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N.º 10

SESSÃO DE 19 DE JANEIRO DE 1897

Presidencia do exmo. Sr. Antonio José da Costa Santos

Secretarios - os exmos. srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
Abilio augusto de Madureira Beça

SUMMARIO

Approvada a acta, o §r. Mascarenhas Pedroso, a convite do sr. presidente, presta juramento na qualidade de supplente á presidencia e vice-presidencia da camara. - Pedido do sr. Francisco Patricio. - Participação de estar constituida a commissão de instrucção primaria e secundaria. - Apresenta um projecto de lei o sr. visconde do Ervedal da Beira. - Considerações do sr. Luciano Monteiro em referencia ao resurgimento da campanha dos portadores dos chamados "titulos de D. Miguel". Pergunta se as reclamações continuam. - Resposta do sr. ministro dos negocios estrangeiros. - Novas explicações sobre o mesmo assumpto. - Apresenta um projecto de lei o sr. Boavida.

Na ordem do dia continúa em discussão o projecto de resposta ao
discurso da corôa, proseguindo e concluindo o seu discurso o sr. presidente do conselho, em resposta ao sr. José Dias Ferreira. - Apresenta um parecer da commissão de instrucção primaria e secundaria o sr. Carlos Braga. - Justificações de faltas.

Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.

Presidentes á chamadas, 46 srs. deputados. São os seguintes: - Aarão Ferreira de Lacerda, Abilio Augusto de Madeira Bença, Agostinho Lucio e Silva, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Barbosa de Mendonça, Antonio Candido da Costa, Antonio José Boavida, Antonio José da Costa Santos, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Teixeira de Sousa, Antonio Velloso da Cruz, Arthur Alberto de Campos Henriques, Carlos de Almeida Braga, Conde de Pinhel, Conde de Valle Flor, Francisco José Patricio, Francisco Rangel de Lima, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Henrique da Cunha Motta de Media, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Lopes Carneiro de Moura, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim José de Figueiredo Leal, José Coelho Serra, José Gil de Borja Macedo e Meneses (D.), José Joaquim Aguas, José dos Santos Pereira Jardim, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Licinio Pinto Leite, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz de Castro (D.), Luiz Maria Pinto de Soveral, Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel de Bivar Weinholtz, Manuel Joaquim Fratel, Manuel de Sousa Avelino de Jesus, Theodoro Ferreira Pinto Basto, Visconde do Ervedal da Beira e Visconde da Idanha.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Antonio José Lopes Navarro, Fidelio de Freitas Branco, Jacinto Candido da Silva, João Maria Correia Ayres de Campos, João da Motta Gomes, José Dias Ferreira, José Freire Lobo doAmaral, José Mendes Lima, Polycarpo Pecquet Ferreira de Anjos e Visconde de Palma de Almeida.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolfo Alves de Oliveiras de Guimarães, Adolfo da Cunha Pimentel, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alfredo Moraes Carvalho, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Adriano da Costa, Antonio de Almeida Coelho de Campos, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Castro Pereira Côrte Real, Antonio Hygino Salgado de Araujo, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Dias Dantas da Gama, Augusto Victor dos Santos, Bernardino Camillo Cincinnato da Costa, Conde de Anadia, Conde de Tavarede, Conde de Villar Secco, Diogo Tose Cabral, Diogo de Macedo, Eduardo Augusto Ribeiro Cabral, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Ignacio José Franco, Jacinto José Maria do Coutinho, Jayme de Magalhães Lima, Jeronymo Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, João Alves Bebiano, João José Pereira Charula, João Marcellino Arroyo, João Rodrigues Ribeiro, Joaquim do Espirito Santo Lima, José Adolpho de Mello e Sousa, José Antonio Lopes Coelho, José Bento Ferreira de Almeida, José Correia de Barros, José Eduardo Simões Baião, José Joaquim Dias Gallas, José Luiz Ferreira Freire, José Marcellino de Sá Vargas, José Maria Gomes da Silva Pinheiro, José Pereira da Cunha de Silveira e Sousa Junior, José Teixeira Gomes, Julio Cesar Cau da Costa, Luiz de Mello Correia Pereira Medello, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro , Luiz de Sampaio Torres Fevereiro, Manuel Francisco Vargas, Manuel Pedro Guedes, Manuel Thomaz Pereira Pimenta de Castro, Mariano Cyrillo de Carvalho, Romano Santa Clara Gomes, Thomaz Victor da Costa Sequeira, Visconde de Banho, Visconde de Leite Perry, Visconde de Nandufe, Visconde de Tinalhas e Wenceslau de Sousa Pereira de Lima.

Acta - Approvada.

Não houve expediente.

O sr. Presidente: - Convido o sr. José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso a vir prestar juramento como supplente á presidencia e vice-presidencia.

(Prestou juramento.)

O sr. F. J. Patricio: - Sr. presidente, mando para a mesa uma nota em que peço a v. exa. se digne colher esclarecimentos ácerca do estado em que ficaram os trabalhos que tão notavelmente ía publicando o finado barão de S. Clemente, quando a morte lhe cortou o fio de tão prestante existencia.

Desejo saber se algum dos volumes está em via de publicação na imprensa nacional, se haverá a fazer-se algum dispendio para se concluir e qual será a verba que terei a propor para tal fim.

Escuso, sr. presidente, de encarecer á camara a importancia de uma tal publicação como era a da Historia das côrtes geraes, pois já em varias occasiões aqui houve referencias e propostas honrosissimas para o illustre funccionario que tão dedicadamente serviu o seu paiz e deixou valiosissimas investigações; limitar-me-hei a apontar sómente que a continuação d'essa obra é um alto serviço

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feito aos que estudam e será um incentivo a algum funcionario que desejo seguir n'esta ordem de trabalhos.

Leu-se o seguinte

Pedido

Peço á exma. mesa da camara dos senhores deputados que se digne colher informações sobre a altura em que estão os trabalhos que deixou o fallecido barão de S. Clemente para a publicação da Historia das côrtes geraes; se algum volume estava em via de publicação á morte do finado funccionario; se algum original está já impresso na imprensa nacional. = O deputado, F. J. Patricio.

Para a secretaria.

O sr. Presidente: - Vão colher-se as informações pedidas pelo illustre deputado.

O sr. Abilio Madureira Beça (por parte da commissão de instrucção primaria e secundaria): - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Tenho a honra de communicar á mesa e a camara que se acha constituida a commissão de instrucção primaria e secundaria, de que foi eleito presidente o sr. João Pereira Teixeira de Vasconcellos e secretario eu, participante. = O deputado, Abilio Beça.

Para a acta.

O sr. Visconde do Ervedal da Beira: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei que tem por fim conceder á camara municipal da cidade da Guarda a isenção, durante um anno, de direitos e de quaesquer impostos locaes para o material que for importado para a illuminação electrica da mesma cidade.

As rasões em que a camara da cidade da Guarda se funda para representar ao governo n'este sentido são de tudo o ponto justificadas; escuso, por isso, de ler o relatorio que precede o projecto; creio, mesmo, que não é esta a primeira vez que se concedem isenções d'esta ordem.

Vou ler o projecto e peço a v. exa. que lhe dê o devido destino.

(Leu.)

O sr. Manuel Joaquim Fratel: - Mando para a mesa uma nota justificativa de faltas.

(Vae no fim da sessão.)

O sr. Luciano Monteiro: - Vou chamar a attenção do governo e especialmente do sr. ministro dos negocios estrangeiros para uma noticia, publicada nos jornaes, e que se me afigura importante.

Refiro-me ao resurgimento da campanha de descredito contra nós, promovida pelos portadores dos titulos chamados - do emprestimo de D. Miguel.

Sr. presidente, é para nós sempre doloroso rememorar acontecimentos gravissimos, como foram os factos que occorreram por occasião do levantamento do emprestimo dos tabacos.

A situação em que se encontrava o paiz, por occasião d'esse emprestimo, era de tal ordem que o sr. ministro da fazenda de então, ao ser interrogado na camara dos senhores deputados sobre as clausulas do contrato, disse que o parlamento o que tinha a fazer, era votar o emprestimo com os olhos fechados!

Não contentes com isso, os negociadores, do emprestimo apresentaram uma proposta pela qual se obrigavam a fazer cessar para sempre a campanha, de descredito, que tão rude e tão deprimente tinha sído para o paiz, mediante a quantia de 2.500:000 francos, e o governo de então, em presença dos factos resultantes d'essa campanha, tão prejudiciaes para o nosso credito, viu-se na dura necessidade de prescindir do uma parte d'esse emprestimo para ser entregue aos contratadores, a fim de que elles liquidassem, por inteiro, essa questão.

Note, porém, v. exa. que o governo para prevenir todas as hypotheses, desde logo estabeleceu as condições em que os tomadores do emprestimo haviam de receber essa somma, para o effeito de se concluir de vez a questão, afastar d'ella a intervenção do governo francez e evitar novas reclamasses. Foi n'esse justo e cauteloso proposito, que o governo estabeleceu n'essas condições, como clausula sine qua non, que elles receberiam a somma dos 2.500:000 francos, mas que os depositariam na caixa geral de depositos em París e á ordem do governo francez, para este fazer a distribuição como entendesse.

O governo teve esta cautela e era absolutamente preciso tel-a; mas, sr. presidente, succedeu um caso verdadeiramente extraordinario: é que os contratadores do emprestimo, tendo-o tomado, receberam com effeito os 2.500:000 francos, mas não cumpriram a clausula do contrato e em vez de fazerem o deposito na caixa geral, foram deposital-os no Comptoir d'escompte á sua ordem, ignorando-se quem fez a distribuição.

O resultado é o que estamos vendo. Resurgiu a campanha e já no anno passado os portadores dos titulos apresentaram reclamações perante o parlamento francez, obtendo da commissão de negocios externos do senado parecer favoravel, e agora, ao que se diz, igual parecer da commissão da camara dos deputados.

Como vê v. exa., não se cumpriram as ordens e as clausulas justas, impostas pelo nosso governo, e que eram indispensaveis para a prompta liquidação do assumpto e para completo afastamento do governo francez. Não se fez o que se tinha ajustado e todavia o thesouro vê-se desembolsado da somma de 2.500:000 francos.

Pergunto agora ao governo se as reclamações continuam, se ellas são patrocinadas pelo governo francez e se elle invocou o facto de não se ter feito o deposito como se tinha ajustado. Pergunto mais qual é o proposito do governo em relação á pessoa ou pessoas que receberam os 2.500:000 francos o não lhes deram o destino, que se tinha ajustado e a que tambem se tinham obrigado os contratadores.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz de Soveral): - Pedi a palavra, unicamente, fiara informar que até hoje não têem chegado oficialmente ao conhecimento do governo os factos apontados pelo illustre deputado. A nossa legação em París nada communicou e da parte do governo francez não veiu reclamação alguma sobre o assumpto.

( S. exa. não reviu.)

O sr. Luciano Monteiro: - Agradeço a explicação do sr. ministro dos negocios estrangeiros.

Tomo, porém, a liberdade de noticiar a. v. exa. um facto de que tenho conhecimento directo, com referencia ao parecer da commissão dos negocios estrangeiros no senado francez e que teve logar no anno passado.

Sobre este facto posso dar a v. exa. a minha palavra de honra e creio, que a minha palavra é suficiente, que tive na minha mão um exemplar do parecer da commissão do senado francez, e que n'esse parecer pedia-se, por unanimidade de votos, ao governo francez que intercedesse vigorosamente em abono das reclamações a que me referi.

Sobre a votação que houve ultimamente na camara dos senhores deputados em França não posso ter a mesma certeza, mas supponho que tambem não foi desfavoravel a essas reclamações.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz de Soveral): - Eu só disse ao illustre deputado, o sr. Luciano Monteiro que não tinha conhecimento official do assumpto.

O governo, porém, ha de tratar d'esta questão com o desvelo que ella merece.

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O Orador: - É certo, é mathematico, é indiscutivel que o governo ha de empenhar-se para a solução favoravel d'este assumpto, sob o ponto de vista diplomatico.

