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SESSÃO DE 23 DE ABRIL DE 1887

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

Francisco José de Medeiros
José Maria de Alpoim Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

É introduzido na sala e presta juramento o sr. José Barroso Pereira de Matos. - Dá-se conta dos seguintes officios: 1.°; um officio do sr. barão de Carvalho Borges, ministro plenipotenciario ao imperio do Brazil era Portugal, accusando a recepção da carta official em que a presidencia da camara dos senhores deputados lhe participava que a mesma camara resolvêra, em sessão do dia l5, lançar na acta a declaração de que fazia fervorosos votos pelo restabelecimento de Sua Magestade o Imperador do Brazil, e communicando que se apressará em levar esse facto ao conhecimento do governo imperial; 2.°, um officio do ministerio do reino, remettendo o processo relativo á eleição de um deputado peio circulo n.° 147 (Margão, 3.º do estado da India). - Tiveram segunda leitura: 1.ª uma nota do sr. Francisco de Campos, renovando a iniciativa do projecto de lei que apresentou na sessão de 2 de março de 1886, e que tem por fim determinar que as disposições do artigo 6.° da carta de lei de 11 de junho de 1867 sejam applicadas, nos termos genericos do mesmo artigo e do seu regulamento, ás familias dos officiaes do exercito que tiverem fallecido na effectividade de serviços nos cordões sanitarios e nos lazaretos por effeito de molestias adquiridas nos referidos serviços; 2.°, uma nota do sr. Figueiredo Mascarenhas, renovando a iniciativa do projecto de lei que apresentou na sessão de 15 de março de 1886, e que tem por fim auctorisar a camara de Lagoa a contrahir um emprestimo com a companhia de credito predial; 3.°, um projecto de lei do sr. Consiglieri Pedroso, abolindo o juramento politico em todas as instancias. -Apresentam requerimentos os srs. Pereira dos Santos, Avellar Machado, Souto Rodrigues, José de Azevedo Castello Branco, Pedro Victor e Franco Castello Branco. - O sr. Alfredo Brandão apresenta uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas sobre o traçado do caminho de ferro da Beira Baixa, entro as estações de Alpedrinha e Fundão. - O sr. Abreu Castello Branco apresenta uma representação da direcção da associação commercial de Angra do Heroismo contra um projecto que lhe consta que ha de ser apresentado á camara, estabelecendo a igualdade da moeda entre as ilhas dos Açores e o continente, e faz algumas considerações sobre o assumpto. - O sr. Antonio de Azevedo Castello Branco refere-se á ordem expedida pela direcção geral de contabilidade, para que desde o dia 1.° de maio fossem suspensos os vencimentos aos empregados que não tivessem pago os emolumentos e o sêllo correspondente aos encartes. - O sr. Souto Rodrigues refere-se á portaria que mandou reabrir os cursos da universidade, juntando algumas reflexões para mostrar que na chamada epidemia não chegou a haver casos que attingissem a 2/3 Por cento da população ordinaria de Coimbra. Responde-lhe o sr. ministro da guerra. - O sr. Consiglieri Pedroso apresenta um projecto de lei, determinando que todas as contestações entre patrões de uma parte e os seus operários ou empregados da outra parte, relativamente ao contrato de serviços, em materia industrial ou commercial, sejam julgados por tribunaes especiaes, denominados tribunaes-arbitros, e faz algumas considerações a esse respeito. - Apresenta-se o parecer da commissão de verificação de poderes, declarando vagos os circulos n.ºs 15 (Montalegre), 29 (Marco de Canavezes) e 39 (Anadia), e é approvado. - O sr. Alves da Fonseca apresentou o parecer da commissão de verificação de poderes, sobre o requerimento dirigido á mesa para que fosse enviado ao tribunal especial o processo eleitoral do circulo n.° 27 (Felgueiras). - O sr. Marcai Pacheco chama a attenção do sr. ministro da guerra para os factos que accusam a indisciplina do exercito, fazendo algumas considerações a este respeito. Responde-lhe o sr. ministro da guerra, tomando parte n'este incidente os srs. Julio de Abreu e Pinheiro Chagas. - Tambem se dão explicações entre os srs. Marcai Pacheco, ministro da guerra, Julio de Abreu, Antonio Candido, Pinheiro Chagas, Consiglieri Pedroso e Laranjo, sobre a lista da commissão de guerra, em que foi tirado o nome do sr. Avellar Machado para o substituir por outro. - O sr. ministro da justiça apresenta uma proposta relevando o governo da responsabilidade em que incorreu pelas medicas que promulgou desde 17 de junho de 1886 até 17 de março de 1887. O sr. Ennes pede que esta proposta de lei do governo seja mandada a uma commissão especial composta de onze membros. É approvado este requerimento. - São approvadas duas propostas dos ministerios da fazenda e das obras publicas, para que possam accumular, querendo, as funcções legislativas com as que exercem n'aquelles ministerios alguns srs. deputados.

Na ordem do dia elegem-se as commissões de instrucção primaria e secundaria, de instrucção superior especial, dos negocios estrangeiros e do ultramar.

Abertura da sessão - Ás duas horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada 72 srs. deputados. São os seguintes: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alfredo Cesar Brandão, Alfredo Pereira, Anselmo de Assis Andrade, Antonio Alves Pereira da Fonseca, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Candido Ribeiro da Costa, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Centeno, Antonio Eduardo Villaça, Antonio José Ennes, Antonio José Pereira Borges, Antonio Simões dos Reis, Arthur Hintze Ribeiro; Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto da Cunha Pimentel, Bernardo Homem Machado, Carlos Lobo d'Avila, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Eduardo de Abreu, Elizeu Xavier de Sousa e Serpa, Ernesto Madeira Pinto, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco José Fernandes Vaz, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Frederico de Gusmão Correia Arouca, Gabriel José Ramires, Henrique de Sá Nogueira de Vasconcellos,- João Antonio Pires Villar, João Augusto Pina, João Cardoso Valente, João Ferreira Franco Pinto de Castello Branco, João Joaquim Izidro dos Reis, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Monteiro Vieira de Castro, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim de Almeida Correia Leal, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim Simões Ferreira, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Augusto Barbosa Collen, José Augusto de Almeida Ferreira Galvão, José de Azevedo Castello Branco, José Maria Barbosa de Magalhães, José Barroso Pereira e Matos, José Domingos Ruivo Godinho, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim de Vasconcellos Gusmão, José Luiz Ferreira Freire, José Maria de Alpoim do Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Andrade, José Maria Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha Oliveira e Sousa (D.), José Simões Dias, José de Sousa Santos Moreira, Julio Cesar de Faria Graça, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Marçal de Azevedo Pacheco, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro Victor da Costa Sequeira, Vicente Rodrigues Monteiro, Victoriano Estrella Braga, Visconde de Monsaraz, Visconde de Silves e Zophimo Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio de Campos Valdez, Antonio Francisco Ribeiro Ferreira, Antonio Lucio Tavares Crespo, Antonio Luiz Gomes Branco de Moraes Sarmento, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Maria Pereira Carrilho, Augusto Faustino dos Santos Crespo, Augusto Maria Fuschini, Augusto Victor dos Santos, Eduardo José Coelho, Emygdio Julio Navarro, Fernando Matoso dos Santos, Fernando de Sousa Coutinho (D.), Firmino João Lopes, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Castro Gomes Monteiro, Francisco de Lucena e Faro (D.), Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jeronymo Pereira da Silva Baima de Bastos, João Eduardo Scarnichia, João Lobo Santiago Gouveia, João Marcellino Arroyo, Joaquim Alves Matheus, Joaquim Antonio da Silva Cordeiro, Joaquim José Maria de Oliveira Valle, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, José Alves de Moura, José Dias Ferreira, José Frederico Laranjo, José de

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Lemos e Napoles, José Maria dos Santos, Julio Carlos de Abreu e Sousa, Lopo Vaz de Sampaio e Mello, Manuel Affonso Espregueira, Manuel d'Assumpção, Manuel Pinheiro Chagas, Marianno José da Silva Prezado, Pedro Antonio Monteiro, Pedro Guilherme dos Santos Diniz e Tito Augusto de Carvalho.

Não compareceram á sessão os srs.: - Alfredo Cesar de Oliveira, Antonio Joaquim da Fonseca, Antonio José Gomes Neto, Antonio Lopes de Guimarães Pedrosa, Antonio Maria de Carvalho, Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello Ganhado, Antonio Maria Jalles, Elvino José de Sousa e Brito, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Guilhermino Augusto de Barros, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João José Dias Gallas, João Menezes Parreira, João de Sousa Machado, Jorge O'Neill, José Bento Ferreira de Almeida, José Elias Garcia, José Maria de Oliveira Matos, José Soares Pinto de Mascarenhas, Julio José Pires, Luiz Augusto da Cunha Mancellos Ferraz, Luiz Emílio Vieira Lisboa, Luiz José Dias e Marianno Cyrillo de Carvalho.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Do ministerio, do reino, remettendo o processo relativo á eleição de um deputado que ultimamente se realisou no circulo n.° 147 (Margão 3.° do estado da India).

Á commissão de verificação de poderes.

2.° Legação imperial do Brazil. - Lisboa, 18 de abril de 1887. - Illmo. e exmo. sr. - Tive a honra de receber hoje a carta official que v. exa. se dignou dirigir-me em data de 16 do corrente mez, para communicar-me que a camara dos senhores deputados da nação portugueza, em sessão do dia 15, tendo ouvido as explicações prestadas pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros, ácerca do estado de saude de Sua Magestade o Imperador do Brazil, resolveu lançar na acta das suas sessões a declaração de que fazia sinceros e fervorosos votos pelo restabelecimento do mesmo augusto senhor.

A legação imperial do Brazil agradece vivamente á camara, dos senhores, deputados essa declaração demonstrativa da veneração e sympathia que a nação portugueza dedica a Sua Magestade o Imperador do Brazil, e se apresará em leval-a ao, conhecimento do governo imperial.

Deus guardo a v. exa. - Illmo, e exmo. sr. dr. José Maria Rodrigues de Carvalho, presidente da camara dos senhores deputados. = Barão de Carvalho Borges.

Á secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Artigo 1.° É abolido o juramento politico em todas as instancias.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, 22 de abril de 1887. - O deputado, Consiglieri Pedroso.

Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de legislação, civil.

Propostas para renovação de iniciativa

1.ª Renovação do projecto de lei apresentado na sessão de 2 de março de 1886:
Artigo 1.° AS disposições do artigo 6.° da carta de lei de 11 de junho de 1867 serão applicadas, nos termos genericos do mesmo artigo e do seu regulamento, ás familias dos officiaes do exercito que tiverem fallecido na effectividade dos serviços dos cordões sanitarios e dos lazaretos por effeito de molestias adquirida; nos referidos serviços.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 22 de abril de 1887. = Francisco de Barros Coelho e Campos.

2.ª Renovo a iniciativa do projecto de lei apresentado por mim na sessão de 15 de março de 1886 e publicado no Diario da camara, de 16 do mesmo mez, que tem por fim auctorisar a camara de Lagoa a contrahir um emprestimo com a companhia, de credito predial.

Sala das sessões, em 22 de abril de 1887. = O deputado, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas.

Enviada á commissão de administração publica.

Representação

Da direcção da associação commercial de Angra do Heroismo contra um projecto de lei que ha de ter apresentado á camara para o estabelecimento da igualdade da moeda entre as ilhas dos Açores e o continente.

Apresentada pelo Sr. deputado Abreu Castello Branco, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario da camara.

NOTA DE INTERPELLAÇÃO.

Desejo interpellar o sr. ministro das obras publicas, sobre o traçado do caminho de ferro da Beira Baixa entre as citações de Alpedrinha e Fundão. = O deputado por Castello Branco, Alfredo Cesar Brandão.

Mandou-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.º Requeiro que, pelo ministerio da guerra, seja enviado com urgencia a esta camara um mappa estatistico detalhado das operações da janta de revisão no districto de Coimbra durante os annos de 1882 a 1886, e no primeiro trimestre do anno corrente. = O deputado pelo circulo n.° 40, João J. de Antas Souto Rodrigues.

2.ª Roqueiro que, pelo ministerio do reino, sejam enviados, por copia, a esta camara os seguintes documentos:

I Actas das sessões da junta consultiva de saude do districto de Coimbra, em março e abril d'este anno;

II. Actas ou pareceres da junta consultiva de saude publica do reino com referencia ao estado sanitario de Coimbra no anno corrente;

III Actas ou pareceres da faculdade de medicina da universidade ou de facultativos de Coimbra, ouvidos sobre o mesmo assumpto e sobre a suspensão dos exercicios escolares, pelo governo, reitor d'aquelle instituto ou governador civil do districto;

IV. Acta ou consulta do conselho de decanos da universidade sobre o encerramento das aulas;

V. Seis dos requerimentos em que foram pedidas licenças por alumnos da universidade no dia 10 de março ultimo e respectivos despachos;

VI. Nota dos requerimentos apresentados ou andamento que tiveram;

VII. Estatistica, do movimento clinico nos hospitaes especiaes que tem havido em Coimbra nos ultimos dez annos. = O deputado pelo circulo n.° 40, João J. de Antas Santos Rodrigues.

3 ° Requero que, pelo ministerio do reino, sejam mandados, por copia, a esta camara os seguintes documentos:

I. Acta da sessão em que a camara municipal de Coimbra creou a estrela de ceramica;

II. Acta da sessão em que se destinou edificio para a escola;

III. Regulamento respectivo;

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IV. Acta da sessão em que o regulamento foi approvado pela commissão especial nomeada para esse fim, e da sessão em que esta commissão foi nomeada;

V. Acta da sessão de 1887 em que a camara creou um museu industrial;

I. Acta de todas as sessões em que a mesma camara deliberou no anno corrente sobre a vencia, no todo ou em parte, da quinta de Santa Cruz;

VII. Termos de avaliação, se os houve, e nomeação dos respectivos louvados;

VIII. Medição do terreno destinado para estação agricola experimental e da area occupada por edificios nobres e rusticos, separadamente;

IX. Contrato da venda d'esses edificios e terrenos, se o houver, ou, no caso contrario, acta da sessão em que a camara deliberou contratar. - O deputado pelo circulo n.° 40, João J. de Ardas Souto Rodrigues.

4.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, me seja enviada, com urgencia, uma nota de todas gratificações ou proventos extraordinarios de qualquer ordem, que tenham sido concedidos por despachos ministeriaes a funccionarios ou empregados de qualquer categoria, dependentes d'aquelle ministerio, e desde 20 de fevereiro de 1886 até 2 de abril do corrente anno. = Franco Castello Branco.

5.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, me seja enviada, com urgencia, a copia da portaria ou despacho ministerial, que incumbiu o conselheiro Silvestre Bernardo de Lima, director geral aposentado do referido ministerio, de interferir na administração da mata do Bussaco e dos trabalhos florestaes na Trataria, e bem assim que gratificação ou provento lhe foi arbitrado por tal serviço. = Franco Castello Branco.

Mandou-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.° Dos officiaes da arma de engenheria, Alfredo Pereira Tovar de Lemos e José Joaquim da Costa Lima, contra a organisação dos serviços technicos das obras publicas, approvada pelo decreto dictatorial de 24 de julho ultimo.

Apresentados pelo sr. deputado José de Azevedo Castello Branco, e enviados á commissão de obras publicas.

