para os eleitores que estavam no adro, que a uma estava intacta, e que tivessem juizo; que, quasi logo que saíram juiz e delegado, entrou para dentro da igreja a infanteria em numero superior a quarenta soldados, que ali já se achava formada, carregando as armas em presença d'elle testemunha e de muita gente; elle testemunha entrára tambem para dentro da igreja pela unica meia porta lateral que se achava aberta, mas, ao entrar, o referido administrador do concelho pretendeu revistal-o, o que não levou a effeito, porque elle testemunha lhe disse que não levava comsigo arma alguma. Que vira e presenceára que a mesa onde se achava a uma com as listas se achava cercada por duas alas formadas pela referida infanteria, que afastava de ao pé da mesma mesa todos os eleitores, a não serem aquelles que faziam parte da mesa da assembléa, sendo elle testemunha um dos eleitores que foi afastado da mesa pela referida tropa e administrador do concelho.

Página 85

85

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presenceára mais, que entre os chefes da opposição, Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, Thiago de Albuquerque, Antonio de Frias e Agostinho Viegas, havia uma altercação com o presidente da assembléa, Amandio Eduardo da Motta Veiga e o referido administrador, na qual aquelles sustentavam o direito, que lhes assistia, a fiscalizarem o escrutinio e todas as operações eleitoraes, e estes, negando-lh'o, os intimavam para se afastarem da mesa e saírem d'ali, aliàs que seriam presos; e affirmando o Hortensio que d'ali só saía feito em postas, foi então que o referido administrador o fez saír violentamente, empurrando-o para fóra das alas da tropa, d'onde não era possivel vigiar o referido escrutinio.

Depois destes factos todos a opposição declarou que abandonava as operações eleitoraes, e que saía da igreja, visto que não podia fiscalisar aquellas. N'esta occasião elle testemunha fixou o presidente, e viu e presenceou, que a uma estava um pouco inclinada para o mesmo presidente, o que este com os olhos fixos nas pessoas, que estavam ao fundo da igreja, repetidas vezes metteu as mãos na mesma uma tirando listas, que, sem ler, rasgava e lançava no chão.

Que faziam parte da mesa, alem do presidente já mencionado, Antonio de Almeida Mello e Sousa, José Marrão e Antonio de Brito Freire Vasconcellos, não se recordando se d'ella tambem fazia parte um Fernando José da Silva, por alcunha o Lindinho.

Que nunca mais voltára á igreja, mas que é publico e notorio, que a referida infanteria estivera cercando a uma, como já disse, dentro da igreja até o fim das operações eleitoraes.

Disse finalmente, que em roda da igreja durante as operações eleitoraes constantemente andou uma patrulha de cavallaria, e sabe isto por ver e presencear, e por ser publico e notorio. E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento, o achou conforme e o ratificou.

6.ª

José Saraiva Claro, casado, sapateiro, de trinta e cinco annos de idade, morador em Pinhanços, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes disse nada.

E sendo interrogado á materia dos artigos da petição do folhas 2, que elle juiz lhe leu e explicou, disse ao primeiro artigo, que é publico e notorio, que o relogio da igreja, fôra adiantado meia hora no dia 15 com o fim de poder o grupo, protegido pela auctoridade, organisar a mesa á sua vontade. E mais não disse, d'este. Ao segundo disse que sabe a materia d'este artigo por ver e presencear. E mais não disse d'este. Ao terceiro artigo disse nada, por ignorar a sua materia. Ao quarto artigo disse que no dia 15 do corrente, seriam nove horas da manhã, viu e presenceou elle depoente, que conjunctamente com o administrador d'este concelho entrára a força publica aqui estacionada, em força não inferior a quarenta praças, para dentro da igreja matriz, formando-se em duas alas e a uma entre ellas; que tendo entrado para dentro da igreja os eleitores Hortensio, Thiago, Agostinho e Frias antes das nove horas para assistirem a um exame judicial e por ordem d'este juizo, lá se conservaram, e elle depoente os viu junto da uma já depois da tropa formada, e antes de começar a extracção das listas o administrador do concelho lhes deu ordem para que saíssem, ao que replicaram, dizendo, que queriam fiscalisar a eleição, porque, estavam no seu direito; que o administrador insistia, que saíssem, aliàs que iam presos para a cadeia; que o queixoso Frias se dirigiu ao commandante da força, pedindo providencias, o qual se dirigiu para junto da mesa, e n'este acto ouviu dizer em voz alta ao dr. Amandio, presidente da mesa, para o capitão commandante que elle ali não mandava nada, e que estava debaixo das suas ordens.

O dito commandante retirou-se da mesa, e, dirigindo-se aos já mencionados eleitores disse-lhes:

Que tinham de saír, porque eram essas as ordens que tinha, e que não lhes podia valer;

Que o eleitor Thiago declarou então, que o que o obrigava a saír, eram tres creanças que tinha em casa. Que postos assim fóra das alas violentamente os eleitores da opposição, e sem que se deixasse romper as alas de tropa, que ali se achava, viu elle depoente, que o referido presidente da mesa, tirando da uma uma lista, a lêra em voz alta, contendo o nome de José de Abranches, que immediatamente rasgou, e em seguida, tirando outra, tambem a leu, contendo o nome de Motta Veiga; e em seguida a isto, viu e presenceou, que o mesmo presidente metteu a mão na urna por duas vezes, formando maços de listas, e que as rasgou sem serem lidas;

Que em presença d'estes factos, voltára se para individuos que ali se achavam, dizendo-lhes que estavam roubados, e por isso saíu d'ali indignado.

Depois d'isto, elle depoente entrou por algumas vezes dentro da igreja, durante as operações eleitoraes, e continuou sempre a ver a tropa formada, e como já referiu, sem que junto da uma, se approximasse ou podesse approximar pessoa alguma;

Que todas as portas da igreja se achavam fechadas, á excepção da porta lateral, que estava meio aberta. Quando saíu da igreja, viu postados junto da referida porta dois cavallarias com a espada desembainhada, e em roda da igreja constantemente uma patrulha de cavallaria.

E mais não disse, e sendo-lhe lido o seu depoimento, o achou conforme e o ratificou.

7.ª

Antonio José Monteiro, casado, proprietario, do logar de Pinhanços, de trinta e seis annos de idade, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade, e aos costumes disse nada. E sendo interrogado á materia dos artigos da petição de fl. 2, que elle juiz lhe leu e explicou, ao primeiro artigo disse nada.

Ao segundo artigo, terceiro e quarto, que lhe foram lidos, disse:

Que, na qualidade do regedor substituto em exercicio, acompanhára alguns eleitores no dia 13, e assistira á eleição até que votou a sua freguezia, reconhecendo elle depoente e o seu vigario a identidade dos eleitores, e que se retirára sendo quatro horas da tarde;

Que no dia 15 de manhã, dirigindo-se para a mesma igreja, viu e presenceou, que a força publica aqui estacionada, em numero do 40 praças, pouco mais ou menos, entrou dentro da igreja, e ali formou em duas alas e a uma entre ellas, e no extremo para o lado do altar mór;

Que a tropa, entrou antes dos eleitores, excepto os eleitores Hortensio, Thiago, Agostinho e Frias, porque estes foram intimados por elle juiz, para assistirem ao exame judicial, que se fez antes da tropa entrar, e por isso ficaram na igreja;

Que, entrando na igreja, e estando a tropa como já disse, presenceou uma altercação entre os eleitores acima mencionados, que estavam ao pé da uma, com o administrador do concelho Elisiario Vaz Preto Casal, dizendo este, que se não se retirassem para fóra da ala da tropa, os prendia;

Que depois de ver dar um empurrão ao queixoso Frias, este se dirigiu ao capitão da forca, pedindo providencias, o qual se dirigiu á mesa, mas não ouviu o que lá se passou, sendo certo que o capitão, voltando para o seu logar, dissera em voz alta para os já mencionados eleitores, que não podia deixar de cumprir as ordens recebidas, e que o unico auxilio que lhes podia dar, era dizer-lhes «que estava prompto para ser testemunha», e que por esta fórma e á força foram os referidos individuos expulsos de junto da uma, e apenas passaram a ala da tropa, saíram da igreja, declarando que iam protestar por esta violencia;

Que no entender d’elle testemunha, a tropa tinha ordem de não deixar entrar para o pé da uma, eleitor algum, e

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 86

86

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

porque elle o tentou logo de principio, foi impedido pelo sargento da dita força.

Que sendo só permittido estar áquem do cordão da tropa, era inteiramente impossivel fiscalisar a eleição, porque a distancia era, de certo, superior a cinco metros, pois basta saber que entre os espectadores e a uma medeiava o espaço occupado pelas linhas da tropa, não tendo cada ala, de certo, menos de vinte soldados.

Que conservando-se na igreja e áquem das alas da tropa, viu que o presidente, depois de extrahir duas listas, as tirava ás mãos cheias e as rasgava sem as ler, retirando-se elle depoente, e por isso não sabe o que posteriormente aconteceu.

Que a sua retirada da igreja foi depois de presencear o facto que acaba de depor, praticado pelo presidente da mesa, que é irmão do candidato governamental, o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, por tres vezes.