O que desejo, porém, saber é o que tenciona o governo fazer em relação á pessoa que recebeu o dinheiro para lhe dar uma applicação, e não lh'a deu.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente (dirigindo-se ao sr. Luciano Monteiro): - V. exa. dá me licença?

Desejo apenas observar que o illustre deputado apenas pediu a palavra para chamar a attenção do governo para o assumpto de que já se occupou. Querendo dirigir-lhe perguntas, tem de fazer o aviso previo que o regimento determina.

Vae passar-se á ordem do dia, visto não haver mais ninguem inscripto, e tem a palavra que lhe ficou reservada da sessão passado o sr. presidente do conselho.

O sr. Boavida: - Pedia a v. exa. que me désse a palavra, antes de se passar á ordem de dia.

O sr. Presidente: - Agora já não posso conceder a palavra ao illustre deputado, porque já a dei ao sr. presidente do conselho.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Hintze Ribeiro): - Pelo que me respeita, póde v. exa. conceder a palavra ao illustre deputado que a pediu.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Boavida.

O sr. Boavida: - É unicamente para mandar para a mesa um projecto de lei, equiparando nos seus vencimentos o professor de hebreu da universidade de Coimbra aos demais lentes e professores do mesmo estabelecimento, para os effeitos e nos termos da lei de 1 de setembro de 1887.

Peço a v. exa. que dê o devido destino a este projecto.

O sr. Presidente: - V. exa., em observancia do regimento tem de ler o projecto.

O sr. Boavida: - N'esse caso vou lel-o.

(Leu.)

Ficou sobre a mesa para segunda leitura.

ORDEM DO DIA

Continuamos da resposta ao discurso da corôa

O sr. Presidente do Concelho (Hintze Ribeiro): - Não vejo presente o illustre deputado, o sr. Dias Ferreira, a quem hontem comecei a responder. Todavia, não só porque os assumptos de que s. exa. tratou no seu discurso, são de interesse para o paiz, mas porque nas considerações que tenho a fazer, não ha cousa que possa susceptibilisar o illustre deputado, creio que a camara não me levará a mal que continue na ordem de considerações que hontem encetei, respondendo a s. exa. (Apoiados:)

Um ponto houve do seu decurso em que o illustre deputado foi soberanamente injusto. Foi quando me arguiu de não ter mandado para a camara a nota que pedíra, sobre o estado da divida fluctuante, em 31 de dezembro ultimo.

Não mandei, porque não podia mandar; não mandei, porque os elementos de que ella se compõe, não estavam apurados nas differentes estações a que o governo tem de se dirigir sobre este assumpto.

Como s. exa. e a camara sabem, uma das causas que na nota de divida flutuante se comprehende, é o estado da conta corrente entre o thesouro e o banco de Portugal. Para que a somma representante do debito do governo, em conta corrente com o banco de Portugal se apure e possa figurar na divida flutuante, é indispensavel que o banco de Portugal ultime o seu balanço, no qual esse debito vem comprehendido.

(Entrou na sala o sr. Dias Ferreira.)

Eu começára, agora mesmo, a responder ao illustre deputado e estava-me referindo áquella parte do seu discurso, em que s. exa. me arguiu de não ter mandado a nota da divida flutuante, relativa a 31 de dezembro ultimo; e dizia eu que não a mandará, porque a não podia mandar, por isso que não depende só do governo o reunir todos elementos de que essa nota se compõe, a fim de a poder submetter á apreciação das côrtes.

Assim, pelo que toca, por exemplo, ao debito do governo pela sua conta corrente com o banco de Portugal, o apuramento d'esse debito depende do balanço final do anno, que elle ainda não concluiu.

S. exa. comprehende bem que nem está na minha não compellir o banco a ultimar em dois ou tres dias o seu balanço, nem é motivo de estranheza o não estar ainda concluido; n'este anno, como em todos os demais, o banco, que semanalmente publica os seus balancetes, ainda não publicou o que devia seguir-se ao de 24 de dezembro. Esse seria e 30 de dezembro; mas o banco julgou dispensavel a sua publicação, desde que no dia seguinte tinha de fechar o balanço de todo o anno; e este é que se tem demorado, porque não vêm rapidamente as contas de todas as agencias que são indispensaveis para o seu encerramento.

Note-se, porém, que não é só, no tocante ás relações do thesouro com o banco, que a divida fluctuante, até 31 de dezembro, se não acha apurada.

Como s. exa. sabe, na nota da divida fluctuante têem de figurar os saldos das contas das nossas agencias no estrangeiro, da casa Bering, do Crédit Lyonnais, e essas ainda não vieram; devem chegar em breves dias. E tambem se comprehende que não estava na minha mão compellir estes estabelecimentos bancaris a, n'um determinado dis, fornecerem a nota das contas correntes com o governo portuguez, quando é certo que, fechado um anno civil, as differentes instituições bancarias se apressam, é verdade, a apresentar no mais breve praso os seus balanços, mas em todo o caso carecem de tempo para o poderem fazer.

O que se dá com respeito ao banco de Portugal e ás agendas no estrangeiro, dá-se igualmente com relação á caixa geral de depositos.

Como s. exa. não ignora, na notada divida fluctuante tem de figurar exactamente o debito do governo para com a caixa geral de depositos, pois que em todas as suas agencias entram fundos d'essa caixa; é necessario para isso fazer um apuramento, que ainda não está concluido.

O illustre deputado perguntou, se era por falta de empregados da caixa geral de depositos, ou por mingua de vencimentos na junta do credito publico que essa conta não estava liquidada.

Foi menos justo o illustre deputado na sua apreciação. S. exa. sabe que no banco de Portugal não faltam empregados; se, todavia, o seu balancete não está fechado, não deve cansar estranheza que tambem não esteja o da caixa geral de depositos.

Pelo que toca aos vencimentos da junta do credito publico, não póde o illustre deputado ignorar que em nada essa junta tem de intervir no encerramento dos debitos para com a caixa geral de depositos. São instituições absolutamente differentes no seu organismo e nas suas funcções.

Dito isto, sem querer de maneira alguma, porque não é esse agora o meu intuito, fazer apreciações retrospectivas, e unicamente para mostrar quanto foi, n'esta parte, injusto o illustre deputado, dir-lhe-hei que, se bem eu não tenha mandado, porque não podia mandar, como já demonstrei, a nota da divida fluctuante até 31 de dezembro, s. exa. encontra já publicados no Diario do governo todos os balancetes da divida fluctuante, successivamente, desde julho até novembro.

Esses que eu podia publicar, apressei-me a fazel-o. E, note-se, nem sempre assim se tem praticado. O illustre deputado, antigo parlamentar e homem d'estado, lembra-se de certo, e tanto mais quanto isto não remonta a tempos muito atrazados, que, por exemplo, desde 7 de março

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de 1891 ate 27 de fevereiro de 1893, o que comprehende todo o tempo da estada de s. exa. nos conselhos da corôa, nem um só balancete da divida fluctuante foi publicado no Diario do governo. (Apoiados.)

Nós só tivemos conhecimento do estado d'essa divida em 16 de janeiro de 1892, no dia em que o illustre deputado assumiu a direcção do governo, pelo relatorio que nos trouxe aqui o sr. Oliveira Martins. Mais tarde, constituido o governo actual, fizemos publicar, em 27 de fevereiro de 1893, a nota da divida fluctuante em relação a 22 d'esse mez e anno, data em que o illustre deputado deixou o poder.

Desde 16 de janeiro de 1892, dia em que s. exa. entrou, até 22 de fevereiro de 1893, dia em que s. exa. saíu, não tivemos, por meio algum, conhecimento de um só balancete da divida fluctuante.

Não aponto este facto, mais uma vez o digo, como retaliação politica, mas unicamente para mostrar quanto na verdade o illustre deputado mal se preoccupa com a falta de publicação da nota da divida fluctuante, relativa a 31 de dezembro do anno passado, sem tomar em conta que eu de tão boa vontade me apressára a mandar para aqui todos os outros documentos que s. exa. pedira, o que havia publicado, quanto á propria divida fluctuante, todos os balancetes até ao ultimo que tinha, que era o de 30 de novembro.

Comprehendo a impaciencia do illustre deputado e o legitimo desejo que tem de se inteirar do estado da divida fluctuante; tanto mais que no discurso da corôa só encontra uma phrase, affirmando que a divida fluctuante, no estrangeiro, em pouco se tem avultado e que o governo, de que faço parte, não tem recorrido, para saldar encargos correntes, a emprestimos externos, consolidados, tornando-se assim evidente que a todos os compromissos que encontrou, a todos os encargos que havia a satisfazer, obtemperou o governo com os proprios recursos do paiz, cuja vitalidade por este modo se manifesta.

Esta affirmação, consoladora para todos os que se interessam pelas cousas portuguezas, levou, provavelmente, o illustre deputado ao desejo de averiguar até que ponto isso era exacto. Ora, é esse desejo que eu vou satisfazer e creio que o farei de uma maneira completa.

A importancia da divida fluctuante no estrangeiro, em 22 de fevereiro do 1893, quando nós entrámos para o governo, era de 1:554 contos, por virtude da supprimentos contrahidos em Londres e París; em 30 de novembro de 1896, data do ultimo balancete publicado, a importancia da mesma divida fluctuante no estrangeiro, por supprimentos, era de 1:567 contos.

Já vê v. exa. que quem encontra uma divida fluctuante, em fevereiro de 1893, de 1:554 contos de réis, e em novembro de 1896 a não tem superior a 1:567 contos de réis, póde com verdade dizer que não a aggravou consideravelmente; porque alem d'isto o que ha são 321 coutos de réis de saldos de contas correntes, que se regularisam no fim do anno, devendo constar esta regularisação das contas de 31 de dezembro.

Logo me referirei mais de espaço á divida fluctuante; por agora quiz apenas tranquilizar o espirito do illustre deputado, mostrando quanto era exacta a asserção contida no discurso da corôa, e ao mesmo tempo dar mais amplo conhecimento á camara de factos que interessam o paiz.

Posto isto, vou occupar-me da operação de credito que realisei, e a que o illustre deputado mais largamente se referiu.

S. exa. satisfez-me bom, dizendo que os documentos que lhe mandei eram completos, ou, pelo menos, suficientes para, sobre esta operação de credito, poder formular, com pleno conhecimento de causa, o seu juizo. Ainda bem que o testemunho leal e nobre do illustre deputado vem confirmar que após uma operação de credito, importante como esta foi, aberto o parlamento e desde que os documentos se pediram, promptamente foram mandados pelo ministro da fazenda. (Apoiados.)

Devo dizer que a minha intenção era publicar esses documentos, quando apresentasse aqui o meu relatório de fazenda; julguei que era esse o momento proprio e preciso para dar conta ás côrtes do uso que fizera da auctorisação que ellas me votaram na lei relativa ao emprestimo; mas, porque não quiz que podesse haver uma duvida qualquer no tocante ao motivo da demora na publicação dos documentos, nem que haja a respeito do credito do paiz suspeições, que são sempre prejudicialissimas, e muito mais nocivas do que as julgam os proprios que as fazem ou formulam, entendi que devia, desde já, enviar todos os documentos pedidos por s. exa. relativamente ao emprestimo, para que o illustre deputado, ou qualquer outro, podesse, conscienciosamente, ajuizar do modo por que usei da auctorisação que foi dada ao governo para aquella operação de credito.

E aqui devo dizer tambem algumas palavras, em abono da contratadores do emprestimo.

Por isso mesmo que o contrato é bilateral; por isso mesmo que a publicação d'aquelles documentos me não interessava só a mim, mas tambem áquelles que commigo contrataram o emprestimo, tenho satisfação em dizer que, ouvindo esses contratadores sobre a publicação dos documentos, me enviaram um officio, que tenho presente, accentuando que, muito embora não fosse costume publicarem-se os documentos do qualquer operação d'aquella natureza, antes de feita a emissão dos respectivos titulos, todavia, e apesar da reserva que, n'esse sentido, haviam feito ao formularem a sua proposta, desde que o governo visse que havia conveniencia politica na immediata publicação da documentos, pela sua parte, elles assentiam á sua publicação.

