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N.º 12

SESSÃO DE l DE FEVEREIRO DE 1902

Presidencia do Exmo. Sr. Malheus Teixeira de Azevedo

Secretarios - os Exmos. Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga

José Joaquim Mendes Leal

SUMMARIO

Approvada a acta, dá-se conta da correspondencia e tem segundas leituras os projectos de lei: sobre o direito de promoção por antiguidade aos primeiros aspirantes do quadro dos Telegraplica; sobre o arrendamento dos predios rusticos, a cujos senhorios não convenha continuar o arrendamento; sobre a graduação militar do medico do exercito Sr. Cunha Bellem. - O Sr. Almeida Dias apresenta uma proposta para renovação de iniciativa do projecto n.° 98, de 1901. - O Sr. Presidente communica ou menos dos Srs. Deputados que compõem a commissão de negocios ecclesiasticos. - Propõe as sessões matutinas na Camara o Sr. Conselheiro Arroyo. - Combatem a utilidade da proposta, o Sr. Luiz José Dias e Oliveira Mattos, sendo, afinal, approvada, - Responde ao aviso previo do Sr. Egas Moniz, sobre as ultimas reformas do instrucção publica, o Sr. Presidente do Conselho (Hintze Ribeiro), - Não se reconhece a urgencia do assumpto sobre que pede a palavra o Sr. Condo de Ponha Garcia, que envia uma nota. - Enviam projectos de lei os Srs. Torgal e Boavida, o primeiro sobre o subsidio aos Srs. Deputados, o segundo sobre a criação de um julgo de paz em Monforte da Beira. - Enviam requerimentos os Srs. Queiroz Ribeiro, Oliveira Simões, Francisco Ramirez e Francisco Machado. - Enviam declarações os Srs. André do Freitas e Raposo Botelho. - Apresenta o parecer da commissão de marinha, sobre a fixação da força naval, o Sr. Telles de Vasconcellos.

Na ordem do dia interpellação do Sr. Conselheiro Alpoim sobre o não que o Governo fez das auctorizações parlamentares) fala longamente este Sr Deputado, justificando a moção que apresenta. - Envia um requerimento, para que se generalize o debate, o Sr. Beirão. - Responde ao Sr. Alpoim o Sr. Presidente do Conselho (Hintze Ribeiro). - Replica o Sr. Alpoim, ficando com a palavra reservada.

Abertura da sessão - Ás 3 horas e 5 minutos da tarde.

Presentes - 63 Senhores Deputados.

São os seguintes: - Abel Pereira de Andrade, Affonso Xavier Lopes Vieira, Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto Botelho, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Mendes de Magalhães Bamalho, Alipio Albano Camello, Álvaro do Sousa Rego, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio José Boavida, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, Antonio Tavares Festas, Arthur da Costa Sousa Pinto Boato, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Belchior José Machado, Carlos Alberto Soares Cardoso, Carlos Augusto Ferreira, Carlos Malheiros Dias, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Paçô- Vieira, Domingos Eusebio da Fonseca, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Vaz do Andrade Basto Ferreira, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Joaquim André de Freitas, João Marcellino Arroyo, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Tavares, Joaquim Antonio de Sant'Anna, Joaquim Faustino de Póças Leitão, Joaquim Pereira Jardim, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José da Cunha Lima, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim Dias Gallas, José Joaquim Mendes Leal, José Mana de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria de Oliveira Simões, Julio Maria de Andrade e Sousa, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luciano Antonio Pereira da Silva, Luiz Gonzaga dou Reis Torgal, Luiz José Dias, Manuel Joaquim Fratel, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Marquez de Reriz, Matheus Teixeira de Azevedo e Ovidio do Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Agostinho Lucio e Silva, Albino Maria de Carvalho Moreira, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Antonio Afonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio de Almeida Dias, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Belard da Fonseca, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Cesar da Rocha Louza, Augusto Fuschini, Augusto José da Cunha, Carlos de Almeida Pessanha, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Conde de Castro e Solla, Conde de Penha Garcia, Custodio Miguel de Borja, Eduardo do Abranches Ferreira da Cunha, Eduardo Burnay, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico Ressano Garcia, Frederico dos Santos Martins, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho do Abreu, Henrique Matheus dos Santos, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alfredo de Faria, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim da Cunha Telles o Vasconcellos, José Caetano de Sousa e Lacerda, José da Gama Lobo Lamare, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria Pereira de Lima, José Matinas Nunes, José de Mattos Sobral Cid, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Augusto Petra Vianna, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manuel Afonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior, Rodrigo Affonso Pequito, Visconde de Mangualde, Visconde de Reguengo (Jorge) e Visconde da Torre.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Alfredo Cesar Brandão, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Roque da Silveira, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Fernando Mattozo Santos, Francisco José Patricio, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Tgnacio José Franco, José Adolpho de Mello e Sousa, José Caetano Rebello, José Coelho a Motta Prego, José Dias Ferreira, Julio Ernesto de Lima Duque, Manuel Homem de Mello da Camara, Manuel de Sousa Avides, Marianno Cyrillo de Carvalho,

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Marianno José da Silva Prezado e Paulo de Barros Pinto Osorio.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Fo Ministerio da Guerra, enviando, na conformidade do disposto no artigo 172.° do regulamento geral da contabilidade publica, a relação dos contratos, superiores a 500$000 réis, celebrados por aquelle Ministerio durante o anno d« 1901.

Para a secretaria.

De D. Laura Moreira Pereira Leite, agradecendo á Camara dos Senhores Deputados o voto de sentimento tributado, na, sessão de 8 do corrente mês, á memoria de seu marido, o antigo Deputado Sr. Augusto José Pereira Leite.

Para a secretaria.

Projecto de lei

Srnhores. - A nova organização do pessoal dos Telegraphos e Correios a Fiscalização das Industrias Electricas, de 30 de dezembro de 1901, garante no artigo 131.º aos segundos officiaes actualmente em serviço na Direcção Geral dos Correios e Telegraphos, que partenceram aos extinctos quadros a que se refere o n.° 2.° do artigo 6.º do decreto com força de lei de 28 de julho de 1886, o direito de promoção por antigüidade sem exame previo.

Succede, porem, que aos primeiros aspirantes do quadro dou Telegraphos, que tambem se acham comprehendidos no mesmo n.º 2.º do artigo 6.º do referido decreto de 28 de julho de 1886, não foram garantidos os mesmos direitos.

Sendo injusta esta excepção, naturalmente consequente da urgencia como foi organizada a remodelação do pessoal, de 30 de dezembro de 1901, tenho a honra de propor á vossa illustre consideração o seguinte projecto de lei, tendente a reparar essa injustiça:

Artigo 1.º Aos primeiros aspirantes do quadro dos Telegraphos, que se acharem comprehendidos no n.° 2.° do artigo 6.° do decreto de 28 de julho de 1886, é garantido o direito de promoção, por antiguidade, sem exame previo, concedido do artigo 131.° da organização de pessoal dos Telegraphos e Correios e fiscalisação de Industrias Electricas, de 30 de dezembro de 1901, a funccionarios em identicas circumstancias.

Art. 2.º É revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 30 de janeiro de 1902. = O Deputado, Augusto Ricca.

Foi admittido e enviado ás commissões de obras publicas e de fazenda.

Srs. Deputados. - São frequentes no foro as questões do despejo. Em geral os senhorios, ou para fugirem ás despesas que lhe acarreta o processo legislado nos artigos 498.° e seguintes do Codigo do Processo Civil que, afora os honorarios do advogado, sobem acima de 7$000 réis; ou mesmo para não vexaram os rendeiros não os despedem judicialmente, limitando-se a despedi-los extra-judiciariamente.

Os rendeiros não protestam, mas findo o arrendamento não despojam, e o senhorio vê, contra sua expressa vontade, renovado o arrendamento.

Muitas vezes acontece que nestas circumstancias o senhorio, para não se ver logrado, levanta no rendeiro difficuldsades no pagamento da renda para se poder valer do disposto no artigo 500.º do mesmo Codigo e d'ahi questões graves que cumpre evitar.

Foram estas considerações que me suggeriram a idéa de formular um esboço de projecto de lei que acabe de vez com estas questões.

O senhorio antes de recorrer ao processo judicial avisa extra-judicialmente o rendeiro; este fica obrigado a, querendo contestar o despejo, declarar que a elle se oppõe; neste caso é que o senhorio tem de recorrer ao processo judicial para ahi ser dirimida a questão.

Preveni o caso do rendeiro, para vexar o senhorio, declarar que ao oppõe ao despejo e depois não vir com embargos para obrigar o senhorio a pagar as custas; neste caso quem paga as custas é o rendeiro.

Se o rendeiro não declara que se quer oppor ao despejo julga-se confessado.

Para o caso do rendeiro confesso não despejar, regula o disposto no artigo 3.º.

«O senhorio justifica summariamente que fez o aviso para o despejo e este é decretado á custa do rendeiro visto ter dado causa á diligencia.

Preveni tambem a hypothese do senhorio vir a juizo com testemunhas falsas justificar o despejo e ainda o caso de occultar o protesto do rendeiro; nesses dois casos se permittem, no artigo 3.º os embargos. Para evitar a chicana pareceu-me que neste caso a parte vencida devia sempre ser condemnado com legitima má fé.

Tambem preveni a hypothese das difficuldades levantadas pelo senhorio ao rendeiro no pagamento da renda; pode isso ser summariamente justificado. É barbara a disposição do § 2.° do artigo 500.° do Codigo do Processo Civil que no caso do despejo requerido por falta de pagamento da renda só admitte a suspensão do despejo juntando-se recibo do pagamento.

Também me parece que se devem prevenir algumas duvidas que se levantem nos arrendamentos e que são objecto dos artigos 6.°, 7.° e 8.°

Não ha razão nenhuma para que as rendas não sejam pagas em casa do senhorio quando isso, em geral, se admitte nos foros.

É em virtude do que acabo de expor, que tenho a subida honra de apresentar á vossa alta consideração o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° O senhorio do predio rustico a quem não convenha a continuação do arrendamento alem do prazo estipulado ou alem d'aquelle por que a lei o presume fixo, ou renovado, poderá, não querendo recorrer logo ao processo legislado nos artigos 496.° e seguintes do Codigo do Processo Civil, fazer prevenir o rendeiro para ser o predio despejado, expirado o prazo, conformando-se com as seguintes disposições.

§ 1.° No prazo marcado no § 1.° do artigo 498.° do Codigo do Processo Civil, o senhorio prevenirá ou fará prevenir o rendeiro de que não quer que o contrato seja renovado, prevenção que pode ser feita perante testemunhas ou por correspondencia postal registada.

§ 2.° O rendeiro assim prevenido que não queira dar-se por despedido, no prazo de dez dias, a contar da recepção do aviso, prevenirá o senhorio, nos termos do paragrapho antecedente, do que quer contestar o despejo, devendo, neste caso, o senhorio que se não conforme com a opposição do rendeiro, recorrer ao processo legislado nos artigos 498.° e seguintes do Codigo do Processo Civil, embora já fora do prazo marcado nesses artigos.

§ 3.º Neste caso, embora o rendeiro não embargue, pagará as custas do incidente; embargando, pagará as custas, afinal, quem for vencido.

Art. 2.° Se o rendeiro, despedido nos termos do § 1.° do artigo antecedente e que não tenha cumprido o disposto no § 2.° do mesmo artigo, não despejar o predio no ultimo dia do arrendamento, o senhorio pedirá em requerimento, sem dependencia do artigos, em que indicará testemunhas e a que poderá juntar quaesquer documentos, que justificado, sem audiencia do rendeiro, que lhe foi feita a pre-

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venção a que se refere o § l.° do artigo 1.° se proceda judicialmente, e á custa do rendeiro, ao despejo judicial.

§ unico, O despejo só será ordenado depois do requerente assignar termo de responsabilidade por perdas e damnos em que possa ter incorrido, só afinal forem julgados procedentes os embargos, permittidos pelo artigo seguinte.

Art. 3.º Effectuado o despejo, poderá o rendeiro no prazo de dez dias apresentar embargos que serão intimados ao requerente, que os poderá contentar até á terceira audiencia seguindo-se os termos do processo ordinario sem mais articulados; embargos que só podarão fundar-se:

1.º Um não ter sido feito o aviso a que se refere o § l.° do artigo 1.°;

2.º Em ter o rendeiro prevenido o senhorio nos termos do § 2.° do mesmo artigo de que contentava, o despejo.

§ 1.° No caso do n.° 2.°, poderá o rendeiro requerer que justificado, summario e independentemente do seguimento regular do processo, o allegado, seja mantido no arrendamento até á decisão do pleito.

§ 2.° Nos embargos podem ser pedidos perdas o damnos o a sentença que os julgar condemnará sempre a parte vencida como litigante de má fé.

Art. 4.° Nos mesmos termos do § 1.° do artigo 1.°, se despedirá o rendeiro sob pena de responder por perdas e damnos.