Declarou finalmente que durante o tempo que elle depoente assistiu á eleição, não houve facto ou palavra, que denunciasse aggressão ou intenção de offender pessoa alguma, nem lhe consta que houvesse a mais pequena alteração da ordem, tanto no dia 15 como nos dias 13 e 14.

E mais não disse; e, sendo-lhe lido o seu depoimento, achou-o conforme e o ratificou.

8.ª

Antonio Alves Ferraz, casado, proprietario, de Santa Comba, de quarenta e dois annos, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade, e aos costumes disse nada.

E sendo interrogado á materia da petição de fl. 2, que elle juiz lhe leu e explicou:

Disse ao artigo primeiro nada.

Ao segundo disse nada.

Ao terceiro artigo disse nada.

Ao quarto artigo disse:

Que no dia 15 de manhã entrou na igreja matriz, e viu o presenceou que a tropa, em força de quarenta praças, pouco mais ou menos, estava formada em duas alas, sem que fosse permittido approximar-se da uma ou mesmo da mesa, porque a tropa o não consentia, sendo elle depoente por ella repellido quando pretendeu fazel-o.

Que, estando assim a tropa formada, viu que Antonio Hortensio foi expulso do junto da uma aos empurrões pelo administrador do concelho, e não sabe elle depoente explicar como é que estes eleitores estavam junto da uma, quando já lá estava a tropa dentro, e esta não deixava approximar d'ella, e mesmo da mesa, onde ella estava collocada, pessoa alguma.

Que depois de serem expulsos os individuos que estavam junto da uma, e ficando esta de todo isolada, viu elle depoente começar o presidente a tirar listas da mesma; e, porque a presença d'elle depoente era de todo inutil n'aquelle logar, attendendo ao que fica relatado, saíu da igreja e não tornou lá; mas, pelo ouvir dizer e ser um facto geralmente sabido, póde affirmar que a tropa se conservou dentro da igreja, e da mesma fórma que já relatou, até que a eleição se concluiu.

Declarou finalmente, que só havia communicação para a igreja por uma porta lateral, e que a outra porta lateral e a principal estavam fechadas.

Que o dr. Hortensio, logo que foram expulsos elle e os outros, declararam que protestavam por esta violencia, e retiraram se da igreja. E mais não disse; e, sendo lhe lido o seu depoimento, o achou conforme e o ratificou.

9.ª

Francisco Paulo da Cunha, solteiro, sapateiro, de vinte e cinco annos, d’esta villa, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade, e aos costumes disse nada.

E sendo interrogado á materia dos artigos de petição de fl. 2, que elle juiz lhe leu e explicou:

Disse aos artigos primeiro, segundo e terceiro, nada. Ao quarto artigo disse:

Que elle depoente não fôra á igreja matriz no dia 15, e por isso não sabe, pelo ver, as occorrencias que lá se passaram n'esse dia; mas é um facto publico e geralmente sabido n'esta villa, que a tropa aqui estacionada entrou para dentro da igreja antes da eleição principiar, e lá se conservou até ella terminar. E mais não disse; e, sendo-lhe lido o seu depoimento, o achou conforme e o ratificou.

De tudo para constar mandou elle juiz lavrar este auto, que assigna com o doutor delegado e testemunhas que escrevem e official Delfim, depois de lhes ser lido por mim Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão que o escrevi e vou assignar. — Eduardo José Coelho — Fernando Henriques da Costa Loureiro Toscano — José Gomes Paula — Antonino Cabral Tavares do Carvalho — Antonio Alves Ferraz — Antonio José Monteiro — Francisco Paulo da Cunha — José Delfim — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Termo de juncção. — Juntei a precatoria em frente no dia 5 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Figueiredo escrevi.

Carta precatoria. — 1878. — Ceia. — Juizo de direito da comarca da Guarda. — Escrivão, Almeida Carvalho. — Carta precatoria crime para corpo de delicto indirecto expedido da comarca de Ceia a requerimento dos bachareis José de Abranches Homem da Costa Brandão, de Torrozello, e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, de S. Romão. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878 aos 28 dias do mez do outubro do dito anno, n'esta cidade da Guarda e meu escriptorio fiz autuar o presente precatorio. E para constar mandei fazer este auto eu Manuel de Almeida Carvalho, escrivão, que o subscrevi e assignei. — Manuel de Almeida Carvalho.

Juizo de direito da comarca de Ceia. — Escrivão, Figueiredo. — Carta precatoria para inquirição de testemunhas em materia crime, passada no juizo de direito da comarca de Ceia a requerimento dos bachareis José de Abranches Homem da Costa Brandão, de Torrozello, e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, de S. Romão, da mesma comarca e dirigida ao meu dr. juiz de direito da comarca da Guarda, para o fazer cumprir na sua fórma. — D. Luiz I, por graça de Deus e da carta constitucional da monarchia Rei de Portugal, Algarves e seus dominios. A todas as minhas justiças em geral, e com especialidade ás da comarca da Guarda. — Faço saber que no juizo de direito da comarca de Ceia, e cartorio do escrivão que esta escreve, foi instaurado um processo crime a requerimento dos bachareis José de Abranches Homem da Costa Brandão, de Torrozello, e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, de S. Romão, da mesma comarca, no qual a petição inicial é fielmente do teor seguinte: — Ex.mo Sr. — Os bachareis em direito José de Abranches Homem da Costa Brandão, de Torrozello, e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, de S. Romão, d'esta comarca de Ceia, têem a expor a v. ex.ª o seguinte:

1.° Que, procedendo-se ao acto eleitoral no dia 13 do corrente n'esta assembléa primaria de Ceia, o grupo politico protegido pela auctoridade constituiu a mesa eleitoral composta de individuos exclusivamente da sua parcialidade, e para isto conseguir fez adiantar o relogio, e quando eram apenas oito horas e meia da manhã já ella se achava eleita na ausencia do grupo opposicionista, não obstante achar-se presente para tomar parte na eleição da mesa antes das nove horas da manhã (hora legal).

2.º Que procedendo-se á votação, e não se tendo concluido esta no primeiro dia, fôra lacrada a uma e encerrada esta no seu respectivo cofre, e expulsos da igreja, local da assembléa, os eleitoras que queriam vigiar e guardar a mesma uma, como a lei lhes faculta.

3.º Que continuando no segundo dia a votação, e tendo decorrido as duas horas de espera, se lacrára tambem a

Página 87

87

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

uma e encerrára no competente cofre, e querendo ficar alguns eleitores á roda da igreja, foram mandados expulsar d'aquelle logar por ordem da auctoridade administrativa, dando para esse fim a força militar uma carga de bayonetas sobre os eleitores inermes, que tiveram de abandonar o adro ou terreno que fica á roda da igreja.

4.° Que, tendo-se sabido o resultado das assembléas de Loriga, S. Gião e Sameice, e, obtendo n'ellas o candidato da opposição 298 votos de maioria, e vendo-se o grupo politico protegido pela auctoridade, com a certeza de que se o escrutinio corresse legal, a sua derrota era certa, por isso lançando mão dos meios extremos, illegaes e attentatorios da liberdade eleitoral, mandou o administrador na manhã do dia 15, logo em seguida á abertura do cofre em que se achava depositada a uma, entrar a força militar para dentro da igreja, collocando duas filas de tropa á roda da mesa eleitoral, e achando-se esta cercada de soldados com armas carregadas e bayonetas em bôca dellas, foram os eleitores afastados da mesa e impedidos de vigiar o acto eleitoral, o qual correu tumultuoso e illegalmente, roubando-se indignamente as listas da opposição, extrahindo-as o presidente ás mãos cheias da uma, e rasgando algumas, estando ainda, alem da tropa que cercava a mesa, uma força de cavallaria, que externamente cercava a igreja, e que fazia afastar os cidadãos eleitores, que pretendiam ir presencear o acto eleitoral, e por esta fórma e com estas violencias, e outras feitas aos eleitores da opposição, que foram expulsos da igreja, se ultimou o escrutinio e eleição da maneira a mais inaudita, arbitraria e illegal, propria dos tempos ominosos da maior pressão e barbaro despotismo.

Requerem, pois, a v. ex.ª se digne proceder ao corpo de delicto indirecto, inquirindo-se sobre os factos as testemunhas abaixo mencionadas, entregando-se depois aos supplicantes para fazerem d'elle o uso que lhes convenha e for legal; e por isso pedem a v. ex.ª, meritissimo sr. dr. juiz de direito, deferimento. — E. R. M.cê — Testemunhas, Francisco de Almeida Mello, casado, proprietario; José Mendes Diniz Belem, viuvo, proprietario e negociante; bacharel Agostinho de Abranches Fazenda Viegas, solteiro, advogado; bacharel Luiz Henriques Cunhal, presbytero, todos estes do Ceia; José Antonio Rodrigues Ferreira, viuvo, proprietario, residente em Pinhanços; José Gomes Paulo, viuvo, proprietario, residente em Aldeia de S. Miguel, freguezia de Santa Comba; Antonio Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, de maior idade, filho-familia, residente em Santa Marinha; Francisco Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, proprietario, de Santa Marinha; José Saraiva Claro, casado, sapateiro, residente em Pinhanços; Antonio José Monteiro, casado, albardeiro, residente em Pinhanços; Antonio Alves Ferraz, casado, proprietario, residente em Santa Comba; Francisco Paulo da Cunha, solteiro, sapateiro, de Ceia; Francisco Augusto Pinheiro Bayão, capitão do regimento de infanteria n.º 12, estacionado na Guarda; Joaquim Alexandre Aguiar, segundo sargento n.º 19 da 5.ª companhia do mesmo regimento, Guarda; Germano Ventura, furriel da 6.ª companhia, n.º 115 do mesmo regimento, Guarda; Antonio Narciso Nogueira, furriel do dito regimento, Guarda. Requer-se para as de fóra da comarca a competente deprecada. — José de Abranches Homem da Costa Brandão — Antonio Hortencio Ferreira da Fonseca.

