Página 219
N.° 13
SESSÃO DE 4 FEVEREIRO DE 1898
Exmo. sr. Eduardo José Coelho
Secretarios - os exmos. srs.
Joaquim Paes de Abranches
Frederico Alexandrino Garcia Ramires
Lida e aprovada a acta, participa o sr. presidente ter sido recebida por El Rei a deputação encarregada do entregar a resposta ao discurso da corôa - Dá-se conta no expediente, e têem segundos leituras os projectas de lei, de 31 de janeiro, do sr. Oliveira Matos, a de 1 de fevereiro, dos srs. Antonio Cabral e Alfredo de Oliveira. - os srs. Malheiro Reymão e ministro da guerra trocam explicações sobre serviço do recrutamento.- O sr. Antonio Cabral apresenta uma proposto sobre a creação de uma cadeira de philologia portugueza.- O sr. Francisco Machado participa o lançamento de varios requerimentos na caixa respectiva.- O sr. conde da Serra de Toureça pede providencias contra abusos dos empregados da companhia dos tabacos.- O sr. Alfredo de Oliveira apresente um projecto, elevando a lyceus nacionaes os de Evora Viseu.- O sr. Tavares Festas associa-se ás considerações do orador.- O sr. Teixeira do Sousa troca explicações com os srs. ministro da marinha o presidente do conselho a respeito do projecto de exclusivos para o ultramar. - O sr. Joaquim Tello apresenta uma representação.- Fazia avisos previos e apresentam requerimentos os srs. Marianno de Carvalho. Mello e Sousa, Simões Baião, José Pessanha e Lopes de Carvalho.
Na ordem do dia (concessão do terrenos no ultramar) fallam successivamente os srs. Teixeira de Sousa, Laranjo e Marianno de Carvalho, que fica com a palavra reservada.
Abertura da sessão - As tres horas da tarde.
Presentes á chamada, 69 sr. deputados. São os seguintes: - Abel da Silva, Adriano Anthero do Sousa Pinto, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alfredo Casar de Oliveira, Alvaro da Castellões, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Antonio Tavares Festas, Antonio Teixeira de Sousa, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur pinto de Miranda Montenegro, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Conde do Alto Mearim, Conde do Idanha a Nova, Conde da Serra de Tourega, Conde do Silves, Eduardo José Coelho, Elvino José do Sousa e Brito, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco João Machado, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Cabral do Oliveira Moncada. Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Jacinto Candido da Silva, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, João Abel da Silva Fonseca, João Baptista Ribeiro Coelho, João Catanho de Menezes, João Lobo de Santiago Gouveia, João de Mello Pereira Sampaio, João Pereira Teixeira do Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro veiga, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Joaquim Simões Ferreira, José Adolpho de Mello e Sousa, José Augusto Correia de Barros, José Benedicto de Almeida Pessanha, José da Cruz Caldeira, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José Frederico Laranjo, José Gil de Borja Macedo o Menezes (D.), José Gonçalves Pereira dos Santos, José Malheiro Reymão José Maria de Alpoim do Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Matos, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes , Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayola, Luciano Affonso da Silva
Monteiro, Luiz Cypriano Coelho do Magalhães, Luiz Fischer Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Luiz Osorio da Cunha Perreira de Castro, Manuel Telles de Vasconcellos, Marianno Cyrillo de Carvalho. Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Visconde do Melicio.
Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Carlos José de Oliveira, Conde de Burnay, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco do Castro Mattoso da Silva Côrte Real, Francisco Silveira Vianna, Frederico Ressano Garcia, Henrique Carlos do Carvalho Kendall, Henrique da Cunha Matos de Mendia, João Joaquim Izidro dos Reis, Joaquim Ornellas de Matos, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Alves Pimenta do Avallar Machado, José Capello Franco Frazão, José Dias Ferreira, José Gregorio do Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Luiz Ferreira Freire, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro e Sertorio do Monte Pereira.
Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Arthur Alberto de Campos Henriques, Conde de Paço Vieira, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Furtado do Mello, Francisco Limpo do Lacerda Ravasco, Gaspar de Queiroz Ribeiro do Almeida o Vasconcellos, Guilherme Augusto Pereira do Carvalho de Abreu, Jeronymo Barbosa de Abreu lima Vieira, Joronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Antonio do Sepulveda, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Monteiro Vieira do Castro, José do Abreu do Couto Amorim Novaes. José Bento Ferreira de Almeida, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Maria Barbosa de Magalhães, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Libanio Antonio Fialho Gomes, Manuel Pinto do Almeida o Visconde da Ribeiro Brava.
Acta -- Approvada.
O sr. Presidente:- Tenho a declarar que a deputação da camara, encarregada de apresentar a El-Rei a resposta ao discurso corôa, foi recebida por Sua Magestade com a costumada affabilidade.
Tenho tambem a declarar a camara, que me fui enviado um officio do sr. Barbosa de Magalhães. Este officio diz respeito ao projecto de lei n.° 25, que está em discussão na ordem do dia.
Se ao considerasse este officio como expediente, deveria ler-se n'este momento, mas como se prendo com o assumpto restricto do projecto de lei n.° 25 (regimen das concessões no ultramar), dado para ordem do dia, parecia-me mais opportuno e conveniente que a sua leitura fosse feita
Página 220
220 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
quando o mencionado projecto entre em discussão. (Apoiados geraes.)
EXPEDIENTE
OFFICIAES
Do ministerio do reino, remettendo os documentos pedidos polo sr. deputado Simões Baião, em sessão de 18 de janeiro ultimo.
Para a secretaria.
Do ministerio da guerra, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Dantas Baracho, copia da papeleta de cabaceira, respeitante ao coronel do cavallaria José Correia.
Para a secretaria.
Segundas leituras
Projecto de lei
Artigo 1.° São auctorisados a poder repetir nos lyceus do reino, nos termos da lei em vigor, para o periodo transitorio, os exames que tenham feito nos seminarios diocesanos os alumnos que pretendam matricular-se na faculdade do theologia da universidade.
Art. 2.º Esta permissão só é concedida aos concorrentes ao curso de theologia, e unicamente para o effeito de n'elle só poderem matricular.
Art. 8.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 31 de janeiro de 1898. = José Maria de Oliveira Matos.
Lida na meta, foi admittido e enviado ás commissões da negados ecclesiasticos, de instrucção publica superior e de instrucção primaria e secundaria e especial.
Projecto de lei
Um dos primeiros, se não o primeiro dever de uma nação culta, é prestar á memoria dos homens illustres que honraram a sua patria, o preito de homenagem, gratidão e reconhecimento que os seus serviços merecem.
Entre os homens cujo nome avulta no livro de oiro da nossa litteratura, occupa, com certeza, um dos logares de honra o glorioso escriptor que em vida se chamou Camillo Castello Branco.
A sua vida foi um continuo trabalhar pelas letras patrias, estudando a lingua e aperfeiçoando-a de tal arte, que até elle talvez nenhum outro escriptor a levasse a tão alto grau do belleza.
Attingiu assim, o glorioso romancista, o culminante logar de mestre indiscutivel de todos os que hoje faliam e escrevem esta nossa formosa lingua portugueza, a lingua do Camões, de Vieira, de Bernardos.
Ninguem dirá, portanto, com verdade, que não prestou assim relevantissimos serviços á sua patria, porque a lingua é, com certeza, um dos elementos fundamentaes para a existencia de uma nação, como autonoma e independente.
Mas fez muito mais o grande escriptor: alem de ter sido um litterato fecundo, um trabalhador infatigavel, versando proficientemente variadissimos ramos do saber humano, estudou a fundo os costumes portuguezes em livros immorredouros e foi um erudito investigador de pontos obscuros da nossa historia.
Foi romancista, dramaturgo, folhetinista, comediographo, poeta, polemista notabilissimo, deixando, com a sua morte, as letras patrias viuvas do seu mais eminente cultor conteporaneo.
E num sequer faltou a Camillo Castello Branco a grandeza do martyrio, pois os ultimos annos da sua vida, escurentados pelos negrumes da cegueira, foi um epico poema de tormentos, entre os quaes a alma superior do eminente romancista se estorcia em agonias indiziveis.
A obra colossal que Camillo legou á sua pátria traduz a grandeza do escriptor mais erudito, mais vernaculo, mais elegante do nosso tempo.
Bem merece, pois, que a nação preste á memoria do glorioso mestre da nossa lingua a homenagem que lhe é devida.
Essa homenagem só póde ser a de fazer repousar para sempre os restos mortaes de Camillo Castello Branco no templo dos Jeronymos, em Belem, o grandioso pantheon nacional.
É o que tenho a honra de propor á camara dos senhores deputados da nação portugueza no seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Por virtude dos seus altos merecimentos, e serviços prestados ás letras patrias pelo eminente escriptor Camillo Castello Branco, visconde de Correia Botelho, serão os seus restos mortaes trasladados do cemiterio da Lapa, no Porto, onde se acham, para o templo dos Jeronymos, em Belem, como homenagem que a patria agradecida presta á memória do grande romancista.
Art. 2.° E o governo auctorisado a fazer com esta trasladação a necessaria despeza, dando depois conta ás côrtes do uso que fizer da presente auctorisação.
Lisboa, sala das sessões da camara dos senhores deputados da nação portugueza, 1 de fevereiro de 1898. == Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, deputado pelo circulo n.° 5 (Braga).
Lido na, mesa, foi admittido e enviado, as commissões de instrucção primaria e secundaria, de instrucção publica superior e especial e de fazenda.
Projecto de lei
Senhores deputados. - Tem-se reconhecido que é indispensavel policiar os campos do Alemtejo, onde se acoitam vadios e criminosos que vivem de extorsões e do roubo. A policia, como está constituida e organisada, composta exclusivamente de guardas a pé, não póde fazer utilmente tal serviço na vasta região alemtejana.
No districto do Funchal, de terreno accidentado e pessimas vias de communicação, tambem, se não póde, sem guardas a cavallo, fazer o policiamento das serras, para evitar a completa destruição dos arvoredos, e defender as invadas de irrigação, o que é do mais vital interesse na ilha da Madeira.
Por isso submetto á apreciação de v. exa. o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a reorganisar o serviço da policia nos districtos de Evora, Funchal e Beja, de modo que ella possa fazer chegar a sua acção á propriedade rural.
§ unico. No corpo de policia de cada um dos referidos districtos haverá uma secção de guardas a cavallo.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 1 de fevereiro de 1898. = O conego Alfredo Cesar de Oliveira = Visconde da Ribeira Brava = Francisco Ravasco.
Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de administração publica e de fazenda.
O sr. Malheiro Reymão (para um aviso previo).- Sr. presidente, em pouquissimas palavras vou explanar o assumpto do aviso previo, que tive a honra de mandar para a mesa.
O aviso previo que enviei para a mesa visa a saber do sr. ministro da guerra, qual o estado em que se encontra a liquidação dos contingentes em divida desde 1882 a 1895, e quaes as diligencias que n'este sentido estão sendo
Página 221
SESSÃO N.º 13 DE 13 DE FEVEREIRO DE 1898 221
ainda praticadas pelos respectivos commandantes dos districtos de recrutamento e reserva.
Nos districtos de recrutamento o reserva do norte do pais sei, porque tenho sido informado, que só encontram ainda muito atrasados os trabalhos necessarios para a inteira liquidação dos contingentes anteriores a 1895; e já depois de concluido o anno findo estava-se ainda fazendo o serviço do chamamento da supplentes de recrutas e intimação individual, que se deve fazer conforme os termos da lei.
Sabe v. exa., e sabe a camara, que pela lei que approvámos no anno passado, o praso para as remissões que foram concedidas aos recrutas pela quantia de 50$000 réis, quando não estivessem julgados refractarios, findou em 31 de dezembro do anno ultimo.
Ora, eu desejava que o sr. ministro da guerra me esclarecesse a este respeito, e desejava ouvir a opinião de s. exa. a respeito do projecto de lei que tive a honra de mandar para a mesa, no qual se estabelece a prorogação do praso para as remissões dos recrutas n'aquellas condições durante todo o anno de 1897. Desde que não é imputavel aos recrutas o atrazo dos trabalhos para o seu chamamento, devido ao que não poderam aproveitar os beneficies, que lhes eram concedidos pela lei, confiam suficientemente no espirito de justiça do illustre ministro da guerra para esperar a sua concordancia com o projecto de lei, que tive a honra de mandar para a mesa.
Eu sou o primeiro a fazer justiça ás diligencias dos commandantes dos districtos de recrutamento e reserva, porque elles têem-se empenhado em concluir no mais curto praso o serviço que lhes foi commettido; assim como faço igualmente justiça ás commissões de recenseamento militar, que envidaram todos os seus esforços por cumprir, dentro do praso legal, as attribuições que lhes foram conferidas pela lei.
O certo porém é que, apesar das diligencias d'aquelles commandantes e das diligencias provaveis d'aquellas corporações, durante o anno findo, não foi possivel concluir esse serviço.
Ora, parece-me, dadas estas circunstancias, que é uma gravissima injustiça deixar que individuos, que estavam em condições de poderem aproveitar os beneficios da lei, não os possam, comtudo, aproveitar, por culpa que lhes não é imputavel.
As rasões que militam a favor da lei approvada no parlamento, no anno passado, são, precisamente, as mesmas que, logicamente, militam a favor do projecto que tive a honra de mandar para a mesa em uma das ultimas sessões.
N'este sentido espero, solicito e confio no espirito de justiça do sr. ministro da guerra, que não duvidara declarar que se conforma com o projecto que mandei para a mesa, patrocinando-o e concorrendo para que elle seja approvado por esta camara.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro da Guerra (Francisco Maria da Cunha: - Ouvi com toda a attenção as reflexões feitas pelo illustre deputado.
Conheço os factos referidos e conheço-os mesmo officialmente.
Sei que apesar das diligencias o instancias feitas a ai gamas commissões de recenseamento, não têem ellas podido, ou não têem querido, cumprir as disposições contidas no decreto de 15 de outubro de 1896.
Digo mais; tenho informações de que effectivamente algumas commissões de recenseamento demoraram propositadamente a remessa d'esses documentos, para os mandar depois por periodos, aproveitando assim a prescripção marcada na lei de 1887.
Tem-se dito isto e insinuado, mas da exactidão d'estes factos não tenho a certeza.
O que é facto é que as commissões têem mandado os documentos fóra do praso marcado e a de Vianna foi uma d'ellas, e isto não por culpa dos mancebos que não podem ser recenseados.
Por consequencia dz bem o illustre deputado, a quem estou respondendo, quando affirma que as condições em que estão lactando os mancebos são as mesmas que se davam em 1886.
Eu tenho ainda uma preocupação com relação ao praso, e ainda hoje mandei pedir informações aos commandantes do divisão sobre o assumpto.
São estas as respostas que tenho a dar ao illustre deputado.
(S. exa. não reviu.)
sr. Alexandre Cabral: - Pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei, que vou ler.
(Leu.)
Poucos momentos tomarei á camara na justificação d'este projecto de lei.
Nas circumstancias pouco favoraveis do thesouro, não ousaria fazer uma proposta que trouxesse augmento de despeza; mas, como a camara vê, o que proponho não é propriamente a oração de uma cadeira, é antes a substituição de uma, que existe, por outra que, a meu ver, é indispensavel.
D'esta forma a despeza que se faria, se fosse creada a nova cadeira, seria a mesma que se faz agora com a cadeira existente, cuja extinção eu proponho.
Esta está, infelizmente, vaga; e digo infelizmente, porque o professor que a occupava, e que ou rememoro com infinita saudade, era ao mesmo tempo uma gloria dias letras patrias e uma illustração do parlamento: era Pinheiro Chagas.
Desde a sua morto nunca mais foi provida a cadeira de litteratura grega e latina; e, por isso, é claro que com a sua extinção não se offendem direitos de terceiro.
Alem d'isso. sr. presidente, o ensino d'essas disciplinas está assegurado, e a extincção não é, portanto, radical, pois no curso superior de letras creou-se modernamente uma cadeira de grego, onde os estudiosos podem aprender noções praticas o theoricas que respeitam á litteratura grega, e ha tambem uma cadeira do litteratura moderna, sujo professor se occupará necessariamente da litteratura latina nas relações que este tem com ás novas litteraturas.
So a extinção da cadeira não é necessario, como bem reconheço, é pelo menos toleravel, porque fica mais ou menos substituido o respectivo ensino. E o que plenamente justifica essa medida é a creação a que ella dá logar. Desapparece apenas em parte o que é incontestavelmente vantajoso, mas surge o que é indispensavel, que é o ensino superior da lingua portugueza.
Em todos os paizes cultos da Europa se ensina a philologia da respectiva nação, e em muitos d'elles em mais de um curso superior.
Em França ha tres ou quatro cursos superiores onde se ensina a philologia franceza.
A lingua antiga tom cursos especiaes no collegio de França, na Sorbonne e na École des Chartes, e a lingua e a litteratura francezas têem cadeira especial na faculdade de letras. Alem de que, succede mais que em todas as nações da Europa, mesmo n'aquellas que não são de origem romanica, como a Russia, Allemanha, Suecia o Noruega, ensinam-se as linguas neo-latinas, e por conseguinte a portugueza, que na Allemanha tem um professor especial que distinctamente rege a sua cadeira de philologia portugueza na universidade de Bonn.
Quando isto succede no estrangeiro, é realmente pouco rasoavel que não exista no nosso paiz um curso especial e superior de philologia portugueza.
É por isso que entendo que se deve crear esta cadeira, mesmo para habilitar professores para os cursos de instrucção secundaria, os quaes entre nós pouco conhecem a lingua portugueza. Não me refiro, é claro, ao portuguez
Página 222
222 DIARIO DA CAMARAB DOS SENHORIS DEPUTADOS
trivial que se aprende nos lyceus: esse mais ou menos o sabem quantos o professam. Refiro-me a litteratura e á historia da lingua patria, que é um dos elementos mais vitaes da nossa nacionalidade. O ensino especia e superior da philologia portuguesa é que não existe em Portugal.
É por isso que mando para a mesa este projecto de lei, pedindo á camara que o toma na devida consideração.
Ficou para segunda leitura.
O sr. Francisco José Machado: - Sr. presidente, participo a v. exa. e á camara, que lancei na caixa de petições um requerimento das srs. as. D. Anna Honorata de Miranda e D. Henriqueta Christina de Miranda, filhes do fallecido marechal de campo José Athanasio de Miranda, em que pedem para que a pensão de 6$666, réis que pertencia a uma sua irmã fallecida, reverta em favor das requerentes.
A camara, reconhecendo em tempo os serviços distinctos e relevantes prestados por este militar á cansa da liberdade e ao paiz, estabeleceu a pensão de 20$000 réis para as tres filhas d'este distincto official, que foi um dos 7:500 bravos do Mindello, que esteve emigrado para se livrar das perseguições do absolutismo, e gastou todos os seus haveres, para o restabelecimento da liberdade.
Não sei se esta circumstancia merecerá alguma consideração aos liberaes de hoje.
É provável que não, porque já vae esquecida a epocha brilhante o os heroes que conseguiram estabelecer e firmar o actual regimen; ora como disse, umas d'estas senhoras já falleceu, passando a parte da pensão de 6$666 réis para o estado.
As duas senhoras sobreviventes, que vivem juntas, pedem para que a pensão que tinha a irmã fallecida e que reverteu para o estado, me seja concedida para assim poderem melhor amparar a sua existencia hoje tão debilitada.
Estas senhoras são já bastante idosas e pouco tempo poderão ter de vida.
Parece-me, pois, do toda a justiça este pedido e para elle chamo a attenção da respectiva commissão.
Mando para a mesa um requerimento do sr. Manuel Eduardo Correia, primeiro tenente da armada, em que pede uma mais equitativa distribuição na contagem do tempo do servido, para ser promovido ao posto de capitão tenente.
N'este requerimento não se pede a diminuição do tempo de serviço do tiroconio; pede-se unicamente que elle seja repartido pelos diversos postos com mais justiça e equidade.
Parece-me de toda a justiça o pedido, e por isso mando para a mesa um projecto de lei, que auctorisa o governo a regular o tempo do tirocinio, que nos diversos postos se ha de fazer para os officiaes de marinha ascenderem aos differentes postos.
Senhores. - A lei que regula actualmente os tirocinios de embarque dos officiaes da marinha de guerra nacional, emquanto obedeça a um principio hoje admittido em quase todas as marinhas do globo - de assegurar a competencia profissional aos promovidos - torna-se, como está estatuido entre nós, um tanto gravoso, se se attender que a nossa marinha, em regra, só serre fóra dos portos do continente do reino, nas estações que defendem as colonias, onde um clima debilitante conjugado com as exigencias do serviço quer no mar quer em terra, abalam as organisações mais robustas.