2.° Dos officiaes da arma de engenheria, Augusto Cesar Carvalho da Silva, Jacinto José Maria do Couto, Constantino José de Brito, Augusto Cesar de Abreu Nunes, Antonio Joaquim de Sequeira de Almeida Beja e Augusto de Paiva Gonzalez Bobela, no mesmo sentido dos antecedentes.

Apresentados pelo sr. deputado Pereira dos Santos, e enviados á commissão de obras publicas.

3.° Dos officiaes da arma de engenheria, Joaquim Lucio Lobo, Achilles Alfredo da Silveira Machado, Manuel de Campos Ferreira Lopo e Joaquim Augusto Lopes da Costa Theriaga, no mesmo sentido dos antecedentes.

Apresentados pelo sr. deputado Avellar Machado, e enviados á commissão de obras publicas.

4.° Dos officiaes da arma de engenheria, Francisco Antonio Alvares Pereira o Pedro Antonio Salema Garção, no mesmo sentido.

Apresentados pelo sr. deputado Franco Castello Branco, e enviados á commissão de obras publicas.

5.° Dos officiaes da arma de engenheria Alfredo Vaz Pinto da Veiga, João Manuel Alves Souto, Amavel Granger e João Severo da Cunha, no mesmo sentido.

Apresentados pelo sr. deputado Pedro Victor, e enviados á commissão de obras publicas.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Participo a v. exa. que por motivo justificado deixei de comparecer nas sessões de 20 e 22 do corrente. = Urbano de Castro.

2.ª Participo a v. exa. e á camara que, por motivo justificado, me não foi possivel comparecer á sessão do dia 20. = Sousa e Silva, deputado pelo circulo 98.

Para a secretaria.

O sr. Presidente: - Consta-me que se acha nos corredores da camara, para prestar juramento, o sr. deputado José Barroso Pereira do Matos.

Convido os srs. Francisco Machado e Vicente Monteiro a introduzirem-no na sala.
Foi introduzido na sala e prestou juramento o sr. José Barroso Pereira de Matos.

O sr. Pereira dos Santos: - Mando para a mesa seis requerimentos de differentes officiaes da arma de engenheria, pedindo ao parlamento para não ser sanccionado em lei o projecto da reorganisação dos serviços technicos do ministerio das obras publicas, a fim de que sejam aproveitados os serviços dos officiaes de engenheria.

Creio que a commissão que deve dar parecer sobre o assumpto ainda não está constituida; por isso peço a v. exa. queira mandar os requerimentos á commissão de obras publicas, para depois irem a essa commissão, quando se constituir.

Desejava fazer outras considerações sobre diversos assumptos pendentes do mesmo ministerio, mas como não está presente o sr. ministro das obras publicas, peço a v. exa. que me reservo a palavra para quando s. exa. estiver presente.

O sr. Antonio de Azevedo Castello Branco: - Pedi a palavra hoje, exactamente para tratar do mesmo assumpto de que hontem me queria occupar, e sinto não ver presente o sr. ministro da fazenda, ou o sr. Carrilho, director geral da repartição de contabilidade publica, que poderia, querendo, prestar-me esclarecimentos.

Consta que por esta repartição foi expedida ordem para as repartições de contabilidade dos diversos ministerios, a fim de serem suspensos os vencimentos de todos os empregados, que estão em divida dos emolumentos e respectivos encargos, que não tenham requerido o pagamento d'elles, ou não estejam habilitados a pagal-os em prestações.

Esta ordem não está em harmonia com as disposições do decreto de 28 de janeiro d'este anno.

O governo foi auctorisado pela carta de lei de 20 de maio de 1875 a descontar em prestações o pagamento dos direitos de mercê.

O decreto de 28 de janeiro determina que, aos individuos que não tenham pago os direitos de mercê e que os não paguem dentro do trinta dias, se supponha que requereram o pagamento em prestações, e pelas repartições publicas se façam os respectivos descontos e se addicione os juros de mora e a quantia de 85 réis correspondente ao requerimento, sendo 80 réis do sêllo e 5 do papel.

Ora, o que é certo, é que os empregados ficaram inteiramente confiados em que, não requerendo, as repartições cumpririam o seu dever, fazendo a liquidação.

A ordem expedida pela direcção de contabilidade publica é completamente contraria ás disposições do decreto.

Muitos empregados publicos estavam confiados em que as competentes repartições de contabilidade fariam a liquidação e não fizeram requerimentos.

Julgaram-se dispensados de os fazer desde que tinham de pagar apenas 85 réis, alem das quantias correspondentes aos emolumentos e ao sêllo dos respectivos encartes.

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Ora, esto assumpto creio que deve interessar a muitos dos cavalheiros presentes; e, comquanto não esteja presente quem possa responder a respeito d'este assumpto, talvez o sr. ministro da fazenda leia o Diario das sessões e por essa fórma chamo a attenção de s. exa. para a necessidade de annullar a ordem passada pela direcção geral de contabilidade do ministerio da fazenda, que me parece contraria, repito, ao decreto de 28 de janeiro ultimo.

Na minha opinião, se alguns empregados deviam ser suspensos, eram aquelles que, devendo fazer a liquidação, a não fizeram a tempo. (Apoiados.)

Demais esta suspensão é iniqua e póde ser desigualissima.

Ha alguns funccionarios a quem póde ser applicada a suspensão por um ou dois mezes; e outros a quem póde ser applicada por cinco ou seis, segundo a morosidade que houver nas respectivas repartições em se fazer a liquidação.

É sabido que nas repartições publicas ha grande morosidade em se fazer a expedição de todos os negócios, ou pelo menos não ha a rapidez que seria para desejar n'esta expedição.

A liquidação n'este caso póde protrahir-se muito, e póde ser desigual, porque, conforme houver mais ou menos sollicitude por parte das repartições de contabilidade, assim os empregados soffrem mais ou menos tempo de suspensão nos seus vencimentos.

Parece-me iniquo que uns empregados soffram a suspensão dos seus vencimentos por mais tempo, e outros por menos tempo.

Limito aqui as minhas considerações.

Como na camara deve haver muitos funccionarios a quem possa prejudicar esta suspensão, espero que algum d'elles tenha a felicidade de obter uma resposta, quando esteja presente o sr. ministro da fazenda, se algum dos illustres deputados quizer referir-se tambem a este assumpto.

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - Não tenho conhecimento dos factos especiaes a que se referiu o illustre deputado que acaba de fallar.

São assumptos que pertencem exclusivamente ao ministerio da fazenda.

No entanto apressar-me-hei em communicar ao sr. ministro da fazenda as observações de s. exa., e estou convencido do que o meu collega lhe dará satisfactorias explicações.

O sr. Alfredo Brandão: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas sobre a traçado do caminho de ferro da Beira Baixa.

Peço a v. exa. que se digne designar dia para esta interpellação se realisar, porque o sr. ministro das obras publicas já n'uma das sessões anteriores se declarou habilitado para tratar d'este assumpto.

O sr. Souto Rodrigues: - Referindo-se á portaria que mandou reabrir os cursos da universidade por ter cessado, na phrase da mesma portaria, a epidemia das febres typhoides, disse, em primeiro logar, que podia informar a camara do total desapparecimento d'estas molestias em Coimbra, e observou que aquella terrivel epidemia não chegou a atacar, segundo as estatísticas finaes, 2/3 por cento da população permanente da cidade.

O orador fez algumas considerações para mostrar quanto são inconvenientes as disposições da portaria que attribuem ao reitor faculdades para designar os lentes que hão de reger as cadeiras vagas, e para alterar o horario de modo quer se recupere o tempo perdido.

O reitor, quaesquer que sejam a sua competencia o os seus talentos; por muito que conheça os homens e as cousas, não póde ter noção exacta das exigencias pedagogicas em cursos tão variados e multiplices como os que se professam na universidade, nem conhecimento tão cabal das aptidões de cada professor como os conselhos escolares.

Por isso acha muito sensatas e praticas as disposições do decreto de 26 de dezembro de 1860, agora revogado em portaria; por um processo em que ainda se entrevêem uns restos de mal disfarçada dictadura.

Quanto á alteração do horario, como na portaria se diz que é para aproveitar o tempo, essa alteração não póde deixar de ser no sentido de alargar a duração dos exercicios escolares.

Que esta questão é fundamentalissima em pedagogia, e não póde ser resolvida por estes processos summarios usados pelo sr. ministro do reino. Na sua faculdade, designadamente, o alargamento dos exercicios escolares diarios fará perder em intensidade muito mais do que poderá ganhar-se na extensão do ensino, com grave detrimento dos alumnos.

Que não comprehendia a necessidade de revogar por esta fórma as prudentes disposições do decreto de 1860. Estão n'esta casa muitos antigos alumnos da universidade, e todos poderão dar testemunho de que os professores d'este instituto nunca se recusaram a associar o seu esforço, bem mal recompensado sempre, ás diligencias empenhadas no adiantamento de ensino, sem preoccupações de politica partidaria nem de commodidades pessoaes.

Estranhou que a portaria não disponha alguma cousa a respeito das aulas do lyceu, que tambem estão interrompidas. Essa lacuna poderia fazer suppor, o que não é exacto, que o estado sanitario de Coimbra ainda não é tão bom que sem risco possa permittir-se a volta immediata áquella cidade de toda a população escolar.

Parece-lhe necessario que este ponto se esclareça, e que se tomem as providencias necessarias para a reabertura das aulas de instrucção secundaria, de modo que os exames possam ainda fazer-se na epocha propria.

Discutirá detidamente a portaria, e apreciará o procedimento do governo em toda esta malfadada questão, quando lhe chegarem os documentos que vae pedir.

Mandou para a mesa tres requerimentos pedindo documentos, dois pelo ministerio do reino e um pelo da guerra.

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - A respeito dos assumptos a que se referiu o sr. deputado Souto Rodrigues pouco posso dizer, como s. exa. mesmo concordou, porque se referem exclusivamente ao ministerio do reino.

Entretanto, por parte do governo, e para dar uma prova da minha consideração para com s. exa., vou dizer algumas palavras relativamente á suspensão das aulas na universidade, em consequencia da epidemia de febres typhoides que se desenvolveu em Coimbra, assumpto que não póde ser alheio a nenhum membro do gabinete, porque o negocio da suspensão da frequencia das aulas era bastante importante para ser tratado em conselho de ministros.

Posso asseverar ao illustre deputado que o governo tomou a deliberação de suspender a frequência das aulas, por informações que teve, livres de toda a suspeita.

Teve informações do reitor, de que a epidemia parecia desenvolver-se de modo assustador e teve informações das repartições competentes ácerca d'este assumpto. Alem d'isso tinha-se desenvolvido um tal panico pela preoccupação da epidemia, na parte da população academica, e a esta circumstancia reunira-se um certo numero de factos crescentes, quanto á epidemia da febre typhoide, que aconselharam naturalmente o governo a fechar temporariamente as aulas.
Recentemente teve noticia de que se não tinha dado mais nenhum coso da chamada epidemia, e nessas circumstancias apressou-se a mandar abrir novamente as aulas.

É certo, é fatal que em consequencia desta lacuna nos estudos e na frequencia da universidade resulta necessariamente uma certa perturbação nos differentes cursos, mas essa perturbação é consequencia de um caso de força maior, que não estava na mão do governo sanar. Creio que o ministerio do reino ha de necessariamente e quanto possivel

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tomar as devidas providencias, que tornem menos sensivel a falta de frequencia que houve.

Não posso dizer mais nada.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Souto Rodrigues.

O sr. Souto Rodrigues: - É simplesmente para agradecer ao sr. ministro da guerra as explicações que acaba de dar-me.

O sr. Avellar Machado: - Mando para a mesa quatro requerimentos de officiaes de engenheria, para que não se de força de lei ao decreto que organisou os serviços do ministerio das obras publicas.

O sr. Azevedo Castello Branco: - Em harmonia com os requerimentos apresentados pelos srs. Pereira dos Santos e Avellar Machado, mando tambem para a mesa dois requerimentos de officiaes muito distinctos da arma de engenheria, pedindo á camara que não sanccione com o seu voto a lei dictatorial de 24 de junho.

O sr. Abreu Castello Branco: - Mando para a mesa uma representação da associação commercial de Angra, sobre a crise monetaria dos Açores.

Sinto que não esteja presente o sr. ministro da fazenda, porque desejava perguntar-lhe se tenciona apresentar uma proposta de lei n'esta casa, para resolver este assumpto, e assim com a sua resposta serenar de alguma sorte os animos que estão justamente recciosos na actualidade, em consequencia do estado a que têem chegado as circumstancias d'aquella localidade. Não posso deixar neste momento de fazer algumas brevissimas considerações a tal respeito, para que v. exa. e a camara conheçam a gravidade e a urgencia d'este assumpto.

Nos Açores, d'aqui a pouco não ha dinheiro!

Têem ali tido curso forçado as patacas hespanholas e as antigas patacas brazileiras e suas fracções.

A associação commercial de Angra do Heroismo representou ao governo pedindo que fosse carimbada a moeda, que ali existia, a fim de não se introduzir nenhuma outra.

Effectivamente o governo mandou carimbar aquella moeda, mas agora consta que há idéa de se decretar a unificação da moeda do continente e ilhas adjacentes.

Ora, contra esta idéa, se porventura se apresentar, hei de envidar todos os meus esforços, hei de combatel-a com todo o vigor de que seja capaz.

Nos Açores não temos certas vantagens que se gozam no continente. Ali pagam-se as contribuições em moeda forte, a materia collectavel da propriedade é apreciada em moeda insulana, e todavia a contribuição paga-se em moeda forte.

Há apenas uma pequena vantagem, que é pagar em moeda da insulana o papel sellado e emolumentos de secretaria; mas isto é uma diminutissima vantagem comparada com as grandes vantagens que se gosam no continente.

Ali não temos caminhos de ferro, nem precisâmos d'elles; não temos telegrapho electrico nem pharoes, e a este respeito aguardo a presença do sr. ministro das obras publicas, desejando chamar a sua attenção para este assumpto, porque é o negocio ainda mais urgente do que o da moeda e outros, pois que importa nada menos do que o salvamento de muitas vidas, visto que muitas se perdem annualmente por falta de pharoes. Sobre este ultimo assumpto fallaremos mais detidamente depois.

Emquanto á moeda, temos a pequena vantagem que deixo apontada, mas não temos as grandes vantagens que se gosam no continente. Por consequencia será para nós um prejuizo e prejuizo gravissimo a uniformidade; alem de que no momento em que ella se decretar para os Açores, veremos desapparecer d'ali completamente toda a moeda portugueza ou ingleza que lá tem curso forçado, porquanto de há de pagar com moeda forte o que se importa do continente e outra moeda se não introduz ali.

Agora ainda vem do Brazil e de outros paizes moeda de prata ou de oiro estrangeira, e vão-se fazendo os pagamentos com ella; mas depois de decretada a igualdade da moeda, as patacas, não tendo já curso nos Açores, deixam de ser importadas; as libras esterlinas ou a moeda do prata que ali existe vem toda para o continente em pagamento de generes que importamos, e ficâmos ali litteralmente sem moeda.

