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SESSÃO DE 18 DE MARÇO DE 1871

Presidencia do ex.mo sr. Antonio Cabral de Sá Nogueira

Secretarios — os srs. Adriano de Abreu Cardoso Machado

Domingos Pinheiro Borges

Summario

Apresentação de projectos de lei, requerimentos, representações e notas de interpellação. — Ordem do dia: Approvação do adiamento do projecto de lei n.º 28, relativo a licenças — Approvação, em votação nominal, do parecer n.° 15, da commissão especial, sobre a proposta do sr. Barros e Cunha, relativa á recusa da distribuição dos impostos por parte de algumas juntas geraes e conselhos de districto — Approvação do parecer da commissão de verificação de poderes, declarando vago o logar de deputado do sr. Carlos Bento da Silva — Discussão do projecto de lei n.° 23, o qual tem por fim annexar uma porção de terreno ao concelho da Gollegã.

Chamada — 43 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: Adriano Machado, Osorio de Vasconcellos, Sá Nogueira, Antunes Guerreiro, Freire Falcão, Sousa de Menezes, Rodrigues Sampaio, Saraiva de Carvalho, Barão do Salgueiro, Ferreira de Andrade, Carlos Bento, Pinheiro Borges, Pereira Brandão, Eduardo Tavares, Francisco Pereira do Lago, Francisco Coelho do Amaral, G. Quintino de Macedo, Barros Gomes, Freitas e Oliveira, Palma, Santos e Silva, Candido de Moraes, Barros e Cunha, J. J. d'Alcantara, Mendonça Cortez, Alves Matheus, Nogueira Soares, J. A. Maia, Bandeira Coelho, Mello e Faro, Figueiredo de Faria, José Luciano, Almeida Queiroz, Nogueira, Teixeira de Queiroz, José Tiberio, Julio do Carvalhal, Julio Rainha, Luiz de Campos, Luiz Pimentel, Affonseca, Marques Pires, Mariano de Carvalho.

Entraram durante a sessão — os srs.: Agostinho de Ornellas, Anselmo Braamcamp, Pereira de Miranda, Soares de Moraes, Antonio Augusto, Veiga Barreira, Arrobas, Pedroso dos Santos, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Eça e Costa, Augusto de Faria, Bernardino Pinheiro, Conde de Villa Real, Francisco de Albuquerque, Francisco Mendes, Francisco Beirão, Costa e Silva, Caldas Aulete, F. M. da Cunha, Pinto Bessa, Van-Zeller, Jayme Moniz, Zuzarte, Augusto da Silva, Pinto de Magalhães, Lobo d'Avila, Gusmão, Dias Ferreira, Elias Garcia, Rodrigues de Freitas, Latino Coelho, Mexia Salema, Paes Villas Boas, Thomás Lisboa, D. Miguel Pereira Coutinho, Pedro Franco, Pedro Roberto, Sebastião Calheiros, Visconde de Moreira de Rey, Visconde dos Olivaes, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram — os srs.: Alberto Carlos, Villaça, A. J. Teixeira, Pequito, Santos Viegas, Antonio Telles de Vasconcellos, Antonio de Vasconcellos, Falcão da Fonseca, Barão do Rio Zezere, Silveira da Mota, Mártens Ferrão, Ulrich, Faria Guimarães, Rodrigues de Carvalho, J. M. dos Santos, Mendes Leal, Lopo de Sampaio e Mello, Camara Leme, Visconde, de Montariol, Visconde de Valmór.

Abertura — Á uma hora e um quarto da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

a que se deu destino pela mesa

Officios

1.º Da secretaria da academia real das sciencias, remettendo tres exemplares do fascículo 3.° do volume 1.º dos Monumentos historicos de Portugal (Diplomata et Chartae).

Tiveram o competente destino.

2. ° Do sr. Albano Coutinho, remettendo 100 exemplares de uma publicação intitulada — Pendencia dos officiaes de Evora Monte.

Mandaram-se distribuir.

Representações

1.ª Da camara municipal do concelho de Grandola, pedindo a restauração dos circulos de jurados. A commissão respectiva.

2.ª Dos alumnos do lyceu nacional de Angra do Heroismo, pedindo que os exames feitos n'este lyceu sejam validos, como se fossem feitos em lyceu de 1.º classe.

A commissão respectiva.

3.ª Dos colchoeiros de Lisboa, pedindo que não seja approvada como esta, a proposta de lei do governo sobre contribuição industrial.

A commissão respectiva.

4.ª Dos retrozeiros de Lisboa pedindo que o seu gremio seja incluido na 5.ª classe.

À commissão respectiva.

5.ª Dos armeiros de arma branca e dos armeiros de arma de fogo, pedindo igualmente que o seu gremio seja incluido na 5.º classe.

Á commissão respectiva.

Requerimentos

1.° Para verificar a interpellação que annunciei na sessão de 13 do corrente, requeiro que pelo ministerio da guerra me seja enviada copia da circular relativa ao licenceamento das praças alistadas para a reserva, que foi expedida em 3 do corrente mez pela 2.ª repartição da direcção geral do mesmo ministerio, aos srs. commandantes das divisões e directores geraes das armas de engenheria e artilheria.

Sala das sessões, 17 de março de 1871. = Domingos Pinheiro Borges.

2.° Requeiro que a esta camara, a fim de ser presente á commissão de fazenda, seja remettida copia do officio que, pela direcção geral do commercio e industria, foi expedido para o ministerio da fazenda, ácerca das matas nacionaes, com data de 10 de dezembro de 1869.

Sala das sessões, 17 demarco de 1870. = José Joaquim Rodrigues de Freitas Junior.

3.º Requeiro que, pelo ministerio da guerra, seja com a possivel brevidade enviada a esta camara uma nota dos requerimentos feitos ao mesmo ministerio pelo tenente do exercito Nuno Leopoldo de Magalhães Infante, ácerca da sua antiguidade, e copias do que sobre aquellas pretensões tiver informado o conselheiro procurador geral da corôa ou seus delegados.

Sala das sessões, 17 de março de 1811. = João Candido de Moraes.

Foram remettidos ao governo.

Interpellação

Desejo interpellar o sr. ministro da guerra sobre a necessidade extrema de se mandar fazer as reparações e concertos necessarios nos quarteis do regimento de cavallaria n.° 6, que se acham em estado de ruina e brevemente estarão em pessimas circumstancias.

Sala das sessões, 17 de março de 1871. = Antunes Guerreiro, deputado por Chaves.

Mandou-se fazer a competente communicação.

Participação

Participo a v. ex.ª que por incommodo de saude não pude comparecer á sessão de 13 do corrente. = O deputado, Barjona de Freitas. Inteirada.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — Foi sempre galardão de portuguezes honrar a memoria de quantos têem contribuido para o engrandecimento da patria, e, ainda que em condições modestas, a gratidão nacional tem, a pouco e pouco, conseguido que não

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fiquem sem perdurável recordação muitos daquelles, a quem a liberdade d'esta terra deve assignalados serviços.

Na epopéa constitucional do nosso paiz figuram distinctamente, entre outros, um vulto militar, cujos feitos assombraram pela audacia, e honraram pela gloria. Refiro-me, senhores, ao venerando duque da Terceira, amigo fiel do Imperador, servidor leal de sua rilha e de seu neto, e um dos valentes a quem mãis se deve a liberdade que desfructâmos. Á memoria d'este egrégio varão que á morte nos roubou ha annos, resta pagar uma divida de honra. Se os recursos do thesouro fossem copiosos, não era muito exigir-lhe grandioso monumento que perpetuasse os seus relevantes serviços; na penuria, porém, das nossas circumstancias financeiras cumpre que nos limitemos a dar uma demonstração do nosso reconhecimento pelos nobilíssimos feitos de tão distincto general, commemorando, principalmente, aquelle que deu mãis vital Alento ao triumpho definitivo da causa liberal.

Foi no logar denominado u largo da Piedade» no concelho de Almada, que o duque da Terceira, á frente dae fôrças pouco numerosas, se arrojou no dia 23 de julho de 1833 a um notavel feito de armas, do qual resultou o prompto libertamento da capital, até então era podér dos contrarios. Rija se travou a luta, a que súbita succedeu victoria completa para a santa causa da liberdade.

Tão relevante serviço tem jus á gratidão nacional. Diga um modesto monumento ás gerações por vir, que a nação portugueza não sabe esquecer os seus heroes.

Filho do concelho de Almada e seu representante em côrtes, tenho a honra de chamar a vossa attenção sobre o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º No sitio denominado «largo da Piedade» no concelho de Almada será collocado sobre uma columna ou pedestal o busto do marechal duque da Terceira, tudo trabalhado em mármore nacional.

Art. 2.° Na columna ou pedestal serão gravadas as seguintes inscripções: de um lado = 23 de julho de 1833 = e do outro = ao duque da Terceira a nação agradecida =.

Art. 3.° O largo de que se trata será empedrado, arborisado, circumdado de uma grade de ferro e ficará sendo denominado «praça do Duque da Terceira».

Art. 4.° È o governo auctorisado a despender com o monumento e embellezamento da praça até á quantia de 4:000$000 réis.

Art. 5.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio da. côrtes, em 15 de março de 1871. = Eduardo Tavares.

Foi admittido u enviado á commissão respectiva.

Mandou-se imprimir um parecer da commissão de estatistica sôbre a representação da camara municipal de villa do Conde.

O sr. Presidente: — Como a camara ouviu, recebeu-se hoje na mesa um officio da academia real das sciencia», remettendo tres exemplares do fascículo 3.º do volume 1.° dos monumentos historicos de Portugal.

A mesa ha de dar o destino conveniente a esses exemplares, e creio que a camara annuirá a que se declare na acta que foi recebida essa publicação com muito agrado, não só por ser um trabalho importante, como por ser dado á luz por uma corporação tão respeitavel (muitos apoiados).

Vista a manifestação da camara, manda-se fazer a competente declaração na acta.

Agora, antes de dar a palavra aos srs. deputados, peço ás commissões que apresentem alguns trabalhos, porque no caso de o não fazerem não ha parecer algum na mesa que possa ser dado para discussão.

Na segunda ou terça feira a camara tem de reunir-se em commissões por não haver trabalhos de que nos possamos occupar.

Peço As commissões que tomem isto consideraçao.

O sr. Saraiva de Carvalho: — Mando para a mesa uma representação da classe de pelleiros da cidade de Lisboa ácerca da proposta de lei sobre a contribuição industrial apresentada pelo govêrno a esta camara.

Reservo-me para fazer as considerações que julgar convenientes ácerca das respectivas taxas quando a proposta do governo vier á discussão.

Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se consente que esta representação seja publicada na folha official.

O sr. Santos e Silva: — Tenho a honra de mandar para a mesa duas representações, uma é da illustrada classe dos facultativos de Lisboa, reclamando contra a taxa que lhes está marcada na respectiva tabella da contribuição industrial, que brevemente vae ser sujeita á discussão da camara; outra é dos srs. commerciantes da cidade de Lisboa

que exercem a industria de mercadores de algodão por miudo, reclamando tambem contra a respectiva taxa da tabella de contribuição industrial, que esta affecta á commissão de fazenda.

A camara comprehende as rasões que me assistem para que eu n'este momento não dê a minha opinião sobre a materia d'estas duas representações.

Sou membro da commissão de fazenda, que esta estudando a proposta da contribuição industrial; por consequencia não devo antes de tempo emittir o meu juizo sobre representação alguma, que me seja entregue, e que eu, por obrigação, tenho de mandar para a mesa; mas o que posso asseverar desde já a estes srs. reclamantes, a outros que reclamem, e mesmo áquelles que não reclamarem, é que a commissão de fazenda está disposta a fazer justiça a todas as reclamações que se fizerem (apoiados). Esta disposta a fazer todas as modificações que se devam fazer nas tabellas da contribuição industrial e a corrigir todos os vexames e iniquidades que possam existir nas mesmas tabellas (apoiados). E dever meu fazer esta solemne declaração, não só porque é esta a minha opinião, e é esta a minha firme resolução, mas porque é tambem a opinião de todos os meus collegas na commissão de fazenda. O paiz póde ter a certeza de que a commissão de fazenda ha de ser acompanhada, creio que o posso affirmar, por todo o parlamento (apoiados) no sentimento de que ella está possuida, para que sejam introduzidas todas as modificações, e todos os melhoramentos que for necessario introduzir a bem da justiça e da equidade em todas as propostas de fazenda que o governo submetteu á apreciação do parlamento (apoiados).

O sr. J. P. A. Nogueira: — Mando para a mesa uma representação dos empregados da secretaria do govêrno civil do districto de Lisboa ácerca de algumas disposiçoes da proposta de lei apresentada pelo governo com respeito á reforma da organisação administrativa.

