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SESSÃO DE 24 DE MARÇO DE 1871

Presidencia do ex.mo sr. Antonio Gabral de Sá Nogueira

Secretarios — os srs.

Adriano de Abrau Cardoso Machado

Domingos Pinheiro Borges

Summario

Apresentação de requerimentos, representações, projectos de lei e notas de interpellação — Explicações pedidas pelo sr. Eduardo Tavares ao sr. ministro do reino ácerca do decreto de 18 de agosto de 1870 e resposta do mesmo sr. Ministro — Referencias a este assumpto por parte dos srs. Sampaio e Dias Ferreira — Approvação do parecer da commissão de verificação de poderes sobre o, processo eleitoral do circulo de Macau, e proclamação e juramento do deputado eleito por esse circulo, o sr. Francisco Maria da Cunha. — Ordem do dia: Discussão, que ficou pendente, das propostas de adiamento do projecto n.º 20, que approva o contrato celebrado entre o governo e o digno par do reino marquez de Niza, para o estabelecimento de ostreiras artificiaes.

Chamada — 55 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: Adriano Machado, Agostinho de Ornellas, Pereira de Miranda, Soares de Moraes, Antonio de Vasconcellos, Sá Nogueira, Antunes Guerreiro, A. J. Teixeira, Freire Falcão, Pedroso dos Santos, Sousa de Menezes, Rodrigues Sampaio, Antonio Telles de Vasconcellos, Falcão da Fonseca, Saraiva de Carvalho, Ferreira de Andrade, Conde de Villa Real, Pinheiro Borges, Pereira Brandão, Eduardo Tavares, Francisco Pereira do Lago, Francisco Coelho do Amaral, F. M. da Cunha, Pinto Bessa, G. Quintino de Macedo, Barros Gomes, Palma, Santos e Silva, Barros e Cunha, Mendonça Cortez, Alves Matheus, Nogueira Soares, Faria Guimarães, Gusmão, J. A. Maia, Bandeira Coelho, Dias Ferreira, Elias Garcia, Figueiredo de Faria, Rodrigues de Freitas, Almeida Queiroz, Rodrigues de Carvalho, Nogueira, José Tiberio, Julio do Carvalhal, Julio Rainha, Luiz de Campos, Luiz Pimentel, Affonseca, Marques Pires, Thomás Lisboa, Mariano de Carvalho, D. Miguel Pereira Coutinho, Pedro Franco, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Entraram durante a sessão — os srs. Osorio de Vasconcellos, Villaça, Veiga Barreira, A. M. Barreiros Arrobas, Pequito, Eça e Costa, Augusto de Faria, Barão do Salgueiro, Bernardino Pinheiro, Francisco Mendes, Caldas Aulete, Freitas e Oliveira, Jayme Moniz, Zuzarte, Candido de Moraes, J. J. de Alcantara, Lobo d'Avila, Mello e Faro, José Luciano, Latino Coelho, Mello Gouveia, Mexia Salema, Teixeira de Queiroz, Paes Villas Boas, Pedro Roberto, Sebastião Calheiros, Visconde dos Olivaes.

Não compareceram — os srs.: Alberto Carlos, Anselmo José Braamcamp, Santos Viegas, Antonio Augusto, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Barão do Rio Zezere, Francisco de Albuquerque, Francisco Beirão, Costa e Silva, Van-Zeller, Silveira da Mota, Mártens Ferrão, Ulrich, Augusto da Silva, Pinto de Magalhães, Moraes Rego, J. M. dos Santos, Mendes Leal, Lopo de Sampaio e Mello, Camara Leme, Visconde de Montariol, Visconde de Moreira de Rey, Visconde de Valmór.

Abertura — Á uma hora e meia da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA.

Officios

1.° Do ministerio da fazenda, remettendo 100 exemplares do relatorio do tribunal de contas.

Mandaram-se distribuir.

2.º Do ministerio da marinha, remettendo o processo eleitoral do circulo de Macau.

Á commissão de verificação de poderes.

3.° Do ministerio das obras publicas, remettendo os esclarecimentos pedidos pelo sr. Rodrigues de Freitas, ácerca das matas nacionaes.

Á secretaria.

4.º Da repartição de saude do exercito, remettendo 100 exemplares da estatistica medica dos hospitaes militares no anno economico de 1869—1870.

Mandaram-se distribuir.

Representações

1.ª Dos algibebes de Lisboa, pedindo que a proposta de lei do governo sobre contribuição industrial, não seja approvada na parte que diz respeito á sua classe.

2.ª Dos mercadores de papel para escrever, no mesmo sentido da antecedente.

3.ª Dos relojoeiros, no mesmo sentido.

4.ª Dos donos de estabelecimentos de venda de vinho por miudo, no mesmo sentido.

5.ª Dos tendeiros, no mesmo sentido.

6.ª Dos salchicheiros, no mesmo sentido.

7.ª Dos cutelleiros, no mesmo sentido.

8.ª Dos merceeiros e donos de armazens de viveres, pedindo que a mesma proposta de lei seja modificada na parte que diz respeito á sua classe.

9.ª Dos mercadores chamados «por grosso», representando contra a mesma proposta.

10.ª Dos latoeiros de folha amarella, pedindo que seja conservada á sua classe a taxa que paga actualmente.

11.ª Dos capellistas vendendo objectos de modas, pedindo que o seu gremio seja incluido na 4.ª classe.

12.ª Dos fabricantes e vendedores de chapéus, pedindo que o seu gremio não seja conservado na classe em que vem incluido na proposta do governo.

13.ª Dos despachantes da alfandega de Lisboa, fazendo igual pedido.

14.ª Da camara municipal do concelho de Aldeia Gallega do Ribatejo, representando contra as medidas de fazenda do governo.

15.ª Da camara municipal do concelho de Ourique, pedindo a revogação da lei de 1 de julho de 1867, que extinguiu os circulos de jurados.

16.ª Da camara municipal de Paços de Ferreira, pedindo a collocação de um corpo militar permanente em Penafiel.

17.ª Dos officiaes dos extinctos batalhões nacionaes de Lisboa, moveis e fixos, pedindo que lhes seja applicado o decreto de 14 de agosto de 1860.

18.ª Dos possuidores de papel moeda, precatorias, restituições de rendimentos e depositos antigos, titulos para pagamento a credores de bens nacionaes, titulos azues admissiveis na compra de bens nacionaes, titulos e liquidações chamados de divida publica, liquidações de divida anterior a agosto de 1833 e titulos de servidores do estado de 1849 a 1851, pedindo a capitalisação dos seus creditos.

Foram todas enviadas ás commissões respectivas.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — Sendo de reconhecida utilidade para o municipio de Lisboa a reconstrucção e augmento do mercado da Ribeira Nova no local entre a praça de D. Luiz I e a Travessa do Boqueirão da Ribeira Nova, como se vê na planta junta, e não se podendo realisar este grande melhoramento sem que seja concedido pela nação á camara municipal de Lisboa o terreno onde estava situado o antigo forte de S. Paulo, hoje mutilado, tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei.

