SESSÃO N.º 9 DE 27 DE JANEIRO DE 1898 135
muitas vezes ha motivos que, estranhos aos desejos e compromissos de s. exa. não deixam resolver com a promptidão precisa e conveniente certos negocios.
Mas como eu me não enfado no cumprimento do meu dever, e como me não incommoda o ser taxado do impertinente quando o cumpro, voltarei a este assumpto tantas quantas vezes foram precisas até o ver resolvido como o nobre ministro prometteu.
Já que me estou referindo a cousas da cidade de Coimbra, a que tão estreitos laços de familia e de interesses me prendem, ainda farei outras ligeiras considerações com referencia a um assumpto tambem importantissimo, que corre pelo mesmo ministerio que s. exa. tão dignamente honra.
Terminou ha dias o praso do concurso para as obras, por meio de empreitada, dos esgotos e saneamento da cidade de Coimbra, obras que têem sido tantas vezes reclamadas ao governo, e que elle reconheceu de urgente necessidade dever mandar fazer.
Não me demorarei a encarecer o grande alcance, para a cidade de Coimbra, para a sua salubridade e garantia da vida dos seus habitantes e da numerosa população academica que ali reside a maior parte do anno, da realisação de um tal melhoramento. Por demais é conhecida a vantagem e a necessidade.
Succede, porém, que o concurso ficou completamente deserto! O que prova que as condições em que foi aberto não satisfazem por fórma nenhuma o são de tal natureza que afastam os concorrentes, parecendo mais um concurso para illudir esperanças do que para satisfazer promessas e compromissos sagrados!
Pedia, pois, a s. exa. que se dignasse dizer-me, com a lealdade propria do seu caracter, se está resolvido a mandar abrir um novo concurso em bases e condições de viabilidade e não illusorias, que difficultam e impedem o desejado começo de trabalhos?
E ainda peço mais a s. exa. que me responda, se n'isso não ha inconveniente, e penso que não, de no caso do novo concurso ficar deserto pensa ou não em mandar proceder sem demora ás obras por conta do estado, abandonando a idéa das empreitadas; ou que providencias adoptará de accordo com o governo, para evitar o prolongamento de uma demora que tantos prejuizos causa á saude e hygiene publicas da cidade de Coimbra, que anciosa e sobresaltada aguarda, como eu, a resposta de s. exa. que, repito, peço seja leal e sincera, como da pessoa que a dá.
Como já disse, estamos em vesperas de discutir o orçaçamento, e por isso é tambem occasião de s. exa. ter margem de poder, por qualquer modo, attender, ainda dentro do anno economico, este importante assumpto, no caso das obras terem de ser começadas por conta do estado, como naturalmente não poderá deixar de ser. S. exa. o dirá e eu aguardarei a sua lealissima resposta.
E agora, sr. presidente, mando para a mesa o projecto de lei, a que me referi, com o qual o governo e especialmente o nobre ministro das obras publicas estão de accordo, como não podia deixar de ser desde que se trata de um assumpto que tanto interessa ao progresso e desenvolvimento da industria nacional, que lhe deve merecer protecção.
(Leu.)
Como se vê, trata-se da creação de uma escola de desenho industrial em Castanheiro de Pera, melhoramento de ha muito reclamada como satisfação ás necessidades do ensino da numerosa classe operaria d'aquella localidade.
Sr. presidente, pedindo a v. exa. que a este projecto já dado sem delongas o destino marcado no regimento, não preciso alargar-me em grandes considerações para mostrar a argento necessidade d'elle ser convertido em lei.
O ensino oficial do operariado portuguez impõe-se como um dever do estado, está no programma de todos os partidos, como no espirito de todos os estadistas dignos de tal nome, e não é preciso tomar tempo á camara para provar as suas incontestaveis vantagens de reconhecida utilidade publica.
O centro fabril o industrial de Castanheiro de Pera, é um dos mais importantes do paiz. Tom treze fabricas de lanificios sustentadas por sete machinas a vapor e quatorze motores hydraulicos, empregam-se diariamente nos trabalhos fabris cerca de dois mil operarios de ambos ou sexos, e as ferias semanaes que estes recebem montam a 2:500$000 réis.
Se exceptuarmos Lisboa, Porto e Covilhã, parece-me poder asseverar que no paiz não ha nenhuma outra região industrial e fabril de tão grande movimento, e que com mais justificada rasão mereça a attenção dos poderes publicos e justifique com tão bons fundamentos a creação da escola de desenho industrial, como um beneficio indispensavel que muito deve concorrer para o aperfeiçoamento dos productos que ali se fabricam já em tão grande escala, rivalisando com os similares de outras procedencias mais adiantadas.
E se outras regiões, talvez menos importantes, têem sido dotadas de escolas, não só de desenho industriai, mas ainda de outras disciplinas porventura superfluas ao ensino profissional, sem terem tanto direito como Castanheiro, de Pera, é justo, justissimo, sr. presidente, que a este localidade se conceda o que pede e lhe é devido, e se attenda sem demora, á necessidade de se illustrar com o ensino profissional competente, os numerosos operarios das suas fabricas, que são tambem portugueses e como os de outros pontos do paiz merecem a attenção e protecção dos governos. E não se lhes negue o que justamente pedem e a que têem direito, em nome de uma mal entendida economia.
Eu não tenho negado, nem negarei, o meu voto n'esta camara, a nenhum projecto de lei que tenda a augmentar a despeza, provando-se que ella seja reproductiva e fomente a riqueza publica; porque é moda agora fallar-se em economias a proposito de tudo, por parte da oposição, e defendel-as a torto e a direito, sem se querer inquerir nem saber se são bem ou mal entendidas, e se d'ellas póde advir prejuizo ou lucro para o estado.
No meu entender ha muitas economias insustentaveis, que redundam em grande prejuizo, e n'este caso estão aquellas que tendem a deixar em atrazo a industria e a agricultura nacionaes, de que tanto se espera e que constituem a verdadeira esperança do nosso resurgimento economico.
Portanto, abstenho-me por agora de mais considerações, e quando o projecto vier á discussão e injustamente for impugnado por aquelle lado da camara, com o fundamento do augmento de despeza, eu justificarei plenamente as rasões attendiveis que militam em seu favor e que de certo hão de calar no animo dos illustres deputados, que tambem só agora se arvoram em sentinellas das economias, mas que, patriotas como são, de certo reconhecerão a grande utilidade d'elle se transformar em lei, não lhe orçando difficuldades, vista a sua capital importancia na merecida protecção que dispensa á industria de uma região fabril e industrial tão digna de ser considerada e de que muito ha a esperar como futura fonte de receite para o mesmo estudo que agora a auxilio.
Mando, pois, para a mesa o projecto, para que novamente peço a protecção da illustre commissão como do nobre ministro das obras publicas, declarando categoricamente que elle não tem intuito algum politico, nem é de natureza a poder suppor-se que patrocine qualquer interesse particular, devendo merecer a geral approvação da camara.
Ficou para segunda leitura,