Ora parecia-me rasoavel que, em lagar de uniformizar a moeda, tendo-se mandado carimbar as patacas que existem ali, ellas continuem a ter curso forçado, ou então recolhendo-as, substituindo-as por moeda forte, tenha esta ali, como agora, o augmento de 25 por cento, continuando a subsistir a moeda de cobre auxiliar insulana com o seu valor actual, sendo o das libras 5$625 réis, o das meias corôas 625 réis etc.

D'esta maneira ainda se poderá demorar ali por algum tempo dinheiro que para lá vá.

Em Cabo Verde e na Madeira tambem se fez isto, e qual foi o resultado? Saír de lá toda a moeda que lá havia.

Ainda na Madeira e Cabo Verde ha um tal ou qual remedio para este mal, que é a grande concorrencia de navios que diariamente nos deixam cá dinheiro, mas nos Açores não acontece isso. Hão de soffrer o mesmo mal sem haver cousa alguma que o attenue.

Depois, é tambem de necessidade que a igual. A este respeito bastaria, creio eu, invocar o exemplo de uma nação que em negocios de tal natureza certamente tem direito a ser imitada, a Inglaterra.

Se a Inglaterra, no Canadá, e nas Indias orientaes, reconhece a necessidade do conservar a desigualdade da moeda, por maioria do rasão nós devemos reconhecer essa necessidade.

Não quero fatigar a attenção da camara, fazendo mais largas considerações a este respeito.

Não é necessario um grande esforço para reconhecer a necessidade de se conservar o statu quo, e em todo o caso de não uniformisar a moeda do continente e dos Açores.

Se estivesse presente o sr. ministro da frenda, pediria a s. exa. que me dissesse se tencionava apresentar alguma proposta de lei n'este sentido, para com a sua resposta se poder serenar os animos que estão bastante excitados.

Essa proposta é de tal magnitude e alcance que certamente o sr. ministro da fazenda não a traria aqui se não de accordo com os seus collegas, e assim o sr. ministro da guerra, que e sul presente, poderia talvez dizer-me se em conselho de ministros se apresentou já essa medida.

Mas, emfim, póde não ter sido apresentada em conselho de ministros, e estar para apresentar, ou o sr. ministro ter essa idéa e tencionar apresentar a competente proposta. E por isso peço a v. exa. que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da fazenda, e peço igualmente que seja publicada no Diario da camara a representação que tenho a honra de mandar para a mesa.

Foi auctorisada a publicação.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, tinha pedido a palavra na esperança de que ao menos hoje estaria presente o sr. ministro do reino; (Apoiados.) mas apesar de quasi todos os oradores que tornaram hontem a palavra se terem referido a s. exa., e apesar mesmo de já na premente sessão se haver dado o facto de dois illustres deputados da opposição fallarem independentemente da presença de s. exa., appelando, como ultimo recurso, para a leitura que o mesmo sr. ministro haja de fazer do Diario da camara, torno novamente a pedir a v. exa. que Castro estiver presente; porque embora o seu collega da guerra, com a delicadeza e correcção que todos lhe agradecemos, (Apoiados.) se preste sempre a dar as explicações que póde, é facto que, pela natureza especial do seu ministerio, essas explicações têem de ser necessariamente deficientissimas. Os Srs. ministros, de cuja presença carecemos n'esta casa, são exactamente os que não comparecem. Cedo

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começam s. exas. a fugir das sessões da camara. (Apoiados.)

Como estou com a palavra, peço licença para mandar para a mesa um projecto de lei, de que não leio relatorio para não fatigar a attenção da camara, e sobre o qual farei apenas por agora ligeirissimas considerações, por me parecer que a opportunidade d'elle, em presença de factos recentemente passados, especialmente na cidade do Porto, será por todos os lados da camara reconhecida, dispensando por isso da minha parte considerações mais largas.

O projecto refere-se á creação de tribunaes arbitros, para julgar as contestações entre patrões e operários, e é do teor seguinte:

«Artigo 1.° Todas as contestações entre patrões de uma parte e os seus operarios ou empregados da outra parte, relativamente ao contrato de serviços em materia industrial ou commercial, são julgados por tribunaes especiaes, denominados «tribunaes arbitros».

Art. 2.° Os tribunaes arbitros são desde já estabelecidos em Lisboa, Porto, Covilhã, Portalegre, Funchal e Ponta Delgada, e nos outros centros industriaes, logo que estes o requererem ou quando os reclame algum ou alguns dos corpos administrativos, dentro do cuja circumscripção só encontrarem os referidos centros.

Art. 3.° O decreto da creação dos «tribunaes arbitros». determinará a sede e a circumscripção dos mesmos tribunaes e a sua jurisdicção no que respeita á industria ou industrias que tenham de lhes ser submettidas para o julgamento das suas contestações.

Art. 4.° Os tribunaes arbitros são compostos de um presidente, dois vice-presidentes e vinte vogaes, pelo menos, não podendo este numero, com tudo, ir alem de trinta.

§ 1 .° O presidente e os dois vice-presidentes são escolhidos pelo juiz: da comarca ou vara, de entre uma lista de cinco nomes, votada em escrutinio secreto pela camara municipal, a cuja circumscripção pertencer o respectivo tribunal.

§ 2.° Na ausencia ou impedimento do presidente e do primeiro vice-presidente, fará ás vezes d'estes o vogal mais velho ou o tirado á sorte entre os mais velhos da mesma idade. Os vice-presidentes sómente têem voto quando presidem.

§ 3.° Os vogaes serão sempre em numero par, e pertencerão, metade á classe dos patrões, eleitos por um collegio de patrões, e a outra metade á classe dos operarios ou empregados, eleitos igualmente por um collegio de operarios ou empregados, nos termos da lei complementar a que se refere o artigo 14.° do presente projecto de lei.

§ 4.° Tanto o presidente como os vice-presidentes e vogaes são eleitos por um anno, sendo immediatamente reelegiveis.

Art. 5.° Cada tribunal arbitro divide-se em tres instancias respectivamente denominadas: juizo de conciliação, juízo arbitrai e tribunal de appellação.

Art. 6.° Na sua primeira reunião os membros do tribunal arbitro, em sessão plenaria, elegem por escrutinio secreto dois membros patrões e dois membros operarios, que, presididos pelo segundo vice-presidente do mesmo tribunal, hão de constituir o tribunal de appellação.

§ 1.° No impedimento do segundo vice-presidente do tribunal arbitro, que é o presidente nato do tribunal de appellação, o juiz da comarca ou vara nomeará quem o deva substituir.

§ 2.° A duração do tribunal de appellação é a mesma que a do tribunal arbitro.

Art. 7.° Os municipios em cuja circumscripção se achar a sede de um ou mais tribunaes arbitros, serão obrigados a pagar as despezas de installação e funccionamento dos referidos tribunaes e a fornecerem para elles um local apropriado.

Art. 8.° São da competencia dos tribunaes arbitros, qualquer que seja a importancia do litigio, as contestações entre patrões de uma parte e operarios ou empregados da outra parte, sobretudo quanto disser respeito a salarios, horas de trabalho, preços e qualidade de mão de obra, indemnisações a pagar em virtude de estipulações de contratos, compensações por motivo de modificação nas indicações de trabalho, e em geral a todas as contestações que se levantem entre patrões e operarios ou empregados, no que respeita a quaesquer convenções entre elles estipuladas.

§ unico. São igualmente da competencia dos tribunaes arbitros as contestações, no exercicio da sua industria, entre operarios ou empregados, trabalhando para o mesmo patrão.

Art. 9.° É livre às partes, qualquer que seja a importância do litigio, reconhecer previamente a competencia do tribunal, e sujeitar-se às suas decisões.

§ unico. A incompetencia deve ser allegada antes de começar a audiencia do julgamento em primeira instancia. Começada sem essa allegação a referida audiencia, têem as partes que sujeitar-se ás decisões do tribunal, que são executarias, salvo a garantia de serem as causas julgadas em tres instancias, nos termos do artigo 5.° do presente projecto de lei.

Art. 10.° O juizo de conciliação ou primeira instancia, é composto de um patrão e de um operario, nomeados para cada causa pelo presidente do tribunal. Cada um d'estes dois membros preside alternadamente ás audiencias, começando pelo mais velho ou pelo que foi tirado á sorte, no caso de igualdade de idade entre os mais velhos.

Art. 11.° O juizo arbitral ou segunda instancia é composto do todos os membros do tribunal arbitro, exceptuando os que fizerem parte do tribunal de appellação.
Esta instancia julga as causas que não poderem ser resolvidas amigavelmente no juizo de conciliação.

§ 1.° O presidente do juizo arbitral é o presidente do tribunal arbitro ou quem as suas vezes fizer.

§ 2.° As audiencias do juizo arbitral são publicas. As partes interessadas pleiteiam pessoalmente ou por meio dos seus representantes perante o tribunal.

Art. 12.° Das decisões do juizo arbitrai ha sempre recurso para o tribunal de appellação.

§ 1.° As audiencias do tribunal de appellação são igualmente publicas.

§ 2.° Das decisões do tribunal de appellação não ha recurso.

Art. l3.° Cada tribunal arbitro fará os seus proprios regulamentos, assim como os regulamentos a observar nas audiencias das tres instancias.

Art. 14.° Uma lei complementar estatuirá sobre o modo de eleição e capacidade, eleitoral do presidente, vice-presidentes e membros dos tribunaes arbitros, sobre as operações que dizem respeito á organisação d'estes tribunaes, sobre o processo especial a seguir era cada uma das instancias, sobre á gratificação que tem de receber cada membro do tribunal, assim como o presidente e os vice-presidentes, sobre as garantias que lhes devem, ser concedidas, finalmente, sobre as isenções de que devem gosar os referidos tribunaes.

Art. 15.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Lisboa e sala das sessões da camara, 23 de abril de 1887. = O deputado por Lisboa, Z. Consiglieri Pedroso.»

Obedecendo á minha declaração de ha pouco, limito-me por agora unicamente a ler o projecto, e a sobre elle fazer brevíssimas considerações, para o fundamentar.

Como v. exa. e a camara vêem, este projecto de lei pôde, ou melhor, deve ser considerado como um projecto de ordem publica!

Os successos que ultimamente se deram e se aggravaram na cidade do Porto, entre os operarios manipuladores de tabaco e os directores da companhia nacional, vieram tristemente levantar, no nosso paiz e no seu estado agudo, um problema que lá fóra preoccupa todos os estadistas dignos d'este nome, e que merece a attenção de todos os parla-

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mentos, a ponto de occupar larguissimo espaço na maior parte dos codigos, não só de direito commum, mas ainda de direito industrial, propriamente dito, como por exemplo, na Allemanha, e especialmente na Suissa. Nos Estados Unidos, em virtude das recentes greves que ahi tiveram logar, as legislaturas de varios citados, que se e reuniram em 1885 e 1886, julgaram do seu dever votar immediatas medidas relativas á creação de tribunais mixto de operarios e patrões.

Quatro estados, sobretudo, Iowa e Kansas, no oeste, acompanhados pelos dois grandes estados manufactureiros do leste, Massachusetts e New-York, distinguiram-se n'este empenho, dedicando o trabalho das suas legislaturas á organisação de leis instituindo tribunaes arbitros para as mais importantes industrias. Escuso de encarecer aqui, neste momento, pois ficará isso reservado para quando se discutir o meu projecto de lei, as vantagens das tribunaes a que me estou referindo. Bastará indicar rapidamente os paizes que já os têem admittido na sua legislação sobre o trabalho.

A França conhece os tribunaes arbitros, ou conseils de prud'hommes, desde 1806. Por diversas vezes tem modificado a legislação a este respeito, no sentido de os aperfeiçoar e de lhes augmentar as attribuições. Ainda ultimamente os creou para a Algeria. A Bélgica instituiu estes tribunaes em 1859. Na Allemanha existem quasi que desde o começo do seculo. A Hungria creou-os em 1872, emquanto que a Austria, propriamente dita, já os tinha creado em 1869. A Inglaterra ainda em 1867 votou uma lei a este respeito. Na Italia o governo, em 1883, formulou uma proposta para a creação dos tribunaes de probi viri (homens probos). Na Suissa, finalmente, existem estes tribunaes, sendo uma das leis mais perfeitas, que sobre taes instituições conhecemos, a recente do cantão de Genebra.

Em Portugal, um ministro que não pertence a esta casa de parlamento, mas que tenho o gosto de ver n'este momento presente, o sr. Thomás Ribeiro, n'um conjuncto de medidas que trouxe á camara dos senhores deputados, em janeiro de 1886, apresentou uma, com respeito á creação de tribunaes arbitros avindores.

A apresentação do meu projecto de lei equivale a dizer que, embora acceitando em principio as idéas d'aquelle ministro, eu não estou de accordo no modo como s. exa. entendia praticamente dever realisar essa reforma. Não quero affirmar que a letra do meu projecto tenha attingido a maxima perfeição, e que ella não seja susceptivel de receber todos os melhoramentos que esta assembléa entender dever introduzir-lhe; mas, pela minha parte, creio que ella realisa, melhor que nenhuma outra, o desideratum que se tem em vista.

Em todo o caso já será importante a adopção das linhas geraes em que se funda o projecto, que acabo de ler, e por isso, com toda a confiança entrego á sabedoria da camara e ao seu patriotismo, porque é uma questão de ordem publica, o concorrer para pacificamente se resolverem os conflictos que surgem das relações do capital com o trabalho.

Uma boa lei é superior a todas as medidas policiaes mesmo quando sejam prudentemente tomadas, e no seu emprego não haja abusos! (Apoiados.)

A apresentação, pela minha parte, de um projecto de lei d'esta ordem, não faz mais do que obedecer ao programma que a mim proprio tracei, desde o primeiro dia em que tive assento n'esta casa, de cumulativamente com projectes politicos, propriamente ditos, occupar-me das questões sociaes, cuja resolução traduz e define melhor a maneira como entendo que o meu ideal de governo póde algum dia vir a realisar-se n'este paiz.

D'esta fórma, creio ter a adhesão, não só de todos os meus correligionarios, mas tambem de um grupo importante da maioria, que constantemente affirmou, quando opposição, serem as questões sociaes as primeiras que devera ser attendidas, e aquellas sobre as quaes, exclusivamente, deve recair a attenção do parlamento. A esse grupo, que até tem representantes nos bancos do governo e com o qual não podem deixar de ser solidarios os restantes membros da maioria, pelas relações politicas que os ligam, recommendo eu particularmente o meu projecto.

Approve-o, embora emendando-o, só pôóde, esta camara, e terá contribuido para que a paz, tão imprudentemente perturbada pelas veleidades dos monopolistas de um ministro, renasça entre o capital e o trabalho, estes dois elementos indispensaveis da producção da riqueza nacional.

Disse.

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de. S. Januario): - Espero que ainda hoje o sr. presidente do conselho compareça para responder ás observações do sr. Consiglieri Pedroso.

Eu estive ha pouco com s. exa. e affirmou-me que vinha hoje á camara; e seguramente alguma cousa de urgencia o tem retido na secretaria por mais tempo e tem obstado a que elle ainda não esteja presente.

E permitta-me o sr. Consiglieri Pedroso que eu lhe diga, com toda a urbanidade, que os ministros nem começam a fugir da camara, como s. exa. disse, nem hão de fugir nunca. (Apoiados.)

Nos dias em que tenho vindo á camara tenho encontrado aqui quasi todos os meus collegas e hoje por acaso só eu é que estou aqui representando o ministerio.