Art. 5.° Quando o senhorio requeira nos termos do artigo 500.° do Codigo do Processo Civil contra o rendeiro despejo por falta de pagamento de renda é permittido a este, quando conteste a acção, pedir em requerimento sem dependencia de artigos, mas em que vão indicadas testemunhas que, justificado, independentemente do requerimento do seguimento do processo, que a renda não foi paga por culpa do senhorio, e que não foi feito o deposito em tempo util, por motivo attendivel, seja mantido no arrendamento até á sentença.

Art. 6.° Quando o predio arrendado for sujeito a mais do que uma cultura o anno agricola a que se refere o artigo 1629.° do Codigo Civil entende-se ser da principal.

Art. 7.º Quando de outro modo não esteja estipulado no respectivo contrato, a obrigado o senhorio a consentir ao rendeiro que retiro, depois do maduros, os fructos que ao findar do arrendamento tenham entrado era maturação e os que, maduros, não tenha sido possivel retirar durante o prazo do arrendamento; e o rendeiro obrigado a permittir que o senhorio faça, ainda durante o arrendamento, os serviços e lavouras necessarias para as sementeiras e culturas do anno agricola seguinte.

Art. 8.° Salva a convenção em contrario, a renda deve ser paga em casa do senhorio.

Art. 9.° Para ns acções do despejo de predios cuja renda annual não exceda a 10$000 réis ou seu valor são competentes os juizes de paz.

Sala das sessões, 30 de janeiro de 1902. = O Deputado, José Rebello.

Foi admittido e enviado â commissão de legislação civil.

Proposta para renovação de iniciativa

Renovo a iniciativa do projecto n.º 98 de 1901. - O Deputado, Almeida Dias.

Foi admittída e enviada, ás commissões de guerra e de fazenda.

Refere-se esta renovação de iniciativa ao seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.° É concedido ao actual Coronel Medico do corpo de medicos militares, Dr. Antonio Manuel da Cunha Bellem, a graduação em general de brigada.

§ unico. A essa graduação ficam inherentes todos as prerogativas d'aquelle posto, tanto para a effectividade, como para a reforma.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

O Sr. Presidenta: - No uso da auctorisação que a Camara concedeu á mesa, vae ler-se a lista dos nomes dos Srs. Deputados pela mesa nomeados para a commissão dos negocios ecclesiasticos; são os Srs. Deputados:

Alfredo Cesar Brandão.

Alipio Albano Camello.

Antonio José Boavida.

Antonio José Lopes Navarro,

Arthur Eduardo de Almeida Brandão.

Augusto Neves dos Santos Carneiro.

Francisco José Patricio.

Luiz José Dias.

Visconde da Torre.

O Sr. João Arroyo: - Sr. Presidente: como V. Ex.a. e a Camara sabem, esta casa do Parlamento não tem podido funccionar regularmente, em consequencia de ter de alternar as suas sessões com as da Camara dos Dignos Pares.

Não é intenção minha pedir aos meus collegas, quer da maioria, quer da opposição, um esforço excepcional, a fim do que os trabalhos parlamentares possam proseguir com toda a regularidade; mas sim adoptar unicamente o que nos, annos anteriores se tem feito.

É nestes termos que eu tenho a honra de mandar para a mesa, pedindo que se considere urgente, a seguinte

Proposta

Proponho que, nos dias em que houver sessão na Camara dos Dignos Pares, o Sr. Presidente possa dar sessão de manhã, fazendo-se a primeira chamada ás dez horas e meia, a segunda ás onze horas, e havendo meia hora para trabalhos antes da ordem do dia. = João Arroyo.

Lê-se na meia. Consultada a Camara, é approvada a urgencia.

O Sr. Luiz João Dias: - Sr. Presidente: admiro-me do que eu tenha votado a, urgencia d'essa proposta, por isso que o Governo, em dictadura, legislou tudo quanto se pode legislar, inventando até materia legislativa.

Desde o momento am que se approvou o bill para se discutirem as auctorizações parlamentares e o abuso que d'ellas eu fez, sempre teremos tempo de sobra, a não ser que o Governo o queira empregar em alargar mais quadros, em criar mais serviços para nomear mais empregados, e em lançar mais impostos. A não ser para esse fim, não vejo na ordem do dia, alem de algumas interpellações e avisos previos, outros assumptos que reclamem a adopção da proposta do Sr. Deputado Arroyo.

Limito por aqui ns minhas observações, accrescentando apenas que me parecia melhor que o Governo se desse pressa um mandar concluir as obras da nova sala da Camara dos Senhores Deputados, a fim de que isto entre nos verdadeiros eixos.

(O orador não reviu}.

O Sr. Oliveira Mattos: - Sr. Presidente: a opposição não se recusa a trabalhar o a assistir ás sessões, sempre que seja necessario aos interesses do país.

V. Exa. tem visto que os Deputados d'este lado da Camara se tem inscripto todos os dias (e ainda hoje isto succedeu), querendo usar da palavra para justificarem as reclamações quo se teem apresentado, especialmente pelo que diz respeito á crise vinicola. E não o teem podido fazer.

V. Exa., e eu não quero dirigir-lhe censuras, não tem seguido a praxe usada em todos os annos. Porque nos annos anteriores, quando só discutia um aviso previo, essa discussão ficava liquidada no mesmo dia. E V. Exa. este anno, por um bello artificio tendente a gastar-se mais tempo, tem consentido que um dia fale o Deputado da opposição, ficando o Ministro para falar quatro ou cinco

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dias depois, e estar respondendo a cousas que se não disseram e não respondendo a outras que se trataram. Assim succedeu com o Sr. Alpoim, que não obteve resposta á accusação grave de que o Governo tinha augmentado a despesa em 32:000$000 réis.

Eis como se desperdiça e empata o tempo, e nós não podemos apresentar as reclamações dos povos.

O Sr. Carlos Ferreira acha-se inscripto, ha dias, para tratar da grave questão dos operarios vidraceiros da Marinha Grande, como representante d'aquelles povos; entretanto, ainda não conseguiu usar da palavra.

Sr. Presidente: não me esquivo, pela minha parte (e não falo em nome da opposição, mas apenas em meu nome), não me esquivo a trabalhar no interesse do meu para, como dei provas na discussão do unico projecto que appareceu, e a opposição tambem provou, com os seus melhores oradores, que não se recusava a collaborar para que aquelle projecto fosse melhorado tanto quanto possivel, achando-se prompta a continuar a cumprir o seu dever. Mas urgente e necessario é tambem que se lhe respeitem os seus direitos, e se não faça o monopolio da palavra a favor dos Srs. Ministros e a favor dos membros da maioria.

Contra isto é que eu protesto energicamente. Protestando contra esse novo monopolio, estou prompto a dar o meu assentimento á proposta, para que se não diga que da parte da opposição não ha desejos de trabalhar. Estamos sempre dispostos a trabalhar, nós; mas, realmente, vir com esta proposta, parece querer fazer suppor ao paiz que lavra aqui um grande zelo, quando sabemos que não ha projectos para ordem do dia que justifiquem a proposta e a sua urgencia.

Aqui está mais um artificio, e este para fazer crer ao país que ha vontade de trabalhar.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Visto que nenhum outro Sr. Deputado se inscreve, considero approvada a proposta do Sr. Arroyo.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: annunciou-me o illustre Deputado Sr. Egas Moniz um aviso previo ou antes, uma interpellação, sobre as minhas reformas de instrucção publica, e veiu realizá-lo com critica vehemente e acerba sobre as reformas mais importantes que tive a honra de publicar.

Pode dizer-se que foi um debate percursor, sobre o uso que o Governo fez das auctorizações legislativas, da campanha que a opposição parlamentar annunciou contra o procedimento do Governo, ao usar d'essas auctorizações.

Nessa campanha, apresentou-se o illustre Deputado como explorador de terreno, do mesmo modo que, nos grandes combates, os corpos do exercito destacam as suas guardas avançadas para explorarem o campo, para sondarem as disposições do inimigo e para atacarem os primeiro» reductos.

O primeiro reducto que a opposição entendeu dever atacar, pela voz auctorizada e vehemente do illustre Deputado o Sr. Egas Moniz, foram as minhas reformas de instrucção publica.

O illustre Deputado, porem, chegaria a ser cruel, se a serena consciencia da modestia e honestidade do meu trabalho me não cobrissem contra todo o genero de golpes semelhantes; porque, emfim, não precisava S. Exa. de invocar a figura do Pombal para deprimir os meus actos de Ministro do Reino.

Não sou um jactancioso, sou um trabalhador; e todo o homem que trabalha é, naturalmente, um modesto: quanto mais elle estuda, quanto mais investiga, quanto mais aprende, mais se convence de que o que sabe muito pouco é em relação ao muito que tem de aprender. (Vozes: - Muito bem). Mas o illustre Deputado foi cruel porque, tratando da reforma da Universidade, ahi, onde fez a invocação do grande Reformador de outros tempos para o pôr em confronto commigo, o illustre Deputado veiu dizer que me louvava pela minha iniciativa, mas só pela minha iniciativa, porque, em toda a reforma da Universidade, só tive collaboração numa errata, e tudo o mais era obra dos homens de sciencia, dos professores da Universidade!

A minha collaboração unica e exclusivamente consistiu, segundo o illustre Deputado, em ter elevado a seis os tres continuos que havia na Universidade! E o meu nobre «migo, que não vejo presente, o Sr. Conselheiro Beirão, achou isto um aperitivo tanto ao sabor do que só possa chamar um «escandalo parlamentar», que até pediu, encantado, a repetição, porque achou delicioso!... (Riso).

Não quero para mim honras que me não cabem.

O illustre Deputado, por pouco que me queira deixar na collaboração da reforma da Universidade, deixando-me, apenas, a errata, ainda me deixa de mais, porque não fui quem nella collaborou.

Sabe o illustre Deputado quem foi o collaborador da errata? Foi o Prelado da Universidade, o seu illustre Vice-Reitor, que, tendo visto publicada a reforma no Diario ao Governo, se dirigiu ao Director Geral da Instrucção Publica para lhe dizer que concordava em não se augmentar o pessoal menor da Universidade, porque emfim entendia que eu não quisesse alargar as despesas resultantes impreterivelmente de uma reforma d'aquella natureza, mas que deixasse ficar o que estava, e o que estava eram seis continuos e não tres.

Mas vendo que da errata resultava a vehemencia do illustre Deputado, tive a curiosidade de mandar pedir o orçamento do anno passado para saber o que lá se encontrava e lá encontrei, na verba «Universidade de Coimbra», o seguinte:

«Na secretaria, um continuo; nos Geraes, tres; na Faculdade de Medicina, um; na Faculdade de Philosophia, um».

Eis os seis; mas no Diario do Governo vieram tres, e foi preciso dizer que eram seis: d'aqui a necessidade da errata.

Ora, francamente, se todas as surpresas que a opposição reserva ao Parlamento e ao país na questão das auctorizações são como esta (e espero em Deus que todas hão de ser assim), se os seus ataques são d'esta natureza, começo por aconselhar o illustre Deputado a que dê o seu ao seu dono: mande a errata, que apresentou, ao Sr. Vice-Reitor da Universidade e não me aggrida a mim, porque não me glorio com o que de direito me não pertence. Só quero o que é meu. (Apoiados}.

Mas, se no entender do illustre Deputado esta é que é a minha collaboração, vamos a ver qual é a collaboração do illustre Deputado. Porque, emfim, o illustre Deputado não é qualquer critico ou censor. O illustre Deputado é um filho laureado da Universidade, alta e justamente diplomado, é um homem de sciencia que conhece de perto as exigencias do ensino universitario; conhece, porque não pode deixar de conhecer, quaes os principios que devem presidir á remodelação da nossa instrucção publica. Por consequencia, é uma auctoridade indiscutivel.

O illustre Deputado fez a critica das reformas de instrucção publica? Pois bem, vamos a ver o que fica da sua critica e collaboração depois de eu ter respondido.

O illustre Deputado arguiu-me por eu ter augmentado a despesa com as minhas reformas, e diz reservar isso para a interpellação. Seja; mas o que não fica para a interpellação e que é para desde já, é o seguinte:

Disse o illustre Deputado: o Se o Sr. Presidente do Conselho tem esbanjado tanto, esbanje-o com a instrucção publica!»

Oh! Sr. Presidente, pois então o illustre Deputado ac-

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cusa ma porque ou na reforma da instrução publica augmentei as despesas - e não o provou - e conclue por me aconselhar a que esbanjo? (Apoiados).

Ora, esta conselho, partindo dos bancos da opposição, em materia de reformas de instrucção publica, é digno de registo!

O Sr. Egas Moniz: - Tambem se pode esbanjar com utilidade.

O Orador: - Perdão, mas não pode. (Apoiados). Permitta-me que discorde d'esse sentido dado por S. Exa. á palavra «esbanjam.

Esbanjar é a exageração do gastar com utilidade; é despender alem do que é preciso, sem resultado, portanto, desde que se perde no que se gasta a mais, não lhe colhendo proveito.

Posto isto, vamos rapidamente percorrer as apreciações que o illustre Deputado apresentou como critica á minha reforma, e vamos ver o que d'essa critica se pode aproveitar, sem se esbanjar.

