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N.° 8

SESSÃO DE 24 DE JANEIRO DE 1898

Presidencia do exmo. Sr. Eduardo José Coelho

Secretarios - os exmos. srs.

Joaquim Paes de Abranches
Frederico Alexandrino Garcia Ramires

SUMMARIO

Approvada a acta, deu-se conta do cinco officios recebidos na mesa, e teve segunda leitura, sendo admittido, um projecto de lei do sr. Reymão. -Interrogações do sr. Mattoso Côrte Real, annunciadas no seu avião previo ao sr. ministro das obras publicos, o resposta d'este. - Largas considerações do sr. Ribeiro Coelho, em referencia no ensino publico no nosso paiz, no sentido de se dever dar preferencia ao desenvolvimento da cultura moral de todas os classes sociaes. É o assumpto do seu aviso previo ao sr. presidente do conselho, que não está presente. Resposta do sr. ministro da justiça. - Observados do sr. presidente para justificar a concessão da palavra n'este momento ao sr. Mello o Sousa, que em seguida usa d'ella, respondendo a algumas das observações feitas na sessão anterior pelo sr. ministro da fezenda. Resposta d'esta.- Novas explicações trocados entre os mesmos oradores, especialmente sobre o lucro presumido do banco do Portugal por cada titulo do emprestimo para as classes inactivas. - O sr. Moraes Sarmento, accusando um procedimento abusivo por parte do governador civil de Villa Real, com respeito á eleição da commissão do recenseamento eleitoral, pede immediatas providencias ao sr. ministro do reino. Declaração d'este, que o sr. Moraes Sarmento agradece.

Entra-se na primeira parto da ordem do dia, continuando a discussão do projecto de lei n.° 57 (reforma de alguns serviços do tribunal de contos). Approva-se sem discussão o artigo 2.º Approva-se tambem o artigo 8.º, depois de uma ligeira observação do sr. Luciano Monteiro. São em seguida approvados sem discussão o restantes artigos até ao 26.º Usa da palavra sobre o artigo 27.º o sr. Elvina de Brito, que apresenta e justifica uma proposta. Admittida, e enviada á commissão com outra proposta apresentada na sessão anterior pelo sr. Ramires, approvou-se o artigo 97.°, o seguidamente são approvados sem discussão os restantes artigos do projecto. - Explicações do sr. presidente, que em seguida encerra a sessão.

Primeira chamada - Ás duas horas da tarde. Presentes, 8 srs. deputados.

Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.

Presentes á segunda chamada, 63 srs. deputados, São os seguintes: - Abel da Silva, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alfredo Carlos Le-Cocq, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Teixeira de Sousa, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Carlos Augusto Ferreira, Carlos José de Oliveira, Conde do Alto Mearim, Conde da Serra de Tourega, Eduardo José Coelho, Elvino José de Sousa e Brito, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco do Castro Mottoso da Silva Côrte Real, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Furtado de Mello, Francisco José Machado, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Baptista Ribeiro Coelho, João Catanho de Menezes, João Joaquim Izidro dos Reis, João de Mello Pereira Sampaio, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Ornellas de Matos, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Joaquim Simões Ferreira, José Adolpho de Mello e Sousa, José Augusto Correia de Barros, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Bento Ferreira de Almeida, José da Cruz Caldeira, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Gonçalves Pereira dos Santos, José Maria de Oliveira Matos, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cavala, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz José Dias, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Sortorio do Monte Pereira e Visconde de Melicio.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Bernardo Homem Machado, Conde de Burnay, Conde de Silves, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Alvos Pimenta de Avellar Machado, José Capello Franco Frazão, José Dias Ferreira, José Frederico
Laranjo, José Gregorio do Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Malheiro Reymão, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Affonso de Espregueira e Manuel Antonio Moreira Junior.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Cesar de Oliveira, Alvaro de Castellães, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Simões dos Reis, Antonio Tavares Festas, Arthur Alberto de Campos Henriques, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paes Vieira, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Silveira Vianna, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Abel da Silva Fonseca, João Antonio de Sepulveda, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Lobo de Santiago Gouveia, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Barbosa de Magalhães, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Fischer Berquó Poças Falcão, Manuel Pinto de Almeida, Marianno Cyrillo de Carvalho e Visconde da Ribeira Brava.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio do reino, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Teixeira de Sousa, o processo

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do syndicancia feita á camara municipal do concelho de Chaves.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Teixeira do Sousa, copia do parecer emittido pela commissão, nomeada por decreto de 24 de maio ultimo, ácerca da circumscripção administrativa do districto de Villa Real, bem como as representações sobre o mesmo assumpto, existentes actualmente n'este ministerio.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo os esclarecimentos pedidos pelo sr. deputado Marianno de Carvalho, em sessão de 11 do corrente mez.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, acompanhando copia do officio dirigido com data de 8 do actual mez, a este ministerio pelo presidente da commissão da revisão das pautas ácerca de uma representação da associação dos fabricantes de pão em Lisboa, não só enviando copia da mesma representação por ter sido remettida ao ministerio das obras publicas.

Para a secretaria.

Do ministerio da guerra, remettendo os documentos pedidos pelo sr. deputado Francisco José Machado, em sessão de 11 do corrente mez.

Para a secretaria.

Projecto de lei

Senhores. - Desnecessario é explanar longamente os motivos justificativos do projecto de lei que tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação, porque são precisamente as mesmas que determinaram a promulgação da carta de lei de 20 de agosto de 1897. Reconhecida por aquella lei a insufficiencia do praso assignado para que dentro d'elle as commissões de recenseamento militar organisassem as listas que deviam ser presentes aos commandantes dos districtos de recrutamento e reserva, para completa liquidação dos contingentes em divida, alongou-se o praso perfixado na carta de lei de 13 de maio de 1896, até 31 de dezembro do anno findo. Esta prorogação foi ainda assim insufficiente.

No resto do paiz sobretudo, onde mais sensivel era o atrazo d'este serviço e mais importante a cifra dos contingentes em divida, não foi possivel concluir a tempo o chamamento de recrutas para preenchimento d'aquelles contingentes. Ainda agora em alguns districtos e em muitos concelhos estão sendo affixadas pelos commandantes dos districtos de recrutamento e reserva as listas do chamamento dos obrigados ao serviço militar, e assim muitos dos interessados serão privados dos beneficios e vantagens que aquella lei concede por facto que lhes não é imputavel.

Muito longe de ser prejudicial para o estado, é antes singularmente vantajosa a prorogação do praso para aquelle beneficio, pois que não podendo ser já grandemente aproveitavel o serviço pessoal dos que eram chamados a prestal-o, melhor será o substituil-o com vantagem do thesouro por uma remissão modica e a que muitos poderão sujeitar-se sem gravame de maior. Equiparam se alem d'isso em vantagens todos aquelles que se encontram em igualdade de condições e que não foi por acto proprio que se collocaram em circumstancias de não lhes ser aproveitavel aquelle beneficio. Em face, pois, do que perfunctoriamente fica exposto, tenho a honra de submetter á vossa deliberação o seguinte projecto do lei:

Artigo 1.° O praso fixado por carta de lei de 28 de agosto de 1897 para a remissão do serviço activo do exercito dos recrutas dos annos anteriores a 1896, é prorogado até 31 de dezembro do corrente anno, tendo o producto das remissões o destino que n'aquella carta de lei lhe é designado.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 15 de janeiro de 1898. = O deputado, José Malheira Reymão.

Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões reunidas de recrutamento e guerra.

O sr. Mattoso Côrte Real: - Sr. presidente, mandando para a mesa o meu aviso previo, tive em mira o desejo de interpellar o sr. ministro das obras publicas sobre os motivos da suspensão do algumas obras hydraulicas nos districtos de Coimbra e Aveiro, no principio da semana passada.

Como não me coubesse a palavra n'uma das sessões d'essa semana, dirigi-me ao sr. ministro; das obras publicas, particularmente, pedindo-lhe providencias.

S. exa., com toda a promptidão, deu as necessarias providencias, e uma d'ellas foi já annunciada nos jornaes de Coimbra - a continuação do caes d'aquella cidade.

Com respeito a Aveiro, o sr. ministro, das obras publicas providenciou igualmente; e, por isso, apresso-me a agradecer a s. exa. em nome dos meus constituintes e meus patricios.

Continuo, no emtanto, a chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas sobre as obras que não têem ainda seguimento: por exemplo, as da campos do Mondego, que se conservam paralysadas com grave detrimento publico e dos proprietarios de Coimbra: Pedia, portanto, a s. exa., o sr. ministro das obras publicas, que desse as competentes ordens para o proseguimento d'aquellas obras no mais breve espaço do tempo que for possivel e dentro das forças do thesouro.

Como estou com a palavra, não posso deixar do pedir ainda a s. exa. que preste a mais seria attenção a uma representação que deve existir no seu ministerio, de um grande numero de proprietarios dos campos do Mondego, pedindo a restauração da circumscripção hydraulica com séde em Coimbra.

Sabe v. exa. muito bem, que em tempo os governos d'este paiz, considerando de muita importancia as obras d'aquella circumscripção, crearam ali uma repartição denominada «Direcção geral das obras publicas do districto do Coimbra», prestando esta direcção importantes serviços áquella localidade, sendo dirigida por um dos mais distinctos engenheiros que nós temos.

Mas, apesar da reconhecida importancia d'aquella direcção, foi ella supprimida por motivos que não quero, não devo, nem preciso explanar agora á camara; mas sendo essa direcção supprimida em 1887, foi substituida por uma direcção das obras hydraulicas.