Não se contém mais na dita petição, na qual se proferiu o despacho do teor seguinte. Distribuido ao segundo officio.

Para o corpo de delicto requerido designo o dia 22 de corrente, feitas as devidas intimações, incluindo-se o agente do ministerio publico por se tratar de crimes eleitoraes. Ceia, 18 de outubro de 1878. = Eduardo José Coelho.

Additamento. Passe a deprecada requerida com citação de dez dias, e para o dia 22 intime as primeiras cinco testemunhas, e as restantes para o dia 23, pelas oito horas da manhã.

Fica assim additado o despacho de folhas. Data supra. — Eduardo José Coelho.

Não se contém mais no dito despacho, em virtude e cumprimento do qual se passou a presente carta precatoria, pelo teor do qual mando a todas as justiças em geral, a quem ella for apresentada, e o seu conhecimento e execução devo e haja de pertencer, e com especialidade ao meu dr. juiz do direito da comarca da Guarda, a quem vae esta dirigida, indo esta competentemente assignada e sellada, e apresentada que seja, pondo-lho o — Cumpra-se - a façaes cumprir e guardar como n'ella se contém e declara, em seu cumprimento ordenareis, que sejam intimadas as ditas testemunhas Francisco Antonio Pinheiro Bayão, capitão da 4.ª companhia do regimento de infanteria n.º 12; Joaquim Alexandre Aguiar, segundo sargento n.º 69 da 5.ª companhia do mesmo regimento; Germano Ventura, furriel da 6.ª companhia, n.º 15 do mesmo regimento, todos estacionados na cidade da Guarda, para comparecerem perante vós no dia, hora e local, que designardes; e, comparecendo lhes deferireis o juramento dos Santos Evangelhos, encarregando-os sob o mesmo de dizerem a verdade sobre o que lhes for perguntado, e depois de inqueridas até os costumes, as interrogareis sobre a materia da petição retrò transcripta, que por vós lhes será lida e explicada, e suas respostas serão fielmente escriptas pelo escrivão, a quem pertencer, observando-se em tudo as formalidades legaes, e os depoimentos serão juntos á presente carta precatoria, que será devolvida ao juizo deprecante, ficando ahi traslado do acrescido; o que tudo será cumprido dentro da dilação de dez dias, a contar da apresentação d'esta n'esse juizo.

Cumpri-o assim, porque El-Rei a quem Deus guarde assim o mandou pelo dr. Eduardo José Coelho juiz de direito na comarca de Ceia, por quem esta vae assignada e sellada com o sêllo de - valha sem sêllo ex-causa — que assim se usa no mesmo juizo; o vae escripto e rubricado pelo escrivão competente Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo. Dado e passado n'esta villa de Ceia aos 21 dias do mez de outubro do anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878. — E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo escrivão que a escrevi e rubriquei. — Eduardo José Coelho. — Ao sêllo valha sem sêllo ex-causa. — Coelho.

Conta. — Assignatura e sêllo, 200 réis; precatorio, 500 réis; raza, 525 réis; sellos, 680 réis; papel, 30 réis; conta, 110 réis; somma 1$545 réis. = O contador interino, Antonio Augusto de Oliveira Santos.

Distribuido a Almeida; para o corpo do delicto designo o dia 29 do corrente, pelas dez horas.

Requisitem-se as testemunhas ao sr. commandante de infanteria n.º 12, e intime-se o sr. dr. delegado.

Guarda, 28 de outubro de 1878. - Mourão.

Officio. — Ill.mo e ex.mo sr. — Todos os individuos com excepção do segundo sargento Joaquim Alexandre Aguiar, actualmente pertencente a infanteria n.º 1, requisitados por v. ex.ª em officio de hontem, para hoje deporem como testemunhas, comparecem no tribunal da digna presidencia de v. ex.ª á hora designada.

Deus guarde a v. ex.ª Quartel na Guarda, 29 de outubro de 1878. — Ill.mo e ex.mo sr. juiz de direito da comarca da Guarda. O commandante interino José Eduardo da Costa Moura, tenente coronel.

Procuração. — José de Abranches Homem da Costa Brandão, solteiro, de maior idade, proprietario e bacharel formado em direito, natural e residente em Torrozello, comarca de Ceia.

Pelo presente alvará de procuração constituo meu bastante procurador ao ex.mo sr. dr. José Augusto Soares Ribeiro de Castro, advogado no auditorio d'esta cidade da Guarda, para que, em meu nome, como se presente fosse, possa promover os termos precisos para o cumprimento de

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 88

88

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

uma deprecada, que veiu do juiz de Ceia para o d'esta cidade, a fim de aqui serem inquiridas testemunhas sobre infracções e delictos eleitoraes commettidos no concelho de Ceia pelo administrador do mesmo concelho e pela mesa da assembléa primaria da villa de Ceia, e bem assim para assistir ao inquerito das referidas testemunhas, para o que lhe dou todos os poderes, que em direito se requerem. E tudo o que o dito meu procurador fizer, obrar e receber o dou por firme e valioso por minha pessoa e bens.

Guarda, 29 de outubro de 1878. — José Abranches Homem da Costa Brandão.

Reconheço por verdadeira a letra e assignatura supra.

Guarda, 29 de outubro de 1878. — Signal publico. — Em fé de verdade. — O tabellião, Manuel de Almeida Carvalho.

Procuração Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, viuvo, proprietario, de maior idade, bacharel formado em direito pela universidade de Coimbra, natural e residente em S. Romão, d'esta comarca de Ceia.

Pelo presente constituo meu bastante procurador ao ex.mo José de Abranches Homem da Costa Brandão, do logar do Torrozello, comarca de Ceia, com poderes de substabelecer esta, a quem dou os poderes que em direito se requerem para que em meu nome, como se presente fosse, possa promover os termos precisos para o cumprimento de uma deprecada que vae d'este juizo de Ceia para o da Guarda, a fim de ali se inquerirem testemunhas sobre infracções e delictos eleitoraes commettidos n'este concelho pelo administrador e mesa da assembléa da villa do Ceia, e bem assim para assistir ao inquerito das mesmas testemunhas.

E tudo o que por este meu bastante procurador for feito e obrado e recebido o dou por bom, firme e valioso, por minha pessoa e bens.

Dada em S. Romão, 23 de outubro de 1878. — Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca.

Reconheço por verdadeira a letra e assignatura supra. — Guarda, 28 de outubro de 1878. — Signal publico. — Em fé de verdade. — O tabellião, Manuel de Almeida Carvalho.

Substabeleço os poderes que me foram dados na procuração retrò no ex.mo sr. dr. José Augusto Soares Ribeiro de Castro, advogado no auditorio d'esta cidade.

Guarda, 29 do outubro de 1878. — José de Abranches Homem da Costa Brandão.

Sêllo da estampilha de 60 réis competentemente inutilisada.

Reconheço por verdadeira a letra e assignatura supra. — Guarda, 29 de outubro de 1878. — Signal publico. — Em fé de verdade. — O tabellião. — Manuel de Almeida Carvalho.

Intimação. — Para o conteudo no despacho retrò intimei hoje de tarde em sua residencia o meritissimo dr. delegado do procurador regio n'esta comarca, Manuel José Dias Salgado Carneiro, que leu e ficou sciente do seu conteudo.

Para constar passo a presente, que assigna commigo.

Guarda, 28 de outubro de 1878. — Salgado Carneiro — Manuel de Almeida Carvalho.

Auto de exame e corpo de delicto indirecto. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 29 dias do mez de outubro do dito anno, n'esta cidade da Guarda o tribunal judicial da mesma, onde se achava o dr. José João de Azevedo Mourão, juiz de direito n'esta comarca, e eu escrivão de seu cargo vim: ahi, presentes as testemunhas para este acto requisitadas, a fim de proceder-se ao presente corpo de delicto, passou elle juiz a inquiril-as pela fórma seguinte:

Francisco Antonio Pinheiro Bayão, casado, capitão de infanteria 12, aqui estacionado, de quarenta e quatro annos de idade, jurou aos Santos Evangelhos, e aos costumes disse nada.