"Outro facto de não somenos importancia, como reforçador do estado gravoso acima mencionado, consiste no serviço permanente das laches-canhoneiras nos nossos rios de Africa, onde a responsabilidade effectiva do official, mais ardua em epochas de tranquillidade anormal, é aggravada com as febres palustres inherentes ás regiões adjacentes a esses rios.
"Accresce alem d'isto, que a lei actual, não resalvando para todos os portos a garantia que possa derivar para a promoção, do excesso de tirocinio nas diversas graduações, colloca officiaes da mesma arma em circumstancias diversas, muito embora bastos vezes sejam iguaes os deveres dos cargos que desempenham.
"As condições especiaes de promoção que o decreto de 14 do agosto de 1892 conservou das leis anteriores aos officiaes de marinha soffrem, pois, pela presente proposta uma pequena alteração mais compensadora aos serviços prestados pelos officiaes superiores, estabelecendo-se tambem uma alternativa para os subalternos que, sem alterar profundamente a lei que rego o assumpto, regularisa os tirocinios que na maioria dos casos os officiaes de marinha são chamados, por conveniencia de serviço, a fazer nas divisões navaes. Este projecto de lei, baseado em um principio de equidade, não traz augmento algum de despeza para o thesouro. Era vista pois do exposto, tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Alem das condições geraes de promoção estabelecidas pelo decreto de 14 de agosto de 1892, devem os officiaes. de marinha satisfazer ao disposto nos seguintes artigos.
"Art. 2.° Paru a promoção a primeiro tenente é necessario :
"1.° Contar quatro annos de posto de segundo tenente;
2.° Ter servido em commissão do embarque, como segundo tenente, por tempo não inferior a dois annos fóra dos portos do continente do reino;
3.° Estar habilitado a exercer em geral as funcções de immediato e em particular as do commandante de navios de pequena lotação.
"Art. 3.° Para o promoção a capitão tenente é necessario:
"1.° Contar tres annos no posto de primeiro tenente;
"2.° Ter servido em commissão de embarque como primeiro tenente, por tempo não inferior a dois annos, fóra dos portos do continente do reino, ou ter seis annos do serviço de embarque desde guarda marinha, fóra dos portos do continente do reino, sendo, pelo menos, dois annos em guarda marinha e um anno em primeiro tenente;
"3.° Ser julgado apto para exercer commissão de commando.
"Art. 4.° Para a promoção a capitão do fragata é necessario:
"1.° Contar dois annos de posto de capitão tenente;
"2.° Ter servido em commissão de embarque como capitão tenente, por tempo não inferior a seis mezes, fóra dos portos do continente do reino.
"Art. 5.° Para a promoção a capitão de mar e guerra é necessario;
"1.° Contar um anno de posto de capitão de fragata;
"2.° Ter servido em commissão de embarque fóra dos portos do continente do reino por tempo não inferior a um anno desde a sua promoção a capitão tenente, ou seis mezes como capitão de fragata;
"3.° Ser julgado apto a commandar mais de um navio.
"Art. 6.° Para a promoção a contra-almirante é necessario :
"1.° Contar um anno de posto de capitão de mar e guerra;
"2.° Ter servido em commissão do cominando, como official superior, fóra dos portos do continente do reino, por tempo não inferior a um anno, sendo, pelo monos, seis mezes no posto de capitão de mar e guerra.
"Art. 7.° Os officiaes que por falta de tirocinio de embarque não hajam sido promovidos, alcançarão promoção quando, satisfeitas as condições geraes d'estas, tenham cumprido o mesmo tirocinio, occupando então o logar da escala que corresponda á vacatura que foram preencher.
"§ 1.° Quando ao tempo do existir vacatura a preencher pelo official não habilitado com o tirocinio completo, esteja
Página 223
SESSÃO N.º13 DE 4 DE FEVEREIRO DE 1898 223
este já embarcado fóra dos portos do continente, para satisfação do prescripto, a sua promoção verificar-se-ha logo que seja completo o tirocinio, e o official conservará a sua anterior situação na escala, sendo considerado supranumerario no respectivo quadro até que seja incluido n'este na primeira vacatura.
" § 2.° Só o official noa condições previstas pelo paragrapho anterior tiver interrompido involuntariamente o tirocinio, deverá ser promovido logo que o conclua, sendo considerado supranumerario até entrar para o quadro na primeira vacatura, conservando a sua situação anterior na escala.
"Art. 8.° A promoção a vice-almirante é feita por antiguidade, observados as condições geraes da promoção.
"Art. 9.° Os officiaes que forem desempenhar alguma commissão de serviço para o ultramar não são dispensados de nenhuma das condições exigidos n'este decreto, para entrarem no quadro effectivo.
"§ unico. O official a quem competir promoção por escala no posto que estiver vencendo ou tenha já vencido em serviço no ultramar, entrará para o quadro effectivo, depois de satisfazer aos tirocinios de embarque exigidos por este decreto, indo occupar o logar na escala que já lhe pertencia, caso não tenha sido preterido por outro motivo legal.
"Art. 10.° As attribuições dos officiaes do marinha são as que derivam da sua situação, o em conformidade dos regulamentos correspondentes.
"§ 1.° O pessoal da armada, que não esteja desempenhando commissões de embarque, será distribuido pelas diversos commissões de serviço dependentes da direcção geral da marinha.
"§ 3.° O ministro da marinha póde, sem prejuizo da escala das estações, conceder licenças temporarias, sem vencimentos, a officiaes do marinha para commandarem paquetes nacionaes, contando-se-lhes o tempo para os effeitos de promoção e reformo.
"Art. 11.° Fica revogada a legislação em contrario.
" Sala das sessões dos srs. deputados, em 4 de fevereiro de 1898. = O deputado, F. J. Machado."
Não faço agora considerações sobre este projecto, reservando-me para quando vier á discussão.
Direi apenas, que não traz augmento de despeza e por este motivo não haverá rasão por elle deixar de ser considerado.
Por ultimo, peço para que seja enviado á commissão de guerra o requerimento do sr. José Maria, fogueiro torpedeiro reformado, aqui apresentado o anno passado.
(S. exa. não reviu.)
O Sr. Conde da Serra de Tourega: - Sr. presidente, pedi a palavra para solicitar providencias ao Sr. ministro da fazenda sobre a fórma abusiva por que os agentes da companhia dos tabacos procedem em geral no paiz, e em especial no districto de Evora.
Sr. presidente, dia o decreto que regula as apprehendisões fiscaes, e impõe penas aos que cultivam a herva santa e sabendo da sua existencia, o seguinte:
(Leu)
É clarissima esta disposição do lei, nem dia ao presta a interpretação dubias, pois é principio elementar de hermeneutica juridica que se não deve presumir absurdo na intenção do legislador. Teve-se em vista salvaguardar os direitos e interesses da companhia dos tabacos e, por isso, seria irrisorio que se passasse alem d'esse justificado notificado intuito, reprimindo factos da quaes ninguem é culpado:
Quem conhece os vastissimos terrenos no Alemtejo, e a sua maneira de cultura, sabe perfeitamente que é impossivel aos proprietarios d'esses terrenos evitarem que nas suas propriedades nasçam alguns pés de honra santo, pois que muitas vezes só de quatro em quatro annos é que são afolhados as terras, e durante esse intervallo é muito fácil que vegetem algum pés de nicociana sem que os proprietarios d'isso tenham conhecimento.
Têem-se dado factos lamentaveis e que merecem reparo a toda a gente, que pede urgentes providencias ao governo para lhes pôr cobro.
Ainda ha pouco n'uma freguesia rural foi preso o parocho, venerando ancião de sessenta annos de idade, porque a disposição que li foi mal interpretada.
Aquelle sacerdote, que ha quarenta annos exerce o seu mester, merecendo o respeito de todos pelo seu proceder justo, deu entrada na cidade de Evora, como se fosse um malfeitor da peior especie, no meio de quatro homens armados de espingarda!
Tão lamentavel acontecimento causou a indignação geral, pois, sem respeito pelas cans nem pelo caracter sacerdotal, aquelle praso atravessou as ruas das mais publicas do cidade, cercado de esbirros, como se tivesse praticado o mais horrivel delicto, como se fosse um criminoso digno do mais severo castigo!
E sabe v. exa. porquê? Sabe qual o motivo por que assim se vexou um velho honrado e bondoso?
Porque na parede da igreja da sua parochia se encontram alguns pés de herva santa!
Isto é assombroso!
Outro dia uns guardas, porque encontrassem tambem, na parede do um poço uns pés da mesmo herva, prenderam o caseiro da respectiva propriedade, conduziram-no á cidade, o sendo, como foi, multado o proprietario, certamente lhe instauraram processo!
Factos d'estes tocam as raios do ridiculo e provocam a indignação; por consequencia é necessario que o governo tome immediatas providenciais para que o lei não seja interpretada de tal fórma, pois que não foi de certo aquella a intenção do legislador. (Apoiados.)
Podia apresentar muitos mais factos, mas não quero nem fatigar a camara, nem tomar-lhe mais tempo.
Comtudo não posso deixar de citar um caso suggestivo que, pela originalidade, quasi se torna inacreditavel, foi o seguinte:
Nos viveiros de cepos do estado foram encontrados alguns pés de herva santa, sendo, por este motivo, instaurado logo o processo contra o agronomo districtal, que pagou a multo por inteiro, processo que supponho está ainda pendente!
E impossivel admittir-se que se dê similhante interpretação á lei.
Sr. presidente, attendendo a que não é monos abusiva a fórma por que ao procura reprimir o uso da isca não sellado, eu peço permissão para apontar um facto que por ai tudo explica, dispensando commentarios.
Ha pouco tempo foi prato um desgraçado mendigo porque lhe encontraram nos andrajos uma gramma de isca de cardo.
Isto nunca foi applicar a lei, antes á praticar á sombra d'ella os maiores abusos.
Salvaguardam-se direito, que o estado deve fazer respeitar, mos na orbita da legalidade e sem excessos que, longe do beneficiarem, só prejudicarem e escandalisam.
Eu peço ao illustre ministro da fazenda que, sem demora, se digno providenciar para que taes factos se não repitam. Peço a s. exa. que evite que de disposições de lei acertadas resultem interpretações viciosas.
O Sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Ainda que só ouvi parte das considerações que acaba de fazer o illustre deputado o Sr. conde da Serra de Tourega, vou tomar informações ácerca da factos o que e. exa. alludiu, e se ellas confirmarem o que s. exa. acaba de dizer, procederei com a energia que o coso merece.
