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mas tambem obstar a que estejam aqui e tomem em parte nas nossas discussões e votações, tanto mais quando até elles têem obrigação de estarem na Camara ou Camaras até que cheguem os seus supplentes.

Não quererem contar os Deputados do Ultramar no numero de 62 para constituir a Junta, e demais a mais não se querer que façam parte da Junta depois de constituida, e tomem parte nas suas decisões, é, na minha opinião, uma coisa contra o espirito e lettra do Decreto no artigo citado; por que o artigo 102 diz, — Logo que se tenham reunido metade e mais um dos Deputados eleitos pelos circulos do Continente do Reino, constituir-se-hão em Junta Preparatoria. — Parece-me que isto quer dizer, que logo que entrem nesta Casa os Membros que n'ella podem ter assento neste numero de metade e mais um que se reputa necessario para se constituir a Junta, ella se deve constituir, e tomarem parte nas suas discussões e deliberações os Deputados presentes, ainda que esse numero de 62 seja composto de Deputados do Continente. O artigo não falla senão do numero.

Resumindo concluirei, dizendo, que os Deputados do Ultramar podem constituir-se para entrarem no numero de 62, que se reputou legal e sufficiente para se constituir a Junta, por que elles têem iguaes direitos a nós; e sendo tanto Membros da Assembléa como nós outros, devem tambem tomar parte nas discussões e deliberações da Junta Preparatoria. O contrario disto é odioso, por que me parece não estar nem no espirito, nem na letra do Decreto Eleitoral. (Apoiados)

O Sr. Jeremias Mascarenhas: — Sr. Presidente, sou já Deputado antigo; sou já sobejamente conhecido; não tenho necessidade de me inculcar, e por isso não tinha empenho em tomar parte nas primeiras discussões desta Junta; devia deixar campo para os Srs. Deputados eleitos, que são novos, poderem satisfazer a natural propensão, que todos temos, de sermos conhecidos do publico, quando pela primeira vez nos apresentamos em scena publica. Devia pois abster-me de tomar parte neste debate, mas sou um dos Deputados pelo Ultramar: a questão respeita aos Deputados em geral passados e futuros daquellas provincias, a resolução della ha de ser um precedente, que por ventura deva poderosamente influir nas decisões das Juntas Preparatorias das Legislaturas seguintes.

E conveniente por isso, que a causa não corra á revelia; que haja um protesto contra a decisão da Junta, se fôr contraria aos direitos dos Deputados pelo Ultramar; pela contestação das razões infundadas, com que se pertende cercear os direitos, aliás incontestaveis, dos Deputados pelo Ultramar para tomarem parte nas deliberações da Junta.

Entro pois neste debate e fallarei nelle precisa e resumidamente, não só para não tomar-me fastadioso á Junta, mas tambem para satisfazer aos meus amigos, quê me pedem brevidade. Não seguirei os meus adversarios a passo e passo; mas para haver precisão e clareza no debate, em que vou entrar, dividirei a discussão em duas partes; na primeira examinarei, se os Deputados pelo Ultramar, a pezar da letra do artigo 102.º do Decreto Eleitoral de 30 de Setembro ultimo devem ser contados para fazerem o numero marcado para se constituir a Junta Preparatoria; na segunda examinarei se, supposto mesmo que não devam ser contados para este numero, podem elles tomar parte nas deliberações da Junta Preparatoria.

Não tenho a fortuna de ser formado em Leis, mas tenho por curiosidade lido as obras de alguns Júris-consultos; tenho alguma noção de Hermeneutica juridica, e seguindo esta, a interpretação das Leis é de duas qualidades, uma authentica, outra doutrinal esta ou é lala e extensa, ou restricta e limitada, ou declaratoria. A lala é, quando a disposição da Lei se extende para mais do que parece significar a letra da Lei, a fim de se attender ao espirito da mesma. A restricta é, quando o sentido se limita para menos, do que significa a letra, e a declaratoria, quando o sentido se não amplia, nem restringe, mas se toma exactamente conforme a natural significação das palavras. Esta é a doutrina corrente, como sabem os Srs. Jurisconsultos, que se assentam nesta Casa, a quem peço perdão, se metto a fouce na seara alheia;, mas faço-o por precisão, e parecer-me necessario para o fim, que me propuz.

O Sr. Avila, meu respeitavel amigo, e que me merece particular consideração por muitos titulos, n'outro dia, quando fallou, ainda que de passagem nesta questão, disse, que esta Junta não tinha direito para interpretar o Decreto Eleitoral de 30 de Setembro; e eu estou perfeitamente de accôrdo com S. Ex.ª, se fallou da interpretação authentica porque nem a Junta, em quanto Preparatoria, nem depois de constituida em Camara, nem a Camara dos Dignos Pares, nem outro algum Poder Politico tem este direito, senão só e exclusivamente o Poder Legislativo; isto é, os Corpos Collegislativos com a Sancção Regia. Mas, se S. Ex.ª fallou da interpretação doutrinal, como parece, peço venia a S. Ex.ª para dissentir da sua opinião; porque estou convencido, que deste direito da interpretação não póde ser privado um simples particular, que quer intender a Lei, e muito menos a Junta Preparatoria, que tem de applical-a ás especies de constituição da Junta, da validade, e nullidade das eleições dos Deputados eleitos, e em outras muitas, que se comprehendem debaixo das suas attribuições legaes. Isto posto para se saber bem o sentido do artigo 102.º do Decreto Eleitoral, é mister interpretal-o doutrinalmente para evitar absurdos, e conflicto ou collisão com outras Leis, e dar-lhe uma interpretação lala para se corresponder á intenção do Legislador, que é o espirito da Lei (Apoiados) como vou mostrar.

Nunca uma Lei é cousa ociosa; pertende-se por ella alguma cousa; ella serve de meio para se conseguir algum fim. (Apoiados) Sendo isto assim; que é o que se pertendeu neste artigo? Porque apparece elle sómente neste Decreto, e não n'outros muitos que o tem precedido? Qual foi o motivo, que tornou necessaria esta disposição regimental? E facil saber. Na Junta Preparatoria da Camara dissolvida não se attendeu a Proposta, de que para funccionar a Junta bastava o numero, que correspondesse ao de metade e mais um das eleições já realisadas, com deducção das eleições reiteradas, da qual opinião fui tambem eu, mas resolveu-se que era necessaria para a constituição da Junta a presença de metade e mais um do numero total dos Deputados que devem compor a Camara, entrando neste numero os Deputados pelas Ilhas, e pelo Ultramar, com quanto se soubesse, que nessas provincias não tenha havido eleições, pela certeza do tempo.