Perguntado ácerca da materia contida na petição e despacho transcripto na deprecada retrò, que tudo por elle juiz lhe foi lido, disse que foi o official encarregado de commandar cincoenta praças para ir a Ceia a auxiliar o administrador do concelho na manutenção da ordem publica por occasião da ultima eleição para deputados que teve logar no dia 13 do corrente; que chegado a Ceia lhe foi requisitado que dividisse a força pelas diversas assembléas, o que fez, e elle mesmo acompanhou expontaneamente e sem que a isso fosse obrigado a fracção que foi destinada á assembléa de S. Gião, por lhe dizer a auctoridade local que ahi corria mais perigo a segurança publica; que n'essa assembléa assistiu elle testemunha ao acto eleitoral em companhia do proprio administrador do concelho, o qual correu muito regular; que findo este acto eleitoral, o dito administrador partiu para Ceia, e que chegado ali officiou a elle depoente, requisitando-lhe que com urgencia marchasse para Ceia com toda a força que estava estacionada em S. Gião, e por fórma que ás oito horas da manhã do dia 15 se achasse em Ceia, o que elle cumpriu; que chegado a Ceia encontrou já á porta da igreja, dentro da qual se ía proceder á abertura da uma, formada, e com as armas carregadas, toda a força ali existente, commandada então pelo segundo sargento Aguiar; que a essa força mandou elle depoente juntar a que vinha com elle e tomou então o commando de toda a força; que em seguida passou a informar-se de que havia occasionado aquella formatura de tropa, e soube que já ali estava desde a noite antecedente requisitada pelo administrador do concelho para guarda da igreja e da uma, que se tinham julgado em perigo; que mais encontrou junto da igreja uma força de cavallaria composta de dez soldados e um sargento; que quando não tinha ainda conhecimento pleno da situação e se achava ainda procedendo a informações dentro e fóra da igreja, o administrador do concelho, inesperadamente, dentro da mesma igreja, em plena assembléa eleitoral e por ordem do presidente da mesa, que se achava constituida, lhe requisitou a entrada de toda a força na mesma igreja, ficando a cavallaria fornecendo patrulhas em volta da mesma; que elle depoente não exigiu ordem por escripto, porque esta lhe foi dada em acto tão publico e tão solemne, que a considerou desnecessaria, parecendo-lhe que uma tal requisição e exigencia só circumstancias muito extraordinarias a podiam ter inspirado; que só depois de formada a tropa, conforme o administrador do concelho exigiu, isto é, em duas fileiras de mais de vinte homens cada uma, desde a mesa até quasi á porta principal, e pelos actos que depois decorreram, é que pude perceber as intenções maliciosas do presidente da mesa e do administrador do concelho; que viu serem os eleitores expulsos do recinto limitado pelas fileiras dos soldados, e viu mesmo ser preso um eleitor, que insistia em approximar-se da mesa; que muitos eleitores que julga da opposição protestaram contra esta violencia, abandonando a igreja, e declarando que se iam queixar; que se procedeu á leitura das listas sem que a ninguem fosse permittido fiscalisar a leitura, e que a respectiva uma se achava deitada com a bôca virada para o presidente; que elle depoente se indignou com este espectaculo, e se lembrou mesmo de saír da igreja com a tropa, protestando assim contra este acto, e que o não fez por temer que d'isso resultasse alguma perturbação; que deixou portanto ultimar o acto eleitoral, e só findo elle se retirou com a intenção de protestar contra quem lhe dera taes ordens illegaes, o que já fez.

Disse mais que nem antes nem depois do acto eleitoral houve tumulto ou desordem, que justificasse a intervenção da força publica. E mais não disse.

Germano Ventura, solteiro, de vinte annos de idade, furriel de infanteria n.º 12, aqui estacionado, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes disse nada. Perguntado ácerca da materia contida na petição e despacho transcripto na deprecada que antecede, que tudo por elle juiz lhe foi lido. Disse que, por ser publico sabe, que

Página 89

89

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

o grupo politico protegido pela auctoridade constituiu a mesa ás oito horas da manhã na ausencia do partido da opposição. «

Disse que no dia 15 do corrente, pelas onze horas da manhã, chegou á igreja de Ceia, onde se procedia á eleição, e viu que em volta da mesa eleitoral e na distancia de tres passos, isto é, em frente da mesa eleitoral havia duas alas de tropa, que chegavam até á porta lateral da igreja, e que impediam que alguem se approximasse da mesa para observar os actos eleitoraes, vendo-se de distancia de seis passos o presidente dar listas a dois homens que estavam dos lados d'elle, não se observando ao principio d'onde elle tirava as listas, mas mais tarde viu que o presidente tirava as listas de uma uma que haviam levantado, ouvindo dizer ao segundo sargento Aguiar que foi por advertencia do seu capitão, testemunha, que já depoz, que o presidente da assembléa pôz de pé a uma, d'onde elle depoente ao depois viu que eram extrahidas as listas, vendo tambem que o presidente, depois que as listas eram lidas, as rasgava e lançava para dentro de um caixão que estava em cima da mesa e ao lado da mesma, e por ouvir ao dito sargento Aguiar sabe que a força fôra collocada na igreja e junto da uma por assim o haver requisitado o presidente da mesa e respectivo administrador do concelho.

Disse mais, que dentro da igreja estava povo, que a tropa permittia entrasse para dentro da igreja, mas o que a tropa não permittia era que o povo se approximasse da mesa eleitoral, da qual ficava distante seis a oito passos, mettendo-se entre o povo e a mesa a ala dos soldados, comtudo a testemunha não viu que alguem que pretendesse approximar-se da uma não fosse prohibido pela tropa, sabendo comtudo que a ordem que esta tinha era de não deixar approximar ninguem da uma, nem mesmo por entre as duas filas. E mais não disse.

Antonio Narciso Nogueira, solteiro, de vinte e tres annos de idade, furriel de infanteria n.º 12, aqui estacionado, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes disse nada.

Perguntado ácerca do conteudo na petição e despacho transcripto na carta precatoria retrò, que tudo por elle juiz lhe foi lido, disse que, por presencear, sabe que no dia 15 do corrente a força armada de que elle fazia parte entrou para dentro da igreja do Ceia com as bayonetas na bôca das armas, e o presidente da mesa lhes ordenou que deixassem entrar na mesa quem quizesse, mas que não deixassem approximar alguem da mesa, o que a tropa fez, e quando alguem se queria approximar da mesa eleitoral, a tropa o mandava retirar, e isto em cumprimento das ordens que haviam recebido, fazendo a tropa conter o povo em distancia de quinze passos approximadamente da mesa eleitoral, e quando alguem queria approximar-se da mesa não sabendo elle depoente a que partido pertenciam, os soldados os intimavam para que se retirassem, cumprindo as ordens que tinham recebido, como já disse.

Que em volta da igreja andavam patrulhas de cavallaria, ignorando elle depoente o que ellas faziam, porque durante o acto eleitoral esteve elle testemunha dentro da igreja com a mais força.

Que viu que o presidente da assembléa, depois de lidas as listas, as rasgava e deitava dentro de uma uma; que as duas filas começavam a distancia de quatro passos, pouco mais ou menos da mesa, seguindo na direcção, de uma das portas transversaes, unica da igreja que estava aberta; que entre as duas filas havia o espaço de cerca de dez passos, de modo que por entre ellas podia o povo ver do ponto onde se achava, que, como já disse, era de quinze passos, pouco mais ou menos, a mesa onde se faziam as operações do apuramento, porém, que a uma no principio do apuramento estivera deitada em cima da mesa, e n'esse estado o povo não podia ver o acto da extracção por ficar a coberto com o cofre onde ella tinha sido guardada, e que estava em cima da mesa, o qual teria tres a quatro palmos de altura e largura, mas que depois o presidente poz a uma em pé, e desde então o acto da extracção podia ser visto pelo povo.

Que finalmente a força que estava dentro da igreja era em numero de cincoenta praças. E mais não disse; e sendo a todas as testemunhas lidos os seus depoimentos os ratificaram apenas com as seguintes declarações.

Disse a primeira testemunha, o capitão Francisco Antonio Pinheiro Bayão, que a porta lateral da igreja, unica que estava aberta, está situada perto da porta principal da mesma igreja, e que as fileiras dos soldados chegavam até essa porta lateral, e que o espaço vedado comprehendia quasi todo o corpo da igreja. E mais não disse.

A ultima testemunha Antonio Narciso Nogueira declarou que quando no principio do seu depoimento disse que o presidente da mesa ordenou á força «que deixassem entrar na mesa quem quizesse, quiz dizer, que deixassem entrar na igreja quem quizesse» e que quando depois jurou que o presidente da mesa, depois de lidas as listas as deitava dentro de uma uma, quiz dizer «que as deitava dentro de um cofre». E mais não disse, e lidas de novo estas declarações as ratificaram.

E por esta fórma houve elle juiz este acto por concluido, a que foi presente o dr. delegado, e mandou fazer este auto que depois de lido vae por todos ser assignado e por mim Manuel de Almeida Carvalho escrivão, que o escrevi e assignei. — Mourão — Manuel José Dias Salgado Carneiro — Francisco Antonio Pinheiro Bayão, capitão de infanteria 12 — Germano Ventura — Antonio Narciso Nogueira, furriel de infanteria n.º 12 — Manuel de Almeida Carvalho - Venceslau dos Santos.

Termo de conclusão. — Em 29 do outubro de 1878 fiz estes autos conclusos. Eu Manuel de Almeida Carvalho, escrivão, que o escrevi.

Despacho. — Ficando copia do depoimento das testemunhas, e pagas as custas entregue-se á parte.

Guarda, 29 de outubro de 1878. — Mourão

Data. — No mesmo dia, mez e anno supra, n'esta cidade da Guarda e meu escriptorio me foram dados estes autos com seu despacho. Eu Manuel de Almeida Carvalho escrivão que o subscrevi.

