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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
em differentes trabalhos por elle publicados. E permitta-me s. ex.ª que por esta occasião lhe agradeça a consideração que commigo tem tido, mais de uma vez, offerecendo-me alguns exemplares d’essas obras, que li e apreciei, e onde me habituei a admirar os elevados dotes do seu talento e as altas qualidades do seu espirito.
Não era possivel, pois, que eu tivesse a intenção de fazer allusões airosas ou desairosas ao illustre deputado o sr. Hintze Ribeiro, que, confesso, n’aquella occasião não passava pela minha mente. O meu fim, n'aquelle momento, era apenas mostrar que o procedimento de uma das commissões de verificação de poderes não estava em harmonia com o das outras, e que não tinha direito a ser muito exigente, emquanto a documentos para instruir os processos eleitoraes, quem, como a junta actual, já tinha dado provas de uma certa lassidão n'este assumpto, visto que havia admittido no seu seio alguns deputados sem previa apresentação dos seus diplomas.
Póde o illustre deputado esforçar-se quanto caiba em suas faculdades para nos convencer de que o diploma dos deputados póde ser dispensado a todos os cavalheiros que se apresentem para tomar assento n'esta casa. Póde s. ex.ª cansar-se para provar que é superflua a tal exigencia. O que lhe digo é que, contra a sua opinião, está a lei clara e terminante. Está o artigo 92.° do decreto eleitoral, que diz:
(Leu.)
A lei eleitoral exige a apresentação de diploma. Este é o titulo pelo qual o deputado póde authenticar a sua identidade.
Como quer, pois, s. ex.ª que a junta preparatoria possa dispensar, a todo e qualquer cidadão que aqui se apresente, o titulo legal que prove a sua identidade?!
Como quer s. ex.ª que adoptemos um precedente, que poderia dar logar a tantas irregularidades?!
É um precedente inadmissivel que nunca vi adoptado n'esta casa senão excepcionalmente. E por excepção tambem me não oppuz á entrada do sr. Hintze Ribeiro, pois s. ex.ª sabe perfeitamente que discutindo a sua eleição nem sequer formulei essa duvida, e que não tive mesmo repugnancia em dizer perante a camara que approvava a sua eleição, como na verdade approvei.
O sr. Hintze Ribeiro, pelo muito respeito que tenho pelo seu caracter e pelos seus merecimentos, não podia suspeitar que eu lhe dirigia uma insinuação ao notar a falta de exigencia de diploma para se tomar assento n'esta junta. Nem aqui havia injuria nenhuma. (Apoiados.)
O illustre deputado parece que comprehendeu mal, ou não quiz comprehender devidamente, o meu pensamento, quando eu tratava apenas de mostrar que não havia direito de ser demasiadamente rigoroso, quando se tinha tanta lenidade, tanta brandura, para não dizer tanta relaxação sobre pontos mais momentosos do que aquelle a que me referia.
Eis aqui o que eu disse. Eu não podia ter e nunca tive outra intenção.
O que hontem disse repito-o hoje.
A illustre commissão de poderes póde ter muita rasão, e eu não tenho o animo de a censurar; só digo que, quando a commissão declarava hontem os motivos pelos quaes se recusava a formular um parecer sobre uma das eleições da ilha da Madeira, eu podia responder aos reparos demasiadamente rigorosos, que ella expoz, pela maneira por que o fiz, sem a menor idéa de faltar á consideração e á deferencia que merecem a todos nós o caracter, as qualidades e os talentos do sr. Hintze Ribeiro.
Eram estas as explicações que tinha de dar.
O sr. Hintze Ribeiro: — Começo por agradecer as lisonjeiras expressões que o sr. José Luciano de Castro acaba de dirigir-me. S. ex.ª fez alem d'isso inteira justiça ao meu procedimento n'esta casa; nem eu menos esperava da sua tão imparcial, quanto esclarecida consciencia.
Permitta-me, todavia, o illustre deputado que eu divirja de s. ex.ª n'um ponto de doutrina em assumpto meramente juridico.
Permitta me s. ex.ª que lhe diga que, se nós fossemos a admittir como condição impreterivel, para alguem se considerar eleito deputado, o facto de ter recebido um diploma da assembléa de apuramento, iriamos violar manifestamente os dictames da lei, emquanto prescreve como unica condição para tal effeito o alcançar-se a maioria absoluta do numero real dos votantes em todo o circulo, no primeiro escrutinio, ou, pelo menos, a maioria relativa no segundo escrutinio.
Incumbe effectivamente ás assembléas de apuramento a rigorosa obrigação do participarem aos deputados eleitos, que não estiverem presentes, que effectivamente o foram; e juntamente enviar-lhes a copia da acta, que é o seu diploma.
Mas, quando o não fizerem, sobre quem recáe a responsabilidade?
Sobre quem não cumpriu os preceitos da lei. (Apoiados.)
Quem assume essa responsabilidade?
São as assembléas do apuramento que, desde o momento em que a lei lhes impõe um dever, devem cumpril-o. (Apoiados.)
Mas, porque uma assembléa de apuramento não cumpre esse dever, será licito concluir que se não devo considerar como deputado eleito aquelle que não recebeu o diploma? Não, porque desde o momento em que satisfez ás condições, que a lei exige para que seja assim considerado, ninguem lhe póde negar essa qualidade, ninguem lhe póde coarctar os direitos que lhe provém d'ella. (Apoiados.)
A disposição do artigo 92.° do decreto eleitoral, que eu conheço muito bem, é uma disposição completamente accessoria em relação ao acto eleitoral, nem ha motivo para se considerar como essencial para o facto de se reconhecer a identidade de um deputado eleito, e tanto que todos os dias estamos vendo e admittindo a pratica de enviarem diplomas para a mesa, não aquelles que os receberam, mas outras pessoas.
E, quando se apresentam os que dizem ter os nomes d’aquelles que devem ser considerados deputados eleitos, como poderiamos nós verificar a sua identidade pelos diplomas, estando taes diplomas já nas commissões, ou não tendo sido por elles apresentados?
Onde está aqui a prova da identidade, quando é contestada? Porque, quando não é contestada, acceita-se sem mais discussão?
Não, a prova da identidade não se faz pelo diploma; nunca se fez.
O que diz o diploma? Diz o nome do individuo que foi considerado deputado eleito; mas o que não diz, e o que não prova, é que aquelle que aqui se apresenta como tendo esse nome, effectivamente o tenha, e pois não affirma nem prova a identidade a que se referiu o sr. Luciano de Castro.
Aqui, onde todos, mais ou menos, nos conhecemos, inutil nos fôra proceder a largas indagações para affirmar a nossa identidade, e parece-me que s. ex.ª não teria duvida em reconhecer que era effectivamente a mim que se referia a acta da assembléa de apuramento no circulo da Ribeira Grande, declarando que fôra eu ali o mais votado.
Sendo eu, pois, o deputado eleito por aquelle circulo, nenhuma duvida deveria ter, á face da lei, em vir tornar parte nos trabalhos d'esta junta.
A minha obrigação era vir desde o primeiro dia; vim, cumpri o meu dever; estou, pois, em tal assumpto perfeitamente tranquillo.
O sr. Presidente: — Está sobre a mesa o parecer da commissão de poderes sobre os diplomas dos deputados eleitos os srs. Agostinho Nunes da Silva Fevereiro e José de Mello Gouveia, cujas eleições já foram approvadas.
Vae ler-se.