Artigo 1.º É auctorisado o governo a ceder á camara municipal de Lisboa o terreno do antigo forte de S. Paulo

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junto da Praça de D. Luiz I, a fim de se reconstruir e augmentar o mercado da Ribeira Nova.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 22 de março de 1871. = Manuel Thomás Lisboa = Augusto Saraiva de Carvalho = Antonio Augusto Pereira de Miranda = José Maria Latino Coelho = José Elias Garcia.

Foi admittido e enviado á commissão respectiva.

Proposta

Proponho que seja nomeada pela mesa uma commissão especial composta de sete membros para dar parecer sobre o projecto de lei do sr. Barros é Cunha sobre á distribuição do imposto da contribuição predial pelas juntas geraes. = José Luciano de Castro.

Foi admitida á discussão e logo approvada.

Mandou-se imprimir um parecer da commissão de guerra sobre o requerimento da João Marliniano Ferreira machado Flambo.

O sr. Pedro Franco: — Mando para a mesa duas representações dos proprietarios do concelho de Belem, em que pedem não só que se lhes não eleve a tão subido preço a taxa da contribuição predial e pessoal, mas ainda mais, o deixarem de ser cobradores ou zeladores das rendas do estado.

Os proprietarios do concelho de Belem fazem ver á digna commissão de fazenda e á camara, que não podem soffrer um augmento tão consideravel na contribuição predial, e mui especialmente os de Carnide, porque o unico estabelecimento que lhes dava vida era o real collegio militar, que foi d'ali tirado o anno passado, vendo hoje as suas propriedades ao abandono. Os mais proprietarios pedem mui especialmente, que não sejam obrigados a pagar a contribuição pessoal, cujo pagamento pertence aos inquilinos.

Na verdade muitos proprietarios ha que apesar de não receberem as rendas dos seus predios, pagam ainda a decima predial correspondente a essas rendas, Obriga-los agora tambem ao pagamento da contribuição pessoal seria uma segunda contribuição mais pesada que a primeira.

A execução das rendas, como v. ex.ª e a camara muito bem sabem, feita perante os nossos tribunaes, alem de ser morosa, é muito despendiosa; emquanto que o governo póde mandar fazer rapidamente a execução por um processo administrativo e seguro, por isso que tem por hypotheca especial, o casco e as rendas da propriedade, o proprietario para executar uma renda, tem que chamar o inquilino á conciliação; quando é contrariada, porpor-lhe acção perante o juizo de direito, de ali para a relação e de lá para o supremo tribunal, e no fim de tres ou quatro annos, gastou o proprietario 300$000 réis para receber uma renda de 50$000 ou 100$000 réis. Ora, isto assim hão póde ser. Ou o proprietario deve ser alliviado da contribuição pessoal, ou então devem os proprietarios serem obrigados a arrendar os seus predios, unica e exclusivamente por meio de um arrendamento sellado o qual servirá de base, para uma execução rapida e sem recurso perante o juiz eleito.

Mando pois para a mesa estas representações, esperando que a digna commissão de fazenda e a camara as tomem na devida consideração, dispensando os proprietarios do pagamento da decima pessoal, ou dando-lhes garantias para receberem rapidamente as suas rendas, taes como o governo as recebe.

O sr. José Tiberio: — Pedi a palavra para fazer uma rectificação.

No Diario da camara, de terça feira, que hontem me foi distribuido, vem transcripto que eu n'aquella sessão tive a honra de mandar para a mesa uma representação dos empregados do governo civil de Castello Branco; e não é assim. O que eu mandei para a mesa foi uma representação dos empregados do governo civil do districto de Vianna do Castello.

Faço esta rectificação, a fim de ser publicada no Diario da camara.

O sr. Eduardo Tavares: — Pedi a palavra, porque desejo ouvir a opinião do illustrado ministro do reino sobre um ponto de legislação administrativa, a respeito do qual existe duvida sobre se é ou não lei vigente.

A reforma administrativa do meu nobre amigo o sr. Dias Ferreira estatuia no artigo 121.°, n.º 1.°, que as camaras municipaes deliberavam sobre emprestimos municipaes e suas garantias; e no artigo 123.° dizia que, para a realisação d'esses emprestimo, bastava a approvação do conselho de districto, quando não excedessem a somma de réis 10:000$000.

Essa reforma, como se sabe, era para ter execução de 1 de janeiro de 1871 em diante; mas pouco tempo depois da sua publicação veiu o decreto de 18 de agosto de 1870, no qual se determinou que os artigos, que referi, e ainda outros da dita reforma, ficassem desde logo em execução.

Algumas camaras municipaes, tendo a convicção de que tal decreto está em vigor, têem pedido aos conselhos de districto a approvação para emprestimos não excedentes a réis 10:000$000; mas acontece que alguns d'esses conselhos têem dado essa approvação, regulando-se, e creio que bem, pelo decreto de 18 de agosto, e outros têem-na recusado, opinando por que tal apptovação só a póde dar o parlamento, depois do governo lhe apresentar á respectiva, proposta de lei. Estes suppõem revogado esse decreto, que aliás o não foi, como é sabido.

Existindo, pois, duvida sobre este ponto, que reputo importante, desejava ouvir a tal respeito o illustre presidente do conselho de ministros, e saber qual a opinião de s. ex.ª sobre o assumpto, para que as camaras monicipaes fiquem sabendo, e os conselhos de districto, como têem de proceder.

Entre as medidas da dictadura, que nós revogámos em dezembro do anno passado, quando votámos o bill de indemnidade, não está incluido o decreto de 18 do agosto de 1870; pelo contrario elle foi homologado pelo poder legislativo, e tanto isto assim é que, quando o meu illustre amigo o Sr. Dias Ferreira tomou a palavra, notou a incoherencia que havia no parecer da commissão especial quando propunha a revogação da reforma administrativa, e deixava em vigor o decreto de que se trata.

A isto respondeu o sr. relator que, se tal decreto não fôra incluido nas medidas cuja revogação a commissão do bill propunha, era isso apenas devido á circumstascia d'elle já estar em execução. Recordo que o criterio de que a commissão se serviu para formular o seu parecer foi propor a revogação de todas as medidas que não estavam já em execução, e a conservação de todas as que o estavam. O decreto de 18 de agosto estava no numero d'estes ultimos.

Havendo porém duvida a este respeito, comquanto me parece que a não deve haver, eu pedia com a reverencia que devo ao nobre presidente do conselho, e com o intuito de esclarecer algumas camaras municipaes, que se digne, com a bondade que o caracterisa, dar-me, e por consequencia ao paiz, algumas explicações para que se fique sabendo qual lei regula no caso em questão. Sendo o decreto de 18 de agosto uma medida descentralisadora, que eu reputo utilissima para os municipios, desejo que se lhe não levantem estorvos á sua plena execução.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Marquez d'Avila e de Bolama): — Eu fui surprehendido pelas observações feitas pelo illustre deputado.