Entretanto creia o illustre deputado que eu e os meus collegas havemos de estar presentes sempre n'esta camara para responder a tudo quanto seja necessario, cada um pela sua pasta, e pela responsabilidade que tem perante o parlamento. (Apoiados.)

Esteja, o illustre deputado na certeza de que todos os meus collegas, e cada um de per si, quando esteja annunciada qualquer discussão sobre assumpto que dependa do seu ministerio, hão de apresentar-se opportunamente para responder. (Apoiados.)

O sr. Alfredo Pereira: - Mando para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes declarando vagos os circulos n.ºs 15, 29 e 39.

Peço a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se permitte que, dispensando-se e regimento, este parecer entre desde já em discussão.

Dispensado o regimento, foi lido na mesa e approvado o seguinte

PARECER

Senhores. - Á vossa commissão de verificação de poderes foram presentes dois officios da camara dos dignos pares do reino, participando terem tomado assento n'aquella casa do parlamento os exmos. srs. Henrique de Barros Gomes, deputado pelo circulo n.° 15 (Montalegre) e José Luciano de Castro, deputado pelos circulos n.ºs 29 (Marco de Canavezes) e 39 (Anadia).

Por este motivo é a commissão de parecer que sejam declarados vagos os tres respectivos circulos, para todos os effeitos.

Sala da commissão, 23 de abril de 1887. = José Maria de Andrade = Baptista de Sousa = Dr. Oliveira Valle = Antonio Lucio Tavares Crespo = Alves da Fonseca = Alfredo Pereira.

O sr. Alves da Fonseca: - Mando para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes sobre o requerimento que foi apresentado para ser remettido ao tribunal o processo da eleição do circulo n.° 27 (Felgueiras), a fim de seguir os tramites legaes.

Foi a imprimir.

O sr. Urbano de Castro: - Mando para a mesa uma justificação de faltas.

O sr. Presidente: - Seguia-se com a palavra o sr. Marçal Pacheco, que a pediu para quando estivesse presente o sr. ministro da guerra.

Vou porém lembrar ao sr. deputado o que dispõe o re-

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gimento com relação ao pedido da palavra para quando esteja presente qualquer ministro.

Diz o artigo 65.°:

«Depois da leitura da acta, e de terminarem os incidentes, que lhe disserem respeito, os trabalhos da camara proseguirão na ordem seguinte:

«1.° Communicações feitas á camara pelo presidente;

«2.° Leitura ou menção da correspondencia;

«3.° Leitura ou menção de representações dirigidas á camara;

«4.° Approvação de ultimas redacções;

«5.° Segundas leituras dos projectos de lei, e de propostas e requerimentos de deputados, que dependerem de resolução da camara;

«6.° Apresentação de propostas de lei pelo governo;

«7.° Apresentação de pareceres de commissões;

«8.° Concessão da palavra aos deputados inscriptos para antes da ordem do dia;

«9.° Ordem do dia.

«§ unico. O presidente, antes de se entrar na ordem do dia, poderá dar a palavra, segundo a ordem da inscripção áquelles deputados, que a pedirem para quando estiver algum dos ministros.»

Por consequencia ha uma inscripção especial, e eu só posso dar a palavra ao sr. deputado depois de terem usado da palavra todos os srs. deputados que se inscreveram para antes da ordem do dia.

Tem a palavra o sr. Pinheiro Chagas.

O sr. Pinheiro Chagas: - Desisto da palavra, mas permitta-me v. exa. que lhe diga que a interpretação que v. exa. dá ao regimento é contraria ás praxes seguida n'esta casa. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - Eu não me posso regular pelas praxes, porque não tenho a honra ha muito tempo de fazer parte do parlamento.

Regulo-me pelo regimento, que não tem outra interpretação; entretanto a camara póde fazer-lhe as modificações que entender.

O sr. Victor Sequeira: - Mando para a mesa quatro requerimentos de officiaes de engenheria, que reclamam contra o decreto de 24 de julho de 1886.

Reservo-me para em occasião opportuna apresentar á camara as considerações que tenho a fazer sobre as rasões que têem os requerentes.

Apenas n'esta occasião eu recordarei á camara uma circumstancia, que me parece curiosa, e que se refere a este assumpto.

O sr. ministro das obras publicas, no relatorio que precede o decreto de 24 de julho ultimo, declara que a principal rasão por que publica aquelle decreto, é por desejar ver acabada ou terminada completamente a velha questão da divergencia entre os engenheiros civis e os engenheiros militares.

E um jornal, que todos nós conhecemos como muito affecto ao sr. ministro das obras publicas, ou que é considerado assim por todas as pessoas que lidam na política, chegou a referir esta phrase - que os engenheiros militares seriam muito ingratos se não considerassem um tal decreto como uma bandeira de paz, que acabava todas as questões.

Sobre esta questão é que eu hei de fallar, quando vier a discussão do projecto para serem convertidos em lei os decretos da dictadura, mas fica já demonstrado, que na opinião do jornal do sr. ministro das obras publicas ha uma corporação que é verdadeiramente ingrata, qual é a dos officiaes de engenheria.

O sr. Franco Castello Branco: - Mando para a mesa dois requerimentos, pedindo esclarecimentos, pelo ministerio das obras publicas.

E mando mais duas representações, uma de Francisco Antonio Alvares Pereira, tenente coronel de engenheria, e outra de Pedro Antonio Salema Garção, tenente de engenheria, reclamando contra a organisação dos serviços technicos do ministerio das obras publicas, approvada por decreto de 24 de julho ultimo.

Os requerimentos são os seguintes:

(Leu.)

Vão no logar competente.

O sr. Presidente: - Estando esgotada a inscripção para antes da ordem do dia, tem agora a palavra o sr. Marçal Pacheco, que a pediu para quando estivesse presente o sr. ministro da guerra.

O sr. Marçal Pacheco: - Tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro da guerra, e vou chamar a attenção de s. exa. e da camara para um facto que reputo da maior importancia.

Sr. presidente, ha alguns tempo a esta parte que se têem dado taes actos de indisciplina do exercito que, não só têem merecido a attenção publica, mas até causado viva impressão no paiz.

Ainda ha pouco tempo a capital presenceava cheia de espanto e commoção as arruaças feitas pelos soldados de artilheria e da guarda municipal, conflicto este que se demorou por alguns dias, sendo necessario vir a marchas forçadas do Porto, o general José Paulino de Sá Carneiro para apasiguar as partes irritadas.

Ainda bem estes conflictos não tinham acabado, ainda não tinham cessado os motivos que lhes deram origem, quando a imprensa periodica noticiava a existencia de novos conflictos que successivamente se deram pela ordem por que os vou enumerar.

(Leu.)

Se a tudo isto se juntar a narração dos factos que têem sido feita pela mesma imprensa periodica, e a narração que hontem aqui foi feita pelo sr. Teixeira de Sampaio, era que appareceram soldados, encarregados de velar pela ordem publica, pondo-se ao serviço dos arruaceiros para evitar que a opinião dos cidadãos se manifeste com toda a liberdade por occasião das eleições; e se v. exa. ainda acrescentar que alguns d'estes militares o fizeram por promessas de dinheiro, caso que é gravissimo, (Apoiados.) e se a tudo se juntar ainda o que succedeu em Ovar, em que outros militares com o que menos se importaram foi com a manutenção da ordem...

O sr. Barbosa Magalhães: - Peço a palavra.

O Orador: - Com o que menos se importaram, dizia eu, foi com a manutenção da ordem, e trataram unicamente de fazer parte de corrilhos facciosos, que na localidade dirimiam as suas contendas.

V. exa. e a camara bem vêem que isto mostra um symptoma de indisciplina e de desorganisação do exercito, a que é preciso dar prompto remedio desde já com promptas providencias. (Apoiados.)

Sr. presidente, v. exa. e a camara sabem que as revoltas militares são das mais funestas consequencias. (Apoiados.) Ellas fazem retrogradar o adiantamento da civilisação de um povo por muitos annos e às vezes por muitos seculos.
(Apoiados.)

Portanto é preciso evital-as a todo o custo, (Apoiados.) porque temos presente ao nosso espirito as consequencias funestas do que se tem passado na nossa vizinha Hespanha, durante um largo espaço de tempo retalhada por successivas revoltas militares. (Apoiados.)

Mas, se isto é mau, cousa peior ainda existe no exercito. São os motins militares, as arruaças militares, e estas têem-se dado em larga escala. (Apoiados.)

É pois necessario que o sr. ministro da guerra ponha de uma vez cobro a esta situação, que é desgraçadissima para o paiz, porque o exercito não pertence ao partido progressista nem ao partido regenerador; pertence á nação, (Apoiados.) e é preciso cercal o de todo o prestigio e respeito, para que elle possa cumprir a sua nobilissima missão de manter a ordem, e ser o mais bello e seguro esteio das instituições e do paiz. (Apoiados.)

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Ao sr. ministro da guerra cumpre, hoje mais que nunca, voltar para este ponto especial a sua attenção; porque s. exa. não se deve illudir ácerca da situação que occupa no ministerio.
Tenha em conta o sr. ministro da guerra, que não ha n'estes factos assentadas bases, que se vejam, mas ha intenções mais ou menos vagas, que existem na sombra, que de ha muito se vão pronunciando, pouco a pouco, e já ninguem póde duvidar d'ellas. S. exa. não deve ter, nem póde ter, n'este momento a menor duvida, nem sentir o menor equivoco ácerca do calor e temperatura que o rodeia. Basta attentar no facto que hontem aqui se deu.
O facto que hontem se deu e grave (Apoiados.) e accusa esta situação que acabo de referir, contra a qual precisa o sr. ministro da guerra precaver-se, acautelar-se. Diz-lhe isto, não um membro da opposição, que falla d'este logar, mas uma voz imparcial.
(Interrupção.)
Creio que o sr. ministro da guerra não é do meu partido; repito, diz-lhe isto uma vez imparcial que deseja que o sr. ministro da guerra cáia de pé, não consentindo que o empurrem.
V. exa. sabe, e sabem aquelles menos versados na economia, na phisiologia especial do regimen interno da camara, que as commissões de importancia, referentes aos ministerios, são sempre eleitas em harmonia e accordo com os ministros das respectivas pastas. Não ha ninguem que possa ignorar isto, porque, alem de ser uma questão de, necessidade, é uma questão de rasão; e mal se comprehendia que o ministro da respectiva pasta deixasse eleger pela maioria dos seus amigos na camara uma commissão para examinar os seus projectos e as suas medidas sem que de antemão fosse ouvido ácerca das pessoas que a deviam compor. Assim se fez, e é natural que se faça.
Em conformidade com estas praxes, que são aconselhadas pelo bom senso, hontem, como é costume, estava sobre a mesa, onde os srs. deputados vão buscar as listas para votar, esta lista que é lithographada.
(Leu.)
Isto significa a derrota do sr. Avellar Machado.
Esta derrota, e chamo para este porto a attenção especial do sr. ministro da guerra, foi logo, pelo telegrapho, communicada para o Porto, para a Provincia, um jornal que não deixa de ser affecto á situação.
Portanto, Sr. presidente é evidente que esta suppressão do nome do Sr. Avellar Machado foi feita pelos membros da maioria, contra a indicação do Sr. ministro da guerra.
Não me faço cargo de defender o Sr. ministro da guerra.
Não me pertence defendel-a.
Vozes eloquentes o defenderão.
D'onde hão de partir essas vozes não sei ainda.
Os que riscaram o Sr. Avellar Machado, evidentemente queriam ser desagradaveis ao Sr. ministro da guerra; a não ser que se dê uma hypothese, e vem a ser que o Sr. ministro da guerra não do consultado ácerca da organisação d'aquella commissão, o que torna bem mais grave e difficil a situação, porque denota a opinião de que para os assumptos da guerra não é necessario ouvir a opinião do Sr. ministro da pasta respectiva.
Qualquer que fosse a hypothese que se desse, a conclusão séria e necessaria é esta; é que o Sr. ministro da guerra precisa ter muita cautela. (Apoiados.)
Os seus amigos da maioria parece que não gostam muito d'estes casos graves de insubordinação que se te, dado nos corpos do exercito, e vão demonstrando assim, pouco a pouco, de vagar, encobertamente, com uma especie de censuras de capote e lenço (Riso. - Apoiados) a sua má vontade, o seu desagrado para com a pessoa de s. exa. (Apoiados.)
Eu não vinha lamentar a situação de s. exa., mas como critico imparcial, venho dizer a s. exa. que tome nota d'esta situação que se precate, que se acautele, (Apoiado) que veja bem. Acautelem-se os consules.(Apoiados.)
Eu tenho um grande amor pelo bom nome de s. exa., pela sua reputação, (Apoiados) pelo prestigio que a sua pessoa tem no paiz, (Apoiados) pelo seu caracter nobilissimo, (Apoiados) e doer-me-ia muito, doer-me-ia profundamente, não que s. ex.ª. caísse, mas que caísse mal, que fosse empurrado. (Apoiados.)
A maioria diz que sim, a maioria dá-me apoiados!...
Eu felicito-me com isso; mas então o que exprime o facto de hontem?
É possivel que alguem fique a chorar. Então serão outras contas a ajustar e a liquidar não sei com quem; talvez com a consciencia.
Não quero alongar-me em mais considerações a este respeito; tenho dito o bastante, o sufficiente, para tornar a situação clara.
Espero merecer a benevolencia da maioria, do sr. ministro da guerra e da minoria, de quem neste momento represento a opinião (Muitos apoiados.) pelo empenho que tenho de que o caracter do sr. ministro da guerra não soffra uma offensa tão grave, como seria sair s. exa. d'essas cadeiras por uma fórma menos correcta, menos nobre ou menos digna.
(O sr. deputado não reviu as notas tachygraphicas do seu discurso.)
O sr. Ministro da, Guerra (Visconde de S. Januario): - Sr. presidente, são de duas ordens os factos expostos pelo illustre deputado e meu amigo o sr. Marçal Pacheco. O primeiro é com relação á indisciplina em que, na opinião de s. exa. se encontra hoje, ou está proximo a encontrar-se o exercito portuguez; o segundo é com relação ao incidente occorrido na eleição da commissão de guerra, realisada hontem.
Vou responder summariamente a esses dois pontos.
S. exa., para fundamentar a sua opinião a meu ver arriscada e perigosa, de que o exercito portuguez está indisciplinado, fez a resenha de quatro ou cinco factos...
O sr. Marçal Pacheco: - Foram dez.
O Orador: - Acceito que fossem dez.
Dizia eu, de dez factos de conflictos de maior ou menor importância havidos, ou entre a tropa e a população civil em certas localidades, ou entre praças de differentes corpo entre si.
S. exa. quer tirar dos conflictos mais ou menos importantes que se deram a conclusão de que o exercito portuguez, ou está indisciplinado, ou caminha para esse estado.
Nego-o! (Muitos apoiados.)
O exercito portuguez tem cumprido, e ha de cumprir sempre com os seus deveres, sujeitando-se, como se tem sujeitado, aos deveres da disciplina. Um facto isolado, occorrido aqui ou acolá, não póde servir de argumento para se dizer que o exercito em geral está indisciplinado.
S. exa. fez a resenha de todos os factos occorridos durante mais ou menos o anno da gerencia deste ministerio.
O sr. Marçal Pacheco: - Em menos de seis mezes.
O Orador: - Creio que alguns dos factos a que s. exa. se referiu se passaram ha mais de seis mezes, mas acceito tambem seis mezes; esses factos são de mais ou menos importancia, e alguns de importancia tão somenos que bastaram algumas providencias insignificantes para os corrigir immediatamente.
Se eu fizesse a resenha dos factos de conflictos e indisciplina militar occorridos em periodos já passados, se tivesse occasião no meu gabinete de tomar os apontamentos necessarios para referir a esta camara quantos factos d'estes se tinham, dado nas gerencias anteriores, não digo que fossem em maior numero, mas a media naturalmente era a mesma.
Assim como os meus antecessores empregaram todos os esforços para sustentar a disciplina no exercito, tambem eu os emprego, e se elles tinham sido auxiliados pelos commandantes dos corpos e por toda a officialidade para man-

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terem essa disciplina, tambem eu tenho sido auxiliado do mesmo modo para continuar a mantel-a.

