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N.° 11

SESSÃO DE 10 DE JULHO DE 1897

Presidencia do exmo. Sr. Eduardo José Coelho

Secretarios - os exmos srs. Joaquim Paes de Abranches Frederico Alexandrino Garcia Ramires

SUMMARIO

Approvada a acta, prestam juramento os srs. João Pinto Rodrigues dos Santos, José Eduardo Simões Baião e conde de Idanha a Nova.- Participações feitas pelo sr. presidente.- No expediente dá-se conta de tres officios, e têem segunda leitura uma proposta do sr. F. de Almeida e um projecto de lei do si. Catanho de Meneses.- O sr. ministro da justiça indica o dia e hora em que será recebida por El-Rei a deputação que vae apresentar-lhe a resposta ao discurso da corôa. Manda em seguida para a mesa uma proposta para aggregação, que é approvada.- Apresenta uma renovação de iniciativa o sr. condo do Alto Moarim, e o sr. Laranjo um requerimento pedindo documentos. - O sr. Queiroz Ribeiro aponta diversos abusos praticados pela fiscalisação privativa dos tabacos, e reclama providencias. - O sr. ministro da justiça, não tendo elementos para responder, promette informar o seu collega da fazenda. - Participa a constituição da commissão de guerra o sr. Cayola,- O sr. Castro Mattoso apresenta uma renovação de iniciativa e duas representações. Chama depois a attenção do sr. ministro da justiça para o estado de deterioração em que se acha a penitenciaria de Coimbra. - Resposta do sr. ministro da justiça. - Perguntas do sr. Teixeira de Sousa ao sr. ministro da justiça, que lhe responde em seguida. - O sr. conde de Paçô Vieira combate a idéa da extincção da relação dos Açores. Apresenta um aviso previo ao sr. ministro da marinha - Participação de se achar constituida a commissão de fazenda.- Requerimento do sr. Reymão pedindo documentos.

Na primeira parte da ordem do dia entra em discussão o projecto de lei n.° 8 (fixação da força na val), fallando em primeiro logar o sr. Ferreira de Almeida, a quem responde o sr. ministro da marinha. Os mesmos oradores usam segunda vez da palavra, sendo em seguida approvado o projecto.

Na segunda parte da ordem do dia elege-se a commissão dos negocios externos, e levanta-se a sessão.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada, 48 srs. deputados. São os seguintes: - Adriano Anthero de Sousa Pinto, Albano de Mello Ribeiro Finto, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alvaro de Castellões, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Carlos Augusto Ferreira, Conde do Alto Mearim, Conde de Paçô Vieira, Conde de Silves, Eduardo José Coelho, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique Carlos do Carvalho Kendall, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Antonio de Sopulveda, João Catanho de Menezes, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Monteiro Vieira de Castro, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alberto da Costa Fortuna Rosado José Augusto Correia do Bairros, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Bento Ferreira de Almeida, José da Cruz Caldeira, José Frederico Laranjo, José Joaquim da Silva Amado, José Malheiro Roymão, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Bayola, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Fischer Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Antonio Tavares Festas, Bernardo Homem Machado, Carlos José de Oliveira, Donde de Burnay, Conde de Idanha a Nova, Francisco de Castro Mattoso da Silva Côrte Real, Francisco Furtado de Mello, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Jacinto Candido da Silva, João Abel da Silva Fonseca, João de Mello Pereira Sampaio, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Simões Ferreira, José Dias Ferreira, José Eduardo Simões Baião, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Maria Pereira de Lima, Luiz Osório da Cunha Pereira de Castro, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Pinto de Almeida, Manuel Telles de Vasconcellos e Visconde de Melicio.

Não compareceram, á sessão os srs.: - Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Augusto José da Cunha, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Silveira Vianna, Frederico Ressano Garcia, Henrique da Cunha Matos de Mendia, João Joaquim Izidro dos Réis, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Maria Barbosa de Magalhães, Leopoldo José de Oliveira Mourao Marianno Cyrillo de Carvalho, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Sertorio do Monte Pereira.

Acta - Approvada sem reclamação.

O sr. Presidente: - Estão nos corredores da camara, para prestarem juramento, os srs. deputados José Eduardo Simões Baião, João Finto dos Santos e conde de Idanha a Nova.

Convido os srs. deputados Correia de Barros e Teixeira de Sousa a introduzil-os na sala.

Foram introduzidos, prestaram juramento e tomaram assento.

O sr. Presidente: - Tenho a participar á camara que a mesa, em virtude dos convites que recebeu, teve a honra de a representar, assistindo á missa que se realisou na igreja de S. Domingos em commemoração da partida da expedição de Vasco da Gama para a India e do mesmo modo á inauguração da nova séde da sociedade de geographia de Lisboa.

Parece-me que correspondo aos sentimentos da camara, fazendo consignar na acta de hoje um voto de adhesão a todas as manifestações realisadas no paiz para solemnisar uma das datas mais gloriosas, faustosas e notaveis da nossa historia patria. (Apoiados geraes.)

Assim se fará, vista a manisfestação da camara.
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Tenho tambem a participar que se acham sobre a mesa as contas da commissão administrativa, relativa, as suas gerencias de 23 de maio a l5 de julho de 1893, 7 a 29 de novembro de 1894, 17 de janeiro a 9 de maio de 1896, e 20 de janeiro a 8 de fevereiro de 1897, bem como as da junta administrativa relativas as suas gerencias de l6 de julho a 31 de dezembro, de 16 de julho de 1893 a 7 de novembro de 1894, de 29 de novembro de 1894 a 17 de janeiro de 1896, e de 9 de maio de 1896 a 17 de janeiro de 1897.

Vão ser enviadas, as primeiras á commissão de fazenda, e as segundou á commissão administrativa.

Não reviu.

EXPEDINTE

Officios

Do ministerio dos negocios estrangeiros, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Marianno de Carvalho, documentos relativos no commercio de vinhos, fructas e legumes no Brazil.

Para a secretaria.

Do ministerio da marinha, participando, em satisfação ao requerimento do sr. Marianno de Carvalho, que o processo relativo á proposta da companhia de Moçambique para o estabelecimento de linhas telegraphicas, incluindo a ligação da Beira ou do qualquer outro ponto na costa portugueza de Moçambique com a Europa, está affecto á junta consultiva do ultramar.

Para a secretaria.

Da commissão executiva do bicentenario da morte do padre Antonio Vieira, convidando esta camara a fazer-se representar na solemnidade que vae realisar se para a sua commemoração.

Para a secretaria.

Segundas leituras

Proposta

Fica auctorisada a mesa a nomear as commissões que faltam eleger, o que hoje o nas sessões seguintes, emquanto não houver projectos para ordem do dia, se aproveite a sessão para explicações entre o governo e os srs. deputados. = F. de Almeida.

Não foi admittida.

Projecto de lei

Senhores. A copia junta da representação dirigida por centenares de lavradores da ilha da Madeira, ao governo de Sua Magestade, o que não pôde ser attendida, por falta de competencia do governo para fazal-o, contém rasões claras e bastantes para justificar o projecto de lei, que temos a honra de submetter á vossa apreciação.

É certo que as bases do contrato de concessão das levadas da Madeira, de 26 de setembro de 1896, annexas á lei de 21 de maio do mesmo anno, auctorisam o concessionario a alterar os preços da renda da agua das levadas concedidas, por fórma que, em alguns pontos, como no concelho de Santa Cruz, a hora de agua da levada do Juncal passa da renda actual de 600 réis para 3$ 130 reis; e no concelho da Calheta, a renda das aguas das levadas Velha e Nova do Rabaçal passam de 800 réis para 1$144 e 1$151 réis por hora!

É facil de prover-se que de uma alterada tamanha terá de resultar forte perturbação para a economia agricola das regiões, onde tal acontecimento venha a verificar-se; e ha justo motivo para receiar-se que o lavrador, ou terá de abandonar a lavoura, que depender do emprego de taes aguas, ou se não sujeitará ao pagamento do similhantes preços novos.

É do interesse do estado prevenir-se contra taes perturbações, das quaes só podem resultar-lhe prejuizo o mal estar para os povos.

Visa este fim o projecto que temos a honra de apresentar-vos, do qual não resulta encargo sensivel para o thesouro publico, porque o estado nunca lucrou directamente com a renda de aguas de irrigação da ilha da Madeira (nem esse lucro directo póde ser objectivo seu); e, ainda que pareça perder, dispondo da percentagem de 35 por cento, que lhe compete nas rendas das mencionadas aguas segundo o § unico da clausula 4.ª do contrato alludido, essa perda será resarcida largamente, pelos beneficies que hão de advir do augmento da riqueza agrícola fomentada por esta medida, tendente a manter a paz do trabalhador e condições rasoaveis para o exercicio da sua industria tão digna de consideração.

Artigo l.° É o governo auctorisado a dispor da percentagem de 35 por cento, que tem a cobrar do concessionario das levadas da ilha da Madeira, por virtude do § unico da clausula 4.ª do contrato de 26 de setembro de 1896, para por esta verba poder corrigir, nos diversos levadas, o augmento da renda actual da hora de agua que vier a resultar dos operações auctorisadas pelas bases da mesma concessão.

Art. 2.° O governo regulará o modo de applicação da verba auctorisada, em ordem a que ella não possa ser excedida, nem applicada a outro fim que não seja corrigir os augmentos de preço, resultantes da execução do referido contrato, mantendo até onde for possivel, pela referida verba, as rendas actuaes das aguas das diversas levadas, objecto da concessão.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Lisboa, sala das sessões da camara dos senhores deputados. = Visconde de Ribeira Brava = João Catanho de Menezes.

Foi admitido e enviado ás commissões de fazenda e obras publicas.

O sr. Ministro da Justiça (Francisco Antonio da Veiga Beirão): - Sr. presidente, pedi a palavra para participar a v. exa. que Sua Magestade se digna receber a deputação da camara, encarregada de lhe apresentar a resposta ao discurso da corôa, na segunda feira proxima, pelas duas horas da tarde.

Aproveito o ensejo de estar com a palavra para mandar para a mesa a seguinte

Proposta

Em conformidade com o disposto no artigo 8.º do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, pede o governo á camara dos senhores deputados da nação portugueza a necessaria permissão para que possa accumular, querendo, as funcções legislativas com as do seu logar de ajudante do procurador geral da corôa e fazenda o sr. deputado Jacinto Candido da Silva.

Secretaria d´estado dos negocios ecclesiasticoa o de justiça, em 10 de julho de 1897. - Francisco Antonio da Veiga Beirão.

Foi approvada.

O sr. Conde de Alto Mearim: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte

Proposta de renovação de iniciativa

Renovâmos a iniciativa do projecto de lei n.° 119-G, de 1890, declarando extinctos os fóros impostos nos terrenos do extincto couto do antigo convento de Almoster, e os respectivos foreiros isentos de toda a responsabilidade pelos fóros vencidos e não pagos.

Sala das sessões, 10 de julho de 1897. = Os deputados, Marianno Cyrilho de Carvalho = Conda de Alto Mearim

Ficou para segunda leitura.

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O sr. Presidente: - Pela note da inscripção tem agora a palavra o sr. deputado Ferreira de Almeida, visto ter enviado para a mesa um aviso previo desejando interrogar o sr. ministro, da marinha e ultramar; mas, como o sr. ministro não está presente, não sei se o sr. deputado interrogante deseja fazer uso da palavra.

O sr. Ferreira de Almeida: - Não usarei agora da palavra, visto não estar presente o sr. ministro da marinha.

O sr. Frederico Laranjo: - Pedi a palavra para enviar para a mesa um requerimento, pedindo alguns esclarecimentos pelo ministerio da fazenda.

É o seguinte

Requerimento

l.º Requeira que, pelo ministerio da fazenda, seja enviada a esta camara nota da quantia com que foi aposentado o posso agente financial barão da Costa Ricci;

2.° Designação da moeda em que essa quantia é paga, e se com a conversão d´essa moeda, á taxa corrente do cambio ou sem ella. = José Frederico Laranja.

Mandou-te expedir.

O sr. Presidente: - Segundo a nota da inscripção, segue-se no uso da palavra o sr. deputado Gaspar Queiroz Ribeiro que tambem enviou para a mesa um aviso previo; mas o sr. ministro da fazenda, a quem deseja interrogar, não está presente...