Tenho dito.
O Sr. Alfredo Cesar de Oliveira: - Já tive occasião do chamar a attenção da camara para o aspiração justissima, dos povos do Alemtejo, para que o lyceu de
Página 224
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS 224
Evora seja elevado á categoria de lyceu central. Como não vejo inconveniente na satisfação d' este acto e do administração, mando para a mesa um projecto de lei, que vae precedido do competente relatorio, que não leio para não cansar a attenção da camara.
(Leu o projecto.)
Ficou para segunda leitura.
O sr. Tavares Festas:- Associa-se às considerações por mais de uma vez, têem sido feitas pelo sr. Alfredo César de Oliveira em favor da elevação do lyceu de Evora a lyceu central, e apresenta alguns argumentos para mostrar que da mesma forma se deve proceder com relação ao lyceu de Vizeu.
Associa-se ainda às considerações feitas por s. ex.ª em favor da reforma da policia na província do Alemtejo, e conclue pedindo á commissão de negocios ecclesiasticos que dê o seu parecer sobre um projecto de lei que apresentou no anno passado, estabelecendo um novo praso para a aposentação dos parochos.
(O discurso será publicado na integra quando s. ex.ª restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Teixeira de Sousa:- Eu desejava fazer uma pergunta ao sr. ministro da marinha, a que s. exa. responderá agora, querendo, ou passadas as vinte e quatro horas que o regimento marca.
O sr. ministro da marinha perfilhou o projecto relativo aos exclusivos das industrias no ultramar; este projecto foi aqui discutido e votado, e v. exa. sabe que elle levanta grande resistencia no norte.
Como v. exa. sabe, esse projecto levantou grandes resistencia? no norte, principalmente por parte d'aquelles que se entregam á industria da tecelagem. Consta, porém, que uma commissão desses industriara, tendo procurado o sr. presidente do conselho, recebeu de s. exa. a resposta de que, emquanto exercesse tão alto cargo, o projecto não teria1 seguimento.
Pergunto ao sr. ministro da marinha se s. exa. concorda com a resposta que o sr. presidente do conselho deu á commissão, se porventura é verdadeira, e se os industriaes a que eu acabo de referir-me podem estar certos que o projecto não terá seguimento e por agora não será convertido em lei. S. exa. responderá agora ou amanha, se quizer aproveitar-se da inscripção dentro do praso marcado no regimento.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro da Marinha (Dias Costa):- Escusa eu mesmo de responder ao illustre deputado. A resposta que tinha a dar era obvia. Desde o momento em que o nobre presidente do conselho declarou que o projecto não seria por emquanto convertido em lei, é claro que eu partilho da mesma opinião.
Eu entendo que a questão que n'este momento mais nos deve preoccupar é a questão de fazenda. (Apoiados.)
Sobre ella deve concentrar-se toda a attenção dos homens públicos. (Apoiados.)
Logo que o projecto dos exclusivos, effectivamente perfilhado por mim, levantou, ainda sem rasão, grande celeuma no norte do paiz, entendo que o nobre presidente do conselho andou muito bem em não estar a complicar as questões, já de si complicadas e em que estamos envolvidos, com a questão de ordem publica.
Estou persuadido de que os industriaes que tanto se alarmaram com esse projecto, logo que reconheçam bem a fundo a essencia d' elle, se hão de convencer de que não apresenta perigo algum para a industria nacional; a tanto estou certo disso, que tanto o governo transacto como o actual não hesitaram em perfilhar o projecto, porque visava a uma medida de fazenda colonial, sem prejuizo das industrias da metropole. Esse principio estava consignado logo no principio do artigo, em que se dizia que o governo podia emendar o exclusivo quando julgasse conveniente aos interesses do estado, exceptuando as industrias
que tivessem larga exportação para o ultramar; e quando alguém podesse ter duvidas ácerca da interpretação deste artigo, o projecto estabelecia, para todas as industrias, ou quaesquer pessoas, o direito de apresentarem as suas reclamações e recorrerem do despacho do governo para o supremo tribunal administrativo, dando, neste ponto, ao accordão d'este tribunal efeito deliberativo. Desde o momento em que a decisão deste pleito estava confiado a um alto tribunal, estou perfeitamente convencido de que não podia restar a menor duvida de que os interesses da industria estavam perfeitamente acautelados. Não o entenderam, porém, assim alarmaram-se com a discussão do projecto. Propalaram-se noticias pela imprensa que alarmaram aquelles industriaes. A questão agravou-se porque não houve uma boa orientação; não houve, no meu entender, um exame detalhado do projecto. Eu recebi um officio em que os industriaes reunidos me apresentavam um alvitre, que era uma espécie de additamento às emendas que foram apresentadas durante a discussão, o que prova que esses industriaes tinham adquirido a convicção de que o projecto em nada lhes era nocivo.
Creio ter respondido satisfactoriamente á pergunta do illustre deputado.
(S. exa. não reviu.)
sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): - O illustre deputado que acaba de fallar, o sr. Teixeira de Sousa, referiu-se a uma declaração que eu fiz á commissão de industriaes do Porto, que veiu procurar-me para representar contra o projecto dos exclusivos. Não nego o que disse, mas não quero que se me attribuam palavras que não proferi.
Eu não disse que o governo se obrigava a que o projecto não fosse convertido em lei; o que disse foi que o governo desistia de dar seguimento ao projecto, e que emquanto eu fosse presidente do conselho elle não teria andamento; quer dizer, o governo dispoz sé d'aquillo de que podia dispor, da sua iniciativa.
O governo, portanto, não affrontou ò parlamento, nem procura tolher a qualquer deputado o direito de iniciativa a respeito do projecto; o que fez foi, no pleno uso do seu direito, declarar que desistia de lhe dar seguimento.
O sr. ministro da marinha já explicou as rasões que me determinaram a tomar aquella deliberação. Eu entendi, que sendo grave a questão da fazenda publica, e que tendo-se levantado no norte e em outros pontos do paiz uma agitação, porventura injustificada, mas em todo o caso real, effectiva e muito importante, que não devia deixar crescer essa agitação, pondo-lhe termo immediatamente, a fim de deixar ao governo e ao, parlamento o seu tempo e a sua acção para se occupar da questão, que n'este momento mais nos deve preoccupar - a questão de fazenda.
São estas as rasões por que eu fiz esta declaração, que compromette só o governo, deixando livre a camara e o illustre deputado.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Joaquim Tello: - Pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei.
O governo transacto, por decreto de 4 de fevereiro de 1897, fez á junta de parochia da freguezia de S. Sebastião, do Lagos, a concessão provisória do extincto convento de Nossa Senhora da Gloria, que eu peço, no projecto que vou mandar para a mesa, seja tornada definitiva.
Como a camara vê, n'este projecto não ha augmento de despeza; é simplesmente um acto de humanidade, que é sempre muito para louvar.
Não sinto, por isso, a menor dificuldade em recommendar a v. exa. e á camara a approvação do projecto, que passo a ler.
(Leu.)
Sr. presidente, já vê v. exa. que é, como disse, simples
Página 225
SESSÃO N. 13 DE 4 DE FEVEREIRO DE 1898 225
mente um acto de caridade que eu solicito da camara, sem o menor encargo para o estado e sem atropelar direitos ou legítimos interesses de terceiro.
Os iniciadores d'esta instituição, dignos do maior louvor pela sua arrojada dedicação e sentida caridade, têem já envidado esforçou importantes para construir o asylo.
Sr. presidente, á custa de esmolas particulares, solicitadas com todo o empenho, e com o producto de um bazar realisado com igual interesse e grandes sacrificios, deu-se começo á sua construcção, a qual brevemente se construíra, porque de certo não arrefece o enthusiasmo dos dirigentes nem se extinguem os sentimentos do caridade dos habitantes d'aquella briosa cidade.
As ruínas do extincto convento de Nossa Senhora da Gloria estão, ha muitos annos, completamente abandonadas, por inuteis. A intenção de aproveitar algum material e os restos de paredes, que para mais nada podem servir; os intuitos humanitários que a acompanham, levantando, n'aquelles escombros! uma casa do beneficencia, e ao mesmo tempo habitar e policiar aquellas ruínas, que têem servido apenas para refugio de vadios e suspeitos; tudo isto, sem solicitar o menor subsidio ou crear qualquer encargo para o estado, afigura-se-me uma idéa digna de incondicional applauso.
Confiadamente, pois, entrego este projecto á illustração e patriotismo da camara, certo de que me secundará n'esta útil e sympathica diligencia.
Aproveito a occasião de estar com a palavra para mandar para a mesa um requerimento de alguns parochos do distrito de Faro, pedindo a applicação do decreto de 31 de dezembro de 1697 para ser regulado o pagamento dos prémios, exactamente como se regula o pagamento das congruas.
O pedido é muito justo. Desde o momento em que os peticionários têem os mesmos deveres e encargos, é justo que se lhes dêem as mesmas garantias e protecção.
Melhor do que eu expõem os signatários as suas fundadas reclamações; por isso, e porque a este assumpto já se referiu n'esta camara o meu illustre collega e amigo, o sr. conselheiro Ferreira de Almeida, com a sua incontestada proficiencia, me dispenso de insistir nesta questão, limitando-me a chamar a attenção do sr. ministro da justiça, que sinto não estar presente n'este momento.
Disse.
(S. exa. não reviu.)O sr. Presidente:- Tem a palavra o sr. Marianno de Carvalho. Faltam apenas dois minutos para se entrar na ordem do dia, e por isso não sei se s. exa. quererá usar d'ella.
O sr. Marianno de Carvalho:- Não levo tempo nenhum. É para mandar para a mesa o seguinte
Aviso prévio
Nos termos do regimento, tenho a honra do participar a v. exa. que desejo dirigir algumas perguntas ao sr. ministro da marinha, ácerca do regulamento para engajamento da indígenas na província de Moçambique para o trabalho na republica sul- africana, publicado no boletim official da mesma província n.° 50, de 11 de dezembro de 1897.=Marianno de Carvalho.
Mandou-se expedir.
O sr. Presidente:- É um aviso previo. O sr. Marianno de Carvalho:- Exactamente, nada mais. O sr. Mello e Sousa:- Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Roqueiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviadas com urgencia, a esta camara, copias dos contratos realisados para supprimentos ao thesouro, e aos quaes tenham servido de caução, no todo ou em parte, obrigações
da companhia real do caminho de ferro portuguez, das que estavam na posse do estado.
