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SESSÃO DE 9 DE MAIO BE 1890 149

formulando algumas propostas e apontando factos, são tambem da, dependencia da pasta do ultramar, e vê presente o sr. Julio de Vilhena, dirigir se-ía a este com a declaração previa de que, embora elles se relacionem com a questão luso-britannica, ainda pendente, não é seu proposito entrar n'ella, antes guardar-se-ha de a provocar desde já, não só em obediencia á disciplina partidaria, como em harmonia com os dictames da sua propria consciencia. Não tem pressas; limita-se a recolher elementos, coleccionar documentos, promover a sua publicação, para, a seu tempo, se servir d'elles e liquidar responsabilidades, pondo em confronto o procedimento do governo actual com o transacto, que tivera a honra de apoiar.

Tem estado retido em casa por doença, mas tem procurado acompanhar, como tem podido, á discussão parlamentar. Dissera ha dias o sr. Hintze Ribeiro, em resposta ao seu collega o sr. Emygdio Navarro, que o governo não tinha conhecimento de haver negociações pendentes entre o Vaticano e o governo inglez para o estabelecimento de dioceses em Africa.

A este respeito nada tem a objectar, mas talvez, o sr. Emygdio Navarro quizesse referir-se tambem a um outro ponto, relativo às negociações, de que a imprensa estrangeira se tem occupado, entre a Santa Sé e a Inglaterra.

Affirma-se que, em resultado do accordo celebrado entre o governo britannico e o Vaticano, o bispo catholico de Calcuttá vae ser investido na jurisdicção ecclesiastica da India ingleza, o que, a ser verdade, cercearia a jurisdicção do arcebispo primaz de Goa, patriarcha das Indias orientaes.

Não sabe de positivo se o facto é ou não verdadeiro; mas presume que alguma cousa de extraordinario haverá, porque, segundo o Capitan Fracassa, corria ultimamente no Vaticano o boato de que o Papa enviaria monsenhor Moccni em missão junto do Rei de Portugal com uma carta autographa para El-Rei, e, segundo o mesmo jornal, tem havido ultimamente activa troca de notas entre o gabinete do Lisboa e o secretario d'estado pontificio.

Reputa grave este facto, e por isso julga do seu dever, no interesse dos direitos do padroado portuguez, provocar explicações por parte do governo.

Ainda em resposta ao seu collega o sr. Emygdio Navarro dissera ao sr. Hintze Ribeiro, que "desde que estão negociações pendentes, relativas ao conflicto luso-britannico, o governo portuguez tem sempre reclamado, como a Inglaterra tem reclamado tambem, a manutenção do statu que ante, a fim de se não prejudicar o bom exito das mesmas negociações". Acredita, e tem mesmo a certeza que o governo portuguez tem honradamente cumprido o compromisso ; mas não só não acredita, antes tem fortes motivos para affirmar que a Inglaterra, ou seus delegados em Africa, têem faltado ao compromisso tomado. Ha cerca de dois mezes, deve disso estar lembrada a camara, todo o paiz se sobresaltou, e muito legitimamente, com a noticia telegraphica que viera de Moçambique, de que fôra occupada pelo consul inglez John Buchanan a Villa Coutinho, que fica na confluencia do Ruo com o Chire, ponto que na costa de Africa e conhecido pelo nome de Chilomo.

O facto dera-se depois do ultimatum o quando o actual gabinete tinha já entaboladas as negociações com o gabinete inglez. De duas, uma: ou a occupação não foi realisada e não passou de pura phantasia, e n'esse caso o sr. ministro dos negocios estrangeiros affirmou uma verdade, dizendo que a Inglaterra tem respeitado o statu quo; ou a occupação foi uma realidade, e então só deverá attribuir a uma dura necessidade de diplomacia o vir o sr. ministro ao seio do parlamento affirmar um facto, que não é inteiramente conforme com a verdade. Não ha sair d'este dilemma. Mas que o facto da occupação não foi uma phantasia, demonstra-o um documento official, que traz comsigo e vae lel-o á camara.