O sr. Gaspar de Queiros Ribeiro: - Se v. exa. me permitte, usarei da palavra mesmo na ausencia do sr. ministro.

O sr. Presidente: - N´esse caso tem a palavra o illustre deputado; mãe peço licença para desde já lhe observar que temos de passar á ordem do dia ás tres horas e quarenta e cinco minutos da tarde.

O sr. Queiroz Ribeiro: - Sr. presidente, a benevolencia é companheira inseparável da illustração. Por isso não farei a v. exa., nem á camara a injuria de lhes pedir que sejam benevolos para commigo.

Tenho a antecipada certeza de que o hão de ser, e é esta certeza o que me anima, no meio da commoção natural em quem, pobre de recursos, como eu, tem a a honra de levantar pela primeira vez a sua humilde voz, n´esta casa do parlamento.

Sr. presidente, ha bastantes dias que desejava trocar algumas palavras com o governo, sobre o assumpto a que se refere o aviso previo, que tive a honra de enviar para a mesa. Infelizmente nem sempre é facil conseguir a realisação d´este desejo, e por isso tive de aproveitar o remedio que este livro (regimento da camara) me dava para o conseguir.

E, quando lancei mão d´este meio, não pensei, por fórma alguma, que na direita da camara estão os escolhidos é na esquerda os reprobos. Só me lembrei que todos aqui somos filhos de Deus. (Riso.)

O assumpto do meu aviso previo - abrange dois pontos capitalissimos: abusos praticados pela fiscalisação privativa dos tabacos e pelas praças da guarda fiscal que a auxiliam, e remedios para evitar a continuação de taes abusos.

Quanto á primeira parte, sr. presidente, já toda a imprensa do paiz, por diversas vezes, se tem referido aos factos e abusos praticados, e aqui de certo se encontram numerosos representantes da nação, com conhecimento do successos lamentaveis, que poderiam narrar.

Mas nem tenho de os interrogar a tal respeito, nem desejaria tomar tempo á camara com referencias vagas.

Alludirei apenas a factos graves, de que eu possua um conhecimento rigoroso e absoluto, ou por os ter presenceado, ou porque, passando-se perto do mim, a opinião publica m´os transmittia em circunstancias que a isentaram da pecha de suspeita.

Quando os agentes da fiscalisação encontram um individuo, com um resto de cigarro na bôca, intimam-n´o immediatamente para pagar a multa de 2$000 réis, a não preferir ser preso e passar peitos vexames de um processo incommodo e moroso.

Não lhe encontrando tabaco algum, examinam-lhe as mãos, para verem se estão queimadas, se denotam o habito de fumar, e embora, por esse exame reconheçam que o desgraçado não commette tão grave crime, raspam-lhe os bolsos, extrahindo cotão, vestigios de tabaco, terra, seja o que for, e se o paciente não se promptifica a pagar a quantia que lhe exigem, conduzem-n´o ás casas fiscaes, para responder n´um processo.

Vou dizer a v. exa. o que se passou com um individuo do circulo que tenho a honra de representar.

Esse homem, um pobre lavrador, por mera brincadeira, dirigiu estas palavras aos agentes da fiscalisação: "Quereis tabaco? Vinde buscado".

Não foi preciso mais. Correram para elle, revistaram-n´o no mesmo instante, e, como nada lhe encontrassem, cobriram-lhe o corpo de coronhadas!

Era um epileptico. Caíu prostrado por um ataque. Pois um dos agentes da fiscalisação, para verificar se o ataque seria verdadeiro ou fingido, torceu-lhe um braço, deixando-o muito maltratado!

Este facto affirmo-o perante a camara, e, se houvesse duvidas, tiral-as-ía todas o respectivo processo, que pende na comarca de Valença.

Abusos d´esta ordem, sr. presidente, são absolutamente revoltantes, e dão o direito de perguntar se vivemos entre hottentotes ou n´um paiz civilisado. (Apoiados.)

Succede ás vezes que o revistado não tem dinheiro para pagar a multa. Então levam-n´o preso, conduzindo-o por longos caminhos, n´uma triste peregrinação, n´uma vexatoria romaria, durante um e dois dias ou mais!

Passo a referir a v. exa. o que succedeu, n´estas condições, a um homem do meu conhecimento.

Arrastaram-n´o de um logar distante para Villa Nova de Cerveira, de Villa Nova de Cerveira, a Paredes de Coura, de Paredes de Coura a Pias, e de Pias a Valença, de fórma que não tendo meios para pagar os alimentos, chegou exhausto, semi-morto, ao ponto onde o entregaram á auctoridade que devia julgal-o!

Mas ha peior ainda. Um jornal de Valença publica o seguinte:
(Leu).

Não ouso fazer commentarios.

Sr. presidente, os factos que expuz e muitos outros que podia narrar, se não receasse tornar-me fastidioso, têem a meu ver uma origem- principal, que urge eliminar.

É o decreto n.° 2 de 27 de setembro de 1894, que no artigo 52.° estatuiu pela primeira vez esta doutrina nova em direito:
(Leu.)

Quer dizer: o proprio individuo, a quem o artigo 147.° dá a maior parte na multa, é o juiz do processo, é quem applica essa multa!

V. exa., como magistrado, e magistrado distincto, sabe perfeitamente que, segundo as leis de todas as nações cultas, nem testemunhas podem ser as pessoas que tiverem interesse directo na causa.

Pois, n´este caso, são mais são, os proprios julgadores, tornando-se quasi sempre a ganancia a norma do seu procedimento.

O sr. Tavares Festas (aparta): - E a falta de competencia ?

O Orador (continuando): - Tem v. exa. rasão. Falta-lhes por completo a competencia technica e nem dispõem ao menos doa instrumentos que seriam necessarios, para procederem a uma analyse rigorosa.

Como o seu interesse é julgarem o tabaco estrangeiro, para cobrarem a multa, não tratam de mais nada, senão

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de explorar a preza que lhes cáe nas garras ou de a entregar ás contingencias de um processo fiscal.

Sr. presidente, o artigo a que me refiro tem ainda outro inconveniente.

Diz o paragrapho 3.°

(Leu).

Deixou-se, pois, aos companheiros, aos collegas do julgador, que não queiram harmonisar-se com a sentença, o direito de recorrerem ao processo ordinario, que dá outras garantias de imparcialidade; mas firma-se o estranho principio do ou sujeitar, n´esse caso, ao perigo da condemnação nos sellos e custas do processo. Por outra: são castigados, se usarem do seu direito!

E note v. exa. que tal disposição veiu abrir uma excepção nas leis fiscaes, que todas isentaram sempre os apprehensores do pagamento dos sellos e custas. Todavias para esta hypothese, dispoz-se o contrario, de proposito, para evitar o emprego do unico processo de que poderia resultar uma decisão rasoavel.

Sr. presidente, parece que o legislador achou ainda pouco tudo isto, e é talvez por isso que a 6 de junho de 1895, se não me engano, se lavrou outro decreto mais extraordinario do que o primeiro.

Foi, por assim dizer, a sua segunda edição, incorrecta e augmentada.

Alargou-se por fórma incrivel a area do julgamento summarissimo, fazendo-a abranger toda a zona fiscal da fronteira.

Esta zona está delimitada pelo artigo 34.° do decreto n.° 4 de 27 de setembro de 1894, que diz:

(Leu).

A area ficou portanto enormemente maior.

Encerra ainda o decreto um novo preceito, contra o qual não posso deixar de protestar.

E sabe v. exa. a fórma por que se conseguiu introduzir na lei essa modificação? Nada mais simples: trocando um o por um e Substituiu-se proferiu por preferiu.

Effectivamente diz o decreto:

(Leu.)

Eis como se tomou o processo summarissimo obrigatorio e inevitavel até para o apprehensor!

As consequencias têem sido multiplicar extraordinariamente os vexames que soffrem os arguidos, com ou sem fundamento.

Num admira que se repitam disturbios o violencias de parte a parte.

Ha uma escola que usa duas lunetas, uma azul, de um azul idyllico, quando está no governo, outra negra, de um negro tragico, quando está na opposição (Riso). Eu não pertenço a essa escola. Vejo sempre tudo da mesma côr. Por consequencia não duvidaria perfilhar as calorosas palavras, que ha dias tive o prazer do ouvir ao sr. Teixeira de Sousa, a proposito do estado geral do paiz.

S. exa. fez ver como por toda a parte se alastra uma crise terrivel, que póde trazer comsigo resultados bem funestos. Ora, n´esta situação, não é necessario insistir na inconveniencia da crueldade, com que a fiscalisação privativa dos tabacos está tratando os povos.

Podem responder-me, bem sei, que essa mesma disposição que eu ataco, tem o seu correctivo no $ 1.° do artigo que citei, pois faculta ao arguido pagar de prompto ou optar pelo processo ordinario.

Mas similhante recurso é, na practica, inteiramente illusorio.

Em primeiro logar, ou mais vexados pela fiscalisação são geralmente pessoas pobres, desprotegidas da fortuna, com o preconceito do que as auctoridades fiscaes condemnam sempre, quer haja prova, quer não. Domais, vêem-se verdadeiramente aterrados pelos exemplos que estão presenceando dia a dia, accrescendo ainda que, em grande parte, ignoram a alternativa que a lei lhes concedo e que tão raras vezes aproveitam.

E comprehende-se. Eu, por mim, declaro a v. exa. e á camara, com toda a sinceridade: não fumo, mas se fumasse, preferiria talvez pagar a multa, embora innocente, a ter uma demanda e sofrer os abusos que de ordinario a precedem, por parte da fiscalisação.

Ainda poderá responder-se que a esta não lhe cabe responsabilidade alguma nas apprehensões, porque só a guarda fiscal tem direito a fazel-as.

Mas isto, a serio, não se póde sustentar.

V. exa. sabe perfeitamente que, sendo, como são, pagos e gratificados pela fiscalisação privativa, os guardas que a auxiliam, dependem d´ella tanto, como os agentes especiaes, que essa fiscalisação tem ao seu dispor. Nem podem ser considerados senão como verdadeiros agentes, a quem a lei faculta um direito que elles exploram, em beneficio proprio e de quem lhes paga. (Apoiados.)

Ha um grande perigo na continuação d´este estado de cousas, porque, alem de tudo, o nosso exercito vae-se tornando cada vez mais antipathico e odiado, senão no todo, pelo menos n´uma parte, que devia ser digna e respeitavel.

Olham-se hoje as praças da guarda fiscal, que auxiliam os empregados da fiscalisação dos tabacos, com um rancor que é geral e até certo ponto justificado.

Ora nós não queremos o exercito para que elle seja, por assim dizer, como um creado de servir da companhia dos tabacos.

Queremol-o para defender a paz e a tranquillidade no interior do paiz, fiel ao seu Rei e ás suas instituições.

Queremol-o para, sondo necessario, de peito ás balas e cabeça erguida, defender esse mesmo paiz contra a invasão do inimigo.

Queremol-o para, lá fóra, como o outro dia aqui disse tão brilhantemente o sr. ministro da marinha, se immortalisar no campo da batalha ou sujeitar-se ás mesmas contingencias, sem ao menos ter a compensação da gloria, que poderiam dar-lhe, as campanhas regulares, em combates frente a frente.

Queremos o exercito para tudo isso, mas não o queremos para ser como que uma succursal da fiscalisação privativa dos tabacos. (Apoiados.)

Hontem, n´esta casa, mas n´outra camara, tive o prazer intenso de ouvir a palavra eloquente, e illuminada do sr. Antonio Candido, e não pude deixar, sobretudo, de admirar a parte do seu discurso, em que s. exa. fazia ver como os parlamentos tinham nascido para as grandes questões politicas.

E sabe v. exa. o que me lembrava n´aquelle momento?

Lembrava-me que essas grandes questões politicas, esses abalos profundou, que ás vezes emocionam as nações, resultam muita voz dos questões economicas e financeiras, nascem das questões de impostos. A França e a Inglaterra ahi estão para o confirmar.

Comprehende-se, pois, quanto seria imprudente permittir a continuação dos abusos que até aqui se têem dado.

É claro que nas minhas palavras não ha, nem podia haver, a menor sombra de animosidade contra ninguem.