Começaram desde logo os effeitos d'esta providencia, mas ainda assim muito mais se sentiram, quando em 1891 foi supprimida esta mesma direcção, transferindo-se a sua séde.

Está reconhecido que é de primeira, necessidade acabar-se com este estado de cousas.

É preciso restabelecer a circumscripção de obras hydraulicas com séde em Coimbra.

Esta providencia parece-me que satisfaria as justas reclamações dos povos d'aquella localidade, e de todas as auctoridades d'aquella terra, que tanto uns como outras só têem dirigido ao ministerio das obras publicas, pedindo providencias promptas e energicas.

Chamo, pois, a attenção do sr. ministro das obras publicas para este assumpto, e estou certo que s. exa., auctorisado como está a reformar alguns; serviços, não deixará de attender a estas justas reclamados.

Tambem agradeço a s. exa. as providencias promptas que deu com relação, ás obras da barra de Aveiro, cujos

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trabalhos estão já em andamento; pedindo, porém, que não sejam só essas obras a que se proceda.

Ha ali outras obras urgentissimas, ás quaes, se se não acudir do prompto, o estado poderá soffrer enormes prejuizos, sendo, pois, necessario que o sr. ministro das obras publicas dê providencias para que ellas continuem.

Aproveito a occasião para lembrar a s. exa. a urgente necessidade que ha em estabelecer a antiga junta de obras da barra d'aquella cidade.

S. exa. sabe certamente que no seu ministerio ha muitas reclamações, e não são recentes, para que se restabeleça aquella junta.

No districto de Aveiro existe um imposto especial destinado a obras da barra.

Esse imposto era administrado por uma junta de obras, a que me estou referindo.

Ha alguns annos, porém, não posso citar quando, foi supprimida essa junta, e o rendimento com applicação especial às obras da barra entrou como rendimento commum a todas as obras.

D'aqui resultou não ter podido o governo dar prompto andamento ás obras mais urgentes.

For isto, estou corto que s. exa. não descurará este assumpto, dando as providencias necessarias para o restabelecimento que solicito.

Dito isto, termino renovando os meus agradecimentos ao sr. ministro das obras publicas.

(S. exa. não reviu.}

O sr. Ministro das Obras Publicas (Augusto José da Cunha): - Responderei em breves palavras ás considerações do illustre deputado e meu amigo, o sr. Mattoso Côrte Real.

Effectivamente foram mandadas suspender por algum tempo as obras hydraulicas na circumscripção a que s. exa. se referia.

O motivo d'essa suspensão foi o mesmo - a verba destinada a obras hydraulicas, que era muito pequena, estava gasta.

Mas já dei ordem para que essas obras continuassem, tanto quanto possivel nas forças da verba destinada a esse fim.

Com respeito á junta da barra de Aveiro, direi a s. exa. que, durante a minha gerencia, só ha pouco tempo recebi uma representação dos povos d'aquella localidade.

Essa representação foi a informar ao director das obras publicas do districto, e hoje mesmo acabo de escrever-lhe, ordenando-lhe que mande quanto antes a informação pedida.

Relativamente á séde da circumscripção hydraulica em Coimbra, concordo com s. exa. em que a arca da circumscripção é muito extensa e o director não póde estar presente em todos os pontos, resultando, da falta de presença do director e da extensão do seu trabalho, serios inconvenientes.

Já pensei, n'uma pequena reforma que estou elaborando a respeito de engenheria, em estabelecer em Coimbra a séde de uma 3.ª circumscripção hydraulica, o que pede fazer-se sem augmento de despesa.

Portanto, parece-me que respondi, com estas breves considerações, as palavras de s. exa., de fórma a dever ficar satisfeito.

(O sr. ministro não reviu.)

O sr. Correia de Barros: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma justificação de faltas.

Vão no fim da sessão.

O sr. Presidente: - O sr. Ribeiro Coelho pediu a palavra para quando o sr. presidente do conselho estivesse presente, caso que se não dá. Não sei, por isso, se o illustre deputado quererá usar da palavra...

O sr. Ribeiro Coelho: - Sim, senhor.

O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.

O sr. Ribeiro Coelho: - Sr. presidente, no aviso previo que tive a honra de mandar para a mesa, exprimia o desejo de ouvir o sr. ministro do reino sobre a necessidade de reformar a instrucção publica e especialmente a instrucção secundaria.

S. exa. não está presente. No emtanto, como as considerações que vou emittir sobre este assumpto, não dizem respeito especialmente á pasta de s. exa., mas a todo o governo, á camara e ao paiz, uso da palavra.

Sr. presidente, o desejo de ouvir s. exa., o sr. ministro do reino, sobre a necessidade da reforma da instrucção deriva da convicção intima, que me domina, de que a actual organisação da instrucção publica está muito longe de se fazer ás legitimas aspirações da nossa epocha.

O assumpto da instrucção publica, que bem melhor se denominaria da educação publica, assume aos meus olhos tal importancia que o reputo merecedor dos mais assiduos carinhosos desvelos dos altos poderes do estado.

Permitta-me por isso a camara que eu desenvolva algumas considerações, embora succintas, no intuito de denunciar o vicio organico, que affecta a nossa instrucção, e de traçar um rapido escorço das consequencias emanadas da errada orientação seguida em tão importante ramo do serviço publico.

Não me proponho esboçar um plano de remodelação da vossa instrucção publica, nem mesmo passar pela fieira da critica as disposições da actual organisação do ensino secundario.

Para tanto ousar seria mister que eu não tivesse a mais pallida noção da profundeza e complexidade do assumpto, ou que a minha palavra humilde estivesse ao serviço da mais deploravel inconsciencia.

O meu scopo n'este momento é simplesmente abordar o problema no seu aspecto geral; pois que para o versar nos seus aspectos particulares, nos seus detalhes, falta-me não só o tempo, mas principalmente a competencia.

Bom sei, sr. presidente, que as attenções do governo, da camara e do paiz estão, com sobejo motivo, concentradas no exame e selecção dos meios mais adequados a remover a depressão economica e financeira, que ha sete annos vem perturbando todas as manifestações da vida nacional.

E bem justificada se me antolha a preferencia dada por todos a tão ponderoso assumpto.

Mas nem por isso as considerações que haja de expender sobre o importantissimo assumpto da educação publica, devem ser apodadas de menos opportunas, e tanto mais que, se não laboro n'uma erro crasso, as crises economicos e financeiras abrolham e bracejam de uma crise mais temerosa e mais nefasta. Mais temerosa, porque sem estimular a attenção publica, vae dilacerando, como um toxico subtilissimo, os tecidos mais profundos do organismo social. Mais nefasta, porque os seus effeitos, menos ostensivos, menos ruidosos que os effeitos das crises economicas e financeiras, são, todavia, mais dissolventes, mais perduraveis e mais irreductiveis.

A crise a que venho alludindo, é a crise dos costumes, a crise dos caracteres, a crise da dignidade privada e publica; é, em synthese, a crise moral.

Se é certo que nos afflige e opprime uma dupla crise economica e financeira, e nos afflige e opprime até ao extremo de ameaçar estrangular-nos; não é menos certo que uma gravissima crise moral se alastra pavorosamente, e nos corroe até á medula, como um cancro veracissimo.

As crises economicas e financeiras são accidentes pathologicos da vida das sociedades; estudos morbidos mais ou menos intensos, mais ou menos duradouros, e até mais ou menos periodicos, segundo alguns distinctos economistas da actualidade. V. exa. e a camara sabem que alguns economistas contemporaneos, como Juglar e Jevons, nos seus estudos sobre as crises commerciaes e financeiras, chegaram a reconhecer que ellas se reproduzem em decenios; regulares.

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Demais, sr. presidente, as nações mais poderosas, como a Inglaterra e a França, têem sido flagelladas por crises bom mais terriveis do que aquella que nos está acabrunhando. E, quem conhece a historia das nossas finanças, sabe que já nos temos visto a braços com crises bem mais desoladoras do que aquella que vamos atravessando.

Não pertenço ao numero dos panglossiatas e indifferentistas que em frente de crises de ordem economica ou financeira, escudados no Deus super omnia, confiam a solução ao laissez faire, laisses passer; mas tambem não pertenço ao numero dos pessimistas que, por um estrabismo sui generis, vêem sempre emergir do seio das crises economicas e financeiras o gadanho da morte enristado contra o peito da patria.

Nem tanto ao mar, nem tanto á terra.

As crises economicas e financeiras devem ser recebidas e atacadas a sangue frio, som precipitações, nem cobardias, com prudencia e energia.

A historia, que eu saiba, não regista facto algum de desapparecimento de nações por motivos economicos ou financeiros; mas, se no registo dos obitos das nações extinctos examinarmos a columna indicadora das causas da morte, encontraremos invariavelmente esta rubrica: decomposição moral.

Na helice da evolução da humanidade é bem facil distinguir as curvas retintas no sangue purulento das nações, que se deixaram apertar e a final estrangular, esphaceladas pela corrupção moral.

Por isso as considerações que houver de emittir sobre a educação publica, não podem ser com justiça capituladas de inopportunas.

Se eu quizesse exhibir exemplos, era-me facil recordar as nações orientaes conquistadas por Alexandre Magno, Bastou um sopro do heroismo grego para sacudir os membros gangrenosos d'essas nações e fazel-as cair a pedaços.