O illustre Deputado atacou primeiro a reforma que eu fiz da Direcção Geral de Instrucção Publica, e atacou-a precisamente sob tres pontos: 1.°, porque criei uma repartição; 2.º, porque criei as inspecções sanitarias; 3.°, porque criei as construcções escolares. A sua critica a reforma da Direcção Geral de Instrucção Publica synthetisa-se nestes tres pontos e em dizer que ao para isto faz o Governo esta reforma.

Ainda mesmo quando só para isto houvesse o Governo feito a reforma da Direcção Geral de Instrucção Publica, tinha elle praticado um acto util. (Apoiados).

Criei mais uma repartição - a da Direcção Geral de Instrucção Publica. É verdade; porque era absolutamente indispensavel. E o illustre Deputado comprehende que, para reformar, a primeira necessidade é conhecer praticamente as cousas. Então é que se pode avaliar dos defeitos para corrigi-los e das vantagens a implantar.

Criei mais uma repartição porque era necessaria; porque numa só repartição estava agglomerado tudo quanto dizia respeito ao material e ao pessoal de instrucção primaria, o que era inteiramente impossivel, chegando-se ao ponto do não poder ali reinar ordem nem regularidade no serviço, nem sequer podia o expediente previo estar em dia.

Quer o illustre Deputado ter uma prova d'isto? Ha pouco tempo desejei sabor o numero de escolas do instrucção primaria existentes no país. Não me souberam responder!

E não me souberam responder porque, á força do avolumar e agglomerar numa só repartição material e pessoal de escolas, ninguem já se entendia, o comprehende-se bem que ninguem já se pudesse entender.

Era este um estado de cousas que devesse continuar? Evidentemente não era; e se havia reforma util, immediata, urgente, era a que viesse separar dois ramos de serviço que não podiam conservar-se unidos.

Agora vamos ao segundo ponto. Criei as inspecções sanitarias. Sr. Presidente: se fosse um Deputado menos competente e menos technico em assumptos de saude que me fizesse uma arguição d'esta natureza, ainda se comprehendia; mas que fosse o illustre Deputado o Sr. Egas Moniz, doutor em medicina pela Universidado de Coimbra, versando, por consequencia, todos os dias, assumptos de hygiene e de saude, quem viesse arguir-me porque eu criei as inspecções sanitarias, é verdadeiramente extraordinario.

Não ha país no mundo, com excepção de Portugal, onde as inspecções sanitarias não estejam devidamente organizadas. (Apoiados). Em toda a parte, na Inglaterra, na França, nos Estados Unidos, na Suissa, em toda a parte onde se oura a serio dos negocios de saude publica, em toda a parte se tem reconhecido a necessidade de estabelecer inspecções sanitarias especiaes e adequadas.

Mas quer S. Exa. ouvir um trecho de um documento importante? É nada manos que um trecho do relatorio apresentado ao Conselho Federal Suisso. E o illustre Deputado sabe, decerto, como as questões de sciencia e do ensino são tratadas na Suissa, país modelo a muitos respeitos, como eu tive pessoalmente occasião de admirar quando o visitei; pais modelo, não apenas no que respeita as suas carinhosas e inteligentissimas formas de ensino, mas no que toca, de uma maneira geral, á maneira por que ahi são tratados todos os importantes problemas modernos da sciencia.

Offereço a S. Exa., como resposta as suas observações, o que nesse relatorio, apresentado ao Conselho Federal, diz um distincto medico, o Sr. Dr. Combe, a respeito das inspecções sanitarias.

O Sr. Egas Moniz: - luso já vem no relatorio.

O Orador: - De duas uma: ou S. Exa. desconhece o que está aqui, ou contesta. Se o desconhece, não é muito que ouça agora:

«De ahi a necessidade de um medico que se interesse pelas escolas, não como membro da commissão das escolas, mas como medico das escolas, tendo o seu serviço bem determinado, devendo consagrar uma parte do seu tempo ás suas funcções, o revestido de uma auctoridade especial, reconhecida por todo o pessoal do ensino. Do ahi a necessidade de criar um serviço medico em todas as escolas de uma cidade.

O Sr. Egas Moniz: - E os delegados o sub-delegados de saude para que servem?

O Orador: - Para outras funcções.

O Sr. Egas Moniz: - Isso não é o que está consignado na lei.

O Orador: - Está o illustre Deputado perfeitamente enganado. Não ha parte alguma do mundo onde os subdelegados de saude tenham a seu cargo estas attribuições. A pratica da experiencia tem demonstrado á saciedade, e parece até impossivel que S. Exa. o desconheça, que a especialidade d'estas funcções requer que ellas sejam entregues a empregados especiaes.

E é a criação das inspecções sanitarias que S. Exa. vem combater, sem uma razão, porque a não podia expor, sem uma prova contra ellas, porque a não podia apresentar.

Isto, quanto ás disposições sanitarias.

Quanto ás construcções escolares, S. Exa., na ancia de combater a reforma, foi combater, não o chefe do partido regenerador, mas o seu proprio chefe. (Apoiados}.

Esqueceu-se S. Exa. de que na lei de 30 de junho de 1898, que eu referendaria com muita honra, e que é da iniciativa e responsabilidade do Sr. Conselheiro José Luciano de Castro, só reconhece que a Direcção Geral de Instrucção Publica não poderia superintender, não só na instrucção, mas tambem na construcção de novos edificios escolares, sem ter funccionarios apropriados para isso; e ahi se propunha que se chamasse, provisoriamente, o Sr. Adães Bermudes, emquanto, por modo legal, não podesse ser nomeado para o serviço das construcções.

O Sr. José Luciano de Castro conformou-se; porque? Porque era razoavel e justo.

E, assim, o que eu fiz foi tornar definitivo, por uma auctorização legislativa, aquillo que o Sr. José Luciano da Castro tinha reconhecido já por absolutamente necessario.

Veja S. Exa. o que me censurou.

Depois, o illustre Deputado atacou a reforma do Conselho Superior de Instrucção Publica; e atacou-a por ella ter, como base, a criação de 4 logares a mais.

Diz S. Exa. que nada mais ahi achou.

Ora, o Conselho Superior de Instrucção Publica está no Ministerio do Reino, funccionando junto do Ministro respectivo.

É uma instituição onde trabalham dedicadamente, com

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absoluto desinteresse, sem preocupações politicas de qualquer ordem, individuos de todos os partidos, os mais auctorisados, aquelles que teem a sua intelligencia applicada aos assumptos do instrucção publica, e que, quando se juntam para discutir as questões sobre que superintendem, põem a politica de parte, como cousa que lhes não interessa.

Porque reconstitui eu um Conselho assim superiormente organizado?

Para que as pressões que naturalmente resultam do proprio meio em que vivemos e se acercam do Ministro, tivessem um anteparo, uma garantia no parecer imparcial, austero, do Conselho Superior do Instrucção Publica.

A reforma fez-se, assim, augmentando-se as attribuições; e, mais ainda, exigindo o seu voto affirmativo para a resolução de muitos assumptos.

Isto não viu o illustre Deputado, mas apenas a criação ao 3 lugares, e por isso me atacou, quando foi o proprio Conselho de Instrucção Publica que me ponderou ser indispensavel, para o perfeito desempenho das suas funcções, augmentá-lo com 3 membros.

Eis porque nomeei os 3 membros, e veja a Camara o horror das minhas nomeações: foram os Srs. Conselheiro José de Azevedo Castello Branco, que acabava de ser Director Geral de Instrucção Publica; o Sr. Curry Cabral, um dos nossos medicos mais distinctos; e o Sr. José de Sousa Monteiro, um distincto e erudito homem de letras.
Efoi por esta nomeações que o illustre Deputado me atacou!

Agora, a reforma da Universidade - a tal em que eu apenas collaborei com uma errata. (Biso}.

Pareceria natural que o illustre Deputado descendo á liça, com a sua critica fina e arguta trouxesse uma collaboração experimentada e absolutamente scientifica sobre a reforma da Universidade.

Nada d'isso eu vi, mas apenas que o illustre Deputado se referiu ás Faculdades de Medicina e de Philosophia, dizendo muito simplesmente que a reforma não satisfaz.

Nesta parte, devo eu declarar o seguinte: não reformei, por iniciativa minha, senão aquillo que entendi, e que intimamente conhecia.

Assim, com respeito ás Faculdades de Philosophia e de Medicina, eu attendi ao que me pediram os seus representantes mais auctorizados, que, dirigindo o ensino, conhecendo as suas necessidades, devem, sem duvida, ser as primeiras auctoridades na questão.

O que elles pediram, foi o que eu fiz.

Com relação á Faculdade de Medicina, foi o seguinte: a criação do Laboratorio de Microbiologia.

Da mesma forma procedi com relação á Faculdade de Philosophia.

Não procedi acertadamente, seguindo as indicações dos que conhecem praticamente os assumptos, que os versavam quotidianamente e são perfeitos conhecedores das reclamações a apresentar?

Não quero, repito, glorias que me não cabem; e sou assás prudente para me não metter a reformar os serviços e o ensino de Faculdades que nunca versei e a que fiquei, naturalmente, estranho.

Por isso, confesso a modestia da minha obra pessoal, emquanto á reforma d'essas faculdades.

Mas, em relação á reforma do ensino na Faculdade de Direito, tomo, pela minha parte, completa e absoluta responsabilidade d'ella, porque ahi exerci a minha iniciativa e a minha acção.

Apesar da reforma da Universidade ser feita, vista, revista a modificada, em muitos pontos, por mim, sobreestive na sua adopção, até que se reuniu o Claustro pleno do todos os lentes da Universidade; e o Claustro pleno nomeou uma commissão composta de um lenta de cada Faculdade, todos elles respeitaveis e auctorizados, para me virem pedir que decretasse as providencias contidas nesta reforma.

A essa commissão tive o prazer de perguntar, no meu gabinete, se o que estava providenciado satisfazia completamente ás differentss Faculdades da Universidade, e a resposta foi clara, affirmativa e peremptoria: Sim.

Só depois d'isso a reforma foi publicada.

Agora, pode o illustre Deputado não concordar, por muita auctoridade que tenha; pode o illustre Deputado ter a sua opinião, seja qual for; mas o que todos esperavamos de S. Exa. era que, vindo aqui dizer que discordava da reforma, dissesse tambem por que razões discordava.

Foi precisamente o que S. Exa. não fez.

O Sr. Egas Moniz: - O que V. Exa. affirma, diz respeito tambem á Faculdade de Medicina?

Estou convencido de que a Faculdade de Medicina não ficou satisfeita com o que V. Exa. fez a respeito do hospital.

O Orador: - Quem veiu por parte da Faculdade de Medicina foi o Sr. Dr. Filomeno da Camara; e, como já havia perguntado á commissão que me procurou, perguntei a este cavalheiro: As providencias contidas nesta reforma são do conhecimento de V. Exa? Sim, senhor, respondeu elle.

Satisfazem ellas, por completo, ao que V. Exa., como representante d'esta Faculdade, entende necessario decretar agora? Sim, senhor, respondeu elle.

Foi depois d'isto que se decretou a reforma. (Apoiados).

Accusou-me ainda o illustre Deputado, relativamente á reforma da Universidade, por causa da criação de um curso colonial, dizendo não haver uma cadeira especial d'esse curso.

O Sr. Egas Moniz: - Peço desculpa a V. Exa. O que disse foi que não havia uma cadeira especial para colonias, porque não se estuda mais do que aquillo de que se trata na Faculdade de Direito.

O Orador: - S. Exa. disse que se trata de um curso colonial aonde não ha uma cadeira colonial; e até apontou a falta de uma cadeira de geographia e ethnographia coloniaes.

Já vê S. Exa. que me lembro bem. (Apoiados}.

Ora agora, deixe-me V. Exa. explicar ao illustre Deputado, como é que foram criados os cursos especiaes. Os cursos especiaes foram instituidos com o fim de habilitar especialmente para determinadas profissões, e d'ahi o curso diplomatico, o curso administrativo e o curso colonial, conforme se destinassem os alumnos á carreira diplomatica, á carreira administrativa ou á carreira de funccionalismo nas colonias. Mas, evidentemente foram tirados estes cursos especiaes das differentes Faculdades, especialmente das de Direito e de Medicina, agrupando as cadeiras que para os cursos especiaes fossem mais propositadas e fornecessem conhecimentos mais indispensaveis.

Assim, para o curso colonial, a que o illustre Deputado se referiu, foram destinadas differentes cadeiras, sendo todas indispensaveis para um funccionario destinado a exercer funcções no Ultramar; e mais estas: a cadeira de administração colonial e a cadeira de Direito internacional.

Não ha lá, effectivamente, a cadeira de geographia e a de ethnographia colonial.

Porque as não ha na Universidade e os cursos especiaes foram criados, agrupando-se cadeiras já existentes na Universidade.

E estes cursos ainda com outro fim foram criados; fazer cursos breves, do modo que os individuos destinados aos differentes misteres obtenham os conhecimentos indispensaveis, mais rapidamente obtidos, fará mais depressa exercerem as suas funcções.