V. ex.ª e a camara comprehendem, que desde que ha duvidas sobre a interpretação do decreto a que o illustre deputado alludiu, e é hoje lei, a minha primeira obrigarão é examinar os fundamentos d'essas duvidas, e habilitar-me a resolve-las, considerando as observações que o illustre deputado fez como interpellação, para seguir os termos ordinarios.

Eu não tinha conhecimento das duvidas a que o illustre deputado se referiu.

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Ha alguns processos de emprestimos de camaras municipaes no ministerio do reino, dos quaes me tenho já occupado. Entre elles ha um da camara municipal da Moita, e talvez seja este a que o illustre deputado se referiu, no qual encontrei falta de informações que pedi, para o poder resolver.

Tomo nota do que o illustre deputado disse, e não terei duvida de, em qualquer outra sessão, satisfazer os seus desejos, depois de saber os fundamentos que a repartição respectiva póde ter para a interpretação do decreto, de que fallou o illustre deputado.

O sr. Eduardo Tavares: — Agradeço ao nobre presidente do conselho a prompta resposta que se dignou dar-me. Devo declarar muito categoricamente que nas palavras que proferi, não tive, nem podia ter, o intuito de fazer sequer a mais leve censura a s. ex.ª, nem tinha para isso rasão alguma.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Apoiado.

O Orador: — Eu não me referi a nenhum caso especial, nem me consta que o nobre ministro tenha duvida sobre a maneira por que se deve entender o decreto de 18 de agosto. Não fallei na pretensão da camara da Moita, mas se ella obteve a approvação do conselho de districto para um emprestimo municipal, e se esse emprestimo não excede a cifra de 10:000$000 réis (o que n'este momento não poderei asseverar), é minha opinião que, para tal emprestimo se effectuar, não é precisa a approvação do parlamento.

O que eu desejo é que se esclareça o caso de fórma tal que todos fiquem sabendo a lei que rege, e desde que o nobre presidente do conselho declara que ha de examinar bem a questão para que possa ter brevemente uma solução, só me cumpre aguardar o cumprimento de tal promessa com a confiança que me inspira sempre o honrado ministro e meu antigo amigo.

O sr. Ministro do Reino: — Creio que nas expressões que empreguei, não houve nada que podesse fazer acreditar ao illustre deputado que eu julgasse que a sua pergunta tinha tido algum sentido hostil; mas como ha no ministerio do reino alguns processos de emprestimos de diversas camaras municipaes, comecei hoje a occupar me do exame d'elles, e por acaso o primeiro que me appareceu foi o da camara municipal do concelho da Moita, que julgo faz parte do collegio, que o illustre deputado dignamente representa, e suppuz por isso, que se tinha referido principalmente a este: não me diz porém a consciencia, que na resposta que dei ao illustre deputado, houvesse alguma expressão, que podesse não lhe ser agradavel.

O sr. Santos e Silva: —Mando para a mesa duas representações a respeito das taxas da contribuição industrial; uma, dos cordoeiros e vendedores de aprestes para navios, com estabelecimento em Lisboa; e outra, dos guarda livros e primeiros caixeiros das casas de commercio.

Peço a v. ex.ª que dê a estas representações o destino conveniente, mandando as publicar no Diario do governo e remettendo-as depois á commissão de fazenda, para que ella haja de as attender no que n'ellas houver de justo e sensato.

O sr. Pedroso dos Santos: — Mando para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro da marinha (leu).

Abstenho-me de fazer considerações sobre este assumpto, porque entendo que o sr. ministro, no interesse do serviço publico, que creio toma bastante a peito, ha de dar-se pressa a vir á camara responder a esta interpellação, porque é necessario que o ministro attenda, como deve, ás cousas concernentes ao seu ministerio, e dô satisfação á camara dos deputados e ao deputado interpellante, para que o direito de interpellação que assiste ao deputado não seja uma ficção.

Espero que o sr. ministro da marinha ha de cumprir o dever que lhe incumbe, e desde já prometto a v. ex.ª que quando esta interpellação se verificar hei de manter a discussão á altura dos principios e da moralidade, sem me occupar determinadamente de pessoa alguma.

O sr. Telles de Vasconcellos: —Mando para a mesa um projecto de lei que diz respeito aos militares que em 1869 foram mandados para a Zambezia.

Os decretos de 1868 e de 1869 concederam a estes militares certas vantagens e mandaram applicar-lhes a lei de 19 de janeiro de 1827.

Estas vantagens concedidas não foram de tal ordem que podessem evitar as desgraças que ali têem acontecido aquelles expedicionarios.

Abstenho-me de ter o relatorio, e só peço a leitura do projecto, que é de tal natureza que por si só se recommanda (leu).

Mando tambem para a mesa um requerimento (leu).

Peço a v. ex.ª que dê ao meu projecto o destino conveniente, isto é, que depois de ter segunda leitura seja enviado á commissão do ultramar, a fim de que ella o tome na consideração que merece.

O sr. Pereira de Miranda: — Mando para mesa tres representações contra o augmento da contribuição industrial; sendo a primeira dos fabricantes de chapéus de sol, a segunda dos mercadores de tecidos de lã por miudo, e a terceira dos srs. Ramires com estabelecimento de tecidos de seda.

Por esta occasião devo dizer que a associação commercial de Coimbra, da qual tenho a honra de ser socio honorario, entendeu, zelando os interesses da classe que representa, dever enviar á camara dos srs. deputados uma representação contra o imposto industrial, e entregou a sua representação ao deputado por aquelle circulo, o meu amigo o sr. Alberto Carlos Cerqueira de Faria, o qual, como a camara sabe, se acha ausente de Lisboa. Creio porém que em breve virá a representação.

Tinha necessidade de dizer estas palavras para mostrar que aquella corporação não descura os interesses da classe que representa.

O sr. Falcão da Fonseca: — Participo a v. ex.ª e a camara que por motivo de doença não tenho podido comparecer ás ultimas sessões d'esta camara.

O sr. Rodrigues Sampaio: — Mando para a mesa uma representação da classe dos luveiros, não contra o augmento do imposto industrial, mas contra a sua exorbitancia.

Peço que esta representação tenha o destino que têem tido outras que aqui têem sido apresentadas sobre o mesmo assumpto.

Como ha pouco se fallou na intelligencia que se deve dar a uma lei d'esta camara, comprehendida nos actos da dictadura, peço tambem ao sr. ministro do reino que examine esta questão e que faça cumprir as leis.

Para mim não ha duvidas a respeito d'aquella lei.

