SESSÃO N.º 8 DE 18 DE JANEIRO DE 1900 5
dem, repito, mas cujos resultados são de primeira ordem. (Apoiados.)
Depois os illustres deputados vinham aqui na sessão passada invocar todos os dias o serviço enorme que tinham feito, constituindo em deposito sagrado aquellas celebradas obrigações dos caminhos de ferro como recurso para pagamento de certa quantia por virtude do julgamento que um tribunal arbitral ha de proferir. E, seja dito de passagem, sempre me pareceram menos prudentes quaesquer referencias a um processo pendente e ao julgamento que hão de proferir arbitros, acima de toda a suspeita, e quaesquer manifestações de receio, pelo resultado final do pleito. (Apoiados.) Confio, certo, que aquelle tribunal ha de fazer-nos justiça, (Apoiados.) e tenho a convicção de que o resultado do pleito ha de cair, como uma desillusão, sobre aquelles que andam procurando descontal-o em nossc desabono e detrimento. Mas, emfim, desde que os illustres deputados julgaram dever constituir um deposito sagrado para assegurar esse pagamento, qualquer que elle venha a ser, pergunto: Pois este governo não resgatou essas obrigações, esses titulos não estão na posse da fazenda publica, como estavam? Então o que para vós era caso e louvor, ha de ser para nós objecto de vituperio? (Apoiados.) Como!? O que é gloria para uns, para outros ha de ser pena? (Apoiados.) Não póde ser. Não ha senão uma justiça, façam-nos a mesma que querem para si.
O outro perigo que nos podia ameaçar seria uma circulação fiduciaria que fosse alem dos limites do possivel e do rasoavel.
Que fez o governo? Por uma providencia de terceira ou quarta ordem...
O sr. Arroyo: - De quinta ordem.
O Orador: - De quinta ordem seja, o governo teimou em não augmentar essa circulação fiduciaria; resistiu, e d'essa resistencia, o que se viu? Os illustres deputado: sabem bem o que resultou.
Quem tem assim procedido, póde ter a consciencia de haver, procurado afugentar todos os perigos para que os illustres deputados vem aqui chamar a attenção do governo.
Prudencia! Devemol-a ter, por certo. Previdencia! É condição forçada dos homens d'estado.
Mas, alem d'isso, é necessario tambem ter animo, e incutir no povo confiança, em si proprio, para que se não possa dizer como o illustre deputado o disse em termos duros:, os maiores inimigos de Portugal são os portuguezes. É necessario que os homens publicos, que, como já disse n'esta camara, têem missão de almas, digam ao povo que elle vale jnaia no conceito das nações da Europa do que se julga; e em logar de vir aqui dizer-lhe que póde haver uma hora em que Portugal deva morrer de pé, convem dizer-lhe que ao paiz cumpre porfiar por viver e que para isso tem todos os recursos.
Uma nação só morre quando em vez de perseverar na lucta em que se acha empenhada se deixa tristemente abater!
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Presidente: - Vae ler-se um officio enviado pelo tribunal de verificação de poderes, que approva as eleições dos srs. Pedro Mascarenhas Gaivão, por Lagos, e Adolpho Loureiro, por S. Thomé.
(Leu-se.)
O sr. Presidente: - Em vista da communicação que acaba de ser lida, proclamo deputados os srs. Mascarenhas Gaivão e Adolpho Loureiro.
Constando-me estar nos corredores da camara o sr. Loureiro, convido os srs. deputados Fortuna Rosado e Vellado da Fonseca a introduzirem s. exa., a fim de prestar juramento.
Foi introduzido e prestou juramento.
O sr. Antonio Cabral: - Pedi a palavra para um assumpto estranho ao que acaba de ser discutido.
Quero chamar a attenção do sr. ministro dos estrangeiros para um facto de que s. ex a, e talvez os meus illustres collegas, tenham conhecimento pelos jornoes.
No anno passado falleceu na India, victima da peste, um medico distinctissimo, o sr. Sousa Proença, que com todo o amor se dedicara ao estudo d'essa enfermidade, e que a procurava combater com a valentia de um soldado, como realmente foi na companha que intentou contra aquelle flagello.
Infelizmente succedeu-lhe o que succcdeu aqui a esse integra da sciencia chamado Camara Pestana. O distincto medico falleceu victima d'aquella doença, e, já quasi moribundo, dirigiu a El-Rei uma petição, rogando-lha o maximo interesse pela sorte de seu filho.
Essa petição vem hoje transcripta n'um jornal da manhã, e desejo pedir ao sr. ministro dos estrangeiros que me diga, caso o possa fazer, se o governo tenciona tomar qualquer providencia de forma a melhorar a situação do filho d'este medico; porque, caso s. exa. me responda que o governo não póde tomar qualquer providencia n'este sentido, eu desejo tomar a iniciativa, como representante da nação, de apresentar á camara um projecto de lei, com
O fim de melhorar a sorte d'essa creança que hoje não tem pae, que o perdeu n'uma campanha contra a peste na India; e que não tem mãe, pois já a tinha perdido anteriormente ao fallecimento de seu pae.
Sr. presidente, se o nobre ministro não me póde informar hoje sobre este ponto, desejo que s. exa. o possa fazer n'uma das proximos sessões; porque, repito, caso o governo não possa tomar qualquer providencia n'esse sentido, desejo elaborar um projecto de lei que tenha por fim melhorar a sorte d'essa creança, projecto de lei que mandarei para a mesa, a fim de que v. exa., sr. presidente, depois das commissões darem sobre elle o seu parecer, o dê para ordem do dia e o faça discutir, e até, se for possivel, conjunctamente com outra providencia que a camara tenha de tomar com relação á filha do sr. dr. Camara Pestana.
Para esclarecer este assumpto vou ler a petição que o dr. Sousa Proença fez quando já se encontrava na agoiua da morte. É a seguinte, conforme se encontra no Diario de noticias:
"Senhor. - Emygdio Jacob de Sousa Proença, delegado de saude de Damão, depõe nas mãos de Vossa Magestade respeitosamente esta supplica.
"Nos ultimos dias de fevereiro de 1897 declarou-se em Damão pequeno a terrivel epidemia de peste bubonica, a um durou seis mezes, fazendo innumeras victimas. Em dezembro do mesmo anno recomeçou o fiagello, propagando-se em Damão grande, que anteriormente tinha sido poupado por as mais rigorosas medidas de isolamento.
"O supplioante n'esta e n'aquella crise cumpriu o seu dever de medico encarregado do tratamento dos accommettidos da peste, porem no maior accesso da lucta o supplicante que tambem agora victima da mesma doença.
"E não é de admirar, pois que visitava, por media, trinta doentes diariamente, chegando a haver dias de setenta e oitenta.
"O supplicante, no desempenho do seu tão perigoso ministerio, inspirou-se sempre nos impulsos do seu coração e nos sentimentos altruistas que a educação lhe radicara na alma, conscio de que a abnegação e solicitude com que cumpria o seu dever eram recommendadas pela sua consciencia de medico official, ao appello de tantos desgraçados que, no perdimento dos melhores e mais validos membros da sua familia, se viam reduzidos á orphandade, ao abandono, á pobreza a mais horrorosa.
"Empenhou-se na lucta sem reserva nem reflexão alguma ácerca da sua segurança pessoal, não pensando nem