Este é o meu pensamento quanto aos cursos coloniaes.

Quanto á geographia, o illustre Deputado sabe que um dos estudos mais vastos e mais profundos da instrucção primaria e que mais detidamente se lecciona, é o da geo-

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graphia; assim, o estudante tendo estes subsidios o frequentando depois as cadeiras da Universidade, pode ter um curso, que não affirmo seja optimo, mas que satisfaz a todas as condições e representa um importante melhoramento. (Apoiados).

Depois, o illustre Deputado referiu-se ao curso de pharmacia, e emquanto a este outro assumpto melhor é aguardar o illustre Deputado que eu traga a minha proposta a este respeito; e se ella não vier nos termos em que o illustre Deputado entende que o ensino de pharmacia se deve exercer, o illustre Deputado me auxiliará com as suas luzes e conhecimentos, para que a minha proposta saia quanto possivel perfeita.

Mas, depois d'isso fez-me o illustre Deputado outra arguição, para continuar a ser injusto em tudo para commigo. O illustre Deputado censurou-me, porque a escola do Funchal representa só uma inutilidade, por isso que tinha apenas, no dizer do illustre Deputado, um curso de tres annos, quando elle não é senão de quatro, e tinha apenas dois professores, quando o seu numero é tambem de quatro.

Mas na conclusão e que estamos de acordo, e é que o aproveitamento resultante d'essa escola é relativamente pequeno.

Agora vamos a ver do que o illustre Deputado me arguiu, e se o fez a mim ou a outra qualquer pessoa que o illustre Deputado não deseje por forma alguma censurar.

No decreto com força de lei de 23 de julho de 1870, para os logares de facultativos municipaes foram admittidos os discipulas da escola do Funchal, quando não concorressem com medicos das tres escolas do Reino.

Mas, emfim, este decreto é do anno de 1870, em que a sciencia podia não ter caminhado tanto e tornar-se-nos ainda necessaria a escola do Funchal. Mas o decreto de 29 de dezembro de 1894, esse é já muito recente e esse é da responsabilidade do chefe do partido progressista; e ahi tratando-se das funcções dos sub-delegados, foram admittidos os da escola do Funchal. Esta é a responsabilidade dos meus antecessores. Agora, a minha.

É claro que eu não podia tirar direitos adquiridos a quem os possuía e, por consequencia, não podia com um traço de penna eliminar do nosso funccionalismo de saude funccionarios que legitimamente estivessem exercendo logares para que legitimamente foram nomeados. (Apoiados).

Mas é na minha reforma - não é na de 1870, nem na de 1899 - é na minha que estão consignados no artigo 67.° os principios que a Camara conhece.

Sou eu que pela primeira vez venho á Camara dizer nesse decreto que, para os logares de facultativos municipaes, só podem ser admittidos a concurso os medicos formados nas tres escolas do continente; e em outro artigo, tratando-se do Ultramar, estipulam-se no artigo 300.°, § 1.º, os principios que a Camara conhece tambem, e que eu recommendo a consideração do illustre Deputado.

É a primeira vez que semelhante disposição apparece, e, todavia, quando sou eu que venho reformar os serviços, estabelecendo o principio que o proprio illustre Deputado preconizou como necessario, não é aos meus antecessores que combate, é a mim proprio que me censura! (Apoiados).

Depois, passou o illustre Deputado ao Curso Superior de Letras e no Curso Superior de Letras disse cousas singulares que eu, emfim, sem querer de forma alguma faltar á consideração que lhe deve - que é muita - nem ao respeito que tenho por todos os membros do Parlamento - que e constante - tenho entretanto de considerar verdadeiramente admiraveis!

S. Exa. disse que a reforma do Curso Superior de Letras só tinha servido para eu fazer nomeações de lentes sem concurso...

O Sr. Egas Moniz: - Apoiado.

O Orador: - Apoiado? Ainda bom que veiu esse apoiado da S. Exa., porque eu cheguei a duvidar de que tinha ouvido bem. Desde, porem, que S. Exa. o confirma, posso então tirar ou corollarios. Vamos aos corollarios. Um illustre antecessor meu, que eu respeito, porque tem uma larga folha de serviços, porque tem gerido por varias vezes a pasta do Reino e nessa gerencia tem mostrado, com applauso de muitos, a sua competencia e a sua auctoridade nestes assumptos, um illustre antecessor meu dizia a respeito do Curso Superior de Letras, em 1889, que a organização d'esse curso estava urgentemente indicada, para o necessario o indispensavel aperfeiçoamento dos estudos, pelo exemplo de nações mais adeantadas e pelas opiniões das pessoas mais auctorizadas e versada» no ensino.

Isto dizia-o em 1889. De então para cá já correram treze annos, e durante esses treze annos, quanto tem a sciencia caminhado?

Era o Sr. José Luciano do Castro quem o dizia. Era elle quem reconhecia a necessidade de reformar o Curso Superior de Letras, não só porque isso era o resultado de uma licito colhida do exemplo de nações mais adeantadas, como porque o aconselhavam nesse sentido as vezes auctorizadas, tanto das pessoas versadas nos negocios de ensino, corôa as das corporações scientificas. O illustre Deputado, ao que pareço, não segundo a minha critica, mas segundo a do Sr. José Luciano, não era do numero dos eleitos que tinham voz auctorizada.

Como o illustre Deputado podia duvidar da minha competencia, porque até na reforma da Universidade só me attribuiu collaboração nas erratas, quis eu ir buscar auctoridade de mais peso, e por isso chamei á auctoria o Sr. Conselheiro José Luciano de Castro.

O que eu digo em 1902 pura me justificar, é que a reforma do Curso Superior de Letras era indispensavel, como escola de habilitação para o magisterio secundaria; e digo-o em face dos factos, e provo-o com os dados estatisticos que vou citar.

Quer S. Exa. saber qual foi o resultado dos exames para o magisterio secundario desde 1895 até hoje? E este, que é extraordinariamente triste e lamentavel.

Em 1895-1896, responderam 55 candidatos o foram approvados, com muito favor, apenas 28; em 1897, apresentaram-se 83, o ficaram approvados, com benevolencia, 23; em 1898 eram 37 os candidatos, e só ficaram 19; em 1899 eram 41, e só ficaram 22; em 1900, eram 36, o ficaram 16; em 1901, eram 38, e ficou apenas 1.

E porque? Porque nós não tínhamos uma escola de habilitação para o magisterio primario: ou haviamos de estabelecer uma escola especial, ou reformar nesse sentido o Curso Superior de Letras.

Consultado o Conselho Superior de Instrucção Publica, onde estão individuos de todos os partidos politicos e de toda a competencia scientifica, foi elle de parecer, que eu acceitei, que se devia reformar o Curso Superior de Letras de modo que elle servisse de habilitação para o magisterio superior. D'ahi resultou, é claro, a criação de novas cadeiras.

Estranhou então S. Exa. que eu tivesse nomeado para ellas professores, sem concurno.

Só nomeei, sem concurso, aquelles que tinham competencia provada para m cadeiras que iam reger. E respondo com os nomes á vista.

As nomeações que eu fiz, foram: do Sr. Consiglieri Pedroso, professor antigo do Curso Superior de Letras e director d'aquelle instituto. Nomeei o Sr. David de Mello Lopes, para professor de lingua francesa. Não o conheço; amigo politico não me consta que seja; mas é considerado como o primeiro professor de lingua francesa.

Nomeei professor de pedagogia para o ensino secundario, o Sr. Adolpho Coelho, que não é meu amigo politico, nem milita nas minhas fileiras; mas nomeei-o porque

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elle é a alta competencia provada para a gerência d'aquella cadeira. Colloquei o Sr. Consiglieri Pedroso na cadeira de historia patria, para a qual as suas habilitações não soarem contestação de ninguem.

Nomeei o Sr. Dr. José Maria Rodrigues para a cadeira de philolegia latina; não é meu amigo politico, mas é o primeiro Reitor dos nossos lyceus, e é uma competencia absoluta para essa cadeira.

Para a cadeira de philosophia nomeei o Sr. Silva Cordeiro; vi este cavalheiro, pela primeira vez, quando foi a minha casa agradecer a sua nomeação.

O Sr. Egas Moniz (áparte): - Ê claro que V. Exa. nomeia muita gente que não conhece pessoalmente.

O Orador: - Nomeio quando, apesar de não conhecer pessoalmente, possuo referencias, informações e juizos formados acêrca da competencia e valor dos individuos.

Mas esta nomeação foi tambem da approvação do Sr. Jayme Moniz, não podendo ninguem duvidar nem da competencia do informador nem da competencia do professor nomeado.

Nomeei também o Sr. Queiroz Velloso, de quem tenho a honra de ser amigo, e que era um professor distinctissimo.

O Sr. Egas Moniz: - Professor de quê?

O Orador: - De historia.

O Sr. Egas Moniz: - Onde mostrou elle conhecimentos de pedagogia?

Eu não quis trazer nomes para a discussão, mas é V. Exa. que os está trazendo!

O Sr. Presidente: - O illustre Deputado não está auctorizado a interromper o orador. (Trocam-se alguns ápartes e levanta-se sussurro}.

O Orador: - Professor de historia. Ê o assumpto que tem versado durante muitos annos.

O Sr. Egas Moniz: - Não duvido da capacidade scientifica d'esse cavalheiro, mas como a provou S. Exa.?

O Orador: - Provou-a primeiro no concurso, onde obteve a melhor classificação; provou-a depois como professor, na pratica do ensino. (Sussurro).

Vozes: - Ordem, ordem.

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados que deixem continuar o orador no uso da palavra. Assim, não pode continuar a discussão.

O Orador: - Eu trouxe tudo á Camara: todas as reformas que fiz, todas as nomeações.

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - Só duas cadeiras ficaram por prover, a cadeira de historia e a de geographia.

E essas não as provi por uma razão: porque para essas cadeiras havia muitos individuos habilitados, e entendi dever abrir concurso. Somente para aquellas em que havia competencias superiormente provadas é que nomeei sem concurso.

Aqui tem o illustre Deputado quaes foram os amigos politicos que nomeei para essas cadeiras.

Agora resta-me só falar da reforma de instrucção primaria. (Trocam-se alguns ápartes).

Os illustres Deputados não gostam, bem sei, mas hão de ouvir-me. (Sussurro).

Vozes: - Ordem, ordem.

O Sr. Rodrigues Nogueira: - Quem não gosta o país, que tem de pagar toda esta bambochata!

O Sr. Presidente: - Peço ordem.

O Orador: - Veja o país, e compare!

Eu sou accusado de ter perpetrado reformas que escandalizaram o país; e quando trago tudo, absolutamente tudo, os principios em que me baseei, as pessoas que nomeei, todos os actos que por mim foram praticados, a opposição levanta-se, e ás palavras com que formulo as idéas que traduzi nessas reformas, aos argumentos que contraponho ás investidas dos illustres Deputados, e aos factos que provo me justificam do meu procedimento, - os illustres Deputados respondem tendo só em vista, nessa resposta, abafar-me a voz, que é realmente o unico meio de me não deixar perfeitamente justificar! (Sussurro. Trocam-se ápartes).

Vozes: - Ordem, ordem.

O Sr. Presidente: - Chamo á ordem os Srs. Deputados e peço-lhes que não interrompam o orador.
O Orador: - Reconheço plenamente aos illustres Deputados o direito de me arguirem...

Uma voz: - Não nos faz favor nenhum.

O Orador: - Mas hão de reconhecer-me o direito de me defender. Não é só accusar, é tambem ouvir. (Levanta-se sussurro).

Vozes: - Ordem, ordem.

O Orador: - Creiam os illustres Deputados que, em primeiro logar, em nada me amedrontam, porque estou habituado de ha muito a estas lutas parlamentares; depois, e porque eu tenho a consciencia do direito que me assiste de me defender, creiam que por mais que me interrompam me ha de chegar a occasião de plenamente me justificar.

O Sr. Presidente: - Deu a hora de passar á ordem do dia.

Vozes: - Fale, fale.

O Orador: - Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

(S. Exa. não revê os seus discursos).

(Ápartes na esquerda da Camara).

O Sr. Presidente: - Peço ordem aos Srs. Deputados. Deu a hora para se passar á ordem do dia, e S. Exa. o Sr. Presidente do Conselho, não pode, portanto, continuar no uso da palavra.

Os Srs. Deputados que tiverem papeis para mandar para a mesa, podem fazê-lo.

Lê-se na mesa a seguinte

Nota

Devendo entrar em execução no dia 6 do corrente o novo regulamento do Hospital de Penamacor, desejo saber se o artigo 54.° do regulamento de 16 de janeiro de 1902 mantem os direitos dos actuaes empregados do Hospital de Penamacor e se o logar de secretario corresponde ao de escripturario, fiel do antigo regulamento de 1889. = Conde de Penha Garcia.

Não foi reconhecida a urgencia.