O proprio imperio romano, tão extenso como o mundo então conhecido e que parecia tão solido que poderia desafiar a eternidade; esse colosso, que foi a organisação mais vasta e mais completa de um estado na antiguidade, salitrado de torpezas, caiu nos apupos de uma horda de selvagens.

Eu não quero recordar factos da actualidade; não fallarei dos escandalos do Panamá, dos Artons e Tonlongs, dos kraes das praças de Berlim e Paris, Vienna e Londres, nem dos casos indigenas; mas uma analyse imparcial, fria, encabeçará bem melhor estes factos n'uma crise de ordem moral, do que n'uma crise de ordem economica.

Áquelles que impunham o leme da governação impende o dever culminante de coordenar todas as forças, todos os elementos da vida nacional e polarisal-os com firmeza e com criterio aos altos destinos da collectividade.

É esta, se não me engano, a funcção caracteristica da politica na accepção scientifica e genuina da palavra.

Eu bem sei que o governo tem patenteado que se deixa inspirar n'esta nobre comprehensão dos seus deveres. Em todos os seus actos se entalha o cunho da mais severa moralidade.

É uma lição pratica de moral a que o governo está dando com o seu exemplo, e as lições do exemplo têem o condão dos efficazes incitamentos.

Mas permitta-se-me que eu diga, com o desassombro e rude franqueza, que são o timbre do meu caracter, que no presente momento historico em que Portugal, como as demais nações civilisadas, vasqueka n«um pantano de abjecções de ordem moral, as lições do exemplo ab alto, por mais suggestivas que seja,, não bastam.

É necessario actuar o nosso meio social com outros reagentes mais energicos e efficazes para recaldear os costumes e os caracteres nos moldes da mais estricta moralidade.

Ora a nossa instrucção publica adoece do defeito gravissimo de ter por objectivo simplesmente a intelligencia, olvidando que o homem é um organismo e um nucleo de energias psychicas, que se desdobram em energias estheticas, intellectuaes e moraes.

A organisação do nosso ensino publico esquece que todas estos energias são solidarias em seu funccionamento, e que desenvolver umas á custa da atrophia de outras, é provocar um desequilibrio no homem, é originar abortos. As consequencias são perniciosissimas para os individuos, e, portanto, para a sociedade.

O progresso e a civilisação de um povo deriva directa e immediatamente do desenvolvimento das energias das individualidades que o constituem.

O dynamismo social não é senão a resultante das acções e reacções em que as energias individuaes se desentranham.

Por isso, para que o progresso e a civilisação sejam integras e harmonicas é mister desenvolver simultanea e parallelamento todas as energias humanas.

A nossa instrucção publica visa quasi exclusivamente ao desenvolvimento das energias intellectuaes, sendo assim um systema de educação incompleto, mutilado.

Mas este defeito organico do nosso ensino não é da responsabilidade de nenhum governo, é da responsabilidade da epocha.

A sua etiologia é facil de determinar. V. exa. e a camara sabem que os philosophos francezes do seculo XVIII por um impulso de odio á supremacia do catholicismo, inauguraram um movimento de separação entre o desenvolvimento intellectual e o desenvolvimento moral. Impotentes para quebrar a intima alliança da moral e da religião, preconisaram a cultura intellectual como instrumento de reacção contra o catholicismo, e consagraram os seus cuidados quasi unicamente á diffusão da instrucção, crivando de vituperios a religião e a moral.

Os philosophos allemães desde Kant a Hegel, que dominaram as correntes superiores do pensamento europeu até meiado do nosso seculo, se versaram a moral foi para lhe dissipar aquelle perfume singelo e suavissimo que trescala dos paginas do evangelho; foi para lhe obliterar aquella feição pratica, eminentemente salutar, que tão sublime se desenha nas doutrinações de Christo.

Enleiaram a moral na teia phantastica das suas abstrusas construcções philosophicas, onde ficou pairando sem nenhuma acção sobre as sociedades.

Por seu turno o individualismo radical do seculo XVIII foi uma reacção politica contra os ultimos arrancos do feudalismo.

Assim como o feudalismo e o absolutismo nos seus codigos prescreviam aos povos quasi exclusivamente deveres, assim tambem o individualismo e a revolução franceza se preoccuparam quasi exclusivamente de direitos.

A revolução franceza foi a apotheose a consagração do individualismo; redigiu e proclamou a declaração dos direitos do homem, que tem sido a Carta Magna da politica moderna, mas não redigiu, nem proclamou uma declaração dos deveres do homem.

A rasão é esta. Assim como o absolutismo e o feudalismo tinham escravisado os povos em nome do dever, o individualismo da revolução franceza procuraram emancipal-os em nome do direito. Tão certo é que a reacção é igual á acção.

D'estes factores summariamente enumerados resultou que nas nações mais influenciadas pelo individualismo e pela revolução francesa, cuidou-se principalmente do desenvolvimento intellectual, e votou-se quasi ao ostracismo a cultura moral. Foi o que succedeu ás nações da raça latina.

As nações da raça anglo-saxonia e germanica têem uma cultura moral mais desenvolvida.

A rasão principal é que nem o individualismo do seculo XVIII. Nem a revolução francesa as penetraram tão pro-

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fundamente, e a moral tem sido cultivada sob o palladio das seitas religiosas que professam.

Nas nações da raça latina confiou-se a solução do gravissimo problema da moral ao carinho e á ignorancia dar mães de familia.

Os resultados d'esta errada orientação seguida no ensino publico são faceis de ver.

É certo que o nosso seculo póde com o mais legitimo orgulho ufanar-se de ter sido um maravilhoso laboratorio de progressos de ordem material.

Effectivamente o homem tem fecundado a natureza bruta com a luz da sua intelligencia, e tem-na senhoreado com o poder da sua iniciativa.

O nosso seculo tem desenvolvido e accumulado em torno do homem um cortejo tão extraordinario de commodos e utilidades que parece estarmos prestes a ver transformado o antigo valle de lagrimas n'um eden de delicias; parece que estamos prestes a ver transformado o mar negro das amarguras da vida n'um lago crystallino dourado pelo sol de todas as venturas.

Mas a rutilante moldura dos progressos materiaes encobre o fundo esverdinhado das gangrenas assustadoras.

O observador circumspecto que fizer incidir um raio do seu talento na atmosphera polvilhada de oiro, em que as sociedades immergem, fica dolorosamente surprehendido. É que ao fundo d'esse labyrinto de illuminuras negrejam ulceras denunciando podridões em livre fermentação.

É certo que se têem desenvolvido e accumulado extraordinariamente as riquezas publicas; mas parece que para se concentrarem nos cofres dos argentarios, para lhes retoucar os palacios de palhetas de oiro e a vida de prazeres caprichosos.

Ao lado dos palacios aurifulgentes, onde o vicio canta os dithyrambos dos mais revoltantes prazeres, estanceia acalcanhado o tugurio onde a miseria ulula os fremitos dos mais lancinantes desesperos.

Emquanto o sordido epicuro refocila no regaço dissoluto de Sileno, Lazaro, o andrajoso Lazaro, esoabuja nos braços chagados de Job.

Ha, sr. presidente, um desequilibrio extraordinario entre o coefficiente dos nossos progressos de ordem material e o coefficiente da moralidade privada e publica. Por isso, sr. presidente, o nosso progresso póde ser comparado, sem hyperbole, a uma pyramide de oiro assente n'um golfão de lama; por isso póde-se dizer sem exagero que a purpura da nossa civilisação rastejo n'um tremedal do ignominias.

Sr. presidente, á nosso vista trava-se uma lucta feroz entre dois colossos igualmente convulsionados pela epilepsia de um rancor satanico.

De um lado o capitalismo organisado em syndicato cosmopolita, apoplectico de prazeres e de milhões, convulsionado pela epilepsia da exploração do suor alheio! E do outro lado o proletariado organisando-se em syndicatos internacionaes, apoplectico de inveja e desespero, convulsionado pela apoplexia da fome! A esta lucta feroz, a esta luta de Titans chama-se a questão social.

Mas nada de enphemismos, nada de artificios. Não detenhamos a vista á superficie tumultuaria da vida moderna; lancemos a sondereza da observação até ao fundo d'essa vida, e lá encontraramos a questão moral no lastro das sociedades, congestionando os cerebros e hypertrophiando os corações.

E que, sr. presidente, a verdadeira questão social é a quesito moral. (Apoiados.}

Sr. presidente, ao feudalismo territorial succedeu um feudalismo bem mais descaroavel, bem mais tyrannico, o feudalismo industrial. O novo feudalismo herdou e aggravou os vicios do feudalismo territorial, mas não lhe herdou nem imitou as virtudes, que attenuavam esses vicios.

Os servos da gleba eram bem menos desgraçados do que são os actuaes servos da industria, já porque os seus senhores possuiam sentimentos altruistas, desenvolvidos e fomentados pela religião e pela moral, já porque esses servos, doutrinados pelo catholicismo, tinham essa grande virtude a resignação, que é simultaneamente uma grande virtude religiosa e uma grande necessidade social.

Os senhores feudaes da industria trocaram os fulgores da moral e da religião pelos fulgores enervantes do oiro; deixaram fanar no seio a grinalda dos sentimentos altruistas, e erguer no coração o monstro do egoismo feroz.

Peleja se sob nossos olhos a mais terrivel das pelejas d'essa campanha secular, enliçada desde o alvor da civilisação, entre as classes poderosos e as classes desbordadas. Qual será o resultado d'esta peleja? Não sei, nem quero pensar n'isso agora. Mas, sob pena de me arriscar a sair d'aqui apodado de visionario, sempre direi que, se as sociedades não forem salvas pela religião e pela moral,
a derrocada do sumptuoso edificio social será completa! Poderemos dizer que ficámos sepultados em ruinas de oiro; mas, em todo o caso, ruinas...