Queixam se os supplicantes da omissão que se dá na mesma proposta com relação ás suas aposentações, e bem assim da disposição que inhibem de serem promovidos aos logares immediatos aquelles a quem faltar o curso de instrucção superior ou secundaria. Parece-me justa a pretensão dos supplicantes, e por isso peço a v. ex.ª que dê o devido destino á representação.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento, e em segundo logar, aproveitando a presença do sr. ministro das obras publicas, a fim de chamar a attenção de s. ex.ª sobre o estado em que se acham os trabalhos technicos ácerca das estradas que devem ligar Trancoso, Pinhel e Barca d'Alva, e de uma outra que deve partir de Trancoso até ao Pocinho.

Estas duas estradas são importantes. Aquelle trato de terra tem sido completamente descurado; não ha n'elle um palmo de estrada feita, e comtudo muitas são as condições de toda a ordem que recommendam ao governo a maior solicitude no desenvolvimento dos melhoramentos publicos, pelo menos, na construcção de novas estradas.

Ainda ultimamente tive occasião de visitar aquelle trato de terreno e conheci o estado lamentoso em que o desleixo publico o tem deixado.

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Aquella parte do paiz é delimitada pela Côa e pelo Douro, cujas margens são muito fragosas e impedem de uma maneira atrocissima todo o desenvolvimento de civilisação material.

Esperando que o sr. ministro das obras publicas dê uma resposta categorica e que me satisfaça, não insisto por ora n'esse ponto, promettendo comtudo voltar a elle, porque vou, sem a menor demora apresentar uma nota de interpellação. Em todo o caso desde já convido todos os srs. deputados dos districtos da Guarda, Bragança e Villa Real, para que, concordes e unanimes façamos todos os esforços possiveis, a fim de que aquella parto do paiz, que tem direitos iguaes aos do resto ('o paiz, e agora muito superiores, em virtude do abandono em que se acha, seja tratada como merece.

Aproveito a occasião para mandar para a mesa dois projectos de lei, um, fazendo algumas modificações na lei das reformas, aposentações e jubilações, e parece-me inutil estar agora a lê-lo, porque tem de ser lido na mesa; o outro tem por fundamento varios, continuados e mui legitimos pedidos da camara municipal de Trancoso, para que lhe seja concedido um convento em ruinas, que é uma ameaça permanente aos habitantes daquelle concelho, por isso que os desmoronamentos são successivos, e já de um delles foram victimas dois habitantes.

Aquellas ruinas pódem ostentar-se muito pittoresca, mas o unico préstimo, que lhes encontro, é serem completamente desmoronadas e por uma vez.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Visconde de Chancelleiros): — Pedi a palavra para declarar ao illustre deputado que presto ás observações que acaba de fazer toda a attenção, e que as julgo recommendadas por graves considerações de interêsse, não só do districto a que o illustre deputado se refere, mas de todo o paiz.

Em 1 de junho de 1869 approvou-se o ante projecto de estrada de Pinhel a Barca de Alva, passando por Figueira de Castello Rodrigo, e mandou-se proceder aos estudos definitivos daquella estrada; mas como ainda não fôssem remettidos no ministerio, recommendou-se ao director das obras publicas daquelle districto, para que quanto antes os concluisse e mandasse ao ministerio. Emquanto ao traçado a seguir entre Trancoso o Pinhel, approvou-se já o anteprojecto da estrada, comprehendida entre o chafariz do Vento e Villa Nova de Foscôa, e mandou-se proceder ao projecto definitivo.

Posso dizer ao illustre deputado que a viação publica, com respeito aos tres districtos de que s. ex.ª fallou, merece toda a attenção do governo, e basta ver o mappa de estradas para conhecer-se a necessidade incessante de se proceder aos melhoramentos da viação publica naquelles pontos, e isto não só em attenção aos interesses daquelles districtos, mas aos interessou geraes do paiz.

O sr. Sampaio: — Mando para a mesa uma representação dos habitantes do logar de Lagar Novo, da freguezia de 8. Thiago, concelho de Tôrres Novas, pedindo a esta camara que não approve o projecto que pretende annexar parte desta freguezia ao concelho da Gollegã.

O sr. Julio do Carvalhal: — Participo a v. ex.ª e á camara que o sr. Falcão da Fonseca não comparece á sessão de hoje por incommodo de saude.

O sr. Julio Rainha: — Na ultima sessão do mez de fevereiro tive a honra de mandar para a mesa um requerimento, no qual pedia pela ministerio da fazenda se enviasse a esta camara o inventario (los bens do extincto convento de Vinho, no concelho de Gouveia.

Não sei se esse requerimento já foi enviado á estação competente e se já veiu o documento que pedi; por isso peço ao sr. secretario quo me informe a este respeito.

O sr. Secretario Adriano Machado: — Posso informar o sr. deputado de que o documento a que se referiu ainda não veiu da respectiva secretaria.

O Orador: — N'esse caso renovo o meu requerimento.

Agoro como deputado pelo districto da Guarda não posso deixar de responder ao appello que me fez o meu sympathico amigo e collega o sr. Osorio de Vasconcellos, deputado por Trancoso, com respeito ao estado em que se acha a viação publica no districto da Guarda, Villa Real e Traz os Montes.

Devo declarar que me satisfizeram bastante as observações que a este respeito fez o sr. ministro das obras publicas, esperando eu que s. ex.ª empenhará naquellas obras todo o zêlo e solicitude de que é capaz.

O sr. Antunes Guerreiro: — Mando para a mesa um requerimento e uma nota de interpellação que vou ler (leu).

O requerimento é para ser inscripto na interpellação do sr. Julio do Carvalhal, dirigida ao sr. ministro das obras publicas, sobre viação em Traz os Montes, e a interpellação é sobre o atrazo em que se acha a construcção da estrada de Braga a Chaves por Barroso, e sôbre a falta da conclusão, dos estudos da mesma.

E a terceira, senão a quarta interpellação que dirijo sobre o mesmo assumpto ao sr. ministro das obras publicas actual e seus antecessores, e creio tanto n'esta, como nas que já apresentei, que não tiveram resultado algum; entretanto, sr. presidente, é preciso que o sr. ministro das obras publicas se convença de que é dever prestar mais protecção e favor aos melhoramentos materiaes daquella provincia, que tem sido tão descurada dos poderes publicos, que nada se têem interessado por ella.

Sr. presidente, desde quo n'este paiz começou o enthusiasmo pela viação publica, isto é, desde que ha mãis de vinte annos ouço fallar na necessidade de construir-se a estrada de Braga a Chaves, considerada essa estrada como uma das mãis importantes do paiz, e a unica talvez que póde verdadeiramente utilisar do desenvolvimento e prosperidade da industria agricola da provincia do Traz os Montes, e auxiliar muito, tambem, a provincia do Minho, e principalmente a cidade de Braga; e, sem embargo, essa estrada ainda se não construia, nem mesmo acabou de ser estudada! Pozeram se apenas em construcção as duas primeiras leguas ao pé de Braga, talvez para satisfazer interêsses de campanario, e por ahi se ficou, porque para o resto não ha pressa alguma.

Mas, sr. presidente, a estrada de Chaves a Braga é a unica que póde e deve ligar entre si as duas provincias de Traz os Montes e Minho, porque é tambem a unica que deve e póde concorrer para a prosperidade de ambas, e com especialidade da primeira d'ellas, animando e desenvolvendo a industria agricola de uma e outra; e não convem por maneira alguma que a sua construcção se faça esperar mais; por emquanto espero quo o sr. ministro das obras publicas, dando-se por habilitado, venha á camara responder a esta interpellação, e prometter-nos que ha de tomar este negocio na devida consideração.

Sr. presidente, a provincia de Traz os Montes paga actualmente os tributos de sangue e de dinheiro, e é preciso quo se lhe dê tambem a partilha que lhes pertence nos melhoramentos materiaes. E preciso que não se peçam sómente tributos ao povo; é necessario que se distribua o seu dinheiro mais regularmente. Pedir ao povo tributos e não lhe dar melhoramentos materiaes, não lhe dar vias de communicação, não lhe dar a protecção de que elle carece, não póde ser.

A provincia de Traz os Montes considera, e com muita rasão, que é uma filha engeitada; quando se querem soldados para preencher os corpos das provincias da Extremadura e do Alemtejo, vão-se buscar ali; quando se querem tributos, obriga-se o povo a paga-los, mas recusam-se-lhe os meios de protecção que os governos podem e devem dar aos povos. Assim, sr. presidente, não ha povo que se não definhe.

A provincia de Traz os Montes vê-se na necessidade de consumir os seus productos agricolas, porque não os póde exportar. Um alqueire de castanhas ou de batatas custa ali (30 réis, 80 réis, ou quando muito 100 réis, emquanto que

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nem mercados do Porto e do Minho, custa 400 réis, 500 réis e 600 réis! E qual será a rasão d'isto? E porque a provincia de Traz os Montes não póde mandar os seus generos agricolas aos grandes mercados, porque não têem viação publica, porque não têem uma estrada que communique com a provincia do Minho e com esses grandes mercados.

Sr. presidente, só ouço fallar em augmentar a receita publica por meio de contribuições lançadas ao povo, sem se ver primeiro se elle póde ou não póde paga-las; mas isso não póde ser, e não deve ser assim. Ao passo que se lançam tributos ao povo, dê-se-lhe partilha nos melhoramentos materiaes, e attenda-se aos seus interesses e necessidades, sem o que não será facil cobra-los. Pedir-lhes contribuições e não os proteger nos meios com que elle as podesse pagar, é pedir-lhe um sacrificio impossivel; e os povos de Traz os Montes não podem pagar maiores tributos, não se lhes protegendo a sua industria agricola, unica fonte da sua receita, porque não têem de que fazer dinheiro senão dos seus productos agricolas. Eu poderia citar outros generos alem dos que já citei, taes como os cereaes, legumes, hortaliças, fructas, vinhos, fenos, etc.. que ali se produzem em grande quantidade, o que poderiam ser vendidos no mercado do Minho com grande vantagem para o productor e para o consumidor, se o transporte se tornasse facil por boas vias de communicação entre as duas provincias; mas, como esse elemento de vida não existe, vêem-se os povos de Traz os Montes obrigados a consumir em si tudo quanto as suas terras produzem.

E quer v. ex.ª saber como se fazem as estradas em Traz os Montes? A de Bragança a Mirandella começou ha mãis de vinte annos, e ainda não esta concluida, sendo apenas nove leguas. A da Regua a Villa Real levou doze annos a fazer, e a de Villa Real a Chaves que são nove leguas tambem, começou ha oito ou nove annos, e só ha poucos mezes se concluiu (apoiados).

Repito, sr. presidente, ha vinte annos que se falla na construcção da estrada de Braga a Chaves, como de absoluta necessidade para o desenvolvimento da industria agricola de Traz os Montes, e até ao presente nem ao menos se acabou de estudar, porque o engenheiro que ha sete ou oito annos foi incumbido dos estudos d'ella houve por bem parar no meio do caminho, não sei se por ter medo á serra das Alturas, se por se lhe apresentarem difficuldades e tropeços que não podéra vencer, não podendo eu nem muitos dos deputados da provincia do Minho, que n'isso se têem esforçado, alcançar a conclusão desses estudos. Quer isto dizer, que os representantes do paiz nada podem quando os govêrnos não querem.

Limito aqui as minhas observações, esperando que o sr. ministro das obras publicas se declare brevemente habilitado para responder á minha interpellação.

O sr. Freire Falcão: — Mando para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas, ácerca do estado da viação publica no districto de Bragança (leu).

O sr. Bandeira Coelho: — Na sessão passada, creio que em dezembro, sendo ministro das obras publicas o sr. marquez d'Avila e de Bolama, apresentou aqui s. ex.ª uma proposta relativa ás aguas mineraes, proposta de muita importancia, porque todos sabem quanto esta descurado este ramo de hygiene publica. Creio que s. ex.ª determinou que essa proposta fosse mandada á commissão de obras publicas, ouvidas as de legislação e saude publica.

Consta-me que a commissão de legislação, á qual foi remettida a proposta, ainda não deu o seu parecer, em consequencia d'ella ter sido distribuida ao sr. Pequito, que, de certo por justificados motivos, não tem podido comparecer á camara.

Não sei se quando a camara se adiou, s. ex.ª entregou na secretaria d'esta casa essa proposta ou se a conserva em seu poder; mas creio que a commissão de legislação tinha meio de fazer com que a proposta tivesse andamento, visto que foi publicada no Diario do governo.

A commissão de legislação, guardadas as devidas attenções com o sr. Pequito, no caso d'elle não comparecer ainda, podia nomear outro relator, a fim de que a proposta tiveste ali o devido andamento, e poder-se correr depois as outras commissões.

Eu espero que n'este empenho serei secundado pelo sr. marquez d'Avila e de Bolama, de quem é a iniciativa da proposta de lei, e que de certo deseja que seja approvada com a maior brevidade possivel, porque é muito importante.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros Marquez d'Avila e de Bolama): — Junto os meus votos aos do illustre deputado, e peço á camara que empregue os meios precisos para que esse projecto de lei possa ser discuti lo quanto antes. A materia é importante.

E agradeço ao nobre deputado o ter, por assim dizer, desempenhado um dever que me pertencia a mim, de preferencia a s. ex.ª

O sr. Pereira do Lago: — Mando para a mesa a seguinte declaração (leu).