Esta camara não confirmou a reforma administrativa, porque não estava em execução, a qual devia começar em janeiro de 1871, mas confirmou o decreto de 18 de agosto, que tinha mandado executar alguns artigos d'ella.

O sr. Dias Ferreira notou a incoherencia d'este proceder, e o relator da commissão declarou que a rasão era porque um decreto estava em execução e outro não.

Aconteceu que a camara municipal de Villa Nova de Ourem me pediu que renovasse n'esta camara a iniciativa de um projecto para ser auctorisada a contrahir um emprestimo. Não o pude fazer, porque sendo membro da commissão especial e membro d'esta camara, tendo votado aquella lei que estava em execução, a minha opinião era que requeressem ao conselho de districto.

Assim o fez aquella camara, e o governador civil de Santarem declarou que esta interpretação que eu tinha dado n'um officio á camara, ou n'uma carta particular, era absurda.

O parlamento não podia acoitar a minha iniciativa n'um ponto já resolvido, e eu não podia renovar a iniciativa do

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projecto perante uma camara de que eu era membro, e que approvou aquelle decreto.

A camara municipal não póde obter o emprestimo do conselho de districto, porque o governador civil não reconhecia a força da lei. Ficou assim a camara sem ter quem lhe fizesse justiça.

Portanto desejo que o sr. ministro do reino, examinando esta questão, dê as ordens aos seus delegados, a fim de que se cumpram as leis.

Sei que muitos conselhos de districto têem concedido estas auctorisações.

No Porto, por exemplo, o conselho dê districto concede estas auctorisações, e em Santarem não se concedem. Esta anarchia não póde sustentar-se nem admittir-se. É isto que eu peço ao sr. ministro do reino. E já lh'o tinha pedido e s. ex.ª promettido. Não diria isto se não se fallasse n'esta questão, porque desejo que as cousas corram regularmente.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Posso assegurar ao illustre deputado que hei de occupar-me incessantemente d'este assumpto, que é inquestionavelmente urgente (apoiados); e se entender que é necessario recorrer ao corpo legislativo para interpretar a lei, no caso que ella careça de interpretação, no caso que ella seja obscura, hei de apresentar sem demora a esta camara a necessaria proposta. Estimarei muito que o governo esteja habilitado para resolver a questão sem ter necessidade de recorrer ao poder legislativo; mas se for necessario, eu, que respeitei sempre e respeito muito as prerogativas parlamentares, não tomarei de fórma alguma sobre mim a responsabilidade de resolver questões que são da sua competencia.

Aproveito a occasião para dizer duas palavras á camara em relação ao que disse o illustre deputado, quando mandou para a mesa uma representação, creio que da classe dos luveiros, a qual não se queixa do augmento do imposto, mas da exageração ou exorbitancia d'esse augmento; foi o que me pareceu ter ouvido ao illustre deputado. (O sr. Sampaio: —Apoiado.)

Eu não estava presente na camara quando o meu collega da fazenda manifestou a opinião do governo a este respeito; provavelmente o que vou dizer é a repetição do que disse s. ex.ª, mas supponho não se perder nada em repetir estas declarações.

O governo está resolvido a concorrer com a illustre commissão de fazenda, a quem foi mandada a proposta de contribuição industrial, para se fazerem n'essa proposta todas as modificações rasoaveis que forem pedidas pelos interessados (apoiados. — Vozes: — Muito bem).

O governo comprehende perfeitamente que a sua missão não é cooperar para que se façam leis de impostos que firam os principios da igualdade e da justiça (apoiados). Todos os impostos são vexatorios, não ha duvida nenhuma, mas sempre que elles são lançados com justiça e igualdade os contribuintes submettem-se a elles (apoiados); e, sobretudo, quando tenho visto, com muita satisfação, os termos em que têem vindo as representações dirigidas ao parlamento, entendo que se não póde deixar de ter em muita consideração essas representações.

Ninguem reclama contra o augmento do imposto, reclamam contra a desigualdade, que se entende haver n'esse augmento (apoiados). Tenha pois o illustre deputado, que é membro da commissão de fazenda, a certeza, tenha-a tambem toda a camara e o paiz, de que as intenções do ministerio são de cooperar com a illustre commissão de fazenda, repito, e com as camaras legislativas, para que se façam na proposta de lei, que foi apresentada a respeito da contribuição industrial, todas as modificações que forem necessarias para que essa proposta se converta n'uma lei tão justa quanto possivel.

Ora, a verdade é, que se tem dito muitas cousas sobre este assumpto, que são altamente injustas, porque não são exactas. Faz-se, por exemplo, a comparação da taxa proposta com a taxa precedente; mas não se nota que se estabelece n'essa proposta um principio que póde corrigir muitas desigualdades que provenham do augmento da taxa: quer isto dizer, que algumas taxas não hão de ser reduzidas; hão de ser todas aquellas, repito, que se conhecer que são exageradas, todas (apoiados). Mas o facto é que a circumstancia de se substituir ao quinto o decimo da taxa, corrige muitas desigualdades e muitas injustiças.

Ha, por exemplo, uma taxa de 80$000 réis; propõe-se que seja elevada a 140$000 réis; mas que a escala, que era até agora de um quinto e de cinco taxas, seja substituida por um decimo e dez taxas. Que acontece? Acontece que quem pagava o minimo da taxa, ou o quinto d'ella, isto é, 16$000 réis, póde agora pagar o decimo da nova taxa, ou 14$000 réis, do que resulta que o pequeno industrial póde ficar pagando menos, se passar a proposta, do que pagava pela legislação actual. O grande industrial é que necessariamente ha de pagar mais, Não se perca pois de vista esta circumstancia, que é capital. A escala da contribuição era de um quinto da taxa até cinco taxas, isto é, de um para vinte e cinco; passando a proposta será de um decimo até dez taxas, isto é, de um para cem, e esta modificação habilita o gremio a reparar muitas desigualdades, fazendo pagar ao grande industrial uma contribuição mais em harmonia com os proventos que retira da sua industria, emquanto que o pequeno industrial póde ficar pagando menos do que paga hoje. Esta é, torno a repetir, precisamente o fim das alterações que se propõem na proposta da contribuição industrial; não gravar a situação do pequeno industrial, que estava collectado proporcionalmente nos seus lucros, não lhe pedir mais, antes, em alguns casos, pedir menos, mas pedir mais ao grande industrial que não contribuisse para as despezas do estado por uma maneira proporcional aos seus teres.

E afigura-se me que o paiz comprehende o pensamento da proposta, como se vê das representações que têem sido dirigidas a esta camara, nas quaes se reconhece a necessidade de augmentar o imposto, e só se representa contra as desigualdades que podem resultar d'esse augmento. Applaudo-me com a direcção que este negocio tem tido, e faz honra ao nosso paiz.

Peço desculpa á camara de a estar occupando com um assumpto que já foi aqui tratado.