Isto será fatal se os mais distinctos pensadores e estadistas da actualidade não procurarem salvar a sociedade pela educação publica. Os mais abalisados pensadores da epocha deram já o grito de alarme, já cumpriram o seu dever. Resta que os grandes estadistas cumpram tambem o seu.

Se eu quizesse fazer alarde de erudição, o que seria facil, citaria os principaes corypheus das diversos escolas, inclusivé da materialista.

Todos inculcam e pregoam a necessidade de tonificar o organismo social com o balsamo da moralidade.

Indicarei apenas dois nomes illustres, que souberam conciliar a veneração de todas as escolas, de todos os pensadores. Retiro-me o Augusto Comte e Herbet Spencer. Augusto Comte, quaesquer que sejam os defeitos que possam assacar-se ao seu systema, o positivismo, ha de ser venerado como um espirito robusto como um cerebro bom organisado; foi realmente um grande critico e um grande organisador. Eu não sou positivista; mas sei render a todos os homens de talento, de estudo e de trabalho a homenagem do meu respeito. Aos olhos d'aquelle philosopho o problema da educação publico tinha uma tal importancia que creava o mais alto poder social, o poder espiritual, ao qual assignava a funcção de prover á educação publica. Póde dizer-se que Comte imitou simplesmente o organisação do catholicismo; mas isto não deshonra um philosopho tão illustre, embora não fosse catholico.

Não conheço organisação mais brilhante e mais completa do poder moral do que o catholicismo.

Comte, nas explorações que fez na historio da idade media, teve ensejo de extasiar-se perante os serviços prestados pelo catholicismo á civilisação. Foi o catholicismo que salvou a idade media, e Comte, lançando a sua vista penetrante no pelago de miserias que envergonham e põem em risco a actual civilisação, entendeu que não podia crear um poder mais alto para salvar as sociedades modernas do que o poder espiritual.

De Herbet Spencer, esse grandissimo talento, em que se cruzou o genio do philosopho com a erudição do sabio, direi simplesmente que o problema da instrucção e educação moral teve a seus olhos tal relevancia, que consagrou uma obra á educação e outro á moral.

As considerações que desenvolvi parecem-me sufficientes para pôr em relevo a importancia summa da necessidade de implantar um systema do educação publica n'uma reforma bem ponderada e bem estudada, reforma que deve ter em vista que o homem não é simplesmente intelligencia, mas tambem sentimento e vontade.

Um systema de educação publica para ser completo, ha de abranger o homem em todas as fórmas da sua complexo e maravilhosa actividade, desde os energias organicas até ás energias psychicas.

O desenvolvimento intellectual desacompanhado do moral

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traz comsigo consequencias perniciosas; serve principalmente, para amontoar a cifra da estatistica criminal.

Se progredir é dilatar cada vez mais os horisontes da intelligencia humana, é tambem embeber a emocionalidade no nectar dos puros affectos; é tambem avigorar a vontade na pratica do bem, no cumprimento do dever.

Ora a nossa instrucção publica despreza quasi por completo o ensino da moral, a não ser nas escolas de instrucção primaria, onde se ensinam rudimentos insignificantes, ou antes, aonde se grudam nos cerebros das creanças rudimentos insignificantes que não podem ser bem assimilados, e depois nunca mais se pensa em moral.

Na instrucção publica deve seguir-se o que se faz lá fóra. Lá fóra ensina-se moral e religião nos diversos cursos.

E se eu quizera relancear um pouco a vista pelo nosso passado, o que é que vemos? De onde efflorou a nossa grandeza? Vamos logo á origem. Pois não foi a fé religiosa que accendeu uma fornalha do heroismo no peito de cada soldado em Ourique?

Basta ler as nossas chonicas para se ver que foi a fé religiosa que animou e inspirou os nossos heroes. E, sr. presidente, não ha heroicidade n'um povo sem que elle tenha um ideal sublime. O ideal é para o homem e para a sociedade o que a seiva vital é para a planta. E que a fé religiosa inspirou e guiou sempre os nossos grandes heroes patenteia-o brilhantemente a nossa grande epopêa, sacrario diamantino onde se realisou o hypostasis do genio da patria com o estro de Camões.

Ahi se encontra refulgente o ideal portuguez, sempre irisado pela inspiração moral.

E se quizermos seguir a curva da nossa decadencia facilmente a entroncaremos no esfriamento do enthusiasmo religioso e na consequente enervação dos costumes. (Apoiados.)

Sr. presidente, se temos a peito a reabilitação da patria, entendo que devemos principiar pela disciplinação dos costumes e pela regeneração dos caracteres.

Eu não conheço nenhum agente mais energico de transformação social, nenhum instrumento mais poderoso de progresso, nenhum manancial mais fecundo de prosperidades do que um systema de educação publica. (Apoiados.)

Pôde dizer-se que n'un bom systema de educação se contém o germen de onde efflora e se expande todo o progresso, toda a civilisação.

A grandeza de uma nação não se afere pelo perimetro do seu territorio, mas pelo vigor das suas energias, pelo seu trabalho, pela sua moralidade e pelo seu ideal.

Ora, a nossa instrucção publica, desde a implantação do constitucionalismo, nunca mais pensou em ensinar moral senão na instrucção primaria.

Confia-se o ensino da moral e da religião á ignorancia e direcção das mães de familia.

A acção educadora do catholicismo não tem sido tão extensa e intensa como podia e devia, porque a orientação politica do nosso seculo lh'o tem infelizmente impedido.

O sr. Presidente: - O sr. deputado tem um quarto de hora para concluir o seu discurso.

O Orador: - Eu concluo já, sr. presidente.

Estou abusando excessivamente da complacencia da camara.

Vozes: - Não está, não está.

O Orador: - Vou concluir; mas antes d'isso desejo dirigir um appello fervoroso ao patriotismo e á illustração do governo e da camara.

Creio que no meio das discordias e das paixões que nos agitam e dividem, ha um elo que prende todos os carações; é a aspiração ardentissima, que estua em todo o peito verdadeiramente portuguez, de levantar a patria, senão á grandeza epica de outras eras, senão ao seu antigo explendor, pelo menos á categoriia de uma nação honrado, independente e livro. (Apoiados.} Não conheço meio mais directo para preparar as gerações do futuro e a grandeza da patria do que um bom systema de educação e ensino.

Debalde se trabalhará para resolver as questões economicas e financeiras, se não se resolver a crise moral, e esta não se resolve senão preparando o futuro com a implantação da bons principios da moralidade. (Apoiados.)

Dizia eu que apesar das discordias e das paixões que mais ou menos apparentemente nos dividem, palpita em todos os corações portuguezes uma aspiração nobilissima pelo resurgimento da patria.

Eu quizera que d'este ideal fulgurante, d'este annel de luz purissima, irradiassem ondas de calor era tal quantidade e com tal intensidade que aquecessem o nosso enthusiasmo, accendessem os nossos brios, galvanisassem a nossa coragem, para que os nossos esforços se unissem e os nossos sacrificios só congregassem: n'um trabalho de tytans para honra e gloria da patria. (Apoiados.)

Eu quizera que o governo e a camara, que contam no seu seio membros tão conspicuos, pelos seus talentos e virtudes, deixassem na sua passagem pelas regiões do poder legislativo e executivo um suleo de luz fulgentissima, que ficasse illuminando a penumbra indecisa do futuro da patria.

Eu quizera que desafogada e melhorada a situação economica e financeira do paiz, fundassemos um thesouro preciosissimo de prosperidades, estabelecendo um systema e educação publica bem estudado, bem ponderado e completo de geito que, não só illuminasse as intelligencias, mas reconstituisse os caracteres, depurasse os costumes e oxigenasse a nossa atmosphera moral. (Vozes: - Muito bem.)

A primeira condição para levar a effeito este trabalho que, reconheço, ser uma tarefa eriçada de difficuldades, mas tanto mais honrosa para aquelles que pozessem hombros a empreza tão arrojada, mas tão fecunda, a primeira condição, digo, é termos fé, termos esperança do que a patria será rehabilitada, não pelo auxilio estranho, mas pelo esforço dos seus proprios filhos. O desalento, a indifferença é o primeiro degrau do tumulo. O desalento é a primeira imagem do espectro da morte projectada na retina intellectual do enfermo....

Coragem e fé!

A fé remove as montanhas.

Para concluir permitia-me v. exa. que ou imite uma phrase conceituosa de um economista italiano, que ha dias foi aqui citada por um nosso collega: Metade da minha alma pertence á educação da minha patria, e a outra metade pertence á educação da humanidade.

Se orador foi muito cumprimentado.)

O sr. Ministro da Justiça (Veiga Beirão): - Ouvi com toda a attenção as judiciosas considerações apresentadas com toda a erudição pelo illustre deputado, e prometto transmittil-as, tão fielmente quanto me seja possivel, ao sr. presidente do conselho.

O sr. Presidente: - Poucos minutos faltam para se entrar na ordem do dia, mas eu devo dar uma satisfação á camara.

Alguns srs. deputados, mesmo da maioria, significaram-me que na sessão anterior houve equivoco da minha parte, porque parece que era intenção da maioria dar a palavra ao sr. Mello e Sousa, quando elle a reclamou depois da resposta do sr. ministro da fazenda. (Apoiados.)