Termo de entrega. — Aos 29 dias do mez de outubro de 1878 annos, n'esta cidade da Guarda e meu escriptorio fiz entrega da presente precatoria ao bacharel José Augusto Soares Ribeiro de Castro, d'esta cidade, na qualidade de procurador dos requerentes, que de o receber assigna commigo. E eu, Manuel de Almeida Carvalho, escrivão que o subscrevi e assignei. — José Augusto Soares Ribeiro de Castro — Manuel de Almeida Carvalho.

Apresentação. — Em 5 de novembro de 1878 me foi entregue a precatoria que antecede. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Conclusão. — Conclusos em 6 do novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Despacho. — Ao ministerio publico. Data supra. — Coelho.

Data. — Recebidas no dia supra. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Termo de vista. — Vão com vista ao meritissimo dr. delegado em 7 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Promoção. — Os requerentes alem das testemunhas inqueridas, deram em rol mais quatro, que ainda o não foram, e são da relação ou rol das mesmas as seguintes: as numeros um, tres, oito e quatorze. Sou informado que o numero um já recolheu a Ceia, o numero oito está em Santa Marinha, o numero tres acha-se em Coimbra, e o numero quatorze pertence actualmente a infanteria numero 1 com quartel em Belem. Parece-me que, para se satisfazer ao requerido a folhas, se devem mandar passar as necessarias ordens para que estas quatro testemunhas tambem sejam

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 90

90

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

inquiridas. Com os depoimentos de todas as testemunhas apontadas pelos requerentes, peço nova vista para convenientes effeitos.

Ceia 9 de novembro de 1878. — O delegado, Toscano.

Termo de data. — Recebidos em 9 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, o escrevi.

Termo de conclusão. — Conclusos em 9 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, o escrevi.

Despacho. — Intime os requerentes para declararem se prescindem das testemunhas ainda não inquiridas. Data supra. — Coelho.

Termo de data. — Recebidos com o despacho retrò no mesmo dia da sua data. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, o escrevi.

Certidão. — Intimei, do que dou fé n'esta villa em suas pessoas aos requerentes os ex.mos drs. José de Abranches Homem da Costa Brandão e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, que reconheço pelos proprios, para todo o conteudo do despacho retrò, que elles leram, ficaram scientes e vão assignar.

Ceia 18 de novembro de 1878, de manhã José de Abranches Homem da Costa Brandão — Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca. - O escrivão, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Termo de junção Juntei a petição em frente, no dia 18 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, o escrevi.

Petição. — José de Abranches Homem da Costa Brandão, de Torrozello, e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, de S. Romão, tendo sido intimados do despacho proferido no auto de exame e corpo de delicto por abusos eleitoraes (escrivão Figueiredo) praticados pelo administrador d'este concelho, presidente da assembléa eleitoral n'esta mesma villa e outros, declaram que prescindem das testemunhas relacionadas sob numeros tres, e quatorze. — Agostinho Viegas e sargento Aguiar, substituindo, este por Francisco Gomes, casado, proprietario, da quinta de Sarrodello, d'esta freguezia de Ceia; e porque a testemunha Francisco Cabral Tavares de Carvalho, de Santa Marinha, esteja doente, requereu que seja inquirido em sua casa, para o que os supplicantes se prestam ás despezas d'esta diligencia, e que a testemunha Francisco Mello se inquira por estar na actualidade n'esta villa, e para tudo isto. — Pedem a v. ex.ª, meritissimo sr. juiz de direito, se digne admittir a substituição requerida e lhe defira sobre o mais que expõem. E. R. M.cê — José de Abranches Homem da Costa Brandão — Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca.

Despacho. — Junte, e para inquirição da testemunha Francisco Mello designo o dia de hoje.

Ceia, 18 de novembro de 1878. — Coelho.

Termo de entrega. — No dia 18 de novembro de 1878 entreguei ao official Pinho o mandado para intimação da testemunha Mello. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, o escrevi.

Termo de juncção. — Juntei o mandado em frente no dia 18 de novembro de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, o escrevi.

Mandado. — O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia, mando seja intimada a testemunha infra indicada para comparecer perante mim, nas casas da minha residencia no dia de hoje por tres horas da tarde, a fim de deporem sobre o que lhes for perguntado, sob pena da lei, faltando. Cumpra-se.

Ceia, 18 de novembro de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi. — Coelho. - Testemunha Francisco de Almeida Mello, casado, proprietario, de Ceia.

Certidão. — Para todo o conteudo no mandado retrò intimei a testemunha Francisco do Almeida Mello, d'esta villa, cujo mandado lhe li e ficou bem sciente e assigna commigo, cuja identidade reconheço. Ceia, 18 de novembro de 1878. — Francisco de Almeida Mello — O official de deligencias, Aleixo Rebello de Pinho.

Auto de continuação do corpo de delicto. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 18 dias do mez de novembro, n'esta villa de Ceia e moradas do dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito n'esta comarca, onde eu, escrivão de seu cargo vim, ali elle juiz inquiriu, em continuação do corpo do delicto, a testemunha Francisco de Almeida Mello, a quem tomou as declarações juradas pela fórma que ao diante se segue.

Francisco de Almeida Mello, casado, proprietario, d'esta villa, de cincoenta e dois annos, jurou dizer a verdade e aos costumes disse nada. E sendo interrogado á materia da petição de folhas 2, que elle juiz lhe leu e explicou, disse que no dia 13 de outubro ultimo, dirigindo-se á igreja matriz d'esta villa, para assistir á formação da mesa eleitoral, e chegando lá, viu que esta estava já formada com o dr. Amandio Eduardo da Motta Ameiga, presidente, e com os vogaes Antonio de Almeida Mello e Senna e José Marrão, escrutinadores, e Antonio de Brito Freire e Vasconcellos e Fernando José da Silva, secretarios, todos pertencentes á parcialidade da auctoridade. Que o relogio da torre, no entender d'elle testemunha, foi adiantado sem saber por quem, pois que, quando se dirigiu para a igreja eram oito horas e trinta minutos nos relogios particulares e no da torre da misericordia. Que no dia 14 á noite, sendo dez para as onze horas, estava elle depoente junto da igreja matriz, e ouviu o som de dois tiros dados para o lado da rua do Assis, contigua ao adro, e que por este motivo houve algum alvoroço, em virtude do qual appareceram o administrador do concelho, dr. Casal, e o presidente da assembléa já dito, que mandaram saír toda agente do adro e de derredor da igreja, empregando para isso a força publica, que então era commandada por um sargento. Que toda a gente saíu em virtude d'esta ordem e emprego da força, ficando a uma entregue desde então á guarda exclusiva da tropa. Que no dia 15, de manhã, viu o presenceou que elle juiz e mais empregados de justiça entraram dentro da igreja para fazer exame directo na urna, do qual constou, que esta estava intacta. Que a tropa se achava já formada ao longo da igreja, junto da porta lateral, unica que estava meio aberta, e apenas elle juiz e mais empregados saíram da igreja, viu e presenceou, que o já dito administrador chegou á dita porta e d'ali deu ordem á tropa para entrar dentro da igreja, a qual entrou effectivamente antes do ser permittida a entrada aos eleitores, e dando-se com elle depoente a circumstancia de querer entrar juntamente com a tropa e ser por ella repellido. Que antes de entrar a tropa para a igreja, viu e presenceou, que alguns soldados carregaram armas. Que elle depoente se retirou n'este momento para sua casa a fim de almoçar, e quando regressou á igreja, seriam dez horas da manhã, soube que a tropa se conservava dentro da igreja formada em duas alas, e logo lhe disseram, que foram expulsos de ao pé da uma os eleitores dr. Hortensio, Thiago e Frias, os quaes entraram primeiro que a tropa, por isso que tinham acompanhado a elle juiz e mais empregados de justiça por occasião do exame.

Que proseguindo até á igreja e approximando-se da porta lateral já dita, viu com effeito, que a tropa estava formada em duas alas quasi até á mesma porta lateral, igualmente viu que em derredor da igreja andavam continuamente patrulhas de cavallaria.

Que estas violencias, no entender d'elle depoente e do publico, tinham por fim evitar, como se evitou pela força, que os eleitores da opposição podessem fiscalisar a leitura das listas.

Declarou finalmente que o presidente da assembléa é irmão do candidato chamado governamental, o dr. Manuel Eduardo da Motta Veiga, e o administrador do concelho, Casal, é cunhado do mesmo. E mais não disse, sendo-lhe lido o seu depoimento o achou conforme e o ratificou.

De tudo para constar mandou elle juiz lavrar este auto, que vae assignar com a testemunha, depois de lhes ser lido

Página 91

91

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

por mim, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi. — Eduardo José Coelho — Francisco de Almeida Mello — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conclusão. - Conclusos em 10 de novembro de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Despacho. — Para a inquirição da testemunha substituido o dia 23 do corrente. Para a inquirição da testemunha na casa da sua residencia designo o dia 22 do corrente. Data supra. Eduardo José Coelho.

