SESSÃO N.º 9 DE 27 DE JANEIRO DE 1898 137
Por exemplo, os inventarios de maiores, segundo a lei, até 100$000 réis, devem ser começados e concluidos nos julgados; sem que tenham de ir ás comarcas, porém, os inventarios de valor superior a esta quantia, devem começar nos julgados, ir as comarcas apenas para a determinação de partilhas, e voltarem outra vez aos julgados para ahi serem concluidos.
Pois nada d'isto se faz. Os inventarios e mais processos que vão ás comarcas lá ficam e nunca mais voltam aos julgados.
D'aqui resulta que os emolumentos, que por lei pertenciam aos empregados dos julgados municipaes, são arrecadados nas comarcas.
Foi o sr. conselheiro Francisco Beirão, que creou os julgados municipaes, e não obstante esta medida ser muito combatida, principalmente pelos empregados das comarcas, o que é facto incontestavel, é que veiu trazer aos povos muitas vantagens e commodidades, já favorecendo os interessados pelo diminuição das custas, já porque tinham a justiça mais proximo e até mais rapida e mais commoda. Porém, como isto era natural, os funccionarios da comarca, que não viram n'aquelle decreto senão um cerceamento aos seus interesses e não uma medida de equidade para a administração da justiça, e vantagem para os povos, trataram por todos os meios de guerrear e embaraçar o regular e legal andamento da mesmos julgados. Ahi está um dos motivos por que os julgados municipaes baquearam.
Outro foi o mau pessoal que foi nomeado para desempenhar funcções tão importantes, como as de applicar as leis. Conheci em alguns julgados, principalmente, subdelegados e escrivães, verdadeiramente incompetentes; muitos, mal sabendo ler e de modo algum sabendo entender é que liam. Isto, congregado com a má vontade do pessoal das comarcas, deu o resultado que desde logo foi previsto. Comarcas ha, onde nunca baixaram aos julgados municipaes, n'ellas estabelecidos, inventarios, ou processos que ali subiram para sentença final, a não ser em virtude de recurso e por accordão do tribunal da relação.
Este venerando tribunal tem dado sempre provimento a todos os recursos, que ali têem subido para fazer baixar os processos e inventarios das comarcas aos julgados municipaes respectivos, logo depois da determinação da partilha ou da sentença final, para ali se proceder aos termos ulteriores do processo, annullando tudo o que na comarca se fez posteriormente a essa sentença.
Como, porém, na maioria das vezes, as partes não têem dinheiro, e como para cada processo é necessario um recurso ou appellação, que em preparos, emolumentos e petições ficam carissimos, lá são retidos e sepultados eternamente nos cartorios das comarcas, onde não deviam ter entrado senão de passagem. D'esta fórma de proceder, lesam-se os partes, que pagam mais e têem mais incommodos, e lesam-se os empregados é funccionarios dos julgados a quem pertenciam os emolumentos e salarios, que assim são recebidos pelos funccionarios das comarcas. Pois, não obstante a relação ter sempre, como disse, dado provimento aos recursos é ter designado ás comarcas, qual era a sua obrigação, continuam a não mandar baixar os processos aos julgados.
Eu podia citar o v. exa. alguns juizes, que escrupulosamente têem praticado este preceito da lei. Lembro-me de um que é dos mais distinctos ornamentos do magistratura portugueza, o sr. João Pacheco de Albuquerque, que foi meu condiscipulo no lyceu e actualmente juiz de direito na comarca de Cuba.
Foi ha tempo collocado n'uma comarca onde então existia um julgado municipal, e assim que tomou posse e entrou em exercicio, os empregados do julgado pediram-lhe para que os processos, que lá baixassem, não revertessem aos julgados, porque sendo assim, soffreriam muito nos seus interesses e nas suas finanças.
S. exa. respondeu com a delicadeza e cavalheirismo que lhe é peculiar, que se uso estivesse na lei, cumprir-se-ia, mas se não estivesse, não cabia nas suas attribuições, nem tinha interesse, nem vontade de pelos seus despachos prejudicar, os seus empregados, para favorecer outros. E sempre religiosamente cumpriu a sua palavra, pois que por despacho na propria sentença, mandou baixar aos julgar dos municipaes todos os processos, que a estes pertenciam o que por direito não devessem ficar na comarca. Este illustre magistrado nunca deixou de cumprir este preceito legal.
Mas emquanto este cavalheiro procedia assim, outros collegas seus, procedem de modo contrario. É por isto que eu desejava chamar a attenção do sr. ministro da justiça e pedir-lhe que imponha a sua auctoridade para que se mande baixar aos julgados municipaes todos os processos, que a estes pertencem e que estes archivados nas comarcas e bem assim os processos orphanologicos, inventario de maiores e acções civeis, que vão á comarca para determinação da partilha ou sentença final, e outros quaesquer que por direito devam baixar, tanto findos, como pendentes, ou que de futuro ali subirem.
As minhas palavras não se dirigem contra a magistratura judicial, que á uma dos garantias sociaes, que eu respeito e considero, pela imparcialidade das suas decisões.
Não quero fazer a mais leve insinuação a estes magistrados, que no seu alto criterio entendem que assim devem cumprir a lei, museu discordo de s. exa. sem com isto querer offender o seu melindre ou a sua susceptibilidade.
Não me alongo em mais considerações visto não estar presente o sr. ministro da justiça, e mando para o mesa o seguinte requerimento:
«Requeiro que, pelo ministerio da justiça, seja pedido a cada julgado municipal, para me ser enviado, um mappa de todos os inventarios orphanologicos, de maiores e processos civeis, que em virtude da lei subiram ao juizo de direito para determinação de partilhas ou proferir sentença final, especificando cada mappa o seguinte:
«l.° Nome dos inventariados e inventariantes, e auctores e réus;
«2.° Valor de cada inventario ou acção civel;
«3.° Quaes dos acima referidos, que baixaram ao juizo municipal para se proseguir na partilha em virtude de fórma dada pelo respectivo juizo de direito, e quaes as acções civeis que, depois de proferida a respectiva sentença, baixaram ao julgado municipal para ali se proceder á sua execução;
«4.° Motivo por que os mesmos inventarios e acções baixaram, especificando se foi por despacho no acto do determinação das partilhas, se em virtude de recurso superior;
«5.° Importancia das custas do incidente do respectivo recurso;
«6.ª Quaes os inventarios e acções que ainda não baixaram ao julgado para o referido fim;
«7.° Nota da correspondencia trocada entre os sub-delegados dos julgados municipaes e os delegados das respectivas comarcas, que dizem respeito aos referidos inventarios e acções. = O deputado, F. J. Machado.»
Já que estou com o palavra declaro que vou mandar para a caixa respectiva um requerimento do capitão de cavallaria reformado pela junta moral, Antonio Baptista Lobo...
Este official requer á camara dos senhores deputados para ser readmittido no serviço activo, porque se julga prejudicado nos seus direitos o illegalmente separado do serviço; junta uma tal copia de documentos comprovativos da sua capacidade moral, que, me parece, a camara e o commissão respectiva, lendo-os, não poderão deixar de lhe dar rasão, reparando, a meu ver, uma flagrante injustiça,