A mesa interpretou de fórma diversa a votação, mas se porventura alguns srs. deputados, por deferencia, não pediram a rectificação da votação, eu agradeço essa deferencia, mas peço que ella se não repita porque desde o momento em que da parte da mesa houver equivoco, o meu dever é rectifical-o. Acho que a camara me auxiliará n'um pedido que vou fazer: que dê a palavra ao sr. Mello e Sousa, para liquidar esse incidente, e que elle se possa prolongar alem da hora de se passar á ordem do dia, para

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assim poder dar as garantias do deputado a ampla defeza, que está no meu caracter conceder-lhe, e a que tem direito. (Apoiados.}

O sr. Mello e Sousa: - Agradeço penhorado a v. exa. a satisfação que se dignou dar-me, e á maioria d'esta camara a maneira correctissima e digna com que acompanhou as considerações do v. exa. Prometto não abusar, e em breves palavras responderei ao sr. ministro da fazenda.

E faço-o pela muita consideração e respeito por s. exa., o porque s. exa. me havia categoricamente emprazado a que lhe respondesse. N'estas circunstancias eu referir-me-hei aos tres assumptos para que chamei a attenção da camara.

O primeiro é a questão dos sellos nos alvarás, que já estavam na posse dos contribuintes com a declaração expressa de que não deviam pagar sêllo.

Declarou s. exa. que estavam ao abrigo da lei; podiam mandal-os sellar e estavam no seu direito. Entretanto o que é verdade é que esse documento passado por uma auctoridade, auctoridade competente para o passar, tem a declaração expressa e impressa de não pagar o sêllo, porque não o deve. Permittir, pois, auctorisar ou mesmo ordenar que a propria auctoridade que deixou de cumprir a lei, intime o contribuinte que está na posse d'esse titulo sob pena de multa, do dez vezes o sêllo, parece-me um cumulo. Desde já prophetiso a s. exa. que ha de haver um rendimento muito grande, de uma certa ordem de licenças: as licenças para porte de armas, porque realmente, para tal argumento de fiscalisação, não póde haver outra resposta senão um tiro. (Riso.) O contribuinte terá de andar armado de revolver. (Apoiados.)

Sobre o decreto de 31 de dezembro que alterou as fórmas de cobrar a contribuição industrial e reorganisou as repartições de fazenda, teve s. exa. um argumento principal, «que era já lei», e não lhe podia mexer. Era todo o caso declarou s. exa., e eu agradeço-lhe, que só por muita consideração para commigo se dignava responder. E dizia, entre outras cousas, que não lhe podia tocar, o que apresentasse ou, deputado, um projecto de lei, e este seria apreciado. Apesar de novato n'esta caso, eu não cairei na ingenuidade de acreditar que as minhas observações escriptas poderiam merecer ao sr. ministro da fazenda mais consideração do que os observações feitas verbalmente. O projecto dava-me só o trabalho de o escrever, para ficar toda a vida na commissão. (Apoiados.)

Um outro argumento tambem importante de s. exa., «isto foi feito por uma commissão de funccionarios competentissimos e respeitaveis, no numero dos quaes s. exa. conta sem duvida amigos seus». É verdade: se ha desculpa para acceitar este decreto é elle ter sido feito por entidades competentissimas. Mas nós estamos longe do tempo em que só porque um individuo dizia uma cousa, todos se curvavam o não se podia discutir. Se s. exa. não podia defender o trabalho d'esses funccionarios, podia mandar para cá um d'elles para discutir commigo e s. exa. ficava na sua secretaria.

Não póde o sr. ministro da fazenda tocar na lei, não obstante não comprehender, como s. exa. declarou com referencia aos agentes de leilões, o que lá está escripto, e não comprehendeu porque me disse que providenciaria n'um regulamento. Qual regulamento?! A lei não se refere a regulamento; pelo contrario, diz que entre em vigor desde a publicação no Diario ao governo. Portanto, a s. exa. foi possivel mexer na lei para alterar a taxa aos agentes de leilões, de 80$000 réis para 365$000 réis, que é o que se conclue do que está escripto.

O sr. ministro, fundado na lei, póde alterar os seus principios essenciaes, póde tirar o pessoal das repartições de fazenda, passando-o para as repartições fiscaes; póde deitar á margem os modestissimos cobradores domiciliarios; mas quando se lhe pede, fundado na lei, para alterar uma parte d'ella, convida-me a fazer um projecto para elle ter a triste sorte de morrer na commissão! (Apoiados.)

Para concluir, trato agora do emprestimo ás classes inactivas.

Em primeiro logar, devo rectificar o que me consta me foi attribuido por varios jornaes. Eu não disse, nem podia dizer, «que os titulos do emprestimo eram nullos». É claro que não não passava pela idéa que era nulla uma obrigação passada pelo primeiro estabelecimento bancario, que eu muito respeito, assim como os seus administradores.

O que eu disse, era: «que as inscripções areadas para caução d'este emprestimo, eram nullas». E entendo e entenderei que são nullas, porque á camara não se pediu auctorisação para ellas.

E certo - e foi esse o argumento do sr. ministro da fazenda - é certo, que o artigo 8.° do projecto diz «que o governo creará os titulos necessarios para a execução d'esta lei». E tambem é certo que, não percebendo o que isto queria dizer, interroguei a este respeito, e tanto que tenho uma interrogação n'este ponto do impresso do projecto. Mas nem o illustre relator, nem o nobre ministro me responderam. S. exa. leu o artigo, que apenas diz «que o governo creará os titulos necessarios para a execução d'esta lei»!

Poderiam ser obrigações do emprestimo dadas ao banco, mas não; era uma caução de inscripções, com margem de 5 por cento, quando muitos dos tomadores não a esperavam, nem tinham ouvido faltar n'ella. Esta garantia é que entendo que o governo não estava auctorisado a crear, e classifico-a de nulla, como qualquer outra.

Respondeu s. exa.: «que todos os contratos têem caução»! É verdade que todos os contratos a tinham, mas era no tempo em que as notas eram convertiveis e não hoje, em que as condições são diversas. Na proposta feita pelo sr. Marianno de Carvalho, lá se diz terminantemente «que o governo dará a caução de inscripções de 3 por cento á cotação do mercado». Não eram 5 por cento.

Por consequencia, isto assim não se podia fazer sem uma auctorisação para se crear uma caução especial em inscripções, com margem determinada, e se o podiam fazer, então devia dizer-se claramente.

Declaro a v. exa. que me faz zanga o antipathia ver qualqur cousa que póde ser classificada de esperteza. Assim não se define claramente aquillo que se pretendo. (Apoiados.)

Se não fosse a questão das ligações partidarias, appellaria para a consciencia da camara para me dizer se, quando votou este projecto, entendeu que este artigo queria dizer - que se podia dar a caução de inscripções de 3 por cento, com margem de 5 por cento! (Apoiados.)

Passemos agora á censura que s. exa. me dirigiu, a respeito de eu ter apreciado a fórma por que os titulos tinham sido emittidos, de me ter referido ao melhor ou peior exito da emissão, que aliás eu não disse qual fôra, e ao facto de se haverem creado esses titulos com isenção especialissima do imposto de rendimento. Direi a este respeito breves palavras á camara.

Eu entendo que se deve dizer sempre a verdade. Pertenço a uma escola inteiramente opposta áquella que vejo quasi sempre seguir, e me parece ser a que trilha o nobre ministro da fazenda. É aquella que sustenta a conveniencia de manter e ampliar o escandalo para evitar o escandalo. Quer dizer que a escola que entendo que não se devem fazer umas certas cousas que sejam desagradaveis; ainda que uns ou outros saibam, no emtanto que não o saibam todos!

Embora merecesse as censuras de s. exa., devo dizer-lhe que n'este ponto me compraz estar de accordo com a orientação seguida no norte da Europa. Este facto fez-me lembrar o artigo 249.° da lei allemã, de 11 de junho de 1844, que diz claramente:

(Leu.)

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Quem, á face d'este artigo da legislação allemã, dissesse que o emprestimo estava passado ou que suppunha que elle estava realmente collocado e que tinha um certo valor, o que podia affectar terceiros, iria um anno para a cadeia, alem de ter de pagar uma multa de 10:000 marcos.

(O orador não reviu.}

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Prometto ser breve porque não quero abusar da attenção da camara.

Tendo dito o sr. Mello e Sousa que tomára a palavra para responder a um emprasamento que eu lhe havia feito, lembrarei a s. exa. que esse emprasamento ficou inteiramente de pé...

O sr. Mello e Sousa: - Foi esquecimento da minha parte tocar n'esse ponto.

O Orador: - S. exa. não tentou ao menos provar a sua asserção gratuita e imprudente, de que o banco tinha ganho 3$000 réis em cada titulo emittido. Embora usasse da concessão da camara para fallar n'esta sessão antes da ordem do dia, s. exa. não disse uma unica palavra a esse respeito! O empresamento, se s. exa. a elle obedeceu quando queria tornar a fallar na sessão de quinta feira, ficou, repito, inteiramente de pé, e eu ainda estou á espera, não da demonstração, mas de uma tentativa de demonstração por parte de s. exa., de que o banco de Portugal, como o illustre deputado affirmou gratuitamente, lucrou 3$000 réis em cada titulo que emittiu de emprestimo para as classes inactivas.

S. exa. voltou outra vez a declarar que é realmente oneroso para os estabelecimentos de 3.ª classe, incommodos, perigosos, insalubres, pagar um sêllo de licença de 20$000 réis.