O sr. José Tiberio: — Sr. presidente, associo-me de bom grado ao appello que o meu illustre collega e patricio, o sr. Osorio de Vasconcellos, fez aos deputados do districto da Guarda, para que de commum accordo velemos pelos interesses do districto, e chamemos a attenção do nobre ministro das obras publicas em relação ao completo estado de abandono em que ali se acha a viação publica.

Sr. presidente, em todas as sessões me tenho occupado dêste importante assumpto, e tanto que em todas ellas tenho mandado para a mesa notas de interpellações, que até hoje não pude verificar. Particularmente tenho constantemente solicitado dos senhores ministros os melhoramentos que ali se precisam, e ainda durante o adiamento, o logo que o actual ministro tomou posse, eu me diriji a s. ex.ª e lhe fiz igual solicitação. S. ex." pediu-me uma exposição por escripto do estado em que se achava a viação n'aquelle districto, e de quaes eram as estradas que convem mandar construir de prompto, a fim de estudar o assumpto e poder dar as necessarias providencias. Apresentei lhe effectivamente essa exposição, apontando todas as estradas a que o meu collega se referiu, e, alem d'essas, ainda a estrada marginal, que é uma das mãis importantes daquelle districto, porque põe em communicação os dois districtos de Bragança e Guarda com a cidade do Pôrto, unico centro commercial daquellas provincias.

O nobre ministro estudou com o zêlo e cuidado que todos lhe reconhecemos essa minha exposição, e o resultado d'esse estudo foi mandar logo proceder ao estudo do projecto definitivo da estrada do Chafariz do Vento ao Pocinho, e comprometteu se a tratar com igual zêlo e cuidado todos os outros objectos para que na minha exposição tive a honra de chamar á sua attenção; folgando de ter esta occasião para poder dar testemunho publico do louvavel procedimento do nobre ministro; de accordo pois com o meu collega, tenciono renovar a nota de interpellação que outras vezes tenho annunciado, e quando ella se verificar, então terei occasião de fazer largas considerações, tendentes a fazer conhecer o mau estado da viação, o abandono e desprezo completo a que têem sido votados aquelles povos, que ha tantos annos contribuem com avultadas sommas para a viação publica e para melhoramentos materiaes, sem terem recebido o mais insignificante, e finalmente para fazer ver por conseguinte, que um direito incontestavel lhe assiste a serem considerados e attendidos, e que tempo é já de se lhe fazer justiça.

Sr. presidente, declaro que me satisfizeram as palavras do nobre ministro, porque nos deu esperanças de que justiça nos será feita, e eu tenho em s. ex.ª plena confiança, esperando ver realisadas as suas promessas.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Agradecemos ao nobre ministro das obras publicas as explicações que se dignou dar-nos e que nos satisfizeram até certo ponto.

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Ao menos o sr. ministro dá boas esperanças, e, emquanto não vierem os factos, que remedio ha senão ir-nos contentando com ellas, á falta de melhor cousa!

Na certeza porém de que esta nossa crença firme e sincera na boa vontade do sr. ministro das obras publicas acabará logo que não se traduza em factos reaes e tangiveis. E então acabará tambem a esperança que se dignou conceder-nos, e procederemos por outro modo.

E o que tinha a dizer.

O sr. Candido de Moraes: — Mando para a mesa a seguinte nota de interpellação (/eu).

E aproveito esta occasião para dizer ao sr. ministro da fazenda que, se s. ex.ª precisar de alguns esclarecimentos relativos ao pagamento d'este direito, eu tenho-os em meu poder, e não duvido de os facilitar a s. ex." para a realisação do meu pedido.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

O sr. Julio Rainha: — Tenho a honra de ser secretario da commissão de legislação, e nesta qualidade confirmo o que disse ha pouco o meu amigo o sr. Bandeira Coelho, com respeito á proposta do governo sobre aguas mineraes.

Esta proposta foi enviada á commissão de legislação e distribuida ao sr. Pequito. Este cavalheiro, seguramente por motivos justos, não tem comparecido na camara, e não tem podido por conseguinte occupar-se daquelle assumpto.

Se se prolongar a ausencia de s. ex.ª é provavel que a commissão de legislação, como lembrou o sr. Bandeira Coelho, encarregue um outro dos seus membros d'aquelle trabalho, guardando comtudo toda a deferencia para com o sr. Pequito. Attendendo á importancia do projecto, a commissão de legislação não ha de descurar similhante assumpto.

ORDEM DO DIA

Entrou em discussão o seguinte

Projecto de lei n.° 28

Senhores. — A vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de renovação de iniciativa n.° 1-L, do sr. deputado Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães, renovando a que apresentou em 2 de maio do corrente anno.

Segundo esta proposta, as licenças de que trata a tabella n.° 3, classe 4.º da lei de 30 de agosto de 1869 e regulamento de 2 de dezembro do mesmo anno, que disserem respeito ao exercicio do commercio e industria manufactureira, seriam passadas na repartição de fazenda em que tiverem de ser registadas e averbadas; a licença, registo e verba serão gratuitos.

A vossa commissão, considerando que esta proposta é destinada a diminuir o trabalho e as despezas dos commerciantes e industriaes, sem que d'ahi resulte damno para a fazenda, é de parecer que a referida proposta deve ser convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° As licenças de que trata a tabella n.° 3, classe 4.* da lei de 30 de agosto e regulamento de 2 de dezembro de 1869, que disserem respeito a exercicio de commercio ou industria manufactureira, serão passadas na repartição de fazenda em que tiverem de ser registadas e averbadas.

Art. 2.° Tanto a licença como o registo e a verba são gratuitos.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 1 »3 de dezembro de 1870. = Antonio Maria Barreiros Arrolas = Henrique de Barros Gomes — José Dionysio de Mello e Faro = Mariano Cyrillo de Carvalho João José de Mendonça Cortez = Alberto Osorio de Vasconcellos = José Joaquim Rodrigues de Freitas Junior, relator.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Como relator d'este projecto mando para a mesa a seguinte proposta (leu).

Este projecto versa sobre impostos de licenças. Eu outro dia tive a honra de apresentar um projecto de lei, a fim de que estes impostos fossem recebidos conjunctamente com a contribuição industrial; por isso parece-me conveniente que o projecto em discussão volte á commissão para dar novo parecer ácerca d'elle, e ser submettido depois á apreciação da camara. Leu-se na mesa a seguinte

proposta

Proponho o adiamento do projecto de lei n.º 28 até que a illustre commissão de fazenda apresente parecer ácerca de um projecto sobre o imposto do licenças, que ha poucos dias tive a honra de mandar para a mesa.

Sala das sessões, em 18 de março de 1871,== José Joaquim Rodrigues de Freitas Junior.

Foi admittida, e logo approvada.

O sr. Pereira de Miranda: — Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre a proposta do governo, relativa ao imposto de transito.

Como é um objecto de grande importancia, e que urge resolver, pedia a v. ex.ª que mandasse imprimir o parecer com brevidade, para ser distribuido por casa dos srs. deputados, a fim de que possa entrar em discussão na proxima sessão.

Leu-se na mesa, e foi a imprimir.

O sr. Presidente: — Passa-se á discussão do parecer n.° 15.

E o seguinte

N.º 15

Senhores. — A vossa commissão especial, tendo em vista o disposto na lei de 19 de novembro do anno corrente, publicada no n.° 263 do Diario do governo do mesmo mez, é de parecer que a proposta do sr. deputado Barros e Canha esta prejudicada.

Sala das sessões, 7 de dezembro de 1870. = Anselmo José Braamcamp (vencido) = Adriano de Abreu Cardoso Machado (vencido) = Antonio Pequito Seixas de Andrade = Antonio Rodrigues Sampaio — Augusto Cesar Falcão da Fonseca — Luiz de Almeida Coelho de Campos = Mariano Cyrillo de Carvalho = João José de Mendonça Cortez = José Joaquim Rodrigues de Freitas Junior (vencido) Augusto Cesar Barjona de Freitas (vencido) = José Dionysio de Mello e Faro = Lopo Vaz de Sampaio e Mello, relator.

A proposta a que o parecer se refere é a seguinte: Senhores. — A carta constitucional diz:

TITULO IV

CAPITULO II

Da camara dos deputados

Art. 35.° É privativa da camara dos deputados a iniciativa:

§ 1.° Sobre impostos.

§ 2.° Sobre recrutamentos.

Considerando que este artigo contém toda a essencia do poder e auctoridade da camara electiva;

Considerando que, no direito de votar os impostos, se funda a garantia principal da soberania popular, que esta camara representa;

Considerando que a dictadura de 19 de maio d'este anno arbitrariamente mandou arrecadar impostos, sem que o parlamento os tivesse votado;

E, tendo a camara no maior apreço toda a resistencia legal, que os corpos administrativos e os cidadãos offereceram para manterem as prerogativas que a lei fundamental confere aos representantes legitimos do povo; proponho-vos para ser adoptada a seguinte moção:

A camara declara:

Que as juntas geraes e conselhos de districto, que se recusaram a repartir a contribuição, que não tinha sido votada pelo parlamento, e que se mandou cobrar pelo decreto de 17 de junho de 1870, cumpriram com o seu dever.

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A camara dos deputados, n'esta conformidade, delibera:

1.º Que esta declaração se lance na acta das suas sessões;

2.º Que se envie, pela mesa, copia d'esta resolução a todas as juntas geraes e conselhos de districto do reino e ilhas adjacentes.

Camara, em 9 de novembro de 1870. = O deputado por Silves, J. G. de Barros e Cunha.

O sr. Barros e Cunha: — Sr. presidente, agradeço cordialmente a v. ex.ª ter tido a bondade de dar para ordem do dia a discussão do parecer que se refere á moção, que julguei meu dever, como representante do povo, offerecer á consideraçao d'esta camara.

V. ex.ª, que tanto sentimento tem da sua propria dignidade, fez-me o favor de comprehender que a minha abstenção de solicitar explicitamente da camara o seu voto sobre a minha proposta não era senão o desejo que eu tinha de não perturbar o andamento regular dos negocios da fazenda, mas nunca abdicação de ter uma resolução, que eu entendo de uma grande moralidade, para que se acabe por uma vez o arbitrio de cobrar despoticamente impostos contra o que dispõe a lei fundamental; de os distribuir depois em larguezas aos complices das revoltas felizes, deixar de dar conta ao povo do modo por que se gasta o tributo com que elle julga contribue para as despezas necessarias á sustentação das liberdades e á boa administração da sua fazenda.

A commissão especial a que esta proposta foi submettida declara que ella se acha prejudicada pelas disposiçoes da lei de 19 de novembro de 1870. Lendo, porém, essas disposições da lei a que a commissão se refere, vejo que ellas consignam no § unico do artigo 2.° um principio, que aliás é de toda a justiça, mas que de maneira alguma se póde referir ao acto das juntas geraes terem recusado repartir uma contribuição illegal, porque esse paragrapho só se refere aos contribuintes onde o imposto se repartir.

A camara disse daquella lei que aquelles dos contribuintes para quem já tivesse corrido o praso dos dez dias, e esses não podiam ser outros senão aquelles a quem o imposto se tinha lançado e principiado a cobrar, ficavam isentos de pagar a malta de 3 por cento imposta pela lei de 3 de novembro de 1860 aos que não concorrem voluntariamente no primeiro praso da cobrança voluntaria, estabelecido na mesma lei.

Não pretendendo discutir objecto da minha moção, porque contra ella não ouvi ainda levantar rasão alguma solida, rasão alguma que mereça ser seriamente discutida; antes ao contrario o que tenho ouvido apenas me convence de que a commissão declinou dar o seu voto a este respeito, desejo sómente que, per parte dos membros da mesma commissão, que se acham presentes e que assignaram este parecer sem declarações, se me declare o seguinte: se por acaso a enunciação da idéa de que a minha moção se acha prejudicada pela lei de 19 de novembro de 1870 e porque elles entendem que as disposiçoes dessa lei affirmaram o principio contido na moção?

N'estas circumstancias pareceme que correspondo ao favor com que v. ex.ª me distinguiu pelo facto de dar para ser discutido este parecer no dia de hoje, abstendo-me de fazer quaesquer outras declarações antes de ter ouvido os membros da illustre commissão que o assignaram sem declaração.

Por emquanto a minha opinião é que as disposiçoes da lei de 19 de novembro de 1870 nada têem com a moção de louvor ás, juntas geraes. que se recusaram a obedecer a uma extorsão despotica o arbitraria. N'estas idéas não posso deixar de declarar por prevenção, que o parecer deve ser rejeitado pelos homens que aqui affirmam e defendem os principios liberaes, e que a moção deve ser submettia ao voto da camara, a fim d» que o paiz conheça verdadeiramente quem são aquelles que se conservam fieis aos principios que proclamam quando são opposição, e os renegam nos votos que dão quando são maioria.

V. ex.ª, portanto, depois de algum dos illustres membros da commissão ter condescendido com o meu pedido, e declarado como entendeu este parecer a parte da maioria que o assignou, terá a bondade de me conceder a palavra, que pedirei, se assim o julgar conveniente.

