SESSÃO DE 16 DE JANEIRO DE 1886 65
não tinha sido eleita no dia 7, porque o administrador do concelho tinha, por auctoridade sua, mandado sair para fora da casa da camara trinta eleitores que lá estavam, impedindo assim que funccionasse a assembléa, que estava, constituida para exercer os seus direitos eleitoraes.
S. exa. não estava presente, e portanto não me póde responder. Depois na camara alta um digno par chamou a attenção do governo para este mesmo ponto, e consta-me que o governo respondeu que já tinha mandado suspender o administrador do concelho.
Mas, sr. presidente, a questão não é de suspender o administrador do concelho, a questão é de saber como e quando se ha de ali eleger a commissão de recenseamento que não foi eleita no dia 7 nem no dia 8, porque o administrador do concelho, num e noutro dia, embora por diversos modos, impediu que se fizesse a eleição.
A suspensão, que não basta para punir, ainda menos basta para prover de remédio á falta de administração.
Eu bem sei que lá estão os tribunaes judiciaes para julgar o delicto, mas a questão é o facto que resultou d'elle. O concelho de Sabugal não tem commissão de recenseamento eleita.
Pergunto ao sr. ministro se deu algumas providencias sobre o modo de se realisar a eleição. Era isto que eu desejava que o sr. ministro do reino me dissesse; mas s. exa. não está hoje na camara, como ainda este anno não esteve dia nenhum, porque s. exa. tem sempre que fazer quando ha parlamento.
Alem d'este ha outro facto no mesmo districto, similhante no fundo, mas com circumstancias muito mais serias e graves. Refiro-me ao que se passou no concelho da Meda. É preciso dar delles conhecimento á camara, e não a dei ha mais tempo, porque pedi informações para lá, que só hoje me chegaram.
Vou dizer com verdade o que se passou, prestando plena confiança no cavalheiro respeitável que assignou as informações que me vieram.
No dia 7 não houve tambem, como no concelho de Sabugal, a eleição da commissão recenseadora, mas estavam dispostos os maiores contribuintes do concelho para a fazerem no dia 8. E quando se iam encaminhando para a casa da camara alguns delles, que eram, como não podiam deixar do ser, dos cavalheiros mais grados do concelho, depararam com um grupo de gente, donde sairam vozes de «lá vem elles».
Sendo todos homens serios, pacificos, de boas intenções, e indo todos desarmados, não pensavam em desordem ou barulho.
Um d'elles era um cavalheiro formado e proprietario, que exerceu ali com muita distincção alguns cargos de serviço publico, tendo sido juiz ordinário, quando estes juizes não eram ordinarissimos, como são hoje, mas juizes letrados e competentes, como os pensou e realisou o meu prezado amigo o sr. conselheiro José Luciano de Castro.
Foi depois disso presidente da camara, é, emfim, um homem muito considerado e muito digno de o ser naquelle concelho.
Pois foi a primeira victima. Contra elle se dirigiram, foi agarrado por dois malfeitores, na presença do administrador do concelho, foi arrastado de encontro a uma parede, e com uma machada deram-lhe na cabeça, felizmente de raspão, porque se fosse em cheio o matariam. Depois desse foram feridos mais dois, conta que foi a mais viva senha dos malfeitores, ficando um d'elles em perigo de vida com facadas e golpes de machada. Noutra parte era outro arremessado ao chão e espesinhado, e um quinto deveu a vida a um sobretudo forte, que lhe serviu de escudo contra uma navalhada que lhe ia dirigida ao peito, e apenas feriu n'um braço.
Em conclusão: no dia 8 houve no concelho de Meda nada mais nada menos do que cinco ou seis homens feridos, dos quaes tres gravemente, e dois com feridas cuja gravidade não posso avaliar.
Estes factos foram praticados na presença do administrador do concelho. (Apoiados.) Não direi que fossem determinados por elle, mas affirmo que foram por elle presenciados, que foram por elle consentidos, que a sua presença os animou, que não prendeu ninguém, que não fez, menor diligencia para pôr termo ao conflicto, no qual era parte activa um seu empregado, amanuense na administração do concelho.
Pois não só não tomou providencia nenhuma no proprio acto da desordem, mas depois destes factos praticados, o administrador do concelho foi, com os homens que tinham feito estas malfeitorias, fazer uma cousa a que chamou - eleição da commissão de recenseamento! N'esse dia, de tarde, passeou com os malfeitores pelas das da villa e depois disso tem feito com elles conciliabulos em sua casa!
E o que é mais sério, é que é este administrador do concelho quem está fazendo o auto de investigação para ser mandado ao juizo criminal. Elle, que foi, ou auctor ou cumplice, constituiu-se parte para investigar e noticiar o crime. (Muitos apoiados.) Com que verdade e imparcialidade será feito o auto! (Muitos apoiados.)
Segundo consta, o sr. ministro do reino disse na camara dos pares, que tinha mandado suspender o administrador; mas tenho uma carta do dia 14, em que se affirma, que o administrador do concelho, não só não foi suspenso, mas está em exercício e procedendo a auto de investigação! Comprehende-se muito bem, que, sendo os amigos do administrador que fizeram o delicto, seja o administrador que queira fazer o auto de investigação; (Apoiados) ha de dispor as cousas de modo que todos fiquem o menos possível culpados. Mas o que não comprehendo é que o governo, em nome da segurança e como garantia de ordem para aquelle concelho, que está numa desoladora perturbação, não mande retirar immediatamente d'ali aquelle homem. Conheço-o muito bem, ha dezeseis annos; e o seu nome é bem conhecido n'aquelle districto; é incapaz moralmente, quando não fosse physicamente, de ser administrador do concelho. O administrador de Meda é um empregado aposentado do governo civil da Guarda. De modo que, sendo julgado incapaz para o serviço sedentário da secretaria, reputaram-no capaz de exercer as funcções activas e trabalhosas de administrador de um concelho. E da sua incapacidade moral ha prova na própria secretaria do governo civil.
Faço justiça ao sr. governador civil do districto da Guarda, suppondo que, se conhecesse bem o homem, não o mantinha como empregado de sua confiança, e num logar d'aquelles.
Desejava saber se effectivamente o sr. ministro já deu as ordens necessárias para que o administrador do concelho fosse suspenso, quando menos.
O que não póde continuar é que o administrador do concelho esteja no exercício das suas funcções, levantando o auto de investigação sobre acontecimentos, em que elle foi, quando não o mandante, pelo menos cumplice.
Peço, portanto, em nome da ordem publica daquelle concelho, que o governo tome as providencias immediatas que são necessárias, para conseguir ali a ordem, que ninguém quer mais do que eu, porque ninguém me póde accusar de procurar estabelecer a desordem em parte nenhuma.
Ordem quero, e ordem peço, mas ordem moral como principio e base da ordem material. O primeiro principio de ordem é a justiça, e a justiça, se exige o cumprimento de todos os deveres, tambem garante a manutenção de todos os direitos. Tenho dito.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, a camara está fatigada de uma longa sessão em que diversos assumptos se têem mais ou menos atropelado; eu mesmo,
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