E que me pediu s. exa.? Pediu-me que por uma simples portaria se fizesse a interpretação do que se entendia por estabelecimentos insalubres; e eu repeti-lhe que não cabe dentro das faculdades do poder executivo interpretar leis. Ha a lei de 1863, que diz que os latoeiros o carvoeiros pertencem á 3.ª classe dos estabelecimentos perigosos, incommodos e insalubres, e portanto não me compete a mim desclassificar estes estabelecimentos; só o legislativo é que tem poder de reformar uma lei que está em vigor.

O sêllo é pesado? Pois sou eu, é o partido a que tenho a honra de pertencer, quem tem a responsabilidade d'esta disposição? Não. (Apoiados.}

A lei é de 1893, e quem tem a responsabilidade d'ella é o partido de que o illustre deputado é ornamento. (Apoiados.)

E o que diz essa lei? Diz: «licença para estabelecimentos... por uma só vez, 20$000 réis».

É esta a disposição perceptiva da lei; e esta disposição não está sujeita a interpretação por parte de quem não tem competencia para o fazer. (Apoiados.}

Portanto, é dentro da lei que a auctoridade competente exige este sêllo. (Apoiados.} Mas o que eu disse e mantenho é que acho injusta esta taxa, e entendo que ha effectivamente industrias que, sendo por sua natureza tão insignificantes que pertencem á 3.ª classe da lei de 1863, que não podem com este imposto; e por isso eu tenciono apresentar ao parlamento uma proposta tendente a modifical-o.

Mas, argumento novo do illustre deputado: o ministro da fazenda tem agora escrupulo de modificar a taxa que pesa sobre os agentes de leilões, quando se julgou auctorisado a supprimir os cobradores domiciliarios e a tributar os armazens de retem e até os proprios leiloeiros?

É certo que eu estava auctorisado pelo parlamento a fazer esta reforma. Fil-a. Agora para que não estou auctorisado é para desfazer o que fiz. (Apoiados.}

Isto é simples; e parece impossivel que um espirito tão lucido como o de s. exa. não o tenha comprehendido.

Com relação ao emprestimo para as classes inactivas, referiu-se s. exa. a disposições de diplomas allemães e outros.

Ora, eu declaro que não tenho habilidade para decifrar enygmas, por isso não percebi o que s. exa. quiz dizer, isto é certamente deficiencia da minha intelligencia, e o que peço ao illustre deputado é que, para que, ou e a maioria d'esta camara o possamos comprehender, seja mais claro.

Quanto aos 3$000 réis, que s. exa. hontem affirmou que o banco de Portugal ganhava, s. exa. nada disse, e foi unicamente isto que eu o emprasei a provar.

Tenho a dizer ao illustre deputado, que insistiu muito para fallar e novamente usar agora da palavra, que ficou a este respeito mudo e quedo, como mudo e quedo vou eu tambem ficar, dando por terminado o que tinha a dizer a s. exa.

Vozes. - Muito bem.

(O sr. ministro não reviu.}

O sr. Presidente: - O sr. deputado Mello e Sousa pediu a palavra?

O sr. Mello e Sousa: - É só para esclarecer o ponto relativo aos 3$000 réis.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara, tem v. exa. a palavra.

O sr. Mello e Sousa. - N'esta parte o sr. ministro da fazenda tem completamente rasão. Esqueceu-me de explicar a minha asserção sobre o lucro do banco de Portugal, de 3$000 réis em titulo.

Eu não disse, como os jornaes me attribuiram e tambem o sr. ministro da fazenda, que o banco de Portugal ganhava; em absoluto, em cada titulo 3$000 réis. É claro que eu não podia dizer similhante cousa.

Se a emissão dos titulos que foram tomados fosse feita a 87, o banco de Portugal não podia ganhar 3:000 réis; o que disse, é que tendo sido o exito do emprestimo o que s. exa. sabia, por circumstancias especiaes o banco encontrava-se possuidor e obrigado a guardar nas suas carteiras uma grande parte do emprestimo, como terá de guardar naturalmente o restante, que são 2:700 contos de réis, que ha a emittir.

N'estas circumstancias o banco de Portugal, que dava ao governo 87$000 réis por cada obrigação, d'essas que ficam em carteira, e obtinha 5 1/2 por cento de juro, sem imposto de rendimento, tendo uma caução de inscripções a 5 por cento, abaixo da cotação do mercado, encontrando-se depois, pela conversão, nas circunstancias de receber 90$000 réis, evidentemente, como qualquer possuidor de titulos, se os tinha dado a 87$000 réis, recebendo réis 90$000, lucrava 3$000 réis.

Eis a explicação simples.

(O orador não reviu.}

O sr. Ministro da Fazenda. - É singular tudo quanto está acontecendo!

O illustre deputado ao terminar o seu discurso na sessão de quinta feira affirmou que o banco de Portugal, emittindo a 87$000 réis os titulos do ultimo emprestimo, do valor nominal de 90$000 réis, ganhára por isso mesmo 3$000 réis em cada um d'elles. Emprasei-o immediatamente a que tentasse ao menos demonstrar essa asserção, porque eu lhe havia de provar que estava; em erro.

O sr. Mello e Sousa quiz immediatamente corresponder ao meu emprasamento, mas v. exa. não lh'o consentiu na sessão de quinta feira por entender que devia passar-se á ordem do dia, o que muito contrariou o illustre deputado.

Hoje v. exa. concedeu-lhe a palavra para esse fim e parece, portanto, que s. exa. se devia considerar obrigado a produzir desde logo a demonstração do seu asserto. Mas esqueceu se! E foi necessario que eu despertasse a sua memoria, para que, usando segunda vez da palavra, se occupasse emfim do assumpto.

Mas sobre elle o que disse de novo o illustre deputado? Nada, absolutamente nada. Limitou-se a repetir o que já tinha affirmado na sessão de quinta feira, isto é, que o

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banco ganha 3$000 réis por titulo, visto vendel-os a réis 87$000, sendo elles de 90$000 réis.

S. exa. confunde duas operações inteiramente distinctas: a do emprestimo feito pelo banco ao thesouro, e a da emissão de titulos, de que se trata, por parte do mesmo banco.

O banco emprestou 1:800 contos ao governo ao juro de 6 por cento ao anno, para serem amortisados em 31 semestres, começando no 1.° de outubro de 1901 e acabando em igual dia de 1916. Em cada um d'esses 31 semestres o estado tem de entregar ao banco a quantia de 89:998$074 réis para juro e amortisação da quantia mutuada, como é facil reconhecer por meio de qualquer tábua de annuidades.

O banco, sob sua responsabilidade, emittiu 20:680 titulos de 90$000 réis e do juro annual de 5 1/2 por conto, amortisaveis tambem n'aquelles 31 semetres. E, portanto, o banco e não o governo que tem de resgatar esses titulos pelo seu valor nominal.

Em taes circunstancias occorre logo esta observação: se o banco emittiu esses titulos a 87$000 réis, como affirma o illustre deputado, e se tem mais tarde de os reembolsar a 90$000 réis quer isto dizer que ganhou 3$000 réis em cada um d'elles? Parece ao contrario, posta a questão em tão restrictos termos, que os perderia em vez de ganhal-os.

Então se era logar de vender os titulos a 87$000 réis, os collocasse sómente a 80$000 réis, ganharia só por isso 10$000 réis em cada titulo? E se os emittisse a 70$000 réis lucraria 2$000 réis? E se os désse de graça, ganharia 90$000 réis?

Eu fiquei na sessão de quinta feira tão estupefacto com essa singular theoria de s. exa. que a todos quantos encontrava dirigia esta pergunta: qual é a coisa que quanto mais se lhe tira maior fica? Muitos me respondiam: é uma cova; e ou observava, não senhor, é um emprestimo, segundo o sr. Mello e Sousa. (Riso.)

A final estou hoje convencido de que é realmente uma cova, onde tem de ficar enterrada para sempre a arithmetica do illustre deputado. (Riso}.

Pois isto é maneira de apreciar uma questão financeira? Pois s. exa. homem versado n'estes assumptos, vem aqui não direi de proposito, mas por inadvertencia, apregoar um erro de tal natureza? (Apoiados). É assim que se estudam as condições de um emprestimo?

Pois ignora o illustre deputado que o mesmo emprestimo se póde emittir em titulos de o ou de 5 1/2 ou de 5 ou de 4 1/2 por cento, sempre com o mesmo encargo real para quem o emitte, e, portanto, com o mesmissimo beneficio para quem o toma?

Exemplifiquemos.

Se o banco de Portugal tivesse preferido o typo de 6 por cento, quantos titulos havia de emittir, e por que preço, para não ganhar, nem perder, durante o periodo da amortisação?

Uma obrigação de 90$000 réis, e do juro nominal de 6 por cento ao anno, exige; para ser amortisada em trinta e um semestres, a quantia de 4$499,9037 réis por semestre. Ora, a prestação semestral paga pelo governo ao banco é de 89:998$074 réis; logo, o numero de titulos a emittir seria

89:998$074 = 20:000
4$499,9087

e o preço de cada titulo

1.800:000$000 = 90$000
20:000

Assim, a emissão teria de ser feita ao par.

Mas o banco escolheu o typo de 5 1/2 por cento. Quantos titulos, e por qno preço, devia omittil-os para não ganhar, nem perder, durante o periodo da amortisàcãp?