O sr. Presidente: — Como não esta mãis nenhum sr. deputado inscripto, vae votar-se.

O sr. Barros e Cunha (para um requerimento): — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que a votação seja nominal.

Consultada a camara decidiu-se affirmativamente.

O sr. Presidente: — Este projecto tem um só artigo. Por consequencia a votação é na generalidade e especialidade Vae fazer-se a chamada. Os senhores que approvam o parecer da commissão dizem approvo e os senhores que o rejeitam, dizem rejeito.

Feita a chamada

Disseram approvo os srs. Agostinho de Ornellas, Osorio de Vasconcellos, Pereira de Miranda, Soares de Moraes, Veiga Barreira, Antunes Guerreiro, Arrobas, Pedroso dos Santos, Sousa de Menezes, Rodrigues Sampaio, Eça e Costa, Augusto de Faria, Saraiva d». Carvalho, Barão do Salgueiro, Bernardino Pinheiro, Eduardo Tavares, Francisco de Albuquerque, Francisco Mendes, Francisco Beirão, Pereira Lago, Coelho do Amaral, Caldas Aulete, Pinto Bessa, Van-Zeller, Barros Gomes, Freitas e Oliveira, Mendonça Cortez, Nogueira Soares, Pinto de Magalhães, Gusmão, J. A. Maia, Bandeira de Mello, Dias Ferreira, Mello e Faro, Elias Garcia, Latino Coelho, Rainha, Luiz de Campos, L. Pimentel, Marques Pires, Lisboa, Mariano de Carvalho, Pedro Franco, Pedro Roberto, Sebastião Calheiros, Visconde de Villa Nova da Rainha, Sá Nogueira, Pinheiro Borges.

E disseram rejeito os srs. Braamcamp, Teixeira de Vasconcellos, Conde de Villa Real, P. M. da Cunha, Jayme Moniz, Santos e Silva, Barros e Cunha, J. J. Alcantara, Alves Matheus, Lobo d'Avila, Rodrigues de Freitas, José Luciano, Teixeira de Queiroz, Julio do Carvalhal, Paes Villas Boas, D. Miguel Coutinho, Adriano Machado.

Foi portanto approvado o projecto por 48 votos contra 17.

O sr. Presidente: — Passa-se á discussão do projecto de lei n.° 23. Vae ler se.

Leu se na mesa e é o seguinte:

Projecto de lei n.° 23

Senhores. — O sr. deputado Mariano Cyrillo de Carvalho renovou a iniciativa do projecto de lei n.° 47 de 1864, approvado em sessão de 18 de abril d'esse anno, que tem por fim o arredondamento do concelho da Gollegã, no districto de Santarem.

A commissão de estatistica, considerando que no parecer n.° 65 de 20 de março de 1861 se acham desenvolvidas as rasões que justificam o arredondamento daquelle concelho pelos limites que a natureza lhe traçou;

E tendo ouvido o govêrno e a illustre commissão de administração publica;

Adopta como seu aquelle parecer, que é o seguinte:

Senhores. — A commissão de estatistica, tendo examinado com a mãis escrupulosa attenção a representação da camara municipal e habitantes do concelho da Gollegã, na qual pedem " arredondamento do seu respectivo concelho, fixando-se-lhe os limites indicados ali pela propria natureza do terreno;

Considerando que o actual concelho da Gollegã tem apenas meio kilometro de extensão ao norte, e um kilometro ao sul e poente da villa;

Considerando que por este lado a demarcação actual neta foi indicada, nem é justificada pela natureza do terreno, sendo por isso visivelmente reconhecida a anomalia da sua limitação, tanto ao norte como ao poente da villa;

Considerando que foi a propria natureza que se encarregou de fixar os limites em que deve circumscrever-se este concelho, estendendo-se a sua area até á margem esquerda

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do rio Almonda, a 2 kilometros ao norte e oeste da Gollegã;

Considerando que feita a demarcação do referido concelho pelos limites que a natureza lhe marcou, se favorece a definitiva organisação da respectiva freguezia de Nossa Senhora da Conceição, unica do concelho, e das freguezias do Pinheiro Grande e da Barquinha, no sentido da mãis palpitante commodidade e conveniencia dos povos das tres referidas freguezias;

Considerando que sem este augmento se não póde equilibrar ali a receita com a despeza municipal, attenta a pouca população e a pequena area do actual concelho, e em presença das suas muitas e urgentes necessidades, que demandam grandes recursos para melhorar as condições sanitarias do municipio e para preservar os seus campos das frequentes inundações do Tejo;

Considerando finalmente que são muito extensos e podulosos os dois concelhos de Torres Novas e Santarem, e que a pequena parte que se lhes tira lhes não faz perder a grande importancia que têem, enquanto póde e deve reputar-se uma restituição fundada na rasão e na justiça, por se não podér deixar de reconhecer como indisputável até certo ponto o direito que tem o municipio da Gollegã de reclamar para si os seus proprios campos:

Por todas estas rasões e fundamentos entende a commissão que a representação da camara e habitantes do concelho da Gollegã deve ser attendida; sendo por isso que tem a honra de offerecer á approvação da camara o seguinte projecto de lei.

Artigo 1.º A freguezia de Nossa Senhora da Conceição, que constitue o concelho da Gollegã, comprehende pelo nascente todo o terreno desde a entrada do ribeiro de Santa Catharina no rio da Ponte de Pedra até á sua foz no Tejo; pelo sul todo o terreno banhado pelo Tejo desde a quinta do Cardiga inclusivè até á foz do rio Almonda desde a sua foz até á valia que divide o campo da Gollegã do campo das Cordas, em que vae desaguar o ribeiro dos Riachos; pelo norte todo o terreno desde a dita valia pelo ribeiro ao sul dos Riachos, incluindo o casal do Vidigal, casal da Amendoeira, direito ao ribeiro de Santa Catharina até ao rio da Ponte da Pedra.

Art. 2.º O terreno ao nascente do rio da Ponte da Pedra até á Aguatesa e os fogos do logar do Pedrogoso, pertencentes ao concelho da Gollegã, ficam pertencendo ao concelho de Villa Nova da Barquinha.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 12 de dezembro de 1870. Francisco Joaquim da Costa e Silva = Barão do Salgueiro = Antonio José Teixeira — Joaquim Nogueira Soares Vieira, relator.

Pertence ao n.º 23

Senhores. — A commissão de administração publica foi presente o projecto de lei n.° 47 de 1864, cuja iniciativa foi renovada pelo sr. deputado Mariano Cyrillo de Carvalho, e que tem por fim o arredondamento do concelho da Gollegã no districto de Santarem.

A commissão, ouvido o governo, e considerando que a demarcação actual não é justificada por os principios que a sciencia indica;

Considerando que a natureza indica que os limites d'este concelho devem estender se até á margem esquerda do rio Almonda, a 2 kilometros ao norte, perto da Gollegã;

Considerando que esta demarcação, não prejudicando os extensos e populosos concelhos de Torres Novas e Santarem, pois que a pequena parte que se lhes tira não diminue a sua grande importancia, favorece a melhor organisação das freguezias de Pinheiro Grande e Barquinha, e a de Nossa Senhora da Conceição, unica do concelho da Gollegã;

E a vossa commissão de parecer que deve ser approvado o projecto de lei n.º 47 de 1864.

Sala da commissão, em 23 de dezembro de 1870. — Antonio Rodrigues Sampaio = Joaquim de Vasconcellos Gusmão — João José de Mendonça Cortez = Augusto Cesar Cau da Costa — Francisco Antonio da Silva Mendes = Barão do Salgueiro = Francisco Coelho do Amaral = Francisco de Almeida Cardoso de Albuquerque, relator. N.° 15-B

Senhores. — Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 47, de 1864, approvado em sessão de 18 de abril d'esse anno, mas que não chegou a ser discutido na camara dos dignos pares.

Sala das sessões, 10 de dezembro de 1870. = Mariano Cyrillo de Carvalho.

N. 47

Senhores. — O sr. deputado Manuel Pereira Dias renovou a iniciativa do projecto de lei n.° 65 da camara dissolvida em 1861, e que tinha por fim o arredondamento do concelho da Gollegã, districto de Santarem. A commissão de estatistica, achando no parecer da commissão daquella epocha o desenvolvimento necessario para provar a rasão que assiste aos povos do concelho da Gollegã, pelos fundamentos allegados na representação dirigida á camara dos deputados de 1860, e sobre o qual assentou o parecer n.º 65, apresentado em sessão de 20 de março de 1861, adopta como seu aquelle parecer, que é contido nos termos seguintes:

N.° 05 de 1860 a 1861. — Passa a ser em 1864 n.° 38-B Senhores. — A commissão de estatistica, tendo examinado com a mais escrupulosa attenção a representação da camara municipal e habitantes do concelho da Gollegã, na qual pedem o arredondamento do seu respectivo concelho, fixando-se-lhe os limites indicados ali pela propria natureza do terreno;

Considerando que o actual concelho da Gollegã tem apenas meio kilometro de extensão ao norte, e um kilometro ao sul e poente da villa;

Considerando que por este lado a demarcação actual nem foi indicada, nem é justificada pela natureza do terreno, sendo por isso visivelmente reconhecida a anomalia da sua limitação tanto ao norte como ao poente da villa;

Considerando que foi a propria natureza quem se encarregou de fixar os limites em que deve circumscrever-se este concelho, estendendo-se a sua area até á margem esquerda do rio Almonda, a 2 kilometros ao norte e oeste da Gollegã;

Considerando que feita a demarcação do referido concelho pelos limites que a natureza lhe marcou, se favorece a definitiva organisação da respectiva freguezia de Nossa Senhora da Conceição, unica do concelho, e das freguezias do Pinheiro Grande e da Barquinha, no sentido da mãis palpitante commodidade e conveniencia dos povos das tres referidas freguezias;

Considerando que sem este augmento se não póde equilibrar ali a receita com a despeza municipal, attenta a pouca população e a pequena area do actual concelho, o em presença das suas muitas e urgentes necessidades, que demandam grandes recursos para melhorar as condições sanitarias do municipio e para preservar os seus campos das frequentes inundações do Tejo;

Considerando finalmente que são muito extensos e populosos os dois concelhos de Torres Novas e Santarem, e que a pequena parte que se lhes tira lhes não faz perder a grande importancia que têem, emquanto póde e deve reputar-se uma restituição fundada na rasão e na justiça, por se não poder deixar de reconhecer como indisputável até certo ponto o direito que tem o municipio da Gollegã de reclamar para si os seus proprios campos:

Por todas estas rasões o fundamentos entende a commissão que a representação da camara e habitantes do concelho da Gollegã deve ser attendida; sendo por isso que tem a honra de offerecer á approvação da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo l.º A freguezia de Nossa Senhora da Conceição» que constitue o concelho da Gollegã, comprehende pelo nas

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cente todo o terreno desde a entrada do ribeiro de Santa Catharína no rio da Ponte da Pedra até á sua foz no Tejo; pelo sul todo o terreno banhado pelo Tejo desde a quinta da Cardina inclusivo até á foz do rio Almendra; pelo poente todo o terreno banhado pelo rio Almendra desde a sua foz até á valia que divide o campo da Golegã do campo das Cordas, em que ave desaguar o ribeiro dos Riachos; pelo norte todo o terreno desde a dita valia pelo ribeiro ao sul dos Riachos incluindo o casal do Vidigal, casal da Amendoeira, direito ao ribeiro de Santa Catarina até ao rio da Ponte da Pedra.

Art. 2.º O terreno ao nascente do rio da Ponte da Pedra até á Aguares e os fogos do lugar do Pedregoso, pertencentes ao concelho da Golegã, ficam pertencendo ao concelho de Vila Nova da Barquinha.

Art. ECU Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da comissão, em 20 de marco de 1861. = Antonio Dias de Azevedo = Antonio Feio de Magalhães Coutinho = Francisco Coelho do Amaral Francisco Lopes Gavião Tavares de Carvalho —Joaquim Cabral de Noronha e Menezes = José Maria Rojão.

Sala da comissão, em 2 de Abril de 1864. = Francisco Coelho do Amaral—Adriano Pequito Seixas de Andrade = Joaquim Antonio de Calça e Pina = Bernardo de Albuquerque e Amaral = Antonio Maria Barreiros Arrobas = José Augusto de Almeida Ferreira Galvão = Antonio Egípcio Quaresma Lopes de Vasconcelos.

O Sr.ª Rodrigues Sampaio: — Não venho atacar o parecer da comissão, porque estou assignado n'elle, e não o posso sustentar, porque, depois que este parecer se deu, appareceram reclamações dos povos, que se oppõe á decisão que a camara pretende tomar.