Trato este assumpto porque, em minha consciencia, estou convencido de que é um assumpto de interesse geral.

Mas não alvejo pessoalmente quem quer que seja, nem quero, de fórma alguma, collocar em embaraços o governo acarretando-lhe ainda mais difficuldades, como se fossem poucas ou mesquinhas aquellas com que já lucta.

Pelo contrario, o meu desejo é que a sua acção benefica o illustrada incida n´este assumpto, como tem incidido n´outros; e indicando algumas resoluções que, a meu ver, são indispensaveis, procuro apenas contribuir para que elle continuo a ser tão util ao paiz, como o tem sido até hoje.

O sr. ministro da fazenda, que não vejo presente, teve a delicadeza de me declarar que, a minha exposição lhe fosse transmittida por qualquer dos seus distinctos collegas, a tomaria em consideração.

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Portanto, sem me alongar mais, porque não desejo abusar da benevolencia da camara, que tão amavel tem sido para commigo, passo a apresentar os alvitres, que me parecem convenientes; para evitar a continuação do mal a que me estou referindo.

Em primeiro logar, julgo necessario revogar desde já o artigo 52.° do decreto de 6 de junho de 1895, com referencia ao artigo 52,° do decreto n.° 2, de 27 de setembro de 1894.

A fiscalisação dos tabacos ficará muito bem, tendo ao seu dispor as leia que já existiam antes d´esses decretos, o podendo assim lançar mão, como fazia d´antes, do processo ordinario, que offerece garantias a uns e outros.

Em segundo logar, parece-me vantajoso impedir as requisições individuaes. Fedem-se muitas vezes praças da guarda fiscal, designando-se-lhes os nomes. Seria melhor que isto acabasse. O commando geral sabe perfeitamente quem deve mandar.

Outro alvitre, que considero urgente, é limitar ás praças o tempo de serviço junto da fiscalisação, a exemplo do que succede com o tabaco no Douro, onde, por uma resolução sensatissima do commando geral, nenhuma praça póde permanecer mais de um anno. São tão palpaveis e evidentes as rasões do que acabo de dizer, que me dispenso de as explanar.

Tambem me parece indispensavel darem-se instrucções rigorosas e especiaes ás praças auxiliares da fiscalisação.

E, a proposito, peço licença para ler á camara uma nota da direcção da alfandega do Porto, prescrevendo a fórma de proceder ás buscas pessoaes.

Diz essa nota:

(Leu.)

Com estas indicações concordam plenamente a portaria de 15 de novembro de 1876 e o artigo 135.º do decreto de 2 de agosto de 1888.

A companhia ou a fiscalisação não são mais que o estado, e se elle acata estas instrucções, parece-me que nem a companhia, nem a fiscalisação, teriam de se queixar, sendo a ellas obrigadas. (Apoiados.)

Sr. presidente, apontarei ainda dois meios para se evitarem os abusos que vou referindo. Um seria a exclusão immediata de qualquer praça, que tenha praticado fraudes.

Mais de uma vez tenho intervim, como advogado, em processos cujas sentenças- declaram que se occultaram dolosamente tabacos n´este ou n´aquelle ponto, para incriminar esta ou aquella pessoa! As praças, que commettem ou auxiliam similhante attentado, devem ser inexoravelmente excluidas do serviço, que deshonram, procedendo assim. (Apaiados.)

O sr. Luiz José Dias (áparte}: - A exclusão ainda é pouco.

O Orador (continuando): - De accordo. Mas ao menos ninguem contestará que ella é estritamente indispensavel para cortar abusos tão graves e que tão serios podem ser em resultados.

A outra lembrança, que peço ainda licença paia apresentar, é a de retirar aos agentes, que praticarem fraudes, a fé que a lei lhes concede.

O n.° 6.º do artigo 6.° das bases do contrato com a companhia, estabelece que os agentes d´ella, que tiverem sido ajuramentados, gosarão de todas as garantias dos agentes da auctoridade.

Comprehendo que assim seja; mas desde o momento em que se mostrarem indignos de taes garantias, parece-me que será de justiça retirar-lh´as sem demora.

Não está presente, é certo, o sr. ministro da fazenda, mas attendendo ao caracter e ao talento de que s. exa. é dotado, bem como todos os seus collegas, tenho a mais fundada confiança em que estas violencias, estes desacatos é lei, estes abusos que os decretos a que eu me referi, mais ou menos sanccionam, hão de ter um correctivo rapido.

São esses os votos que faço, pedindo ao governo que, por intermedio de qualquer dos seus distinctos membros, que aqui se encontram, se digne transmittir a s. exa. o sr. ministro da fazenda as minhas considerações, para o mais brevemente possivel se pôr termo á justa exaltação de animos, que existe, não só no circulo que tenho a honra de representar, mas ainda em muitos outros pontos do paiz.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - O illustre deputado declarou que dispensava a presença do meu collega da fazenda, por onde corre particularmente o assumpto a que o illustre orador se referiu, circumstancia esta que faz com que eu não possa responder ás perguntas de s. exa., visto que não estou para isso devidamente habilitado.

Entretanto, o que posso fazer é tomar nota para communicar ao meu collega as observações do illustre deputado, o que farei com muito gosto, podendo s. exa. ter a certeza de que o sr. ministro da fazenda as tomará na consideração devida.

O sr. Queiroz Ribeiro: - Peço licença para significar o meu sincero reconhecimento ao sr. ministro da justiça pelas palavras que acaba de proferir, ficando eu certo de que o illustre ministro se dignará transmittir e mesmo advogar, perante o illustre ministro da fazenda, a justiça das minhas considerações.

O sr. Cayolla: - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Participo que está constituida a commissão de guerra, tendo a mesma eleito para presidente o sr. José Estevão de Moraes Sarmento, e a mim participante para secretario. = O deputado, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayola.

Para a acta.

O sr. Francisco Mattozo: - Mando para a mesa uma representação dos distribuidores telegrapho-postaes de Coimbra, que pedem melhoria de vencimento.

Sobre este assumpto já foi apresentado n´esta camara um projecto de lei na sessão de 15 de janeiro d´este anno.

Renovo agora a sua iniciativa.

Esta pretensão parece-me justissima. Basta recordar á camara que estes servidores do estado estão recebendo hoje o mesmo vencimento que tinham ha trinta e dois annos, ao passo que os distribuidores de Lisboa, Porto e de outras terras do paiz têem conseguido dos poderes publicos melhoria de vencimento.

Mando tambem para á mesa uma representação de 364 cidadãos das povoações denominadas do Pharol e Forte, pedindo que, no caso de ser restabelecido o concelho de Ilhavo, lhe fiquem pertencendo aquellas povoações.

Esta representação é acompanhada de um mappa que demonstra bem a justiça do pedido, e a seu tempo não terei duvida de tratar esto assumpto mais detidamente.

Como estou com a palavra e está presente o sr. ministro da justiça, chamo a attenção de s. exa. para o estado lastimoso em que se encontra o edificio destinado á penitenciaria de Coimbra.

S. exa. sabe que a acquisição d´aquelle edificio custou ao estado uma importante quantia, e que para que elle fosse devidamente installado, e satisfizesse ao fim para que era destinado, de poucas obras carecia. Pois até hoje ainda se não fizeram obras algumas, correndo por isso aquelle edificio o perigo de ficar completamente inutilisado.

Peço, pois, ao sr. ministro, se acaso se julga n´este momento habilitado a dar-me uma resposta, o obsequio de me dizer o que tenciona fazer sobre o assumpto.

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150 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Mando para a mesa a proposta para a renovação de iniciativa e as duas representações a que me referi.

Renovação de Iniciativa

Renovo a iniciativa do projecto de lei apresentado em 18 de janeiro ultimo, considerando para todos os effeitos como segundos distribuidores telegrapho-postaes os individuos que á data da presente lei exercerem os legares de terceiros distribuidores nas sédes dos districtos administrativos do reino. = F. Mattozo Côrte Real.

Ficou para segunda leitura.

As representações vão por extracto do fim da sessão.

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr. Ministro da Justiça (Veiga Beirão): - A resposta á pergunta que me fez o illustre deputado, tão facil e simples, que torna dispensavel o aviso previo.

Effectivamente eu tive a honra de submetter á approvação do parlamento uma proposta para adquirir as penitenciarias districtaes de Coimbra e de Santarem. Essa proposta foi convertida em lei, e em virtude d´ella foram adquiridos para o estado aquelles dois edificios, e tratando-se logo de prepararas cousas de modo que podessem servir para o fim a que eram destinadas.

O illustre deputado e a camara sabem perfeitamente que o systema penitenciario de separação individual e do trabalho obrigatorio é ainda hoje o systema legal em Portugal, mas que a penitenciaria de Lisboa não é suficiente para que ali cumpram as penas a que são condemnados todos os réus incursos nos crimes sujeitos a essas penas.

Acontece, ainda, que a penitenciaria de Lisboa é destinada apenas a homens, de maneira que as mulheres condemnadas á pena penitenciaria, não têem aonde possam cumpril-a. Assim, a penitenciaria de Santarem era, ao proposito do governo de então, destinada a mulheres e a de Coimbra, para ali serem recolhidos os criminosos pertencentes aos districtos do norte do reino.

Como o illustre deputado sabe, começaram-se n´esse tempo as obras que eram mais necessarias á penitenciaria de Santarem e estavam já muito adiantadas, e até já nomeado o pessoal, não só para essa, mas tambem para a de Coimbra, quando o governo caíu em 1890.

É certo, porém, que ainda hoje as cousas estão no mesmo ou talvez em peior estado, porque, segundo me consta, a penitenciaria de Santarem foi entregue ao ministerio da guerra com destino á reclusão militar e d´este modo desappareceu um dos elementos com que o governo de então contava para levar a effeito a completa execuçã do systema penitenciario.

Com respeito á penitenciaria de Coimbra, folgo em dar testemunho á camara de que o illustre deputado muitas vezes se me tem dirigido, fazendo-me particularmente a pergunta que reproduziu hoje em publico, e eu tenho-lhe dito que era intento do governo, logo que entrou para os conselhos da corôa, mandar proceder ás obras necessarias na penitenciaria de Coimbra para que ella o mais breve possivel podesse ser apropriada ao fim para que foi destinada; isto não só para pôr em execução completa o systema penitenciario, mas tambem para evitar que se desmoronasse totalmente aquelle edificio.

Ora, sendo eu interessado n´este assumpto, que corre todavia mais propriamente pela pasta das obras publicas, muitas vezes tenho conversado com o meu illustre collega o sr. Augusto José da Cunha, e posso affirmar que s. exa. se manifestou disposto a fazer convergir para Coimbra o numero sufficiente de operarios empregados nas obras da cidade de Lisboa que, pelas suas circumstancias especiaes, podessem ser removidos facilmente da capital sem lhes causar prejuizo, ou por serem das provincias do norte ou por não terem aqui familia que tornasse indispensavel a sua permanencia em Lisboa. Haveria assim ali o numero sufficiente de operarios para se levar a cabo, dentro de muito pouco tempo é com a maior economia possivel, as obras da penitenciaria. E creio que até já se deram ordens n´esse sentido, achando-se já concluido o projecto respectivo, como tive occasião de dizer a s. exa.

Estimarei que o illustre deputado fique satisfeito com esta resposta.

(S. exa. não reviu este discurso.)

O sr. Mattoso Côrte Real: - Agradeço ao sr. ministro da justiça as palavras que acaba de proferir e peço a s. exa. que insista com o seu collega das obras publicas para que as suas promessas se traduzam em factos.

O sr. Presidente: - O n.° 3.° do artigo 104.° do regimento diz:

"3.° Se o ministro faltar, o deputado que se inscreveu para interrogar, seguir-se-ha ao ultimo que fallar, dentro da respectiva inscripção."

Pertencia fallar, em primeiro logar, ao sr. Ferreira de Almeida, mas como não tinha ainda comparecido o sr. ministro da marinha, dei a palavra ao sr. Queiroz Ribeiro. Agora que já s. exa. está presente, cabe a palavra ao sr. Ferreira de Almeida; mas observo a s. exa. que está muito adiantada a hora e n´estas condições não sei se s. exa. quererá usar da palavra.

