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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nobre deputado quando confessa que o escrutinio principiou e terminou achando-se permanentemente occupada a assembléa pela força armada, distribuida em torno da mesa, a distancia tal, que o eleitor não via nem o que o escrutinador estava lendo, nem qual era o bilhete que o presidente lhe entregava, nem d'onde esse bilhete saía? (Apoiados.)

É esta a doutrina liberal? (Muitos apoiados.) São estes os principios que o governo acceita para si e que a illustre commissão apresenta para serem acceites pela maioria da junta? (Muitos apoiados.)

Definamos bem os campos. É assim que se querem fazer eleições? (Apoiados)

Acham ainda pouco a influencia, a pressão, os meios de corrupção de que os governos lançam mão quando querem avassallar a maioria dos circulos? (Apoiados.)

Nós, os que temos alguns annos de pratica parlamentar, já sabemos antecipadamente quaes são os eleitos de qualquer governo, quaes os resultados que hão de dar as eleições pelos diversos circulos do paiz. Todavia não é caso novo, se esse governo cáe quatro dias antes da eleição, quando os seus candidatos estão certos da victoria, ver-se o governo seu successor trazer maioria inteiramente differente, verdadeira surpreza completamente inesperada; essa maioria, justo é confessal-o, representa tanto o paiz, como o representava a outra. (Apoiados.)

Acham pouco? Querem mais? Querem fazer eleições por esta fórma? (Apoiados.) Querem a leitura das listas feita, não pelo povo, e vigiada por elle, mas guardada n'um circulo de ferro pelas bayonetas? (Muitos e repetidos apoiados.) Então affirmam claramente os seus principios. (Apoiados.)

A eleição de Ceia em si é pouco, mas o precedente, o exemplo de direito eleitoral, ou de abuso eleitoral, é muito; é grave. (Apoiados.)

Poderá ser damno irreparavel. (Apoiados.) Entretanto espero ainda, porque sou dos que confiam até ao fim que a junta não considerará esta questão como politica, porque não o é, nem póde ser (Apoiados.); excepto se o governo quizer declarar principio governamental do seu credo politico o fazerem-se eleições á bayoneta, em vez de as deixar fazer ao povo. (Apoiados.)

Mas se o governo não faz tal declaração, e eu vejo presente o nobre ministro do reino, que supponho absolutamente incapaz de dizer que mudou a ponto de querer eleições feitas á força armada, em logar de serem feitas pelos eleitores; se o governo não admitte tal principio, esta questão nunca poderá ser considerada como politica, e á maioria seria fazer grave injuria suppor que é esta a sua politica.

E não seria favor; antes seria pôr em grande risco um governo, que ficasse com a responsabilidade de ter feito approvar, por politica, uma eleição que nunca podia ser considerada n'esse terreno nem n'esse campo.

A questão é do paiz; é principalmente da dignidade d'esta camara, da sua legitimidade, do seu prestigio e da indispensavel confiança, que precisa de inspirar ao paiz, para legislar com auctoridade, e para se não tornar suspeita de representar a fraude, a força ou a violencia, em vez de representar a expressão legitima do suffragio popular.

É debaixo d'este ponto de vista que colloco esta questão.

Felizmente o illustre orador que me precedeu, o sr. Francisco do Albuquerque, tratou-a com conhecimento pleno dos factos, e não lhe deu tambem caracter algum politico; e espero que os oradores que se sigam a não desviem do caminho em que ella se acha collocada; e refiro-me principalmente aos oradores que não sympathisam com a maioria d'esta camara, porque não creio, apesar de ter havido exemplos, e exemplos repetidos, em contrario, que a opposição fosse mandada ao parlamento para fazer mais serviços ao governo do que os que lhe faz a sua maioria.

Poderá haver alguma duvida, quando nós decidimos como jury, e sem o rigor estricto, de documentos e provas a que são obrigados os tribunaes judiciaes?! Poderá algum de nós, em boa consciencia, conservar qualquer duvida, em relação ao modo como as cousas se passaram n'esta assembléa eleitoral?

Ha um documento a que vou referir-me, e do que não podia deixar de fazer menção. É o protesto do capitão que commandava a força n'esta assembléa, protesto sobre o qual tenho de dizer duas palavras.

Este documento, pela fórma por que está escripto, pelo momento, pela occasião em que se escreveu, convence todo o espirito imparcial, de que contém a narração fiel e exacta dos factos que se passaram na assembléa eleitoral. Não ha, não póde haver individuo estranho ás paixões de um circulo qualquer, que tivesse a audacia de affirmar o que se affirma n'este documento, logo que tivesse a certeza de que o desmentia uma assembléa inteira, porque estava contrariando a verdade dos factos, que tinham sido presenceiados por todos os eleitores de uma assembléa primaria.

Como jury, eu reconhecia a este documento uma importancia essencial, mesmo decisiva; e dando importancia a este indicio em relação a este ponto, sou dos que lamentam que este protesto fosse escripto por um official do exercito portuguez, o encarregado de manter ou commandar a força publica, n'um acto qualquer, onde a sua intervenção se julgava indispensavel.

Não creio que este documento, que reputo filho de um momento de paixão, embora, para mim elle seja um testemunho a favor dos factos que affirmo; não creio que este documento pudesse ser escripto por nenhum official do exercito n'um paiz em que o governo não quizesse, ou não tivesse querido exagerar o seu systema de tolerancia a ponto de relaxar os principaes e indispensaveis vinculos, as primeiras e indispensaveis garantias de boa organisação social. (Apoiados.)

Esse ajuste de contas terei occasião de o fazer com o actual governo, não em relação a este facto isolado, mas em relação a outros muito mais importantes e muito mais significativos.

Veja esta junta, e eu desejaria tambem que o governo visse, se fosse capaz de ver, ou se fosse ainda tempo de olhar com seriedade para cousas importantes; vejam todos se é justo ou admissivel que o commandante de uma força publica, possa ou não possa examinar se deve ou não deve n'esta qualidade vir protestar na imprensa do seu paiz do modo como aqui se fez.

É uma questão de disciplina e organisação militar que não me cumpre tratar nesta occasião.

Se a verdade dos factos deveria ser relatada n'uma especie de protesto politico, ou se deveria apparecer antes n'um depoimento que o militar tivesse de prestar perante o poder judicial ou perante qualquer auctoridade, é questão que não quero tratar n'este momento; affirmando, todavia, desde já que me parece muito mais regular expor a verdade dos factos não ao publico, mas aos tribunaes encarregados de apurar a verdade, ou na exposição aos seus superiores.

Mas o protesto não é só este. No protesto apparece o seguinte, e chamo a attenção da junta.

Diz-se aqui:

«Estamos, porém, n'um paiz onde taes sentenças se não cumprem, porque o poder moderador cobre sempre os criminosos d'esta especie com o seu manto de misericordia.»

Isto é com o governo, com o governo que tem por theoria e como principio cobrir com a sua responsabilidade os actos do poder moderador.

Parece que só cobre quando é para receber louvores, e descobre quando é para a censura ou injuria.

Como é que um individuo, um cidadão d'este paiz, não

Sessão de 17 de janeiro de 1879