Vozes: — Não tem duvida; é necessario.

O Orador: —Mas não se perde nada na repetição d'estas declarações por parte do governo (apoiados).

Effectivamente, a nossa situação financeira sem ser desesperada, é grave. Nós carecemos de augmentar a receita publica e carecemos de fazer na despeza do estado todas as economias comportáveis com as necessidades do serviço (apoiados). D'estes dois meios ha de resultar a fructíficaçâo do credito, e a fructificação do credito ha de trazer-nos economias valiosissimas (apoiados) que muito hão de contribuir para a solução da questão de fazenda. O paiz comprehende isto (apoiados).

Diz-se que esta proposta de lei devia ter tido por base um inquerito. Esse inquerito está-se fazendo. As representações que as diversas classes industriaes estão mandando ao parlamento são o melhor de todos os inqueritos.

Tive já a fortuna de fazer duas reformas de pauta; a ultima está ainda em vigor. Quando essas reformas foram feitas ouvi todas as industrias. E preciso notar que eu não sou adversario da liberdade do commercio, bem pelo contrario, entendo que é o fim a que todos devemos tender; mas é necessario proseguir n'este caminho com passos lentos, mas firmes, porque se quizessemos chegar a esse resultado de repente, a minha convicção é de que se comprometteriam muitas industrias e não se obteria o fim desejado.

Como disse, empreguei sempre o systema de ouvir todas as industrias, e alcancei sempre os melhores resultados,

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porque encontrei nos nossos industriaes o bom senso de que agora estão dando provas, e quase sempre pude vir a um accordo com elles, porque na maior parte dos casos elles reconheciam a necessidade de se reduzir o direito protector de que tiravam proveito, e propunham ou aceitavam de bom grado uma protecção rasoavel. Assim fiquei habilitado a levar a effeito essas reformas mansa e pacificamente sem perturbação alguma.Do mesmo modo desejo que se proceda a respeito das leis tributarias. Se não podérmos obter tudo o de que carecemos de uma vez, melhoremos sempre o èstado da fazenda publica, mas não assustemos as industrias nem o paiz (apoiados).Entendo que é esta exactamente a missão que deve ter o governo e o parlamento (apoiados).Visto que fallei da reforma da pauta, vou citar um facto, que toda a camara conhece, e explica melhor o meu pensamento.

Ha vinte annos, creio eu, o direito sobre o papel era de 5$600 réis por 100 arrateis. Todos reconheciam que esse direito era exorbitantissimo. O sr. Fontes Pereira de Mello em 1852, na sua reforma da pauta, reduziu esse direito a 2$800 réis, e a industria da fabricação não ficou compromettida com tamanha reducção.

Eu achei as cousas n'este estado em 1858 quando fiz a minha primeira reforma da pauta, e quiz reduzir o direito do papel de 2$80O réis por 100 arrateis, como disse, a 1$400 réis, chamei os industriaes para os ouvir a respeito d'esta reducção. Os fabricantes de Alemquer sustentavam que o direito não se podia reduzir a menos de 2$500 réis, mas os da Abelheira propozeram elles mesmos o direito de 2500 réis. Aceitei, entendendo que fazia uma reducção importante trazendo o direito de 2$800 réis a 2)51000 réis, e fazendo essa reducção com o accordo dos interessados.

Um anno depois chamei os mesmos industriaes e disse-lhes: se a reducção tivesse sido levada a 15400 réis, o que diriam os senhores? Que se podia fazer, responderam elles. Muito bem, faz-se agora; e effectivamente reduzi aquelle direito a 15400 réis. Dois annos depois o sr. Lobo d'Avila reduziu-o a 700 réis, e ninguem se queixou.

Ora, pergunto eu á camara, se em 1852, em logar de se reduzir o direito de 5$600 réis a 2$800 réis, como fez o sr. Fontes, se tivesse reduzido logo a 700 réis, o que acontecia? Provavelmente gritava toda a gente, fechavam-se as fabricas, e não se tinha preenchido o fim.

Aqui está a minha maneira de proceder n'estes assumptos. Entendo que devemos continuar incansaveis nas reformas de que o paiz carece, mas com prudencia, e convencendo o paiz da necessidade d'essas reformas, e de que ellas são levadas a effeito unicamente no seu interesse. Estou certo de que em taes circumstancias poderemos contar afoutamente com o concurso do paiz.

A camara procedeu com muita prudencia, mandando publicar todas as representações das diversas classes industriaes que vieram já á camara, e peço á camara que continue a mandar publicar todas as que vierem ainda.

Peço tambem á commissão de fazenda que não apresse o seu parecer emquanto se apresentarem representações n'este sentido, as quaes hão de ser-lhe muito uteis no estudo que a illustre commissão está fazendo. O mesmo aconteceu em 1860, e digo isto, porque n'aquella epocha tinha eu a honra de ser presidente da commissão de fazenda. A commissão examinou attentamente todas as representações que lhe foram dirigidas; o que a não inhibia de aceitar na, discussão parlamentar muitas das propostas que foram feitas por alguns srs. deputados. O sr. Faria Guimarães apresentou uma grande porção de substituições e emendas, e os outros srs. deputados fizeram o mesmo. Estas substituições e estas emendas foram á commissão, que approvou uma grande parte d'ellas, e as submetteu a uma nova discussão na camara. Só depois d'isto é que a lei saíu d'aqui e foi para a outra camara, onde se fez identico trabalho.

Por consequencia não ha motivo algum para os industriaes se assustarem. Este negocio ha de correr todos os tramites; ha de encontrar da parte da commissão de fazenda toda a boa vontade, e da parte do governo precisamente o cumprimento das declarações que estou fazendo.

Nós queremos que a situação do paiz melhore, mas sem que assustemos as industrias, porque o mal que d'ahi resultaria seria muito maior do que as vantagens que poderiam provir do augmento da receita, que queremos obter com esta proposta.

O sr. Santos e Silva: — Tenho a honra de mandar para a mesa o parecer da commissão de verificação de poderes, a respeito da eleição por Macau.

Esta eleição correu regularmente; o processo não offerece duvida alguma, e por consequencia peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que, dispensando o regimento, se entre já na discussão d'este parecer.

O sr. Presidente: — Ha uma resolução da camara que determina que estes pareceres, quando não offerecem duvida as eleições respectivas, sejam logo discutidos. Leu-se na mesa o seguinte

Parecer

Senhores. — Á vossa commissão de verificação de poderes foi presente o processo eleitoral do circulo de Macau, dando conta da eleição de um deputado, verificada n'aquella cidade aos 5 de fevereiro do corrente anno.

Compõe-se o circulo de uma só assembléa. Entraram na urna 398 listas.

O cidadão Francisco Maria da Cunha obteve 213 votos, e no cidadão Joaquim José Gonçalves de Matos Correia re-cairam 181. Houve uma lista branca, e o resto foi repartido por differentes pessoas.