O Sr. Reis Torgal: - Mando para a mesa um projecto de lei concedendo aos Deputados da Nação, durante as sessões das Côrtes Geraes, o subsidio que estava fixado por decreto de 29 de julho de 1886 e nos termos ali expostos.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Antonio José Boavida: - Mando para a mesa um projecto de lei, criando um juizo de paz em Monforte da Beira, o qual será constituido por esta freguesia e pela de Malpica, ambas do concelho e comarca e Castello Branco.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, com a maxima urgencia, me seja expedida nota do seguinte:

1.° Viagens feitas pelo Sr. Philippe Belford, agente de propaganda de vinhos, no anno de 1901.

2.° Verbas que recebeu a titulo de ajudas de custo, especializando as que lhes foram dadas por carta de credito para despesas de expediente.

3.° Qual o seu ordenado mensal cobrado naquelle anno.

4.° Tendo outra collocação official, as verbas que recebeu em virtude d'essa collocação.

5.° Quem assignou o recibo das verbas pagas para aju-

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das de custo ou despesas de expediente, ao mesmo senhor

6.° Qual a verba mensal paga como remuneração a titulo de agentes do mercado central de productos agricolas aos agronomos dictrictaes.

7.° Indicação da disposição legal que auctorizou este pagamento.

8.º Quão» as quantias entregues ao Mercado Central de Productos Agricolas para despesas geraes.

9.º Especificação das quantias pagas, por qualquer titulo, aos funccionarios do referido Mercado e sua commissão directora.

10.° Finalmente, qual a disposição legal em que se apoia a cobrança particular de 1 por cento ad valorem sobre as mercadorias apresentadas a despacho no referido Mercado.

Declaro que com estes documentos pretendo habilitar-me para interpellar nesta Camara o Sr. Ministro das Obras Publicas. = Queiroz Ribeiro.

Mandou-se expedir.

O Sr. Vellado da Fonseca: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Tendo S. Exa., o Sr. Ministro do Reino, affirmado na sessão de hoje que todas as Faculdades universitarias estão completamente satisfeitas, quanto aos seus desejos e aspirações, desejo interrogar S. Exa. sobre a reforma da Faculdade de Philosophia. = Antonio Maria Vellado da Fonseca.

Mandou-te expedir.

O Sr. Oliveira Simões: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que seja enviado á illustre commissão de fazenda o requerimento documentado de Carolina Augusta Ribeiro, apresentado a esta Camara no anão de 1884, e que se acha archivado. = José Maria de Oliveira Simões.

Mando tambem para a mesa uma proposta de renovação de iniciativa do projecto n.° 82, de 1901, que tem por fim considerar de provimento vitalicio os logares de mestres do Instituto Industrial e Commercial de Lisboa, no fim de dois annos de bom e assiduo serviço, conservando-se-lhe a actual remuneração.

Ficou para segunda leitura.

O requerimento vae ser expedido.

O Sr. Frederico Ramirez: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro me sejam enviadas pelo Ministerio da Fazenda, com a maxima urgencia, copia da circular n.° l5, de 17 de maio de 1900, enviada pelo delegado do thesouro de Faro ao escrivão de fazenda do districto.

Copia do parecer da Procuradoria Geral da Coroa relativamente á forma de collectar as fabricas de conservas de peixe de Villa Real de Santo Antonio.

Informação exacta da forma como se collectam os industriaes de conservas residentes em Olhão, Portimão, Lagos, Setubal e Espinho.

Sala das sessões da Camara dos Senhores Deputados, 31 de janeiro de 1902. = 0 Deputado, Frederico Ramirez.

Mandou-se expedir.

O Sr. Francisco José Machado: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me seja enviada com a maior urgencia, copia do despacho ministerial que auctorizou o pagamento das quantias em divida, provenientes de arrendamentos do casas para os postos fiscaes da antiga fiscalização externa, referente aos annos de 1882, 1883, 1884 e que foram pagos em 1887, depois do repetidas e instantes reclamações dos interessados. = F. J. Machado.

Requeiro que, paio Ministerio da Fazenda, me seja enviada copia da correspondencia trocada entre aquelle Ministerio e o Banco de Portugal, referente ao contrato que o Governo pretende fazer com este estabelecimento.

Sala das sessões, l de fevereiro de 1902. = F. J. Machado.

Mandaram-se expedir.

O Sr. André de Freitas: - Mando para a mesa a seguinte

Declaração

Declaro que, por incommodo de saude, não póde comparecer nesta Camara nas ultimas sessões. = André de Freitas.

Para a acta.

O Sr. Raposo Botelho: - Mando para a mesa a seguinte

Declaração

Declaro que lancei na caixa das petições um requerimento em que o primeiro sargento graduado cadete, José Eduardo Franco Antunes Centeno, pede que seja confirmada a sua admissão como alumno na Escola do Exercito. = José Nicolau Raposo Botelho.

Para a acta.

O Sr. Presidente: - Chamo a attenção da Camara para lhe communicar que o Sr. Conde de Penha Garcia pediu a palavra para um negocio urgente, que a mesa não considerou como tal, mandando para a mesa uma nota que para melhor clareza do assumpta se vae ler.

(Leu-se).

Vou portanto consultar a Camara sobre se considera este negocio como urgente e se permitte que S. Exa. use da palavra.

Convido os Sr. Deputados a occuparem os seus lagares.

(Consultada a Camara, não foi reconhecida a urgencia}.

O Sr. Carlos Ferreira: - Era uma cerimonia com que não valia a pena gastar tempo!

O Sr. Presidente: - Cumpro o Regimento e nada mais.

ORDEM DO DIA

Interpellação do Sr. Conselheiro João de Alpoim sobre o uso que o Governo fez das auctorizações parlamentares

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Conselheiro Alpoim, para a realização da sua interpellação ao Sr. Ministro do Reino.

O Sr. José de Alpoim: - Deve ser calmo, que é a força dos que teem serenidade; e bastante violencia tem que exercer sobre a sua palavra, para que ella saia serena e tranquilla, depois de largas horas de trabalho no remanso do seu gabinete, vendo perpassar todas as cousas e todas as pessoas que emergem do revolto mar das auctorisações parlamentares.

Não é em nome dos intuitos partidarios que vae falar; vem trazer a paz; ergue na mão o ramo de oliveira, e vem, em nome do passado que é triste, em nome do presente que é cheio de torvas apprehensões, e em nome do futuro, que pode ser bem doloroso, pedir que o escutem, por piedosa mercê, até que acceitem e approvem a proposta que ha de mandar para a mesa, em nome dos interesses sagrados da patria.

Vae expungir do seu discurso todos os aggravos pessoaes; esqneceu-os; crê que não tom na sua vida publica nenhum acto de que se penitenceie; offerece se, no entanto, humilde, em holocausto e acceita todas as censuras e até aggravos, desde que consiga evitar o que julga uma grande desgraça nacional.

Ha um anno o Sr. Beirão, a quem tanto venera, como correligionario e a quem tanto ama como amigo, pediu ao Sr. Presidente do Conselho que retirasse as auctorisações

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parlamentares que pedira, ou ao menos marcasse o termo d'essas auctorisações; S. Exa. não acceitou esse pedido porque, segando declarou, precisava d'essas auctorizações; mas marcou-lhe um termo, que era o dia 31 do dezembro de 1901.

Causou-lhe assombro essa declaração, porque se lembrou do que occorrera em 1897 com as auctorizações concedidas ao Governo progressista de então, que S. Exa. declarou que não reconhecia, nem manteria, porque taes auctorizações não as concederia a Governo nenhum.

Entretanto quis para si essas auctorizações! Solicitou-as e acceitou-as!

Não censura a mudança de opinião e comprehende que os homens publicos mudem de altitude, quando obedecem a um grande sentimento nacional. Succedeu isso na Inglaterra, com a politica do velho Gladstone, na França com Jules Ferry, na Allemanha com Bismarck em cuja obra, através de todas as cambiantes, transparece sempre a idéa da grandeza da Allemanha. Crê, portanto, que o Sr. Presidente do Conselho obedecia a essa alta inspiração do sentimento nacional, ou ainda a razões de nobre paixão partidaria, ao pedir essas auctorizações, e que ellas seriam utilizadas na idéa de reduzir as despezas publicas.

Pela forma por que ellas eram redigidas eram mesmo uma delegação da Camara ao poder executivo, para que se fizesse a remodelação dos serviços publicos em ordem a obter economia para o Thesouro e melhoria para o serviço.

Vae ver como o Governo usou d'ellas, começando pela nomeação de empregados publicos, e o que logo se lhe depara é a reforma do instrucção primaria, de cujo ventre fecundo surgem inspectores, sub-inspectores, inspectores sanitarios, directores technicos, secretarios, amanuenses e continuos.

Passa á Direcção Geral de Instrucção Publica, segue pelo Curso Superior de Letras, sobe as escadas do Museu Ethnographico, assiste ao desfilar do grande exercito da Inspecção Geral dos Impostos, que ostenta ao vento fartos estandartes, e veste luzidas fardas agaloadas de oure, defronta com a Administração das Alfandegas, admira na fachada do edifício da Bibliotheca, como forte brasão em altivo escudo, a figura do bibliolhecario-mor, que não sabe quem é, pode mesmo ser que seja seu amigo, entra pelo Conservatorio, e o que se lhe depara em toda a parte é uma enorme legião de empregados, sob todos os titulos a de todas as categorias.

Falando no Conservatorio, não pode, porem, deixar de pedir aos Srs. Ministros da Justiça e da Fazenda que sejam os primeiros discipulos das novas aulas de harpa e oboé, ao primeiro porque o oboé lembra elegia, ao segundo, porque tambem o Rei David tocava harpa e dansava deante da Arca da Alliança, e S. Exa., de borzeguins escarlates e vestes do pagem, como nas procissões das nossas provincias, podia tocar nesse instrumento, deante da esvasiada arca do Thesouro.

Para adestrar S. Exa. nos manejos da dansa tambem tem um professor; é o professor da gymnastica theatral.

Foi ironico, talvez, nestas palavras; pede desculpa, não quis ser alegre, quiz pôr em relevo o que foram as reformas do Sr. Presidente do Conselho, e como foram augmentadas as despesas.

Passa, pois, adeante, e tem chegado ás auctorizações parlamentares, que foram feitas para organizar serviços e obter reducção de despesas, condição obrigatoria inserida em differentes alineas.

Em umas d'essas alineas prohibe-se o Governo de contratar empregados; entretanto o decreto que reforma os estatutos da Universidade, permitte a criação de cursos livres, doutrinados por professores nacionaes ou estrangeiros. O mesmo succede no decreto que reformou o Curso Superior de Letras.

Numa outra alinea consigna-se a prohibição de se concederem aposentações extraordinarias de empregados, e todavia no decreto relativo á policia repressiva da emigração, concede-se essa aposentação.

Tambem se alteraram as normas de aposentação das praças de pret da Guarda Municipal e beneficio semelhante foi ainda concedido aos empregados do Posto Meteorologico da Serra da Estrella.

Estes tres exemplos mostram que tambem nesta parte a lei foi desrespeitada.

Em outra alinea prohibia-se ainda tornar definitivos os empregados provisorios e comtudo no decreto referente á policia de emigração determina-se que sejam considerados definitivos os empregados que tenham tres annos de serviço.

Mostrou já tres prescripções da lei, que foram fundamentalmente esquecidas, mas ha cousa mais grave. E o que se refere, propriamente, ao augmento da despesa.

Esse augmento resulta, inquestionavelmente de quanto tem já dito, porque nomear centenas de empregados, não demittindo nenhum e aposentando outros, fatalmente augmenta a despesa.

O proprio Governo é reu confesso, que em muitos dos decretos a que se tem referido, declara que a despesa é augmentada, não podendo, sequer, calcular-se até onde vão esse augmento, porque nas tabellas de despesa nem apparecem os nomes dos funccionarios nomeados. Alem d'isso todos os dias vão apparecendo no Diario novas rectificações e nenhuma d'ellas é para diminuir a despesa.

Mas o que é gravissimo é quo dentro dos proprios decretos, ha novas auctorizações, tão largas, que o Governo pode, á sombra d'ellas, gastar centenas e milhares de contos, de réis.

É o que se conclue, por exemplo, dou artigos 22.° e outros do decreto que reforma a instrucção primaria, no que reforma a Universidade, e ainda em outros, que não menciona para não cansar a Camara.

Mais grave, porem, do que tudo isto, é a reducção das receitas, demonstrada na extincção dos arbitradores, judiciaes, que não traziam nenhum encargo para o Estado e o beneficiavam, porque só em contribuição industrial pagavam perto de 12 contos de réis, não falando em sêllo de diplomas, direitos de mercê, etc., etc., e confirmada ainda na isenção do pagamento de contribuição de renda de casas, concedida aos empregados da Inspecção Geral do Thesouro.

Faltou, portanto, o Governo a todos os compromissos solemnemente tomados, em resposta ao Sr. Beirão.

Como porem, a elle, orador, não o movem intuitos politicos, vão apresentar á Camara uma proposta, que deve ter como consequencia a suspensão immediata de todas as auctorizações de que o Governo se vestiu e de todas as nomeações já feitas ou que ainda tenha a fazer.

