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126 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Não são porventura causas identicas as que em parte o têem favorecido no continente?

Que necessidade ha então de uma questão agraria para explicar tal phenomeno?

Mas admittamos por hypothese que a questão agraria, esse espectro vermelho das convulsões sociaes, que tanto ahi se agitou na imprensa monarchica por occasião das ultimas eleições, admittamos que essa questão era realmente a cumplice nas tristes e lamentaveis scenas que ensanguentaram aquella ilha. Quid inde? Podia ainda n'este caso repetir que a culpa era apenas do governo; e sabem os srs. deputados porque?

Sabem porventura quem levantou a questão social na ilha da Madeira, na vespera da eleição?

Sabem quem fez reviver em um jornal esse problema que tanto serviu depois para que os adversarios do partido republicano podessem especular no continente com similhante propaganda?

Foi um delegado do governo, e o que é mais, um delegado que tem gosado até hoje da inteira e illimitada confiança do sr. ministro da justiça, com grave detrimento, digo-o aqui á face do paiz, sem receio de que ninguem me desminta, da seriedade e da dignidade da magistratura portugueza!

Tenho, aqui n'estes documentos accusações dirigidas ao referido funccionario de tal maneira graves e extraordinarias, que nem me atrevo a lel-as á camara, podendo ser examinadas no entretanto por quem o desejar; accusações a que ainda não se respondeu nem por parte do accusado nem por parte do governo, e que por si só são bastantes para lançar o stygma de eterna infamia sobre a obra a que aquelle funccionario se está prestando na ilha da Madeira como instrumento...

O sr. Presidente: - Pedia ao illustre deputado que retirasse a palavra infamia.

O Orador: - Peço licença para lembrar a v. exa. que o sentido etymologico da palavra infamia é má fama, e na verdade não deixarão boa fama nos annaes da nossa historia os homens que promoveram as tristes scenas que enlutaram a ilha da Madeira. Em todo o caso, não tenho duvida em retirar a palavra, visto que v. exa. assim m'o pede, permanecendo todavia, a idéa, que com tal expressão eu quiz significar.

O artigo, a que me referi, é do jornal O direito, e já foi devidamente classificado por cavalheiros que se senta n'esta camara.

Tenho aqui tambem os documentos d'essa classificação, e se não a leio agora á camara é para não estar a cansal-a com episodios.

Alem d'isso este artigo foi reproduzido em diversos jornaes, e creio que é conhecido de todos.

Bastará dizer que tal escripto é assignado pelo sr. Bernardo Vieira Pinto de Andrade, delegado na Ponta do Sol.

Foi este o unico individuo que levantou na Madeira a tal questão social; e se esta questão ali existe, e sobre ella impendem tão graves responsabilidades, a culpa é do governo que ainda o não demittiu, como foi em tempo exigido pela imprensa do partido progressista.

Não desejo perder-me em divagações, sr. presidente, que possam levar-me alem do proposito do meu discurso, mesmo porque, quando essas opiniões sejam aqui por alguem rebatidas, não terei duvida em subir novamente a esta tribuna para accentuar, explanar e desenvolver tudo o que por motivo de brevidade não póde deixar de ser agora em muitos casos uma mera asserção.

Eu disse na sessão anterior, sr. presidente, que para mim a eleição da Madeira representava um plano harmonico, completo, desenvolvido com atroz pertinacia, de um systema de terror empregado n'aquella ilha contra o partido republicano.

E por que rasão se empregou esse systema de terror na ilha da Madeira?

Porque, srs. deputados, no meu paiz os homens que se sentam nas cadeiras do poder são exactamente os ultimos a saber zelar a causa de que se dizem os defensores; porque no meu paiz os homens que deviam fazer com que as instituições, que elles representam, se não podessem ser amadas por todos, ao menos não fossem odiadas, são exactamente os que parecem apostados em fazer com que no dia em que este regimen haja de sumir-se nas sombras da historia e tenha de ser substituido por outro regimen mais perfextivem, elle desappareça não só sem saudades da nossa parte, mas porventura acompanhado dos nossos odios e da nossa exeração!

Para mim, srs. deputados, o systema de terror estabelecido na ilha da Madeira é uma das maiores insanias, é um dos maiores delictos, é um dos maiores crimes, que os partidos monarchicos em Portugal têem commettido n'estes ultimos tempos. Porque de duas uma; ou a propaganda republicana é justa, ou injusta.

Se ella é injusta e se é filha apenas da phantasia de um certo numero de individuos convencidos ou não dos dogmas politicos que pretendem apostolar perante as massas, dogmas, porém, sem rasão de ser objectiva para que tal propaganda possa fructificar; se ella é apenas o producto doentio de cerebros exaltados, ou o sonho irrealisavel de alguns devaneadores inoffensivos, então deixem-na entregue a si propria que o tempo a destruirá.

Mas se, pelo contrario, ella represneta uma idéa justa e se significa, alem de uma aspiração organica, o protesto altivo e vehemnete contra os desvarios d'estes governos que por tanto tempo nos têem dominado, então não é a ferro e a fogo, srs. deputados que o partido republicano desapparecerá, eu vol-o prognostico; não é por esta fórma que a paz se restabelecerá dentro da nossa esphera politica; não é d'este modo que os srs. ministros poderão continuar descançados nas cadeiras, de onde fazem gala em affrontar os legitimos brios da nação!

Mas o systema do terror estabeleceu-se na Madeira, continua ainda, e pelo modo como eu vejo dispostas as cousas continuará ainda por bastante tempo.

Mas cuidado, senhores, com o accordar do leão!

Julgaes-vos por agora fortes e invenciveis?

Não importa. Ao menos ha de protestar-se contra esse systema; ao menos ha de ficar transcripta nos annaes parlamentares a nossa condemnação contra, esse expediente: funestissimo da politica monarchica, funestissimo expediente, sobretudo para vós, como o futuro se encarregará de o mostrar!

O terror na ilha da Madeira estabeleceu-se antes da eleição, continuou durante o acto eleitoral e prosegue ainda hoje, que a eleição terminou.

E o terror continua hoje, tendo arrastado ásecadeias do Funchal e Ponta do Sol noventa e tantos innocentes, e entre elles um brioso e illustre jornalista, em parte para preparar o campo para uma eleição nova, e em parte para cohonestar os criminosos, actos do dia 29 de junho do anno findo e servir de commentario a esta discussão que está tendo logar.

Era preciso que a discussão n'esta casa tivesse como supremo argumento a opinião dos republicanos. Era preciso que essa discussão tivesse como prologo a preparar os espiritos o facto de sensação de estarem os cárceres atulhados de criminosos, que a final são tão criminosos que os que já compareceram nas duas primeiras audiencias foram absolvidos!

Depois era tambem indispensavel que lá o villão fosse aprendendo com o exemplo qual a recompensa que poderia esperar, se para a primeira vez persistisse em dar o seu voto aos republicanos. E aqui está o motivo das perseguições, sr. presidente.

Mas não antecipemos.