Outrosim copias da correspondencia e quaesquer outros documentos rotativos ao mesmo assumpto. = Mello e Sousa.
Mandou-se expedir.
O sr. Simões Baião:- Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeira que, pelo ministerio das obras publicas, me sejam fornecidas copias authenticas de todos os contratos de arrendamento e de prorogação de arrendamento de terrenos na posse do estado e marginaes do Tejo, no districto de Santarem, celebrados em 1897 pela l.ª circumscripção hydraulica. = Simões Baião.
Mandou-se expedir.
O sr. José Pestana:- Mando para a mesa a seguinte
Participação
Participo a v. ex.ª e á camara que está constituída a commissão de commercio, escolhendo para seu presidente o sr. deputado Simões Ferreira e para secretario a mim participante. = O deputado, José Pessanha.
Para a acta.
O sr. Lopes do Carvalho!- Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Roqueiro que me seja enviada copia dos documentos correspondentes ao processo de syndicancia feita á camara de Alemquer, bem como do parecer da procuradoria geral da corôa. = António Mariano Lopes de Carvalho.
Mandou-se expedir.
OREDEM DO DIA
Continuação da discussão do projecto n.º 25 de 1897 concessões de terrenos no ultramar.
O sr. Presidente:- Vae ler-se um officio dirigido á presidencia da camara, como eu participei quando se abriu a sessão, pelo sr. Barbosa de Magalhães, e que diz respeito ao projecto que ao discute.
Leu-se na mesa o seguinte
Officio
Exmo. sr.- Ao ler o extracto da sessão do hontem da camara dos senhores deputados, a que tenho a honra de pertencer, a que v. ex.ª dignamente preside, julguei do meu dever expor os factos, que commigo so passaram, e que esclarecem um dos pontos em discussão.
Como o meu estado de luto e de saude me não permittem ir fazel-o de viva voz, peço a v. ex.ª que se digne transmittir á camara a seguinte exposição, e mandal-a publicar no Diario das sessões, segundo me parece justo e neccessario.
A discussão do projecto de lei n.° 25 sobre concessões de terrenos no ultramar foi concluída pela respectiva commissão a horas alta da noite de 21 de julho de 1897, nas vesperas da morte de meu sogro, e quando já então minha mulher se debatia noa horrores da doença que a matou.
Apesar d'essas dores lancinantes, e a pedido do sr. conselheiro Barras Gomes, então ministro da marinha, aceitei o encargo da relator d'esse projecto, e nessa mesma noite escrevi o relatório e redigi o projecto, segundo os confusas idéas que pude colher dos debates oraes da commissão e das rapidas indicações do sr. ministro, mandando logo tudo no dia immediato para a mesa dessa casa do parlamento, como sé vê do Diario das sessões, a pag.338.
Esse parecer foi impresso e distribuído na camara du-
Página 226
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS 226
rante a minha ausencia, nos dias em que tive de ir a Aveiro prestar a ultima homenagem de veneração e saudade ao que fora em vida meu segundo pae.
No primeiro dia em que pude voltar á camara, 7 de agosto, veiu o sr. conselheiro Barros Gomes dizer-me que o parecer já havia sido distribuído, mas que a redacção do artigo 71.° do projecto não traduzia bem o seu pensamento, e que alguns membros da commissão lhe haviam declarado que tambem não concordavam com essa redacção.
Propuz-lhe logo que a commissão se reunisse de novo para deliberar sobre a redacção definitiva d'esse artigo, e o sr. Barros Gomes, concordando commigo, encarregou-me de combinar com o sr. conselheiro Marianno de Carvalho, presidente da commissão, o dia e hora d'essa convocação.
Procurei ali mesmo em seguida o sr. Marianno de Carvalho, que me auctorisou a dizer á mesa que podia, em nome d'elle, convocar a commissão para o dia e hora que julgasse conveniente, comtanto que não fosse qualquer dos dois ou tres dias seguintes, em que tinha de estar ausente de Lisboa
Assim o fiz, e a commissão veiu a reunir-se para esse fim em 17 de agosto.
N'esta reunião, a que não assistiu o sr. Marianno de Carvalho, discutiram-se diversas redacções a dar-se ao referido artigo 71.°, até que a final se resolveu dar-lhe definitivamente a que consta de uma proposta de substituição ali mesmo escripta por mim, e que foi depois assignada pelos srs. Marianno de Carvalho, Correia de Barros, Frederico Laranjo, Dias Costa, Moreira Júnior, Queiroz Ribeiro e Poças Falcão. O original d'essa proposta está em poder da commissão, como vou explicar.
Tratando-se depois da forma pratica de fazer essa substituição, entendeu-se que o mais simples e rápido, e o mais conforme aos usos parlamentares, era eu, como relator, mandal-a para a mesa quando o projecto entrasse em discussão, pedindo que ella fosse discutida conjuntamente com o projecto.
N'essa conformidade, levei para a camara essa substituição manuscripta, e por indicação do sr. conselheiro Barros Gomes fui mostral-a e lel-a ao chefe da opposição parlamentar, o sr. conselheiro João Franco, que depois do conferenciar com o sr. conselheiro Ferreira de Almeida sobre o assumpto, me declarou concordar com aquella redacção, comtanto que se acrescentassem, no final do único do mesmo artigo, as palavras suspensas pelo mencionado decreto de 27 de setembro de 1894".
Voltei com esta declaração ao sr. Barros Gomos, que acceitou o acrescentamento, e depois de ouvir sobre elle, tanto o sr. Marianno de Carvalho, que, apesar de não haver assistido á reunião, se prestou a assignar. a proposta, embora com a declaração de vencido em parte, como os demais membros da commissão, que estavam então na camara, e que tambem concordaram, acrescentei eu mesmo aquellas palavras ao paragrapho.
Só em 27 de agosto é que o parecer n.° 25 foi dado para ordem da noite de 28, como se vê do Diario das sessões, a pag. 489. N'essa sessão nocturna deu-se até um pequeno incidente, que pela sua insignificancia, na occasião, não consta dos registos parlamentares, mas de que talvez v. exa. e alguns dos deputados presentes se lembrem. Ao entrar em discussão um outro parecer da commissão do ultramar, suppondo eu que já era o n.° 25, pedi logo a palavra e comecei a dizer que, como relator, mandava para a mesa, por parte da commissão, uma proposta de substituição ao artigo 71.° V. exa., porém, sr. presidente, preveniu-mo do equivoco, e eu desisti da palavra, indo em seguida á mesa pedir que tivessem bem presente a necessidade que havia de eu apresentar opportunamente aquella substituição.
Supponho que se deverá lembrar desta minha recomendação
m o digno primeiro secretario, o sr. conselheiro Paes de Abranches.
Na sessão seguinte, 30 de agosto, não se chegou a entrar na ordem da noite, e não houve mais sessões o anno passado.
Quando este anno se abriu a actual sessão parlamentar, abriam-se tambem as portas da eternidade para receber a alma immaculada da mãe de meus filhos.
Quebrado de animo e forças, senti que tinha de abandonar, ao menos por agora, os trabalhos parlamentares, e efectivamente não tenho podido acompanhai-os. Mas quando ante-hontem á noite .(segunda feira), soube que de tarde entrara em discussão aquelle projecto, e que por parte da commissão se dissera que nenhuma emenda havia para apresentar, lembrei-me então d'aquella antiga proposta; de substituição deliberada o anno passado, e hontem mesmo (terça feira) logo de manhã, á hora em que a commissão devia reunir no ministerio da marinha, fui pessoalmente á porta da sala, onde já estavam reunidos com o sr. ministro alguns dos membros da commissão, e encarreguei o continuo da direcção geral do ultramar, o sr. Taveira, de ir, como foi, entregar ao presidente, ou quem suas vezes fizesse, o officio do teor seguinte:
"Ex.mo sr.- Não podendo comparecer á sessão de hoje da illustre commissão do ultramar de que v. exa. é digno presidente, tenho a honra do enviar a v. exa., para ser presente á mesma commissão, a substituição que ella, em sua sessão do 17 de agosto do 1897, resolveu que eu, como relator, propozesse ao artigo 71." do projecto de lei n.° 25, quando o mesmo projecto, já então impresso e distribuído ha muitos dias, entrasse em discussão na camará dos senhores deputados, o que na sessão parlamentar do anno passado não houve occasião de fazer. Isto explica a rasão por que do parecer impresso em 21 de julho do mesmo anno não podia constar aquella substituição posteriormente deliberada.
"Deus guarde a v. exa. Lisboa, 1 de. fevereiro de 1898.-Exmo sr. presidente da commissão do ultramar = J. M. Barbosa de Magalhães."
Acompanhava este officio o mencionado autographo, com cuja copia fiquei, e que transcrevo:
"Substituição ao artigo 71.°:
"Artigo 71.° Fica o governo auctorisado a modificar as concessões de terrenos suspensa pelo decreto de 27 de setembro de 1894, excepto as que envolvem transferencia de direitos de soberania, as quaes se consideram caducas.
"§ único. As modificações a que este artigo se refere serão feitas em conformidade das clausulas e condições que, segundo a sua área, estão respectivamente prescriptas no titulo 3.° d'este regimen, ficando, porém, sempre dependentes da sancção parlamentar as concessões de mais de 50:000 hectares, suspensas pelo mencionado decreto de 27 de setembro de 1894. ;
"Sala das sessões da commissão, em 17 de agosto de 1891.=Marianno Cyrillo de Carvalho (vencido em parte) = J. A. Correia de Barros =José Frederico Laranja = F. F. Dias Costa = M. Moreira Júnior = Queiroz Ribeiro = Poças Falcão - Barbosa de Magalhães, relator."
O sr. Taveira veiu dizer-me que entregara estes documentos. A esse tempo ia a entrar para a sala da commissão o meu illustre collega e amigo, o sr. dr. Jeronymo Barbosa, a quem declarei o que acabava de fazer, expliquei os termos do meu officio e a importância da substituição que o acompanhava, e pedi com instancia que os fizesse ler á commissão e tomar na consideração devida nessa mesma sessão, porque era urgente que o fossem antes da sessão parlamentar d'esse dia.
Consta-me que afectivamente esse officio e a respectiva substituição foram recebidos e communicados á commissão algumas horas antes de começarem os debates parlamentares sobre o projecto.
Página 227
N.° 13 DE 4 DE FEVEEEITIO DE 1898 227
Não sei o mais que se passou.