Data. — Recebidos no dia supra. Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Termo de entrega. — Em 21 de novembro de 1878 entreguei ao official Pinho o mandado para intimação de uma testemunha. Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Termo de juncção. — Juntei o auto em frente no dia 22 de novembro do 1878. Eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Continuação do corpo de delicto. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 22 dias do mez de novembro, n'este logar de Santa Marinha, e moradas do Francisco Cabral Tavares de Carvalho, onde veiu o dr. Eduardo José Coelho juiz de direito n'esta comarca, commigo escrivão de seu cargo e com o official de diligencias Aleixo Rebello de Pinho, para, em virtude da petição que antecede, se inquerir a testemunha ao diante mencionada, por se achar doente e impossibilitada de saír de casa, a qual elle juiz inquiriu pela fórma seguinte: Testemunha

Francisco Cabral Tavares de Carvalho, solteiro, proprietario, de sessenta e tres annos, morador n'este logar, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes não disse nada.

E sendo interrogado á materia da petição de fl. 2, que elle juiz lhe leu e explicou, disse:

Que em noite do dia 14 do mez de outubro ultimo, seriam dez horas, pouco mais ou menos, estando elle depoente junto da igreja matriz de villa de Ceia, ouviu o estrondo de dois tiros dados para o lado da rua do Assis, contigua ao adro da igreja, o que produziu algum alvoroço, e passado algum tempo, appareceu o administrador do concelho, Elisiario Vaz Preto Casal, no adro da igreja, o qual deu ordem ao sargento, que então commandava a força, para que mandasse dispersar toda a gente do adro e derredor da igreja, e que o dito sargento fez, e em virtude d'esta ordem toda a gente saíu, apesar de alguns eleitores dizerem, que queriam ali estar para guardarem a uma, reclamação que não foi attendida.

Que desde esta epocha e durante toda a noite ficou a uma ou antes a igreja só guardada pela tropa.

Que este facto causou suspeitas á gente da opposição, e por isso alguns cavalheiros, e entre estes o dr. Francisco Ribeiro Pinto de Moraes, foram n'aquella noite procurar o administrador do concelho pedindo-lhe providencias, mas ignora a resposta que elles alcançaram; mas entende que foi negativa porque nenhum eleitor se deixou approximar da igreja, e porque no dia 15 de manhã cedo alguns eleitores da opposição foram requerer a elle juiz um exame directo na urna antes de começar o escrutinio, e com receio de que a mesma tivesse sido viciada durante a noite.

Que elle depoente viu proceder a exame, isto é, viu entrar a elle juiz e mais empregados judiciaes para dentro da igreja, a fim de se proceder ao dito exame, e recorda-se que elle juiz, ao saír da igreja, dissera para os eleitores, que estavam no adro, em voz alta, que a uma estava intacta.

Que depois que saíu, elle juiz, viu e presenceou, que o administrador do concelho, Elisiario Vaz Preto Casal, chegára á porta lateral da mesma e dera ordens á tropa, que já ali estava formada, para entrar na igreja, ordem que foi obedecida, e que, só depois de a tropa estar introduzida na igreja, é que se permittiu a entrada aos eleitores, sendo revistados á proporção que entravam, um por um, os eleitores da opposição, que á autoridade administrativa se tornavam suspeitos, sem que a alguns d'elles fosse encontrada arma ou instrumento offensivo ou defensivo.

Entrado que foi elle depoente na igreja, viu, que a tropa estava formada em duas alas, e estendendo-se as mesmas alas, em força de vinte soldados cada uma, pouco mais ou menos, para o lado da porta lateral, e chegavam quasi ao guarda vento da igreja.

Que os eleitores, dr. Antonio Hortensio, Frias, Thiago e dr. Agostinho, segundo lhe parece, estavam junto da uma, dois de cada lado, por terem entrado, no entender d'elle depoente, por occasião do exame judicial, e antes de ser introduzida na igreja a tropa, como já disse.

Que entre estes eleitores e o presidente da mesa, dr. Amandio, o administrador do concelho, dr. Casal, havia grande altercação, dizendo estes para os eleitores, que se retirassem de junto da uma e para alem das alas da tropa, porque de outra maneira eram presos, e o eleitor dr. Hortensio declarou, que se considerava preso, mas que o deixassem estar ali até ao fim do acto eleitoral.

Que n'esta occasião o presidente da mesa disse, em voz alta, para o administrador do concelho, que retirasse d'ali aquelle homem para o fundo das alas da tropa ou para a cadeia, e o já dito administrador, acto continuo, o expulsou aos empurrões para fóra das alas da tropa, e n'esta occasião o eleitor Frias se dirigiu ao capitão da força, pedindo-lhe providencias, e presenceou elle depoente, que o dito capitão se dirigiu para a mesa, e, sem ouvir o que este disse ao presidente, é certo que este em voz alta, e com modo desabrido, disse para o capitão, que ali não mandava nada e que tinha de obedecer ás suas ordens.

Que o dito capitão voltou para o seu logar, ouvindo que dissera para o eleitor Frias, e do modo que os outros podiam ouvir, que elle lhes não podia valer e que só tinha de obedecer.

Declarou que, pelo ver e presencear sabe, declararem o queixoso e outros eleitores, que protestavam contra esta violencia, ao que o presidente da mesa, e administrador do concelho, dr. Casal, responderam, que ali senão admittiam protestos de qualidade alguma, e por isso se retiraram e foram fazer seu protesto perante um tabellião.

Que, pelo ver e presencear sabe, que a nenhum eleitor era permittido transpor as alas da tropa, que entre os espectadores e a uma mediavam, pouco mais ou menos, de 7 a 8 metros, e de onde era impossivel fiscalisar a verdade das operações eleitoraes.

Que elle depoente, em vista d'estes factos, calculou logo, que a eleição ía ser roubada, e tanto mais que elle depoente viu o já mencionado presidente, antes de começar o escrutinio, metter a mão na urna e de lá tirar uma mão cheia de listas, e, de um modo desesperado, rasgal-as sem as ler nem dar a ler aos escrutinadores.

Que elle depoente se retirou da igreja depois de ver praticar estas violencias, e por isso ignora o que lá se passou posteriormente, mas é um facto publico e que ninguem póde pôr em duvida, ter a tropa permanecido dentro da igreja formada, como fica dito, até que o escrutinio terminou e as listas foram queimadas, e é tambem certo, que em derredor da igreja andou constantemente durante o acto eleitoral uma patrulha de cavallaria. Declarou finalmente, que já no dia 14 á noite era publico e constante, que o partido da auctoridade tinha perdido a eleição, pois que as assembléas ruraes haviam dado ao candidato Abranches uma maioria de quasi 300 votos, que não podia ser supplantada pela maioria da assembléa de Ceia, e é isso que explica as violencias praticadas, que elle depoente já relatou. E mais não disse, e sendo-lho lido o seu depoimento o achou conforme e o ratificou, o vae assignar e rubricar com elle juiz e commigo, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi e assigno. — Eduardo

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 92

92

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

José Coelho — Francisco Cabral Tavares de Carvalho — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Termo de juncção. — Juntei o mandado em frente no dia 24 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Mandado. — O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia. Mando seja intimada a testemunha infra indicada para comparecer perante mim, nas casas da minha residencia, no dia 24 do corrente, por dez horas da manhã, a fim de depor sobre o que lhe for perguntado, sob pena da lei faltando.

Cumpra-se. — Ceia, 19 de novembro de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso do Figueiredo, escrivão que o escrevi — Coelho — Testemunha, Francisco Gomes, casado, proprietario, da quinta do Sarrodello.

Certidão. — Para todo o conteudo no mandado retrò intimei em sua propria pessoa a testemunha Francisco Gomes, cujo mandado lhe li e ficou sciente do dia, hora e local em que deve comparecer, e assigna commigo, cuja identidade reconheço.

Quinta do Sarrodello, 24 de novembro de 1878. — Francisco Gomes — O official de diligencias, Aleixo Rebello de Pinho.

Continuação do auto de corpo de delicto. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos 24 dias do mez de novembro, n'esta villa de Ceia, e moradas do dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito n'esta comarca, onde eu escrivão do seu cargo vim; ahi elle juiz procedeu ao inquerito da testemunha substituida na petição que antecede, em continuação do corpo de delicto e sobre a materia da petição de fl. 2, á qual testemunha elle juiz inquiriu, tomando-lhe as declarações juradas pela fórma que ao deante se segue:

Francisco Gomes, casado, proprietario, morador na quinta de Sarrodello, freguezia d'esta villa, de quarenta e cinco annos, jurou aos Santos Evangelhos dizer a verdade e aos costumes disse nada. E sendo interrogado á materia da petição de fl. 2, que elle juiz lhe leu e explicou, disse:

Que, entrando na igreja matriz d'esta villa no dia 15 de outubro proximo findo, depois da tropa ter entrado dentro da mesma igreja, viu que esta estava formada em duas alas e a uma ao cimo dellas.

Que viu entre o administrador do concelho presidente da mesa, dr. Hortensio e outros uma altercação, mas não pôde dizer os termos em que ella consistiu, sendo certo que tanto o dr. Hortensio, Agostinho e outros saíram n'esse acto da igreja, ouvindo dizer que vinham protestar.

Que elle depoente viu, que a tropa se conservou dentro da igreja na fórma já dita até o fim da eleição, e que o dr. Amandio, á proporção que tirava as listas, as entregava aos escrutinadores.