O sr. Ferreira de Almeida: - Cedo da palavra; tanto mais que tenho que a pedir na ordem do dia para discutir o projecto de fixação da força naval.

O sr. Presidente: - Segue-se na ordem da inscripção o sr. Teixeira de Sousa, mas como já disse, faltando apenas dez minutos para se entrar na ordem do dia, não sei se s. exa. quererá usar da palavra.

O sr. Teixeira de Sousa: - Se v. exa. me dá a palavra, eu desejo fazer umas singelissimas e concretas perguntas ao sr. ministro da justiça, ácerca de dois factos que se não forem cabalmente explicados, podem dar relevo á fama de faccioso de que gosa o sr. ministra da justiça e que desejo muito não ver mantida.

O padre Julio Candido César, parocho collado na igreja de S. Gens, concelho de Vieira, foi apresentado na igreja de Santa Eulalia do concelho de Fafe por decreto de 4 de fevereiro ultimo, despacho que foi publicado no Diario do governo de 6 do mesmo mez. Começou a pagar os direitos de mercê e tem-n´os pago até hoje, mas aconteceu que tendo solicitado a carta regia para poder collar-se em 20 de fevereiro ultimo lhe foi negada em virtude de ordem emanada do sr. ministro da justiça. Para este facto anormal peço a attenção de s. exa., e muito desejaria que s. exa. retirasse as ordens que deu no sentido da recusa d´essa carta regia e que levantasse assim a excommunhão de que tem sido victima o parocho a que me refiro.

Já que estou com a palavra, pergunto tambem a s. exa. qual a rasão de interesse publico porque até hoje não foi provido na igreja de Villa Verde do concelho de Alijo o unico concorrente devidamente habilitado para sobre elle recair o despacho.

Eu, sr. presidente, sou o primeiro a reconhecer que o sr. ministro da justiça é o unico juiz da opportunidade dos despachos a fazer pela sua pasta; mas, com relação á igreja de Villa Verde, deu-se um facto, que até certo ponto, poderá inquinar de suspeição o procedimento havido por parte do sr. ministro da justiça o sr. Beirão.

Foi aberto concurso de provas publicas para a igreja a que acabo do referir-me, e foram tres os concorrentes.

Um foi reprovado, outro desistiu, e o terceiro, o presbytero Joaquim Garcia, que ainda não foi despachado, e que no processo do concurso está excelentemente classificado!

Ora o que aconteceu?

É que foi nomeado para essa igreja um presbytero, de de nome Fausto Alvim, que tinha sido reprovado em concurso!

Devo dizer com franqueza, que não accuso o sr. ministro da justiça. Sou o primeiro a reconhecer e a jurar, se preciso for, que s. exa. fez este despacho em virtude de um equivoco.

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Tomei a liberdade de particularmente me dirigir a s. exa., informando-o de que só por engano ou equivoco tinha despachado um padre reprovado em concurso, e devo dizer francamente, que o sr. Beirão honradamente se apressou a annullar esse despacho. Todavia, v. exa. comprehende que, tendo-se dado esse facto, e tendo passado mezes, sem que o sr. ministro da justiça nomeie o unico concorrente habilitado com approvação e boa informação do seu prelado, poderá até certo ponto, não serei eu que o duvide, duvidar-se da boa fé com que foi feito o despacho que o sr. ministro annullou.

Aguardo a resposta de s. exa., se porventura s. exa. houver por bem responder-me, e farei depois do s. exa. as considerações que o caso exigir.

O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Na verdade o illustre deputado não se limitou a fazer o aviso previo: fez tambem a resposta previa; e essa tenho eu a agradecer-lhe, porque me tirou absolutamente é trabalho de a dar, dispensando-me, ao mesmo tempo, de cansar a attenção da camara.

O illustre deputado perguntou a rasão por que se tinham dado ordens para recusar a carta regia a um presbytero cujo nome não vem á proposito.

Ora eu, querendo unicamente colocar a questão nos termos em que ella se póde discutir, direi que s. exa. não póde ter conhecimento official senão do facto de não se haver passado a carta de provimento a um presbytero. É isto unicamente o que a s. exa. póde constar.

Ora, eu não respondo, senão com as proprias palavras do illustre deputado, isto é, que eu, como ministro dos negocios ecclesiasticos e de justiça, sou o unico juiz da conveniencia de submetter á sancção regia qualquer diploma da minha pasta. (Apoiados.)

Com respeito á pergunta concreta que o illustre deputado fez, respondo que ainda não julguei conveniente, nem opportuno submetter á sancção regia a carta de provimento a que se referiu s. exa. Reservo-me tomar quaesquer providencias a respeito d´esses e de outros casos analogos ou similhantes; e essas providencias hão de chegar ao conhecimento dos interessados. Só depois é que terei de responder pelo acto que tiver praticado.

Isto pelo que respeita ao primeiro ponto. Pelo que respeita ao segundo, a resposta é a mesma. É verdade que houve um concurso aberto para o provimento da igreja de Villa Verde e eu levei á sancção regia e apresentei ali um parocho. Por fórma alguma quero desculpar-me; por que o illustre deputado disse e disse muito bem que esse parocho tinha ficado em condição de não poder ser despachado, mas as rasões porque o fiz ou julguei que podia fazer, constam do processo.

Nos termos mais delicados, devo dizel-o, o illustre deputado chamou a minha attenção para o assumpto, e eu recebendo o processo, colhi informações e reconhecendo que não se podia sustentar aquelle despacho, annullei-o immediatamente. É esta a verdade, e tambem é verdade que o processo está pendente, não tendo eu tomado ainda resolução alguma com respeito ao provimento da igreja, de que se trata.

É esta a resposta que tenho a dar ao illustre deputado e a unica que está nos minhas faculdades poder dar.

( S. exa. não reviu este discurso.)

O sr. Conde de Paçô Vieira: - Sr. presidente, quando, ha dias, o illustre deputado sr. Luciano Monteiro requereu aqui que pelo ministerio da justiça lhe fossem enviados os mappas do movimento judicial da relação dos Açores, nos ultimos annos, para instruir com elles o projecto de lei que tenciona apresentar á camara extinguindo aquella relação, eu pedi immediatamente a palavra.

Queria, acto continuo á affirmação d´essa grande injustiça, protestar contra ella, e dizer desde logo a v. exa. e á camara que, não obstante a muita consideração e respeito que tenho pelo saber e pelo talento de s. exa. o seu projecto terá em mim o mais intransigente adversario, e declarar que pela minha parte, como deputado açoriano que tenho a honra de ser, hei de empregar todos os esforços e todos os meios de que poder dispor, para evitar que esse projecto seja convertido em lei.

Mas como em seguida ao sr. Luciano Monteiro estava inscripto o sr. Teixeira de Sousa, e este fallou todo o tempo que faltava para se entrar na ordem do dia, não me chegou a mim a palavra, e não pode, portanto, lavrar immediatamente o meu protesto.

Faço-o agora. E estou certo de que o illustre deputado sr. Luciano Monteiro, que não é só um distinctissimo parlamentar, mas tambem um notavel jurisconsulto e considerado advogado, ha de ser o primeiro a reconhecer a rasto e a justiça das minhas palavras.

Sr. presidente, a idéa de supprimir a relação dos Açores, não é de hoje, nem de hontem. (Apoiados.) Não é nova.

Pelo contrario. É muito antiga.

Já por mais de uma vez mesmo se tem tentado a sua extincção e sempre sem resultado.

Em 1870 por exemplo, o sr. Dias Ferreira, então ministro da justiça, chegou a redigir um decreto que a extinguia, e passava todas as suas attribuições para a relação de Lisboa.

Quando, porém, leu um conselho de ministros esse decreto, todo o conselho votou contra. E em frente d´essa unanimidade de votos a favor da conservação da relação, o sr. Dias Ferreira entendeu, e muito bem, que devia guardar o decreto na pasta e desistir do seu plano. (Apoiados.)

E assim o fez.

Mais tarde, em 1886, quando o nobre ministro da justiça sr. Francisco Beirão, que então geria esta mesma pasta, apresentou ao parlamento a sua proposta de reforma judiciaria, levantou-se no seio da commissão de legislação civil novamente a idéa de supprimir a relação dos Açores.

Felizmente, porém, fazia parte d´essa commissão o nosso illustre collega sr. Poças Falcão, que era, como hoje é, deputado por S. Miguel. E com tão solidos argumentos e tão decisivas rasões s. exa. a defendeu, que ainda d´essa vez a relação foi conservada.

E assim devia ser, porque não só pela sua origem e pela sua historia a relação de Ponta Delgada é para os açorianos a instituição que mais amam; mas ainda porque a sua extincção representaria para elles gravissimos prejuizos de toda a ordem. (Apoiados.)

Bastará dizer que, havendo apenas, como ha, dois vapores por mez entre Lisboa e os Açores, um a 5 e outro a 20 de cada mez, os julgamentos das causas seriam muito mais demorados, e obrigariam as partes a muito maiores despezas, porque teriam de constituir aqui tambem advogado e procurador, para receberem as intimações, deduzirem embargos aos accordãos, etc.

Isto sem fallar nos interesses que iria affectar dos advogados, procuradores e pequenos proprietarios de S. Miguel, para os quaes a relação representa uma fonte de receita importante, porque os primeiros trabalham perante ella e d´isso vivem, e os outros alugam as suas casas e vendem os productos das suas lavouras aos juizes, aos escrivães, ao guarda mor, aos officiaes, a todos os empregados emfim que constituem o tribunal e d´isso em parte vivem tambem.

A extincção da relação podia representar uma economia para o paiz; não o nego; mas tão insignificante, que póde dizer-se inapreciavel.

Para S. Miguel; porém, era uma calamidade. E para o governo, diz-lh´o um seu adversario e que por isso deve ser insuspeito, seria um enorme desastre politico. (Apoiados.)

Mas sobretudo o que seria, o que era com certeza, era um grande erro e uma incoherencia.

Pois haviamos de ir agora, quando acaba de dar-se a

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Ponta Delgada a autonomia administrativa, tirar-lhe a relação judicial, que tem desde 1833?

Pois haviamos de ir já, quando tão poucos mezes são ainda decorridos depois que os animos ali exaltadissimos serenaram, provocar nova agitação?

Não me parece que isso fosse acertado (Apoiados.)

Mas o que sei, pelo conhecimento que tenho do povo de S. Miguel, é que era perigoso. (Apoiados.)

Eu entendo, sr. presidente, que a favor da conservação da relação dos Açores ha ainda hoje os mesmos motivos, e existem ainda hoje as mesmas rasões, que levaram os ministros de 1870 a votar contra o projecto do sr. Dias Ferreira, convenceram o sr. Dias Ferreira a desistir do seu plano e fizeram triumphar em 1896 a defeza do sr. Poças Falcão. E isso era o bastante para não devermos pensar em extinguil-a. (Apoiados.)

Mas alem d´esses motivos, mas alem d´essas rasões, ha ainda a mais as ponderosas considerações que levaram o partido regenerador a conceder a Ponta Delgada a autonomia administrativa, que a camara demasiado conhece, para que seja preciso eu recordal-as (Muitos apoiados.)

Sr. presidente, lembrou tambem o sr. Luciano Monteiro a creação de secções commerciaes nas relações de Lisboa e Porto, para evitar assim as longas demoras que ha nos julgamentos das appellações commerciaes.

N´este ponto concordo com s. exa.

É realmente indispensavel prover de remedio e rapido, este grave inconveniente. Eu sei de processos que estão ha annos na mão dos juizes, sem decisão. (Apoiados.)

Não discutirei agora qual a melhor fórma de obviar a este abuso, que prejudica por vezes gravemente as partes. Não sei se será melhor crear secções commerciaes, como propõe o sr. Luciano Monteiro, se augmentar o numero de juizes nas relações e no supremo tribunal, se crear outra relação no continente. Isso é assumpto para estudar.

Mas no que não tenho duvidas é na inadiavel necessidade de fazer promulgar uma disposição legislativa qualquer, que melhore o actual estado de cousas.

Ha processos que, quando chegam a ser decididos, não são os primitivos auctores ou réus que vêem a decisão. São os filhos ou os netos. (Apoiados.)

