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SESSÃO DE 17 DE JANEIRO DE 1890 71

não ser estranho o predominio colonial na Africa d'aquelles dois imperios.
Não e desconhecida a ambição d'aquellas duas potencias em relação á acquisição de novas colonias, e como as suas vistas estão de ha muito fixadas no sul da Africa.
De resto, comprehende a camara, esta interpretação, que dou á entrevista da velha Imperatriz e do joven Imperador, podia ser por outros argumentos, perfeita e claramente defendida; não a via, senão quem a não quizesse ver.
Ora sr. presidente, as imprevidencias pagam-se.
O governo portuguez tinha tal tendencia para a grande potencia allemã que, francamente, permittiu, o que a meu ver governo algum devia jamais permittir (estou em occasião de dizer verdades e continuarei a dizel-as, custe o que custar) permittiu, digo, que o capacete de coronel de um corpo allemão podesse substituir por momentos a corôa real portugueza, não se lembrando que o capacete do uhlano, tão inconvenientemente acceitado por Affonso XII, não tinha salvo a Hespanha da questão gravissima das Carolinas.
Era facil de prever o resultado do accordo secreto, que em Spithead se manifestou pela maior demonstração espetaculosa de força naval, que a Inglaterra jamais deu aos olhos de qualquer soberano. Não era difficil suppor, qual seria a conclusão. O leopardo inglez, que encolhera as garras, emquanto a aguia negra da Prussia o vigiava, sentiu-se forte o caiu sobre a presa com a fome de longo jejum.
Era de esperar. E, incuria, sempre incuria do governo! para lhe aguçar o appetite tinha ainda o mercantilissimo inglez. O governo incauto, ou confiando muito na sympathia allemã, não viu que, impellindo as tendencias dominadoras e absorventes, caracteres da raça ingleza, e arrastando o proprio governo inglez, o egoismo monstruoso, hoje como sempre, a respeito de Portugal, como da Irlanda, das classes ricas inglezas havia tomado conta do negocio.
O milhão inglez foi mais adiante e não teve pudor, elle e a dynastia, de associar um membro da familia reinante a um acto de expoliação!
Factos insignificantes pareciam ser estes, mas um previdente, um estadista que ali se sentar (indicando as cadeiras do poder) deve immediatamente desconfiar de pequenos factos, quando se pozer em jogo o egoismo das classes ricas inglezas.
De resto, sr. presidente, era tambem para considerar o caso de estar no poder um ministerio conservador, presidido por um homem mediocre que se chama Salisbury. Por toda a parte os conservadores são os mesmos e se os ha peiores, são os inglezes.
Affirmo, quasi sem receio de errar, se o velho liberal Gladstone estivesse no poder, o governo inglez não teria praticado um acto de fraqueza, e a imperatriz das indias não haveria ligado o seu nome ao bando de burguezes capitaneados pelo duque de Fife. (Uma voz: - Apoiado.)
Todavia, as indicações eram claras; o nosso paiz, que não póde luctar com os colossos de mar e terra, precisa proceder com habilidade.
Ha alguem regularmente intelligente, conhecendo a historia moderna e contemporânea, a organisação politica da Europa, o chamado equilibrio europeu actual, que não saiba que os paizes pequenos correm grave risco, perigam no seu dominio colonial, se a têem, e até na sua autonomia? Ninguem.
O que devia, pois, ter preparado o governo?
Em primeiro logar o desenvolvimento das nossas forças terrestres e maritimas, quanto o comportassem os nossos recursos financeiros; mas, certamente, isto não bastava.
Ha muito tempo, a meu ver, nós deviamos ter cuidado na organisação do exercito e da marinha; mas desilludam-se: é impossivel attingirmos, isolados, força, que possa resistir a 60 collossos de ferro e a 100:000 marinheiros excellentes, que a Inglaterra possue para tripular uma esquadra monstruosa.
Deviamos ter preparado, quanto possivel, allianças solidas, para não ficarmos isolados n'esta Europa armada em guerra ate aos dentes.
O que fez o governo transacto e os que o precederam? Dormiram sobre os louros de faceis glorias alcançados na Africa, não se lembrando que, cessando a acção da Allemanha, havia de vir a revindicta por parte da Inglaterra; e quando viesse nos achava inermes.
(Interrupção.)
Comprehendo, perfeitamente, que a certos espiritos perspicazes estas idéas pareçam ou ridiculamente comesinhas ou extraordinarias; não sou, porém, obrigado senão a dizer o que sei e como sei. Responsavel pela minha consciencia sou-o; pela minha intelligencia não o posso ser.
Quando os meus constituintes me entregaram o mandato de deputado disseram-me: - responsabilisâmos-te absolutamente pelos teus actos, que elles sejam dignos e honrados, e pelas tuas opiniões, que deverão ser sinceras e apresentadas no parlamento com decoro.
O que elles me não disseram foi: que me obrigavam a ser um Tayllerand, um homem de genio; porque a isso não me podia comprometter, principalmente n'um paiz, em que quasi se nasce financeiro e estadista. (Apoiados.)
Affirmo, pois, no anno da graça de 1890, perante o paiz: que supponho perigoso o isolamento, em que nos encontrámos na Europa; affirmo perante o paiz que n'este isolamento me parece haver perigo para o nosso dominio colonial e ate, no caso de conflagração europêa, para a propria autonomia nacional.
Houve tempo em que o direito e a justiça alguma cousa valiam. O direito internacional, essa mesma opinião publica universal, que continha os estados fortes nos limites da justiça, que era a grande força dos fracos, desappareceram desde que Bismark pronunciou o terrivel lemma la force prime le droit.
O direito internacional tem hoje a sua primeira pagina escripta pela força das armas, pelos exercitos e pelas esquadras.
Bismark, embora eu o considere um dos maiores vultos d'este seculo, faz-me, pelas suas idéas e pelos seus processos, a impressão terrivel de um grande barão feudal, nascido por engano no principio do seculo XIX; na sua phrase o grande estadista traduziu livremente o grito de Brennus voe victis; ai, dos vencidos! ai, dos pequenos!
De resto as allianças não se fazem por sympathias de testas coroadas, ou por simples interesses dynasticos, mas por afinidades de raça, de interesses economicos e politicos.
A Italia commetteu esta falta, que rudemente está pagando. Fujamos-lhe nós com a experiencia dos outros e com a historia.
Se a Inglaterra é a nossa infiel alliada, a nossa inimiga na Africa, é preciso encontrar na Europa os inimigos naturaes dos inglezes; ora estes inimigos de raça, de historia e de interesses politicos e economicos são a França e a Hespanha.
A França, emula secular da Inglaterra, ameaçada no Egypto; a Hespanha com a chaga sempre viva de Gibraltar.
Se os politicos do meu paiz tivessem sido previdentes (houve um que o foi, o sr. conde de Casal Ribeiro) ha muito que se teria preparado, ao menos para a defeza, uma alliança com a França e a Hespanha.
Desilluda-se, não direi a camara, que e muito illustrada, e tem em si tão grandes talentos, que nunca se illudem, desilluda-se o paiz, as allianças solidamente estabelecidas, longe de diminuirem a autonomia dos povos, contribuem poderosamente para a fortalecer e garantir.
São as allianças nas relações internacionaes dos povos o
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