Rematando em seguida o seu discurso, pela declaração de que não teve a idéa de aggredir, politicamente, o Governo e simplesmente erguer o ramo de oliveira, symbolo de paz, o orador lê e manda para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que se eleja uma commissão de vinte e um membros para dar parecer sobre deverem ou não ser confirmadas, para terem força de lei, as providencias de caracter legislativo decretadas pelo Governo até 31 de dezembro de 1901, que excederem a auctorização concedida pela carta de lei de 12 de junho de 1901, e que esta commissão se faça dividir em sub-commissões por especialidades de materias. = José de Alpoim.

Foi admittida.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir).

O Sr. Presidente: - Consta-me que se acha nos corredores da Camara o Sr. Deputado Ressano Garcia, a fim de prestar juramento. Convido os Srs. Deputados Conse-

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lheiros Beirão e Espregueira a introduzirem S. Exa. na sala.

Foi introduzido prestou juramento e tomou assenta.

O Sr. Beirão: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que a presente interpellação se generalize. = F. Beirão.

Foi approvado.

O Sr. presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Sr. Presidente: chegou, emfim, a tremenda accusação ao Governo, o Dies Irae! Chegou, emfim, pela palavra do illustre Deputado o Sr. Conselheiro Alpoim, que acaba de dardejar raios sobre todas as reformas feitas pelo Governo, e que começou o seu discurso penitenciando-se o batendo contrictamente no peito.

Para ter auctoridade suprema, para confundir os abusos, os crimes praticados por este nefasto Governo, essa figura austera, implacavel, que vinha assim fulminar o procedimento do Governo, precisava de começar por se penitenciar a si mesma, de se penitenciar do seu proprio procedimento.

Era a consciencia que lhe dizia que para elle poder atacar as reformas publicados, as medidas, as providencias que o Governo adoptou, tinha primeiro de vir, não como censor, mas como peccador contricto; não como auctoridade inconcussa, mas como arrependido e regenerado dos proprios errou que commetteu. Era só assim que elle, na sua propria consciencia, interrogando o seu passado o vida publica, julgava poder ser admittido a censurar e a condemnar os autos d'este Governo.

Chegou, emfim, a enorme, a tremenda accusação ao Governo, e ninguem mais do que o Governo folga com isso; porque, que o illustre Deputado se apresente contricto, que o illustre Deputado diga que nos trax, como pomba sem fel, o raminho de oliveira na mão candida, ou que o illustre Deputado se apresenta fulminando phrases vehementes, austeras, implacaveis, contra os actos do Governo, - a attitude do Governo é sempre a mesma, porque tem por si a consciencia dos seus actos.

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - Venha o illustre Deputado como entender, como o sou criterio lhe suggerir, e venham os outros illustres Deputados á arena a terçar armas commigo; venham apreciar os nossos decretos, venham combatê-los (que é essa a sua missão) e verão que nesta arena, em que todos nós temos voz e nos fazemos ouvir, não é o Governo que se arreceia d'essas accusações com que o illustre Deputado quer profligar o procedimento do Governo, apresentando-o aqui como réu, quando o Governo tem a consciencia perfeita de ter cumprido o seu dever.

Repito eu que o Governo não se arreceia da luta, não está tremendo das accusações, não foge ao debate, porque não vem aqui, confesso e envergonhado, como se tivesse um passado todo cheio de írregularidades, de actos de favoritismo, que pudessem constituir uma accusação vehemente. O Governo não se esconde da luz do sol, como misero animal que fica na toca por não poder fixar a que o cega. Mercê de Deus, a luz não nos cega a nós.

Vem sereno o illustre Deputado; vem com candido ramo de oliveira, na mão. E qual e esse ramo de oliveira que o illustre Deputado nos traz, qual é esse penhor de paz, o onde está essa proposta de conciliação, essa harmonização quo S. Exa. propõe e quer que nós acceitamos?

O ramo de oliveira, a proposta de paz, o titulo de harmonia, estão aqui: estão numa moção quo S. Exa. mandou para a mesa, e em virtude da qual lança a suspeita, a desconfiança, a condemnação, sobre os actos do Governo!

Porque S. Exa. quer que o Governo, que usou das auctorizações de uma maneira regular, venha ao Parlamento não discutir o seu procedimento, não justificar os seus actos, mas confessar, como reu contricto, que abusou das auctorisações que lhe foram concedidas.

Podo a Camara resolver como entender; mas o Governo é que tal não fará, porque a accusação de S. Exa. não e justa e a censura, portanto, é descabida.

O Governo acceita a responsabilidade, mas quer justificar os seus actos, embora repudio para longe de si esse tal raminho de oliveira. (Apoiados).

Digo ao illustre Deputado: discutamos, que para discutir é que estamos aqui.

Mas o illustre Deputado quer discutir com serenidade? Tambem eu.

S. Exa. conhece a minha serenidade, a minha serenidade antiga que não pode ser perturbada pelas exaltações da opposição, porque, quando preciso dar contas dos meus actos, não na ninguem que entibie a minha coragem. (Apoiado»).

O illustre Deputado começou por dizer que no anno passado, quando aqui discutiamos o orçamento, o meu nobre amigo pessoal e inimigo politico, dos mais facciosos e dos mais intransigentes, o Sr. Beirão, me tinha convidado a renunciar as auctorizações que pedi o que me recusara a isso, obstinadamente.

Porque me recusei?

Disse o illustre Deputado, em contradição flagrante, em antinomia com as declarações feitas em 1897, quando o Governo a que o illustre Deputado pertenceu, aqui veiu pedir ao Parlamento auctorizações como eu não pedi, e como até então nenhum Governo tinha pedido: porque foi que eu não accedi ao pedido do illustre Deputado, o Sr. Beirão, e que insisti nas auctorizações pedidas? Foi, apenas, porque julguei que estava nisso o cumprimento do meu dever, porque até então não era mysterio para ninguem que o Parlamento contava com poucos dias de vida e eu precisava, desde que não podia contar com o Parlamento, munir-me das auctorizações necessarias para poder caminhar audaz e intemerato para a resolução d'esta questão, a fim do que a nossa administração tivesse por parte do Governo, não só a sua iniciativa, mas a acção que era indispensavel para resolver os problemas mais graves.

S. Exa. o Deputado hoje, Ministro hontem, Ministro ámanhã; e não preciso dizer-lhe o que elle bem sabe: é que para um homem de Governo, entre a declaração de hoje e a necessidade de uma resolução de momento, não ha hesitação de um instante.

É por isso que, se eu me posso arrepender, não é das dictaduras que tenho feito, mas das declarações que porventura ás vezes tenho feito tambem. Nestas e que julgo que pode haver o arrependimento do ámanhã.

Mas que eu, que tenho a responsabilidade do Governo, que tenho deveres a cumprir e um caminho a trilhar na minha vida publica, possa praticar um acto de incoherencia era relação a uma declaração do hontem, comprehende-se. Não ha nenhum homem publico que o não tenha feito, e tanto mais quantas mais vozes tem sido chamado a gerir os negocios do Estado.

Mas que nesta propria sessão legislativa, num dia se faça uma declaração solemne (tambem com os taes ares ponderosos a que ha pouco S. Exa. se referiu, com esse tal modo grave, composto e supremo, como fala em geral o cathedratico), mas, digo eu, que num dia se faça uma declaração em nome de um partido (que se não tem obrigações do Governo, tem todas as responsabilidades de acção publica) e que no outro dia se rasgue essa declaração, isso é que tem mais da consuravel do que a pretendida incoherencia que o illustre Deputado me pretende ver. (Apoiados).

Ora, quer o illustre Deputado ver onde está a incoberoencia? Em poucas palavras a vae alcançar.

Abriu-se o debate da resposta ao Discurso da Coroa,

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veiu o nobre tender da opposição progressista, o Sr. Beirão (que é quem tem maior categoria e por consequencia maior competencia e auctoridado para dizer, em nome do seu partido, solemnemente, com os taes ares ponderosos e altivos, como quem representa no país uma força e no partido uma auctoridade indiscutivel), levanta-se o nobre Deputado e declara de forma que todos ouviram, e declarou exactamente para que o país o soubesse: «Nós, partido progressista, declaramos não cooperar com o Governo, que assumira a dictadura e usara de auctorizações como meios ordinarios e regulares de governar».

Ora bem. Nós tinhamos feito dictaduras e usado de auctorizações.

As nossas dictaduras, que não eram meios ordinarios e regulares de Governo, e que eram oppostas ás declarações do illustre Deputado e por isso deviam ser discutidas, o partido de S. Exa. não a discute! Mas discute e censura as auctorizações, que eram meios ordinarios de administração!

Se não coopera em relação ás auctorizações quando forem meios ordinarios de Governo, quando forem meios extraordinarios, é que coopera. Não approva a dictadura como meio ordinario, mas por circumstancias extraordinarias não discute a dictadura, discute as auctorizações.

Disse o illustre Deputado: Mas ainda suppusemos que as auctorizações pedidas pelo Governo eram para reduzir as despesas, eram para fazer uma administração severa, era para conter os desperdicios dos actos de favor nas nomeações, nos despachos de todos os dias; e qual foi o nosso assombro quando vimos, em presença das provas fornecidas por essas auctorizações, infringirem-se uma a uma as condições impostas pelo proprio Governo nessas auctorizações!

O illustre Deputado labora num erro. Eu nunca disse que o Governo pedira as auctorizações unicamente para reduzir as despesas.

Acceitei a condição de não augmentar as despesas (o que é diverso), e cumpri-a; mas nunca disse que era para effectuar reducções de despesa que o Governo pedia as auctorizações.

O Sr. José de Alpoim: - Não o disse, mas é o que está na auctorisação.

O Orador: - Peço desculpa, mas não está. Eu leio a auctorização que está deante de mim. A auctorização está na lei do anno passado que é a repetição do que está na lei de 1897. A lei de 1897 diz o seguinte:

«6.° A reorganizar os quadros e os serviços publicos dos diversos Ministerios, e das suas dependencias em ordem a obter a maior reducção das despesas actuaes, assim como a possivel simplicidade, e a regularidade de funccionamento dos mesmos serviços, ficando expressamente prohibido em toda a reforma que, no uso d'esta auctorização, for decretada:

a) Augmentar a despesa actual, não se computando, para o confronto d'esta despesa com a que resultar das novas organizações, quaesquer gratificações descriptas no orçamento quando não sejam fixadas nos diplomas organicos de serviços; devendo, porem, contar-se para o dito confronto, com a despesa que a mais vier a fazer-se com a criação ou augmento de emolumentos, e com os empregados addidos, por virtude das mesmas organizações».

Isto é o que aqui está. As auctorizações não foram pedidas exclusivamente para reduzir as despesas; foram para simplificar serviços, para estabelecer ordem. Onde pus a condição de que essa auctorização era para reduzir as despesas? Mas o illustre Deputado disse que era essa a condição. Não era, positivamente. (Apoiados).

Mostrarei ao illustre Deputado que a razão das auctorisações era melhorar o serviço, aperfeiçoar os differentes ramos da administração publica, prestando manifesta vantagem á engrenagem da nossa economia no que toca ao desenvolvimento dos differentes ramos que decretei e que contribuem e são garantia para esse desenvolvimento. Tudo isto fiz sem augmentar as despesas. (Muitos apoiados).

Para onde vae essa tremenda accusação ao Governo, a respeito de despachos feitos, de nomeações realizadas? (Muitos apoiados).

Para onde vae, finalmente, a proposta que o illustre Deputado apresentou como anathema fulminante contra nós, somo uma sentença lavrada contra o Governo? (Muitos apoiados).

O illustre Deputado veiu dizer-nos que o Governo tinha augmentado as despesas, infringindo assim as condições impostas pela lei; e eu vou mostrar á Camara quanto isso é absolutamente inexacto, que não ha Ministerio algum, por onde se fizesse uso das auctorizações, em que nas providencias em virtude d'ellas tomadas, não corresponda ao augmento de despesa a criação de receita superior a esse augmento.

Vou provar-lhe que não ha um só Ministerio em que isto não acontecesse.
(Exclamações da esquerda).

Mas, não nos agitemos. Porque não hão de os illustres Deputados, serenamente como o illustre Deputado o ar. Alpoim quis fazer, e com aquella serenidade que S. Ex.a. nos aconselhou, aguardar que eu responda e justifique os actos do Governo, demonstrando que as preoccupações que S. Exa. tem são absolutamente descabidas? (Apoiados). Qual foi a asserção do illustre Deputado o Sr. Alpoim?
Foi a de que nem uma só das condições, expressas na lei do anno passado, nas auctorizações que o Parlamento votou, deixou de ser infringida. S. Exa. é muitissimo habil nas finuras parlamentares, dispõe de uma palavra não só fluente, mas alta, elevada na concepção e na forma, e com todos aquelles poderes oratorios de que dispõe, depois de ter feito divagações esplendidas a respeito do que se tem passado na vida politica do estrangeiro, e de ter evocado personagens isolados mas proeminentes na historia de outros tempos, depois de ter feito brilhar as suas imagens e figuras de rhetorica mais bellas, S. Exa. percorreu rapidamente differentes decretos, e no que se refere á instrucção publica citou os inspectores e sub-inspectoras, o pessoal da direcção que nomeei; passou em seguida para o Curso Superior de Letras citando as cadeiras novas; d'ahi saltou para o Museu Ethnographico; seguiu para a reforma dos serviços de fazenda; para a da Administração das Alfandegas; para a das Bibliothecas; vae até á do Conservatorio e termina na criação do logar de professor de gymnastica theatral: mas tudo isto com uma tal rapidez, levado no brilho da sua palavra tão meridional e imaginosa, que por mais que eu quisesse tirar apontamentos para lhe dar resposta, tive difficuldade em o fazer. (Exclamações da esquerda).