Sr. presidente, nós já tivemos uma relação commercial em Lisboa, que foi extincta, como v. exa. sabe, pelo decreto de 23 de junho de 1870, passando as suas attribuições para as relações civis, com excepção das marcadas
no artigo 1011.° n.° 2.° do codigo commercial de 1833, para regularisar e uniformar a policia de todas as praças commerciaes do reino, que foram transferidos para o governo, com audiencia do procurador geral da corôa e fazenda e dos presidentes das relações.

E por isso não me repugna absolutamente nada que, ou se restabeleça devidamente reformado e melhorado esse tribunal, ou se criem as secções commerciaes que lembra o sr. Luciano Monteiro, ou qualquer outra cousa que modifique o que está

É, repito, um assumpto para estudar. (Apoiados.)

Mas, visto que o sr. Luciano Monteiro quer melhorar, e tem para isso a mais alta competencia, os nossos tribunaes judiciaes, permitia-me s. exa. que eu lhe lembre que em vez de se preoccupar com a extincção da relação dos Açores, de que nenhum beneficio viria, antes só inconveniente, a necessidade de se fixar o limite de idade para ou magistrados, o que é urgentissimo; de se separar completamente a magistratura do ultramar da do reino, porque sem isso d´aqui a pouco não ha juiz do continente que vá á relação, nem delegado do procurador regio que chegue a juiz; de se evitar a continuação dos arestas contradictorios, que são a vergonha e a deshonra dos tribunaes.

E nobre este ponto já eu até apresentei um projecto de lei. (Apoiados.)

Aqui sim, n´este campo é que o illustre deputado póde fazer grandes serviços á magistratura e ao paiz, e evidenciar as suas brilhantes qualidades. E por isso para elle o chamo.

Termino, sr. presidente, perguntando ao nobre ministro da justiça, em harmonia com o aviso premo que mandei para a mesa, se o governo pensa em acceitar a indicação do sr. deputado Luciano Monteiro, de supprimir a relação dos Açores.

Sei que s. exa. póde, querendo, deixar de responder-me, porque o regimento lhe dá a faculdade de adiar por vinte e quatro horas a sua resposta; mas as palavras de s. exa. são esperadas pelo povo de S. Miguel com tanta anciedade, e é para os açorianos de tão grande interesse este assumpto, que eu espero que o nobre ministro não deixará de responder-me hoje mesmo.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

Aviso previo

Declaro para os effeitos do regimento, parte applicavel, que desejo interrogar o exmo. sr. ministro da marinha sobre os «direitos de estadia no porto de Ponta Delgada». = Conde de Paçô Vieira.

Mandou-se expedir.

O sr. Ministro da Justiça (Francisco Antonio da Veiga Beirão): - Estou habilitado a responder ao illustre deputado e poucas palavras direi para não tomar muito tempo á camara. E se não fiz igual declaração á que vou fazer, quando fallou sobre o assumpto o meu illustre collega e amigo, o sr. Luciano Monteiro, foi porque s. exa. n´essa occasião não pediu a minha opinião, como agora fez o illustre deputado, o sr. conde de Paçô Vieira.

A minha opinião é exactamente a mesma que tive em 1886. Entendo que rasões superiores de ordem politica, tomada esta palavra no sentido mais elevado, impõem ao governo a conservação da relação dos Açores. É o mesmo pensamento que eu tinha em 1886, quando apresentei um projecto de reforma judiciaria e é ainda n´estas idéas que eu hei de apresentar novamente um projecto de reforma judiciaria ao parlamento, no qual será conservada a relação dos Açores. Não posso dar a s. exa. resposta mais positiva. (Apoiados.)

(S. exa. não reviu).

O sr. Frederico Ramires: - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Participo a v. exa. e á camara que se acha constituida a commissão de fazenda, elegendo o conselheiro José Dias Ferreira para presidente e a mim, participante, para secretario, havendo relatores especiaes. = Frederico Ramires.

Para a acta.

O sr. Malheiro Reymão: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, me seja enviada com urgencia nota dos empregados que ficaram dirigindo e exercendo a fiscalisação do imposto do sêllo, em execução do decreto de 25 de fevereiro de 1897; relação dos que, nos termos do mesmo decreto, foram dispensados d´aquelle serviço para serem collocados nas vagas occorrentes; nota das vagas ocorridas n´aquelle pessoal mantido no serviço da fiscalisação e individuação dos empregados que em virtude d´ellas têem sido chamados a servir ou nomeados para aquella fiscalisação. = O deputado pelo circulo n.° l, José Malheiro Reymão.

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, me seja enviada com urgencia nota dos lanços de estradas mandados estudar pela direcção das obras publicas de Vianna do Castello, desde l de março a 30 de junho findos, e bem assim nota dos trabalhos, da construcção man-

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SESSÃO N.° 11 DE 10 DE JULHO DE 1897 153

dada iniciar por aquella direcção dentro do mesmo periodo e dotações designadas para esses trabalhos. = O deputado pelo circulo n.° l, José Malheiro Reymão.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Discussão do seguinte projecto de lei n.º 8

Senhores: - A vossa commissão de marinha, tendo examinado a proposta de lei n.° 6-H, fixando o numero de praças e o numero e qualidade de navios que devem constituir a força naval no anno economico de 1897-1898, é de parecer que ella merece a vossa approvação e deve ser convertida no seguinte projecto de lei

Artigo 1.º A força naval para o anno economico de 1897-1898 é fixada em 4:856 praças, distribuidas por l cruzador, l corveta couraçada, 4 corvetas, 20 canhoneiras, 19 lanchas-canhoneiros, 2 lanchas, 4 transportes, l rebocador, 2 vapores, l barca, 5 navios-esoolas e l escola de torpedos.

Art. 2.° O numero e a qualidade dos navios armados poderá variar, segundo o exigir a conveniencia do serviço, comtanto que a despeza não exceda a que for votada para a força que se auctorisa.

Art. 3.° Fica revegada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de marinha, 5 de julho de 1897. = José Estevão de Moraes Sarmento = José Bento Ferreira de Almeida (com declarações) = Francisco Felisberto Dias Costa = João Catanho de Menezes = Carlos Augusto Ferreira = Visconde de Silves = José M. de Alpoim = Henrique de Carvalho Kendall, relator = Tem voto do sr. Leopoldo Mourão.

N.º 16-H

Artigo 1.° A força naval para o anno economico de 1897-1898 é fixada em 4:856 praças, distribuidas por l cruzador, l corveta couraçada, 4 corvetas, 20 canhoneiras, 19 lanchas-canhoneiras, 2 lanchas, 4 transportes, l rebocador, 2 vapores, l barca, 5 navios-escolas e l escola bo torpedos.

de Art. 2.º O numero e a qualidade dos navios armados poderá variar segundo o exigir a conveniencia do serviço, comtanto que a despeza não exceda a que for votada para a força que se auctorisa.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d´estado dos negocios da marinha e ultramar, 30 de junho de 1897. = Henrique de Barros Gomes.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Ferreira de Almeida: - Sr. presidente, por dever do cargo, uso da palavra sobre o projecto em discussão, e digo «dever do cargo», por ter sido ministro
da marinha.

Antes de eu tomar conta da pasta da marinha em 1895, apresentei na sessão de 1894 um projecto de lei tendente a reorganisar as condições de construcção no nosso arsenal, construcções metallicas, e de navios modernos; e mencionava eu então n´esse projecto que a nossa força naval se deveria constituir de cruzadores de aço de não menos de 4:000 toneladas de deslocamento com 23 milhas de marcha na experiencia, no seu deslocamento normal, forrados de madeira e cobre, protegidos com couraça em abobada; com não menos de 10:000 milhas de raio de acção a 10 milhas de marcha por hora, com artilheria accommodada á sua tonelagem, manifestamente de 15 centimetros a principal, a mais geralmente adoptada e em maior numero, apparelhos para torpedos e metralhadoras.

Torpedeiros do typo Hornet e Hawock de 220 toneladas e 28 milhas de marcha, que n´essa epocha eram a ultima palavra sobre construcção d´esta especie de barcos: Torpedeiros de 1.ª classe de 70 toneladas e da maxima velocidade.

Canhoneiras coloniaes typo Cacongo de 280 toneladas.

Canhoneiras fluviaes de 40 toneladas em media.

Taes eram as minhas aspirações em 1894, que manter-se ao presente com os melhoramentos aconselhados pela experiencia e traduzidos para os cruzadores no typo Buenos Ayres, que é o Yoshino melhorado e forrado e para os torpedeiros nos destroyers de 300 toneladas e 30 milhas de marcha.

Quando ministro fiz todas as diligencias directas e indirectas para executar aquelle projecto. Infelizmente não o consegui, e pensei então, que o que mais interessava ao paiz, seria fazer por conta propria um novo arsenal, aproveitando para este fim estudos de uma commissão que indicavam que, o novo arsenal, para as necessidades navaes do paiz, deveria ter 23 hectares, porque o actual, tendo apenas 7, não comportava as accomodações necessarias para as exigencias da nossa marinha.

Indicava a commissão que o novo arsenal, deveria montar-se na outra banda do Tejo em seguida e para o sul do pontal de Cacilhas.

Uma tal obra daria á cidade de Lisboa alem das vantagens de caracter politico a que me referi na camara em 1896, o desafogo de que ella carece na passagem estreita e estrangulada da rua do Arsenal, transformando o recinto d´este em praças e ruas largas com passagens por meio de arcarias para o Terreiro do Paço e Pelourinho, a exemplo do que existe em muitas cidades estrangeiras.

Isto vem incidentalmente e não se liga com a força naval, mas serve apenas para em parte responder ao sr. ministro da marinha nas referencias que fez sobre a necessidade de se tentar alguma cousa com alcance pratico. O seu a seu dono.

Como disse, não tive tempo de tornar viavel este plano e tambem não tive occasião de poder fazer acquisição de alguns navios construidos no estrangeiro, para de momento acudir ás urgentes necessidades da marinha de guerra, na substituição do seu material, mas dando-lhe navios de combate e não material de parada, só para trazer contente as mal entendidas ambições de alguns com uns naviosinhos de todos os tamanhos, em que desde o guarda marinha até ao almirante desfrutassem as regalias e proventos do commando.

Para isso não nasci eu.

N´esta ingrata tarefa de combater uma tal orientação, e o espirito de rotina que procura preponderar, ponho de parte todas as malquerenças que possa despertar, diante da idéa de defender os interesses da nação.

Não pareça a v. exa. e á camara que este cancro da tradição, de nepotismo do dulce far niente, da resistencia a toda a innovação, é peculiar só a Portugal; não é, tem a sua preponderancia, maior ou maior, em todas as nações; e para v. exas. verem que esta affirmação é exacta e não acharem extraordinarias as minhas apreciações, ou não parecer que ellas são dictadas por um espirito de má vontade, vou ler os trechos de um pequeno folheto de um official da marinha franceza e de Eduardo Lockroi, ministro da marinha em França, em 1896, confirmando o que eu acabo de dizer e cujos conceitos applico a Portugal. Não faço mais citações porque seria longo e fatigaria a attenção da camara.

Diz o commandante Destellant n´um folheto de recente data, que a tradição impera em França e abusa da ignorancia do parlamento sobre todas as questões navaes, tratando de lhe impor uma confiança que elles proprios não compartilham, e a pag. 31, diz:

«É preciso que o paiz se compenetre do perigo que corre em confiar a pasta da marinha a homens que não têem outra preoccupação senão a do seu interesse pessoal; a ministros capazes de acceitar toda a especie de compromissos e de todas as fraquezas, só para conservar a pasta, ocultando a verdade se a conhecem; ou confiando-a a inconscientes, que ignoram todas as exigencias do material naval de que depende a segurança e honra nacional.»

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Se algum dos meus collegas tiver duvidas sobre a traducção do trecho que acabo de ler, aqui fica o folheto ás suas ordena.

Não sei se dou novidade á camara dizendo que Lockroi se occupou por muito tempo na camara franceza dos negociou da marinha.

Como paizano, não podia conhecer por si só as necessidades do regimen naval, e por isso acercou-se de individuos, que os ha tanto na corporação da armada franceza como na portuguesa, despidos do espirito de rotina, desejando todos os progressos e encarando as questões sob o ponto de vista ao interesse publico e não proprio.

