SESSÃO DE 20 DE JANEIRO DE 1886 139
tas. Desejo sómente que s. exas., depois do tão asperas censuras, conservem d'ellas sufficientes reminiscencias para que, em as voltas da politica os levando outra vez ás cadeiras do poder, não ponham de novo em pratica o funesto regimen da perseguição barbara e iniqua de 1879 a 1881 a todo o funccionario, não particularmente affecto á causa progressista. (Muitos apoiados.) Isso sim; isso é que é respeito pelos direitos adquiridos... no entender de s. exas. (Muitos apoiados.)
A verdade é que o principio do respeito pelos direitos adquiridos, estabelecido no n.° 1.° do artigo 1.° da lei de 31 de março de 1885, de maneira a abraçar todos os serviços publicos comprehendidos na auctorisação parlamentar, se acha completado, no que toca á fiscalisação externa, pelo outro principio mais adiante fixado de que os corpos da fiscalisação terrestre e maritima serão constituidos á similhança dos corpos militares, principio este completado pela declaração legal de que os guardas e empregados menores até chefe de posto s era o considerados como praças de pret. (Apoiados).
Portanto, a interpretação juridica da lei, levava a entender e modificar aquelle texto, que é geral, pelos outros preceitos particulares á reorganisação da fiscalisação externa e que se acham collocados entre as bases que formam pariu integrante da lei de 31 de março de 1885.
Póde alguem, que julgue imparcialmente a questão, suppor compativel com a organisação militar a existencia simultanea de duas classes de guardas, com obrigações differentes, em situações perfeitamente diversas?
Como manter a disciplina severa, base de toda a organisação militar, quando sobre os individuos de igual graduação não pesarem responsabilidades completamente identicas? (Apoiados.)
Como responder pelo cumprimento fiel dos preceitos legaes sobre fiscalisação externa das alfandegas, se a acção do poder central não contar firmemente com as garantias de uma uniforme organisação militar, que a lei estabelece, e cuja necessidade ainda o anno pastado a opposição reconheceu expressamente? (Apoiados.)
A lei entendida por esta fórma, como o devia ser, foi acatada pelo sr. ministro da fazenda. Demonstrou-o s. exa., provando como em nenhuma derivão tinha havido quebra dos preceitos formulados na lei, demonstração completada, no terreno dos factos, pelo sr. Franco Castello Branco; e ainda ultimamente o sr. Thomás Bastos, citando-o equivoco de que ía sendo victima innocente o nosso collega, o sr. Antonio Centeno, poderia, se quizesse, ter explicado á camara como o equivoco nascêra da execução de uma ordem de serviço, cujo fim era verificar se a ausencia de certos guardas só justificava por doença, ou se os guardas que faltaram ao serviço se achavam em condições legaes de aposentação. (Apoiados.)
Tambem o sr. Thomás Bastos, tomado de irreprimivel colera contra a conducta do sr. Hintze Ribeiro, affirmou que os erros da politica do gabinete ciavam em resultado o engrossamento das fileiras do partido que lucta contra as instituições vigentes.
Não é a primeira vez que o partido progressista lança essa accusação ao governo, sem que eu tenha conhecimento de um só desertor politico que houvesse por bem passar-se do partido regenerador para o partido republicano. (Apoiados.) Dou pois de barato aos progressistas que sejamos nós os instigadores de um movimento favoravel ao partido radical, se s. exa. concordarem commigo em que lhes pertence a materia prima da deserção... (Muitos apoiados.) E não ha mais onde escolher entre os partidos monarchicos, sr. presidente, desde que as contingencias e transformações da nossa vicia politica nos levam a considerar o sr. conselheiro Dias Ferreira como pertencente á classe dos addidos, muito embora na categoria de chefe de partido... (Riso.)
Não quero fatigar a attenção da camara, e por isso restringirei as considerações que me propozera fazer sobre os outros abusos da que o sr. ministro da fazenda é accusado, taes como a alliciação de menores, a perseguição dos guardas e a transferencia arbitiaria d'estes empregados da fiscalisação.
Dá-se um facto excepcional e curiosissimo.
A opposição narra a proposito um certo numero de factos; levanta-se o sr. Hintze Ribeiro, levanta se um membro da maioria e reduzem a zero, ponto por ponto, minudencia por minudencia, as allegações apparentemente fundadas dos oradores opposicionistas. Não obstante, a opposição continua inclemente a vociferar contra a administração do sr. ministro da fazenda, exactamente a respeito do serviço que motivára uma defeza brilhante e completa da conducta d'este illustre estadista.
Faz-me isto lembrar um caso de tão justa applicação na hypothese presente que não resisto a pedir licença a v. exa. e á camara para o narrar succintamente.
Um general portuguez, cujos ditos de perfeita bonhomia têem sido muito peioradas pelo sal da critica dos commentadores, recebeu certo dia no seu gabinete um soldado que impetrava de s. exa. um favor qualquer. Tendo-se o general negado terminantemente a satisfazer ao requerido, o soldado comprimentou militarmente o encaminhou-se para a porta. Ao transpol-a, chama-o o general e pergunta-lhe:
- Olhe lá, de que regimento é você?
- Sou do 5, respondeu pressuroso o soldado.
- Pois deixal-o ser! concluiu o general. (Riso.)
Assim acontece no caso premente: a opposição apresenta o seu libello, o governo e a maioria contestam facto por facto; mas a opposição é que nada se importa com isso e continúa bradando: diga o sr. ministro da fazenda o que quizer: s. exa. é um momento e os pobres guardas são uns desgraçados! (Riso. - Apoiados.)
Não esqueceu ao sr. Thomás Bastos notar que o sr. Franco Castello Branco advogára a conveniencia de que não mediasse largo espado de tempo entre a feitura de uma lei e a sua execução, parecendo ao illustre deputado opposicionista que o sr. Castello Branco defendia um parecer cujo resultado pernicioso seria a execução de leis pouco maduras, pouco reflectidas, sem conhecimento seguro do meio para que se legisla. Oxalá não houvera tambem esquecido ao sr. Thomás Bastos o reconhecimento das vantagens concedidas pelo decreto n.° 4 de 17 de setembro aos guardas fiscaes, confrontando o regulamento de 1 de setembro de 1881 com o citado decreto n.° 4, nos artigos 39.°, 41.°, 50.º, 51.º, 67.º e outros. (Apoiados.)
Quanto ao parecer exposto pelo sr. Franco Castello Branco, é evidente que para s. exa., assim como para mim, a maduração dos preceitos legislativos constitue um phenomeno que deve preceder a promulgação da lei e não succeder-lhe. (Muitos apoiados.)
Não julgue todavia o sr. Thomás Bastos que me causou espanto essa observação de s. exa.; comprehendo perfeitamente que s. exa. advogue a opinião de que devo mediar um praso longo, e até longuissimo, entre a promulgação das leis e a sua execução, visto que s. exa. se acha filiado n'um partido politico, o qual redigiu ha dez annos um programma que até ao presente ainda não executou. (Muitos apoiados.)
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi comprimentado.)
O sr. Carlos Loto d'Avila: - Sr. presidente, declaro francamente a v. exa. que, quando entrei hoje n'esta casa, estava bem longe de suppor que ainda teria de usar da palavra.
Ao terminar a sessão de hontem o espectro do albafarete pairava já sobre a camara, e eu saí d'aqui profundamente convencido de que o sr. ministro da fazenda estava já satisfeito de ouvir accusações a que não podia responder, e an-