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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO DE 18 DE JANEIRO

PRESIDENCIA DO SR.º REBELLO DE CARVALHO

Aos tres quartos depois do meio dia verifica-se, pela chamada, estarem presentes 77 srs. deputados.

O sr. Presidente: — declara aberta a sessão.

Acta approvada.

Mandam-se lançar na acta as seguintes declarações:

1.ª Do sr. Pinto Martins, de que não compareceu ás duas sessões antecedentes por incommodo de saude. — Inteirada.

2.ª Do Sr. Couto Monteiro, de que faltou ás duas sessões antecedentes por incommodo de saude. — Inteirada.

3.ª Do sr. Mamede, de que o sr. Santos Lessa, por motivo justificado, não tem podido comparecer nas primeiras sessões da camara, mas espera apresentar-se muito brevemente. — Inteirada.

CORRESPONDENCIA

1.° Um officio do ministerio do reino acompanhando os esclarecimentos pedidos pelo sr. Arrobas, ácerca da eleição do circulo n.° 116.

Por proposta do sr. Arrobas mandam-se imprimir com urgencia.

2.° Da direcção da companhia união mercantil, acompanhando 200 exemplares de documentos relativos á mesma companhia. — Mandam-se distribuir.

Deu-se expediente pela mesa ao seguinte requerimento:

Requeiro se peça ao governo, para remetter a esta camara, o seguinte:

1.° Uma relação de todo o movimento da relação dos Açores, nos ultimos dez annos, das causas, assim civeis como crimes, aggravos de instrumento e de petição, cartas testemunháveis, e conflictos, com declaração da procedencia dou juizos ou tribunaes inferiores d'onde tenham subido, e das que excederam a alçada da mesma relação.

2.° Os estatutos dos hospitaes de Ponta Delgada, da Ribeira Grande, e Villa Franca do Campo da ilha de S. Miguel.

3.° Uma relação do movimento maritimo do porto de Ponta Delgada, da ilha de S. Miguel, com designação dos portos, de que tenham procedido as embarcações entradas nos ultimos dez annos, e dos carregamentos d'aquellas que tenham procedido de portos das outras ilhas dos Açores.

4.º Relação dos navios entrados nos ultimos dez annos no porto de Lisboa, procedentes dos portos dos Açores, com designação d'estes.

5.° Qual o numero de pessoas que nos ultimos seis annos tem visitado o Valle das Furnas, na ilha de S. Miguel.

6.° Qual o numero de navios que dos Açores tenham transportado colonos para o Brazil e Estados Unidos, com designação dos portos de que tenham partido, e do numero de passageiros que cada um transportou.

7.° Quantos processos crimes se tenham, intentado no districto de Ponta Delgada por motivos de emigração illegal ou clandestina, com designação do julgamento de cada uma das causas, e das em que interveio o jury, e qual a sua decisão, e quantas vezes esta tenha sido julgada iniqua pelos respectivos juizes, tudo isto nos ultimos dez annos. = O deputado pela Ribeira Grande, F. M. R. Bicudo Correia.

É remettido ao governo.

Tambem são mandadas, ao governo as seguintes notas de interpellação:

1.ª Pretendo ser inscripto para tomar parte na interpellação que o sr. deputado Dias Ferreira - mandou hontem para a mesa, dirigida ao sr. ministro das obras publicas, sobre o ramal da estrada da Raiva. = José de Moraes Pinto de Almeida.

2.ª Pretendo interpellar o sr. ministro das obras publicas, por se não ter cumprido o contrato do caminho de ferro de Belem a Cintra, approvado pela lei de 26 de julho de 1855 = José de Moraes Pinto de Almeida.

3.ª Pretendo interpellar o sr. ministro das obras publicas, por se não ter cumprido o contrato feito entre, o governo portuguez e o conde do Farrobo, sobre a exploração da mina de Buarcos, no concelho da Figueira, por não ter

cumprido a condição de semear pinheiros nos montes da mina = José de Moraes Pinto de Almeida.

São enviadas ás respectivas commissões as propostas de lei apresentadas, nas sessões antecedentes pelos srs. ministros das obras publicas, da fazenda, da guerra e da marinha.

São approvadas as ultimas redacções dos projectos de lei nºs 121, 137, 151, 97, 98, 100 e 158.

O sr. Blanc (Hermenegildo): — manda para a mesa dois pareceres, um da commissão de fazenda e outro da commissão de verificação de poderes.