Esses individuos foram auxiliares activos do ministro, fornecendo-lhe elementos de critica, de estudo e de analyse nas discussões parlamentares, e quando o partido a que elle pertencia subiu ao poder, foi nomeado ministra da marinha.

Chegado ao poder poz em execução tudo o que na camara sustentara como util e conveniente para a marinha francesa, como eu fiz, pois tendo estado doze annos a appreciar as questões de marinha no parlamento, quando recebi a pasta da marinha não fiz mais nem menos do que executar aquillo, que sustentei no parlamento como
util e conveniente para a administração publica n´esse ramo de serviço.

Lockroy fez reformas e economias, e só as do anno anterior promovidas por elle nas commissões e as que se seguiram montaram a 15 1/2 milhões de francos, alliviando ainda o orçamento naval de 21 milhões de francos, por posarem para o ministerio da guerra as tropas coloniaes.

Tambem eu as fiz immediatas em perto 100 contos, annulladas depois de mim a breve trecho.

Levou Lockroy tão longe a sua preoccupação de economias e de regimen, sem se importar se ía ferir as conezias tradicionaes de commando e outras commissões inuteis, só traduzidas em encargos para o paiz, que fez vender e riscar da lista do material uma porção enorme de navios.

A indicação respectiva vem a pag. 153 do notavel relatorio, e que passo a ler. (Leu.)

No epilogo d´este relatorio, que tem por titulo " A marinha de guerra", completa Leckroy a sua critica sobre o tradicionalismo francez, e bem assim aprecia os elementos que o favorecem.

Diz elle: na classe naval impera o espirito de opposição e critica, dominando uma orientação contraria a qualquer innovação.

A tendencia geral é para o quietismo e favoritismo, que dá força ás cotteries tradicionalistas.

A reacção maritima, refere elle a pag. 372, é restricta, restricta, quanto ao numero; é poderosa, porém, poios suas relações, pela sua situação preponderante, pelas dependencias e pelo poder de que desfructa.

"Tem a seu serviço os clubs, tão influentes ao presente, uma parte da imprensa, os homens politicos que desejam sinceramente a paz, o que é louvavel, mas que imaginam que o melhor modo de a garantir, consiste em não preparar a defeza, o que é absurdo; os que se contentam com as apparencias e declarações officiaes, os pretendentes a ministros, que naturalmente se fazem defensores do atatu quo os conservadores republicanos que por aquelle titulo se julgam obrigados a conservar os abusos; emfim, alguns escriptores collocados em condições criticas e que para se sustentarem ou salvarem têem necessidade de altas protecções.

E desenvolvendo eu largo rol a má administração que o tradicionalismo tem mantido em França, dizendo que o seu imperio seria desculpavel sem taes erros e abusos, conclua:

"E esses escriptores inqualificaveis (déclassés), os optimistas por vocação uns, outros por calculo, os servidores systematicos de todas as auctoridades e de todas as influencias, serviram só para embaraçar as reformas ou para conservar instituições inuteis."

"Alguns srs. professores da escola naval, tambem têem trazido assolados contra mim e muito callados com o sr. Barros Gomes varios jornaes jacobinos, de que são mais ou menos associados, á espera de apanhar a reintegração nas suas cadeiras como vitalicios.

Não pude fazer quanto desejei, porque não tive tempo, harcelé por toda essa tropa de que falla Lockroy, cuja critica e descripção se adapta perfeitamente ao nosso meio.

Crearam-me toda a sorte de embaraços, chegando a pôr em sobresalto os meus collegas do ministerio, receiando que a campanha podésse determinar qualquer abalo grave, e todos estes elementos protectores do tradicionalismo, do dulce far niente e do nepotismo, fizeram com que eu, apesar de estar dez mezes no ministerio da marinha, cheio de fadigas o de cuidados por causa das guerras em quasi todas as colonias, que consegui deixar pacificadas, não podesse effectuar algumas modificações importantes.

Digo isto para que o sr. ministro, na resposta que porventura queira dar-me, não faça esta natural observação:

"Você, que já lá esteve, porque o não fez?"

Não fiz, é verdade, porque não pude, não tive tempo, não me deixaram fazer.

Mas isso não quer dizer que eu não possa analysar o estado das cousas, sem que todavia isto represente uma critica ao ministro que actualmente gere a pasta, mas apenas a manifestação dos meus bons desejos sobre a materia em discussão e um desafogo, emfim, de quem tem paixão pelo metiér, e sem a pretensão de ser inspirador de s. exa. mas tão somente com o intuito de animal-o para ver se consegue fazer o que eu não fiz, melhor ou peior, com mais ou menos modificações, conforme ao espirito de s. exa. se afigurar util.

Para se ver como impera o espirito de tradição, bastará dizer que antes de mim dois officiaes de marinha que occuparam a pasta, mantiveram a orientação tradicionalista, um na parte que diz respeito á aceleração da promoção, outro pretendendo organisar o material com muitos navios, perfeitamente inuteis para combate.

Por tal fórma está arreigada esta orientação, que na auctorisação ultimamente dada pelo parlamento para a acquisição de novos navios, foram os typos determinados por consulta de chamadas commissões technicas, que mui forçadamente deixaram que se fizesse apenas um cruzador de alguma importancia, e cuja velocidade se for como se diz, de 23 milhas e de largo raio de acção, constituirá um bom typo de combate.

Nada conheço sobre as novas acquisições, apesar de ter pedido em 1896 os documentos respectivos; não m´os mandaram, e ainda agora não m´os enviam: o sr. ministro diz naturalmente o mesmo que disse na camara dos dignos pares, "que não têm pessoal para isso; desculpe-me s. exa. dizer-lhe que o enganaram; quando eu fui ministro não me me faltou pessoal, o que é preciso o fazel-o trabalhar, não tolerando nem consentindo o espirito de rotina e de dulce far niente de que falla Lockroi.

A mim nunca me faltou pessoal, nem mesmo por occasião das expedições coloniaes; não e por falta de pessoal que os documentos não vem, é porque não querem que esses curiosos trabalhos appareçam.

No uso das auctorisações parlamentares contrataram-se dois cruzadores de 1:800 toneladas e 15 milhas de marcha, e se eu tiver vida e saude, quando vier á discussão o projecto do cruzador de 1:660 toneladas, já denominado D. Amelia, hei de demonstrar com mappas e estatisticas comparadas, de diversas marinhas, que ninguem faz navios d´esses como navios de combate.

Doe-me o coração, ver o estado do material no pé em que está, e mais ainda por ver o espirito de rotina, de

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tradição e do tal dulce far niente, como diz Lockroi e que eu confirmo, malbaratar os recursos da patria.

Doe-me o coração, repito, porque, sendo o nosso paiz pobre e pequeno, em vez de procurarmos ter bom material naval, ainda que pouco, mas optimo, se compram navios de parada, que servem apenas para satisfazer ta pretenciosas vaidades de commando.

A força naval menciona o mesmo numero de praças da proposta do ministerio anterior; e ambas augmentam em algumas centenas de praças a força naval de 1896 a 1896.

Não ha muita rasão, não a houve então, e não a ha agora para este augmento, uma, porém, póde desculpal-o, e vem a ser a baixa nos efectivos provenientes das remissões não preenchidas por novos recrutas, precisando-se, portanto, de um contingente maior para essa eventualidade por não se poder chamar o contingente sento fixado por lei, muito embora depois no effectivo seja menor do que a mesma lei marca.

Mas no material ha uma cousa curiosa para mim.

Um dos navios que se inclue no armamento é um cruzador.

Tinha o exmo. ministro promettido ha cinco dias mandar-me um mappa com todos os detalhes, não o recebi nem o encontrei na mesa onde no principio da sessão o procurei.

Vejo por aqui como as ordens do sr. ministro se cumprem: não tendo o referido mappa, fui forçado a recorrer a um documento official, publicado e louvado.

Este processo dos louvores está muito, em uso pelos tradicionalistas do dulce far niente, etc., etc., para dar força á cotterie, para se popularisar, crear amigos, etc., etc.

Procuro na lista da armada o tal cruzador, e não o encontro!

Presumo que deve ser o Adamastor.

Mas para notar é, que tendo sido este barco mandado incluir no material naval, por portaria de 10 de março de 1895, que foi publicada na ordem da armada n.° 9 d´esse anno, não apparece inscripto, nem na lista de 1896, nem na de 1897.

Já agora incidentalmente apresentarei outra curiosidade.

A canhoneira D. Luiz, que foi lançada ao mar em 1896 apparece na lista de 1897 só com o nome, sem indicação alguma, nem da sua grandeza, nem da sua tonelagem, nem do seu armamento.

Encontro ainda na mesma lista da armada outra curiosidade, quando trata da situação dos navios ha uns poucos sem indicação alguma.

Ora, apesar da vetustez da maioria d´elles, ainda não devem ser lançados á categoria da nau Catherineta, que vogava sem destino por esses mares fóra

Ainda n´essa lista, cuja organisação teve louvor já na gerencia de que s. exa. tem a responsabilidade, apparecem officiaes inscriptos sem se saber quando nasceram, como é por exemplo, nem mais nem menos, o sr. conselheiro Custodio Borja, que toda a gente conhece em Lisboa. (Biso.)

Dos navios comprados velhos para fortalecer o nosso material velhissimo só figura um na lista, sem se saber onde para, mas sem tonelagem, nem indicação de especie alguma, apesar de se encontrarem os detalhes precisos no registos dos Loyds, e que eu tenho aqui; o outro fundeado em Lisboa nem à lista o menciona, talvez por vergonha; (Riso.)

Faço estas referencias para justificar o que ha pouco disse sobre o tradicionalismo da armada, que trata de crear as suas popularidades e, portanto, os correspondentes antagonismos commigo por ser eu o demolidor de um passado de desacertos.

Com aquella orientação teve o compilador da lista o seguinte louvor;

"Tendo já sido publicada no corrente mez a lista da armada, referida a 31 de dezembro de 1896, e que representa uma consideravel antecipação em relação á epocha em que tem sido costume publicar identicos trabalhos em annos anteriores, antecipação duvida aos esforços empregados pelo primeiro tenente, etc., louva o mencionado official pelo zêlo e dedicação com que se houve no desempenho do serviço que lhe foi commettido."

Saíu a lista em março de 1897.

Ora o governo fechando a camara em principios de fevereiro deixou a imprensa nacional desembaraçada para outros trabalhos a louvar-se alguem devia então ser o pessoal da imprensa: mas este louvor ridiculo é no fim de contas uma censura aos officiaes que anteriormente tiveram a seu cargo o mesmo trabalho e que não conseguiram tiral-o da imprensa pelos afazeres d´esta com as camaras abertas.

Aqui tem v. exa. um exemplo do nepotismo e do tradicionalismo entre nós. Podia citar outros exemplos que me justificavam por ter applicado os conceitos de Lockroi ao nosso meio.

Imagino que v. exa. não leva a mal que continue n´estas referencias fóra da materia, mas caracteristicas, alem de que eu hei acabar dentro da hora.

V. exa. quer dizer-me quanto tempo falta?

O sr. Presidente: - V. exa. ainda tem vinte minutos.

O Orador: - O caso é o seguinte.

Imagine v. exa. que mandei umas sessenta peças de artilheria para as colonias, e d´estas uma meia duzia para a ilha do Principe.

O governador ali, official de marinha, desfructava uma gratificação, sem fundamento legal, a titulo do director das obras publicas. Cortei-lh´a.

São necessarios estes pormenores para melhor apreciar os factos que vou narrar, e que significara que só se pensa em apanhar muito dinheiro ao thesouro e fazer o menos possivel.

Cada peça de artilheria pesa tonelada e meia, cousa que o governador devia saber como official de marinha e consta de tabellas, e o governador, que não estava para se incommodar e naturalmente irritado pelo córte da gratificação illegal mandou effectuar o desembarque com um um guindaste que tinha na ponte da alfandega que elle sabia que pegava apenas n´uma tonelada. É claro que o guindaste partiu.

É elementar que com duas vergonteas e um apparelho que lhe podia fornecer o transporte India, que levava a artilheria, teria feito uma cabrilha para o desembarque do material; a cabrilha podia ter de cabeça umas plumas para o mar dadas a ancorotes e outras para terra, e tendo alem d´isso uma certa inclinação de cabeça para o mar facil era fazer galgar as peças com uma retinida, a borda da embarcação, arriando-as sobre uma zorra ou sobre dois paus, rolando-as por meio de cabos pelo seio até chegarem a terreno enxuto.