Logo, não havia rasão para que houvesse divergencia n'este sentido, apresentando-se muito maior numero de factos symptomaticos de uma precipitada decadencia no exercito n'esta epocha, em comparação das epochas anteriores. O que eu posso dizer a s. exa. é que cada um desses factos foi immediatamente seguido das providencias necessarias, não só para o restabelecimento da ordem e da disciplina onde ella foi affectada, mas tambem para o levantamento dos respectivos autos, o emprego emfim de todas as medidas, que os regulamentos e as leis militares auctorisam para que estes factos fossem corrigidos, a disciplina restabelecida em toda a sua plenitude, e os criminosos devidamente castigados, quer fossem officiaes de qualquer graduação, quer fossem praças de pret. (Apoiados.)

O nobre deputado não póde citar-me nenhum facto de indisciplina militar, que não fosse immediatamente seguido do devido correctivo.

Na torre de S. Julião deu-se um facto de indisciplina por parte do destacamento, que ali estava de guarnição, e que pertencia ao regimento de infantaria n.° 21. Mandaram-se levantar logo os respectivos autos, duas horas depois do acontecimento o commandante da divisão comparecia na torre de S. Julião, e logo apoz um regimento de cavallaria e um regimento de infanteria, para auxiliar, se fosse necessario, a manutenção da ordem n'aquella praça de guerra.

Não foi necessario porque o acto de indisciplina limitou-se, e quando digo limitou-se, não o quero absolver, porque como acto de indisciplina teve tanta gravidade como qualquer outro, mas digo, limitou-se a algumas vozes dadas pelos soldados do destacamento, ao toque de recolher, manifestando o desejo de voltarem para o seu quartel, porque o destacamento fôra muito prolongado. E porque foi tão prolongado esse destacamento, alem do que devia ser e costuma ser? Foi pela falta, que se encontra em todas as divisões militares, de praças suficientes nos corpos para que opportunamente sejam rendidos os destacamentos, em conformidade com os regulamentos.

E essa falta vem de longe, e vem principalmente da organisação do exercito de 1884 (Apoiados.) para a qual aliás eu collaborei, a qual aliás eu defendi, mas é uma consequencia natural d'essa organisação, defeito que eu apontei logo de principio, mas que é facil de corrigir. Desde que era augmentado o numero dos corpos, devia augmentar-se logo a respectiva verba orçamental, para que os contingentes annuaes podessem ser maiores, e para que, em logar de ser o effectivo do exercito de 22:000 praças, fosse de 25:000 ou 26:000, isto é, que se elevasse proporcionalmente a força, que já então era defficiente, de maneira que podessem ser convenientemente preenchidos os quadros dos corpos, não só os antigos mas os novos.

Como disse, este defeito é facil de corrigir, e eu apontei-o desde o principio. Basta votar uma verba mais avultada para o effectivo do exercito. Isto julgo eu necessario, e até indispensavel; e se agora não o proponho, é porque não quero de algum modo ir embaraçar, o meu collega da fazenda no empenho em que está de equilibrar a receita com a despeza. Entretanto é de esperar que este defeito venha a ser remediado, augmentando-se o effectivo dos corpos, de maneira que o numero de praças seja suficiente, não só para os multiplicados serviços, que d'ellas são exigidos, e alguns d'elles de natureza administrativa e policial, mas tambem para os corpos terem um numero de praças necessarias para receberem a devida instrucção.

Deu-se por consequencia por este motivo aquelle acto de insubordinação no destacamento da guarnição da torre de S. Julião da Barra.

As providencias foram tão promptas, que esse facto não teve a menor consequencia. Levantaram-se os competentes autos, e aquelles que se acharam implicados n'elles foram devidamente punidos, e um alferes, que se suppunha ser o instigador d'aquelle acontecimento, sendo encontrado num estado que é punido pelos regulamentos disciplinares, foi castigado com seis mezes de inactividade temporaria. Assim se deu o correctivo necessario para que factos d'estes não tornassem a repetir-se.

Os outros factos referidos por s. exa. e que chegaram opportunamente ao meu conhecimento, por participação das auctoridades militares, foram igualmente apreciados por indagações e syndicancias, sendo corrigidas todas as faltas que se deram por essa occasião. Ainda hoje estão cumprindo pena maior ou menor as praças ou os officiaes que foram implicadas n'estes acontecimentos; aquelles que pela natureza mais grave do crime que commetteram tiveram de responder a conselho de guerra, os seus processos correm os tramites competentes, não podendo asseverar que já estejam condemnados, porque isso depende dos tribunaes.

Com relação ao facto que se deu em Extremoz, se s. exa. consultar a ordem do exercito que foi publicada hoje, verá que ao commandante do destacamento de artilheria, por ter infringido os preceitos militares, deixando entregue ao sargento a pequena distancia do quartel o destacamento que retirava de Vendas Novas, foi imposta a pena de inactividade temporaria por tres mezes, depois de averiguado que tivera havido uma irregularidade grave do regulamento disciplinar.

Isto é para provar a s. exa. que, se se têem dado alguns casos de indisciplina, têem sido corrigidos devidamente, tendo-se feito as syndicancias, levantado os competentes autos, e emfim, tudo o que se costuma fazer nestas circumstancias.

Note-se que o numero de casos que se têem dado não é superior aos que tem havido n'outras epochas em igual periodo.

Repito, se eu fizesse uma resenha logo que dispozesse dos documentos necessarios, para provar que em períodos anteriores e iguaes tem havido o mesmo ou maior numero do factos, ficaria s. exa. convencido de que não é na epocha actual que se dão casos mais frequentes, e nesse caso não incriminaria o exercito de uma indisciplina geral, que está muito longe de existir. (Apoiados.)
Com relação aos factos ultimamente occorridos em Chaves, têem-se tomado as providencias que é costume adoptar em taes circumstancias.

O facto foi grave pelas suas consequencias, mas não accusa uma indisciplina inveterada, como seria para lastimar, nas praças do exercito.

S. exa. sabe, pelo relatorio que vem nos jornaes, que é o mesmo que coincide com a participação oficial, que recebi, que costuma haver uma romaria, muito concorrida, nas proximidades de Chaves, e onde ordinariamente ha desordens promovidos pelos individuos da classe civil entre si, ou entre militares e civis, ou entre as praças dos dois corpos, que compõem a guarnição d'aquella praça de guerra. Um conflicto d'esta natureza nasce occasionalmente por uma circumstancia, que não se póde prever, muitas vezes de pequena importancia. Mas infelizmente quando estão em presença uns dos outros, praças de differentes regimentos, ha um falso espirito de camaradagem, que leva a congregar as praças d'esse mesmo regimento contra as praças de outros regimentos, para tirar desaffronta de suppostas offensas. Infelizmente este facto tem-se dado muitas vezes, não só neste paiz, mas em todos os paizes. Não ha nenhuma nação que soja isenta d'estas occorrencias, que aliás são para lastimar, que não se podem prevenir, mas que compete coagir, como se tem feito entre nós. (Apoiados.)

S. exa. referiu-se aqui aos acontecimentos de Lisboa em junho do anno passado, entre praças do regimento de artilharia n.° 1 e a guarda municipal. Esses conflictos, que foram lamentaveis, não tiveram, felizmente, consequencias fataes; principio da disciplina fez-me manter por todos os meios do alcance das auctoridades militares. E se pos-

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teriormente a esses acontecimentos veiu para Lisboa o general José Paulino de Sá Carneiro, que estava commandando a terceira divisão militar, não foi de certo para apaziguar esses tumultos, pois que, quando o general Henrique José Alves com manda vá, estavam completamente serenados. Se o general José Paulino de Sá Carneiro veiu de preferencia a outro qualquer, é porque é o general de divisão mais antigo; se não é systema sempre seguido, entendo que o devia ser, o commandante da divisão mais importante, que é a primeira divisão militar, deve ser o general de divisão mais antigo. Por isso veiu o sr. Sá Carneiro.
O illustre deputado, candidato por Alijo, ao defendei hontem a sua eleição, referiu factos que são de bastante gravidade, não só para a responsabilidade do official a quem aquelle candidato se referiu, mas tambem para a honra para o brio da classe a que esse official pertence. Eu, ministro da guerra, se estivesse presente, quando s. exa. fez essa referencia, não deixaria de declarar, que tomaria as providencias que fossem necessárias para corrigir tão grave falta, como procuraria ao mesmo tempo afastar da corporação brilhante dos officiaes do exercito a arriscada asserção que s. exa. fez; e digo arriscada, se s. exa. não provar cabalmente a gravidade d'aquella accusação. (Apoiados.) Dito isto, passarei á segunda parte da asserção do illustre deputado, o sr. Marçal Pacheco.
Eu maravilho-me da importância que S. exa. e a opposição querem dar a este facto, e que em minha consciencia e perante os meus melindres não posso dar-lhe. (Apoiados.)
Eu tinha indicado os nomes de alguns dos officiaes do exercito, que são deputados da nação, para comporem a commissão de guerra; mas tinha indicado esses nomes sem conhecer precisamente o numero de membros de que devia compor-se essa commissão.
Entre os nomes dos officiaes que indiquei para a commissão, figurava de certo o nome do sr. Avellar Machado, por quem tenho toda a consideração, e, se não me engano, tinha tambem indicado mais alguns srs. deputados da opposição.
Ora, sendo maior o numero de deputados por mim indicado para compor a commissão de guerra, do que aquelle que era necessário, porque não tinha n'aquella occasião conhecimento do numero preciso, e não estando eu presente na occasião em que se fez a eleição, porque só entrei na camara depois da eleição terminar, podia lamentar, como lamento, que o sr. Avellar Machado não tivesse sido eleito para essa commissão, mas não podia estranhar esse facto, porque desde que indiquei maior numero de membros, claro é que alguns d'elles haviam de ficar de fora.
Eu não podia entrar na consciência da maioria da camara, para poder apreciar, condemnando ou louvando, o modo como ella procedeu.
Se eu tivesse indicado precisamente, numero de nomes de deputados para comporem esta commissão incluindo nesse numero o nome do sr. Avellar Machado, ou o de outro qualquer deputado da opposição, ou da maioria, e esse nome fosse cortado, de certo eu não ficava em boas relações com a maioria da camara; mas desde o momento em que eu apontei para essa lista um maior numero de nomes, não posso estranhar que tivessem cortado três ou quatro, os que fossem a mais para ficar a lista completa, e nesses nomes fosse incluído o do sr. Avellar Machado. O sr. José Castello Branco: - O nome do sr. Avellar Machado não foi cortado por estar a mais na lista, foi substituído por outro.
O Orador: - Eu asseguro que não tive conhecimento da lista lithographada senão quando entrei na camara, já depois de concluida a eleição, e tenho a convicção de que não foi por menos consideração que a maioria tivesse pelo ministério, que se cortou o nome do sr. Avellar Machado, mas porque eu tinha apontado maior numero de nomes do que aquelle que era necessário.
Auctorisei as pessoas a quem dei esses nomes a comporem a lista da commissão e subi á presidência e pedi-lhe que no começo da sessão seguinte se elegesse a commissão de guerra.
Tencionava vir a tempo á camara, mas, infelizmente, quando cheguei já a commissão estava eleita e não fiz correcção alguma. Deixei toda a liberdade á maioria da camara e não me julgo offendido pelo facto de entre três ou quatro nomes que estavam cortados, porque estavam a mais, se achar comprehendido o sr. Avellar Machado. Lastimo isso sinceramente, porque, alem da consideração pessoal que tenho pelo illustre deputado, s. exa. é um distincto e excellente chefe de uma das repartições do ministerio da guerra. (Apoiados.)
Estou convencido de que, se á commissão de guerra, depois de installada, parecer opportuno e conveniente st r auxiliada pelas luzes de s. exa. ou de qualquer outro sr. deputado, quer da maioria quer da opposição, ella se apressará certamente, no uso das suas faculdades, a pedir á camara que lhe seja aggregado.
Nada mais tenho a dizer senão que não posso considerar me mal com a maioria por ter comprehendido no corte de quatro ou cinco nomes a mais o do sr. Avellar Machado, o que de certo não representa tambem da parte della uma desconsideração para com s. exa. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas do seu discurso)
O sr. Abreu e Sousa: - O sr. deputado Marcai Pacheco, ao fazer a enumeração dos conflictos que ha seis mezes a esta parte se têem dado no exercito, pareceu querer lançar sobre o governo a responsabilidade de factos, que me parece elle não tem.
A disciplina do exercito creio que não se perde num dia nem se restabelece noutro. (Apoiados.) A disciplina é um facto complexo, que deriva de muitos e diversos factores.
Parece-me, pois, que da parte de s. exa. houve uma verdadeira injustiça para com o governo, attribuindo-lhe uma culpabilidade que se lhe não póde imputar.
Estes casos, que se têem dado, são casos verdadeiramente esporádicos e nada significam em relação á disciplina do exercito. Posso até dizer a v. exa. que um dos factos apontados pelo illustre deputado, a recente insubordinação de alguns soldados de cavallaria n.° 6, póde elle mesmo levar á conclusão de que o exercito portuguez é altamente disciplinado. Vou dizer a rasão.
Um certo numero de soldados de cavallaria n.° 6 insubordinaram-se. (Interrupção.)
Perfeitamente, o sr. ministro da guerra já o declarou, é o seu dever, punir os criminosos.
Como ia dizendo a v. exa., desse mesmo facto tiro eu a conclusão de que o exercito é altamente disciplinado.
V. exa. ha de ter conhecimento da narração, creio que verídica, porque foi extrahida dos jornaes dá localidade, de que a força do regimento de infanteria n.° 19, que estava no forte de S. Neutel, em Chaves defendeu o seu posto a tiro contra os insubordinados; note v. ex.a, contra os seus camaradas. Isto tem muita significação; é um facto que demonstra claramente que aquelle Acontecimento não fez abalar a disciplina do exercito, porque teve iogo o exemplo do contraste, de um lado a insubordinação, do outro o procedimento da guarda do forte, que é altamente significativo do poder da mesma disciplina, que todos sabem respeitar,
(Interrupção.)
Quando quarenta soldados de espada em punho pretendiam invadir o forte de S. Neutel, que estava guardado por três soldados e um cabo, qual era o dever d'esta força senão recebel-os a tiro?
Muita prudência teve o commandante d'ella em mandar primeiro uma descarga com pontarias altas. Não fez;

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mais do que cumprir o seu dever, se os factos só passaram como contam os jornaes.