O sr. Palma: — chama a attenção do sr. ministro das obras publicas sobre o importante ramo de serviço que se tem deixado de fazer na provincia de que é representante: refere-se ao estabelecimento da linha telegraphica, prolongando-se desde Faro ao Cabo de S. Vicente: esta linha devia de ter, na sua opinião, seguido outra directriz, que elle tinha proposto, como funccionario que era, e o sr. ministro das obras publicas de então, não admittindo a directriz que devia seguir pelo Cabo de S. Vicente, e depois continuar pelo litoral do Algarve, ordenou que ella seguisse as margens do Guadiana, dizendo s. ex.ª que era por causa da fiscalisação daquelle rio; e acontece que esta directriz, muito dispendiosa e muito custosa que se levou pelas margens do Guadiana, não serve de fiscalisação, porque entre Beja e a Foz do Guadiana não ha estação alguma; ha uma estação em Beja e outra na Foz do Guadiana, não tendo offerecido vantagem alguma ao serviço da fiscalisação, e trazendo o inconveniente de não communicar um ponto importantissimo das nossas costas que é o Cabo de S. Vicente, onde se abrigam immensas embarcações nas invernadas, onde o commercio tem muitas vezes suspensa a sua fortuna, o podia por aquelle meio tranquillisar-se; e é este ponto que está ainda sem communicação telegraphica. Espera, pois, que s. ex.ª, conhecendo a importancia d'esta linha, ha de ordenar que ella comece quanto antes.

Tambem chama a attenção de s. ex.ª sobre a escassez de estações telegraphicas. Não propõe que se estabeleça uma estação telegraphica em Alcoutim, visto o pouco pessoal habilitado para o estabelecimento das estações, mas sem duvida Mertola é um ponto que não póde deixar de merecer a consideração do governo, para o estabelecimento de uma estação telegraphica.

Olhão não póde deixar de ter uma linha telegraphica; é hoje um dos pontos mais commerciaes do Algarve, e está certo de que s. ex.ª, logo que lhe seja possivel, não deixará de tomar em attenção este objecto.

Conclue pedindo ser inscripto para apresentar um projecto de lei.

O sr. Chamiço: — manda para a mesa um parecer da commissão de fazenda, approvando a despeza feita com a fiscalisação extraordinaria das alfandegas do Porto e provincias do norte.

O sr. Ministro das obras publicas (Thiago Horta): — tudo quanto os illustres deputados, que representam o Algarve, possam dizer n'esta camara para promoverem os meios de communicação d'aquella rica provincia com o resto do paiz, é muito justo.

O Algarve, que é susceptivel de tantos melhoramentos, e que promette um grande incremento na sua riqueza, se lhe forem facilitados os meios de communicação, tem estado condemnado a um isolamento quasi completo da provincia do Alemtejo e do resto do paiz.

O governo mostrará, nos projectos que tenciona apresentar á camara n'esta sessão, que tem a peito fazer cessar este estado de cousas, e roga ao illustre deputado queira ter a bondade de esperar a apresentação d'esses projectos para poder verificar o empenho que elle, orador, tem em que, se melhorem as condições de viver na provincia de que se trata.

Pelo que respeita á linha telegraphica, póde affiançar ao illustre deputado, que é sua intenção estabelecer desde já uma estação em Mertola, e já estão tomadas as providencias preliminares para este effeito. O ponto de que se trata tem toda a importancia, e hoje mais, basta a proximidade em que se acha das importantes minas de S. Domingos.

Lê-se o parecer da commissão de verificação de poderes, sobre a eleição do sr. José de Oliveira Baptista, que é approvado.

Em seguida é proclamado deputado, e sendo introduzido na sala com as formalidades, do estylo, presta juramento e toma assento.

O sr. Mendes de Vasconcellos: — participa que a commissão diplomatica se tinha installado, nomeando para presidente o sr. Silva Cabral, para relator o sr. Silva Costa, e a elle para secretario.

O sr. Presidente: — a hora está muito adiantada, e vae passar-se á ordem do dia; aquelles senhores que têem a mandar requerimentos para a mesa, podem faze-lo.

O sr. F. Luiz Gomes: — requer se consulte a camara se lhe permitte dar uma explicação sobre um incidente que teve logar na sessão de 17.

Resolve-se affirmativamente.

O sr. F. L. Gomes: — mal esperava ter tão cedo de subir á tribuna, e de passar por esta provação, que entibia os mais ousados e valentes, e á qual julga que deve completamente succumbir quem, alem de inexperiente e novo, for como elle, orador, tão pouco conhecedor do idioma portuguez. Mas, acima d'estes escrupulos de amor proprio, d'estas hesitações em ler o horoscopio de uma vida nova, está a responsabilidade que contrahiu com aquelles, que se dignaram confiar-lhe o mais honroso dos mandatos; e ao lado da sua fraqueza, vê a benevolencia que abunda n'esta camara, e da qual acaba n'este memento de receber uma prova. Relevar-lhe-ha ella, que não falle a linguagem pura e correcta, como a usaram os nossos bons classicos, e como tantas vezes tem ouvido n'esta camara, mas sim a que aprendeu em paizes afastados, e tão outros d'este.

Lamenta com sincera magoa o incidente que teve logar n'esta camara na sessão do dia 17, e muito mais lamenta que não estivesse presente ás explicações dos seus nobres collegas os srs. Arrobas e Abranches. Ignorante das praticas parlamentares, incommodado de saude, retirou-se julgando que não lhe seria dado usar da palavra que n'esse mesmo dia lhe havia sido concedida: vem, porém hoje, ainda que tarde, registrar a sua opinião ao lado d'aquella que emittiu o sr. Arrobas. Não propõe um combate, porque não tem forças para elle, principalmente vendo diante de si um contendor tão valente como o sr. Affonseca. É um protesto e nada mais.