A eleição correu regularmente, e não ha protesto ou reclamação.

A vossa commissão é de parecer que deve ser approvada esta eleição, e proclamado deputado o cidadão Francisco Maria da Cunha, visto ter conseguido a maioria legal de votos, e apresentado o seu diploma em fórma legal.

Sala da commissão, em 24 de março de 1871. - João Antonio dos Santos e Silva —Mariano de Carvalho —Antonio Maria Barreiros Arrobas. Foi logo approvado.

O sr. Santos e Silva: — O sr. deputado a quem se refere a eleição que acaba de ser approvada, ou está n'esta sala ou nos corredores. Não sei se s. ex.ª é obrigado a prestar juramento; se é, peço a v. ex.ª que proceda n'essa conformidade.

Vozes: — Ha de ser proclamado deputado e ha de prestar juramento.

Foi proclamado deputado o sr. Francisco Maria da Cunha, que em seguida foi introduzido na sala e prestou juramento.

O sr. Freitas e Oliveira: — Requeiro a v. ex.ª que se digne inscrever-me para tomar parte na interpellação que foi dirigida ao sr. ministro da marinha pelo sr. deputado Pedroso dos Santos.

O sr. Presidente: — Queira mandar o seu requerimento por escripto.

O sr. Rodrigues de Carvalho: — Tenho a honra de mandar para a mesa uma representação da associação commercial de Braga.

Pede-se n'esta representação uma providencia legislativa por effeito da qual sejam transferidas para os escrivães de fazenda as attribuições que actualmente pertencem aos escrivães das camaras, pelo que diz respeito á expedição de alvarás de licença para a abertura de lojas, armazens e outros estabelecimentos para a venda de quaisquer generos e mercadorias, devendo estes alvarás ser processados ex-of-ficio, no interesse da fazenda publica, pelo augmento da venda de sellos, e dos commerciantes que ficam alliviados do pagamento dos emolumentos que actualmente pagam.

Não digo cousa alguma n'este momento ácerca d'este pedido, porque na representação vêem expostas com desenvolvimento e lucidez ás rasões que provam á evidencia a

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justiça que assiste aos signatarios; e limito-me a manda-la para a mesa, esperando que V. ex.ª se digne dar-lhe o destino competente.

O sr. Dias Ferreira: — Pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei. Aproveito porém esta occasião para associar-me ás observações feitas n'esta casa pelos srs; deputados Eduardo Tavares e Rodrigues Sampaio, com relação ao decreto de 19 de agosto de 1870; não me alargo em considerações a esse respeito, visto que o sr. ministro do reino já declarou que tomaria este negocio a seu cuidado; e a circumspeeção, com que s. ex.ª aprecia todas as questões da sua repartição, não me deixa duvida alguma de que o assumpto ha de ser resolvido com justiça.

A reforma administrativa foi approvada por decreto de 21 de julho, é completamente desligada do docreto a que se referiam os illustres deputados, que tem a data de 18 de agosto. Quando aqui appareceu o parecer da commissão especial ácerca dos actos da dictadura, parece que foi approvado, vinham n'elle descriminados os decretos que deviam ser confirmados, d'aquelles que não deviam ser approvados, e todos os que não foram expressamente rejeitados, ficaram ipso facto confirmados, sendo, por consequencia, o decreto de 18 de agosto distincto do outro de 21 de julho, e não sendo expressamente revogado, é claro que está em vigor. A este respeito não póde haver duvidas, nem duas interpretações. Porém, desde que o sr. ministro do reino declara que não examinou ainda o decreto com relação a qualquer negocio a que tenha applicação, eu entendo que a camara não póde insistir sobre este.

O projecto de lei para que tambem pedi a palavra, e que vou mandar para a mesa, é o seguinte (leu-o).

O sr. Lisboa: — Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte projecto de lei (leu).

O sr. Saraiva de Carvalho: — Pedi a palavra para remetter para a mesa varias representações de industrias estabelecidas em Lisboa, que vem perante esta camara reclamar contra a exageração e má organisação da proposta de contribuição industrial apresentada pelo sr. ministro da fazenda.

A primeira é da industria dos canteiros e esculptores em pedra; a segunda é da industria dos caixeiros de fóra e de escriptorio; a terceira é da industria dos photographos; a quarta da dos fabricantes de instrumentos músicos de madeira; a quinta da dos mercadores de couros curtidos.

O sr. Julio do carvalhal: — Mando para a mesa os seguintes requerimentos (leu-os).

O Sr. Arrobas: — Mando para a mesa uma representação da direcção do banco lusitano a respeito da proposta da contribuição industrial, em que esta direcção representa contra varias disposições da mesma proposta que se referem aos bancos, principalmente com relação a injustiça de se lançar a contribuição sobre os lucros. A direcção pede que seja só sobre os dividendos que assente a contribuição, como entende de justiça; e eu; tendo tambem esta opinião, encarreguei-me de trazer aqui a representação.

O sr. Pereira de Miranda: - Pedí de novo a palavra, porque acabo de ser procurado por um representante da classe dos correeiros, que vem representar á camara contra a proposta da contribuição industrial. Mando para a mesa a representação desta classe.

O sr. Barão do Salgueiro: — Mando para a mesa um parecer da commissão de administração pública.

Leu-se na mesa, e foi a imprimir.

ORDEM DO DIA

Entrou em discussão o Projecto lei nrº 30

Senhoares. — A vossa oommissao de commercio e artes foi presente a proposta de lei nº 13 para a approvação do contrato celebrado entre o governo e o digno ao reino marquez de Niza, que diz respeito ao estabelecimento de ostreiras artificiaes.

A concessão de que trata a mencionada proposta acha-se por tal modo fundamentada no relatorio que a acompanha, que a commissão se limita a propôr que seja approvada e convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É confirmado e approvado, na parte em que depende de sancção legislativa, o contrato celebrado em 23 de novembro do corrente anno, entre o governo a o digno par do reino marquez de Niza, para o estabelecimento de ostreiras artificiaes, o qual contrato fará parte integrante d'esta lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 10 de dezembro de 1810. = José Dionísio de Mello e Faro = Antonio Augusto Pereira de Miranda—José Joaquim Rodrigues de Freitas Junior (vencido) = Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães.

O sr. Candido de Moraes (para um requerimento): — Peço a V. ex.ª, sr. presidente, que mande ter o requerimento que na sessão de 1870 submetteu á camara um dos concessionarios de empreza identica á de que se trata, o sr. Bernardo Machado de Faria e Maia.

O sr. Presidente: — Manda-se buscar á secretaria.