Folgo de poder assim, antes mesmo da emissão, responder ao primeiro pedido que me foi formulado por um representante da nação, mandando immediatamente os documentos todos, para que todos possam conhecer e apreciar como o emprestimo se realisou. (Apoiados.)

Posto isto, entremos no assumpto.

Pela minha parte, a camara comprehende que as apreciações que eu haja do fazer, têem de ser pautadas pelas do illustre deputado.

S. exa. fez, ácerca do emprestimo e sobre os documentos que pediu, as considerações que entendeu opportunas; é sobre ellas que, evidentemente, tenho de dar a minha resposta. E folgo de a dar; porque, se bem que as apreciações do illustre deputado fossem serenas e elevadas, como é proprio de um estadista distincto, foram todavia menos justas, e por consequencia menos proficuas aos interesses do paiz.

E é realmente para mim motivo de satisfação o poder restabelecer, não direi a verdade, porque não foi de certo com o intuito de a obscurecer que o illustre deputado apreciou a questão, mas em todo o caso o exacto e preciso estado das cousas, que deriva da operação de credito que effectuei.

Disse o illustre deputado, e disse-o com mágua, que tratando o governo de fazer uma operação de credito sobre obrigações dos tabacos, só o presidente e vice-presidente da companhia dos tabacos tinham querido entrar n'essa operação; só elles haviam apparecido a contratar com o governo.

Devo dizer, em primeiro logar, ao illustre deputado que não foi n'essa qualidade que a firma Fonseca, Santos & Vianna e a firma Henry Burnay & C.ª vieram contratar commigo; contrataram por si proprias e não como representantes da companhia dos tabacos.

Demais, permitta-me o illustre deputado que, sobre os proprios documentos que lhe enviei, ou diga que não é perfeitamente exacta a asserção de s. exa. Não foram só aquellas duas firmas que se ofereceram a contratar com

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o governo. Entre os documentos que mandei, s. exa. encontra uma outra proposta de empréstimo, apresentada por João da Fonseca Cruz. É a seguinte:

"Illmo. e exmo. sr. conselheiro Luiz Augusto Perestrello de Vasconcellos, dignissimo director geral do ministerio da fazenda. - Respondendo ao officio que me foi dirigido em 19 de setembro ultimo pela thesouraria do ministerio da fazenda, venho apresentar a v. exa. a proposta do emprestimo que o governo de Sua Magestade deseja realisar segundo a carta de lei de 21 de maio do corrente anno, nas condições seguintes:

"O Comité de París que represento tomará o total do emprestimo na importancia de 9:000 contos de réis em oiro ao preço de 415 francos por obrigação, mediante a commissão de 2 1/2 por cento.

Sobre esta mesma proposta terei a communicar mais alguma cousa a v. exa. ainda hoje, segundo um telegramma que acabo de receber de Paris n'este momento.

"Esta minha proposta, está por emquanto garantida pelos banqueiros de París os srs. E. Samuel e C.ª

"Lisboa, 1 de outubro de 1896. = João da Fonseca Cruz.

"Está conforme. Primeira repartição da direcção geral da thesouraria, 16 de janeiro da 1897. = José Alberto Rotado."

Esta foi a proposta que se me offereceu, alem da outra que acceitei. Não foi a que eu preferi, porque muito embora comprehendesse á totalidade do emprestimo dos 9:000 contos de réis, todavia as condições financeiras em que se formulava, eram inferiores ás da que se tomou para base do contrato.

A camara comprehende que se o emprestimo a contrahir fosse, como o de 1891, para amortisação da divida fluctuante, evidentemente a circunstancia de, n'essa proposta, se offerecer 9:000 contos de réis, quando na proposta que eu preferi se offerecia apenas 3:000 contos, era sobremaneira attendivel no confronto entre uma e outra. Mas, como a camara sabe, este emprestimo sobre obrigações dos tabacos não foi para amortisação da divida fluctuante; foi para um fim perfeitamente especial e exclusivo; foi, conforme a auctorisação votada na sessão passada, para a acquisição de navios de guerra, cujo preço de custo não ía alem de 2:800 contos de réis.

Por consequencia, sendo suficiente, para o fim que o emprestimo tinha em vista, a quantia de 3:000 contos de réis, desde que as condições da proposta relativa aos 9:000 contos eram bastante inferiores, evidentemente á outra e não a esta proposta eu devia dar a preferencia; e assim o fiz.

Mas porque pedi eu que me enviassem propostas, ou pela totalidade dos 9:000 contos de réis ou sómente por tuna primeira serie de 3:000 contos? As rasões conhece-as a camara muito bem, porque tive occasião de as expender, quando a lei foi discutida e votada: foi porque circumstancias occasionaes se poderiam dar nos mercados, que tornassem preferivel a acceitação de uma proposta de emprestimo mais largo

Não succedeu, porém, assim. As condições que se me ofereceram, acceitaveis para o fim especial que se tinha em vista - a acquisição de navios de guerra - não justificavam, todavia, um mais largo emprestimo, que, importando maior encargo para o thesouro, não poderia, nos termos da lei, ter uma applicação integral e immediata.

Eis a rasão por que me decidi pela proposta concernente a um emprestimo de 3:000 contos de réis. Fiz o que devia, como ministro da fazenda que, não tendo, nem querendo ter, predilecções de qualquer especie, só visa a fazer uma operação de credito nos melhores termos que póde obter, acceitando para isso a proposta que lhe dá maiores vantagens, parta ella de onde partir.

Surprehendeu-me, sr. presidente, que s. exa. quizesse chegar á conclusão de serem calamitosas, as circumstancias das financeiras do paiz, e adverso o estado, do nosso credito, pelo facto de só aquelles dois estabelecimentos terem apparecido a contratar o emprestimo.

"Só aquelles - dizia o illustre deputado - nem o banco Lisboa e Açores, nem o banco commercial se apresentaram a formular uma proposta que o governo podesse considerar!"

É isto verdade. Mas o que o illustre deputado d'ahi podia concluir, era que as condições que eu pozera na circular que expedi, haviam sido, em attenção ás circumstancias, tão altas, que aquelles bancos entenderam não poder, em vista d'ellas, formular uma proposta sua.

Ora, é precisamente o que resulta da comparação da circular que dirigi a todos os que haviam significado querer tratar dá operação, com a resposta d'aquelles bancos, que vou ler á camara.

A verdade que resalta d'essa comparação é, como a camara vae ver, inteiramente diversa da conclusão que tirou o illustre deputado.

Começarei por ler a circular, para que a camara conheça bem quanto ella foi de todo o ponto conforme ás declarações que fiz n'esta casa, e perfeitamente de harmonia com a lei que as côrtes votaram.

A circular dizia o seguinte:

Illmo. e exmo. sr. - Tendo v. exa. feito constar ao governo que desejaria ser prevenido da epocha e condições em que o thesouro julgasse conveniente realisar o emprestimo auctorisado pela carta de lei de 21 de maio do corrente anno, venho, devidamente auctorisado por s. exa. o sr. ministro da fazenda, declarar a v. exa. o seguinte, para que v. exa., convindo-lhe, possa organisar e apresentar a competente proposta:

"l.° Que o governo, usando da auctorisação conferida pela citada carta de lei, está resolvido a emittir e contratar firme a collocação de tantas obrigações de 4 1/a por cento, amortisaveis em cincoenta e nove semestres, a contar de 1 de outubro proximo, quantas forem necessarias para perfazer a quantia de 3:000 contos de réis, ou de 9:000 contos de réis em oiro, conforme, em vista das propostas que receber, lhe convier mais - emittir por agora, só uma serie ou desde já a totalidade da somma ainda não levantada, nos termos da carta de lei de 23 de março de 1891; e que, portanto, podem as propostas referir-se á emissão d'aquella primeira serie de obrigações e á da sua totalidade."

Esta condição, como a camara vê, é perfeitamente conforme com as declarações que fiz, tendo só a acrescentar que o praso da amortisação foi calculado de fórma que a amortisação d'este novo emprestimo, em obrigações dos tabacos, viesse a coincidir com a amortisação do emprestimo de 1891, que se fizera em obrigações da mesma especie.

"2.° Que as novas obrigações que se emittirem, terão consignação especial no saldo disponivel do rendimento dos tabacos, gosando em tudo o mais das mesmas garantias do estado que têem as obrigações já emittidas, por virtude da mencionada carta de lei de 23 de março de 1891; ficando bem entendido que se a emissão, a que se proceder agora, for de 3:000 contos de réis, e por consequinte de uma primeira serie de obrigações em relação á totalidade de 9:000 contos de réis em oiro, a consignação especial no saldo disponivel do rendimento dos tabacos será por igual extensiva a qualquer outra serie de obrigações que venha a effectuar-se, até perfazer aquella totalidade, no subsequente uso da auctorisação acima referida, não havendo por conseguinte diferença de especie alguma, quanto a garantias do estado, entre as obrigações que agora se emittam e as que mais tarde venham a emittir-se até se realisarem os referidos 9:000 cantos de réis."

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Isto, exactamente, a fim de evitar que de futuro se podesse suscitar qualquer questão no caso em que a emissão se fizesse, successivamente, por series de obrigações, sobre qual a garantia applicavel a essas series, visto que o que estava consignado na lei, e a intenção do parlamento e do governo era que o saldo disponivel das obrigações dos tabacos, satisfeito o serviço das de 1891, fosse por igual, sem distincção, applicavel a todas as obrigações de qualquer serie emittida dentro dos limites dos 9:000 contou de réis complementares da emissão da 45:000 contos que primeiro se fez.

Continúa a circular:

"3.° Que as propostas, que para esta operação financeira se apresentarem, devem ser firmadas ou devida e provadamente garantidas por estabelecimentos financeiros, cujo credito e auctoridade inspirem absoluta confiança no bom exito da operação; declarar que em tudo e absolutamente se conformam com as condições que ficam especificadas, e designar o preço por que os proponentes se obrigam a tomar firmes as obrigações que se emittirem, ficando desde já advertidos do que o governo só contratará a nova emissão em condições mais vantajosas para o thesouro do que as da emissão que já effectuou por virtude da carta de lei de 23 de março de 1891.

"4.° Que as propostas devem ser enviadas para esta direcção geral até o dia 1 de outubro proximo futuro inclusive, reservando-se o governo o plenissimo direito de, ácerca d'ellas, proceder como entender mais conveniente.

"Deus guarde a v. exa. Direcção geral da thesouraria, 19 de setembro de 1896. - Illmo. e exmo. sr. ... = O director geral da thesouraria, Luiz Augusto Perestrello de Vascancellos.

"Está conforme. Primeira repartição da direcção geral da thesouraria, 13 de janeiro de 1897. = José Alberto Rosado."

A camara lembra-se de certo da declaração formal, peremptoria, por mim feita aqui, e que deve constar da acta, de que eu só contrataria uma nova serio, ou a totalidade dos 9:000 contos de réis, em obrigações dos tabacos, quando o podesse fazer em condições mais vantajosas do que as de 1891. (Apoiados.) Inseri essa declaração na minha circular, definidamente, para que se não perdesse tempo na elaboração de propostas que eu não podesse acceitar, por se afastarem da condição que eu punha. A isto é que se prende a resposta dada pelos bancos Lisboa & Açores e commercial. Essa resposta tenho eu aqui e a vou ler. Diz assim:

"Banco Lisboa & Açores. - Lisboa, 1 de outubro de 1896. - Illmo. e exa. sr. - Referindo-nos ao convite que s. exa. o sr. ministro da fazenda nos dirigiu para a collocação das obrigações do emprestimo dos tabacos, temos a honra de informar a v. exa. que não podamos concorrer nau condições offerecidas, mas que, no caso de s. exa. o sr. ministro entender dever modificai-os, estâmos promptos a fazer novo estudo da operação.