É necessario explicar a simplicidade do caso, que todos comprehendem, sem serem engenheiros, architectas ou mestres de obras para ver até onde pode chegar a ignorancia audaciosa ou a negligencia propositada.

Pois como o guindaste partisse não se quiz encommodar e devolveu a artilheria!

Como eu não gostava de demoras, perguntei pelo telegrapho porque não tinha desembarcado a artilheria. Respondeu porque tendo empregado um guincho, que tinha na ponte da alfandega, que pegava só n´uma tonelada, se partira.

Respondi: "Demittido e pague o guincho". (Riso.)

V. exas. riem; pois querem saber o que se fez depois, no imperio da tal tradição de nepotismo e dulce far niente?

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Foi reintegrado o condecorado !! (Riso.)

Isto não vem muito a proposito de força naval; mas v. exas. hão de ver que é de força para o caso e justificativo em relação ao facto de eu dizer que impera a negligencia, o dulce far niente, o tradicionalismo e a opposição a tudo que é innovação e economia nas despesas publicas não justificadas, etc., etc.

Ora, sr. presidente, ou diria ao exmo. ministro que se dispozesse a ter um pouco menos de coração e mais nervo.

S. exa. disse aqui ha dias que para a administração publica não póde imperar aquelle e, portanto, menos coração, menos preocupação de ser adulado e mais regimen. (Apoiados.)

Figura na força naval ainda a Bartholomeu, Dias, uma veterana, pois veiu para a armada no anno da graça de 1858, tendo, pois, trinta e nove annos, o que para navios já é uma boa conta.

Acresce, porém, que em 1895, quando eu era ministro, estava no estado que vou mostrar á camara, pela participação do respectivo commandante.

Diz elle:

"Segundo a opinião dos mergulhadores, o navio tem a pôpa nas obras vivas má, as tábuas do fundo podres nos topos, e parecendo alluidas, as tábuas do resbordo atacadas em parte de podridão e as costuras abertas e sem calafeto!

"É manifesto o seu alquebramento e a agua que faz pela tem augmentado, não obstante achar-se o navio fundeado em aguas socegadas.

"Caldeiras velhas cansadas, não podendo trabalhar com mais de 10 libras de pressão.

"As bombas reaes não estão de confiança."

Tal era o bello estado d´este velho navio, fazendo mais de 24 pollegadas de agua por dia. Uma canastra. (Riso.)

Não se denunciava ainda então o seu estado doentio, mas ou sabia que as suas condições hygienicas não eram boas, mas não tão más como mais tarde se revelaram, já depois da minha saída do ministerio.

Tive tambem, por consideração de classe, a fraqueza de não dar uma ordem de completo desarmamento, determinando apenas a passagem a meio armamento, o que importava uma grande reducção do pessoal do navio, segundo a sua lotação, para dar tempo, ao official que lá estava commandando, e que tem uma larga folha de serviço de embarque, a completar o tirocinio de embarque para o posto immediato.

Em grande numero de casos, este tirocinio traduz-se em ir o official commodamente n´um paquete até á colonia onde está o navio a que o official é destinado, muitas vezes o navio já innavegavel e até pontão, metter-se o official a bordo, conservar-se por lá seis mezes ou um anno, e voltar outra vez de paquete, mais gordo por causa da inchação do figado, é claro, e não do dulce far niente. (Riso.)

Quiz acabar com este systema de tirocinio, mas encontrei as taes resistencias do trudicionalismo, que me impediram de decretar a reforma dos quadros, de grande alcance para a classe e para o serviço, e onde não inclui desde logo o preceito de embarque navegando, para não levantar mais resistencias.

Chorava o tradicionalismo que se perdia um commando com a condemnação da Bartholomeu Dias! E que commando !

E a velha corveta, que fazia, fundeada, mais de 24 polegadas de agua em vinte e quatro horas, com as caldeiras velhas, não havendo confiança nas bombas, foi tornada a armar pela influencia da tradição, como em França.

O que eu pedia ao illustre ministro era que esta corveta fosse eliminada do numero dos taes navios para se acabar com ella de uma vez. Pedia mais, pois segundo as informações que tenho o navio está n´um tal estado de infecção, que é perigosissimo fazer n´elle qualquer trabalho com o fim de o alliviar para ser reparado e aproveitado como pontão: pedia que conservando todo o recheio de podridão, que contém, s. exa. o mande rebocar para fóra do porto de Loanda e mettel-o a pique, servindo de alvo á artilharia de qualquer dos outros navios da estação se os ha em condições de supportar tal abalo.

Foi para Loanda ha pouco tempo a Rainha de Portugal que estava garantida por quatorze annos quando comprada e que em Moçambique ninguem queria navegar n´ella!

Tem hoje este navio vinte e um annos, tendo portanto excedido de ha muito o tampo de garantia.

Quando ministro cuidei de desarmar varios navios para os aproveitar como pontões depositos do que resultaria grande economia para a fazenda, e obedeceu a essa orientação a ida do India para Angola, comboiado, por inspirar pouca confiança; pois fizeram-n´o regressar a Lisboa e foi mandado para Moçambique só, e com risco de esbarrar no cabo Guardafui com a monsão contraria de SW.

A distribuição que me propuz fazer era a seguinte:

A Ave na Guiné, e India em Loanda, a Burtholomeu Dias, então não dada por contaminada, para Mossamedes, a barca Cabinda na bahia dos Tigres, a Rainha de Portugal em Moçambique, e um barco de véla, que me propunha mandar comprar, carregado de carvão, para Lourenço Marques.

O tradicionalismo alterou tudo isto; eram commissões de commando e outras que se perdiam.

Lockroy vendeu, desarmou, distribuiu para serviço especial das colonias e deixou pendente de irradiação da lista do material naval francez perto de oitenta navios comprehendendo torpedeiros.

O nosso material fluctuante nem ao menos merece o nome de navios de parada como em França denominam alguns navios ainda armados e só de aspecto exterior, sem efficiencia alguma naval. Entretanto, o Vasco da Gama, depois de jazer no Tejo, quasi ininterruptamente, desde 1876, em que foi adquirido, tendo apenas feito algumas viagens á pittoresca avenida do Mediterraneo para que apenas, se dizia, elle tinha capacidade, foi enviado a India, n´uma "missão militar longa e por todos os competentes julgada arriscada e impropria dos fins a que o navio fôra destinado"; assim o diz no seu relatorio o commandante que fez a viagem, acrescentando, que "a opinião mais geralmente seguida na corporação, era que só por milagre da fortuna, o navio poderia desempenhar a commissão que lhe estava commettida".

Contra todas estas indicações dos suppostos entendidos, contra a descompostura e tetricas prophecias dos jornaes, contra a surda intriga que chegou a causar impressão no animo dos meus collegas do ministerio, o Vasco da Gama foi á India, e sendo um navio em que o panno não lhe dá seguimento nem governo mesmo com vento duro, como informa o conselheiro Ferreira do Amaral no seu relatorio de viagem a Tanger, tendo portanto tão sómente nas suas duas helices os meios de acção, foz a viagem de Suez a Bombaim com uma só helice em quinze dias incompletos, percorrendo perto de 3:000 milhas, como affirma o commandante no seu relatorio quando diz que achegara a Bombaim com vinte o sete dias de navegação apesar de ter feito mais de metade da travessia só com uma das machinas".

Quando ordenei a partida do Vasco da Gama estudei a exequibilidade da viagem e seguro do meu estudo, que os factos se encarregaram de confirmar por demais, pois que até com avaria não reparada se fez a viagem, não hesitei em fazer seguir o navio dando-lhe todas as providencias para poder chegar ao seu termo e servir, para desalojar os revoltosos da fortaleza da Aguada na eventualidade possivel de se terem apoderado d´ella, pois que a esse tempo Pangim já tratava de defender-se com barricadas.

Esta viagem do Vasco da Gama com uma só helice, desde Suez a Bombaim tendo meios do reparação em Suez,

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onde a avaria se deu, provou de mais, e provou tambem outras cousas que não são para agora analysar.

De então para cá quebrou-se a lenda e lá foi para Angola a impor-se á Allemanha!!

Para affirmar e fazer valer á nossa força perante os revoltosos da India e os Ranes, vá; mas perante os allemães e na bahia dos Tigres francamente o caso é irrisorio.

Agora foi para Inglaterra, e como que desacanhando-se entrou n´uma roda viva.

E por agora, como navio de parada não ha mau nada.

Salvo quando vier o Adamastor, e isto se a commissão da subscripção nacional der licença.

Ia-me esquecendo os dois Peros, estylo antigo - o Pero Nunes e o Pero de Alemquer, dois navios que já não serviam ao commercio, porque se estivessem bons, claro está que os não vendia, e que vieram reforçar o já tão decrepito material, da nossa marinha, tendo cada um mais de vinte e oito annos.

Só um d´elles figura na lista; e bem podia um ser aproveitado para ir levar carvão para Angola, ficando depois lá para servir de deposito d´este combustivel e de pessoal.

Entrando na apreciação da força naval o que quiz foi tornar patente ao parlamento as condições em que se encontra o material naval.

Quando tiver occasião de trocar explicações com sr. ministro da marinha a respeito da ida do Africa a Livorno, a camara ha de ter mais um exemplo demonstrativo dos conceitos do Lokroy ao nosso meio.

Sem querer impugnar a força naval apresentada em numeros que só justificam e desculpam n´este estado decadente em que tudo está, desculpe-me v. exa. e a camara se me alarguei em considerações a respeito das quaes os que me querem indispor com a coterie da tradição, dirão que foi uma zurzidella.

Não tenho disposições para isso; o que quiz foi revelar ao parlamento o estado de decadencia da cousa publica n´este ramo de serviço, para que os ministros presentes, os passados quando voltarem e os futuros, se não deixem facilmente arrastar por cantos de sereia e falsas orientações com que muitas vezes se pretende abalar e até fazer uma especie de politica de classe.

Cada um só cuida do seu dulce far niente. É por isso que isto continua n´este estado decadente, custando muitos mil coutos, tanto pela administração da marinha como pela do ultramar, não tendo um só navio que possa chamar-se de guerra, quando na lista da armada figuram cincoenta e tantos, e ainda não contendo todos porque se não mencionam os torpedeiros, quando estes ainda que minusculos e do antigo padrão podem, com alguma protecção, ser elementos do combate.

Concluo por ter corrido a hora regulamentar.

O sr. Ministro da Marinha (Barros Gomes):- A camara acaba de ouvir o illustre deputado sr. Ferreira de Almeida, S. exa. não impugnou o projecto, tratou o governo com benevolencia e appellou para o que desejaria ver em mim - um espirito reformador que pozesse termo a actos impregnados de espirito, rotineiro, podendo, n´esta conformidade, continuar a assignalar a marcha da administração naval; e assim confia em que o governo alguma cousa fará.

Ora, não impugnando s. exa. o projecto, a minha resposta é muito succinta.

Infelizmente para Portugal, o que se passa entre nós não se póde comparar com o que só passa em França.

Ali, com relação a um ministro, que se não é competente, por não ser da especialidade, tal deve ser considerado pelo talento e pelo valor dos pessoas com quem se aconselhou, a critica póde exercer-se livremente, porque no thesouro, nos brios e no patriotismo d´essa nação, que não se recusa a sacrificios, ha os meios do pôr um termo, um dique a todas as irregularidades, á rotina; mas entre nós não succede assim, e eu faço justiça a s. exa., porque
não quero crer que um official da marinha portuguesa realisasse essa critica bastante acerba, não sendo movido pelo nobre impulso de querer melhorar a nossa administração naval.

Em todas as nações do mundo, que estão á frente do movimento naval, haja vista a Inglaterra, onde o espirito de rotina tem sido criticado e mesmo assignalado por actos que até chegaram a deslustrar, todas as dificuldades se vencem; mas, entre nós, com falta de recursos e escassos meios, não admira que não possamos ir tão longe quanto seria para desejar e quanto o illustre deputado, pelo seu zêlo pela marinha nacional e pela sua gloria, queria alcançar, levando os seus camaradas a que vencessem, por um esforço heroico, as maiores difficuldades que nos cercam.

