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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

clamavam a nomeação de conegos para o ensino nos seminários».

Mas esta desculpa não o releva de responsabilidade.

O governo podia responder aos prelados do reino nos mesmos termos em que fallou aos representantes do paiz a respeito da instrucção secundaria.

Podia dizer-lhes: «Vindo a corte pontificia a um accordo com relação á circumscripção das dioceses, e fixados os quadros capitulares, tereis conegos, se o tempo o permittir; senão, não.» (Riso.)

Bem sei que os prelados se queixam de que são poucos os conegos, e de que algumas vezes ficam, por esse motivo, sem as festas capitulares e sem o pontifical, e eu deploro esse estado. Mas prefiro que uma ou outra sé fique por algum tempo sem essas festas, a que nós fiquemos eternamente sem a circumscripção das dioceses e sem a fixação dos quadros capitulares.

E, se a santa sé se não preoccupa com essa falta de esplendor para o culto religioso, porque ha de o governo ser mais papista do que o proprio papa? (Apoiados.)

E se a côrte de Roma se inquieta com a falta de festas capitulares e com a falta do pontifical, porque não vem a um accordo com o partido liberal sobre a circumscripção ecclesiastica? (Apoiados.)

A um governo liberal não é licito n'uma questão religiosa ir mais longe do que o chefe da igreja catholica.

E fez-se a nomeação sem se obter a mais leve concessão, nem ao menos a confirmação na diocese, em que foi apresentado, de um sacerdote illustrado e caracter honestissimo.

Ha sete annos, e creio que por um ministerio tambem presidido pelo actual sr. presidente do conselho de ministros, foi apresentado n'uma sé do continente do reino, na sé do Algarve, um prelado tão distincto, que nem em letras nem em virtudes haverá, de certo, no reino prelado mais digno. (Apoiados.)

Esse prelado espera ainda a sua confirmação!

O que é agradavel para a côrte pontificia faz-se logo; concessões da parte d'ella é que não se obtêem. (Apoiados.)

Pois o governo portuguez póde porventura pactuar com o systema já usado com os bispos do Porto e de Coimbra, que estiveram mais de dois annos á espera da sua confirmação, sendo dois prelados respeitabilissimos da igreja lusitana? (Apoiados).

O governo portuguez póde manter-se na altura de um governo liberal e defender o jus sirca sacra e as regalias da corôa, em frente da santa sé, sem faltar ao respeito devido ao Summo Pontifice, nem desacatar a religião catholica apostolica romana, que é a religião do reino.

Fique o governo com a responsabilidade de ter compromettido, com a nomeação de conegos, um argumento importante de que podiamos valer-nos para obter a circumscripção ecclesiastica.

Agora ha de ser difficil, difficillimo, levar a corte pontificia a um accordo sobre a questão da circumscripção das dioceses.

Foi pois o governo quem durante o interregno parlamentar se declarou em hostilidade aberta ao corpo legislativo. Prometteu-nos economias; e os grandes productos da sua actividade politica manifestaram-se no beneficio de uma cadeira de saoskrito, creada em dictadura, e na nomeação de varios conegos. De pouco mais se occupou o governo.

E o governo tem em verdade uma certa desculpa de não se preoccupar muito com os vivos, porque durante o interregno parlamentar todo o tempo foi pouco para cuidar dos mortos. Mas antes de ir a esse ponto direi ainda a respeito de conegos que o governo não só é mais papista que o papa, mas mais religioso que o patriarcha de Lisboa. (Riso.) Eu não quero religião de mais. Tudo quanto é de mais é vicio. Nós somos catholicos apostolicos romanos; tudo quanto for alem d'este sentimento religioso é ultramontanismo, é a reacção disfarçada, qualquer que seja o meio de disfarce. (Apoiados.)

E nós não temos só conegos; segundo li no Diario de noticias temos em perspectiva tambem o provimento de logares de beneficiados.

Para esses não se abriu o concurso que a lei effectivamente não exige, e é melhor nomear os beneficiados sem concurso para não se assustar duas vezes o paiz, uma quando se annuncia concurso, e a outra quando se publicam as nomeações.

N'essa parte o governo andou prudentemente.

Mas, ainda sobre a questão dos conegos, os prelados do reino, durante a gerencia do anterior ministerio, não requereram ao governo que fizesse uso da lei de 20 de abril de 1876, com excepção de quatro, o vigario capitular de Elvas e os bispos do Funchal, do Porto e de Lamego. Só depois que entrou este governo, com o cheiro de santidade que chegou lá ao longo, é que os prelados do reino começaram a reclamar conegos para as suas dioceses. Que havia de fazer o governo? Attendeu em primeiro logar o bispo de Lamego, cuja diocese está condemnada a ser supprimida por um decreto que ainda se acha em vigor!

Mas para concluir a minha argumentação a respeito da nomeação dos conegos, resta-me dar a rasão por que o governo está mais empenhado do que o proprio patriarcha no esplendor do culto. O cardeal patriarcha de Lisboa viu tantos conegos nomeados ou annunciados para outras dioceses que em 15 de outubro de 1877 os pediu tambem para o patriarchado; e depois de pedir o numero que julgou necessario, disse: «salvo se o thesouro soffre com esta medida, ou algum outro inconveniente, que não discuto, a ella se oppõe».

Eu leio esta passagem do officio do patriarcha muito de vagar para ficar bem consignada nas notas tachygraphicas. Quando o governo estava pressuroso em nomear conegos com concurso e beneficiados sem concurso, o patriarcha de Lisboa, que deve ser o melhor juiz das necessidades de culto no patriarchado, e que devia ser o mais interessado em manter o esplendor do culto, dizia ao governo o seguinte: «salvo se o thesouro sofre com esta medida, ou algum outro inconveniente, que não discuto, a ella se oppõe». Não ha nada mais racional, nem mais sensato.

Eu contentava-me com que o governo não fizesse mais do que queria o patriarcha. Creio que não sou por isso muito exigente, e ninguem de certo me accusará por este motivo de opposição exaltada.

Eu queria que o governo dissesse ao patriarcha e aos outros prelados: «Não lhes podemos desde já nomear conegos, não só porque tal nomeação se oppõe ao nosso systema de economias, mas sobretudo emquanto não tratarmos da circumscripção das dioceses e da fixação dos quadros capitulares».

O documento a que me referi é honroso para o primeiro prelado da igreja lusitana. (Apoiados.) Eu folgo de fazer esta declaração no parlamento, vendo que os prelados são os primeiros a dar exemplo de liberalismo ao governo temporal do meu paiz.

Mas dizia eu que o governo mal podia ter-se preoccupado com os vivos, quando todas as suas preoccupações eram com os mortos, o que explica tambem o facto de possuirmos uma situação em que o patriarcha de Lisboa é mais liberal do que o governo.

Levantou-se a questão dos enterros, chamados civis; ou antes levantou-a o governo.

Na questão do enterro civil ainda nenhum governo se havia intromettido, e com justa rasão. Se os enterros civis são apoiados pela maioria da população, sustentem-se, porque é essa a vontade do paiz. Se a opinião publica é contra elles, hão de cair fulminados pelo ridiculo e não é preciso nem justo mandar cercar pela força publica a casa do pae que tem o filho dentro do caixão, nem assaltar o caixão no caminho para o cemiterio, arrancando violentamente

Sessão de 18 de janeiro de 1878