"Deus guarde a v. exa. Lisboa, 1 de outubro de 1896. - Illmo. e exmo. sr. conselheiro director geral da thesouraria do ministerio da fazenda. = Pelo banco Lisboa & Açores, J. Freitas = E. Mendonça. = Pelo banco commercial de Lisboa, C. Reincke = Eduardo Antonio dos Reis.

"Está conforme. Primeira repartição da direcção geral da thesouraria, 16 de janeiro de 1897."

Já vê, pois, o illustre deputado que não foi porque esses bancos descressem das garantias offerecidas pelo governo, no tocante áquella operação, mas sim porque, em vista da minha advertencia, entenderam que as condições exigidas não eram taes que vantajosamente convidassem os capitães que elles podessem reunir, que deixaram de concorrer ao emprestimo que se lhes offerecia. (Apoiados).

Posto isto, querer s. exa. inferir que o resultado d'esta operação é um indicio desfavoravel para o nosso credito, parece-me, francamente, que é forçar muito a propria logica dos factos. (Apoiados).

Mau indicio para o nosso credito seria, se, dirigindo-se o governo aos capitães nacionaes ou estrangeiros para fazer uma operação d'esta natureza, ninguem absolutamente lhe respondesse. (Apoiados.) Quando, porém, o governo, em condições como as que eu acabei de indicar, se dirige a todos quantos annunciaram o proposito ou desejo de fazer uma operação d'esta natureza, e chega a fechar uma negociação e a fazer um contrato em que perfeitamente se comprehendem nos limites das declarações feitas, isto é, em condições sem duvida muito mais vantajosas de que as de 1891, não me parece que isto deponha contra o credito do paiz; muito pelo contra...

Mas - e foi uma cousa que surprehendeu sobremaneira o illustre deputado - disse-nos s. exa. que, no relatorio que ultimamente publicou, o banco Alliança declara, com singular contentamento, que lhe foram obsequiosamente cedidas duas mil obrigações, um milhão de francos, neste emprestimo, que elle reputa boa operação. E d'ahi conclue s. exa. que o contentamento assim significado pelo banco Alliança mostra que o emprestimo foi contraindo dentro do paiz.

Francamente, acho que é logica forcada.

Então porque o banco Alliança tomou parte n'este emprestimo, segue-se d'ahi que elle foi todo contrahido dentro do paiz, quando essa parte que o banco Alliança tomou, no dizer de s. exa., é apenas de duas mil obrigações, e as obrigações emittidas são quarenta mil? (Apoiados.)

Ora eu posso n'este ponto tranquillisar o illustre deputado, e dizer-lhe que o emprestimo não foi só contrahido por capitaes portuguezes, mas sim e em larga escala por capitães estrangeiros.

Demais, dizia-nos s. exa. que o banco Commercial e o banco Lisboa e Açores se não tinham prestado a entrar n'esta operação; e com a mesma logica com que o illustre deputado concluiu, pelo facto do banco Alliança entrar para a operação, que o emprestimo era contrahido no paiz, devia ter concluido, pelo facto da recusa d'aquelles dois bancos a virem ao emprestimo, que elle tinha sido contrahido fóra do paiz. Ou não ha logica. (Apoiados.)

Em todo o caso, comprehendo que a preoccupação do illustre deputado era que, levantado, o emprestimo no paiz, isso representaria uma drenagem de oiro, importante, para o estrangeiro, na satisfação dos respectivos encargos, e viria, por consequencia, apoucar as disponibilidades da praça, contribuindo, assim, para o aggravamento dos cambios.

Convenho em que, com effeito, dadas as circumstancias actuaes, preferivel era que este emprestimo fosse realisado por capitães estrangeiros. Recorrer só aos capitães do paiz poderia, n'um dado momento, ser uma prova de vitalidade e até de brio nacional. Vimos, ainda ha pouco, o que aconteceu em Hespanha.

A Hespanha, perante o mallogro das negociações que encetou para um emprestimo externo, appellou para o patriotismo dos seus nacionaes, e elles concorreram em tão larga escala que o emprestimo foi mais do que subscripto, o que provou não só a existencia dos recursos necessarios para uma operação d'aquella natureza, mas o enthusiasmo, o grande impulso, a enorme dedicação pelo seu paiz, de que todos ali deram prova, unindo os seus capitães para fornecer ao governo os elementos indispensaveis com que podesse sustentar a autonomia do paiz e a sua auctoridade na ilha de Cuba. (Muitos apoiados.)

Mas não é menos certo que a Hespanha pensando, evidentemente, depois de realisada a operação nacional, em a substituir por um emprestimo externo que lhe forneça capitães fóra dos seus mercados, corrobora o que eu acima ouse, ficando-me a satisfação de ver que o nosso empres-

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timo, que aliás não tem comparação, porque é apenas de 3:000 contos de réis, com os largos recursos de que a Hespanha precisa, se póde realisar sem prejuizo dos capitães portuguezes, interessando as praças estrangeiras.

Mas uma pergunta formulou o illustre deputado: - em que representa este emprestimo uma melhoria do nosso credito? E acrescentava, com aquelle colorido de phrase que por vezes lhe acode tão espontaneamente: - é porque ficamos devendo mais? - só se é, concluia s. exa., por se entender que quanto mais deve um paiz mais rico está, porque tanto mais pôde dever!

Engana-se o illustre deputado; não é porque ficâmos devendo, mais. O encargo a mais que nos resulta d'esta operação tem a sua compensação, vista e reflectida, na applicação do emprestimo á acquisição de navios de guerra, com que melhor possamos sustentar o nosso dominio colonial. Pesámos tudo como n'uma balança. Vimos de um lado os encargos da operação e do outro a vantagem que nos advinha de podermos retemperar as nossas forças navaes, de termos alguns vasos de guerra com que de momento podessemos acudir onde o nosso dominio fosse mais atacado e a necessidade de defeza se tomasse mais instante.

Resolvemos contrahir mais aquelle encargo por entendermos que d'esta fórma acudiamos a uma absoluta necessidade de soberania. Tomada essa resolução, reconhecido e assente que esse augmento de encargos era de todo o ponto indispensavel, fez-se a operação e o facto d'ella ter podido fazer-se, nas condições em que se fez, foi uma prova de ter efectivamente melhorado o nosso credito.

Porque, desde 1891 até ha pouco, encontravamos sempre cerradas as portas dos mercados estrangeiros, e se tivessemos querido levantar capitães lá fóra, por certo a resposta nos não seria favoravel. O que succedeu agora? Succedeu que quando fômos, depois de uma crise financeira aguda, recorrer ao credito, solicitando capitães, não só nacionaes mas estrangeiros, promptamente os encontrámos. Se isto não significa uma melhoria de credito para o paiz, então, francamente, não sei onde s. exa. a quer ir buscar. (Apoiados.)

Mas não é só por isto; é porque não tendo havido nenhuma outra operação de credito entre a de 1891 e a de agora, podémos, emfim, realisar esta, depois de tantas provações por que passámos, depois do descalabro de tantas das nossas esperanças, depois de termos todos afincadamente e como largos sacrificios procurado augmentar as receitas do thesouro, de fórma a occorrer ás suas despezas mostrando assim que queremos, acima de tudo, que a nossa nacionalidade se mantenha, e o nosso credito se consolide com os meios de que dispômos, evitando qualquer nova reducção nos juros da divida publica, que seria fatal á economia e á reputação do paiz. (Apoiados.)

Podemos fazer esta operação em 1896 em condições absoluta e incomparavelmente superiores ás do emprestimo de 1891. Isto não o contestar o illustre deputado nem o póde contestar. Quem tenha na sua não os documentos do emprestimo, ha de reconhecer que as declarações que fiz, foram lealmente cumpridas e que os termos da operação de 1896 foram bem melhores do que os de 1891. Basta para isso reflectir no seguinte: que a operação de 1891 foi feita oppressivamente, por virtude de circumstancias que não quero rememorar.

Quando o governo tratou de negociar, o emprestimo de 1891 já tinha um compromisso, um supprimento que não podia espaçar, na importancia de 3 milhões de libras, que urgia satisfazer; para isso o unico meio que se lhe deparava, era o de uma larga operação consolidada. E tinha por outro lado a divida fluctuante a crescer, larga e rapidamente, sendo absolutamente necessario reduzil-a, sob pena de tudo se precipitar n'uma derrocada. N'estas circumstancias, forçosamente a operação de 1891 havia de ser pouco favoravel para nós.

O illustre deputado disse-nos hontem que o parlamento a votou sob a pressão do que se lhe dizia, sob a ameaça da bancarota que estava á porta, se essa operação se não realisasse; e acrescentou que só s. exa. votára contra. Pois eu votei-a, e não me arrependo. Quer isto dizer que achei vantajosa a operação de 1891? Longe de mim o pensal-o; mas desde que um governo, que tinha como ministro da fazenda um homem em cuja boa fé todos acreditavamos, nos dizia: - não posso declarar quaes as condições do emprestimo, mas a salvação do paiz depende d'elle se realisar, - poderiamos nós votar contra, ficando com a responsabilidade d'esse facto?

É muito, fácil, quando se está na opposição votar contra medidas financeiras, que se apresentam como duras, ou gravosas; mas quem está no poder e conhece os compromissos que tem a satisfazer, é que póde ajuizar da situação, e ver de onde vem um descalabro mais fundo, se de recusar uma operação de credito, se de a fazer, embora as condições não sejam favoraveis.

Não quero, como disse, alargar-me na historia da operação de 1891; a satisfação que tenho, está, como o proprio sr. Dias Ferreira reconheceu, em ter podido realisar agora um melhor emprestimo. É note-se que então se concedia o monopolio dos tabacos para que tal operação se conseguisse. Agora não havia monopolio a conceder.

E uma outra circunstancia se dava ainda: é que as obrigações que eu ia emittir, não tinham, não podiam ter, precisamente a mesma garantia, que tiveram as obrigações dei 1891. (Apoiados).

Os titulos do emprestimo de 1891 foram obrigações, chamadas de primeira hypotheca ou de primeiro grau; e não estava na minha não fazer com que todas, as de então e as de hoje, ficassem irmanadas, porque encontrei diante de mim um documento official, a obrigado geral do emprestimo de 1891, firmado pelo ministro d'aquella epocha, e em que se disse: "que as sommas necessarias para occorrer ao pagamento do respectivo juro e amortisação serio compensadas em primeiro grau na renda fixa a cargo dos concessionarios do exclusivo do fabrico dos tabacos em Portugal."

Foi isto o que então solemnemente se declarou.

Achava-me por conseguinte, perante um pacto, firmado pelo governo d'aquelle tempo, entre o thesouro e os contratadores; e o illustre deputado comprehende, que qualquer cousa que eu fizesse em contrario, seria, não só faltar á boa fé dos contratos, mas, mais ainda, querendo salvar o nosso credito, prejudical-o por completo, porque nada mais prejudicial para o paiz, do que não honrar a boa fé dos contratos, não satisfazer os compromissos publica e oficialmente tomados. (Apoiados.)

Tinha por consequencia de acceitar integralmente aquella declaração.

Já vê, pois, o illustre deputado que se com relação ao emprestimo de 1891, que tinha annexo um emprehendimento sobremodo lucrativo, qual o monopolio da tabacos, e cujos titulos representavam uma garantia mais solida, porque eram obrigações de primeira hypotheca, se reconhece que as condições da operação que realisei, apesar de ella não offerecer aos contratadores as vantagens e garantias d'aquelle emprestimo, são, ainda assim, bem memores para o thesouro, evidentemente, isto, que se alcançou, não foi pelos meus bons esforços, foi porque o credito do paiz memorou, porque a sua situação financeira e economica se tornou mais desafogada. (Apoiados.)

Nem eu quero outra conclusão.

Não quero glorias para quem realisou o emprestimo; quero para o paiz o conceito, exacto e verdadeiro, de que procura, diligentemente; honrar os seus compromissos, e de que a sua situação é hoje mais alevantada e prospera do que em 1891. (Apoiados.)

Posto isto, algumas arguições ainda fez o illustre deputado com respeito ao emprestimo, ás quaes desejo responder.