Está-se procedendo a uma syndicancia, essa syndicancia ha de vir para o ministerio da guerra e o sr. ministro ha de ter occasião de a apreciar devidamente.

Estes factos são, como disse, esporadicos; e tanto assim é, que antes da subida deste governo ao poder, deu-se um caso notabilissimo do insubordinação em Lisboa no regimento de cavallaria n.° 2, facto que deu logar á dissolução d'esse regimento, e ninguem accusou o sr. ministro da guerra d'essa epocha de concorrer para a indisciplina do exercito.

(Interrupção.)

Foi um unico? Estas cousas não só avaliam pelo numero mas sim pela sua gravidade. São casos que se não podem prever, e quando se dão punem-se severamente, como prescrevem as leis militares. (Apoiados.)

O que eu pretendo fazer ver á camara é que o governo não póde ter a minima responsabilidade destes actos. (Apoiados).

O governo está ha muito pouco tempo sentado n'aquellas cadeiras para se lhe poder fazer uma tão grave accusação.

(Interrupção.)

Não tenho dotes oratorios. Digo francamente a verdade como a entendo, embora desagrade ao illustre deputado.

É certo que ha uma causa predominante que concorre um pouco para enfraquecer a disciplina nas fileiras do exercito, é essa a inconveniente reducção da effectivos que a lei de 1884 trouxe aos corpos do exercito; (Apoiados.) não digo que seja a unica causa da indisciplina; mas concorre para um mau estar geral, que só traduz num excesso de serviço que desgosta o soldado e o official, tornando-os talvez menos zelosos no cumprimento dos seus deveres pela quasi impossibilidade de fazerem executar as prescripções regulamentares.

Em todo o caso, eu terei occasião, quando se discutirem assumptos respeitantes ao exercito, de mostrar qual a conducta, em geral, do exercito portuguez. (Apoiados.)

Quando esta camara votar 30:000 homens para o effectivo do exercito em pé de paz, talvez se remedeie uma grande parte d'esses inconvenientes. (Apoiados.)

Em relação ao outro ponto a que o illustre deputado se referiu, creio que o sr. ministro da guerra já deu as explicações mais categoricas; refiro-me ao facto da não eleição do sr. Avellar Machado: entretanto quero apenas dizer duas palavras a esse respeito.

Eu tinha recebido ordem do sr. ministro da guerra para lhe apresentar uma relação de nomes dos membros que podiam constituir a commissão de guerra, n'essa relação estavam incluidos alguns collegas nossos, sem que o podessem estar, porque, não tendo ainda prestado juramento e tomado assento na camara, ainda não faziam parte d'ella. Lembro-me, por exemplo, do sr. Thomás Bastos, que vinha incluido na relação e que por advertencia da exma. mesa tive de riscar e substituir.

Tinham portanto ficado definitivamente na lista dos onze membros da commissão os nomes dos srs. Figueiredo Mascarenhas e Avellar Machado. Ora quando primeiro se tinha feito esta lista, creio que não havia ainda tomado assento n'esta casa um outro nosso distincto collega e camarada, o sr. Lucena e Faro, que, como v. exa. sabe, é deputado da maioria, e teve portanto de alterar-se posteriormente aquella lista, substituindo um dos nomes da deputados da opposição pelo do sr. Lucena e Faro.

O sr. ministro da guerra tinha, é verdade, recommendado o nome do sr. Avellar Machado, como chefe de uma das repartições do ministerio da guerra, e por ser um official distincto e da sua confiança; a maioria, porém, para quem não se davam as mesmas rasões, tendo de substituir um dos nomes dos dois deputados da opposição, substituiu o do sr. Avellar Machado e preferiu que ficasse o sr. Figueiredo Mascarenhas.

Creio portanto que não houve desconsideração para ninguem e que todos procederam correctamente, o sr. ministro e a maioria.

Sr. presidente, por ultimo direi a v. exa. que isto é uma verdadeira questiuncula que não devia ter vindo ao parlamento, porque tem uns laivos de questão pessoal e como tal não me pareça bem collocada nesta casa. (Apoiados.)

O sr. Antonio Candido: - Eu pedi a palavra quando o meu sympathico amigo, o sr. Marçal Pacheco, a proposito do facto do se substituir o nome do sr. Avellar Machado na lista da commissão de guerra, se referia ás intenções da maioria para com o sr. ministro da guerra.

A maioria n'este facto não teve á intenção de desconsiderar o sr. ministro da guerra (Muitos apoiados.) nem a podia ter porque o sr. visconde de S. Januario continua a inspirar inteira e completa confiança (Muitos apoiados.), confiança que se torna merecida pelas eminentes qualidades do seu caracter, no que até a opposição lhe faz justiça (Apoiadas.), o pelos serviços da sua honesta, digna, seria e imparcial administração. (Muitos apoiados.)

Eu peço licença para dizer ao meu amigo o sr. Marçal Pacheco que é verdade ter sido cortado o nome do sr. Avellar Machado, já depois de lithographada a lista, mas quando a lista estava em poder de quem a lithographou já tinha mais nomes do que aquelles que o regimento marca para formar a commissão.

(Interrupção.)

Estavam de mais. Tinham sido eliminados alguns nomes e com a organisação definitiva da lista coincidia a entrada na camara de um official de artilheria que tem a confiança da maioria; e era natural que, tendo de ser sacrificados alguns nomes, não fossem os de amigos do governo, mas sim da minoria.
(Apoiados.)

Mas a lista ficava ainda com um representante da minoria, como todas as listas que temos votado, o que não era precedente n'esta casa.

(Interrupção.)

Um facto só, é verdade.

Mas nas commissões eleitas ha dois annos não estava representada a minoria, e este anno em todas as commissões está representada a minoria. (Apoiados.)

E é um pouco extraordinario que o meu amigo, o sr. Marçal Pacheco venha entender como censura encoberta ao sr. ministro da guerra o ter sido tirado da lista da commissão de guerra o nome do sr. Avellar Machado. Parece-me que deste modo as cousas ficam explicadas.

Mas eu não posso deixar de dizer ao sr. Marçal Pacheco que, se s. exa. está disposto a estar á espreita de quaesquer pequenas divergencias apparentes para as annunciar como dissensões profundas entre o governo e a maioria, o trabalho de s. exa. deve de ser fatigantissimo.

É verdade que se lembrou tarde, porque se se lembrasse d'isso na eleição de outras commissões, teria visto que a maioria na eleição d'essas commissões teve por mais de uma vez de riscar uns nomes para os substituir por outros, e até nas propostas do governo a maioria ha de fazer vingar as indicações que julgar mais convenientes.

Parece me que estas palavras devem tranquillisar o animo sobresaltado do meu amigo e fazer-lhe ver que entre o ministerio e a maioria não ha as nuvens que o seu extraordinario animo suspeitou.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - Esqueci-me de agradecer ao illustre deputado, o sr. Marçal Pacheco, a benevolencia das palavras que me dirigiu e os encomios que me fez; agradeço-lhe tambem, ainda que os não julgo necessarios, os conselhos e advertencias que me deu ácerca dos meus collegas e da maioria. Tenho vivido na mais perfeita harmonia com os meus collegas e com a maioria, que começo a conhecer agora; espero vi-

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ver do mesmo modo: e assim termino dizendo ao illustre deputado que os seus conselhos me parecem desnecessarios. (Apoiados.)

O sr. Pinheiro Chagas: - Ouvindo a palavra eloquente do sr. Antonio Candido, fiquei satisfeito com o modo por que concluiu, dizendo que estes incidentes têem-se dado em todas as sessões e hão de ter logar em muitas outras. Esta primeira aos corinthios agradou-me, e o sr. ministro da guerra respondeu perfeitamente ao sr. Antonio Candido, quando disse que era agora que começava a conhecer a maioria.

Eu folgarei muito que continue a manifestar-se esta união intima que ha entre a maioria e e governo, principalmente desde que ella se manifesta pelo mesmo modo que a disciplina do exercito, de um modo um pouco desastroso para aquelles que são victimas da concordia entre a maioria e o sr. ministro da guerra.

Eu demoro-me muito pouco tempo para não cansar a camara e porque isto é um negocio findo. Está concertado.

Não ficou bem concertado; porque a bilha está um pouco rachada; e (Riso) o S. Januario não é Santo Antonio para concertar bilhas. (Riso.)

Mas não se magôe o sr. visconde de S. Januario. Foi comprehendido por todos, porque foi explicado largamente pelos srs. ministro da guerra, Abreu e Sousa e Antonio Candido que houve nomes a mais, que se tiraram nomes de uns, que se pozeram nomes de outros, um modo um pouco esquisito realmente de organisar uma lista. Lembra-me isto o caso succedido num omnibus em que iam de um lado quatro pessoas e do outro tres, e um sujeito passa para o lado aonde íam as trrs para que de um lado não fossem menos pessoas do que do outro. (Riso.)

Assim succedeu com o sr. Avellar Machado, que foi tirado da lista da comissão para a commissão ficar mais pequena e depois foi substituido por outro.

Isto é curioso, mas em summa já sabemos como isto se passou, porque a maioria explicou-o perfeitamente. Mas o que eu desejava saber por fim era quem tinha sido censurado.

Seria quem organisou aquella famosa lista lithographada?

Quem sabe? Talvez fosse o nosso prezado amigo Clemente dos Santos quem apanhasse a censura. (Riso.)

O sr. ministro da guerra agora póde dizer quem foi um pouco melindrado pela maioria.

O sr. Avellar Machado é um dos officiaes mais distinctos, (Apoiados.) e se elle não tivesse prestado bons e relevantes serviços não lhe tinha o sr. ministro da guerra concedido a commenda da muito nobre ordem de Aviz. (Apoiados.) E fez muito bem.

Agora a maioria corta o nome do sr. Avellar Machado!... (Riso.)

Talvez s. exa. tivesse feito bem seguindo o conselho do sr. Marçal Pacheco.

Eu n'isto quiz pôr bem em relevo o que houve de estranho n'este procedimento da maioria, e depois, fallemos clara o seriamente, a maioria quiz positivamente dar um signal de descontentamento ao sr. ministro da guerra, (Apoiados.) e entendeu por conveniencias politicas, que eu não censuro, que devia cortar o nome do sr. Avellar Machado, como está no direito de dizer que isso não envolvia offensa ao sr. ministro da guerra.

Duas palavras apenas para concluir e com relação a outra parte bem importante do discurso do sr. visconde de S. Januario.

A opposição de fórma nenhuma declarou, ou disse, que o nosso exercito estava indisciplinado; nem por sombra se levantou uma unica voz que podesse censurar as nobres qualidades dos soldados e officiaes. O que se lamenta apenas, e eu mostrarei que é preciso tomar conta do modo por que as cousas vão caminhando; o que se lamenta apenas, é que nas regiões superioras da governação nem sempre tivesse havido bastante cuidado. (Apoiados.)

Como se recompensam, e como se punem os actos de disciplina e de indisciplina praticados pelo nosso exercito, e que são, como v. exa. disse, factos que podem repetir-se em todos os regimens e com todos os governos: Mas o que é necessario é que não aconteça aquillo que vou mostrar a v. exa. o que aconteceu ha pouco tempo, a respeito do que talvez s. exa. queira dar algumas explicações.

V. exa. sabe que quando se levantou o conflicto em Bragança, o commandante de caçadores n.° 3 entendeu que devia proceder de um certo modo para manter a ordem e fazer respeitar o direito a quem o tinha: o sr. ministro do reino expediu uma portaria em que condemnava abertamente o procedimento d'esse official. A portaria dizia o seguinte:

(Leu.)

Se este facto censurado era verdadeiro, precisava ter uma punição severa; e o sr. ministro do reino affirmou.

(Leu.)

Que providencias foram estas, de que ninguem teve conhecimento? Como é que este official foi punido, se praticou um acto que tinha sido pouco digno, com se lhe attribue n'esta portaria? Se o não praticou, como é que foi restaurada a sua dignidade, a sua honra militar da affronta que se lhe fez? (Apoiados.)

Como é que o sr. ministro da guerra procedeu neste caso? Eu creio que procedeu como devia, considerando e tratando dignamente aquelle official, que procedeu briosamente. Mas a affronta que lhe foi dirigida n'esta portaria ficou estampada nas paginas do Diario do governo. Aqui está um facto que concorreu para a indisciplina, como outros que, ainda há pouco, foram citados pelo sr. Abreu e Sousa.

Quero apenas acrescentar duas palavras para a confirmação do que digo: os soldados de infanteria n.° 19, disse s. exa., e muito bem, cumpriram o seu dever militar, defendendo o posto que lhes estava confiado.

Sabe v. exa. o que succedeu a estes soldados?

Foram desarmados e presos immediatamente por terem cumprido o seu dever, defendendo o posto que lhes estava encarregado!

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - É negocio que não está liquidado.

O Orador: - Que esperança posso eu ter de se restituir a disciplina ao exercito, quando, depois do ministro da guerra o affirmar tambem, um official tão distincto e illustrado, como o meu amigo o sr. Abreu e Sousa, vem dizer que a causa principal da indisciplina é a sua fraqueza numerica, que vem de um erro da administração anterior!

Se isto é assim, porque é que o sr. ministro da guerra não ousa apresentar uma proposta para acabar com esse erro, para acabar com essa causa de indisciplina?!... (Apoiados.)

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario):- Lá chegaremos.

O Orador: - Lá chegaremos ?!... Pois ha alguma cousa mais urgente do que restabelecer a disciplina do exercito?!..-. (Apoiados.) São mais urgentes, do que restaurar a disciplina do exercito, as reformas dictatoriaes?!... (Apoiados.)

Garanta a vida dos officiaes, garanta a disciplina militar, garanta a honra das instituições militares primeiro que tudo. (Apoiados.)

Pois póde demorar se, por quaesquer circumstancias financeiras, ou não, uma providencia que s. exa. acaba de dizer que é a unica que póde salvar a dignidade, a disciplina e a honra do exercito?!... (Apoiados.)

Venha immediatamente essa providencia. (Apoiados.)

Se, o sr. ministro da fazenda se recusa a acceder a essa necessidade, sáia d'essas cadeiras, porque sáe briosamente, porque sáe dignamente, ou não venha dizer que o unico.

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meio de restaurar a disciplina do exercito é um meio que não póde propor, por ter ao seu lado o sr. Marianno de Carvalho. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas do seu discurso.)

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - Não se póde estar preparado de repente para uma discussão assim, tão vasta, sobre factos que se vão engrenando uns nos outros.

Para apreciar alguns desses factos, e esclarecer a camara a respeito d'elles, seria necessario ver documentos e estar habilitado pela leitura dos processos que se lhes referem.

Só assim se podia expor com toda a clareza o modo por que se procedeu com relação a esses factos e as rasões d'esse procedimento.

No entretanto os factos que têem sido citados estão ainda na minha memoria, e eu posso dizer aos oradores que me precederam o modo por que tenho procedido, de maneira a ser sempre coherente o meu modo de dirigir os negocios da minha pasta.