A questão não é importante pelo lado pessoal, mas é importante pelo lado material. Disputam-se menos as almas e os corpos do que o terreno; e nesta divergencia de opiniões a camara é pouco competente para decidir. Este ponto de incompetencia é que eu vou alegar. E não é porque não reconheça que a camara pôde fazer tudo, mas é porque não deve fazer, e para mostrar que não deve fazer tudo quanto pôde, fundo-me n'uma lei de 1869, que primeiramente foi decreto, e foi depois confirmado por esta camara. Esse decreto, hoje lei, que diz o seguinte:

«Artigo 1.° Fica o governo auctorisado para decretar a transferencia de qualquer freguezia de um concelho para outro, ou transferencia de qualquer povoação de uma freguezia para outra, apenas que dois terços dos individuos recenseados para eleitores n'essa freguezia ou povoação assim o requeiram, e guardadas as formulas de direito.

«Art. 2.º Esta alteração na divisão territorial não poderá ser decretada sem que preceda consulta affirmativa do conselho d'estado, depois de ouvidas as camaras municipaes e juntas de parochia interessadas, e o governador civil respectivo em conselho de districto.

«Art. 3.° Fica o governo igualmente auctorisado para demarcar os limites entre concelhos e entre freguezias, ouvidas as camaras ou as juntas de parochia que forem competentes, e o governador civil do respectivo districto em conselho, guardadas tambem as formulas de direito.

«Paço de Belem, 15 de Abril de 1869. = REI. = Marquez de Sá da Bandeira = Antonio Bispo de Vizeu = Antonio Pequito Seixas de Andrade = Conde de Samodães = José Maria Latino Coelho = Sebastião Lopes de Calheiros e Menezes. »

A auctoridade para mim é maior de toda a excepção; a camara de certo não a recusará! Os fundamentos da doutrina do decreto são os seguintes:

«Não está o governo auctorisado pela legislação existente para deferir as reclamações dos povos ácerca dos defeitos que se encontram na divisão territorial, porque se ha entendido que toda a modificação na divisão territorial, por pequena que seja, deve depender do corpo legislativo.

«Parece ao governo exagerado este principio.

«A interferencia das côrtes só deve exigir-se quando se trate de crear ou de supprimir circumscripções territoriaes, acto que tem por necessaria consequencia dar ou tirar entidade juridica, e alterar a ordem das jurisdicções.

«As hypotheses porém a que a lei sujeita o presente decreto não produzem estes resultados, e são de tão pequena importancia, e dependem tanto de informações e conhecimentos locaes, que podem sem inconveniente ser resolvidas pelo poder executivo.

«Não é para temer que possa fazer-se mau uso da faculdade que propomos se conceda ao governo, porque a cercámos de formalidades taes, que temos quasi impossivel o abuso.»

Ninguem dirá que a justiça não fica melhor garantida por aquelle processo, do que pela decisão que nós vamos tomar sem ouvir as allegações dos diversos concelhos ou freguezias interessadas.

A pretensão da camara municipal e da freguezia da Golegã é antiga. Tem tido acolhimento favoravel nesta casa, não o tem tido na outra camara.

Quando me deram o parecer não tive duvida alguma em o assignar, por julgar que não offerecia objecção; e sómente perguntei se o governo concordava, ao que se me respondeu affirmativamente.

O Sr.ª Francisco de Albuquerque: — Apoiado, apoiado.

O Orador: — Depois d'isto a camara de Torres Novas representou, dizendo que os seus rendimentos ficavam altamente cerceados, que não podia fazer face ás suas despezas, e que na epocha da descentralisação e das grandes circumscripções não era justo que se diminuísse o rendimento do concelho de Torres Novas, para se engrandecer um concelho que, não tendo meios de existencia, devia acabar.

Estas são as rasões que elles allegam, e eu não as quero robustecer, nem as quero informar. Não desejo ser juiz n'este pleito, porque se o fosse havia de trepidar entre as ponderações que se fazem de uma e outra parte, receiando o inconveniente de diminuir a importancia dos concelhos, sendo minha opinião antiga que, quando se queira dar importancia ás municipalidades, é preciso engrandece-las, e não as tornar pequenas.

Na questão sujeita confio mais nos conhecimentos das auctoridades locaes, do que na decisão do parlamento, ainda que julgo que alguns dos srs. deputados presentes conhecem o terreno que se quer expropriar; e eu sou representante dos habitantes desse terreno; mas apesar d'isso não estou sufficí en temente habilitado para julgar, e não creio que os mais srs. deputados o estejam.

O relatorio do governador civil de Santarem, em 1866, fallando do concelho da Golegã, diz o seguinte:

«O concelho da Golegã, comquanto em população seja dos ultimos do districto, porque só conta 876 fogos, comtudo em riqueza póde classificar-se um concelho de 3.* ordem, porquanto paga de contribuição predial a quantia de 6:349$665 réis.

«Este concelho, comquanto pequeno em extensão, tambem tem suas necessidades, e a camara aponta como principaes as seguintes:

«1.° O arredondamento do concelho, marcando-se nos limites, ao norte pela linha ferrea, ao sul pelo Tejo, ao nascente pela ribeira de Santa Catarina, ao poente pelo rio Almendra;

«2.° Emquanto ao primeiro ponto nada disse, porque, estando este trabalho commettido a uma comissão creada por decreto de 21 de Abril de 1862, para propôr o plano de arredondamento de freguezias, a esta comissão compete emittir o seu parecer ácerca d'este objecto, porquanto este concelho da Golegã se compõe de uma só freguezia.»

Como o meu fim não é senão apresentar os factos como elles são, sem querer prejudicar nenhum dos concelhos, li

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mito-me a lembrar qual é a opinião do governador civil a este respeito.

N'esta incerteza do que é justiça; entendendo que a questão que se debate é de pura conveniencia, conveniente para a Gollegã, porque vae esse terreno augmentar o seu rendimento, prejudicial para Torres Novas, porque se lhe tira esse terreno d'onde lhe provém um rendimento para as suas despezas; e quando os povos, não sei se por movimento proprio, se por solicitações estranhas, requerem uns n'um sentido e outros n'outro, estabelecendo-se a incerteza para o nosso julgamento, proponho o seguinte (leu).

Pela legislação actual estas questões são da competencia do governo. Nós decidindo esta, não fariamos uma grande usurpação; mas é mau que vamos assumir attribuições que pertencem ao poder executivo, quando esse poder apresenta no relatorio da legislação que lh'as deu, rasões que eu não vi combatidas nem na occasião em que esse decreto se promulgou, nem quando foi confirmado pelas côrtes.

Estabelecer-se que o governo era o mais competente para decidir taes questões, e avocar agora esta, é commetter uma usurpação que póde prejudicar os interesses da justiça.

Não entro nem quero entrar nas rasões que têem as duas camaras contendoras, porque effectivamente isto é questão de camaras; não entro nos motivos que podem obrigar esses povos a quererem pertencer mais a uma freguezia do que a outra. Eu, representante d'aquelles que não querem ser annexados á freguezia da Gollegã, devo acreditar na sinceridade do seu desejo e não posso contraria lo; e como ha uma estação que póde com conhecimento de causa decidir a questão, ouvindo todos os interessados, que nós não podemos chamar á barra, parece-me que a votação d'esta minha proposta nos livraria de commetter uma grande injustiça.

Não digo mais nada, nem podia dizer, porque não estou inteirado de todas as particularidades da questão, e porque não podia tambem convencer a camara a respeito da utilidade de uma ou outra decisão.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que todos os documentos que instruem esta pretensão sejam remettidos ao governo para resolver o que julgar conveniente, na conformidade do decreto de 15 de abril de 1869.

Sala das Bessões, em 18 de março de 1871. = Antonio Rodrigues Sampaio.

O sr. Presidente: — Esta proposta em parte é um adiamento, é uma substituição. A camara decidirá como quer considera-la.

O sr. Francisco Costa: — Mando para a mesa um parecer da commissão de verificação de poderes, que julga que o sr. Carlos Bento perdeu o seu logar de deputado, por ter aceitado a nomeação de conselheiro d'estado effectivo.

O sr. Barros Gomes: — V. ex.ª e a camara comprehendem que, na minha posição especial de representante do concelho de Santarem, eu não podia sem faltar a um dever deixar n'este momento de me levantar, usando da palavra na defeza de interesses que reputo justos d'aquelle concelho, aos eleitores do qual devo em parte a cadeira que tenho a honra de occupar n'esta casa.

Começarei por declarar que me conformo inteiramente com a proposta de adiamento apresentada pelo sr. Sampaio.

A legislação de 1869 a este respeito é clara, e á vista d'ella parecia-me menos conforme com os bons principios que a camara fosse hoje deliberar sobre assumptos que são mais naturalmente da competencia do poder executivo. Equivaleria isso até certo ponto a uma confusão de poderes, que convem n'este, como em todos os casos, evitar, pelos inconvenientes obvios a que póde dar origem.

Mas, declarando desde já que partilho a opinião de s. ex.ª, tenho ainda, alem dos que foram indicados pelo sr. Sampaio, outro motivo, e forte, para julgar indispensavel que a discussão seja adiada. Está ausente d'esta casa o sr. ministro do reino, cuja opinião é absolutamente preciso conhecer-se em questões d'esta ordem, que dizem respeito á divisão administrativa; e a camara de certo não dispensará o ser elucidada com esclarecimentos que só podem ser dados pelo governo.

Tem sido esta a pratica constante n'esta casa; e na actual sessão legislativa, ainda ha poucos dias, nós vimos a camara votar o adiamento da discussão de projectos de lei importantes, porque se achavam ausentes os srs. ministros da guerra e do reino, que eram particularmente aquelles que podiam dar a respeito da doutrina d'esses projectos os esclarecimentos indispensaveis para a camara poder discutir com conhecimento de causa.

Embora porém eu deseje e vote o adiamento, não posso comtudo deixar de fallar sobre a materia do projecto, que supponho estar em discussão conjunctamente com o adiamento...

O sr. Presidente - Como a proposta apresentada pelo sr. Sampaio não corresponde claramente a um pedido de adiamento, embora este seja consequencia da sua adopção, eu não consultei a camara sobre se apoiava ou não o adiamento; mas, se a camara entender dever considerar essa proposta como de adiamento, eu vou consulta la a esse respeito.

Consultada a camara, resolveu afirmativamente.

O sr. Presidente: — Está em discussão o adiamento.

O sr. Barros Gomes: — Creio interpretar bem a votação da camara, suppondo que a materia do projecto está conjunctamente em discussão com o adiamento...

O sr. Presidente: —A materia do projecto não está conjunctamente em discussão com o adiamento. Era preciso que a camara assim o resolvesse para eu poder declarar que estava uma e outra cousa em discussão. E verdade que muitas vezes se tem seguido essa pratica; mas eu reputo-a pouco racional (apoiados), e entendo que, quando se trata do adiamento de qualquer projecto, só tem logar darem-se as rasões por que esse projecto não deve ser discutido. Em todo o caso, sem resolução da camara, a mesa nada póde deliberar a este respeito.

O Orador: —- Em vista das explicações que V. ex.ª tão benevolamente acaba de me dar, restringir-me-hei á questão do adiamento.

Já me pronunciei a respeito da conveniencia d'elle, porque nos é preciso a presença do sr. ministro do reino. S. ex.ª está n'este momento assistindo na outra casa do parlamento a uma importante discussão politica, que lhe não permitte comparecer aqui; e o assumpto d'este projecto! de lei é tão particular que só o nobre ministro nos póde dar a seu respeito os esclarecimentos necessarios.

Não se julgue effectivamente que esta questão é muito simples; a prova que o não é, está em ter vindo a esta casa mais de uma vez, e em todas ter tido sorte adversa, apesar das apparentes condições de exito em que tem sido apresentada.

Este projecto veiu pela primeira vez á camara em 1861. Teve então um parecer favoravel das commissões de estatistica e de administração, mas como a camara foi dissolvida, não se póde proceder a discussão sobre elle. Mais tarde, em 1864, foi renovada a iniciativa do mesmo projecto pelo sr. Pereira Dias.

As commissões, tanto a de estatistica como a de administração publica d'essa legislatura, fizeram seu o parecer dado em 1861, e este foi effectivamente, não o occulto, approvado sem discussão em 18 de abril de 1864, mas n'essa mesma sessão, no principio da qual se approvava sem discussão um projecto que alterava de um modo tão essencial as condições de vida de tres concelhos, um outro projecto que tendia simplesmente a determinar a transferencia da séde de um concelho de uma povoação para outra, se me não engano de Proença a Nova para Sobreira Formosa, soffria uma forte impugnação, apresentando-se

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primeiramente a seu respeito uma proposta de adiamento que foi defendida pelo sr. Vaz Preto.

Tomou tambem parte importante na discussão o sr. conselheiro Mártens Ferrão, o qual com a auctoridade que todos lhe reconhecem n'estes assumptos, formulou mais uma vez a sua opinião ácerca da inconveniencia de se tratarem questões d'esta ordem na ausencia do ministro respectivo, discutiado-se sem conhecimento completo das circumstancias locaes, que só se póde obter por um exame detido e imparctai.

Nem basta por certo a tal respeito ouvir os deputados que têem interesse na questão, e assim como eu a respeito dos interesses de Santarem, que desejaria ver engrandecido e não cerceado, desde já me dou por suspeito, assim acho que deve ser considerado o sr. Mariano de Carvalho com relação aos da Gollegã, quando se trata de augmentar a importancia d'este concelho á custa dos que d'elle são limitrophes.