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Disse a. exa., discutindo as condições especiaes do contrato, que eu espacei os prasos do pagamento ao thesouro até l5 de dezembro de 1897, e que todavia o pagamento dos juros aos contratadores começára em 1 de outubro de 1896, quando o contrato se firmará só em 19 de novembro! E perguntava s. exa.: "então nós pagâmos juros pelo emprestimo desde 1 de outubro, quando só o realisámos em novembro?!"

"Mais ainda - dizia s. exa. - o governo tão apressado é no pagamento dos juros, que até os antecipa; e não contente com isso, proroga o pagamento das prestações, por parte dos contratadores, durante um anno; e proroga-o a ponto de que o maior numero de prestações vem exactamente a coincidir, quasi no fim de um anno da data em que o contrato se fez."

A isto que á primeira vista podia fazer impressão na camara, é que eu desejo responder, por fórma que não só nenhuma illusão, mas nenhuma duvida, absolutamente, lhe fique a este respeito.

Effectivamente, espacei os prasos do pagamento das prestações do emprestimo até 15 de dezembro de 1897. Porque? Porque este emprestimo, como ha pouco disse, não foi destinado á amortisação da divida fluctuante; se o fosse, comprehende-se que a vantagem estaria em amortisar essa divida no mais curto praso, libertando o thesouro, dos riscos e contingencias que ella lhe trouxesse. Mas não; este emprestimo foi destinado especialmente á acquisição de navios de guerra; e o pagamento d'esses navios tem de se fazer por prestações. Qual era, pois, a conveniencia do thesouro? - era receber dos contratadores á medida que tivesse de pagar aos constructores dos navios. De contrario, aconteceria ficar com a importancia a mais que levantasse do emprestimo, correndo-lhe por isso o juro sem compensação, nem necessidade.

Ora foi, precisamente, o prejuízo, que d'ahi lhe adviria, em dezenas de contos do réis, que eu quiz evitar ao thesouro.

Desde que a importancia do emprestimo só era applicavel á acquisição de navios de guerra, e que esta acquisição representava um desembolso do governo em successivas e determinadas epochas, toda a vantagem estava em que n'essas epochas o governo recebesse por um lado e pagasse por outro, ao mesmo tempo, tanto quanto possivel.

Aqui tem s. exa. a rasão por que eu espacei os prasos de pagamento, as prestações do emprestimo. Quer ver como ellas coincidem com os pagamentos a fazer ás casas constructoras? Tenho aqui o programou do concurso para a construcção dos navios de guerra. Por este programma, e pelo contrato que foi redigido em harmonia com elle, o compromisso tomado pelo governo com as casas Armstrong e Forges et Chantiers foi o seguinte:

"O governo portugues pagará o preço dos navios em dez prestações de 10 por cento cada uma: a primeira depois da quilha estar assente no estaleiro; as quatro seguintes successivamente em periodos iguaes durante a construcção; a sexta um mez depois do navio estar lançado ao mar; a setima depois das experiencias; e as tres ultimou por letras a quatro, oito e doze mezes depois da entrega do navio"

A camara comprehende que eu não podia cingir-me por completo a estas condições de pagamento, porque então espaçaria excessivamente o recebimento do emprestimo por parte do thesouro; mas, tanto quanto se podesse, era do interesse do thesouro fazel-o; por isso encontra s. exa. fixados no contrato de emprestimo, os seguintes prasos para a entrada das prestações:

Em 15 de dezembro de 1896 10 por cento

Em 1 de março de 1897 10 "

Em 15 de maio de 1897 10 "

Em 1 de agosto de 1897 10 "

Em 15 de outubro de 1897 10 por cento

Em 15 de novembro de 1897 10 "

Em 15 de dezembro de 1897 o saldo

Como se vê, a primeira prestação teve vencimento em 15 de dezembro de 1896, precisamente quando tivemos de pagar a primeira prestação ás casas constructoras dos navios de guerra. A segunda prestação vence-se em 1 de março de 1897, dois mezes e meio depois; a terceira prestação em 15 de maio de 1897, ao fim de outros dois mezes e meio; a quarta prestação em 1 de agosto, mais dois mezes e meio; a quinta prestação em 15 de outubro, ainda outros dois mezes e meio; o que perfaz, com relação a estas quatro prestações, dez mezes, porque, segundo as informações que me foram dadas, de dez mezes a um anno póde ser o tempo necessario, desde o assentamento da quilha no estaleiro, para os navios se poderem lançar á agua. Quatro prestações, a intervallos iguaes, se vencem, durante esse tempo, para as casas constructoras, outras tantas prestações, em iguaes periodos, receberá o thesouro do emprestimo que fez.

Assim, á medida que o thesouro ha de ter de pagar ás casas constructoras, vae recebendo o producto do emprestimo, por fórma a poupar, quanto possivel, todo o encargo desnecessario de juro.

Com relação as outras prestações do emprestimo, a sexta vence-se em 15 de novembro, quando, um mez depois do lançamento dos navios á agua se houver de pagar tambem a sexta prestação ás casas constructoras; e as quatro ultimas prestações vencem-se em 15 de dezembro de 1897, quando a entrega dos navios se póde verificar, sendo facil liquidar então, desde logo, o que aliás se teria de pagar, a prasos, por meio de letras.

Mas, diz o illustre deputado: "e o juro? - pagâmos o juro das novas obrigações desde 1 de outubro, quando o contrato só se fez em 19 de novembro? - porque se antecipa o juro?"

A rasão por que os juros começaram a vencer-se em 1 de outubro, é porque, como o illustre deputado sabe, nas obrigações dos tabacos, os coupons vencem-se em 1 de outubro e 1 de abril; o primeiro coupon depois do contrato é o de abril; esse coupon, para ser como todos os outros, abrange o juro desde 1 de outubro; e por consequencia desde 1 de outubro começou a contar-se o juro das novas obrigações, cujo primeiro coupon se ha de pagar em abril. Mas não representa isto um desembolso em pura perda para o thesouro, porque isso mesmo se levou em conta no preço do emprestimo, que os contratadores offereceram e o governo acceitou.

Tambem o illustre deputado, com respeito á amortisação dos titulos, disse: - "a amortisação já começou; nós ainda não recebemos, e todavia já amortisámos!"

Tambem não é exacto; pelo contrario, nós já recebemos e ainda não amortisámos, porque o sorteio para a amortisação começa com o primeiro coupon, que se vence em abril proximo. Só então é que começamos a amortisar, mas já começámos a receber, porque recebemos em 15 de dezembro a primeira prestação do emprestimo, com que pagámos a primeira prestação dos navios.

Já vê o illustre deputado, com respeito á apreciação que fez das clausulas do emprestimo, que essa operação não incorreu nos defeitos que s. exa. apontou.

Mas ha ainda uma outra apreciação de s. exa. que é da mesma fórma inexacta. O illustre deputado disse que n'esta operação de credito se tinha introduzido uma estipulação absolutamente nova, a do pagamento dos encargos por duodecimos.

Effectivamente, o contrato do emprestimo diz no artigo 8.º:

"O governo mandará pôr pela companhia dos tabacos de Portugal á disposição da contratadores d'esta operação ou de quem elles indicarem, por duodecimos, no fim

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de cada mez, a contar de 1 de outubro de 1896, e em conta do saldo disponivel da receita dos tabacos, a annuidade necessaria para o juro e amortisação do presente emprestimo e respectiva differença de cambios..."

É certo. Mas porque? Porque foi isso o que a lei determinou. A lei votada no anno passado, estabeleceu que, á parte o consistir a garantia principal no saldo disponivel do rendimento dos tabacos, no mais as novas obrigações tivessem as mesmas garantias que as anteriores. Ora, com relação ás obrigações já existentes, preceituou o contrato de 1891, no artigo 4.°, de que o illustre deputado creio se não recordava, quando julgou que era esta uma estipulação nova, o seguinte:

"A sociedade reterá, durante toda a concessão, sobre cada pagamento mensal que terá de fazer ao thesouro, pelo que lhe deve da sua parte, uma somma de 213:7841$500 réis, representativa da sexta porte de cada periodo semestral."

Ahi tem o illustre deputado o pagamento mensal ou por duodecimos.

Não só não é cousa nova, mas é o que devia ser, em observancia da lei que o parlamento votou.

Disse ainda o illustre deputado que, nos termos do contrato que eu fiz, o governo não póde contratar o resto dos 9:000 contos de réis, porque se obrigou a dar a preferencia aos contratadores do emprestimo que agora.

Tambem não é exacto.

No contrato que eu celebrei, duas cousas se estipulou. A primeira foi que o governo não emittiria o resto dos 9:000 contos de réis antes de 30 de junho d'este anno; esta é uma clausula que, com maior ou menor praso, se põe em todos os contratos, para acautelar a emissão dos emprestimos que por elles se realisam, e, como se vê, foi curto o praso de restricção que se fixou; a partir de junho proximo, fica o governo perfeitamente livre. A outra foi que o não contrataria depois em condições inferiores ás d'este contrato, sem, sobre o assumpto, ouvir os contratadores de agora; esta é uma garantia para o paiz e para o thesouro; para fazer o emprestimo subsequente dos 6:000 contos de réis, em uma ou mais series, em condições iguaes ou superiores ás d'este actual emprestimo, o governo não tem de consultar ninguem. Desde que possa fazel-o nas mesmas ou em melhoras condições, contrata liberrimamente.

Isto vae ainda de harmonia com a declaração, que eu fiz no parlamento, de que não deviamos fazer novas emissões de obrigações dos tabacos pelos preços de 1891.

E devo ainda dizer que não só o governo não está inhibido de, quando for opportuno e necessario, emittir o resto das obrigações até aos 9:000 cantos, mas, mais ainda, que pelas contas que se acham apuradas, sé mostra que o saldo disponivel do rendimento dos tabacos é para isso garantia sufficiente. Basta ver o seguinte:

No ultimo anno, de que está feita a conta do rendimento dos tabacos, - é o anno que Vae de 1 de abril de 1895 a 31 de março de 1896 - a importancia dos juros e amortisação das obrigações emittidas em 1891 foi de 2:565 contos de réis; os encargo do cambio e commissão, despezas inherentes ao serviço d'esse pagamento representaram 719 contos de réis; a totalidade, pois, da annuidade relativa ás obrigações de 1891 foi 3:285 contos. Ora, sendo a importancia da prestação, devida pela companhia dos tabacos ao thesouro, de 4:440 contos de réis, ficam livres 1:114 contos, dos quaes a annuidade respeitante ás obrigações, agora emittidas, orça approximadamente por 310 contos. D'aqui resulta que, satisfeito o encargo d'estas novas obrigações, ainda restam, approximadamente, 800 contos de réis, que podem servir de garantia á emissão das subsequentes obrigações até se perfazer o total dos 9:000 conto.

O sr. Presidente: - Observo a v. exa. que já decorreu uma hora depois que está fazendo não da palavra, mas póde continuar, porque o regimento concede-lhe ainda um quarto de hora.

O Orador: - Eu não quero cansar a attenção da comara.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - Em vista da manisfestação da camara póde v. exa. continuar. Foi só em cumprimento do regimento que fiz esta observação a v. exa.

O Orador (continuando): - O illustre deputado referindo-se ao resultado que esta operação de credito teve, ao effeito que ella produziu, achou-lhe um grave inconveniente-o de aggravar os encargos cambiaes.

É certo que todo o augmento nos encargos do thesouro a satisfazer no estrangeiro, se reflecte no premio do oiro; foi esse um dos inconvenientes em que no anno passado aqui se reflectiu; apezar d'isso, a camara resolveu levar por diante a operação, tão necessaria ella era á compra de navios de guerra.

Effectivamente, a situação cambíal presente está longe, digo-o convictamente, de corresponder ás forças economicas da nação e ás suas circumstancias financeiras; é mais gravosa do que realmente devia ser ante os recursos do paiz, computados os seus encargos, feito o confronto da sua Balança commercial. Todavia, a situação cambial precisa de ser considerada tal como ella realmente é, porque nada mais nocivo do que o exagero em assumptos praticos, financeiros, d'esta natureza.

