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SESSÃO DE 19 DE JANEIRO DE 1886 117

allegar em meu favor a minha pratica de dezeseis annos, e posso invocar o testemunho de muitos dos srs. deputados que fazem parte da camara e que sabem que o que eu digo é a verdade.
Dada esta explicação, porque desejo resalvar o direito que. me reservo de apresentar qualquer moção antes da ordem do dia, vou entrar na materia, e digo que entro n'ella muito contrariado e com muito má vontade, porque naturalmente terei de dizer cousas que a mim me desagradam muito e que talvez á camara ainda desagradem mais.
Não quero que algum orador se dê ao trabalho de me responder para me fazer a accusação que o sr. Franco Castello Branco fez aos que o precederam pela maneira por que a discussão tem corrido.
Se o sr. José Luciano muito de passagem, como protesto e sem demonstração, se limita a declarar illegal o procedimento do governo, reservando-se para n'outra occasião tratar a fundo este assumpto, e ao mesmo tempo, examina largamente o procedimento abusivo e fraudulento havido com os guardas, o illustre deputado da maioria e o sr. ministro da fazenda invertem os termos, tratam largamente da questão de legalidade, abandonando a dos guardas, e ainda por cima nos accusam de ser o debate desconnexo e confuso!
Para que não me succeda o mesmo, protesto a v. exa. que não me affastarei da minha ordem de idéas. Tenho um certo e determinado proposito, que em breve indicarei, do qual não me affasto por cousa alguma d'este mundo.
Antes, porém, de me explicar mais claramente, permitta-me v. exa. que muito rapidamente e só como prova da muitissima consideração que tenho pelo grande talento, pelo aturado estudo e pelo nobre caracter do illustre deputado que me precedeu, responda a algumas considerações feitas por s. exa. na sessão de homem e na de hoje.
O illustre deputado apresentou duas especies de argumentos para sustentar a legalidade com que o sr. ministro da fazenda fez uma reforma e uma novissima reforma em virtude da mesma auctorisação parlamentar.
Segundo um dos argumentos adduzidos pelo illustre deputado, o sr. ministro da fazenda, para publicar o seu segundo decreto, bastava-lhe recorrer á disposição do decreto n.° 1, onde se diz, que nas disposições relativas ao pessoal das alfândegas e ao serviço d'ellas é unicamente considerada materia legislativa: as taxas dos direitos e addicionaes e a fixação do quadro geral dos empregados e dos vencimentos, podendo tudo o mais ser constituido ou alterado por actos do executivo. E d'aqui tomou s. exa. argumento para demonstrar, que o ministro, fazendo a novissima reforma, não usou da auctorisação legislativa, mas das faculdades mencionadas no artigo 2.° do decreto n.° 1.
Respondo a s. exa. que é possivel que tenha muita rasão. Não quero discutir miudamente com o illustre deputado; o meu intuito reduz se apenas a pedir a s. exa. que se ponha de accordo com o sr. ministro da fazenda, porque o governo, no preambulo da novissima reforma das alfandegas, diz expressa e terminantemente, que se serve ainda da auctorisação legislativa dada pela lei de 31 de março de 1885.
Não sou eu que tenho culpa de que o illustre deputado não lesse o diploma que pretendeu defender, mas d'ahi resulta ser possivel que juridica e constitucionalmente a opinião de s. exa. seja a melhor de todas; mas a opinião do governo é contraria á de s. exa. Vejam se podem compor-se.
Alem d'isso, o illustre deputado quiz comparar as auctorisações dadas ao poder executivo para reformar os serviços publicos com as moções de confiança, pretendendo assim defender-se de um argumento muito bem posto pelo sr. Barros Gomes.
Com effeito, se o governo póde servir-se repetidas vezes das auctorisações legislativas dentro do praso d'ellas, e na mesma auctorisação enxertar decretos sobre decretos, reformas sobre reformas, então tambem o actual gabinete poderia usar da auctorisação sem limite de tempo dada pelas côrtes em 1SG9 para a reforma de todos os serviços.
Para fugir d'este escolho, o sr. Franco Castello Branco, comparando estas auctorisações para reformas com as moções de confiança, disse que só o governo, a quem a camara tinha outorgado a sua confiança, podia usar d'ella, ficando assim o sr. Hintze com o direito de ámanhã ou depois nos apresentar uma reforma da novissima reforma.
Ora, n'este ponto, como no anterior, o accordo de s. exa. com o sr. ministro não é completo, antes pelo contrario.
O sr. ministro da fazenda acha que o governo tem o direito de fazer uso da auctorisação até o 1 de março, e o illustre deputado entende que é só o governo que tiver merecido a confiança da camara, que póde usar a auctorisação ainda antes de 31 de março.
Por outro lado, a novissima reforma foi feita antes da reunião da camara. Pergunto, na hypothese do sr. Franco Castello Branco, a confiança d'esta camara é uma especie de feudo, de morgadio, do que o governo possa dispor á sua vontade para continuar a usar da auctorisação que lhe havia sido concedida sob o pretexto de que gosava da confiança da camara? (Apoiados.)
Póde-se porventura em materia tão melindrosa proceder por simples supposições?
Não quero travar um debate sobre este assumpto, mas parece-me ter provado que, mesmo admittindo como exacta a singular doutrina constitucional do illustre deputado, o governo procedeu incorrectamente. S. exa. o condemnou.
(Interrupção do sr. Franco Castello Branco.)
O illustre deputado disse que na hypothese figurada a camara daria um voto de censura ao governo. Era isso mesmo que esta camara, faria a um governo que não fosse aquelle que está sentado n'aquelles logares e a quem deu a auctorisação. (Apoiados.) E isso prova a falsidade do seu argumento.
Pareceu-me um ponto muito embaraçado a questão do casamento dos guardas.
Por mim confesso, com toda a minha ingenuidade, com a ingenuidade de que tenho dado muitas provas, (Riso.) que o negocio do casamento dos guardas me tem dado muito que scismar. (Riso.)
Tinha vontade até de pedir ao sr. ministro da fazenda que consultasse o sr. Tnomás Ribeiro e o sr. Pinheiro Chagas, ambos poetas distinctissimos, e talvez fosse muito melhor para os negocios publicos que elles fossem menos poetas, sobre as trovas de S. Gonçalo de Amarante, casamenteiro das velhas, (Riso.) porque me lembrou que s. exa. teria algumas veleidades do sor canonisado de futuro e só tornar o casamenteiro da guardas. (Riso.)
Esta aspiração a santo seria tão legitima como outra qualquer. Mais legitima talvez do que outra qualquer, porque se realisa com as virtudes e com actos de caridade, como os que se têem praticado em relação aos guardas da alfandega. (Riso.}
Mas vi depois que o sr. ministro da fazenda se defendeu com a legislação italiana, do que este decreto n.° 4 é em grandissima parte traduzido, a qual preceitua que a licença para casar aos guardas só se dê quando elles tenham 400 liras de rendimento.
Este é um criterio simples e claro. Infelizmente desapareceu na traducção, e se nos tirarmos d'ella em que pelago de difficuldades vae metter-se o sr. ministro da fazenda.
Nem o proprio Salomão, que ficou celebre, não por causa do casamento, mas por causa de uma creança, cuja mãe não era bem conhecida, seria capaz de resolver a questão. (Riso.)
O illustre ministro não tem um criterio seguro na lei.
Se acaso um guarda lhe pedir licença para casar, o que fará s. exa.?
Consultava os sentimentos do coração do guarda? (Riso.)