Discutindo-se o parecer da commissão de verificação de poderes sobre a eleição de Angola, remontou-se até aos principios consignados na carta constitucional, n'esse sagrado codigo que um rei philosopho outorgou á sua nação (apoiados). Disse-se que as provincias ultramarinas não deviam ter o direito de representação nacional, porque Inglaterra, a nação mais colonial do mundo, negava similhante direito ás suas colonias, porque as provincias ultramarinas não estavam civilisadas. Deter-se-ha em cada um d'estes fundamentos.

Não duvida de que a Inglaterra seja uma nação modelo, que seja a nação que primeiro arvorou o estandarte constitucional, e revelou ás outras nações as gloriosas vias do futuro; porém mais modelos que tudo são os principios santos, que n'um governo livre mandam que centenares de cidadãos não sejam privados dos direitos politicos, desses, pelos quaes se participa da formação ou exercicio dos ponderes sociaes, só por terem tido a desdita de nascerem no ultramar (muitos apoiados).

A Inglaterra creou no Canadá um conselho legislativo e uma assembléa; o primeiro era nomeado pelo rei, a segunda eleita pelos habitantes do paiz. Um conflicto estabeleceu-se entre estes dois corpos, como era inevitavel entre quem não tinha communidade de interesses. Os membros do corpo legislativo eram como hospedes e estranhos, que pisavam a terra do Canadá, ao passo que os membros da assembléa tinham implantadas n'ella as raizes do seu patriotismo. O conflicto fez uma explosão terrivel e tal, que levou áquellas paragens o valente Richemond, o velho lord Dalhousie, amigo do celebre Wellington. Não foi possivel applacar a irritação popular; e hoje o Canadá está sendo governado militarmente. Será isso digno de imitação? Na India ingleza não são raros iguaes conflictos, e sabe Deus como têem sido suffocados.

A Inglaterra não nega ás suas colonias o direito de representação nacional, por encontrar em muitas d'ellas falta de civilisação; pois quem póde negar o titulo de civilisada á possessão do Canadá? A essa terra d'onde saíu uma assembléa, que com verdadeiro denodo e illustração, se oppoz á lista civil, que se ufana de ter produzido o eloquente Papineau! A negativa da Inglaterra é fundada em outros motivos, que não desenvolverá aqui, e que os portuguezes nunca quizeram imitar, e Deus queira que nunca imitem. São os mesmos motivos, que levam aquella poderosa nação a excluir os indigenas das suas possessões de certos empregos de consideração a despeito do seu merito; ao passo que mesmo em tempos antigos o marquez de Pombal, um dos génios maiores d'esta terra, não queria que houvesse outra differença entre os indigenas da India e aquelles que nasciam no continente, senão a do seu merito (Vozes: — muito bem, muito bem).

Passará ao segundo argumento. Não conhece todas as nossas colonias, mas conhece Macau, e conhece Goa, onde nasceu, e foi educado. Segundo o testemunho de nacionaes e estrangeiros, Macau é uma cidade quasi europea na civilisação, rica de recordações gloriosas, e unico ponto da monarchia que não conheceu a dominação dos Filippes de Castella.

Na India não ha festins de carne humana; pelo contrario ha seitas que têem as suas mãos puras de todo o sangue; que se abstêem da dieta animal; que têem piedade até para com os animaes; na India ha, segundo a estatistica, quasi 30:000 habitantes, que sabem ler e escrever; na India, finalmente, houve já, no seculo XVI, uma camara, á qual se deu o regimento da camara de Lisboa, pelo qual o corregedor, com o povo, elegia por uma eleição indirecta os vereadores. As eleições são lá muito antigas. O direito do suffragio é exercido n'aquellas provincias com tanto escrupulo, que Salsete, que elle orador tem a honra de representar n'esta camara, contando quasi 100:000 habitantes, apenas 2:000 são inscriptos no recenseamento eleitoral, porque para isso é preciso que provem pagar pelo menos 320 réis fortes de imposto.

Admitte que se queira restringir o direito do suffragio; que se queira a eleição justa, na frase de Lamartine; que se exijam do cidadão, que gosa d'esse direito, todas as condições que garantam o uso judicioso e independente do seu voto; o que, porém, não póde admittir, é que se lhe pergunte a sua naturalidade, e se indague a sua côr. São questões essencialmente differentes: n'uma procura-se só a capacidade; na outra a capacidade encontrada em certos climas, e em certas côres (Vozes: — muito bem, muito bem).

Em abono de uma opinião evocaram-se do silencio e paz do sepulchro as venerandas imagens dos Sá Correias, Benevides, e Menezes: em abono da sua evocará o terrivel Albuquerque, esse chorado heroe que, mesmo no terceiro dia da conquista de Goa, enlaçou as mãos das filhas dos vassalos do Labaio com as dos legitimos subditos do excelso e venturoso rei D. Manuel, que festejou essas nupcias como de seus filhos; que por todos os modos quiz prender a sua querida Goa á famosa Lisboa. Se lhe constasse que se tratava hoje de semear differenças onde elle queria união,