É innegavel que o governo tem annualmente de satisfazer no estrangeiro encargos avultados; tem de pagar os juros e supplementos da sua divida externa, tem de solver os coupons da camara municipal de Lisboa, tem de completar os coupons relativos ao caminho de ferro de Mormugão, tem, por consequencia, desembolsos importantes, que se repetem periodicamente, uns em janeiro e julho, outros em abril e outubro; são compromissos indeclinaveis que demandam annualmente larga procura de oiro; e ou ha de ir buscal-o aqui ao mercado, comprando-o com notas do banco de Portugal, ou ha de levantar supprimentos no estrangeiro, mais ou menos garantidos, para obtemperar a esses encargos.

Póde n'uma occasião em que as circumstancias sejam mais apertadas, em que lhe impenda a obrigação de não pesar Sobre os cambios, ir buscar recursos ao estrangeiro, o que aliás se traduz em augmento de divida fluctuante; mas, como modo de vida normal, é no paiz que tem de procurar os recursos de que precisa.

É isto, evidentemente, uma causa de depressão dos cambios; mas que actua em relação ao governo, como actua em relação á companhia dos tabacos, á companhia das aguas, ás companhias dos caminhos de ferro, a todos os que têem pagamentos a fazer no estrangeiro. São necessidades inherentes á nossa situação, a que temos forçosamente de obtemperar.

Imaginar que em um dado momento fechâmos a porta á exportação do oiro, e que com isso nos defendemos, é pura illusão, porque se nós temos de pagar lá fóra em oiro, evidentemente esse oiro ha de sair da paiz, a não sor que tanto ou mais oiro tenhamos a receber do estrangeiro.

Que o governo seja moderado e prudente, que leve o seu bom aviso até ao ponto de, para não pesar de vez sobre os cambios, ir successivamente angariando as sommas em oiro de que precisa no estrangeiro, perfeitamente de accordo; que o faça da maneira mais acautelada, aproveitando os melhores ensejos que se lhe deparam, é esse o seu dever. Mas, se póde em circumstancias extraordinarias, abster-se por completo de o fazer, como succedeu, ha pouco, com o coupon de janeiro, e não ser, por consequencia, um concorrente no mercado, quando ahi mais escasseie o oiro, não o póde fazer sempre, como systema, porque isso representaria um incomportavel sacrificio para o thesouro.

Este é um dos lados do problema: a procura de oiro

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por parte do estado, das companhias e dos particulares, com que é preciso contar; o outro, a compensação, está no incremento das industrias e do commercio de exportação. A correlação entre estes dois elementos é que substancialmente determina uma resultante na questão, que póde, accidentalmente, ser melhor ou peior, consoante as circunstancias dos mercados externos, e especialmente, para nós, o cambio do Brazil; porque é certo e incontestavel que a uma depreciação no cambio do Brazil corresponde uma maior dificuldade na situação na nossa praça, como é evidente que a uma maior largueza de operações com o Brazil corresponde maior desafogo nos nossos mercados.

Ora, eu não vou até ao ponto de entender que seja, por agora, de utilidade ou interesse para o paiz a completa suppressão do agio cambial; tenho presente o exemplo da Italia. A Italia imaginou que podia, n'uma determinada occasião, fazer cessar o seu agio cambial, e para isso lançou mito de providencias extraordinarias. Pois nunca as suas industrias foram mais affectadas, nunca os seus recursos se apoucaram tanto, nunca por conseguinte as suas dificuldades cresceram em tão largas proporções.

O agio cambial, n'um limite moderado, póde ser, e é, um elemento do protecção para a producção nacional, para as industrias que forcejam por se desenvolver; tambem é evidente que desde que elle attinja um limite exagerado, vae pesar sobre toda a economia interna, collocando-a em precaria situação.

Mas, voltando ao emprestimo, o illustre deputado ha de reconhecer commigo uma cousa; é que decidido pelo parlamento que elle se fizesse, por uma de duas fórmas se havia de realisar: ou como emprestimo interno, ou como emprestimo externo. D'estas duas fórmas de realisação, podia s. exa. preferir uma e combater a outra; impugnar ambas e censurar o governo por qualquer d'ellas, quando lhe cumpria executar a lei, é que não póde ser.

E, todavia, foi isto o que s. exa. fez.

O illustre deputado, suppondo que o emprestimo fôra feito dentro do paiz, viu n'isso motivo para graves preoccupações, receando que elle viesse perturbar e aggravar ainda mais a questão dos cambios.

Mas contra o levantamento de capitães estrangeiros da mesma maneira, e com igual vehemencia se pronunciou s. exa., por temer que d'ahi resultem serias complicações para a nossa situação cambial.

Ora é certo que um paiz, como o nosso, que tem encargos avultados a satisfazer no estrangeiro, que precisa de oiro com que satisfaça esses compromissos, e vive n'um regimen de inconvertibilidade de notas, por serem estas a sua moeda corrente, deve usar da maxima prudencia evitando, quanto possivel, o cercear as disponibilidades em oiro.

Isto é evidente.

Mas não menos certo é que ha necessidades de administração que absolutamente se impõem, e que, d'estas, a acquisição de navios de guerra se tornára inadiavel; conseguil-a, como se conseguiu, por meio de uma operação, para que se aproveitou apenas uma parte do rendimento liquido dos tabacos, affecto ás obrigações que estavam hypothecadas no banco de Portugal, e que o governo alcançou libertar, ficando-lhe ainda um stock, realisavel, de 6:000 contos, que para qualquer eventualidade é uma reserva importante, póde não merecer o applauso do illustre deputado; imprevidencia ou desperdicio é que com certeza não é.

Com relação ao emprestimo creio ter dito o que basta em resposta ao illustre deputado. E uma vez que estou no uso da palavra permitta-me a camara que, antes de terminar, lhe dê ainda algumas informações, com respeito á nossa situação economica e financeira.

Dizer, apregoar que nunca a nossa situação economica foi tão tensa como hoje, é mais de que um erro, é um crime contra a nação, porque não representa uma verdade, não põe de util sobreaviso os que governam ou trabalham, não faz senão aterrar, illudir, mais do que isso, depreciar o paiz não só aqui, mas lá fóra, onde a repercussão d'essas falsas atoardas é uma das mais deprimentes da nossa situação financeira. (Apoiados.)

Não digo isto, comprehende-o o illustre deputado, como resposta ás suas palavras. S. exa. fallou como um homem de estado, elevadamente, serenamente, expondo as suas duvidas que eu procurei elucidar, como era o meu dever; mas eu não fallo só para s. exa., fallo para o paiz e tenho obrigação de apontar, bem claro, os perigos que corremos com tão perniciosa desorientação.

O mal não vem BÓ da mingua de esforços com que se procura debellar, vem, sobretudo, da maneira exagerada como esse mal é descripto, e dos effeitos desgraçados que isso produz em relação ao nosso credito e aos proprios recursos que precisamos de valorisar.

Isto é deprimente para os nossos proprios brios como nação. É mais do que um abuso, é um verdadeiro crime o depreciar as forças economicas do paiz, levar de rastos os seus recursos, apontal-o como não tendo meios de acção para se defrontar com as dificuldades que, dizem, nos assoberbam, nem possibilidade de poder continuar a viver como nação independente e honrada que é. (Vozes: - Muito bem). Se fosse exacto isso, seria uma imprudencia dizel-o, não o sendo é mais do que isso; é, como disse, um crime. (Apoiados.)

Nós passámos, em 1891, por uma crise aguda, é certo; mais financeira, no meu entender, do que propriamente economica. Tenho-o dito repetidas vezes e muito a mal m'o têem levado. Os effeitos, porém, mais instantes e mais opprimentes d'essa crise successivamente têem tendido a desvanecer-se, representando, por consequencia, a nossa situação economica uma melhoria em relação ao que foi.

Não tem faltado quem me assalte por todos os lados e por todas as fórmas, porque eu ouso dizer isto ao meu paiz. Tenho, todavia, a convicção de que se dissesse o contrario não só faltaria á verdade, mas prestava-lhe o maior de todos os serviços, porque seria então eu a malsinar o seu credito.

Comprehendo que n'uma nação haja discussões politicas internas, que os homens publicos se degladiem, se combatam; a ambição do poder não fica mal aos que na vida politica terçam as suas armas. O que não comprehendo, é que para isso se empreguem aquelles meios, com absoluta ausencia de escrupulo, sem se olhar ao effeito das palavras que se proferem ou aos boatos que se propalam; não comprehendo que se vá ao ponto de se atacar, não os governos, mas a situação do paiz, não os actos dos que administram, mas propriamente o modo de ser da nação. (Apoiados geraes.)

Não têem sobrescripto estas minhas palavras, não as dirijo a ninguem, não viso nome nenhum, digo isto, porque é o que acode do fundo da minha convicção ao ouvir os apódos com que muitas vezes os assumptos mais graves, mais serios que mais prendem com a inteireza da nação, que é a nossa patria, são tristemente abocanhados! Muitos apoiados.)

Sr. presidente, façamos uma ligeira comparação sobre o movimento do paiz em 1891-1892 e 1895-1896.

Vamos á balança do commercio.

Em 1891-1892 (tomo este anno por ponto de partida, não arbitrariamente, mas porque foi precisamente o anno em que a crise se revelou mais funda), a totalidade das nossas importações para consumo, baldeação e transito, abstraindo do oiro e prata, a que logo me referirei, foi do 44:539 contos de réis. A exportação, n'esse mesmo anno foi de 35:255 contos de réis.

Em 1895-1896 (ultimo anno economico de que ha estatisticas apuradas), a importação completa foi de 51:634

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contos de réis, e a exportação total foi de 37:889 contos
de réis.

Isto dá o seguinte resultado: o movimento total de importação e exportação, e por consequencia de tudo, que entra como elemento de valorisação, em 1891-1892, é representado por 68:791 contos de réis; em 1895-1896 por 79:004 contos de réis. A camara vê, pois, que na valorisação d'este movimento, comprehendendo tudo, importação e exportação, o augmento é consideravel.

Mas estabeleçamos mais propriamente o confronto.

É certo que entre a importação e a exportação a differença foi: em 1891-1892 de 9:283 contos; em 1895-1896 de 13:745 contos de réis. Parece, á primeira vista, que o deficit relativo da exportação se traduz em 1895-1896, por um absolutamente desconsolador aggravamento de 4:461 contos de réis, quando não é exacto. Basta discriminar o seguinte: em 1895-1896, para mais na importação de materias primas 3:612 contos de réis, o que é uma prova do incremento das nossas industrias; assim este augmento de importação, longe de accusar empobrecimento para o paiz, é, pelo contrario, um testemunho eloquente do engrandecimento das nossas forças productoras e industriaes.

Ao mesmo tempo vemos: para mais na exportação de tecidos 1:018 contos; em manufacturas diversas 233 contos. Na importação e exportação de gado um augmento, parallelo, superior a 1:800 contos, o que depõe a favor da nossa industria de engorda.

Por conseguinte, ao passo que a importação das materias primas, necessarias ao desenvolvimento das nossas industrias, augmentou 13:612 contos n'um anno, a exportação de tecidos, manufacturas dos productos fabricados dentro do paiz, cresceu tambem consideravelmente, de sorte que a conclusão que se apura d'este confronto da dois annos, 1891-1892 e 1895-1896, é de que a industria se activa, e commercio se valorisa e o movimento cresce em todo o sentido.

Vejamos agora no que diz respeito propriamente ao oiro e á prata; comparemos ainda os dois annos, o anno da crise e o ultimo anno decorrido, e veremos que a importação de oiro e prata em barra, e em moeda, foi: em 1891-1892, de 5:402 contos; em 1895-1896, de 894 contos; e que a exportação, que em 1895-1892 foi de 23:819 contos, desceu, em 1895-1896 a 2:682 contos. De modo que, successivamente, a drenagem do oiro, que era uma das causas mais depauperadoras da nossa economia, diminuiu em muito, o que é tanto mais importante, que, como vimos, o valor das transacções, longe de enfraquecer, tem significativamente augmentado.