É um protesto energico, mas digno O patriotico, do governador do districto de Quelimane, o sr. Alfredo Augusto Ferreira Machado, major do exercito de Portugal, no qual este distincto official protesta, em nome do Rei de Portugal, em nome de todos os subditos e cidadãos portuguezes, em nome do direito das gentes, tratados de direito internacional, em nome do glorioso pendão das quinas, perante todos os poderes constituidos de todas as nações civilisadas, contra o insolito attentado e subversivo procedimento do consul de Sua Magestade Britannica e seus sequazes, ultimamente adoptado no baixo Chire, occupando traiçoeiramente o Chilomo, arvorando n'elle a bandeira ingleza e salvando-a com sete tiros, depois da retirada da tropa portugueza por virtude do ultimatum.

Não pedirá a publicação d'este energico protesto no Diario do governo, porque nem por sombras quer crear embaraços ao governo n'esta questão, mas declara que o fará inserir no seu discurso.

Outro facto, que demonstra á evidencia o não cumprimento do statu que por parte da Inglaterra, é a declaração feita no parlamento inglez, não ha muito tempo, e já depois de entaboladas as negociações pelo actual gabinete, polo sub-secretario parlamentar dos negocios externos, James Fergusson, de que o regulo Lobengula, chefe dos matabeles, sanccionára a occupação do Mashona pela South African Company. Toda a imprensa portugueza se referiu, com justa indignação, a este novo acto de má fé praticado pelo gabinete inglez, e até este momento o facto não recebeu o menor desmentido por parte da imprensa ministerial.

Logo, é licito concluir que, não tendo sido respeitado o stato que pelo governo inglez, o sr. Hintze Ribeiro, por uma habilidade diplomatica, que não louva e cuja responsabilidade lhe cabe toda, veiu ao parlamento fazer uma affirmação menos consentanea com a verdade dos factos.

Pede ao sr. ministro da marinha, que, não havendo inconveniente, habilite o poder legislativo a formar juizo seguro sobre estes factos, cuja importancia a ninguem é dado pôr em duvida.

Dirige-se ao sr. Julio de Vilhena, por serem estos assumptos da dependencia da sua pasta, é por não estar presente o seu collega dos estrangeiros.

Antes de concluir, desejava chamar a attenção do sr. ministro do ultramar para os factos que parece se estão dando no paiz de Gaza. Ha dias que o telegrapho annunciou, talvez como balão de ensaio, que o regulo Gongunhana firmára ou tentára firmar um tratado com a Inglaterra, dando como não existente, ou não auctorisado por elle, o que se fizera com Portugal. Ao mesmo passo que esta noticia nos chega pelo telegrapho, chegam noticias menos tranquillisadoras da propria Africa. O sr. Augusto de Bettencourt, distincto official do nosso exercito, que fôra ha pouco para Moçambique n'uma commissão de confiança do governo, escreve do Cabo da Boa Esperança uma carta digna de ser lida e meditada pelos que se interessam pelas nossas cousas coloniaes.

Diz aquelle official, que a situação de Portugal em Africa não é a que aqui se póde avaliar, através do chauvinismo indigena. Na propria Africa, a dois passos dos terrenos disputados, é que se póde bem conhecer quanto temos que luctar para guardarmos o nosso patrimonio.

Tendo entrado n'um club de empregados superiores do governo inglez, surprehendeu projectos de occupação, em que o nome portuguez era totalmente posto de parte.

De um lado fallava-se de uns inglezes, que haviam chegado das terras de Gaza, onde o Gongunhana lhes affiançára que o protectorado portuguez não existia; do outro lado fallava-se na expedição do argentario Ecil Rhodes às terras do Mashona.

Tudo isto é grave e denota que os inglezes não descansam e querem-nos levar de surpreza, illudindo-nos com o