Com relação aos factos citados pelo sr. Pinheiro Chagas, a respeito dos acontecimentos que tiveram logar em Bragança já ha muitos mezes, direi que, se o coronel de caçadores n.° 3, que é aliás um official muito respeitavel, que é considerado um dos melhores coroneis do exercito, (Apoiados.) sem auctorisação concedida ou sem requisição da auctoridade administrativa, entendeu que, para a manutenção da ordem, lhe era necessario empregar parte da força de que dispunha, eu o que fiz com relação áquelle coronel foi restabelecer os bons principios, (Apoiados.} que, pela sua correspondencia, pareciam ser desconhecidos do mesmo militar.

Elle empregou a força sem lhe ser requisitada pelo governador civil, que estava na localidade; e, na sua correspondencia, diz que, por auctoridade propria, lhe competia, como commandante militar superior das forças ali aquartelladas, o dever de as fazer sair dos quarteis e de as empregar para manter a ordem publica, quando ella fosse alterada, embora lhe não fossem requisitadas pela auctoridade administrativa.

Estes não são os bons principios. (Apoiados.) E o que eu fiz foi restabelecel-os. (Apoiados.)

A força militar não occorre, para manter a ordem publica, quando é alterada, em localidades onde exista a auctoridade administrativa, sem ser requisitada. (Apoiados.)

Póde a auctoridade militar julgar muito opportuno o emprego da força e muito necessario o facto de fazer sair as tropas dos quarteis sem requisição da auctoridade administrativa, quando esta está longe da localidade, mas quando esta circumstancia se não dá, não lhe é licito dispor da força, não se attendendo ás advertencias da auctoridade administrativa, que diz não ser necessaria.

Foi o que fiz, restabeleci os principios. (Apoiados.)

A força militar só sáe dos seus quartéis a reclamação da auctoridade administrativa. (Apoiados.)

Se é esta a advertencia a que s. exa. chama de censura, não sei. Da minha parte não houve mais nada.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas dos seus discursos n'esta sessão.)

sr. Oliveira Valle: - Mando para a meza o parecer da commissão de verificação de poderes sobre a eleição de deputados por accumulação.

Só hoje chegaram as actas de apuramento da Horta, que têem sido a causa da demora na apresentação d'este parecer, e, como a camara vê, tão depressa ellas chegaram immediatamente o elaborámos e apresentámos.

O sr. Presidente: - Como a hora está adiantada vae passar-se á ordem do dia, que alguns srs. deputados da opposição já requereram.

Tenho a participar á camara que de hoje em diante entrarei mais cedo na ordem do dia, porque ha trabalhos muito importantes sobre a mesa, a sessão vae já adiantada e eu não posso estar a prejudicar a discussão dos assumptos que se devem tratar na ordem do dia com os que se tratam antes da ordem do dia.

Aos srs. deputados que desejam occupar-se dos assumptos que não fazem parte da ordem do dia, peço que tenham a bondade de comparecer na camara á hora marcada.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Peço a v. exa. o obsequio de dizer á camara quaes são os deputados que se acham inscriptos sobre este incidente.

O sr. Presidente: - São os srs. Consiglieri Pedroso, Marçal Pacheco, Arroyo e Eduardo Coelho.

O sr. Ministro da Justiça (Veiga Beirão): - Mando para a mesa a proposta de lei relevando ao governo as providencias governativas adoptadas durante o periodo decorrido entre 17 de julho de 1886, e 17 de março do anno corrente.

Peço a v. exa. lhe dê o distino conveniente.

Vae publicado no fim da sessão a pag. 197.

O sr. Ministro da Guerra: - (Visconde de S. Januario). Mando para a mesa uma proposta de accumulação pelo ministerio da fazenda.

Leu-se na mesa. É a seguinte:

Proposta

Senhores. - Em conformidade do artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, pede o governo á camara permissão para que o sr. deputado Ernesto Madeira Pinto, vogal do conselho superior das alfandegas, possa accumular, querendo, o exercicio do seu emprego com o das funcções legislativas.

Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 23 de abril de 1887. = Marianno Cyrillo de Carvalho.

Foi approvada.

O sr. Antonio Ennes: - Pedi a palavra para requerer a v. exa. que a proposta mandada para a mesa pelo sr. ministro da justiça fosse presente a uma commissão especial, que póde ser nomeada agora ou quando v. exa. o julgar conveniente.

Peço a v. exa. a urgencia.

Foi approvada a urgencia. É a seguinte.

Proposta

Requeiro que o projecto de bill de indemnidade seja enviado a uma commissão especial de onze membros, eleita pela camara. = Antonio Ennes.

Foi approvada.

O sr. Presidente: - Proceder-se-ha á eleição da commissão especial na proxima sessão.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Mando para a mesa uma proposta, para que os srs. deputados que exercem funcções dependentes do ministerio das obras publicas, possam accumular, querendo, essas funcções com as de deputados.

Leu-se na mesa. É a seguinte:

Proposta

Senhores. - Em conformidade com o disposto no artigo 3.° do acto addicional, pede o governo á camara dos senhores deputados da nação a necessaria permissão para que possam accumular, querendo, as suas funcções legislativas com as que exercem no ministerio das obras publicas, commercio e industria, os srs. deputados: Tito Augusto de Carvalho, Jorge O'Neill e Julio Goes Pinto.

Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 23 de abril de 1887. = Emygdio Julio Navarro.

Foi approvada.

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ORDEM DO DIA

Eleição de commissões

O sr. Presidente: - Vae proceder-se á eleição das commissões de instrucção publica superior e especial, e instrucção primaria e secundaria.

Convido os srs. deputados a formarem as suas listas.

Feita a chamada e corrido o escrutinio verificou-se terem entrado na urna 58 listas, saíndo eleitos:

Para a commissão de instrucção publica superior e especial os seguintes srs.:

Anselmo de Assis de Andrade .... 58 votos
Antonio Candido Ribeiro da Costa .... 58 votos
Antonio José Ennes .... 58 votos
Antonio Lopes Guimarães Pedrosa .... 58 »
Eduardo de Abreu .... 58 votos
Fernando Matoso Santos .... 58 votos
Joaquim Alves Matheus .... 58 »
José Joaquim Maria de Oliveira Valle .... 58 votos
José Dias Ferreira .... 58 votos
José Frederico Laranjo .... 58 votos
Zofimo Consiglieri Pedroso .... 58 »

Para a commissão de instrucção primaria e secundaria os seguintes srs.:

Albano de Mello Ribeiro Pinto .... 58 votos
João Antonio Pires Villar .... 58 votos
João José de Antas Souto Rodrigues .... 58 votos
Joaquim Antonio da Silva Cordeiro .... 58 »
José Alves de Moura .... 58 votos
José Maria Barbosa do Magalhães .... 58 votos
José Maria de Oliveira Matos .... 58 »
José Simões Dias .... 58 votos
Luiz Augusto da Cunha Mancellos Ferraz .... 58 »
Luiz José Dias .... 58 votos
Pedro Monteiro .... 58 »

O sr. Presidente: - Vae proceder-se á eleição das commissões do ultramar e de negocios estrangeiros.

Convido os srs. deputados a formarem as suas listas.

Feita a chamada e corrido o escrutínio, verificou-se terem entrado na urna 57 listas, saíndo eleitos:

Para a commissão do ultramar os seguintes srs.:

Alfredo C. Brandão .... 57 votos
Alfredo Pereira .... 57 »
Antonio José Ennes .... 57 »
Henrique de Sá Nogueira de Vasconcellos .... 57 votos
João de Sousa Machado .... 57 votos
Joaquim Alves Matheus .... 57 »
Joaquim P. de Oliveira Martins .... 57 votos
Joaquim J. Maria de Oliveira Valle .... 57 »
José Bento Ferreira de Almeida .... 57 votos
D. José de Saldanha .... 57 votos
José Frederico Laranjo .... 57 »

E para a commissão dos negocios estrangeiros, os seguintes srs.:

Antonio Candido Ribeiro da Costa .... 57 votos
Antonio José Ennes .... 57 votos
Carlos Lobo d'Avila .... 57 »
João Eduardo Scarnichia .... 57 votos
João Ferreira Franco Pinto Castello Branco .... 57 votos
Joaquim Alves Matheus .... 57 votos
Joaquim Pedro de Oliveira Martins .... 57 votos
José Bento Ferreira de Almeida .... 57 votos
José Frederico Laranjo .... 57 votos
D. José de Saldanha de Oliveira e Sousa .... 57 votos
Vicente Monteiro .... 57 votos

O sr. Presidente: - O sr. deputado Consiglieri Pedroso tinha pedido a palavra para antes de se encerrar a sessão.

Tem s. exa. a palavra.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, ha pouco tinha pedido a palavra, quando o sr. ministro da guerra pela primeira vez fallou sobre um ponto que envolvia uma declaração altamente grave para este parlamento.

Infelizmente não póde intervir no debate, embora o incidente se tivesse generalisado; pois apesar de alguns oradores da opposição regeneradora terem usado mais de uma vez da palavra, o incidente terminou por iniciativa de v. exa. exactamente quando se seguia a fallar o representante dá fracção da opposição, que ainda não se pronunciara sobre o assumpto.

Sem querer apreciar n'este momento o uso que por vezes v. exa. faz das suas atribuições, recordo unicamente o facto para lembrar á camara o motivo que me levou a pedir a palavra para antes de se encerrar a sessão.

Entretanto, constando-me que o sr. ministro da guerra tem necessidade de sair, e como as observações que tenho a fazer se dirigem principalmente a s. exa., eu não tenho duvida em aprazar as minhas considerações para a primeira hora da proxima sessão, se s. exa. se compromette a comparecer ámanhã na camara.

Em todo o caso, o que eu queria era que ficasse consignado nos annaes d'esta casa, que na mesma sessão em que se tinham pronunciado palavras, que nunca ouvi nem me consta que se tivessem jamais pronunciado por parte dos representantes do poder executivo em parlamento algum do mundo, na mesma sessão se tinha apresentado o devido protesto por parte de alguem que não concorda com esta triste doutrina de disciplina parlamentar!...

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - A vista da gravidade que o illustre deputado attribue ás minhas palavras, naturalmente por algum equivoco, ou por eu não me ter explicado tão correctamente como era preciso, eu peço a s. exa. que faça agora mesmo as suas considerações.

O Orador: - Como o sr. ministro da guerra se presta a ou vir-me agora mesmo, eu vou formular em breves palavras o meu protesto.

Nada tenho que ver absolutamente com o assumpto que aqui se discutiu, porque as questões que interessam ao exercito serão tratadas por occasião do debate sobre as propostas de lei que o sr. ministro da guerra tem tenção de trazer á camara e a respeito das questões propriamente de familia, de bastidores, que aqui se levantaram por incidente, a camara sabe qual é a minha posição especial, quasi isolado n'esta camara, para comprehender bem que em nada tenho que ver com ellas. Mas, se nada tenho que ver com essas questões, tenho tudo que ver com as declarações que aqui se fizeram, que não se podem prestar a equivocou, e que está camara não póde de maneira nenhuma acceitar, apesar de não terem por parte do presidente d'esta assembléa, como representante das regalias e prerogativas do poder legislativo, recebido o immediato e necessario correctivo!

O sr. ministro da guerra, ao responder ao illustre deputado o sr. Marçal Pacheco, a proposito de uma alteração, que houvera na lista da commissão de guerra votada hontem, não por uma allusão, mas insistindo e fazendo d'esta declaração o thema principal da segunda parte do seu discurso, declarou á camara que interviera na confecção d'essa lista, que interviera com boas intenções e que não partira de s. exa. nenhuma indicação para a exclusão do nome do deputado opposicionista de que se tratava; e por este teor foi affirmando o principio mais extraordinariamente abusivo das prerogativas parlamentares, que aqui esta casa se tem affirmado!

S. exa. confessou, é certo, com toda a sinceridade, mas

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196 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

confessou o que não póde por forma nenhuma ser dito n'esta camara!

Ha mais, porém!

Depois do sr. ministro da guerra se ter sentado, um illustre deputado, que eu conhecia muito de nome, e que é respeitado por todos os cavalheiros d'esta camara, mas que eu ignorava ser official do exercito, levantou-se e declarou que tinha recebido ordem do sr. visconde de S. Januario para incluir certos e determinados nomes na lista da commissão de guerra.

O sr. Abreu e Sousa: - V. exa. dá-me licença?

... quando disse que tinha recebido ordem do sr. ministro, talvez me não expressasse muito correctamente.

S. exa. pediu-me para formular uma relação de nomes, nada mais.

(O sr. Abreu e Sousa não póde ser ouvido por se ter voltado para o orador),

O Orador: - As minhas palavras e a gravidade da asseveração, a que ellas se referem, não necessitavam ser corroboradas por nenhum membro d'esta camara.
Estão ainda nos ouvidos d'aquelles que escutaram as extraordinarias asserções do sr. ministro da guerra. Mas se fosse necessario insistir na gravidade d'essas declarações, são as palavras do cavalheiro que acaba de levantar-se, que dão a mais completa rasão ao meu protesto! Bem sei que o sr. ministro da guerra não póde, invocando a disciplina militar, dar ordem a um deputado, ainda que seja seu inferior hierarchico, para que formule certa e determinada lista.

Não me levantei para reclamar contra a fórma por que s. exa. exprimia a sua idéa, mas para me revoltar contra o facto de se dizer em pleno parlamento que o sr. ministro da guerra tinha intervindo, quer fosse por uma ordem, quer fosse por um pedido, para serem incluídos certos e determinados nomes na lista de uma commissão que lhe ha de apreciar as propostas. É singularmente subversiva de tudo quanto são praxes parlamentares esta usurpação sem precedentes, por parte do poder executivo, das regalias e fóros do poder legislativo!

As commissões que têem de dar parecer sobre as propostas dos ministros desempenham n'esta ordem de deliberações as funcções de um tribunal a que vão ser submettidas para julgamento dessas mesmas propostas. (Apoiados.)

O sr. ministro da guerra ha de ámanhã submetter as suas propostas ao exame da commissão de guerra. Que auctoridade terá essa commissão para dar sobre ellas um parecer favoravel, quando se saiba que os seus membros foram eleitos a rogo, a pedido, ou por ordem do sr. visconde de S. Januario? É inaudito! (Apoiados.)

Sinto que v. exa., sr. presidente, como mantenedor dos brios, da dignidade e das regalias parlamentares, não tivesse interrompido o sr. ministro da guerra e o illustre deputado que ha pouco me interrompeu, advertindo-lhes que não lhes era licito estarem a lançar tão inconveniente repto á representação nacional. (Apoiados.)

É triste que se faça isto, mas que a confissão de similhante acto saia das cadeiras do poder executivo, é mais do que triste, é doloroso, porque prova tal facto quão baixo desceu entre nós o systema parlamentar e até que ponto se confirmam as profecias feitas ha pouco tempo, quando militára nas fileiras da opposição, pelo sr. presidente do conselho, sobre a sorte do parlamentarismo em Portugal!

É triste que seja sob o consulado de s. exa. exactamente sob essa dictadura que veiu, segundo sua propria declaração, para corrigir abusos, e para zelar as immunidades offendidas do regimen representativo, que se pratiquem d'estes attentados sem precedentes em nenhum parlamento do mundo. (Apoiados.)

Não me alargo, sr. presidente, em mais considerações, porque seria fazer offensa á rectidão de espirito do sr. ministro da guerra querer obrigal-o a inventar um subterfugio qualquer para nesta occasião attenuar a gravidade das suas declarações.