Especificando o movimento do oiro e da prata, apuram-se os seguintes resultados: com relação ao oiro, em 1891 importámos 3:721 contos e exportámos 29:707 contos; no ultimo anno, de que ha estatistica completa, que é o de 1895, importámos 906 contos, e exportámos 2:099 contos. Com relação á prata, em 1891, tivemos uma importação de 4:547 contos de réis; foi quando se imaginou que era possivel com prata franceza, obtemperar ás necessidades da circulação; importámol-a e ella desappareceu rapidamente, sem beneficio apreciavel; então a exportação foi, apenas, de 96 contos; em 1895 tivemos 236 contos de réis de importação contra uma exportação de 209 contos.

De todos estes numeros se evidencia que o nosso movimento commercial augmentou muito n'estes ultimos cinco annos, que notavelmente se desenvolveu a producção e a industria, e que, emfim, cessou a larga drenagem de oiro que tanto nos affectou em 1891. Quem, pois, quizer tirar uma conclusão imparcial, conscienciosa e verdadeira, ha de dizer que a situação do paiz melhorou.

Mas não é só isto, não é só o movimento geral do commercio do paiz que o demonstra; é ver tambem o das nossas colonias, é ver, uma por uma, o das nossas provincias ultramarinas, comparando o anno de 1891 com o de 1895.

Assim, Cabo Verde que em 1891 tinha um movimento commercial no valor de 1:028 contos, em 1895 teve já um movimento, cujo valor se representou por 1:651 contos. A importancia dos direitos aduaneiros cobrados em 1891 foi de 135 contos de réis, em 1895 foi de 176 contos de réis.

Na Guiné ao valor de 519 contos em 1891 correspondeu em 1895 o de 563 contos. A importancia dos direitos foi de 22 contos em 1891, de 26 contos de réis em 1895.

S. Thomé teve um movimento no valor de 1:747 contos em 1891, em 1895 de 3:325 contos; os direitos cobrados em 1891 foram de 159 contos de réis, em 1895, de 145 contos de réis, não sendo por consequencia o thesouro que se aproveitou d'esse augmento, mas sim o commercio e em larga escala.

Em Angola o valor foi, em 1891, de 9:684 contos, e, em 1895, de 11:651 contos de réis; os direitos subiram de 1:079 a 1:210 contos.

Finalmente, em Moçambique ao valor de 5:096 contos em 1891 succedeu o de 8:227 contos em 1895.

De fórma que a comparação da totalidade dos valores e dos direitos, nos dois annos a que me tenho referido, dá os seguintes resultados: em 1891, um movimento commercial na importancia de 18:037 contos; em 1895, decorridos apenas quatro annos, um valor total de 25:418 contos; em 1891 os direitos cobrados nas alfandegas ultramarinas sommam 1:935 contos; em 1895 elevam-se a 2:523 contos de réis.

Portanto, não é só o movimento geral do paiz, é especialmente o das nossas colonias, que nos mostra o que temos a esperar do futuro. O confronto indica-nos, não que a nação está pobre, não que a situação economica se tem aggravado, mas, pelo contrario, que o paiz tem forcejado por se desenvolver no seu commercio, na sua producção e nas suas industrias, por uma fórma que se traduz já hoje em beneficies perfeitamente apreciaveis, não sendo licito a ninguem de boa fé contestal-o.

Não sei se estou abusando da paciencia da camara...

Vozes: - Não, não.

O Orador: - Podia terminar aqui o meu discurso, mas alguns esclarecimentos desejo ainda dar á camara, porque a todos realmente interessam. Depois de me ter referido á situação economica, desejo fallar da situação financeira.

Não posso, n'este momento, dizer á camara qual foi o resultado do ultimo exercicio financeiro que terminou, ha pouco, em 31 de dezembro; conto fazei-o quando apresentar aqui o meu relatorio de fazenda; mas posso desde já referir-me á gerencia de 1895-1896 e comparal-a, tambem, com a de 1891-1892; a comparação dá-nos os seguintes resultados:

Em 1891-1892, a totalidade das receitas representava-se por 38:643 contos, a das receitas ordinarias por 38:478 contos. Em 1895-1896 a totalidade das receitas attingiu 53:220 contos a das receitas ordinarias 52:111 contos

Façam todos os correctivos que quiserem; eu sei bem quanto se procura amesquinhar os resultados vantajosamente alcançados n'estes ultimos annos; não poderão negar que as receitas do paiz têem largamente crescído.

Ha, é certo, um correctivo a fazer e é importante: é o que respeita aos juros dos titulos na posse da fazenda; mas esse é tanto na receita como na despeza. Comparando o orçamento, que já apresentei, para o proximo anno, de 1897-1898, com o de 1893-1894, que foi apresentado pelo illustre deputado, apura-se que em 1893-1894 o nominal dos titulos na posse da fazenda era de 47:216 contos, sendo de 1:322 contos os juros respectivos, ao passo que em 1897-1898, incluindo os titulos que o governo foi, pela lei de orçamento do anno passado, auctorisado a crear para amortisação e reforço de cauções,

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o nominal se eleva a 140:116 contos, a que correspondeu juros na importancia de 3:997 contos.

Como os juros d'estes titulos se descrevem tonto na receita como na despeza, porque o proprio estado é d'elles credor e devedor, é este um correctivo a fazer nas receitas e nas despegas das differentes gerencias, para bem se poderem comparar. Mas feito esse correctivo, o augmento no receita total do estado, de 1891-1892 para 1895-1896, é ainda de 11:902 contos de réis, de 10:958 contos na receita ordinaria.

Pelo contrario, no que diz respeito ás despezas, é certo que a despeza total de 1891-1892 foi, segundo as contas que se acham publicadas, de 54:947 contos para uma receita total do 38:643 contos, o que representava um deficit de 16:303 contos, ao posso que em 1895-1896 a totalidade das despezas, comprehendendo as que foram feitas com as expedições ao ultramar, na importancia de 2:412 contou, só n'esse anno, foi de 54:571 contos para uma receita de 53:220 contos, dando por consequencia um desequilibrio de 1:350 contos tão somente.

E feito o correctivo, que acima referi, concernente aos juros dos titulos de divida consolidada na posse da fazenda, em uma e outra d'essas gerencias, se apura approximadamente: em 1891-1892, uma receita de 37:321 contos, uma despeza de 53:625 contos, um deficit de 16:304 contos; em 1895-1896, uma receita de 49:223 contos, uma despeza de 50:574 contos, um deficit de 1:351 contos. E, portanto, noa cinco ultimos annos, um augmento do 11:902 contos na receita, uma diminuição de 3:051 contos na despeza, uma reducção de 15:053 contos no deficit.

Podem os malevolos ou os descrentes ajuizar de animo sombrio a situação, financeira do paiz em presença d'estes elementos de confronto, façam ainda os correctivos que quizerem, o que é certo e innegavel é que, comparadas as receitas e despezas effectivas de ha cinco annos com as que hoje tomos, evidentemente a situação do thesouro é bem mais desafogada. (Apoiados.)

Attentemos, especialmente, no movimento das receitas aduaneiras.

Em 1891-1892 os direitos de consumo em Lisboa, que como a camara sabe, não só interessam ao thesouro, mas reflectem os proprios condições economicas da capital, representavam-se por 2:002 contos de réis; em 1892-1893 por 2:008 contos: em 1893-1894 por 1:867 contos; em 1894-1895,por 1:899 contos; e em 1895-1896 por 2:056 contos, mais do que em nenhum dos annos anteriores.

O imposto do real de agua produziu, em 1895-1896, ao todo, 1:053 contos, quando em 1893-1894 rendêra 1:006 contos, e em 1894-1895 só 965 contos.

Não fallarei agora dos direitos dos cereaes, que se inscrevem por mais ou por menos, conforme a importancia que se manda vir do estrangeiro para preenchimento do deficit da producção do paiz; a esses logo me referirei, unicamente pata explicar, quando tratar da divida fluctuante, uma das rasões do seu augmento.

As restantes receitas aduaneiras que em 1891-1892 foram de 12:174 contos e que em 1892-1893 desceram a 11:847 contos em cujo excedente a 11:400 contos têem partilha, successivamente se elevaram: em 1893-1894 a 13:190 contos; em 1894-1895, a 13:507 contos e em 1895-1896, a 15:014 contos.

A somma total das receitas aduaneiras, que em 1891-1892 se representava por 14:735 contos, foi em 1895-1896 de 20:134 contos de réis.

São resultados positivos. Não ha aqui orçamentologia possivel. É o que se apura das estatisticas dos alfandegas.

É certo que no segundo semestre de 1896, primeiro de 1896-1897; houve um decrescimento nas receitas aduaneiras. Assim, a receita geral de julho a dezembro, que em 1895-1896 fôra de 6:931 contos, desceu em 1896-1897 a 6:520 contos, havendo por consequencia uma diminuição de 411 contos; como houve uma diminuição de 583 contos nos cereaes, e, por isso, de 957 contos no total, diminuição que implicitamente affectou as receitas que se acham affectas aos credores externos.

É assim que encontramos, de julho a dezembro de 1896-1897, um apuramento de 6:183 contos, quando em 1895-1896, em igual periodo, se apurára 7:033 contos.

De que provera está diminuição nas receitas aduaneiras? Proveiu de causas diversas, evidentemente, diversas, mesmo, em relação a Lisboa e ao Porto.

Assim, com relação a Lisboa, a diminuição proveiu, principalmente, do menor producto dos direitos sobre o importação do assucar, em resultado da antecipação que se fez em presença da lei que votámos aqui no anno passado. Para isto basta ver o seguinte: - de julho a novembro, de 1896, a diminuição, na receita geral da alfandega de Lisboa, foi ao todo, de 293 contos; pois só no assucar baixou o producto dos direitos em 313 contos; alem de que houve tambem uma diminuição de 63 contos no producto do alcool, e de 36 contos no dos tecidos de algodão. Quanto á alfandega do Porto, verifica-se que ali não foi propriamente a diminuição na receita dos direitos sobre o assucar que cansou a differença; foi, sobretudo, a diminuição no producto do alcool que, já de julho a outubro, se traduziu em 206 contos; a do assucar foi de 85 contos; estas duas verbas explicam de sobra a diminuição de 274 contos que, durante esses mezes, se deu na receita geral d'aquella alfandega.

Aqui tem a camara as rasões por que, no segundo semestre de 1896, decresceram as receitas aduaneiras e quaes as verbas d'esse decrescimento. Tratarei agora da divida fluctuante.

Segundo os mappas que se acham publicados no Diario da governo, a divida fluctuante que estava em 29:418 contos em 31 de dezembro de 1895, subiu em 30 de novembro de 1896 a 32:619 contos. Foi, portanto, o augmento, durante os onze mezes decorridos, de 3:201 contos. Este augmento procede: em primeiro logar, de se ter effectuado o pagamento ao empreiteiro Hersent, pela indemnisação arbitrada em virtude da revisão do contrato das obras do porto de Lisboa, que representa a satisfação de uma divida, na importancia de 682 contos, quantia que não póde, por isso, levar-se á conta de despezas de administração; em segundo logar, de se incluir n'aquelle augmento a importancia da compra de prata, que se realisou para a celebração do centenario da India, e que foi de 370 contos de réis. Estas duas verbas sommam 1:052 contos de réis. E se a isto juntarmos: 681 contos, que amais se gastou com as expedições ultramarinas; os 957 contos, que a menos produziram as receitas aduaneiras, e o augmento de encargos que nos trouxe a subida no agio do oiro, teremos, por completo, explicado as rasões por que a divida fluctuante se avolumou em 3:201 contos, nos ultimos mezes do anno que findou. Porque de 31 de dezembro de 1895 a 30 de junho de 1896, a differença foi pouco sensivel; era de 29:418 contos; ficou, em 30 de junho de 1896, em 29:462 contos; o augmento da divida fluctuante deu-se, portanto, no ultimo semestre, e deu-se pelas rasões que acabo de expor.