Não basta, repito-o, ouvir os deputados respectivos, embora conhecedores das circumstancias locaes. As suas opiniões estão até certo ponto influenciadas pelas sympathias particulares e pela obrigação de defender os interesses d'esses concelhos que representam. É indispensavel que o unico juiz superior a esses preconceitos, o unico que possuo elementos para uma informação imparcial, isto é, o governo, se pronuncie, e é da bôca d'elle que a camara póde esperar receber os esclarecimentos sem os quaeB vàe pronunciar-se ás pegas sobre quastões que podem affectar as localidades respectivas nos seus interesses de um modo muito grave, (apoiados).

Proseguindo na exposição que estava fazenda á camara, acrescentarei que se a circunstancia, que referi, d'este projecte passar em 1864 sem discussão n'esta casa, pareceu de algum medo favorecer as tendencias e aspirações d'aquelles cavalheiros que se mostraram mais empenhados na sua adopção, não encontrou elle uma igual aceitação na camara dos digno? pares. Não se conseguiu ahi faze-lo saír da commissão de administração publica, a cujo exame havia eido confiado; e não se imagine que foi a influencia d'este ou d'aquelle digno par que determinou a resolução d'aquella comissão. Uma tal explicação seria indigna de cavalheiros collocados em tão eminente posição, e ninguem por certo se atreveria a formula-la. A verdadeira explicação é diversa e muito digna. Tem sido effectivamente dou trina constante n'aquella casa do parlamento que a conversão aja lei de projectos d'esta ordem é sempre inconveniente, a menos que por parte do governo se não demonstre a necessidade absoluta da sua adopção.

Estar a alterar as circumscripções administrativas dos diversos concelhos, em casos tão particulares, legislando a retalho em questões desta importancia é um principio altamente inconveniente e condemnado por todas as boas praticas parlamentares (apoiados).

E nem só pela camara dos pares tem sido defendida e acatada esta doutrina, ha tambem uma resolução d'esta casa, creio que adoptada em 1863 (e não sei mesmo, sr. presidente, se foi V. ex.ª quem propõe á camara a consagração d'esse principo), para que nenhuma d'estas alterações na çircumscripçao dos concelhos se discutisse sem se terem presentes as bases geraes para ma modificação da divisão administrativa do reino, completamente em harmonia com os JB|eres8es das localidades, para o conhecimento dos quaes eram necessario,? elementos que não podiam então e não podem, hoje ter oenhecidos dos srs. deputados (apoiados).

Bem vêem pois V. ex.ª e a camara que as tentativas para effectuar esta appexação de uma parte dos concelhos de Sentarem a Torres Novas ao da Gollegã é antiga, não data de hoje, mas aqüellas rasõss que expendi não pôde levar-se a effeito nem em 1861 nem 1864.

Mais tarde, promulgando-se o decreto de 1869, a que alludiu... Rodriques Sampaio, denseguiram os cavalheiros da Golegã, que mais particularmente têem a peito a apprevação d'este projecto, que dois terços dos eleitores da freguezia de Azinhaga reclamassem do governo a desannexação d'aquella freguezia do concelho de Santarem, e a sua reunião ao da Gollegã. O despacho do governo não podia em harmonia com a legislação vigente deixar de ser favoravel a uma tal pretensão. Não teve elle porém tempo de apparecer, porque antes do governo haver a esse respeito tomado uma resolução definitiva, vieram representações de uma parte d'esses mesmos signatarios, declarando que as suas assignaturas haviam sido alcançadas sem que tivessem tido completo conhecimento da natureza do pedido, a que primeiro haviam dado força com os seus nomes. Não julgavam esses eleitores que se tratasse de annexação da sua freguezia a outro concelho, nem da alteração tão importante no seu modo de viver municipal, e reclamavam portanto contra a assignatura que primeiro tinham concedido.

Em vista d'isso o governo, por portaria de dezembro de 1869 indeferiu a primeira representação dos habitantes da Azinhaga, para serem desannexados do concelho de Santarem. Mais outro naufragio, e estes naufrágios estou certo que se hão de repetir, se acaso uma tal insistencia continuar, porque o concelho de Santarem não póde nem deve ser restringido: exige isto a sua mesma grandeza, exige-o a importancia d'esse concelho que data de eras tão remotas, e exigem o finalmente as suas tradições illustres que tantas vezes se enlaçam na historia geral do paiz, e que devem protege-lo contra alterações como a que se propõe n'este projecto de lei.

Frustrada mais esta tentativa, nem por isso se abandonou o primitivo plano, mas hoje procede-se de outro modo e por outra fórma, mudou-se de tactica. Não queremos as almas, como disse o sr. Sampaio, prescindimos da freguezia uma vez que os habitantes dizem que não querem vir para nós, mas não prescindimos dos terrenos.

Respeitadores em extremo das modernas theorias de direito internacional, não queremos que se declare que as povoações são rebanhos que se levam para onde se pretende, entendemos que é necessario em materia de annexações consultar as opiniões dos habitantes quanto ao seu modo de ver a esse respeito; mas o desinteresse que se apresenta por esta fórma em relação ás almas, não apparece do mesmo modo emquanto ás terras; e as terras n'este caso representam uma parte importante na questão, porque os terrenos e os campos que se reclamam, são dos mais ricos e ferteis do paiz. Os campos da Azinhaga são conhecidos por todos como terrenos de 1.º ordem e dos mais abençoados que tem Portugal.

Portanto, como ía dizendo, prescinde-se das almas, mas não dos terrenos e a rasão é forte: é porque se precisa de rendimentos, sem os quaes se torna impossivel a conservação de uma autonomia municipal.

Baldados os esforços dos cavalheiros da Gollegã, pelas suas diligencias immediatas junto ao governo, empenhou-se n'esta tentativa o representante d'aquelle circulo o sr. Mariano de Carvalho e apresentou novamente á consideração da camara o projecto que não tinha podido ser convertido em lei nem em 1861 nem em 1864.

Tendo assim indicado algumas das circumstancias, que me parecem demonstar não ser facil discutir esta questão na ausencia do governo, não posso ainda deixar de me referir aos considerandos allegados pela commissão de estatistica de 1861, n'este abençoado parecer, que tem merecido a honra de uma successiva apresentação em tres diversas legislaturas.

O sr. Mariano de Oarvalno: — Peço ao sr. presidente que me queira declarar se está em discussão só o adiamento, ou tambem o projecto, preciso d'essa declaração para saber logo come me hei de regular no que tenho a dizer.

O sr. Presidente: — Eu lembro que o que está em discussão é a adiamento.

Orador: —Eu declaro a V. ex.ª que as rasões que

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estava apresentando eram para demonstrar a necessidade d'esse adiamento, e para fazer ver á camara que o projecto se não póde discutir na ausencia de informações que só devem ser dadas pelo governo; e parece-me que tenho conseguido provar a necessidade do mesmo adiamento. V. ex.ª porém, me chamará á ordem, se entender que eu saio fóra d'ella.

Diz-se que o concelho de Santarem é muito rico e muito populoso, e que essa circumstancia permitte cercear-lhe os seus mais ricos territorios, sem fazer por isso perigar a sua importancia, mas como muito bem allegou o sr. conselheiro Rodrigues Sampaio, quando hoje estamos tratando, por todas as formas, de descentralisar os serviços e as despezas, quando ha pouco tempo o sr. ministro do reino nos apresentou aqui uma proposta de lei que obriga as municipalidades a sacrificios avultadíssimos, lançando-lhes os encargos quasi totaes da sustentação da instrucção primaria, não me parece que seja occasião opportuna para restringirmos os concelhos grandes, tirando-lhes os meios de satisfazer a essas novas necessidades que lhes tão creadas pela tendencia irresistivel da epocha, e pela nova legislação que se vae harmonisando com essa tendencia.

Nem a meu ver se póde sustentar que esta parte que se pretende tirar aos concelhos de Torres Novas e Santarem, por insignificante, não influirá na importancia de dois municipios tão extensos em área, e ricos em população. A minha resposta a esse argumento é de ordem tal, que deve só por si esclarecer a esse respeito o espirito dos meus collegas.

O rendimento collectavel, total, do concelho de Sentarem, não excede a 283:000$000 réis; a simples freguezia da Azinhaga de que se pretende annexar uma parte ao concelho da Gollegã, entra n'aquella verba com a somma de 69:0QQ$00Q réis; quer dizer, quasi a quarta parte d'esse rendimento collectavel total; nem deve admirar o facto que acabo de referir, quando se souber que o terreno d'essa freguezia é dos mais ricos do Riba-Tejo; e por pessoas da localidade, para mim da maior confiança, me é asseverado que não desceria a menos de 52:000$000 réis a differença no rendimento collectavel de Santarem, caso fosse adoptado este projecto de lei.

Podia apresentar ainda muitas outras rasões para justificar a proposta de adiamento do sr. Sampaio; quanto mais que a legislação vigente nos prohibe de alguma fórma o intervir n'estes assumptos. Mas como V. ex.ª me advertiu de que o que estava em discussão era só o adiamento, não quero abusar da benevolencia com que a camara me escutou, tendo dito o bastante para a esclarecer ácerca da conveniencia d'esse adiamento.

Ouvirei as rasões apresentadas em contrario pelo sr. Mariano de Carvalho, e se julgar necessario responder, de novo pedirei a palavra a V. ex.ª

O sr. Presidente: —Vae ler-se o parecer mandado para a mesa pelo sr. Costa e Silva.

O sr. Gosta e Silva: — Eu pedia a V. ex.ª se consultava a camara para que, dispensando-se o regimento, entre desde já em discussão este parecer sem se imprimir. Parece-me que é um negocio muito facil e muito simples.

Consultada a camara decidiu afirmativamente.

Leu-se na mesa o seguinte

Parecer

Senhores. — Á vossa commissão de verificação de poderes foi presente o requerimento do sr. Carlos Bento da Silva, pedindo se resolva se a nomeação que recebeu, por decreto de 28 de fevereiro ultimo, de conselheiro d'estado effectivo, apesar de não ser cargo retribuido, lhe fez perder o logar de deputado da nação.

A oommissão, vendo o artigo 28.° da carta constitucional da monarchia, o qual estabelece que a nomeação de qualquer deputado para o cargo de conselheiro d'estado lhe faz perder o seu logar na camara;

Visto o 2.° do artigo 2.° do acto addicional que por firma e amplia a disposição do alludido artigo 28.° da carta constitucional;

Visto o § 1.° do artigo 17.° do decreto de 30 de dezembro do 1852:

Parece á vossa commissão que o sr. Carlos Bento da Silva perdeu o logar de deputado em virtude da referida nomeação de conselheiro d'estado, e que se deve mandar proceder a nova eleição pela circulo n.º 35 que o elegeu.

Sala da commissão, em 18 de março de 1871. — João Antonio dos Santos e Silva = Mariano Cyrillo de Carvalho = Francisco Joaquim da Costa e Silva.

O sr. presidente: — Está em discussão.

(Pausa).

Como não ha quem peça a palavra vae pôr-sc á votação. Os srs. que o approvam tenham a bondade de se levantar. Foi approvado.

Considerou-se como adiamento a proposta do sr. Sampaio, e foi apoiado, entrando em discussão.

O sr. Ministro da Marinha (Mello Gouveia): — Pedi a palavra n'esta discussão em que vim encontrar a camara, porque ouvi allegar a ausencia do sr. ministro do reino Como rasão de adiamento da questão, e me parece que não era um adiamento que se devia discutir, mas sim a moção do sr. Rodrigues Sampaio, que é mais uma excepção de incompetencia oppeata ao juizo da camara, do que um adiamento.

E eu queria dizer que se para decidir sobre a materia do projecto que se discute é necessaria a presença do nobre ministro do reino, porque a camara não póde dispensar esclarecimentos que só o governo lhe póde dar n'estes negocios de circumscripção territorial, quer judicial quer administrativa; não será o mesmo se a discussão versar sobre a excepção de incompetencia, opposta pelo illustre deputado o sr. Sampaio, como me parece regular, na qual póde bem ser dispensada a presença do ministro.

Diz-se que a legislação em vigor concede ao governo a facullade de attender todas as representações que tendam a alterar a circumscripção territorial. Pois n'este caso creio que digo bem que emquanto não se derrogar ou modificar essa legislação, a camara procederá mais regularmente, abstendo-so de tomar resoluções d'esta ordem, por excepção aos principios de administração que sanccionou n'aquellas leis, e dando á questão a solução indicada na moção do sr. Sampaio, que é enviar o negocio ao governo para o tomar na consideração que merecer, e usar a respeito d'elle da faculdade que lhe dão as leis,

É este o meu parecer como deputado e como membro do governo.

Repito; para se discutir o assumpto debaixo do ponto de vista de uma excepção de incompetencia, não creio indispensavel a presença do governo.

E, a querer-se entrar na discussão da materia, então tambem eu peço o adiamento até que esteja presente o sr. ministro do reino.