Mas parece-me que quem fez tudo isto para que a substituição do artigo fosse deliberada, conhecida e apresentada não queria illudir a camara sobre as idéas e votações da commissão, nem tinha o mais leve interesse ou desejo de que esse artigo fosse redigido d'esta ou d'aquella fórma, e de que fosse mais ampla ou mais restricta a simples auctorisação por elle concedida ao governo, e de que poderia em todo o caso usar ou não usar como entendesse melhor.
Como v. exa. e a camara vêem não deduzo uma defeza, porque creio em consciencia não merecia a ninguem a injustiça de me accusar.
Faço apenas um depoimento, que firmo com a minha palavra, e corroboro com o testemunho que invoco dos cavalheiros que citei.
E, cumprido assim o que devia á propria dignidade e ao nome que tenho de legar a meus filhos, permitto-me v. exa. e a camara que eu volto para a obscuridade que desejo e a que me condemnou a insuficiencia o os desgostos.
Deus guarde a v. exa. Lisboa, 2 de fevereiro do 1898.- IIImo. e exmo. sr. presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza. = J. M. Borbota de Magalhães.
Á secretaria.
O sr. Arthur Montenegro (relatar):- Participo a .v. exa. e á camara que o sr. Barbosa de Magalhães, antigo relator do projecto em discussão, assistia hoje á sessão da commissão do ultramar, e leu um communicado igual áquelle que acaba de ser lido na mesa.
Em harmonia com a deliberação que a commissão havia tomado ácerca do artigo 71.°, mando para a mesa a seguinte
Proposta
Substituição ao artigo 71.°:
Artigo 71.º Fica o governo auctorisado a modificar as concessões de terrenos suspensas pelo decreto de 27 de setembro de 1894, excepto os que envolvem transferencia de direitos de soberania, as quaes se consideram caducas.
§ unico. As modificações a que este artigo se refere serão feitas em conformidade das clausulas e condições que, segundo a sua area, estilo respectivamente prescriptas no titulo 3.° d'este regimen, ficando porém sempre dependentes da sancção parlamentar as concessões de mais de 50:000 hectares, suspensas pelo mencionado decreto de 27 de setembro do 1894.
Sala das sessões, 4 de fevereiro do l898. = Arthur Montenegro.
Foi admittida a ficou em discussão conjunctamente com o projecto.
O sr. Presidente: - Fica em discussão conjuntamente com o artigo 1.° do projecto.
O sr. Teixeira de Sousa: - Ouvi com toda a attenção a leitura do officio enviado A mesa pelo sr. Barbosa de Magalhães, e essa leitura deixou no meu espirito a impressão de que a questão relativa á sua pessoa está liquidada, se porventura os factos referidos são verdadeiros, e eu não tenho o direito de suppor o contrario.
De reato devo dizer que n'este ponto já essa situação estava liquidada, porque d'este lado da camara se não levantou a mais pequena suspeita nem ácerca da probidade dos srs. ministros, nem dos membros da commissão. (Apoiados.)
Dito isto devo affirmar a v. exa. que o officio que foi lido na mesa, longo do modificar a situação em que o governo e a commissão se encontram, a aggrava consideravelmente. (Apoiados.)
O officio é mais uma rasão para mostrar a verdade do que nós sustentamos, isto á, a necessidade de ser remettido A commissão um projecto que está profunda e notavelmente alterado. (Apoiados.)
Passados dois dias sobre esta discussão, entendo que é conveniente recordar o avivar o que principalmente se discute, porque todos os esclarecimento são poucos para uma questão como esta excepcionalmente melindrosa (Apoiados) e tão melindrosa que, apesar do todos os esforços, do todas as ajudas, o sr. ministro da marinha e a commissão ainda não chegaram. A desembaraçar-se d'ella, e bom pelo contrario cada dia que passa mais se aggrava a situação do ex. ministro e da commissão, em consequencia da sua teimosia em levar por diante um plano de campanha evidentemente cheio do riscos o do perigos para quem o traçou e para quem o sustenta. (Apoiados.) A culpa não é nossa. Nós abrimos cominho para uma saída airosa, porque o nosso proposito não é levantar difficuldades ao governo e antes pelo contrario os nossos esforços visaram muito especialmente a arredar de sobre esta questão uma suspeição, que nem utilisava ao governo, nem á camara, nem individualmente a cada um de nós. (Apoiados.)
Bom pelo contrario, avolumaria a onda do descredito que por toda a parte envolve o systema parlamentar !
Sr. presidente, ha oito annos que me honro de ter assento n'esta camara, pois devo confessar a v. exa. que nunca assisti a um espectaculo tão deprimente para as instituições parlamentaras como aquelle que nós presenciámos aqui na ultima sessão ; nunca assisti a um espectaculo tão deprimente para o parlamento portuguez, que ou havemos de levantar do descredito em que caíu, ou havemos de abandonar como inutil e como ridiculo ; se não fizermos assim, a indifferença pela causa publica que é um dos mais graves males de que o paiz enforma, ha de aggravar-se consideravelmente, ha de augmentar o divorcio que agora é manifesto entre o parlamento o a opinião publica (Apoiados.)
Mas, sr. presidente, que caminho se pretende dar a esta discussão ?!.. .
Nós somos impenitentes, reincidimos em erros que são incompativeis com a confiança publica, e aggravâmos uma situação do sua natureza melindrosa, ao contrario do que devia acontecer!
E não venham dizer "que esta é uma questão regimental, que é uma questão ragimental, que é uma questão minima !" Não é .(Apoiados.) É uma questão de valor sobremaneira importante, porque prende com a dignidade do parlamento, prende com a dignidade de um poder, que é a base do nosso systema politico e de tal maneira, que se esse poder caír em profundo descredito, eu não comprehendo como esse systema se possa deixar de perder e da condemnar !
E aqui vieram dizer-nos: "que os deputados d'este lado da camara tinham levantado uma questão regimental com o fim de crear dificuldades ao governo, parecendo querer arrastar para a discussão um debato essencialmente politico !"
Não é verdade isso. (Apoiados.) Os nossos esforços visam exclusivamente a afastar o desprestigio do parlamento portuguez; e se por muitos e ponderosos motivos seria perigoso em todas as ocasiões, é hoje principalmente em que ao parlamento está entregue a resolução de problemas, que se prendem com o futuro e com a dignidade do paiz.
Levantarmos difficuldades ao governo, nós ! que no meio da maior tranquillidade recebemos dia a dia aggravos do natureza partidaria! Levantâmos difficuldades ao governo, nós!... que assistimos no maior silencio a essa torrente de provocações do ministerio do reino, que pareço inexgotavel! Não é verdade isso.
Sr. presidente, affirmou o sr. Elvino de Brito "que nós queremos levantar difficuldades ao governo!" Isto não passa de um expediente rhetorico, não passa de uma affirmação gratuita e banal, que não corresponde a nenhum facto positivo, antes traduz as difficuldades em que o illustre deputado se viu para defender uma questão que estava inteiramente perdida. (Apoiados.) A questão era má, sr. presidente, e quando as questões são más, não ha esfor
Página 228
228 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
ços de intelligencia, não ha nada que possa salval-as. A questão era má e v. exa. veiu a sessão de terça feira tornal-a de má em pessima. A sessão de terça feira foi uma sessão verdadeiramente deploravel, foi uma d'estas sessões que, como costuma dizer-se, marcam um systema politico. Mas vamos aos factos.
Na sessão de segunda feira o meu illustre amigo o sr. Ferreira de Almeida mandou para a mesa uma proposta,, que sustentou, no sentido de ser remettido á commissão o projecto em discussão, com o fundamento de que a commissão do ultramar estava a fazer n'elle grandes e profundas alterações. Nada mais justo. Pois se esta discussão tinha de versar sobre um projecto da commissão, nada me parece mais logico do que adiar-se até que a esta camara fosse remettido o projecto definitivo. (Apoiados.)
E ainda por outras rasões.
O projecto tem dois artigos. O primeiro artigo trata de toda a economia do projecto, de modo que approvado elle nos termos em que se encontra, ha de necessariamente considerar-se approvado todo, por isso que a camara não resolveu que houvesse uma discussão em separado para cada uma das bases.
Estava ou não estava alterado? Estava. Sabia-se, e não póde duvidar-se, pelo O Popular, de que é director politico o sr. Marianno de Carvalho e ao mesmo tempo presidente da commissão do ultramar a que presidia, que a commissão se havia reunido, estudado e refundido o projecto de fond en comble até ao artigo 31.°, resolvendo ainda a commissão em sessões subsequentes alterar o resto. E note v. exa. que tão notaveis foram as modificações introduzidas no projecto, que tendo-o O Popular combatido violentissimamente, por ser inconveniente para os interesses publicos, concluia que se o projecto se não tornára bom, ficára pelo menos consideravelmente melhorado, tão notaveis e profundas tinham sido as alterações feitas.
Qual não foi o nosso espanto ao ouvir as primeiras declarações do sr. relator, levantando-se e dizendo que a commissão se havia reunido, na verdade, havia conversado sobre o projecto, mas que não havia resolvido nada, que pelo menos o illustre deputado na qualidade de relator nenhuma proposta de emenda ou substituição tinha a mandar para a mesa.
Ora, sr. presidente, as declarações feitas pelo sr. relator só podiam deixar de ser consideradas como uma de conveniencias politicas, se as informações de O Popular fossem falsas, dada a importancia do assumpto, dada a respeitabilidade do director politico de O Popular e a sua qualidade de presidente da commissão do ultramar. E não eram.
Veiu o sr. Marianno do Carvalho, chamado a terreiro, como se costuma dizer, pelo sr. Jacinto Candido, e confirmou todas as informações dadas pelo O Popular.
A commissão havia reunido, a commissão havia discutido, a commissão havia procedido a votação sobre muitos pontos importantes do projecto. (Apoiados.)
Depois disto o que representava para nós a declaração do sr. relator? Uma mystificação de certo, assente em necessidades e conveniencias politicas; mas que francamente não corresponde inteiramente á exactidão dos factos como elles se haviam passado. (Apoiados.)
E é n'esta altura do debate que o sr. ministro da marinha, de quem nós esperavamos que n'um momento de bom senso tirasse da camara este projecto e se impozesse no sentido de ser remettido á commissão, vem confirmar por modo absoluto e completo que o projecto estava alterado. (Apoiados.) Mais que isto: pela primeira vez o sr. ministro da marinha levanta a ponta do véu que encobria graves e profundas alterações no projecto ! (Apoiados.) Aconteceu isto quando o sr. ministro da marinha de uma maneira clara, authentica e positiva nos affirmou que o projecto em muitos dos seus pontos não correspondia ao modo de pensar e do sentir, nem ao voto dos membros da commissão que o assignaram. (Apoiados.)