O aggravamento da crise cambial evidentemente contribuiu em muito para isso, não só porque produziu um retrahimento no commercio de importação, como as estatisticas comprovam, mas mais ainda, porque veiu difficultar a questão da importação dos trigos, e impedir que o governo auctorisasse desde logo toda a importação que presumisse necessaria ao paiz para saldar o deficit de producção propria. Conjugadas estas circumstancias com a alta de preço que se deu nos trigos americanos, resultou d'ahi que não só o governo teve de restringir a importação, mas teve, não menos, de fixar um direito de entrada muito menor. Ao posso que no anno anterior tinha esta-

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belecido a taxa de 20 réis por kilogramma para o trigo que se despachasse nas alfandegas, viu-se, agora, na impossibilidade de marcar mais do que 8 réis.

D'aqui resultou não só que a importação dos cereaes foi menor, na ultima quadra da 1896, do que fôra em 1895, mas que a propria importancia da direitos cobrados sobre a importação que se realisou, foi tambem muito menor. É evidente que isto se traduziu por uma fórma immediata e manifesta no decrescimento da receita aduaneira, e por consequencia no aggravamento da divida fluctuante.

Examinemos agora a questão por outro lado.

Como a camara sabe, a moeda corrente hoje no paiz são as notas do banco de Portugal; os encargos do governo são satisfeitos principalmente pela sua conta corrente com o mesmo banco; o movimento, portanto, d'essa conta corrente e o estado da circulação fiduciaria são indicadores da situação financeira, se não completos, em todo o caso sobremodo importantes.

O que nos dá a comparação, em determinadas epochas, do estado da ponta corrente do thesouro, com o banco de Portugal?

Cito os factos, não como arguição a outros governos, mais uma vez o digo, mas pelas conclusões a que preciso de chegar.

Em 27 de janeiro de 1892, a divida do thesouro ao banco, por contratos especiaes, era de 13:931 contos; em 22 de fevereiro (quando nós assumimos o governo) era de 22:257 contos; o augmento, por consequencia, durante aquelle período (ministerio do sr. Dias Ferreira), foi de 8:326 contos de réis. A conta corrente, no mesmo periodo, subiu de 5:645 a 10:151 contos, e, portanto, mais 4:506 contos; a divida por escriptos do thesouro foi paga, na importancia de 4:198 contos. Assim, o augmento total do debito foi de 8:134 contos.

Note a camara: 8:134 contos de réis de augmento em pouco mais de um anno! Quer isto dizer que a gerencia do illustre deputado fosse menos cuidadosa, menos diligente do que tem sido a gerencia do actual governo? Não; mas ha de querer dizer alguma cousa. Desde que eu provo que, a partir de então até hoje a proporção de augmento é singularmente menor, e desde que a ninguem occorre, por certo, attribuir a rasão d'essa differença a menos competencia por parte do illustre deputado o sr. Dias Ferreira, que tão conhecedor é dos negocios publicos para gerir a fazenda da nação, evidentemente havemos de concluir todos que, se o movimento do debito do thesouro pela conta corrente com o banco tem decrescido, é porque os recursos da nação têem melhorado, e porque a situação financeira é hoje mais desafogada. (Apoiados.)

Ora a verdade é que, desde 22 de fevereiro de 1893 até 23 de dezembro de 1896, data do ultimo balancete do banco, a divida do thesouro por contratos especiaes diminuiu em 573 contos; o debito em conta corrente augmentou em 8:034 contos, e por escriptos do thesouro em 1:065 contos, havendo, porém, em deposito á ordem da junta, 1:142 contos. Assim, feita a liquidação de tudo, apura-se que o debito liquido do thesouro ao banco, só cresceu em 7:384 contos, durante perto de quatro annos, entrando n'esses 7:384 contos: - 2:456 contos, pagos aos bancos do Porto em satisfação da antiga divida das classes inactivas; 234 contos, em adiantamento á companhia de Ambaca, a reembolsar pelo contrato de 20 de outubro de 1894; - 682 contos pagos ao empreiteiro Hersant pela rescisão do seu contrato em 1892; - 370 contos, compra de prata para o centenario da India, de que o estado se reembolsará pelo producto da amoedação; e cerca de 3:000 contos com as expedições que houvemos de mandar á Africa, em defeza da soberania nacional.

A camara, feito o confronto, que lhe tire as illações.

E note-se que ainda este confronto me é desfavoravel, porque tive de ir buscar para ponto de partida, em 1893, o mez de fevereiro, que é exactamente a epocha do anno em que pela entrada das receitas provenientes dos impostos directos a situação da conta corrente com o banco de Portugal é sempre relativamente melhor, tanto que, de dezembro de um anno a fevereiro ao anno seguinte, baixa o debito do thesouro ao banco, pela sua conta corrente, em 2:000 a 3:000 contos, como se póde ver comparando, nos differentes annos os respectivos balancetes com dezembro, em 1896, a epocha peior, em qualquer anno.

Pelo que toca á circulação fiduciaria não discuto, n'este momento, se ella póde attingir 72:000 contos, como o illustre deputado propunha em 1893; o que vejo é que por emquanto, felizmente, estâmos afastados d'esse limite; e quanto mais afastados estivermos melhor, porque desde que ultrapasse o limite, que as circumstancias do mercado comportam, difficil é prever quaes sejam os resultados, em toda a sua calamitosa extensão.

Mas quero, num singelo confronto, mostrar qual tem sido o movimento da circulação fiduciaria nos ultimos tempos.

Desde 27 de janeiro de 1892 até 20 de fevereiro de 1893, toda a epocha comprehendida na administração do illustre deputado, o augmento na circulação fiduciaria foi de 12:003 contos de réis; o augmento da circulação fiduciaria, de 22 de fevereiro de 1893 a 23 de dezembro de 1896, gerencia do actual governo, foi de 10:500 contos; que, se, em parte, são devidos ao debito do thesouro, em não pequena parte resultam, tambem, das solicitações da praça, e que já no dia de hoje devem, como em todos os annos, ter baixado em cerca de 2:000 contos.

O confronto é significativo.

Succede isto, porque eu tenha podido, cohibir o crescimento da circulação fiduciaria, pela minha administração, pelo meu esforço, pela minha diligencia, quando o sr. Dias Ferreira o não pôde fazer? Ninguem de certo lhe faz essa injustiça nem me tributa esse louvor. Nem eu o quero. O que quero, porque isso é em proveito do paiz, é a conclusão que tenho o direito de tirar do facto da circulação fiduciaria, em pouco mais de um anno, crescer na importancia de 12:000 contos de réis, e, durante os ultimos quatro, annos, se ter elevado, em muitos menos, absoluta e relativamente. Essa conclusão é que, sem duvida nenhuma, as condições financeiras do paiz têem melhorado consideravelmente. (Apoiados.)

Portugal, pelos sacrificios a que se tem sujeitado, e pelos largos e persistentes esforços com que tem procurado debellar a crise que violentamente se lhe abriu, bem merece o conceito que é devido a toda a nação que trabalha honradamente para levantar o nivel do seu credito e a prosperidade do seu futuro. (Muitos apoiados.)

Posto isto, desinteressado como fui na exposição que acabo de fazer, não é muito que, presidindo a um governo, eu invoque a obra d'esse governo.

Já dei ao paiz a sua parte - os esforços, o trabalho que pôz em melhorar as suas condições financeiras, os resultados assim alcançados pela sua propria diligencia; não á muito que remate o meu discurso, fallando tambem um pouco do que o governo tem feito. (Apoiados.)

Os tempos não vão longe, em que um homem, cuja memoria nos é saudosa, um talento culto, um espirito superior, o sr. Oliveira Martins, entrava aqui e lendo-nos um relatorio em que se continha o balanço que déra á fazenda publica, nos deixava aterrados, dizendo-nos que não só encontrava um deficit, que mal sabia como solver, de 10:000 contos de réis, quasi 20 por cento das receitas publicas, mas que, a par d'esse deficit, encontrava, não menos, o thesouro no desembolso de 13:006 contos, por adiantamentos feitos a bancos e a companhias, mal cobertos e garantidos, cuja cobrança não via modo de realisar a praso certo.

E citava, tristemente, que o thesouro era credor: do syndicato de Salamanca, por 5:350 contos; do banco Lusitano, por 500 contos, e mais 1:044 contos de responsa-

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104 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

bilidade por aval; da companhia real dos caminhos de ferro portugueses, por 5:062 contos; dividas de diversas proveniencias; da companhia nacional dos caminhos de ferro, por 60 contos, fóra os juros; do banco do Povo, por 50 contos em aval; da companhia de fundição e forjas, por 20 contos, tambem em aval; da antiga empreza do theatro de S. Carlos, por 10 contos, ainda em aval; da mala real portugueza, por 910 contos. E ainda poderia disser, da companhia de Ambaca, por 989 contos de réis.

Tudo isto estava por liquidar, e tudo isso por liquidar ficou, quando a poucos passos saíu o sr. Oliveira Martins, e quando, mais tarde, se demittiu o sr. Dias Ferreira.

A situação que desenrolou aquelle sudario de miseria; não pôde, mau grado seu, faço-lhe essa inteira justiça, liquidar um só dos desembolsos em que encontrou a fazenda publica.

Pois tudo isto, ou quasi tudo, tem o actual governo liquidado, dando-lhe fórma de pagamento: o debito do syndicato de Salamanca, pelo contrato que fez em 10 de maio de 1894, pondo os bancos do Porto em circumstancias de mais desafogadamente poderem continuar as suas operações; os avales dados ao banco Lusitano e á antiga empreza do theatro de S. Carlos, pelo contrato feito com o banco de Portugal em 9 de fevereiro de 1895; os adiantamentos feitos á companhia real dos caminhos de ferro portuguezes, pelo convenio de 1894, que o tribunal de commercio sanccionou; os que fizera á mala real portugueza, acceitando a concordata que ante o tribunal foi proposta; os da companhia do Ambaca, polo contrato de 20 outubro de 1894.

Tudo isto se regularisou. E duas reservas importantes tem hoje o thesouro comsigo: o stock das obrigações dos caminhos de ferro do norte e leste, já valorisadas pela cotação que lhes abriu a bolsa de Paris; a faculdade de emittir 6:000 contos nas obrigações dos tabacos, que o governo encontrou hypothecadas ao banco de Portugal.

Temos tido uma vida difficil, sr. presidente, entrecortada de espinhos, sobresaltos e dificuldades de toda a ordem, dentro e fóra do paiz; e creia a camara que não são as questões internas que mais preoccupam, nem as que mais angustiam. Temos, porém, uma satisfação, e com isto remato: é que se temos tido dificuldades internacionaes, nós mesmos as temos resolvido; não as legâmos aos nossos successores.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi cumprimentado por quasi todos os deputados presentes, e pelos dignos pares que se achavam na sala.

S. exa. não revê as notas tachygraphicas dos seus discursos.

O sr. Carlos Braga: - Tenho a honra de enviar para a mesa um parecer das commissões de instrucção primaria e secundaria, sobre o assumpto de um oficio do ministerio do reino, enviado a esta camara em data de hontem.

O sr. Presidente: - Vae mandar-se imprimir, e depois será distribuido pelos srs. deputados.

Estão inscriptos os srs. Teixeira de Sonsa e José Dias Ferreira, mas faltando apenas alguns minutos para dar a hora, se a camara não resolve o contrario, fecho a sessão. (Apoiados.)

A ordem do dia para ámanhã é a mesma que veiu para hoje.

Está fechada a sessão.

Eram quasi seis horas da tarde.

Justificações de faltas apresentadas n'esta sessão

Participo á camara que o sr. deputado Cau da Costa tem faltado e continuará faltando ás sessões por motivo de doença. - Manuel Fratel.

Pede-me o sr. Augusto Dias Dantas da Gama para participar a v. exa. e á camara que, por motivo de doença, não tem pedido comparecer, nem poderá ainda por alguns dias vir tomar parte nos trabalhos parlamentares. = O deputado, F. J. Patricio.

Para a secretaria.

O redactor = S. Rego.

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