É certo que temos navios velhos, e que aquelles que deviam ter uma vida de quatorze annos, como a corveta Rainha de Portugal, têem já vinte e mais; tambem é certo que o Africa podia e devia ser transformado em pontão; mas devo dizer, repito, que n´esses navios velhos é que muitas vezes, com risco de vida, os nossos officiaes vão promptamente, sem a minima reluctancia, cumprir as ordens que recebem em serviço da nação. (Apoiados.)

Ainda ha pouco, tendo dispersa pelo oriente e por Moçambique e Angola a pouca força naval da que podiamos dispor, e precisando de uma canhoneira para ir immediatamente á Guiné, evitando assim que mais uma expedição militar se organisasse para operar n´aquella, para nós, tão terrivel e tão dispendiosa guerra, promptamente encontrei navio que se prestasse a essa commissão de serviço, porque, tendo mandado que a Rio Ave, estacionada em Cabo Verde....

O sr. Ferreira de Almeida: - Se v. exa. me dá licença que o interrompo, dir-lhe-hei, que é verdade o que acaba de dizer; têem saído navios velhos com officiaes, que encarando o perigo, só pensam em cumprir o seu dever sem se insurgirem contra as ordens que recebem; mas alguns ha que se insurgem, sendo necessario obrigal-os e dizer-lhes: "ou parte, ou demitto-o".

O Orador: - V. exa., que tem qualidades de energia que todos lhe reconhecem, teve necessidade de empregal-a para fazer respeitar as suas ordens, e deu-as, tomando d´ellas completa responsabilidade, desde que conhecia o estado dos navios; mas eu é que declaro aqui bem alto, que nas diversas occasiões em que tenho tido a honra de gerir a pasta da marinha, nunca soffri o desgosto de ver desrespeitada qualquer ordem de serviço, nunca me foi necessario empregar essa energia, porque nunca dei uma ordem que não fosse prompta e briosamente obedecida. (Apoiados.),

Mas dizia eu, que ao momento em que não dispunha de navios, ordenei á Rio Ave que apressasse os tristes e magros concertos que estava realisando em Cabo Verde, para partir logo para a Guiné. E partia, e a sua presença ali foi um alto apoio moral, pelo menos, para o governador d´aquella possessão. (Apoiados.)

E a proposito de navios velhos, direi que, por exemplo, temos a Tejo, que n´este momento está em Goa, em condições taes, que se hesita, se será possivel, com alguns concertos em Bombaim, regressar a Portugal.

Veja v. exa. as tristes condições em que se encontra a nossa armada !

Ultimamente, o illustre deputado, quando ministro, desejou fazer alguma cousa em seu proveito, mas não teve tempo de o realisar; do contrario estou certo, que não sairia do governo sem ter tomado providencias que melhorassem consideravelmente as condições da nossa força naval.

Os successores de s. exa. animados do mesmo desejo procuraram o meio de levantar a nossa marinha da guerra, com os poucos recursos de que se póde dispor, não para intimidar a Allemanha, nem a França, nem nenhuma outra nação, mas para poder apresentar-se nas nossas

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colonias e dar perante os indigenas um signal da nossa força, o que é como que um apoio moral aos governadores que tantas vezes se vêem privados d´elle.

Ora, n´estas condições, é que esta pobre marinha, velha e quasi condemnada, e que n´uma nação rica, nem mais um instante, continuaria a ser empregada em qualquer commissão, tem prestado ao paiz altos serviços, que seria injustiça deixar de registar.

A corporação da armada é tão briosa, tem atraz de si tantas tradições que, n´este momento, embora perante um official de marinha, o qual de certo não quiz amesquinhal-a, mas antes, estimulal-a e levantal-a mais, eu como chefe que tenho a honra de ser, dos serviços d´essa corporação, pois que não a tenho igualmente de pertencer a essa nobre classe, não posso deixar de dizer, que nas differentes occasiões em que tenho gerido a pasta da marinha, em Zanzibar, em Tanger, em Moçambique e em todos os pontos onde se tem carecido dos seus serviços, elles foram sempre prestados rapidamente, com brio, dignidade e amor da patria. (Muitos apoiados. - Vozes: Muito bem.)

Ainda hoje se assignala a fórma por que em Moçambique as proprias tripulações dos navios da nossa marinha de guerra fraternisam com as forças de terra e têem contribuido para na victorias que se têem alcançado. (Apoiados.)

Repito, não ha aqui a minima intenção de censura, nem de critica para com o illustre deputado; fiz justiça ás suas intenções, acreditando que s. exa. o que apenas pretendia era estimular a corporação da armada, se porventura ella carecerão de estimulo. Creio bem que não teve nem podia ter outro pensamento.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. foi cumprimentado.)

(Não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ferreira de Almeida: - Eu não frisei os factos na interrupção que fiz a s. exa. o sr. ministro da marinha; e é necessario definil-os bem, para que as minhas palavras não possam ter interpretação diversa da que devem ter.

Apesar dos embaraços que tive com a guerra em quasi todas as colonias, pude dispor a tempo de material naval para todas as necessidades.

Podam d´este facto dar testemunho os meus collegas do ministerio, que se admiravam como um material naval que se dizia descadente podia fornecer navios para tantos serviços. Consegui até fazer com que n´um dia estivessem promptos a saír de Lisboa seis navios, e se não saíu o sexto, destinado aos Açores, foi porque o governador pediu o adiamento da partida. Esses seis navios representavam mais de 9:000 toneladas de deslocamento e perto de 700 homens; do tripulação, que tomaram diversos destinos. Não encontrei resistencias, mas os embaraços que resultam do tal dulce far niente, que nem todos têem, porque, como diz Lockroi, as cotterien tradicionalistas são de numero restricto, tiram a sua força das condições do meio e da occasião.

Passe a explicar o caso de ter feito sentir a um official que corria o risco da demissão do commando e de que o sr. ministro quiz tirar partido para exaltar o respeito pela sua auctoridade!

Como ministro, não ora obrigado, pelo facto de ser da pronto, a cuidar da maneira de se executar um determinado serviço; mas parque não desejava que se suppozesse, que por estar um pouco separado do serviço de horda, não teria a precisa orientação quanto á maneira de effectuar os serviços nunca foi dada uma ordem sem eu ter estudado a sua exequibilidade, não só para eu ter a firme idéa do alcance do que ordenava mas para ter plena consciencia dos factos no caso de embaraço ou resistencia.

Foi assim que mandando o couraçado á India estudei a viagem e ordenei todas as providencias precisas, como consta dos documentos da secretaria, por isso que, conforme disse o sr. Ferreira do Amaral no seu relatorio, a opinião da maioria da corporção, era que o couraçado não podia ir á India, e tonto pôde que foi com um só helice, como ha pouco disse.

Mas vamos ao coso. Quando reuni na India alguns navios, mandei para ali uns em viagem e outros das estações navaes, um foi a canhoneira Rio Lima, commandada por um habil official que pela sua modestia se não põe em evidencia.

N´esta referencia não se trata de um amigo, pois não tenho relações com esse official, o sr. Azeredo e Vasconcellos.

Estando em Aden de viagem de Moçambique para Lisboa teve que seguir para a India, e fez a viagem o mais correctamente possivel.

Pretendendo mandar de Moçambique um navio tombem para a India, mas sem diminuir o effectivo em numeros, mandei que a canhoneira Zaire, que estava em Loanda, partisse para Moçambique e a Dio, apenas ahi chegasse a Zaire, partisse immediatamente para a India.

Era a unico maneiro de evitar delongas e porque o Diu era do mais forças paro o oceano indico.

O commandante da Zaire respondia de Loanda que precisava de vinte dias para preparar o navio para partir!

Era o dulce far niente! Quando saíu de Lisboa recommendára muito o não mandassem para Moçambique, e pelo uso e costume contou-se que a ordem de serviço passasse a outro!

Respondi ou mandei responder, que ou partia ou era demittido! Partiu no fim de quatro dias! Se eu fosse o tyranno que me fazem, deveria tel-o castigado ou mettido em conselho de guerra por ter pretendido esquivar-se ao serviço. Não o fiz. É verdade que conquistei mais um inimigo, mas o serviço fez-se a tempo.

É certo que ha muita gente boa, na corporação da armada, como em todas as classes e categorias e regiões, para o que invoco até o testemunho do sr. ministro, que muito religioso, não ignora que até no céu houve um anjo mau!
(Leram-se e foram successivamente approvados os tres artigos do projecto.)

O sr. Dias Costa: - Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra sobre a proposta de lei n.° 8-H, fixando em 30:000 praças de pret, de todas as armas, o força do exercito em pé de paz, no anno economico de 1897-1898.

Foi a imprimir.

O sr. José Marta de Alpoim: - Mando paro a mesa o parecer da commissão de marinho, sobre a renovação de iniciativa do projecto de lei n.º 1-C, apresentado na sessão de 15 de janeiro de 1897, auctorisando o governo a applicar ás despezas do cruzador de aço D. Amelia, em construcção no arsenal de marinho, o saldo que ficar da quantia de 2:800 contos de réis, destinado por corta de lei de 21 de maio de 1896 á acquisição de navios de guerra, e o excedente do emprestimo realisado nos termos da carta de lei, tambem de 21 de maio de 1896, sobre aquella importancia.

Foi enviado á commissão de fazenda.

ORDEM DO DIA

Eleição de commissões

O sr. Presidente: - Vae-se proceder á eleição da commissão de negocios externos. Convido os srs. deputados a formularem as suas listas.

Fez-se a chamada.

O sr. Presidente: - Convido para escrutinadores os srs. Carlos Ferreira e Libanio Fialho Gomes.

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SESSÃO N.º 11 DE 10 DE JULHO DE 1897 159

Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna 46 listas, saíndo eleitos os srs.:

Conde de Alto Mearim, com................ 45 votos

Francisco Dias Costa...................... 45 "

João Franco Castello Branco................ 45 "

José Correia de Sarros.................... 45 "

José Dias Ferreira....................... 40 "

José Frederico Laranjo..................... 45 "

José Maria de Alpoim..................... 45 "

Leopoldo de Oliveira Mourão................ 45 "

Visconde de Melicio......................... 45 "

O sr. Presidente: - Convido os srs. deputados a formularem as suas listas para a eleição da commissão de redacção.

(Pausa.)

Fez-se a chamada.

O sr. Presidente: - Convido para escrutinadores os srs. Lacerda Ravasco e Fialho Gomes.

Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna 44 listas, saíndo eleitos os srs.:

Tavares Festas, com....................... 44 votos

Fialho Gomes...........................44 "

Correia de Bairros......................... 44 "

Rodrigues dos Santos...................... 44 "

Luiz José Dias........................... 44 "

O sr. Presidente: - Verifica-se não haver numero na sala.

Tenho a declarar á camara que Sua Magestade El-Rei receberá na segunda feira, ás duas horas da tarde, a deputação que lhe ha de apresentar a resposta ao discurso da corôa.

A primeira sessão é na segunda feira.

Na primeira parte da ordem do dia entrará em discussão o parecer que conclue pela annullação das eleições dos srs. deputados que não foram sorteados; e, na segunda parte, proceder-se-ha á eleição de commissões.

Cumpre-me ainda declarar, que o digno par, o sr. Jardim, enviou para esta camara alguns exemplares do seu projecto sobre fomento militar agricola. Não sei se chegarão para todos os srs. deputados; entretanto, far-se-ha a distribuição até onde chegarem.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e vinte e cinco minutos da tarde.

Documentos apresentados n´esta sessão

Representação

Dos proprietarios das povoações denominadas do Pharol e do Forte, na barra do Aveiro, pedindo que seja modificada a antiga linha que divide as duas povoações de modo que fiquem comprehendidas no concelho de Ilhavo as mesmas povoações.

Apresentada pelo sr. deputado Mattoso Côrte Real, e enviada ás commissões de administração publica e fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

Justificação de falta

Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado D. José Gil de Borja Macedo e Meneses não compareceu á sessão de hoje, nem poderá comparecer ás sessões seguintes, por incommodo de saude. = Pereira dos Santos.
Para a acta.

O redactor = Lopes Vieira.

Página 160

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