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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Isto vem a proposito do que são obras publicas, não só na provincia de Traz os Montes, como no paiz. Fazem-se obras publicas por influencias eleitoraes e não por attender aos interesses dos povos!
Uma voz: — Então o que quer?
O Orador: — Pergunta o meu collega o que quero? Eu lhe respondo. Quero que o governo cumpra com o seu dever, quero que se dê á provincia de Traz os Montes o que se lhe deve, porque paga ha muitos annos para as estradas que não se lhes tem dado até hoje. Para soldados e para tributos serve; para se dotar com melhoramentos não serve.
Uma voz: — E muito montanhosa.
O Orador: — Não é por ser montanhosa, como diz o illustre deputado, nem ser difficil de construir as estradas na provincia de Traz os Montes; e, como já disse, porque não passeiam por lá os homens influentes d'este paiz e que determinam as cousas n'este grande mundo... Por lá só andam os pequeninos; mas são pequeninos que têem muita força e que é preciso respeita-los, porque têem direito como têem os outros.
A provincia do Minho e a da Extremadura está coberta de estradas; a provincia de Traz os Montes não tem nenhuma, porque uma de dez leguas, e que começou ha vinte annos, ainda não está acabada. E não tenho rasão? Tenho, ainda que alguem diga que não.
Ha quinze annos que está para se construir a estrada de Chaves a Fezes, que são sete kilometros, e não sei ainda quando se construirá. E é uma estrada determinada por um tratado entre o governo portuguez e o hespanhol, ha quinze annos!
O caminho de ferro de Lisboa ao Porto fez-se em bem menos tempo, e já está em tal estado, que ha de acabar primeiro do que as estradas de Traz os Montes se hão de construir; pelo menos as pontes vão abatendo, e a madeira podre com difficuldade se substitue.
Concluo por chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas sobre este assumpto. S. ex.ª, como ministro e como oriundo d'aquella provincia, deve prestar-lhe toda a sua attenção, e é de esperar que lh'a preste.
Como estou com a palavra, ainda direi mais alguma cousa, para mostrar a v. ex.ª e á camara como seguem as cousas n'aquella provincia, e como se presta consideração aos negocios e interesses d'ella.
As camaras municipaes do districto de Villa Real, senão todas, parte d'ellas representaram ao governo sobre a necessidade urgente de estabelecer uma mala-posta entre o Porto e Chaves, representações que vieram por minha intervenção e do illustre deputado que representa aquelle districto. Empreguei os esforços que estavam ao meu alcance, para ver se obtinha que se estabelecesse a referida mala-posta, porque ninguem ignora o interesse que d'aquelle serviço postal podia resultar, não só ao estado, mas tambem aos povos em especial.
Mandou-se pôr a concurso o serviço da mala-posta, pela primeira, segunda e terceira vez, e não se adjudicou, porque o governo não está resolvido a fazer aquelle augmento de despeza, que podia montar a 1:800$000 réis; mas o governo não a quer fazer, porque entende que a provincia de Traz os Montes não tem direito a gosar nenhum beneficio do estado.
Repito. É preciso dar a cada um o que lhe é devido; é preciso que a provincia de Traz os Montes tenha a parte que lhe toca nos melhoramentos materiaes. Sem que isto se faça, parece-me poder affirmar que, só com grandes violencias, se conseguirá d'aquelles povos qualquer augmento de impostos.
Mando o meu requerimento para a mesa, e peço a urgencia d'elle.
O sr. Candido de Moraes: — Mando para a mesa a seguinte declaração de voto (leu).
Como estou com a palavra, aproveito a occasião para levantar uma insinuação, feita pelo illustre deputado que me precedeu, em referencia á classe a que tenho a honra de pertencer.
Parece-me que s. ex.ª quiz indicar que os engenheiros que estão ao serviço do ministerio das obras publicas pretendiam desfructar os proventos da sua posição, sem todavia aceitarem, senão de muito mau grado, os encargos que a sua profissão lhes acarreta.
S. ex.ª tem alguma rasão quando diz que a provincia de Traz os Montes tem a sua viação ordinaria muito menos desenvolvida do que seria para desejar. Se s. ex.ª porém notasse as difficuldades technicas que se encontram ali, e que tem de ser vencidas á custa de grandes sacrificios pecuniarios, para ligar pontos aliás muito proximos; se s. ex.ª attendesse a que essas difficuldades são n'aquella provincia muito superiores ás que se dão nas outras provincias, isto em virtude dos accidentes naturaes do paiz, modificaria um pouco a sua opinião; se s. ex.ª attendesse a que a verba destinada no orçamento do ministerio das obras publicas para estradas de nenhuma sorte aproveitam aos engenheiros, porque estes não desfructam parcella alguma á essa verba, quer estejam em Lisboa, quer estejam em outra qualquer localidade, visto que essa verba tem uma applicação diversa; se s. ex.ª tivesse ponderado tudo isto antes de dirigir as censuras que dirigiu á minha classe, estou convencido de que me teria dispensado de apresentar a s. ex.ª estas considerações, que eu julguei do meu dever fazer para repellir qualquer conclusão menos justa, que se possa tirar das palavras menos pensadas do illustre deputado, e que podem recaír com deslustre sobre uma classe que tem prestado ao paiz relevantes serviços, os quaes, embora não sejam largamente remunerados, tem custado a essa classe grandes sacrificios.
E não fallo por mim. Entrei n'esta carreira ha muito pouco tempo, e a posição que occupo na classe é tão insignificante, que das censuras do illustre deputado nenhuma parcella me chegaria a tocar. Fallo pelos meus collegas, de sobre os quaes julguei do meu dever arredar accusações injustas e completamente infundadas.
Tenho concluido.
O sr. Eduardo Tavares: — Tinha pedido a palavra quando o illustre ministro da fazenda estava fazendo ainda agora algumas considerações a proposito do que eu tinha dito por occasião de apresentar uma felicitação dirigida á commissão de fazenda. Pareceu-me que s. ex.ª se propunha impugnar as observações que fiz, mas como s. ex.ª apenas fez declarações, que de certo a camara e o paiz muito estimará que se fizessem na camara, desde este momento não tenho senão o felicitar-me por ter proporcionado este ensejo, que s. ex.ª aproveitou em assumpto de tanta importancia para os contribuintes.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Visconde de Chancelleiros): — Mal pude ouvir o que o illustre deputado, o sr. Antunes Guerreiro, disse com respeito á viação publica na provincia de Traz os Montes.
Persuadia-me que s. ex.ª estaria um pouco mais tranquille do que me pareceu estar hoje, com uma resposta que havia dado a s. ex.ª n'uma das passadas sessões, e até mesmo porque tinha praticado com s. ex.ª sobre este assumpto n'um dos ultimos dias; e, com surpreza minha, vejo porém que s. ex.ª, que tem tomado tanto a peito esta parte da viação publica, ainda está possuido das mesmas apprehensões de que o governo, e emfim os poderes publicos, não attendem, como devem, a este assumpto importante.
S. ex.ª declarou, que não conhecia a applicação do imposto a estradas de interesse para aquella provincia. Permitta-me o illustre deputado que lhe diga, que ainda que seja assim, ainda que se haja feito pouco em relação ao que se devia fazer, ainda assim mais de uma provincia tinha rasão de se queixar (apoiados).
Se o illustre deputado toma a peito, como deseja tomar, tão importante assumpto, creio que o meio mais facil de obter todas as explicações que lhe possa dar na posição of-