Uma obrigação de 90$000 réis, e do juro nominal de 5 1/2 por cento, exige 4$351,9077 réis por semestre para juro e amortisação em trinta e um semestres. Logo, o numero dos titulos a emittir é

89:998$074 = 20:680
4$851,9077

e o preço da emissão

1:800:000$000 = 87$040,6
20:680

Se o banco tivesse optado pelo typo de 5 por cento, o calculo far-se-ia do seguinte modo. Uma obrigação de réis 90$000, e do juro nominal de 5 por cento, exige 4$206,51 réis por semestre para ficar amortisada ao cabo de trinta e um semestres. O numero de titulos a emittir seria, pois,

89:098$074 = 21:395
4$206,51

e o preço da emissão

1.800:000$000 = 84$132
21:395

Assim, sem levar mais longe este estudo, reconhece-se que o banco não ganharia, nem perderia um real, durante o periodo da amortisação, quer emittisse 20:000 obrigações de 6 por cento, ou 20:680 de 5 1/2 por cento ou 21:395 de 5 por cento, porque em todos os casos teria de entregar integralmente aos obrigacionistas, para juro e amortisação durante trinta e um semestres, precisamente a quantia de 89:998$074 réis, que ha de receber do governo em cada um d'esses semestres. E tão pouco ganharia ou perderia um real na emissão propriamente dita, só vendesse os titulos do 6 por cento a 90$000 réis, os de 5 por cento a 87$040,6 réis e os de 5 por cento a réis 84$132, porque, em qualquer dos casos, o producto da venda seria precisamente igual á importancia de 1:800 contos de réis que o banco teve de entregar ao thesouro.

As tres referidas operações são, pois, equivalentes entre si sob o ponto de vista da emissão e dos encargos durante o periodo da amortisação, embora isto pareça extraordinario ao illustre deputado, o sr. Mello e Sousa, que entende que o banco ganharia tanto mais quanto menor fosse o typo do juro nominal escolhido.

Mas, sr. presidente, o banco, adoptando o padrão de 5 1/2 emittiu effectivamente 20:680 titulos, mas nem sequer ao preço de 87$040,6 réis. Os prospectos fixam o preço liquido em 86$760 réis. Assim, o banco, que durante os trinta o um semestres do periodo da amortisação, não ganha, nem perde um real, na emissão propriamente dita perdeu em vez de ganhar, porque o producto da emissão não attinge a importancia de 1:800 contos de réis que teve de adiantar ao thesouro.

Isto prova que s. exa. não soube pôr bem a questão. Ouviu cantar o gallo, mas não sabe de onde. A este respeito ainda tem muito que ler. Eu vou pol-o no verdadeiro caminho, dando-lhe até armas contra mim.

O lucro do banco, e algum teve, como era justo, porque, alem de dar a sua propria garantia, tomou a seu cargo o serviço de todo o emprestimo, o lucro do banco, dizia eu, não está, como s. exa. suppunha, na differença entre o valor nominal e o preço de emissão dos titulos. O illustre deputado caiu a tal respeito, permitta-me que lhe diga, em erro grosseiro.

O lucro do banco deriva de ser a taxa do juro que paga, durante o periodo anterior ao da amortisação, um

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pouco inferior á do juro que recebe, e de haver tambem uma pequena differença nas epochas, a partir das quaes se contam respectivamente esses juros.

Ahi é que está a questão, e não onde o illustre deputado quiz vel-a.

E agora que eu o puz no verdadeiro caminho, refaça s. exa. os seus calculos e traga-os ao parlamento, porque aqui lhe demonstrarei que o lucro do banco de Portugal, illiquido ainda da commissão dada aos outros bancos, não foi cousa que se pareça com os 3$000 réis por titulo, annunciados pelo illustre deputado com tanto entono como incorrecção.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Mello e Sousa: - Peço a palavra.

O sr. Presidente: - Está fechado incidente.

O sr. Mello e Sousa: - Peço a v. exa. que consulte camara se me permitte usar novamente da palavra para responder ao sr. ministro da fazenda.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara dou a palavra ao sr. Mello e Sousa.

O sr. Mello e Sousa: - Eu agradeço ao illustre professor de mathematica as explicações que se serviu dar-me. E digo ao illustre professor de mathematica, e não ao nobre ministro da fazenda, porque foi n'essa qualidade que s. exa. me ordenou até, que, quando eu quizesse fazer calculos, os sujeitasse primeiro á sua conferencia e approvação.

Ninguem mais póde fazer calculos n'esta casa sem os sujeitar primeiro á conferencia do illustre professor do mathematica, porque nós não estamos na camara dos deputados, estamos a receber prelecções na escola polytechnica, e quem é o conferente é o sr. Ressano Garcia. (Riso.)

Não caiam v. exa. mais em fallar em algarismos, porque o papão não dá licença que se falle em algarismos na sua presença. O nobre e illustre professor de mathmatica, que appelou para a sua qualidade de distinctissimo professor, porque o é, não dá licença, repito, até com todo o entono: «não dou licença: primeiro traga cá os calculos para eu os examinar, e depois direi se elles podem seguir». (Riso.)

Ora, francamente, isto está abaixo do merito e do concebo que toda a gente faz, e do preito que eu presto ao grande talento e erudição de s. exa. (Apoiados.)

Pois então a proposito de uma discussão comesinba, sobre os famosos titulos em carteira, vem s. exa. com uma alluvião de algarismos, que eu, confesso, me senti embaraçado em sua frente!

Estas questões de algarismos são para estudar em casa; mas s. exa. lendo os seus calculos, disse: «São 465, confira».

Eu posso lá conferir uma cousa d'estas!

Isto é perfeitamente um banho russo, como eu tomei uma vez em Moscow. Tive tenções de sair pela porta fóra, quando s. exa., accumulando uma quantidade extraordinaria de algarismos, disse: «São 465».

Francamente, nem uma agulheta espetada depois de sair de um banho a 33 graus. (Riso.)

Mas, emfim, eu prometto obedecer. Nunca mais apresentarei calculos sem ir á bancada do illustre professor de mathematica saber se estão correntes.

E depois ainda s. exa., com grande emphase, com uma pose natural, propria e conveniente, exclama: «E veiu o sr. deputado dizer isto para lançar o descredito sobre aquelle grande estabelecimento!»

N'este ponto, sr. presidente, o illustre professor de mathmatica claudicou; eu disse que o banco ganhava 3$000 réis em cada obrigação.

S. exa. sustentou que este perde 40 réis; logo é s. exa. quem desacredita o estabelecimento e não eu.

Aqui a mathematica falhou.

Mas vamos ao famoso caso da 3$000 réis, porque não quero cansar a attenção da camara, nem abusar da sua benevolencia. Quem emitte é o banco, quem paga é o banco, quem perde é o governo; não comprehendo; mas o que é tambem incomprehensivel é que o banco emitte 1:861 contos de réis para dar 1:800 contos!

Isto é que ninguem percebe; mas lendo, percebe-se; dil-o o § 2.° do artigo 20.°

(Leu.)

Ora aqui é que está tudo e n'estas palavras - comprehendendo as despesas da emissão -, de sorte que o banco nos titulos que lhe ficam em carteira, que são quasi todos, ganha 5 1/2 por cento sem imposto de rendimento, e isto por fazer favor ao estado, de lhe dar papel, que só tem poder circulatorio porque o estado quer!

Seja, porém, como for, o que é certo, e o que s. exa. confirmou é que o banco finge que tem de pagar a réis 90$000 e do facto só paga a 87$000 réis, dentro do juro de 6 por cento.

Eu tambem tinha visto essa questão da data do contrato; mas isso é uma questão insignificante comparada com a que eu tenho tratado e que é importantissima. Se emitte, ganha 6 por cento; não emitte, e ganha a differença e o juro de 5 1/2 por cento, de maneira que quando finge ganhar menos é quando ganha mais, porque, repito, fica com os 3$000 réis de differença e tem os juros de 5 1/2 por cento, porque n'este § 2.° se diz, alem d'isso, terminantemente...

(Leu.)

Tenho dito.

Agradeço a v. exa. e á camara, promettendo não voltar ao assumpto, porque ficariamos eternamente a discutir cifras; o sr. ministro da fazenda applicando novos douches e eu tendo de replicar.

(O orador não reviu.)

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - O illustre deputado ficou incommodado com a historia da cova, e agora repete outra da mesma natureza.

S. exa. não quer reconhecer que um titulo de 5 1/2 por cento, para dar o juro real de 6 por cento, não póde ser tomado a 90$000 réis, aliás não dava senão 5 1/2: para dar 6 precisa ser tomado a um preço inferior, isto é, a réis 87$041. A differença é de 3$000 réis em cada titulo.

Não teve occasião de verificar, diz s. exa., mas acceita os 87$000 réis, e acrescenta: «Isso era se o banco emittisse, mas como fica com o titulo em carteira, ganha».

Ganha porque? Porque são os mesmos 87$000 réis? O banco em vez de dar 87$000 réis e depois recebel-os fica com os 87$000 réis e não os dá, nem recebe. Portanto, não ganhou nem perdeu.

Isto corre bem parelhas com a historia da cova. (Riso.)

Eu disse que abstraia da minha qualidade de professor, e por isso procurava reduzir a questão a termos tão simples que o mais leigo na materia me podesse comprehender. Ouso esperar que fui comprehendido, salvo talvez por s. exa., não por defeito só meu, mas tambem por um pouco de má vontade da parte de s. exa.

Tenho dito.

(O orador não reviu.)