O sr. Mariano de Carvalho: — De dois modos se propõe á camara o adiamento d'este projecto de lei que o illustre deputado, o sr. Barros Gomes, teve a idéa felicíssima de chamar naufrago em quantas tentativas emprehande para soltar o rumo.

Sinto que o illustre deputado quizesse lançar sobre mim a accusaçâo de parcial. Rejeito-a. Não creio tambem que no animo de s. ex.ª possam pesar outras rasões que o levem a pugnar por uma causa qualquer senão as da estricta justiça e da imparcialidade.

Essa accusação de parcial não deve n'esta casa soltar-se, porque deprime o credito da canora a avilta O systema constitucional.

Deus nos livre de que possamos, ser accuaados de parciaes, sempre que por uma lei em discuto os interesses dos nossos circulos sejam prejudicados. se a imputação fosse justa, deveriamos ser expulsos d´aqui, porque e nosso dever primordial é ter só em consideração o bem geral.

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Homens parciaes não podem votar lei justa e conveniente. Pois qual é o circulo que não é lesado pela votação de impostos? São o todos. E, sendo assim, não seria possivel votar-se nenhum imposto. Não havemos de defender nenhuma causa sem que desde logo se lance sobre nós o infamante estigma de parciaes?

O illustre deputado não pensou o que dizia; não viu que se desconceituava a si, que me desconceituava a mim, que desconceituava todos, e tirava a esta camara toda a auctoridade e todo o prestigio.

Rejeito, pois, a accusação do illustre deputado, e devemos rejeita-la todos por nosso credito e pelo credito do systema representativo.

Mas se não sou parcial por vontade, poderei sê lo por defeito de intelligencia, porque me segue o entranhado affecto que me prende áquelle honrado e laborioso povo da Gollegã. Creio que não é assim; mas se existe em mim a parcialidade filha do coração, devem ser parciaes as commissões que em 1861 deram o seu parecer favoravel a este projecto de lei. Seriam compostas de deputados da Gollegã? Seriam parciaes e compostas de deputados pela Gollegã as commissões de 1864, que deram parecer favoravel a este projecto de lei; e a camara de 1864 que votou este parecer? Seria parcial o governo de então, em que entrava o nobre duque de Loulé, que, ouvido sobre este assumpto, ou achou justo e conveniente? Seria parcial o nobre bispo de Vizeu que, quando ministro, deu opinião favoravel ao parecer? Seria parcial o actual sr. ministro do reino que, posso afiança-lo, está de accordo com as commissões a este respeito? Serão parciaes as commissões de estatistica e de administração publica, cujo parecer aqui está lavrado?

Permitta-se-me pois que eu repilla de sobre mim, de sobre o illustre deputado, e de sobre a camara toda, a accusação de parcialidade. É preciso que tenhamos cautela com as nossas palavras, que todas têem echo lá fóra; desde que uma voz se levanta e a todos nos acoima de parciaes, o systema constitucional soffre e enfraquece.

Pela minha parte, ou agora sobre a questão do adiamento ou mais tarde sobre a materia, quando entrar em discussão, hei de fallar, tendo em attenção, e bastante, os interesses da localidade que represento, mas muito mais os interesses da justiça e da verdade. Se estes fossem contrarios á causa da Gollegã, contra esta havia de fallar e votar. Felizmente não é assim; pugnando pelos meus constituintes, defendo a justiça opprimida e attendo a grande conveniencia publica.

A excepção de incompetencia posta pelo illustre deputado, o sr. Sampaio, não póde ser admittida. Tem contra si a rasão, os principios e os factos.

O governo, por um acto de dictadura, declarou que em certas hypotheses é competente para decretar a delimitação de concelhos e parochias, e a annexação de freguezias. As camaras sanccionaram este principio, porém não estabeleceram que em quaesquer outras hypotheses não podiam ellas resolver. O parlamento nem deu ao governo auctorisação illimitada emquanto ao tempo, nem emquanto ás condições. Não abdicou todo o direito de alterar as circumscripções territoriaes. A doutrina dos srs. Sampaio e Barros Gomes é inadmissivel, e sinto que fosse sustentada no parlamento, que deve ser o mais zeloso defensor dos principios líberaes, e que nunca devia renunciar dos seus direitos para os ceder ao governo. É certo que quando, pelo menos, os dois terços dos habitantes de qualquer freguezia pedem para ser annexados a um concelho, o governo está auctorisado para decretar essa annexação pelo decreto de 15 de abril de 1869; mas, quando o governo não póde decreta-la, póde ainda o poder legislativo, que é soberano e que nunca deve abdicar os seus direitos (apoiados). Se requerem dois terços dos eleitores, o governo póde alterar a circumscripção; em qualquer outra hypothese póde faze-lo o poder legislativo. Esta é a boa e verdadeira doutrina.

Emquanto a dizer-se que é necessaria n'esta casa a presença do governo para elle emittir a sua opinião relativamente a este assumpto, tenho a ponderar que n'essa hypothese aceito o adiamento.

Quero igualmente que o sr. marquez d'Avila emitta a sua opinião sobre este assumpto; desejo tambem que o sr. ministro do reino dê o testemunho de que este negocio é de justiça pretendo finalmente que o digno presidente do conselho pronuncie relativamente a este assumpto a sua opinião, como igualmente a têem pronunciado os srs. duque de Loulé, bispo de Vizeu e outros cavalheiros que têem estado á frente dos negocios publicos (apoiados). A justiça e a verdade não temem a luz; falle o sr. ministro do reino. Aceito o seu voto e quero junta-lo ao dos seus predecessores.

Mas este negocio é infeliz, diz o sr. Barros Gomes. Tem rasão. Mas a infelicidade não prova falta de rasão. Devo explicar essa infelicidade.

Em 1861 foi aqui apresentado o projecto de lei que tinha por fim o arredondamento do concelho da Gollegã, porém o projecto caducou, porque n'essa epocha a camara foi dissolvida. Uma dissolução provará contra a Gollegã? Em 1864 foi renovada a iniciativa d'esse projecto pelo sr. deputado Manuel Pereira Dias, e pertencendo á camara de então não só V. ex.ª, sr. presidente, mas muitos dos illustres deputados que estou vendo, cavalheiros aliás tão illustrados como os que n'essa epocha assignavam o parecer da commissão, o projecto foi approvado unanimemente e sem discussão (apoiados). Porém infelizmente naufragou ainda, porque, como disse o sr. Barros Gomes, e permitta-me V. ex.ª que repita exactamente as mesmas palavras do illustre deputado, porque «não foi possivel arrancar da commissão respectiva da camara dos dignos pares o parecer relativo ao projecto que da camara dos senhores deputados lhe tinha sido enviado!» Apesar de ser parcial e apaixonado, quero ser mais moderado que o sr. Barros Gomes, e não direi á camara os motivos porque não saíu da gaveta da commissão da camara dos dignos pares o projecto que lhe tinha sido remettido. Depois terminou a legislatura, o projecto caducou, e que não houve, até ao anno passado, quem se levantasse para o fazer seu. Em dezembro de 1870 foi renovada a iniciativa por mim.

De outro naufragio fallou o sr. Barros Gomes, naufragio similhante áquelle que se deu na camara dos dignos pares, quando não foi possivel tirar um papel da gaveta onde foi escondido, dois terços dos eleitores da freguezia da Azinhaga fizeram uma representação, pedindo a sua annexação ao concelho da Gollegã. Insinuam que foram movidos por suggestões dos cavalheiros d'esta villa; mas não admira, sr. presidente, porque é moda insinuar que o povo, porque é povo, não sabe o que diz nem o que lhe convem. Não o sabemos nós tambem que somos emanação do povo. A suprema sabedoria vê se no governo, e por isso se pretende entregar-lhe a solução d'este negocio e de outros muitos. Pois os eleitores da Azinhaga, empregados em trabalhos agricolas, e tendo negocios a tratar na camara municipal, na repartição de fazenda e na administração do concelho, ainda tiveram perspicácia para ver que lhes era preferivel ser annexados a um concelho que fica a 5 kilometros de distancia e não vivem unidos a outro que deita 25 kilometros (apoiados). Para não ver a vantagem d'este procedimento, era preciso que o povo fosse cego e que toda a luz existisse sómente para os que pugnam pelos interesses de Santarem.

Mas sabe V. ex.ª o que succedeu?! A representação que tendia a realisar um acto de justiça; mas que não era agradavel aos influentes de Santarem, foi remettida á camara municipal d'aquella cidade para informar e, apesar das diligencias e instancias do proprio governo para se lhe dar andamento, demorou-se cinco mezes na camara municipal de Santarem!! Succedeu, como a respeito do projecto, que ninguem póde arrancar das gavetas da commissão. Entretanto o

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administrador, o presidente da camara e o escrivão de fazenda de Santarem iam á Azinhaga convencer com blandícias e ameaças os eleitores; era dissolvida a junta de parochia favoravel á annexação á Gollegã, arranjava-se outra e conseguia fazer retirar alguma assignatura da representação. Logo que se conseguiu este resultado, os papeis saíram como que por encanto da camara de Santarem, e o governo vendo que a representação não era assignada pelos dois terços dos eleitores da freguezia da Azinhaga, ainda que o fosse ainda pela sua maioria, indeferiu o requerimento e cumpriu o seu dever. D'elle não me queixo eu, queixo-me da demora acintosa na camara de Santarem; queixo-me da pressão exercida pelas auctoridades d'esta cidade; queixo-me da dissolução da junta de parochia. Estes factos regularissimos dão a explicação do naufragio.

Ainda ha rasões mais poderosas para combater o adiamento indefinido d'esta questão. Mas antes de aponta-las devo dizer que a freguezia da Azinhaga tinha em 1868 apenas 27 eleitores, em 1869 apenas 26. Dois terços d'este numero são 18. Estranham a falta do testemunho d'estes 18 homens. Pois ha outro mais valioso.

Tenho aqui, para mandar para a mesa, uma representação, assignada pelos proprietarios dos terrenos de que se trata. Esta representação allega todas as rasões que militam a favor da annexação pedida.

Devo notar a V. ex.ª que nos terrenos, de cuja annexação se trata, ha proprietarios, residentes na Gollegã, 16; residentes em Lisboa, 15; residente em França, 1; residentes na Azinhaga, 6; residentes em Torres Novas, 8; total 46; dos quaes, dois terços são 31. A representação está assignada por 35 proprietarios dos terrenos que se trata de annexar á Gollegã; este numero ainda excede os dois terços. E não são os votos d'estes signatarios, d'aquelles que se vendem por dinheiro, nem dos que se dão por condescendencia, nem dos que se cedem por temor, são assignaturas dadas com sciencia e consciencia. E a assignatura dos srs. José Maria Eugenio de Almeida, que possue n'estes terrenos a quinta do Paul, uma das melhores propriedades de Portugal. S. ex.ª é hoje o primeiro proprietario em Portugal, e não só o primeiro em haveres, mas tambem um dos primeiros em illustração e amor do progresso.

Na Gollegã e no Algarve cria, á custa de enormes capitães, elementos para elevar a agricultura, nos terrenos que possue, ao nivel a que ella deve chegar em Portugal.

Tem s. ex.ª os melhores engenheiros portuguezes, largamente retribuidos, para realisar trabalhos de deseccamento de pantanos, de irrigações, trabalhos destinados a tornar salubres e productivos milhares de hectares. Na propria Gollegã, se se realisar esta annexaço, sei que s. ex.ª pretende, de accordo com a camara municipal e mais proprietarios, proceder ao deseccamento do paul do Bunhol, um doa peiores do reino, e existente em terreno que póde tornar-se feracissimo.

Vem tambem n'esta representação a assignatura do sr. conde de Nova Goa, um dos maiores proprietarios d'aquelle sitio; vem a do sr. visconde das Fontainhas, representante da companhia das lezirias, e que, com certeza, não assignou cegamente. Vem a assignatura dos srs. conde de Rio Maior e visconde da Vargem da Ordem, tambem dois grandes proprietarios, pares do reino. Vem a assignatura do sr. visconde da Asseca, cavalheiro distinctissimo; vem a do sr. Carlos Augusto Relvas, grande proprietario, que não menos enriquece a nação como amigo do progresso agricola, do que a honra como artista primoroso. Vem a assignatura do sr. marquez de Sampaio; da Sr.ª baroneza de Almeida; vem a do sr. conselheiro Mendes de Carvalho, a do sr. D, Thomás do Napoles, a do sr. Vaz Monteiro e a de muitos outros, dos melhores e maiores proprietarios do reino.

Caso notavel! Em Azinhaga ha seis individuos que têem propriedades no territorio contestado, e passo a ter os seus nomes, para mostrar que estou perfeitamente informado (leu).

Pois d'estes seis individuos, o unico residente na Azinhaga que possue terrenos no territorio litigado e que não quiz assignar, foi o sr. José Faria.

Os outros cinco aqui estão assignados, pedindo a annexação á Gollegã. Estes são dos que residem no concelho de Santarem.

Só um, o sr. José Faria, é que se recusou a assignar, mas os outros cinco, que são todos juntos maiores proprietarios que o sr. José Faria, porque basta dizer que são os herdeiros das grandes propriedades que Rafael José da Cunha possuia, todos digo, que estão debaixo da pressão benefica das auctoridades de Santarem, pedem para ser annexados á Gollegã.