Que elle depoente durante todo o acto eleitoral não passou do guarda-vento da igreja, e que d'este ponto até onde estava o presidente da mesa não distam menos de 18 metros. E mais não disse, e sendo lhe lido o seu depoimento o achou conforme e o ratificou: De tudo para constar mandou elle juiz lavrar este auto, que assigna com a testemunha e commigo Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi e assigno. — Eduardo José Coelho — Francisco Gomes — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conclusão. — Conclusos em 24 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Despacho. — Ao ministerio publico. Data supra. — Coelho. Termo de data. — Recebidos com o despacho retrò no mesmo dia da sua data. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi.

Termo de vista. — Vão com vista ao meritissimo dr. delegado do procurador regio, em 25 de novembro de 1878. E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Promoção. — Pelos crimes constantes d'estes autos, em 30 de outubro ultimo, offereci querella contra pessoas certas e incertas, cujo summario deve correr seus termos em processo pendente no cartorio do sr. escrivão, que este processe, para o bom esclarecimento da verdade e da justiça, pois, e para servir tambem de base ao respectivo processo e despacho de pronuncia, promovo, que, com urgencia, este documento se junte aquelle processo crime ordinario. Emquanto á ultima parte do requerimento de folhas, peço o cumprimento da lei e a costumada justiça. Ceia, 25 de novembro de 1878. — O delegado do procurador regio, Toscano.

Termo de data. — Recebidos com a resposta retrò, no mesmo dia da sua, data. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Termo de conclusão. — Conclusos em 25 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi.

Despacho. — Passe a certidão requerida, e depois junte-se ao processo a que allude o ministerio publico. Data supra. — Coelho.

Termo de data. — Recebido no dia supra. Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Certidão. Intimei, do que dou fé n'este villa, em sua pessoa e morada, ao ex.mo dr. Fernando Henrique da Costa Loureiro Toscano, delegado do procurador regio n'esta comarca, que reconheço, o despacho retrò, que elle leu e ficou sciente e vae assignar. Ceia, 26 de novembro de 1878, de manhã. — Toscano — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Certidão. — Intimei, do que dou fé n'esta villa, em suas pessoas, que reconheço, os queixosos, os ex.mos drs. José de Abranches Homem da Costa Brandão e Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca o despacho retrò, que elles leram, ficaram d'elle scientes e assignam. Ceia, 26 de novembro de 1878, de tarde. José Abranches Homem da Costa Brandão Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca — O escrivão, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Termo de remessa á conta. — Vão ao contador do juizo, em 26 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Conta. — Ex.mo sr. juiz Eduardo - Distribuição, fl. 4 v. 50 réis; presidencia, fl. 23, 800 réis; dito, fl. 61, 800 réis; dito, fl. 68, 800 réis; caminho, 1$600 réis; residencia, fl. 9, 800 réis; dito, fl. 74, 800 réis; somma, 5$650 réis; recebeu por conta, a fl. 9, 850 réis; a fl. 72, 1$600 réis; somma, 2$450 réis; haverá 3$200 réis. - Escrivão, Figueiredo.

Figueiredo: autuação, 150 réis; termos ordinarios, 29, 1$450 réis; mandado de fl. 27, 100 réis; intimação, fl. 25 v. 500 réis; pagou a fl. 7, 50 réis; auto de fl. 9, 200 réis; pagou, a fl. 19, 850 réis; mais ali, 100 réis; rasa do auto de fl. 9, 1$610 réis; mandado e assignatura que pagou 150 réis; pagou a fl. 22, 3$300 réis; auto de fl. 23, 200 réis; rasa, 2$345 réis; intimações, fl. 62, 1$000 réis; mandado, fl. 63, e assignatura, 150 réis; auto de fl. 64, 200 réis; rasa, 430 réis; auto de fl. 68, 200 réis; rasa de fl. ditas, 660 réis; caminho dentro, 600 réis; dito fóra, 600 réis; pago a fl. 72, 1$600 réis; mandado e assignatura, fl. 73, 150 réis; auto de fl. 74, 200 réis; rasa, 195 réis; intimações, fl. 176 v. 3, 1$500 réis; sellos, 53, 1$590 réis; papel, 265 réis. Somma 2$545 réis. Official Delfino, assistencia de fl. 23, 100 réis; official Pinho, intimação de fl. 63 v. 100 réis; assistencia, de fl. 68, 534 réis; caminho, 500 réis; intimação de fl. 73 v. uma, 100 réis; caminho, 250 réis. Somma, 1$184 réis. Ex.mo sr. juiz Mourão, da Guarda, distribuição de fl. 41 v. 50 réis; presidencia de fl. 49, 800 réis. Somma, 850 réis. Escrivão Carvalho, da Guarda, autuação de fl. 38, 150 réis; intimação de fl. 48, 500 réis; auto de fl. 49, 200 réis; rasa, 1$440 réis; termos ordinarios, dois, 100 réis; termo de fl. 58, 160 réis; sellos, onze, 330 réis; papel, 50 réis. Somma, 2$935 réis. Sellos a pagar: o de fl. 45, 30 réis; dos requerentes, sellos de 60 réis e papel, 7, 450 réis; conta de fl. 44 v. 1$545 réis. Somma, 1$995 réis; Contador, por contar os emolumentos, 90 réis; salarios do

Página 93

93

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

escrivão, 595 réis; ditos do official, 60 réis; verbas de custas, 30 réis. Somma, 775 réis. Total, 31$914 réis. — O contador, Luiz Augusto de Oliveira Santos.

Termo de data. — Recebidos no dia 26 de novembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão que o escrevi.

Segue-se um provimento do meritissimo sr. dr. juiz de direito sobre a conta que acaba de ser transcripta.

Não me pertence senão 800 réis, porque não ha senão um corpo de delicto. Como porém foi requerida a inquerição da testemunha Cabral na sua residencia, e o caso é omisso na tabella crime, ha de, quanto ao caminho, seguir-se a tabella em vigor por applicação do artigo 2.°, § unico da carta de lei de 12 de abril de 1877. Não tem applicação o artigo 24.º, n.º 5, da tabella de 1864; mas o n.º 19 do mesmo artigo. Reformo pois n'este sentido a conta. — Coelho.

Termo de remessa ao contador. Vão de novo ao contador em virtude do provimento retrò em 3 de dezembro de 1878. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Conta. — Ex.mo sr. juiz Eduardo: Caminho, por ida e volta, 10 kilometros, 4$000 réis. Escrivão Figueiredo: autuação, 150 réis; termos ordinarios, 29, 1$450 réis; mandado, fl. 7, 100 réis; intimação de fl. 5 v, 500 réis; Pagou a fl. 7, 50 réis; auto, fl. 9, 200 réis; rasa, 1$610 réis; pagou a fl. 19, 850 réis; mais ali, 100 réis; mandado e assignatura de folhas, 150 réis; pagou a fl. 22, 3$500 réis; rasa, fl. 23, 2$345 réis; intimações de fl. 62, 1$000 réis; mandado e assignatura de fl. 63, 150 réis; rasa de fl. 64, 430 réis; dita de fl. 68, 660 réis; caminho dentro 600 réis; dito fóra, 5 kilometros, 600 réis; mandado e assignatura de fl. 73, 150 réis; rasa de fl. 74, 195 réis; intimações de fl. 76 v. 31$500 réis; sellos, 53, 1$590 réis; papel 265 réis. Somma 18$145 réis. Official Pinho: intimação de fl. 63 v. 1, 100 réis; caminho 500 réis; intimação, fl. 73 v. 100 réis; caminho 250 réis. Somma 950 réis. Dos requerentes: sellos de 60 réis e papel, 7, 450 réis; conta de fl. 44 v. 1$545 réis. Somma 1$995 réis. Contador: por contar os emolumentos e salarios do escrivão, 960 réis; ditos do official, 80 réis; verbas de custas, 20 réis; somma 1$060 réis. Total 26$150 réis. O contador Luiz Augusto de Oliveira Santos.

Termo de data. Recebidos com a conta retrò em 4 de dezembro de 1878. Eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo o escrevi.

Não se contém mais no dito processo, que bem e fielmente para aqui transcrevi por certidão em virtude do despacho retrò transcripto, a qual conferi o concertei com o original, ao qual me reporto em meu poder e cartorio. Passado n'esta villa de Ceia aos 10 dias do mez de dezembro do anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878. E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão que a escrevi, conferi, rubriquei e vou assignar. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conferi e concertei. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

E commigo o escrivão interino, José Arthur Carlos das Neves.

Mandado de captura

O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia, etc..

Mando a qualquer official de justiça competente, a quem este for apresentado, que, em seu cumprimento, prenda, para ser conduzido ás cadeias d'esta comarca, a Antonio de Almeida Mello e Sousa, solteiro, d'esta villa de Ceia, por se achar pronunciado n'este juizo por despacho do 2 de corrente mez, pelo crime de falsificação da verdade eleitoral, e pelo crime de attentado contra o exercicio do direito eleitoral por meio de demonstrações ameaçadoras e até pelo meio da força armada, vedando-se o livre accesso á uma, praticados no dia 15 de outubro proximo findo na assembléa d'esta villa, quando se procedia á eleição de deputados por este circulo, em que não é admissivel fiança, entregando-se-lhe no acto da prisão o duplicado d'este mandado, observando-se n'esta diligencia as formalidades legaes, sob responsabilidade do empregado d'ella encarregado. Cumpra-se.

