66 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
que suppuz ter a palavra logo em seguida ás explicações ciadas pelo sr. ministro da fazenda, e quasi contrafeito que uso agora d'ella para responder a s. exa., mesmo porque já parte dos factos que tinha de memoria para rectificar ao sr. Hintze Ribeiro me passaram da idéa na confusão de um tão desordenado debate.
Direi comtudo ao sr. ministro, que não se trata agora de apreciar, nem de discutir, a doutrina dos decretos, e especialmente a do decreto n.° 4 do 17 de setembro de 1885.
Sei que o sr. ministro da fazenda foi muito habil em se aproveitar de uma parte do discurso do sr. Eduardo Coelho para deixar desusar para ali I a sua oratória; mas eu, que comecei por dizer, que pela minha parte estava disposto, tanto quanto podesse, a contribuir para que a discussão se mantivesse dentro dos limites da regularidade, a fim de que d'ella podesse resultar algum proveito, tomo a liberdade de chamar o sr. ministro da fazenda novamente ao terreno onde o desejo collocar, e donde não estou disposto a deixai-o sair.
No entretanto e para acompanhar s. exa. ab initio na sua replica, começarei por apreciar a declaração prévia que s. exa. entendeu dever apresentar á camará.
Disse o sr. ministro, que o motivo em virtude do qual não tinha podido até hoje comparecer nesta casa, era porque negócios graves de interesse publico o tinham prendido na sua repartição; e depois, mostrando triumphantemente o salvo conducto ou o passaporte que lhe abonava neste ponto a asserção, apresentou os três ou quatro volumes que estão sobre a mesa, e que são, no entender de s. exa., as testemunhas mudas, mas eloquentes na sua mesma mudez, que o sr. ministro até hoje, com todo o cuidado e desvelo tinha applicado a sua attenção, para assumpto que, sou o primeiro a confessar, é da mais alta importância. Até baixinho se dizia ahi pela maioria, que para o sr. Hintze Ribeiro poder, vir hoje á camara, ainda as folhas do ultimo volume estavam húmidas, taes como haviam saído á pressa da imprensa.
Ha evidentemente da parte do sr. ministro da fazenda, n'este panto, um equivoco, quando suppõe que a apresentação dos documentos que ha pouco mandou para a mesa com as folhas enxutas ou molhadas, póde ser uma desculpa da sua não comparencia na camara até hoje.
Aquelles documentos saíram hoje da imprensa, é verdade, mas não consta que o sr. ministro da fazenda tivesse tão assiduamente collaborado na revisão das provas, a ponto de ter de esperar até á ultima hora pelo acabamento dos volumes. (Riso. Apoiados,)
Os documentos que vem colligidos n'aquelles volumes, deviam estar ha muitos mezes concluidos por parte do sr. ministro da fazenda, suppondo mesmo que todos elles fossem da redacção de s. exa., o portanto não póde ser esta a desculpa de s. exa. não ter até agora comparecido. (Apoiados).
Se não foi, pois, o assumpto adduzido como desculpa que tem inhibido s. exa. de comparecer, de certo os meros negocios de expediente de repartição não podem servir de pretexto ao sr. ministro para não ter vindo responder ás perguntas urgentes, que repetidamente, durante mais de uma semana, aqui lhe foram feitas.
Dito isto, e passando desde já a apreciar a forma como o sr. ministro respondeu ás tres perguntas que lhe dirigi, direi que s. exa. absolutamente não me satisfez, porque não respondeu a uma única dessas perguntas.
Disse eu que desejava saber se já tinham sido expedidas ordens para o pagamento dos dois mezes atrazados aos guardas fiscaes do districto do Porto, s. exa. respondeu a isto encarecendo as difficuldades do regimen transitorio que necessariamente hão de acompanhar o começo de execução da sua reforma aduaneira.
Que a reforma aduaneira levada a cabo pelo sr. ministro da fazenda havia, de ter, não só estas difficuldades mas ainda outras maiores, isso sabíamos nós os deputados da opposição, e até bem alto o dissemos a s. exa. quando no anuo passado arrancou do parlamento a auctorisação latitudinaria para reformar as alfândegas. (Apoiados.)
Mas não é das difficuldades resultantes da reforma do sr. ministro que se trata agora. Trata-se de saber se porventura a esses pobres funccionarios do estado, que são dignos de toda a contemplação, já foi satisfeito o que por direito lhes compete, ou se a existência desses velhos carregados de serviços e a existência de suas famílias póde estar á mercê das difficuldades que se levantam com a execução de um decreto mais ou menos cerebrino. Aqui está do que se trata!
O que é preciso saber é como o sr. ministro acautela esta hypothese, que não póde deixar-se única e exclusivamente entregue aos acasos do funccionamento, porventura tardio, d'este regimen transitório. (Apoiados.)
Como é que s. exa. tratou de occorrer ás tristes circunstancias dos guardas reformados da fiscalisação externa, que estão ha perto de dois mezes literalmente a morrer de fome?
Chega a ser cruel, sr. ministro, que tão de leve se trato do tal assumpto, porque dois mezes é tempo mais que sufficiente para morrerem ao desamparo algumas centenas de velhos servidores da nação!
Quando formulei a minha segunda pergunta quiz fazer justiça ao caracter do sr. ministro da fazenda, dizendo que continuava a acreditar, até declaração em contrario, que era em nome de s. exa., mas sem o seu consentimento que se estava exercendo esta iniqua perseguição aos guardas, que não queriam alistar-se.
Não trato agora, conforme disse, de discutir a legitimidade do decreto n.° 4; não trato agora de saber se ha direitos adquiridos ou não; não trato agora de saber se o sr. ministro da fazenda respeitou ou desrespeitou alguns direitos; porque todos esses pontos hão de discutir-se, não incidentalmente antes da ordem do dia, mas por meio de unia interpellação, o que eu, desejei saber foi se s. exa. auctorisou, ou se pelo menos não procurou, com a posição preponderante que tem no seu ministerio, impedir que só estejam a repetir as ferozes scenas de perseguição que todos conhecem e que são impróprias da dignidade do poder, porque revelam nesse poder a existência de paixões mesquinhas, que não podem e não devem por forma nenhuma ali encontrar guarida.
Diz o sr. ministro que não tem conhecimento das perseguições! Oh! sr. presidente, pois o sr. ministro nem ao menos sabe o que quotidianamente se publica na imprensa, não como accusação vaga, á qual se não possa dar importancia, mas em termos precisos, porque até se citam nomes e se apontam circunstancias especiaes que concorrem nos factos apontados e que são verdadeiros crimes? (Muitos apoiados.)
É necessario que o sr. ministro da fazenda, que tem tanta coragem parlamentar, que assume tão facilmente a responsabilidade do que se passa no seu ministério, declare se estes actos dimanam directamente de s. exa., ou se s. exa. cobre apenas com a sua auctoridade as pessoas que os praticara. (Apoiados.)
Disse s. exa. umas venham os factos relativos às perseguições, que os não conheço».
O sr. Carlos Lobo d'Avila já mencionou alguns e eu vou completar o quadro.
Pergunto: tambem são indispensaveis condições de disciplina para o corpo da fiscalisação externa, que s. exa. vae reorganisar militarmente, que os chefes de districtos, como tem sido affirmado pela imprensa, andem illudindo e alliciando os pobres guardas, fazendo-lhes assignar em branco...
(Interrupção do sr. Franco Castello Branco.)
Eu posso repetir alguns nomes se v. exa. quer, que vem citados nos jornaes sem reclamação alguma, dos accusa-