Que é isto, sr. presidente?
O projecto estava profundamente alterado! - E note v. exa. que eu não repito o que tantas vezes aqui se tem dito e lá fóra; eu disse que o projecte estava alterado; não digo que estava falsificado. E espantei-me de não ver o sr. ministro da marinha n'um assomo de independencia, que lhe ficaria bem, repellir a discussão de um projecto que de antemão elle reputava profundamente alterado nos seus pontos mais importantes e essenciaes. (Apoiados.)
Eu tenho pelo sr. ministro da marinha a maior consideração. Folgo de ter occasião de prestar uma sincerissima homenagem ás suas superiores qualidades de caracter e de intelligencia; mas com a mesma franqueza devo dizer que fraquezas d'esta natureza não se coadunam bem com a dignidade do poder executivo. (Apoiados.)
Foi sob a impressão das palavras do sr. ministro da marinha que foi encerrada a sessão de segunda feira; foi ainda sob a impressão das palavras pronunciadas pelo sr. ministro da marinha que eu me inscrevi para deixar lavrado o meu protesto contra mais este golpe que se pretende dar sobre as instituições parlamentares. (Apoiados.)
Mas estava ou não estava o projecto profundamente alterado? Estava. Por quem? Não sei. Como? Foi o que se apurou na sessão de terça feira, sessão que tão penosa e dolorosamente impressionou o espirito publico. (Apoiados.)
Vejamos o que se passou n'essa sessão.
O sr. Elvino de Brito, em resposta ao sr. Jacinto Candido, interveiu com a sua eloquencia n'esse dia demasiadamente apaixonada, procurando enredar-nos em interpretações regimentaes, mas pretendendo especialmente arrastar-nos para a paixão de um debate politico, expediente conhecido e velho para interessar a maioria parlamentar.
Foi assim que o sr. Elvino de Brito veiu sustentar aqui a celebrina doutrina de que as commissões parlamentares podem em qualquer occasião estudar e apreciar os assumptos que uma vez lhe foram commettidos; e a demonstrar esta these, aliás errada e falsa, o sr. Elvino de Brito, a quem eu folgo de ter occasião do prestar homenagem pelos seus brilhantes recursos parlamentares, gastou o melhor dos suas forças.
Póde qualquer commissão apreciar os assumptos que lhe são commettidos? Evidentemente, mas em virtude de resoluções da camara. (Apoiados.)
O sr. ministro da marinha, que era então o sr. Barros Gomes, trouxe a esta camara uma proposta de lei regulando a maneira de fazer concessões no ultramar. A commissão reuniu-se, estudou a proposta, converteu-a em projecto de lei, mandou-o para a mesa; e depois d'isso a commissão do ultramar podia discutil-o podia aprecial-o? Podia, mas officiosamente, como podiam; fazel-o quaesquer particulares. A commissão nenhuma ingerencia tinha mais no projecto emquanto não lhe fosse devolvido, em virtude de resolução da camara. (Apoiados.) Esta é a verdadeira e sã doutrina.
Devo dizer que o illustre deputado sr. Elvino de Brito n'este ponto está em contradicção comsigo proprio. Pois se as commissões podessem em qualquer occasião examinar, estudar, alterar os assumptos que uma vez lhes foram commettidos, para que foi que s. exa. ha muitos poucos dias mandou para a mesa um requerimento pedindo a v. exa. que consultasse a camara sobre se consentia que fosse devolvido á commissão de fazenda o projecto da conversão para apreciar uma proposta que o sr. ministro da fazenda disse que mandava para a mesa, mas que ninguem viu, porque não existia então? (Apoiados.) Oh! sr. presidente, se as commissões podessem em qualquer occasião estudar, apreciar, alterar os projectos que uma vez lhes fossem commettidos, não havia necessidade de consul-
Página 229
SESSÃO N.°13 DE4 DE FEVEREIRO DE 1898 229
tar a camara, e o projecto da conversão podia n'esse mesmo dia ser remettido á commissão de fazenda. ( Apoiados.)
Mas não é isso que discutimos. Nas não discutimos se a commissão tem ou não competencia para apreciar o projecto que tem estado em discussão. O que discutimos é o ponto restricto e concreto de alterações profundas no projecto, conservando-se inteiramente desconhecidas d'esta camara. (Apoiados.) Tambem não discutimos a doutrina constitucional do sr. ministro da marinha de dois poderes executivos, um na metropole e outro em Moçambique, tendo o poder executivo delegado mais faculdades que o poder executivo delegante.
O que queremos saber é se o projecto esta ou não alterado. (Apoiados.) Está alterado o profundamente alterado. (Apoiados.)
Nenhuma duvida existe a este respeito depois que o sr. ministro da marinha fez uma declaração clara e inilludivel. (Apoiados.) Nenhuma duvida ficou depois dos declarações peremptorias e claras de s. exa.
A commissão havia resolvido que as concessões de terrenos de area superior a 50:000 hectares não fossem consideradas feitas senão depois da approvação parlamentar, e, portanto, já vã v. exa. que nenhuma rasão tinha o sr. Elvino de Brito para fazer a affirmação de que estávamos a entreter-nos numa chicana parlamentar. For motivos que v. exa. comprehendo, não exagero a gravidade d'este facto. Ella impõe-se ao espirito de todos. Eu não quero tirar partido, nem effeitos politicos das vantagens da nossa situação, mas v. exa. comprehende que, se nos animassem intuitos como os que por muitas vezes dominaram outras opposições. poderiamos levantar uma grave questão do moralidade. Não o fazemos, e não o fazemos porque o nosso proposito é unicamente mostrar a rasão que nos assisto quando pedimos que o projecto volte á commissão. E, se elle fosse remettido a commissão quando o propoz o sr. Ferreira de Almeida, ter-se-ia evitado uma grande vergonha.
Vejamos, sr. presidente, a que se refere uma das alterações feitas no projecto, porque, come já tive occasião de referir, é sabido que o projecto foi profundamente alterado, pelo menos até ao artigo 31.°
O artigo 71.° dia o seguinte:
(Leu.)
Como muito bem disse o sr. Luciano Monteiro, este projecto é, por assim dizer, a regulamentação do decreto e 27 de setembro de 1894 relativamente a concessões a fazer de futuro, a concessões, feitas depois do 27 do setembro, o ainda a concessões feitas até 27 do setembro e que por este decreto foram suspensas.
Este artigo 71.° é uma disposição transitoria. A commissão tinha resolvido que essas concessões, quando fossem de area superior a 50:000 hectares, ficariam dependentes de previa approvação parlamentar.
Pelo artigo em questão ácerca das concessões feitos n'estas circunstancias apenas se obrigava o governo a dar conta ás côrtes do uso que fizesse d'esta auctorisação. Esta conta é inteiramente banal, porque os governos não dão conta ás côrtes de auctorisação d'esta natureza, e quando dão é o mesmo que não dessem. (Apoiados.) Já vimos que nenhuma rasão tinha o sr. ministro quando, embaraçado n'esta questão, nos vinha dizer que um erro typographico tinha alterado o modo de pensar e de sentir da commissão. Eu não quero abusar da situação. Mas se s. exa. confrontar a antigo projecto com o relatorio do projecto que o precedo, s. exa. verá que não se tratava o um erro typographico, mas do sustentar uma doutrina que foi reflectida e pensada. Que importancia tem isto? Enorme. Ha ou não ha concessões que oram superiores a 50;000 hectares, que pelo voto da commissão tinham de vir ao parlamento como condição essencial, o por este projecto ficavam dispensadas da approvação do parlamento?
Ha, e ha mais de uma. N'este ponto não insisto por motivo que v. exa. muito bem comprehende.
O sr. ministro apressou-se a reunir a commissão - a commissão reuniu-se na segunda feira - fez grandes e profundos alterações a este projecto, alterações que ainda não vieram á camara - veiu apenas á camara a alteração que consta da carta mandada para a mesa pelo sr. Barbosa de Magalhães.
Vejamos que importancia tem para a questão a carta que ha pouco foi lida na mesa. Da carta consta essencialmente o seguinte. Primeiro, que as alterações feitas ao artigo 71.° - quer dizer a substituição que foi lida na mesa foi approvada pela commissão, se bem me recordo, em 27de agosto do anno passado - o que o sr. Barbosa de Magalhães, constando-lhe que estava em discussão n'esta camara o projecto relativo ao concessões, na terça feira, de manhã, remettêra á commissão a proposta de substituição que estava assignada, tendo todo o cuidado do se certificar de que a substituição fóra entregue na commissão foi lida e apreciado. (Apoiados.) Quer dizer, a proposta de substituição que o sr. Barbosa do Magalhães tinha em seu poder, foi lida na commissão do ultramar na terça feira, antes da sessão d'esta camara (Apoiadas), e todavia n'esta sessão o sr. relator vinha dizer que não havia nada que apresentar á camara.
O sr. Artur Montenegro: - Não foi lida.
O sr. Cayola: - Não foi lida a proposta na commissão.
O Orador: - Quem o diz é o sr. Barbosa de Magalhães. Tanto quanto pude ouvir, o sr. Barbosa de Magalhães diz que elle mesmo foi o portador da carta para o sr. presidente da commissão do ultramar.
Elle mesmo procurou occasião em que ella estivesse reunida e para que se désse conta do que a carta continha, ao illustre deputado o sr. Jeronymo Barbosa pedira que imitasse com a commissão para que d'ella tomasse conhecimento.
Uma voz: - Não foi lá lida.
O Orador: - E certo que o sr. ministro da marinha sabia que essa alteração existia. (Apoiados.) O que é certo é que essa alteração, segundo o officio do sr. Barbosa de Magalhães, vinha do 17 de agosto do anno passado e tinha a sancção do sr. ministro da marinha. O sr. ministro da marinha disse "que era um erro typographico".
(interrupção.)
Não venha s. exa. defender o sr. ministro da marinha, que eu respeito; não tenho o mais insignificante proposito o pôr em duvida a incontestavelmente probidade pessoal do sr. Dias Costa. (Muitos apoiados.) Venho accusar uma gravissima irregularidade, que não tem explicação!