O sr. Marques Pires: — Mando para a mesa a seguinte proposta de adiamento.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o projecto de approvação do contrato, de que se trata, para o estabelecimento de ostreiras artificiaes nas lagoas e costas do Algarve, desde Lagos até ao Guadiana, e nas de Aveiro, desde Mira até Ovar, vá ás commissões de agricultura e pescarias para darem sobre elle o seu parecer, por isso que algumas camaras, representaram contra elle, como prejudicial á pesca e á agricultura, e que se suste por isso a discussão.

Sala da commissão, 24 de março de 1871. O deputado pelo circulo de Estarreja, M. Marques Pires.

Admittida.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Na qualidade de membro da commissão de commercio e artes, tinha assignado vencido este parecer; como porém creio que unicamente está em discussão o adiamento, e não o projecto, e peço a V. ex.ª que me dê explicação a este respeito...

O sr. Presidente: — O que está em discussão é o adiamento.

O Orador: — Sendo assim, por esta occasião não fallarei de todos os motivos que tive para assignar vencido o projecto mandado para a mesa pela commissão de commercio e artes; simplesmente direi poucas palavras em apoio da proposta do adiamento que acaba de ser feita por um dos nossos collegas.

Entendo que este projecto não está sufficientemente fundamentado pelo relatorio do sr. ministro das obras publicas nem pelo parecer da commissão de commercio e artes.

Num projecto como este, no qual são offendidos principios importantes, taes como o da liberdade de industria e o do concurso (principio contra o qual o governo abertamente se declara n'este parecer), entendo que é conveniente ouvir-se não só a commissão de pescarias, mas tambem a de fazenda, para nos dizerem quaes os altos interesses do estado que reclamam que um artigo da carta constitucional seja violado, e que por isso nos obrigam a approvar este contrato; tanto mais que se estabelecem condições evidentemente desvantajosas, quando comparadas com as do contrato antecedente feito entre o governo e o sr..Bernardo Machado de Faria e Maia.

Pelo contrato feito com este cavalheiro, dá-se-lhe o exclusivo de aperfeiçoamento da industria das ostras, o estabelecimento de ostreiras artificiaes em certos logares, por dez annos, pagando o direito de 5$02Q réis pela exportação de cada metro cubico de ostras, emquanto que no contrato agora sabmettido á discussSo da camara o praso é

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de trinta annos e o direito é de 180 réis por metro cubico, devia portanto haver importantissimos motivos para que fosse approvado este, de preferencia a outros, que existem na secretaria, como diz o governo.

É verdade que o governo affirma haver adoptado duas bases para approvar este contrato de preferencia aos outros. Essas bases são as seguintes: prioridade do requerimento, e pedido de maior área para o estabelecimento de ostreiras.

Por me parecer que a camara não toma como importantes vantagens de um contrato o ter sido solicitado primeiro do que outro, e a extensão de terrenos pedidos, como entendo que estas não são condições suficientes para que o contrato tenha todas as garantias de ser bem executado, e de ser util, julgo que não póde ser desde já approvado pela camara.

Por todas estas rasões voto para que o projecto vá ás commissões de pescarias e tambem de fazenda, porque se trata de um direito de exportação.

Se a camara rejeitar o adiamento, peço a V. ex.ª que me inscreva para fallar contra o projecto. De certo o sr. ministro das obras publicas dará algumas explicações, e é possivel que, sendo completamente satisfactorias, eu não deva votar o adiamento; e desde já declaro que desejo que sr. ex. possa supprir com o conhecimento que tem d'esta questão os esclarecimentos que nos possam dar não só a commissão de pescarias, mas tambem a de fazenda.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que o projecto de lei n° 20 vá ás commissões de fazenda e pescarias. = J. J. Rodrigues de Freitas.

O sr. Mello e Faro: — É me absolutamente indifferente o que a camara tenha de resolver sobre o adiamento proposto; entretanto, como o illustre deputado que acaba de sentar se, invocando o nome da commissão de commercio e artes, disse, que ella no seu parecer não tinha apresentado as rasões pelas quaes, segundo a opinião de s. ex.ª, devia mostrar-se a conveniencia do projecto, cabe-me na qualidade de membro d'essa commiasSo o dever de dar a s. ex.ª a explicação que pareceu desejar da parte d'ella ou pelo menos da minha parte como um dos seus membros e mostrar a s. ex.ª, que a commissão (pelo menos eu) deu aquelle voto com conhecimento de causa.

Sr. presidente, sabe V. ex.ª e a camara que a commissão de commercio e artes quando lhe é enviado qualquer trabalho, para dar parecer interlocutorio, tem de considerar a questão debaixo do ponto de vista do objecto especial do seu mandato. (O sr. Barros e Cunha: —Peço a palavra sobre o adiamento).

A commissão perguntou a si mesma se era de interesse que fossem exploradas as ostreiras naturaes que ha no paiz e é claro que a sua resposta não podia ser negativa.

Decidido este ponto, que é o que constitue o objecto da commissão do commercio e artes, não podia ella deixar de dar parecer favoravel, porque á commissão não cumpria nem cumpre tomar conhecimento das condições com que aquella concessão podia ter sido ou deixado de ser feita, pertencendo isto a commissão de outra natureza.

Mas não supponha a camara que eu faço estas observações para arredar de mim a responsabilidade, que porventura me caiba por ter assignado como membro da commissão de commercio e artes este parecer. Ao contrario, sabendo que havia alguns queixumes contra o projecto que ora pende da discussão desta camara, tratei de me informar sobre o modo como tinha sido feita a concessão a que elle se refere, e soube que fôra o mesmo de uma concessão semelhante das ostreiras naturaes do Tejo, que por. um contrato analogo foram entregues ao sr. dr. Bocage.

E certo que depois se fez uma concessão a outro cavalheiro, e que n'essa concessão se estabeleceu o concurso publico, no qual este cavalheiro aceitou a obrigação de pagar cinco mil e tantos reis por cada metro cubico, de, ostras que fosse exportada peço licença, para, chamar atenção da camara para uma pergunta que desejaria dirigir ao sr. ministro da fazenda, se s. ex.ª estivesse presente e vem a ser: qual o rendimento que s. ex.ª conta que o estado tenha de auferir d'estes cinco mil e tantos réis por cada metro cubico de ostras que tenha de exportar o cavalheiro a quem se fez aquella concessão.

Infelizmente s. ex.ª não está presente, mas não me sinto por isso embaraçado visto como das informações que pude colher, sei que o preço de cinco mil e tanto por Cada metro cubico de ostras exportadas, é tão exagerado que não ha hypothese de se esperar d'ahi a menor receita.

Se isto é assim, eu não sei que papel teria, a representar a camara se viesse aqui argumentar com um absurdo para embaraçar um contrato, que póde talvez não ser o melhor que se podesse fazer, que pôde talvez ser mau; mas que em todo o caso é um contrato que se refere a uma riqueza que estava, submersa, que ninguem tinha pedido, nem querido explorar, e que o governo entendeu que era de vantagem conceder, a quem pretenda tirar d'ella algum partido.