Porque é que S. Exas. se incommodam tanto ao ouvir-me? O illustre Deputado o Sr. Alpoim veiu, rapidamente nesta escala progressiva, neste andar apressado, saltando de um para outro decreto, mal me dando tempo a poder acompanhá-lo. Mas, Sr. Presidente, quando chega ao fim, eu reconheço então que não tinha de o acompanhar em cousa alguma, e por uma razão: porque d'esse brilhante anathema vasio, eu vi que não estava de pé uma só accusação contra o Governo! (Apoiados).

No Conservatorio ha uma aula de harpa? O que seria para estranhar é que lá houvesse um bibliothecario-mor. O illustre Deputado usou da palavra, e, como um grande maestro, quando compõe um crescendo, vae gradualmente subindo e avolumando a composição e carregando a instrumentação até chegar ao mais grave, alto, sonoro e produz maior impressão no espirito dos ouvintes, o illustre Deputado compôs um crescendo, e nós o vamos acompanhando passo a passo, para ver as conclusões que o illustre Deputado tira, conclusões que me assombraram pela novidade, a mim, que sou o auctor das reformas. O illus-

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tre Deputado elisão que ellas custavam centenas ou milhares de contos de réis. Isto é um assombro, E tanto assim, que ao o Sr. Presidenta não nos desse um pequeno intervallo, fazendo introduzir o Sr. Ressano Garcia, era que eu pude sacudir a impressão que o illustre Deputado me deixou, parece-me que até iria... votar a sua proposta.

Realmente, assombrou-me. Vamos ás condições:

1.ª condição: não augmentar a desposa. Como é que esta condição está imposta e para quê?

Agora deixemos o canto o a harpa e o professor de gymnastica e vamos á logica, que é tambem uma cousa preciosa para a discussão. Não augmentar as despesas, como se entende? Ê em relação a qualquer providencia isolada que o Governo tomou? Não. É era relação a um complexo de providencias e não só ás providencias que tomei pelo Ministerio do Reino, de forma a dar uma resultante a todas as pastas.

Por consequencia, vê-se que não ha Ministerio, onde balanceadas as receitas com as despesas, confrontadas as que se fazem depois das reformas com as que se faziam anteriormente, não ha Ministerio algum em que as despesas sejam superiores áquellas que existiam. Demonstrado isto, todas as considerações do illustra Deputado desapparecem, caindo pela base. (Apoiados).

Vejamos se assim é, e visto que se trata de reus, devo penitenciar-me em primeiro logar, e ser o primeiro a vir de corda ao pescoço, para que o Parlamento tomo sobre mim a resolução que entender melhor, absolvendo-me ou condemnando-me.

Synthetizemos todos as providencias tomadas pelo meu Ministerio. Receitas que criei, augmento de propinas:

(Leu).

Portanto, augmentei as receitas e diminui as despesas, por forma a conseguir um saldo a favor da reforma do meu Ministerio.

Vozes: - Muito bom.

O Sr. Fialho Gomes: - Isto é da gente se benzer.

O Orador; - Quando os Illustres Deputados queiram ver, estão aqui todos os documentos ás suas ordens.

O Sr. Oliveira Mattos: - Peço a V. Exa. que publique esses documentos no Diario das Sessões.

O Orador: - Tudo que V. Exa. quiserem. Tenho aqui as notas fornecidas pelo chefe da contabilidade.

O confronto das estatisticas dá este resultado.

A acção de se benzer pratica-se nos actos do fé, mas agora não se trata de ter fé; trata-se de examinar, de confrontar, de criticar dados estatisticos, provas documentadas.

Portanto, não é necessario benzerem-se os illustres Deputados; o que é neccessario é que nós discutamos.

Melhor do que com palavras, eu estou argumentando com numeros.

Isto quanto ao meu Ministerio; mas vamos a outros a que o illustre Deputado se referiu.

S. Exa. referiu-se ao Ministerio da Fazenda.

Aqui tem S. Exa. um mappa.

O illustre Deputado, Sr. Alpoim, no Ministério da Fazenda, referiu-se ás reformas dos serviços de fazenda, e ahi despejou as suas iras, as suas arguições mais fundas e mais terriveis.

Ora, vamos a ver as repartições de fazenda. Aqui estão:

(Leu).

Aqui tem o illustre Deputado; quando estas providencias forem successivamente executadas, a economia irá crescendo ato 48:400$000 réis.

Não são mappas que eu traga para meu uso; são mappaa que aqui estão á disposição de todos os Srs. Deputados.

Quanto á reforma da Guarda Fiscal, outra reforma feita pelo Ministerio da Fazenda, tambem resulta differença para menos 35:367$066 réis.

Tudo isto está aqui, num mappa enorme, com cuja leitura não quero cansar a attenção da Camara, mas que os illustres Deputados podem examinar, se quiserem.

Ora, se os Ministerios que o illustre Deputado atacou, foram o Ministerio do Reino por áquellas reformas que tive a honra do fazer, e o Ministerio da Fazenda, e se eu demonstro, não com ramalhetes de flores oratorias, mas com algarismos, que d'estas reformas, longo de resultar augmento de despesa, resultara economias ou ha compensações, em receitas criadas, veja-se para onde vão a accusação do illustre Deputado, e como caem por terra todas as suas trovejadoras affirmações!

Quanto á primeira condição que se disse infringida, parece-me que a minha demonstração foi completa (Apoiados), porque á spalavras contraponho algarismos, porque são os escondo, não os guardo para mim e os forneço á opposição.

Vamos á segunda condição, que o illustre Deputado disse que foi infringida.

É o segundo mandamento: não contratar empregados.

Diz S. Exa. que na Universidade e no Curso Superior de Letras lá estão nas auctorizações outras auctorizações para contratar empregados. Ora, entendamo-nos.

O que é que está na lei de 1897, que passou para a lei do anno passado e que o illustre Deputado diz que infringi?

Está o seguinte:

(Leu).

E é por isso que as suas conclusões peccam, porque não teem rigor logico e porque S. Exa. architectou permissas para depois tirar coronarios que as proprias permissas não conteem.

O que está na lei é outra cousa bem diversa do que o illustre Deputado affirmou.

O illustre Deputado não vê, em nenhuma das reformas a que se referiu, que o Governo tivesse a faculdade de contratar empregados, alem dos existentes, por forma a esquecer-se das auctorisações legislativas.

S. Exa. disse: prohibe-se a aposentação em condições especiaes; e, todavia, o que faz o Governo no decreto relativo ás praças reformadas da Guarda Municipal?
Altera as condições da reforma.

Ora, isto não é exacto. O illustre Deputado tem aqui o decreto relativo á policia da emigração o pode ver se alterei as condições da aposentação.

Diz o artigo 7.º:

(Leu).

Com relação ás pensões para as praças reformadas da Guarda Municipal, o illustre Deputado referiu-se á aposentação com pensões. Pois eu não alterei as condições do aposentação, o que fiz foi regular as pensões devidas ás praças reformadas. O meu decreto é relativo ás pensões e não ás reformas.

Uma outra condição, disso S. Exa. que infringi: é a condição de não collocar como empregados vitalicios os empregados que tinham nomeações provisorias.

Mas o que S. Exa. disse e o que está na auctorização são cousas tambem differentes.

S. Exa. não nos mostrou nem um caso unico em que o Governo fosse collocar definitivamente empregados que tinham nomeação provisoria, havendo addidos, e por consequencia nem em um unico caso provou que eu tivesse infringido a lei. (Apoiados).

Vem primeiro a infracção com relação a augmento de despesa, depois a infracção com ralação á collocação do empregados, e por ultimo a infracção relativa ás condições de aposentação dos empregados.

Mas demonstrado está que nenhuma d'essas infracções se fez, em que pese ao illustre Deputado; que nenhuma d'essas infracções se deu. (Apoiados).

Vamos agora ao que é mais grave, vamos a ver se Deus permitte que escapemos d'aquella temerosa procella que ameaça derrubar o Governo1

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14 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Vamos ao que é supremamente grave!

É supremamente grave, diz o illustre Deputado, e eis que mais se avizinha o momento da temerosa tormenta que vão ferir severamente o ponto mais serio e grave. E agora é que S. Exa. passa do andante ao allegro nas auctorizações.

E eu que tinha, aliás, a minha convicção, ia-me atemorizando um pouco, interrogando-me na minha consciencia, procurando na minha memoria se ella me teria atraiçoado no exame das providencias adoptadas, e eu, emfim, viesse a merecer uma justa condemnação.

Mas, o ponto mais grave, disse S. Exa., é que nas auctorizações que estão nos decretos, se encerram outras auctorizações, e por consequencia não se conhecendo o limite das despesas, não se sabe, neste crescendo, a quantos milhares de contos ellas se elevarão! E estando o país extenuado e os credores afflictos, tudo se revolta contra o Governo, que com estas providencias adoptadas em virtude das autorizações, por esta forma crescente, ampla e indefinida, arrasta o país á miseria, compromette os interesses do Thesouro e torna impossivel a salvação da Fazenda Publica!

Deixei passar esta rajada e perguntei a mim mesmo: Nestes decretos, que já são providencias adoptadas, poderá haver essas auctorizações?

Essas auctorizações, para montar esses serviços, trazem encargos, affrontando o Thesouro?

Mus, Sr. Presidente, qual é d'essas auctorizações a unica que se pode invocar sem auctorização parlamentar? (Apoiados}.

Pois não é o Parlamento que auctoriza annualmente no Orçamento a despesa? (Apoiados).

Que importa quo nos decretos, alem d'aquellas auctorizações, haja outras, se todas ellas ficam subordinadas ao exame e á resolução do Parlamento (Muitos apoiados), e sem que o Parlamento tenha votado essas despesas, não terra effeito algum? (Muitos apoiados}.

Por consequencia nenhum valor tem o quadro tragico, esboçado pelo illustre Deputado, em que S. Exa. apresentava o Thesouro com encargos enormes, dando razão ao que os nossos credores possam dizer acêrca da nossa administração publica. (Apoiados).

Portanto, não ha nesses decretos uma só auctorização, alem d'aquellas que nelles se conteem, a que corresponda uma despesa que não seja devidamente auctorizada pelo Parlamento. (Muitos apoiados). Sem isto não ha auctorização que subsista.

Pois não temos nós nas Camaras uma censura tão rigorosa, uma vigilancia tão perfeita e uma opposição tão dedicada, para que essas auctorizações que trazem augmento de encargos passem sem o Parlamento resolver que devem ser approvadas? (Apoiados).

Em que fica o tal assombrado temor com que o illustre Deputado na sua palavra ardente, vehemente, sombria, negra em relação aos actos que pratiquei e prenhe de condições para com o Governo, quis tirar effeitos rhetoricos?

Onde então os crimes?

Onde estão as ilegalidades?

Onde eu tão os perigos?

Vozes - Muito bem).

O Orador: - Continua o crescendo: ainda ha um ponto mais supremamente grave!

Disse o illustre Deputado: o mais grave de tudo é a reducção das receitas!

E sabem porque é a reducção das receitas? Porque eu extingui os arbitradores judiciaes, que pagavam contribuição industrial, sellos de diploma», direitos de mercê, emolumentos de secretaria.

Confesso que quando ouvi esta conclusão, fiquei maravilhado. (Apoiados prolongados).

Se ha lógica neste mundo, saiba o illustre Deputado que isso me leva á conclusão de que nomeando empregados, muitos empregados, immensos empregados, pois quanto mais empregados só nomearem mais encargos pagarão ao Thesouro, é que só ha de salvar o país e restabelecer o equilibrio da nossa Fazenda Publica!

Então vêem condemnar o Governo exactamente por elle ter reduzido a despesa com a suppressão de empregados? (Apoiados).

Disse o illustre Deputado que é impossivel calcular a despesa que pode advir d'essas auctorizações, que é impossivel prever para onde o Governo arrasta o país, e agora vem o homem de paz, a pombinha branca com o ramo de oliveira, pedir harmonia entre todos, e offerecer-nos uma bella proposta que nos traz a salvação. O corollario do seu discurso está na proposta que mandou para a mesa.

A Camara quer ouvir? A proposta é a seguinte:

«Proponho que só eleja uma commissão de vinte e um membros para dar parecer sobre deverem ou não ser confirmadas, para terem força de lei, as providencias de caracter legislativo decretadas pelo Governo até 31 de dezembro de 1901, que excederem a auctorização concedida pela carta de lei de 12 de junho de 1901, e que esta commissão se faça dividir em sub-commissões por especialidades de materias. = José de Alpoim.