É melhor que s. exa. confesse francamente, que commetteu uma heresia constitucional; é melhor que o sr. ministro da guerra confesse, que com o consenso de todos nós, está prompto a que essas palavras se apaguem das actas d'esta casa do parlamento...

O sr. Ministro da Guerra: - V. exa. está respondendo por mim?!

O Orador: - Eu estou dizendo o que faria, se fosse ministro da guerra e estivesse na posição em que s. exa. está perante o parlamento! Se s. exa. concorda, e confessa que errou, eu não abusarei da posição especial e quasi unica que tenho nesta assembléa. Não abusarei agora d'esta posição, que, se tem agruras e difficuldades, tem tambem a suprema e invejavel vantagem de muitas vezes poder dizer á camara aquillo que todos sentem na consciencia, mas que as conveniencias politicas obrigam muitas vezes a calar! Não ha um sr. deputado, tenho disso a certeza, que, como eu, não se sinta offendido no seu direito por esta offensa feita collectivamente a todo o parlamento portuguez! Isto me basta! Não vejo presente o leader, se não confirmado, ao menos já revelado; da maioria, o sr. Antonio Candido. Sinto que s. exa., tendo-se levantado depois das palavras do sr. ministro da guerra, não tivesse começado por reivindicar com todo o calor que lhe dá o prestigio da sua palavra, as garantias offendidas do parlamento! E, se não se queria pôr em divergencia com o sr. ministro da guerra, para não dar maior corpo a esses boatos, de que anda muito baixa a temperatura partidaria em volta do sr. ministro, então calasse-se, porque não é licito ao chefe de uma maioria deixar sem protesto declarações d'esta ordem!

Espero que o sr. ministro da guerra limite as suas explicações ao pedido, para que as suas palavras sejam riscadas das actas d'esta casa do parlamento. Aguardo no entretanto essas explicações, na certeza de que, quaesquer que ellas sejam, não podem de fórma alguma attenuar a gravidade da affirmação compromettedora, feita pelo sr. visconde de S. Januario e corroborada pela declaração do sr. deputado Abreu e Sousa. Fica, sr. presidente, o meu protesto lavrado. E basta neste caso esse protesto, para salvar a dignidade do parlamento.

Tenho dito.

O sr. Presidente: - Deu a hora e a sessão não está prorogada.

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - Eu não desejo ficar debaixo d'esta impressão desagradavel. (Muitos apoiados.)

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - A vista da manifestação da camara, dou a palavra ao sr. ministro.

O sr. Ministro da Guerra (Visconde de S. Januario): - Não desejo ficar debaixo da impressão desagradavel da accusação vehemente que o illustre deputado o sr. Consiglieri Pedroso acaba de fazer, de eu desconhecer as attribuições parlamentares, ou de as querer invadir; effectivamente não póde deixar de haver um mal entendido da minha parte ou da parte de s. exa., ou de nos ambos. Vou tratar de explicar o ponto sobre que recaiu a accusação de s. exa.

Eu não disse que tinha indicado ou resolvido que taes e taes nomes compozessem a commissão de guerra.

Conheço perfeitamente o machinismo constitucional, como o illustre deputado ou qualquer outro é obrigado a conhecer; sei quaes as attribuições do poder executivo, e as faculdades do poder legislativo, e portanto não podia de modo nenhum invadir estas, que respeito e acato.

Mas o que s. exa. não ignora e em que todos concordam, e que é um facto, é que quando se procede á eleição de commissões, dão-se sempre uns certos accordos. (Apoiados.) Não ha exigencia da parte dos ministros; mas os deputados da maioria procuram, como é natural, ter um certo accordo com os ministros e perguntam-lhes se convém em

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que para as commissões sejam eleitas estes ou aquelles individuos, porque depois, quando se trata de eleger, a camara é livre na sua votação.

Este accordo e outros sobra assumptos a que s. exa. não se referiu dão-se frequentemente, e mesmo são indispensaveis para a boa governação e paia a harmonia constitucional em que a maioria deve estar com o governo.

Ninguem póde contestar que a maioria é a feição do parlamento, e póde resolver de commum accordo eleger de um ou de outro modo. O governo não intervém n'esse assumpto, mas se o consultam, respondo que lhe não seria agradavel que fossem eleitos taes e taes nomes, e a maioria depois, no exercicio livre do seu direito, vota como quer, e nisto creio que não ha invasão de poderes, por parte do governo.

Portanto a maioria, no direito que se assiste de consultar o governo sobre differentes assumptos, perguntou-me se concordava em que fossem eleitos taes e taes nomes, e eu respondi, indigitando alguns, mas indiquei maior numero de que devia ser, e a maioria usou perfeitamente das attribuições que lhe assistem, escolhendo e votando como quiz.

É isto o que se tem feito sempre, e por tanto não ha aqui invasão de attribuições legislativas.

Declaro mais uma vez, desde que o meu procedimento constitucional é posto em duvida por parte do illustre deputado, que acato e respeito as deliberações do parlamento, porque as conheço e portanto não as podia invadir.

O sr. Presidente: - O sr. deputado Consiglieri Pedroso pediu a palavra, e como a camara consentiu em que o sr. ministro da guerra usasse d'ella, de certo quererá ter igual procedimento com aquelle sr. deputado. (Apoiados.)

O sr. Consiglieri Pedroso: - Pouco direi em resposta ao que acaba de ouvir-se, mesmo porque, se carecesse de confirmação o que ha, pouco expuz á camara, bastavam as palavras proferidas agora pelo sr. ministro da guerra para plenamente o justificar.

Em primeiro logar disse o. sr. ministro da guerra que só fez isto sempre. Bem o sei, mas nunca foi dito no parlamento e muito menos por parte de um ministro da corôa.

Em segundo logar diz s. exa. que, tanto não interveiu directamente na organização da lista, que a maioria approvou uma lista diversa.

Isso é outra questão. É a questão do cheque de que fallou o sr. Marçal Pacheco e com o qual eu nada tenho. É a questão da maioria ter ou não respeitado a indicação de s. exa. mas isso em nada altera o freto de s. exa. ter tentado intervir na formação da lista.

Em terceiro logar s. exa. interveiu como da sua propria declaração se deduz...

(Interrupção do sr. Laranjo).

Ora s. exa., como lente da faculdade de direito, não póde avançar esta heresia.
Que um militar distincto, como é o sr. visconde de S. Januario, com a singeleza e a rudeza, podemos até dizer, que caracteriza a sua classe, venha aqui dizer o que fez devo constitucionalmente merecer uma censura, mas pessoalmente, é um procedimento que não póde merecer reparo, Mas v. exa., sr. Laranjo, lente de uma universidade, onde se professa direito publico, tendo a certeza de que este procedimento é irregularissimo, que nunca se praticou similhante acto n'um parlamento, venha cobril-o com um simples apoiado, prova apenas que a maioria póde suicidar-se entregando nas mãos do governo as suas mais caras attribuições. (Apoiados.)

É completamente in~util o prosseguir no debate, posta a questão no campo em que o Sr. ministro a poz.

O Sr. ministro da guerra insiste que pela fórma por que interveiu na organisação da commissão, não attentou contra as regalias parlamentares. Eu, com todos que assistiram á extraordinaria sessão de hoje, lavro o meu protesto, que não póde deixar de ser o da camara inteira, inclusivamente o de v. exa., sr. presidente, que entendeu não dever pronunciar-se a isto respeito.

Pela minha parte prometto á camara que com a minha palavra e com o meu voto não deixarei nunca passar sem o competente correctivo invasões d'esta ordem. Até hoje sabiamos que nos corredores se attentava contra a nossa prerogativa; mas não se tinha chegado a esta franqueza, a esta sem ceremonia de vir dizer-se em publico o que se faz.

Tenho dito.

O sr. Presidente: - O sr. Laranjo pediu a palavra sobro este incidente, mas não lh'a posso conceder.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara tem s. exa. a palavra.

O sr. Laranjo: - O sr. Consiglieri Pedroso disse que sabia o que se fazia sempre quando se elegiam commissões; o governo estava de accordo com a maioria.

Naturalmente por isso que ha uma maioria que o apoia.

Mas não lhe chegou quando isto se fazia, chegou-lhe quando se disse.

Parece, que, se houvesse motivo para ella, lhe deveria ter chegado quando o facto se dava e não simplesmente quando se patenteia.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Muitas vezes protesto dentro dos limites em que um individuo que não tem prova material do que avança póde protestar em uma assembléa d'esta ordem.

O Orador: - A maioria estava no seu direito de consultar e combinar com o governo quaes os membros que havia de eleger, como eu disse no áparte dirigido
ao sr. Consiglieri Pedroso.

S. exa. diz que é uma herezia constitucional. Não é tal.

Quando é preciso nomear para as differentes commissões indivíduos technicas que estejam no caso de relatar as propostas apresentadas pelos diferentes ministerios, não é para duvidar que a maioria consulte os ministros e d'este accordo fique averiguado quaes são os cavalheiros mais aptos para comporem as commissões, e n'estas, os que deve-o, desempenhar o cargo de relatores na discussão das differentes propostas.

Nem a maioria cede do seu direito de eleger, nem de julgar depois as propostas do governo com toda a independencia e integridade.

Era isto o que tinha a dizer.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é a eleição da commissão especial para dar parecer sobre o bill, eleição de commissões e continuação da discussão do parecer relativo á eleição de Alijó.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e um quarto da tarde.

Proposta de lei apresentada pelo sr. ministro da justiça

N.º 85-A

Em obediencia aos preceitos constitucionais e no rigoroso cumprimento do seu dever, o governo vem hoje dar-vos coma dos actos de natureza legislativa que praticou durante o periodo decorrido de 17 de julho de 1886 até 17 de março ultimo, e pedir-vos que o releveis da responsabilidade do seu procedimento.

Motivos ponderosos de interesse publico determinaram o governo a promulgar as diversas providencias a que se refere a proposta de lei que tem a honra de apresentar á vossa esclarecida apreciação. Esses motivos acham-se expostos nos relatorios que precedem aquellas providencias, e em vista d'elles julgareis da necessidade que obrigou o governo a exercer funcções superiores ás suas faculdades ordinarias.

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O governo espera que merecerá a vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É relevada a responsabilidade em que incorreu o governo pelas providencias de natureza legislativa que promulgou desde 17 de julho de 1886 até 17 de março do corrente anno.

Art. 2.° São confirmadas as referidas providencias que se acham em vigor, emquanto não forem alteradas ou revogadas por lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Presidencia do conselho de ministros, em 23 de abril de 1887. = José Luciano de Castro = Francisco Antonio da Veiga Beirão = Marianno Cyrillo de Carvalho = Visconde de S. Januario = Henrique de Macedo = Henrique de Barros Gomes = Emygdio Julio Navarro.

Representação apresentada pelo sr. Abreu Castello Branco e mandada publicar n'este Diario

E N.º 15

Senhores. - A direcção da associação commercial de Angra do Heroismo, na ilha Terceira, tendo conhecimento do boato, que circula no publico com insistencia, sobre um projecto de lei, que, dizem, vos ha de ser apresentado para o estabelecimento da igualdade da moeda entre estas ilhas dos Açores e o continente, vem perante vós, como legaes representantes do paiz, e legisladores da nação, respeitosa, mas energicamente, representar contra uma tal medida que, sobre vir offender os justos interesses e legitimos direitos d'estes povos, creados e estabelecidos em tão remotas datas do passado, traria inevitavelmente, e num futuro muito proximo, como forçada consequencia, senão a completa ruina economica d'estas terras, pelo menos uma gravissima crise, e tão seria, que sómente a sua perspectiva nos assusta e atterrorisa.

Já representou, em 19 de março ultimo esta associação perante Sua Magestade El-Rei, conforme a copia, que esta acompanhe, para a instruir, e elucidação do assumpto; e se bem que fosse especial objecto do pedido, de então uma providencia para a crise monetaria, que nos affligia, é certo que tambem nos referimos ao alvitre da igualdade da moeda, porque já áquelle tempo corria o boato, que agora com mais insistencia corre, e nos impressiona.

Dignou-se Sua Magestade attender á nossa supplica, e para solução da crise, hoje completamente resolvida, e extincta, foi mandada adoptar a segunda das providencias que ousámos submetter á apreciação do seu elevado criterio, a qual está hoje aqui em via de execução.

A persistencia desta medida, ou o estabelecimento de qualquer outra, em que se mantenha o principio da moeda fraca e a differença de 25 por cento para a do continente, como actualmente existe, tanto nos serve, e tanto nos basta.

O contrario, ou tudo quanto não for isto, será de funestissimos resultados para as, já hoje, attribuladas condições de existencia económica destes povos; e não sabemos, nem é facil de prever, até que extremos os poderá arrastar.

É tão melindroso o assumpto, e tão importante a questão, que todo o cuidado e toda a attenção demandam. Prende com todas as classes sociaes; relaciona-se com os mais íntimos interesses; affecta, directa e indirectamente, a cada um, em particular, e a todos collectivamente.

Pois isso, e como representante de uma das mais importantes classes sociaes, e d'aquella a quem mais directamente interessa este problema, a associação commercial, por intermedio da sua direcção, tinha stricto dever de vir perante o poder legislativo, como já foi perante o poder executivo, apresentar, não com fundamento em theorias especulativas, mas baseada nas duras lições da experiencia, a expressão sincera do seu pensar sobre a questão.

Não tem pretensões a fazer um tratado; nem mesmo a discutir a materia com largueza de vistas e rigor scientifico, que nem tal empreza se compadece com a estreiteza do tempo e a indole d'esta representação, nem seria necessario tal trabalho, quando para tanto tivesse competencia, para vós, a quem sobra a illustração, o que não careceis do alheios ensinamentos.

O seu intuito é meramente fazer-vos sentir, senhores, qual a disposição d'estes povos, e como seriam profundamente feridos, e quem sabe se de um modo terrivelmente desastroso, nas precisas condições, não dizemos já para o augmento da sua prosperidade, senão que até mesmo para a sustentação da que até aqui alcançaram.

As melhores theorias, as mais bellas, caem por terra muitas vezes e não logram mais erguer-se embaraçadas nos escolhos da pratica, de que se não curou, para as pôr em realisação. Todavia, sempre os seus perniciosos effeitos se fizeram sentir, e d'elles foram victimas os povos. N'estes casos, vale mais prevenir do que ter de remediar.

São muito para attender as circumstancias peculiares das localidades, e o primeiro elemento para a apreciação de qualquer reforma: e estas circumstancias das ilhas dos Açores repellem energicamente o projecto, se é que elle existe, da igualação da sua moeda á do continente.

m côrtes temos os nossos representantes, entre vós se acham aquelles a quem conferimos os diplomas de nossos mandatarios, a esses mais particularmente nos dirigimos; a questão para nós é vital; que d'ella cuidem e lhe prestem toda a sua attenção, como sua que tambem é.

Tal é o nosso pedido; tal é o objecto que nos preocupa mais que nenhum outro, e hoje tem na maxima tensão a espectativa publica.

Confiâmos na justiça do governo, na illustração do parlamento, e no patriotismo dos nossos representantes, e de todos esperâmos que ha de ser attendido o nosso pedido, porque é justo e se inspira em ponderosas rasões de interesse publico e utilidade geral.

Sala das sessões da associação commercial de Angra do Heroismo, 15 de abril de 1887. - (Seguem-se as assignaturas.)

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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