O sr. Presidente: - Antes de se passar á ordem do dia, tenho a dizer á camara que o sr. deputado Moraes Sarmento, na impossibilidade de obter a palavra n'esta occasião, veiu declarar á mesa que tinha necessidade de chamar a attenção do sr. ministro do reino para um negocio urgente. Devendo reunir-se ámanhã a commissão districtal de Villa Real para eleger os membros para as commissões de recenseamento, constava-lhe que o governador civil d'aquelle districto se recusava tenazmente a fazel-a convocar, e por isso queria pedir providencias ao governo. Dou a palavra ao sr. deputado.

O sr. Moraes Sarmento: - Pedi a palavra para chamar a attenção do governo sobre um flicto extraordinario,

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SESSÃO N.° 8 DE 24 DE JANEIRO DE 1898 129

que se está passando no districto de Villa Real e para o qual peço providencias ao digno presidente do conselho, que vejo presente.

Como a camara sabe, as commissões do recenceamento são compostas de tres membros, um eleito pela commissão districtal, outro pela camara municipal e o terceiro pelo juiz de direito da respectiva comarca.

As commissões districtaes são presididas pelos governadores civis que, nos termos do codigo administrativo, podem fazer-se substituir n'essa presidencia pelos sons substitutos ou pelos secretarios geraes, e quando a commissão districtal, até ao dia 25, não tenha eleito os membros da commissão de recenseamento, essa faculdade reverte para o governador civil fazendo elle então a nomeação.

Esta é a legiislação vigente sobre assumpto, que eu vou ter a honra do expor a camara.

Tendo agora de se verificar a eleição dos vogaes das commissões do recenseamento, o governador civil de Villa Real tem-se escusado a reunir com a commissão districtal pelo que ella não tem funccionado. Os vogaes d'esta com missão escreveram-lhe, pedindo a convocação de uma reunião extraordinaria e o governador civil respondeu-lhes n'uma carta cuja copia ou tenho presente o que diz o seguinte:

«Venho accusar a recepção da carta que v. exas. me fizeram a honra de me dirigir com data de hontem.

«Relembram-me v. exas. na alludida carta o facto de não ter havido sessão da commissão districtal nas ultimas tres semanas e ao mesmo tempo manifestam o desejo de que seja marcada uma sessão extraordinaria para a proxima segunda feira 17, para se proceder á nomeação de vogaes para as commissões do recenseamento eleitoral.

«Respondendo como me cumpre, julgo dever ponderar a v. exa. que me parece absolutamente dispensavel similhante sessão extraordinaria, visto dever a commissão districtal reunir-se em sessão ordinaria na proxima 5.ª feira, 20.»

Na quinta feira 20 do corrente o governador civil de Villa Real não só não compareceu á sessão da commissão districtal, mas mandou fechar as portas da sala onde essa commissão se devia reunir, impedindo que ella funccionasse, e mandou tambem sequestrar o livro das actas. A commissão reuniu fóra d'aquelle local, elegeu os vogaes da commissão de recenseamento, mas consta-me que o governador civil dou instrucções aos administradores de concelho para que impedissem a posse e o exercicio das funcções aos individuos eleitos pela commissão districtal. Para que o cumprimento da lei seja assegurado e se evitem conflictos desagradaveis, eu venho pedira o governo caso julgue que os individuos eleitos o não estão legalmente, que de hoje para amanhã, que é o ultimo dia em que essa eleição se póde fazer, determino ao seu delegado n'aquelle districto que reuna a commissão districtal e eleja os respectivos delegados com toda a regularidade.

Abstenho-me n'este momento de fazer quaesquer considerações politicas, porque espero que o nobre presidente do conselho ha de obstar a pratica de violencias d'esta ordem, que em circumstancia alguma só justificaria, mas menos no momento presente em que do necessario se torna o afastamento de todas as causas do irritação, das paixões politicas.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - Tenho a declarar que os factos a que s. exa. se referiu me são absolutamente desconhecidos.

É a primeira vez que d'elles tenho conhecimento, mas asseguro a s. exa. que agora mesmo vou dar ordem ao governador civil de Villa Real para que se elles foram verdadeiros, seja dado immediato cumprimento á lei, e admittindo a hypothese de o não serem, eu não faço nenhuma injuria ao caracter do illustre deputado, porque podem as paixões politicos de quem o informou tel-os exagerado,

S. exa. parece que me fez justiça confiando em mim. Eu não tolero violencias da ordem d'aquellas a que se referiu o sr. Moraes Sarmento, e se ellas tiverem tido logar, póde s. exa. estar certo de que hei de empregar os meios ao meu alcance para que a lei seja cumprida pelos meios ao meu alcance.

O sr. Moraes Sarmento: - Agradeço ao sr. presidente do conselho as explicações que deu, confiando em que s. exa. tomará providencias para obstar a quaesquer violencias.

Agradeço a v. exa. e á camara a sua benevolencia.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 67, reforma do tribunal de contas

Foi approvado sem discussão o artigo 2.°

Leu-se o artigo 3.°

O sr. Luciano Monteiro: - O § 3.° do artigo em discussão diz:

«Em vista da communicação a que se refere o paragrapho antecedente, o tribunal exigirá as contas omissas da repartição que dever organisal-as e prestai-as...»

E acrescenta: «E se não for pelo responsavel que tiver conhecimento da omissão, informará d'esta falta o governo, para proceder contra elle como tiver por conveniente.»

Se não for, o que? Parece-me haver aqui uma lacuna que desejaria ver explicada.

(Pausa.)

O sr. Presidente: - Não ha quem peça a palavra, vae votar-se.

Foi approvado o artigo com seus paragraphos.

Seguidamente foram approvados os artigos 4.º a 26.°

Lê-se o artigo 27.º

O sr. Elvino de Brito: - Declara que não póde dar o seu voto a nenhuma reforma de serviços que apresente augmento de despeza, por entender que, no momento actual a tendencia de todos deve ser para diminuirem as despezas e nunca para as aumentar. Está certo que é este tambem o pensamento do governo que se honra de apoiar.

A reforma, porém, que se discute, embora se tivesse declarado que trazia augmento de despeza, não o traz, pois com a proposta do sr. Ramires já ella foi reduzida, e com a proposta que vae apresentar, representará uma economia de mais de 3:000$000 réis.

Para obter essa economia não vão por fórma alguma prejudicar os empregados actuaes, a quem nada se reduz nos seus vencimentos, mas simplesmente interpretar como entende que deve ser a lei de julho de 1886, que manda que os vencimentos, dos primeiros e segundos conductores do tribunal de contas sejam respectivamente iguaes aos dos primeiros e segundos officiaes da secretaria dos negocios da fazenda.

Conclue mondando para a mesa a seguinte

Proposta

No futuro, os vencimentos dos primeiros e segundos contadores e dos amanuenses do tribunal de contas serão respectivamente iguaes aos dos primeiros e segundos officiaes e dos amanuenses das secretarias d'estado dos negocios da fazenda, devendo estes vencimentos ser applicados aos que por acaso foram desde logo nomeados ou promovidos por virtude da execução d'esta lei. = Elvino de Brito.

Foi admittida e enviada á commissão de fazenda.

(O discurso do sr. deputado será publicado na integra guando o devolver.)

O sr. Presidente: - A este artigo ha uma outra emenda mandada para a mesa pelo sr. relator; mas como

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o sr. Elvino de Brito e o sr. relator do projecto desejaram que estas emendas fossem mandadas á commissão, parece-me escusado submettel-as á votação da camara, visto que a approvação do artigo é sem prejuizo das emendas que têem de ser consideradas pela commissão. Se a camara não faz reclamações, considera-se que a approvação do artigo não prejudica qualquer deliberação da camara sobre quaesquer emendas ou propostas que tenham sido enviadas á commissão.

Foi approvado o artigo 27.° e seguidamente os restantes artigos ao projecto, sem discussão.

O sr. Presidente: - Peço a attenção da camara por alguns minutos.

A sessão de hoje correu muito bem, satisfazendo-se a vontade da camara, que é soberana n'estes assumptos.

Preciso dar á camara uma explicação para meu governo e d'ella.

A camara está no seu plenissimo direito de dispensar o regimento, para que a hora antes da ordem do dia se prolongue o tempo, que for necessario. Eu entro, porém, em duvida se esse tempo vae prejudicar a ordem do dia.

Devia eu depois prolongar a sessão por mais tres horas, que são as que o regimento marca para ordem do dia? Sendo assim, hoje a sessão devia ir até ás oito horas, porque só se entrava na ordem do dia ás cinco.

Ora eu, emquanto a camara não deliberar o contrario, entendo dever considerar como prejudicado na ordem do dia o tempo que se gastou a mais com os assumptos de que os oradores se occuparam antes da ordem do dia. (Muitos apoiados.)

Ainda falta meia hora para se encerrar a sessão, mas tomo está dado para discussão um projecto importantissimo, não sei se a camara quererá que se encete o debate n'outra sessão. (Muitos apoiados.}

Como a camara não faz reflexões em contrario, dou por terminados os trabalhos, dando para ordem do dia de ámanhã o projecto n.° 40, que estava dado para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas menos um quarto da tarde.

Justificações de faltas apresentadas n'esta sessão

Participo a v. exa. o á camara que, por motivo do fallecimento de sua filha, tem faltado, e continuará por algum tempo a faltar ás sessões d'esta camara, o sr. deputado Manuel Pinto de Almeida. = J. A. Correia de Barros.

Participo a v. exa. e á camara que, por motivo justificado, faltei ás ultimas sessões. = O deputado por Villa Nova de Foscõa, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca.

Para a secretaria.

O redactor = Sergio de Castro.

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