E não representa tambem o sr. duque de Cadaval, porque não reconhece o nosso regimen nem está no paiz, assim como não representa o sr. duque de Palmella, porque s. ex.ª, como par do reino, teve o honrado escrupulo de não aesignar uma representação do poder legislativo, de que faz parte.

Portanto, não são só trinta e cinco, são mais os que concordam n'este projecto.

Citarei ainda algumas assignaturas sobre cuja imparcialidade não póde haver duvida. O sr. conde da Ribeira Grande, um dos maiores proprietarios e a cujo animo generoso a povoação de Alpiarça deve riqueza e salubridade pelo deseccamento do grande paul da Gouxa. O sr. Frederico Tavares Bonacbo, tambem um dos maiores lavradores e mais illustrados d'aquelle sitio. Veja a camara se lhe faltam testemunhas insuspeitas?! Receia a camara que não sejam bem imparciaes estes grandes e illustrados lavradores e possuidores de terrenos, que pedem a annexação á Gollegã? Se estes não lhe bastam, aqui estão os pequenos; são 64 cultivadores não proprietarios dos terrenos em questão, que pedem a annexação; aqui estão assignados na representação que mando para a mesa.

Por consequencia não faltam testemunhas de nenhuma especie, a camara tambem tem o do governo actual que eu affirmo sem medo de ser desmentido, que é a favor do projecto, como era o do governo em que entrava o sr. bispo de Vizeu, o do sr. duque de Loulé em 1864, o da camara de 1864 e o das commissões de 1861, 1864 e 1870.

Quer V. ex.ª saber quem se oppõe a isto? E a camara de Torres Novas, está claro. Esta diz apenas que não lhe convem, escusava de o dizer. E a camara de Santarem, e tambem escusava de dizer que não lhe convem, bem se sabia. Mas ás conveniencias das camaras de Santarem e Torres Novas não podem sobrepor-se á rasão, á justiça e ao interesse publico.

São finalmente 13 cultivadores da freguezia de S. Thiago, os quaes dizem que querem ser sepultados no mesmo cemiterio em que jazem os seus maiores! De maneira que quando se trata de saber se uma porção de territorio deve pertencer ao concelho da Gollegã ou ao de Torres Novas, a rasão que se vem allegar é esta nossos paes foram sepultados n'este cemiterio e nós queremos fazer-lhes companhia! Talvez os paes nem lá estejam.

É a rasão principal que allegam os individuos que não querem pertencer ao concelho da Gollegã, ao mesmo tempo que os que pedem a annexação dizem: os nossos campos são invadidos pelo Tejo e precisámos defende-los; a parte que pertence ao concelho da Gollegã está defendida, mas não o está a parte que pertence a Santarem, nós queremos que os impostos lançados sobre as nossas propriedades e que a camara de Santarem emprega em embellezamentos da sua cidade, sejam applicados para melhorar os campos que os produzem.

O Tejo e o Almonda assoriam e areiam os campos, roemos com goivos, alagamos em paues. Desejâmos que o nosso dinheiro seja empregado em evitar estes damnos immensos e não sirva só para calçar as ruas da cidade e

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construir alguns metros de estrada nos seus arredores. Aqui nos campos da Gollegã a acção municipal faz-se sentir só pelo onus dos impostos e pelos vexames. Queremos que valha pelos beneficies.

Trouxe-se para aqui a questão dos concelhos grandes e dos concelhos pequenos. Tenho ouvido diversíssimas definições de concelhos grandes e de concelhos pequenos. Segundo uma escola que em certa epocha predominou, concelho grande é áquelle que tem grande área e grande povoação. Concelho grande para mim é o concelho sufficientemente rico para satisfazer a todos os encargos que devem pesar sobre elle. Não importa que tenha uma freguezia, ou que tenha uma duzia; basta que tenha os meios necessarios para satisfazer os seus encargos. O concelho da Gollegã é grande, porque tem meios para satisfazer os seus encargos, porque paga a despeza dos seus expostos, porque cresce em progressos e melhoramentos, emquanto o concelho de Torres Novas precisa das esmolas do concelho da Gollegã e dos concelhos do sul do Tejo para sustentar os expostos. É maior o concelho que tem melhores recursos; se o concelho da Gollegã não é maior em área e em popolução, é maior em riqueza, em zêlo, em boa administração e no progresso que só têem desenvolvido n'aquella povoação. A Gollegã dá, Torres Novas pede. Qual é maior?

Argumenta-se com o grandissimo prejuizo que resultaria ao concelho de Santarem da adopção do projecto. Diz-se que Santarem tem apenas 283:000$000 réis, de rendimento Collectavel; que se lhe tirarem esta porção de territorio fica reduzido á insignificância de 230:000$000 réis de rendimento collectavel, e que em taes condições não póde viver. Vamos a ver se haverá no paiz concelhos nas condições em que fica o de Santarem com 230:000$000 réis de rendimento. Quasi todos os concelhos, cabeças de districto, têem menor rendimento collectavel e comtudo não morrem. O conselho de Aveiro tem 105:000$000 réis de rendimento. O concelho de Beja tem 214:000$000 réis. O concelho de Braga, com a importantissima cidade de Braga, apenas 222, o de Bragança 187, o de Castello Branco 94, o de Coimbra 265, o de Faro 167, o da Guarda 120, o de Leiria 180, o de Portalegre 94, o de Vianna 183, o de Villa Real 96, o de Vizeu 231, o de Lamego 208, o de Elvas 193, o de Setubal 201, o de Montemór o Novo 120, o de Tavira 137, o da Figueira 170, o de Guimarães 178. Todos vivem, todos têem menos que Santarem, embora se tire a este uma pequena porção da Azinhaga.

Aqui está como o concelho de Santarem fica arruinado e sem condições nenhumas de vida, desde que se lhe tirar áquelle bocado de terreno! O concelho da Santarem é de uma pobreza tamanha que, na opinião do illustre deputado, tirar-lhe áquelle terreno, é condemna-lò á morto.

Quanto ao da Gollegã, dizem os illustres deputados, esse é tão pobre com os seus 67:000$000 réis de rendimento collectavel, que não póde viver. Assim condemnam á morte nada menos de 177 concelhos, que tantos são no continente os que têem menor rendimento collectavel, emquanto só 85 tem rendimento superior!

São estas as rasões que me levam a combater o adiamento que desejam os srs. Sampaio e Barros Gomes. São patentes tambem as rasões por que este projecto tem naufragado até hoje. Mas estou certo de que a final se ha de fazer justiça aos povos da Gollegã.

Approvo portanto o adiamento, unicamente pela falta da presença do sr. ministro do reino, e não pela excepção de incompetencia; voto o adiamento até que esteja presente o sr. ministro do reino.

Não é provavel que s. ex.ª possa ainda hoje vir a esta caía. Sei que está empenhado em uma discussão importantissima na camara dos dignos pares, mas póde ficar adiado este projecto para se discutir na primeira parte dá ordem do dia de segunda feira (apoiados).

Leram-se as ultimas redacções dos projectos n.º 29 e 31, e foram approvadas.

O sr. Francisco de Albuquerque: — Não posso prescindir da palavra, porque a posição especial de relator do parecer interlocutorio da commissão de administração publica, colloca-me na posição de tomar parte n'este debate. Tencionava porém faze-lo sómente na proxima sessão desde que vi que estava em discussão a adiamento, e n'este proposito me conservaria, se não ouvisse partir do banco dos srs. ministros uma opinião que não posso aceitar, e contra a qual, com o devido respeito ao cavalheiro que a emittiu, protesto em nome dos principios constitucionaes (apoiados).

Entendo que a camara não fez nem podia fazer delegação alguma de poderes ao governo, privando se ou perdendo por esse facto o direito de legislar ácerca do objecto d'essa delegação. Se tal fizesse, ou acontecesse, declaro a V. ex.ª que não acreditaria mais na utilidade do systema parlamentar; ficaria perfeitamente aniquilado, as suas decisões não teriam mais valor algum. Pretender justificar um adiamento com o fundamento de que ao governo é que compete decretar a respeito do assumpto sobre que se quer faze recaír esse adiamento, e que por consequencia a camara se não deve e póde pronunciar, é erroneo. Primeiramente esta hypothese não é aquella de que trata o decreto já citado no artigo 1.°, onde se determinam os casos em que o governo póde publicar o seu decreto, que o artigo diz assim (leu).

Mas ainda mesmo que esta fosse uma das hypotheses em que o governo podesse providenciar, eu entendo que a camara jamais podia ficar tolhida do direito de legislar sobre este assumpto, como sobre todos aquelles que ella julgue opportuno e conveniente, logo que não viole a lei fundamental.

Alem d'isso todos sabem que, mesmo na hypothese especial de pertencer ao governo a decisão de pretensões, como aquella de que nos occupámos, que não pertence, a lei exige tambem um certo numero de formalidades, sem o preenchimento das quaes não póde ter logar o exercicio d'esse direito de decisão.

A principal d'essas formalidades é a de ser requerida a modificação da divisão territorial por dois terços dos habitantes da freguezia ou povoação.

Ora, o meu collega e amigo, o sr. Mariano de Carvalho, já nos relatou que, tendo effectivamente requerido a annexação de dois terços doa habitantes, esse numero fôra comtudo, por circumstancias que s. ex.ª apontou, reduzido a menos de dois terços, embora constituisse maioria.

Portanto, ainda que esta fosse a hypothese em que o governo podia decretar, faltava a base essencial para o exercicio do direito que lhe assistia, e não podia cousa alguma decidir. Só pois no parlamento reside tal direito, portanto destruidos se acham os fundamentos para o adiamento.

Foi para dar estas explicações que eu pedi a palavra. Não podia deixar de protestar contra os principios que me pareceu ver partilhados pelo nobre ministro da marinha, de que a camara faria uma confusão de poderes, legislando sobre este assumpto, o que s. ex.ª disse pertencer ao poder executivo.

Entendo que ainda quando a camara tivesse dado ao governo todas as auctorisações possiveis e imaginaveis, ella nunca podia ser privada do seu direito soberano de legislar sobre a materia da auctorisação. Se a camara demittisse de á esse direito, exautorava se, e teriamos o governo legislador e executor.

Concluo, declarando que aceito o adiamento até que esteja presente o sr. ministro do reino, unicamente para que se ouçam as explicações de s. ex.ª, e nunca pelos fundamentos apresentados, que nem derivam da lei nem dos bons principios. Tenho dito.

O sr. Ministro da Marinha: — Vejo me obrigado a dar uma explicação ácerca das breves palavras que proferi ha pouco sobre este assumpto.

Desprevenido sobre o objecto d'esta discussSo, que não

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interessa a negocios do meu cargo, logo que ella se abriu ouvi fallar por uma parte na necessidade da presença do sr. ministro do reino, e por outra oppor á decisão da camara uma excepção de incompetencia, fundada em legislação, que não vi nem consultei, e que citou o illustre deputado que allegou a excepção; e então disse, que se se discutia a excepção de incompetencia, não me parecia necessaria a presença do sr. ministro do reino, e acrescentei que se o caso estava previsto na lei citada, a camara faria bem em proceder em conformidade d'ella, emquanto a não derogasse ou alterasse; se porém se pretendia discutir a materia do projecto, então eu seria o primeiro a pedir o adiamento da discussão até que o meu collega do reino podesse comparecer aqui, porque não julgava a camara habilitada a resolver negocios d'esta natureza sem informações do governo. Foi isto o que eu disse e confirmo agora.

Fallei em hypothese e não discuti em thèse as competências da camara. Não tenho porém duvida em dizer ao illustre deputado que me precedeu, que não estou inteiramente de accordo com s. ex.ª nas doutrinas que expoz sobre este ponto.

Sem disputar ao parlamento as suas amplas faculdades legislativas, nem desconhecer a auctoridade superior que tem na administração publica, entendo que quando uma lei solemne e constitucionalmente decretada estabelece regras, direitos ou garantias de administração ou de justiça, e designa a auctoridade que deve fazer a applicação das suas disposições, não é regular nem conveniente que o parlamento assuma as funcções judiciaes ou executivas com que essa lei deve ser applicada, decidindo por leis especiaes nos casos singulares que elle previu e regulou.

Não affirmo que seja esta a hypothese de que tratámos, porque já disse que não consultei a lei citada pelo auctor da moção, mas o que sustento é que o parlamento deve ser o primeiro zelador do cumprimento das leis, especialmente d'aquellas que definem direitos e garantias e que não deve viola-las, fazendo n'ellas excepção sem rasão fundada de utilidade publica; porque aliás teriamos com a confusão de todas as noções de administração e de justiça a incerteza de todos os direitos sem exceptuar os de propriedade e de liberdade individual.

O sr. Presidente: —Na segunda feira haverá trabalhos em commissões. A ordem do dia para terça feira é a discussão do parecer da commissão de fazenda sobre a proposta do governo relativa ao imposto do transito, e a continuação da que está dada.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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