Oh! Sr. Presidente, se estamos discutindo as auctorizações, para que serve nomear uma commissão com o fim de examinaras providencias decretadas? Se S. Exa. prescindirem d'essa commissão para as examinar e vir aqui discutir, os primeiros que devem votar contra a proposta são S. Exas. (Apoiados).

Se S. Exas. se julgam habilitados a discutir ponto por ponto, doutrina por doutrina, decreto por decreto, as providencias tomadas, para que vêem propor a commissão? (Apoiados).

Eu creio que a maioria, desde o momento em que os illustres Deputados demonstram que ha excessos no uso das auctorizações, e por consequencia augmento de encargos, infracções flagrantes, irregularidade» abusivas, não precisaria de nomear uma commissão. (Apoiados). Convencida com os argumentos dos illustres Deputados dirá: Amen, não á sua proposta, mas á condemnação do Governo, e o Governo saberá o que ha de fazer. Se os illustres Deputados vêem para aqui hoje affirmar que hão de convencer o país de que isto é um Governo nefasto, que gastou milhares de contos com prejuizo do Thesouro, se teem já o seu juizo feito, e podem apresentar aqui uma justificação plena para uma catechese absoluta das suas affirmações - para que precisam da commissão? Se sabem tudo, para que precisam que uma commissão os esclareça? (Apoiados). S. Exas. o que deviam era, primeiro: fazer a justificação de que o Governo commetteu irregularidades; e, provado isso, pedir não uma commissão, mas a sancção penal para os Ministros que abusaram das auctorisações. Agora, depois de terem demonstrado com a sua fecunda acção de palavra que o Governo em todas as reformas que publicou praticou irregularidades, abusos, infracções, illegalidades, concluiram por pedir uma commissão para apurar o que estamos affirmando, para esclarecer o que estamos dizendo! O que prova é que ou S. Exa. não estão convencidos do que dizem, ou então querem apenas, gratuitamente, infundadamente, contra as proprias convicções formadas nos seus espiritos, lançar contra o Governo a suspeição e a guerra. (Apoiados).

Se nós fossemos severos, como o illustre Deputado disse, imparciaes; se nós fizessemos critica como ella deve ser feita, se vissemos os factos como elles se praticaram, e se em vez dos illustres Deputados annunciarem interpellações temerosas, viessem ao Parlamento contrictos e arrependidos, examinando o seu passado, consultando as suas tradições, rememorando os seus actos, fazer uma expiação

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SESSÃO N.º 12 DE l DE FEVEREIRO DE 1902 15

completa, e apresentar-se, depois de feita essa liquidação; promptos a entrarem num caminho seguro, - então, sim.

Então viessem com a harmonia e com a paz; então viessem com o candido raminho de oliveira; não com a proposta, mas com a demonstração de uma bua vontade segura para resolver os problema» mais graves. Quanto melhor seria isso! (Apoiados).

Mas o illustre Deputado sabe que a sciencia da esgrima consta de duas partes: a defesa e a resposta.

O illustre Deputado atacou e ou defendi-me. Eu tenho o direito agora do responder, porque, valha a verdade, numa questão a liquidar outro nós, em que se discutiram responsabilidades eu tenho as minhas e o illustre Deputado tem as suas. Os meus amigos politícos que não acompanham e que votam mostrando a sua adhesão, assumem a sua responsabilidade; mas os amigos politicos do illustre Deputado hão de assumir as suas tambem. Agora é que eu quero ser sereno, porque a serenidade é a força, citou o illustre Deputado e citou bem.

Sereno é quem tem a consciencia de ser junto e forte, e como eu tenho a consciencia de ser forte e justo, e cheguei ao meu momento de resposta, depois da defesa, quero ser sereno; portanto, que a opposição seja tambem serena quanto eu vou ser na exposição dos factos.

Todos nós temos as nossas responsabilidade, e convença-se o illustre Deputado de que não basta, para se atacar uma pessoa, mostrar-se contricto e arrependido, é necessario mais: é necessario que a contricção tenha sido sincera.

Mas estou, repito, depois da minha defesa, que o país apreciará, no momento da resposta e S. Exa. vae ver como eu respondo.

O illustre Deputado porque é que me atacou? Atacou-me porque eu abusei das auctorizações que me foram concedidas: demonstrei que não abusei.

Accusou-me de ter augmentado as despesas; demonstrei que não augmentei. Accusou-me de ter infrigido as condições de aposentação, demonstrei que não infrigi. Accusou-me de eu ter transformado em empregados definitivos empregados provisorios; demonstrei que não transformei.

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - Então porque me atacou o illustre Deputado? Porque pedi auctorizações?

Pedi essas auctorizações e usei d'ellas em beneficio do meu país, criando vantagens de utilidade pratica para o ensino e para os differentes ramos de administrarão publica; fiz uso das auctorizações para melhorar os differentes ramos da administrarão da justiça, para os serviços mais importantes do exercito português, e, mais, para desenvolver as nossas colonias. Portanto, longe de ser condemnado, deve ser elogiado. (Apoiados}.

Os Governos teem por destino caminhar e proceder, e tudo isto a bem do país, em proveito dos resultados que podem advir para a publica administração.

O illustre Deputado mostrou ser um orador distincto, mas o que não mostrou é que tivesse razão, que o Governo tivesse procedido em prejuizo do país. (Apoiados).

Então o que condemna o illustre Deputado? Condemna só os processos, como numa synthese dizia S. Exa.: o Governo nomeou empregados a mais, não demittiu os que estavam, logo augmentou as despesas; o Governo commetteu o crime de ter usado das auctorizações, mas o Governo confessa a sua feia acção.

Mas qual é a norma do partido do illustre Deputado, qual a sua acção politica, quaes as suas responsabilidades, qual o seu passado? Em nome de que principios, de que norma vem o illustre Deputado dizer isso?

Quanto tempo esteve o seu partido no poder? Quatro annos quasi, quatro sessões parlamentares. Quer S. Exa. ver o horror que o seu partido tinha ás auctorizações, e o proprio illustre Deputado, que vem com esses conselhos, feito agora pomba sem fel, trazendo candidamente o raminho symbolico no bico?

Então, procedia-se d'este modo: auctorizações em 1897, auctorizações as mais extraordinarias que temos visto até hoje. Auctorizações em 1898, facto unico sem precedentes; é um documento em que se podia auctorização para cobrar pretendidas receitas e fazer face a certas despesas.

Em 1899 um orçamento em que se repetem auctorisações de 1897. E agora á ultima hora, 1900, ainda auctorizações para mais reformas de serviços publicos, como se ao fim de 4 annos de administração não tivessem reformado tudo.

Tinham pelas auctorizações um verdadeiro pavor! Mas o mais claro symptoma do horror do illustre Deputado e dos seus amigos politicos pelas auctorizações no uso ou abuso que um Governo pode fazer d'ellas, está em que no ultimo dia do seu Governo, (do seu Governo, não, porque demittido estava o Governo), no ultimo dia, Sr. Presidente, com data de 21, data da demissão do Ministerio de que S. Exa. fez parte, é publicado no Diario do Governo, no uso de uma auctorização, todo um Codigo Administrativo para os seus successorres.

Vozes: - Muito bem).

O Orador: - No ultimo dia, com data de 21, é publicada tambem a remodelação da divisão judicial!

Isto é da responsabilidade do illustre Deputado, e é por isso naturalmente que hoje se mostra arrependida e contricto.

Com a mesma data de 21 uma auctorização para a reorganização do Mercado Central de Productos Agricolas, e criando empregados!

Ora, foi um Governo a que pertenceu o illustre Deputado que tem no seu passado este fecundo desdobrar de auctorizações, porque até ao ultimo dia, emquanto teve um folego de vida, emquanto lhe restou uma parcella de confiança da Coroa, para que o Chefe do Estado pusesse o seu nome num decreto, as foi aproveitando sempre, e procedeu como vou mostrar a Camara. E peço a attenção da Camara, porque isto á interessante, e é uma lição!

O Sr. Presidente: - Deu a hora, V. Exa. tem mais 15 minutos para concluir o seu discurso.

O Orador: - Muito agradecido a V. Exa. É quanto me basta.

Mas, não quero cansar a attenção da Camara. Esta é a verdade, e quem compulsar o volume da Legislação, do anno para anno, no tempo em que aquelles illustres benemeritos estavam no Governo, não encontra senão as palavras: «fica o Governo auctorizado, está o Governo auctorizado». Porque, de resto, em tudo e para tudo, era uma auctorízação! (Apoiados).

Agora, com relação aos despachos, e com isto vou terminar.

Sejamos serenos e calmos, porque, como o illustre Deputado disse; o sereno é que é o forte. Com a maxima serenidade, eu exponho á consideração da Camara um commentario eloquente ao discurso do illustre Deputado, que profligou este Governo pela sua acção nefasta; demolidora e desmoralizadora. Offereço-lhe tres unicos numeros do Diario do Governo.

Tendo cada anno 365 dias, eu offereço-lhe só 3 dias. Parece-me que é ser modestissimo.

Pois, offereço a consideração da Camara os tres numeros do diario do Governo; o n.° 135, de 21 de junho, dia em que o Governo pediu a sua demissão; o n.° 135, de 23 de junho e o n.° 139, de 26 do mesmo mês; offereço á Camara estes tres Diario do Governo e peço-lhe que os leia com attenção.

Nestes 3 dias de Diario do Governo, sabe a Camara quantos despachos fez o Governo a que o illustre Deputado pertenceu, certamente para beneficio do país e não para contemplar amigos politicos, mas, pelo contrario, para assegurar a ordem e a boa administração?

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16 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Fez 594 despachos, sendo 492 nomeações novas.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

(Não reviu).

O Sr. Telles de Vasconcellos: - Mando para a mesa o parecer da commissão de marinha, sobre a proposta de lei n.° 5-8, que fixa a força naval para o anno economico de 1902-1903 em 5:800 praças.

Foi a imprimir com urgencia.

O Sr. Presidente: - Faltam apenas 14 minutos para se encerrar a sessão.

O Sr. José de Alpoim: - Se V. Exa. me concede a palavra, usarei d'ella.

O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. a palavra.

O Sr. Alpoim: - Servindo-se da phrase de um dos maiores vultos da nossa terra, tambem exclama, com elle: isto dá vontade de morrer!

Com profundo sentimento vê, que o Sr. Presidente do Conselho, em contraste com as palavras, d'elle, orador, palavras de paz e de serenidade, acaba de lançar-lhe um repto, com retaliações pessoaes, perdendo a linha, lançando mão de recursos improprios de S. Exa. e do Parlamento, vindo accusá-lo falsamente de ter procedido por forma semelhante á que pôs em pratica o illustre Presidente do Conselho.

E, comtudo, elle, orador, que tão vivamente foi accusado, não fez a reforma do seu Ministerio, apesar de para isso ter auctorização, por um sentimento de escrupulo; porque não tinha maneira de a fazer sem augmentar a despesa.

Nunca se rasgou assim a mascara; nunca foi tão longe a audacia!

Gisava, desde ha muito, a dissolução do Parlamento - foi S. Exa. que o disse - e então, antes mesmo da scisão, S. Exa. pensava já em obter auctorizações que lhe permittissem levar vida larga.

Uma tal declaração é extraordinaria e precisa ser ouvida pelo país.

Elle, orador, porem, por um sentimento de generosidade é obrigado a ter pena do nobre Ministro, porque S. Exa. arranjou esse argumento, empregou-o, mas esqueceu-se de que as auctorizações que lhe foram concedidas não eram as que vinham no orçamento, foram as que o Sr. Beirão lhe apresentou e que eram muito diversas das outras.

A verdadeira razão não foi, portanto, a que S. Exa. invocou; o que o levou a remodelar serviços foi a necessidade de contentar os seus apaniguados, dando a uns largas prebendas e captivando outros com a promessa d'esse prebendado.

Lembra-lhe, porem, sem offensa para ninguem, o famoso sermão ao Padre Antonio Vieira, denominado dos peixes, quando fala dos roncadores e dos pegadores, e aconselha o Sr. Presidente do Conselho a que fuja de que o seu partido seja de pegadores e o Governo de roncadores, que são pequenos e roncam, como se fossem fortes.

Respondeu á primeira parte do discurso do Sr. Presidente do Conselho e sente-se tão fatigado que pede para ficar com a palavra reservada.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir).

O Sr. Presidente: - A primeira sessão realiza-se na segunda feira, á hora regimental. A ordem do dia é a mesma que vinha dada para hoje, e mais o projecto n.º 6.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e trinta e cinco minutos.

Representação enviada para a mesa nesta sessão

Dos distribuidores supranumerarios dos concelhos fora de Lisboa e Porto, nomeados anteriormente á actual organização telegrapho-postal, pedindo que lhes sejam mantidos os mesmos direitos que gozavam á data das suas nomeações.

Apresentada pelo Sr. Deputado Oliveira Simões, enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar no Diario do Governo.

O redactor interino = Affonso Lopes Vieira.

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