O sr. ministro da marinha sabia que havia a substituição do artigo 71.° Quem nós diz a nós que não houve força ou pressão que levasse a commissão a reconsiderar sobre a alteração que tinha sido feita em agosto do anno passado?
(Pausa.)
Não se ria v. exa., sr. Cayola, explique esta contradicção flagrante...
O sr. Cayola: - Peço a palavra.
Uma voz: - Ha do ser explicado tudo.
O Orador: - Mas antes d'isso ouçamos quem de cadeira póde fallar n'este assumpto.
Eu n'este ponto appello para a probidade do sr. Marianno do Carvalho.
Sr. Marianno de Carvalho, v. exa., o grande jornalista, o grande parlamentar que, n'um largo periodo de annos, não tem negado ao seu paiz o seu grande talento, o sacrifício da sua saude e o risco da sua vida, não póde guardar sobre ente assumpto, que é tão melindroso, reservas; não póde manter este grave ponto de interrogação. Varra v. exa. a sua testada, que é lisa e limpa, diga o que ha, tire de sobre nós um peso que nos esmaga!...
Página 230
230 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
V. exa. conhece a historia completa d'esta questão, v. exa. tem as provas de que o projecto está notável e consideravelmente alterado, faça v. exa. luz completa sobre este assumpto. Não creio que haja ninguem que precise justificar-se, mas se houvesse, v. exa. prestava um enorme serviço e um grande favor. V. exa. não tem direito, como homem de bem que é, de manter reservas sobre um assumpto tão importante e melindroso, embora essas reservas utilisem ao governo.
Dê v. exa. explicações claras e peremptorias e depois d'isso, sr. presidente, repetindo as palavras do sr. Ferreira de Almeida, mande v. exa. o projecto á commissão, como satisfação á dignidade parlamentar (Apoiados), e talvez ainda para arredar por completo qualquer fumo de suspeição - que no meu espirito não existe - que ainda possa existir no espirito publico.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
(O orador não reviu.)
sr. Frederico Laranjo: - Disse que, se o sr. Teixeira de Sousa, relativamente ao officio que só acabara de ler, declarou que, pelo que respeitava á pessoa do auctor d'esse officio, o sr. Barbosa de Magalhães, a questão estava liquidada, isso não podia ser senão, porque esse officio era a expressão da verdade, e se o era a questão estava liquidada em tudo o mais.
Houvera o anno passado um equivoco na redacção do artigo 71.° do projecto, equivoco que bem se explicaria pelo estado attribulado de espirito do sr. Barbosa de Magalhães, cercado de tantas dores, a morte de seu sogro, a doença irremediavel de sua esposa; equivoco que mesmo sem essas circumstancias era frequente; mas contra esse equivoco reclamara logo o sr. ministro da marinha e ultramar, que então era o sr. Barros Gomes, contra elle tinham reclamado os membros da commissão, um dos quaes era o sr. ministro da marinha actual, e, em virtude d'essa reclamação, o artigo 71.° tinha sido substituido, sendo a substituição assignada pelos membros da commissão, incluindo o seu presidente, o sr. Marianno do Carvalho. Não era, pois, necessario fazer outro projecto e outro parecer, para poder ser discutido com lealdade, porque essa substituição, como se via do officio do sr. Barbosa do Magalhães, fôra communicada ao leader da opposição, o sr. João Franco o ao sr. Ferreira de Almeida. Ambos tinham concordado com ella, tinham até collaborado n'ella, exigindo que se acrescentassem as palavras finaes da mesma substituição.
Não era necessario, repete, fazer um parecer o um projecto novo para dar á opposição conhecimento do uma rectificação, que ella muito bem conhecia, mas de que agora lhe aprazia figurar, perante o publico, que era para ella um mysterio.
Forque não se tinha apresentado essa rectificação logo no começo da discussão? porque não se podia dizer tudo ao mesmo tempo, o porque, sendo a rectificação ao artigo 71.°, era natural apresentar-se quando d'esse artigo se tratasse.
Relativamente ao resto da questão que se discutia, o gravo facto de a commissão do ultramar tornar a estudar um projecto de lei que já estava affecto á camara, e deliberar, em virtude do seu estudo, propor na camara, sem parecer previo, algumas emendas, o caso era ainda mais simples.
Tendo passado alguns mezes, e mudado o ministro da respectiva pasta, era conveniente ver se seria util alterar alguma cousa. Reuniu-se, pois, para novo estudo a commissão e oxalá que sempre as commissões assim procedessem, e em resultado d'esse estudo tinha concordado em se proporem á camara algumas emendas; mas, porque estas não alteravam o systema, a economia do projecto, deliberára-se tambem não se apresentar um projecto novo, o que só serviria para malbaratar tempo.
Essas emendas eram simples, perceptiveis á primeira leitura; por exemplo, a commissão julgava exageradas algumas multas, attenuára-as; era porventura cousa que não se percebesse rapidamente, que precisasse novo projecto, novo relatório?
Por exemplo, algumas escalas de plantas foram julgadas pequenas; deliberou-se que se propozessem escalas maiores; porventura é alguma cousa intrincada, que precise de novo projecto e novo relatório ?.
A commissão julgou e julga que não é necessario para base da discussão um novo projecto ; mas, porque julga que os seus membros não estão privados, pelo facto de pertencerem a essa commissão, da sua iniciativa de deputados para apresentarem emendas, apresentarão as que julgarem convenientes, elles, e todos os deputados tanto da maioria como da minoria que assim o quizerem; e porque a questão é aberta, todas as emendas irão á commissão, todas serão julgadas pelo que em consciencia a commissão entender que valem, e o parecer sobre todas essas emendas será depois discutido e julgado pela camara.
A opposição queria que a commissão, alem do projecto actual, fizesse um outro, e depois um terceiro sobre as emendas; a maioria pensa que basta o actual projecto, e depois um segando sobre as emendas; o proposito da opposição gastaria tempo inultilmente; o da commissão e da maioria poupa-o. E eis a que se reduz a altisonante questão.
O sr. Teixeira de Sousa dissera que não levantava uma questão de moralidade; não a levantava, porque a não podia levantar. O caso reduz-se a um equivoco rectificado pela commissão, de accordo com os chefes da opposição e ao uso de direito de iniciativa de emendas da parte de todos os deputados, n'uma questão; administrativa, de alta administração, e que nada deve ter de politica partidaria.
(O discurso será publicado na integra guando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Marianno de Carvalho: - Começa dizendo que nos termos do regimento, não tendo havido resolução alguma em contrario, e tendo o projecto um unico artigo são com elle discutidas todas as disposições que lhe respeitam; e assim a emenda proposta é agora que devia ser posta em discussão e não mais tarde, como indicou o sr. Laranjo.
Tudo quanto está succedendo, diz o orador, se deve attribuir á máxima latina abyssus abyssum. Nunca se viu uma commissão approvar emendas sem que logo as apresente á camara. A commissão reuniu-se para avivar a memoria, mas esqueceu-se exactamente d'aquillo do que todos se lembravam, como disse o sr. Laranjo, e que ora a emenda ao artigo 71.°
Não tencionava dizer quaes as alterações feitas pela commissão, mas desde que o sr. Laranjo apontara algumas, dirá agora as restantes.
O projecto foi completamente modificado na questão das multas, e na das plantas, não se limitando a modificar a escala, mas alterando tambem a obrigação da apresentação previa.
Também houve alterações no que respeita ás concessões ao longo dos rios, das obrigações de cultura e confiscação de terrenos. Emfim, tudo foi alterado.
O orador, em seguida, impugna o principio sustentado pelo sr. ministro da marinha, de que o poder executivo não póde revogar os seus proprios actos.
Assim como s. exa. não comprehende, diz, o que ha de illegal nos actos do sr. commissario regio de Moçambique, segundo poder executivo, assim elle, orador, não comprehende a rasão por que o poder executivo não póde alterar os seus proprios actos.
O que vê é que entre nós os poderes executivos se re-
Página 231
SESSÃO N.º 13 DE 4 DE FEVEREIRO DE 1898 231
produzem como os laparos, excellentes roedores, ou como os cohens, ainda mais do que aquelles.
Faltaria mais livremente, se estivesse presente o sr. Barbosa de Magalhães; assim não o fez pelo receio de molestar alguem.
Dirá, comtudo, em abono da verdade, que os factos descriptos no seu officio são exactos, mas na narrativa, ha lacunas.
Narra, em seguida, o que se passou na commissão, affirmando que, apesar de se terem feito muitas alterações na proposta de lei, nenhuma se fez em relação á parte d'essa proposta que correspondo ao artigo 71.° do projecto. O sr. Barbosa do Magalhães foi o encarregado de o relatar.
Quando depois se procedeu novamente a leitura do projecto, o sr. Barros Gomes, então ministro da marinha, logo declarou que o artigo tal como estava redigido não correspondia ao pensamento do governo, e foi n'essa occasião que a emenda se apresentou. Mais tarde, elle, orador, relendo o projecto, logo notou que o artigo não estava emendado, como se tinha resolvido, mas foi informado de que a emenda seria apresentada durante a discussão.
É claro, portanto, que não houve erro typographico, mas sim, um equivoco, que attribue ao espirito angustiado do sr. Barbosa de Magalhães.
E se é para estranhar que a emenda não fosse apresentada logo no principio da discussão, é facto esto que bem se póde attribuir a maneira irregular por que tudo tem corrido, verificando-se assim o que já disse: o abysmo invoca o abysmo.
O orador, depois de mais algumas considerações, pede, por se achar fatigado, para ficar com a palavra reservada.
(O discurso será publicado na integra, se s. exa. restituir os notas tachygraphicas)
O sr. Presidente: - Desde o momento em que v. exa. se mostra fatigado, a camara de certo recebe com agrado o pedido de ficar com a palavra reservada para a sessão immediata. (Apoiados.)
A primeira sessão é na segunda feira, sendo a ordem do dia a que esta designada.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas.
Documentos enviados para a mesa
Representação
Dos parochos dos freguesias ruraes do concelho de Faro, diocese do Algarve, pedindo que as disposições do novo decreto que regula a cobrança das congruas sejam extensivas á cobrança ordinaria e voluntaria da premios ou bolos para os parochos que queiram usar d'essa faculdade.
Apresentada pelo sr. deputado Joaquim Tello e enviada á commissão de fazenda.
Justificação de falta
Declaro que faltei por motivo justificado á sessão de 31 de janeiro. = O deputado pelo circulo 67, Ferreira da Cunha.
Para a secretaria.
O redactor = Barbosa Colen.