Ceia, 31 de dezembro de 1878. E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi. — E. J. Coelho.

Mandado de captura

O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca da Ceia, etc..

Mando a qualquer official de justiça competente, a quem este for apresentado, que, em seu cumprimento, prenda, para ser conduzido ás cadeias d'esta comarca, a José Marrão, casado, d'esta villa de Ceia, por se achar pronunciado n'este juizo por despacho de 2 do corrente mez, pelo crime de falsificação da verdade eleitoral, e pelo crime do attentado contra o exercicio do direito eleitoral por meio de demonstrações ameaçadoras, e até pelo meio da força armada, vedando-se o livre accesso á uma, praticados no dia 15 de outubro proximo findo na assembléa d'esta villa, quando se procedia á eleição de deputados por este circulo, em que não é admissivel fiança, entregando-se-lhe no acto da prisão o duplicado d'este mandado, e observando-se n'esta diligencia as formalidades legaes, sob responsabilidade do official d’ella encarregado. Cumpra-se.

Ceia, 31 de dezembro de 1878. — E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi. — E. J. Coelho.

Mandado de captura

O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia, etc..

Mando a qualquer official de justiça competente, a quem este for apresentado, que, em seu cumprimento, prenda, para ser conduzido ás cadeias d'esta comarca, a Antonio de Brito Freire e Vasconcellos, casado, d'esta villa de Ceia, por se achar pronunciada n'este juizo por despacho de 2 do corrente mez, pelo crime de falsificação do escrutinio, ou falsificação da verdade eleitoral, e pelo crime de attentado contra o exercicio do direito eleitoral por meio de demonstrações ameaçadoras, e até pelo meio da força armada, vedando-se o livre accesso á uma, praticados no dia 15 de outubro proximo findo na assembléa d'esta villa, quando se procedia á eleição de deputados por este circulo, em que não é admissivel fiança, entregando-se-lhe no acto da prisão o duplicado d'este mandado, e observando-se n'esta diligencia as formalidades legaes, sob a responsabilidade do official d'ella encarregado. Cumpra-se.

Ceia, 31 de dezembro do 1878. — E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi. — E. J. Coelho.

Mandado de captura

O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia, etc..

Mando a qualquer official de justiça competente, a quem este for apresentado, que, em seu cumprimento, prenda, para ser conduzido ás cadeias d'esta comarca, a Fernando José da Silva, casado, d'esta villa de Ceia, por se achar pronunciado n'este juizo por despacho de 2 do corrente mez, pelo crime de falsificação do escrutinio ou falsificação da verdade eleitoral, e pelo crime de attentado contra o exercicio do direito eleitoral por meio de demonstrações ameaçadoras, e até por meio de forca armada, vedando-se o livre accesso á uma, praticados no dia 15 de outubro proximo findo na assembléa d'esta villa, quando se procedia á eleição de deputados por este circulo, em que não é admissivel fiança, entregando-se-lhe no acto do prisão o duplicado d'esse mandado, e observando-se n'esta diligen-

Sessão de 13 de janeiro de 1879

Página 94

94

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

cia as formalidades legaes, sob a responsabilidade do official d'ella encarregado. Cumpra-se.

Ceia, 31 de dezembro de 1878. E eu Augusto Cesar Cardozo de Figueiredo, escrivão, que o escrevi. = E. J. Coelho.

Mandado de captura

O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia, etc..

Mando a qualquer official de justiça competente, a quem este for apresentado, que, em seu cumprimento, prenda, para ser conduzido ás cadeias d'esta comarca, o bacharel Elisiario Vaz Preto Casal, casado, administrador d'este concelho de Ceia, por se achar pronunciado n'este juizo por despacho de 2 do corrente mez, pelo crime de falsificação do escrutinio, ou falsificação de verdade eleitoral, e pelo crime de attentado contra o exercicio do direito eleitoral, por meio de demonstrações ameaçadoras, e até pelo meio da força armada, vedando-se o livre accesso á uma, praticados no dia 15 de outubro proximo findo, na assembléa d'esta villa, quando se procedia á eleição de deputados por este circulo, em que não é admissivel fiança, entregando-se-lhe no acto da prisão o duplicado d'este mandado, e observando-se n'esta diligencia as formalidades legaes. Cumpra-se.

Ceia, 31 de dezembro de 1878. E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi. = E. J. Coelho.

Mandado de captura

O dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito na comarca de Ceia, etc..

Mando a qualquer official do justiça competente, a quem este for apresentado, que, em seu cumprimento, prenda, para ser conduzido ás cadeias d'esta villa, o bacharel Amandio Eduardo da Motta Veiga, solteiro, d'esta villa, por se achar pronunciado n'este juizo, por despacho de 2 do corrente mez, pelo crime de falsificação do escrutinio, ou falsificação de verdade eleitoral, e pelo crime de attentado contra o exercicio do direito eleitoral por meio de demonstrações ameaçadoras, e até pelo meio da força armada, vedando o livre accesso á uma, praticados no dia 15 de outubro proximo findo, na assembléa d'esta villa, quando se procedia á eleição do deputados por este circulo, em que não é admissivel fiança, entregando-se-lhe no acto da prisão o duplicado d'este mandado, e observando-se n'esta diligencia as formalidades legaes, sob responsabilidade do official d'ella encarregado. Cumpra-se.

Ceia, 31 de dezembro de 1878. E eu, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi. = E. J. Coelho.

Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão do terceiro officio ante o juizo de direito d'esta comarca de Ceia, etc..

Certifico que ao cartorio a meu cargo foi distribuida uma petição em que se requereu exame á uma da assembléa eleitoral d'esta villa, no dia 15 do corrente mez, em cumprimento da qual se lavrou o auto seguinte de declarações para exame:

Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1878, aos quinze dias do mez de outubro, n'esta villa de Ceia e igreja matriz da freguezia de Ceia, onde eu, escrivão de seu cargo, vim com o dr. Eduardo José Coelho, juiz de direito n'esta comarca, e com o dr. Fernando Henriques da Costa Loureiro Toscano, delegado do procurador regio n'esta mesma comarca, a fim de se proceder a exame directo sobre a uma, na conformidade do requerimento de fl. 2, e elle juiz mandou intimar o dr. Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, Ayres de Albuquerque do Amaral Cardoso, Luiz Ribeiro Bacellar, a fim de comparecerem na sua presença para apresentarem os sinetes, de que são depositarios, o verificar se na urna externamente e nos locaes onde estão os respectivos sinetes, se observára vestigios ou signaes de viciação ou alteração digna de notar-se.

E presentes os mesmos, depois de por mim escrivão intimados, elle juiz lhes deferiu o juramento aos Santos Evangelhos, encarregando-os debaixo do mesmo de verificarem por meio de inspecção occular, e servindo-se dos alludidos sinetes, se ha ou não signaes de viciação.

Sendo por elles recebido o dito juramento assim o prometteram.

E depois de todos e individualmente procederem ao exame ordenado pelo intimado e requerente Antonio Hortensio Ferreira da Fonseca, foi declarado, que, confrontando a marca feita com o sinete existente em poder d'elle declarante, não tinha havido rutura de sêllo e era igual á do mesmo sinete, e que por isso, no entender d'elle declarante, não havia viciação no cofre aonde se acha fechada a uma que contém os votos d'esta assembléa.

E que nada mais tinha a declarar em relação a este acto. Pelo intimado Ayres de Albuquerque do Amaral Cardoso foi declarado que, confrontando o seu sinete com a marca feita no cofre, que contém a uma, não achou alteração nem viciação alguma, e o reputa nas mesmas circumstancias em que se achava na mesma occasião em que se fez o dito signal. E que nada mais tinha a declarar.

Sendo chamado o intimado Luiz Ribeiro Bacellar, declarou, que achou exactas as marcas que no lacre fez com o seu sinete no cofre, sem que observasse signaes alguns de viciação. Em vista do que, elle juiz não proseguiu nas posteriores diligencias, visto que as declarações precedentes são plenas e concordantes em mostrar que não ha viciação nem suspeita d'ella.

E para constar se fez este auto, que vae ser assignado pelos declarantes, dr. delegado, sendo testemunhas a todo o acto presentes Antonio Ribeiro Sedrim, solteiro, escrivão do juiz de paz, e Antonio Rodrigues Prata, casado, proprietario, ambos d'esta villa, e por elle juiz, depois de lhes ser lido por mim, Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi e assigno. — Coelho — Fernando Henriques da Costa Loureiro Toscano — Antonio Hortencio Ferreira da Fonseca Ayres de Albuquerque do Amaral Cardoso — Luiz Ribeiro Bacellar — Antonio Ribeiro Sedrim — Antonio Rodrigues Prata — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Não se contém mais no dito auto, que bem e fielmente para aqui fiz transcrever por certidão em cumprimento de um despacho proferido n'uma petição junta ao mesmo auto, com o qual este conferi, e a elle me reporto em meu poder e cartorio.

Ceia, 19 de outubro do anno de 1878. E eu Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo, escrivão, que o escrevi e assigno. — Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

Conferi e concertei. = Augusto Cesar Cardoso de Figueiredo.

E commigo. — O escrivão substituto, Francisco Eduardo Leite.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×