Taes foram as rasões por que, na qualidade de membro da commissão de commercio, entendi não dever hesitar em dar o meu parecer interlocutorio favoravel ao projecto.

Dada esta explicação, já vê o illustre deputado e meu amigo o sr. Rodrigues de Freitas, que a commissão, não obstante não ter tido nessa occasião a honra do voto favoravel de s. ex.ª, considerou esta questão.

S. ex.ª não assisou a este pequeno, colloquio que se trocou entre os membros da commispão, porque s. exª não esteve presente á reunião, ou por estar ausente ou talvez por ter tido motivos que o inhibiram de comparecer, de modo que s. ex.ª só assignou depois o parecer ha camara; mas nem por isso se segue que a commissão andasse com leveza; e assim tambem cumpre notar que, se no seu parecer se não alargou em considerandos, não foi porque não tivesse rasões que auctorisassem o seu voto.

Tenho concluido.

O sr. Secretario: — O requerimento a que se referiu o illustre deputado, o sr. Candido de Moraes, está ainda na Commissão de commercio, e por isso não posso satisfazer já ao requerimento de s. ex.ª, mas ámanhã será satisfeito.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Visconde de Chancelleiros): — Pedi a palavra por parte do governo, para dar algumas explicações á camara, com referencia á questão proposta do adiamento; dizendo duas palavras sobre os motivos que me parece que na opinião dos illustres deputados o determinam, mas sem desejar influir no espirito da camara, para a resolução que tenha a tomar sobre essa questão.

Creio que os illustres deputados, que propõem o adiamento, desejam acatar o direito de petição firmado n'essa representação, e salvaguardar os interesses da fazenda.

Parece-me que as explicações que posso dar em nome do governo, poderão influir um pouco no espirito de alguns dos illustres deputados, e resolver em termos mais resumidos a questão proposta do adiamento.

O illustre deputado, o sr. Rodrigues de Freitas, fallando a favor do adiamento, impugnou o projecto por o julgar contrario á liberdade da industria e á de. agricultura.

Permítta-me s. ex.ª que lhe diga que não compreendo, nem posso comprehender bem a força do argumento; porque regular o exercicio de uma industria é por forma alguma contrariar a liberdade, de industria; e, por este, projecto o que se faz é regular o exercicio da, industria da pesca das ostras. Mas isso mesmo já estava regulado ha tempo pelo regulamento de 15 de Dezembro de 1868, cujas disposições, em grande, parte se acham neste contrato; e não, pelo, menos pelas informações, que pude colher, não cheguei a Conhecer que contra esse regulamento se tivesse protestado ou reclamado.

Ora, se assim é, se ninguem nesta casa ainda se levantou contra esse regulamento, não comprehendo as rasões

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que se apresentam contra este contrato, a não se lhe dar uma interpretação muito diversa d'aquella que na realidade elle tem.

Disse, por exemplo, o illustre deputado o sr. Rodrigues de Freitas que este contrato, cuja sancção legislativa se pede á camara, prohibe uma industria de que muita gente vivia e ía de encontro aos interesses da agricultura. Da agricultura! Mas da agricultura, porque?

(Interrupção.)

Perdôe-me o illustre deputado, julguei ter sido s. ex.ª quem viu em alguma das considerações d'este contrato uma offensa directa aos interesses da agricultura. Não insisto porem no argumento, cuja significação mal pude coroprehen-der.

Sr. presidente, determinam alguns dos illustres deputa dos a rasão do adiamento pela conveniencia, ouvida a commissão de fazenda, de sujeitar á apreciação de mais algumas commissões o projecto em discussão e as representações que contra elle se têem dirigido á camara. Creio que é regular que a camara deseje ouvir, para sua illustração, o voto de taes commissões; muitas vezes porém este recurso significa um adiamento indefinido da questão, e não será de certo com este intuito que a camara o approvará.

Tambem se pediu para illustração do debate um requerimento feito á camara na sessão passada pelo sr. Bernardo Machado de Faria e Maia. Creio que o fim d'este pedido seria provar á camara que o governo, adjudicando por concurso aquelle individuo duas zonas de terreno para estabelecimento de ostreiras artificiaes, pagando por cada metro cubico de ostras que exportasse 5$020 réis por metro, deveria ter, para quaesquer novas adjudicações, adoptado sempre o principio do concurso, e a base de licitação sobre o quantum do imposto de exportação. Devo porém declarar á camara que esse mesmo facto prova que tal systema se não devia seguir nas futuras adjudicações. E lembro aos illustres deputados que protestam contra o monopolio, que quaesquer novas adjudicações nos termos d'esta a que me acabo de referir, dariam em resultado o monopolio de facto, constituido a favor do concessionario do contrato primitivo de 10 de agosto de 1867, e que o foi tambem sem concurso. E a rasão é simples. N'aquelle contrato estabelecia-se que por cada metro cubico de ostras que exportasse pagaria ao estado o concessionario o imposto de 180 réis. Se pois o concurso para novas adjudicações desse ao quantum do imposto de exportação mais do que poderia fixar a justa concorrencia com o primeiro concessionario, o resultado seria, como diz o parecer, que os licitantes poderiam desviar da praça, offerecendo lanços exagerados, todos os concorrentes serios; e isto tanto mais facilmente, quanto é certo que á falta de sancção para o não cumprimento do contrato, nada perdia o concessionario não o cumprindo. Assim com effeito o concurso podia não ser n'estas condições o meio mais seguro a empregar para garantir os interesses do estado nas novas adjudicações.

Desde que aberta a praça, os licitantes que não incorrem em nenhuma responsabilidade por elevar exageradamente o preço da licitação, se não arreceiam de que a adjudicação que em taes condições lhes seria onerosissima, lhes imponha pelo não cumprimento d'essas condições uma pena qualquer, o concurso é, ou pelo menos póde ser, uma illusão e uma burla.

Por estes motivos, como inculca o relatorio que precede a proposta de lei que se discute, é que o governo se decidiu a fazer esta nova adjudicação sem consulta. E creio que isto não significa que o governo condemna o principio de concurso, significa que nas condições em que o primeiro contrato collocava os licitantes, e este primeiro contrato o de 1867 tambem se havia celebrado sem concurso, melhor seria determinar por outras regras a nova adjudicação. Que regras, porém, foram essas, pergunta o illustre deputado. Foram as que constam do parecer. Em igualdade de circumstancias preferiu o individuo que tinha a prioridade do requerimento e que pedia a adjudicação de maior área de terreno.

E com effeito em igualdade de circumstancias qualquer pequena condição poderá determinar uma rasão de preferencia. O illustre deputado sabe com quantos argumentos de paridade eu poderia dar a esta asserção o maior tom de auctoridade. Não vale porém a pena insistir sobre este ponto. Deverei, porém, declarar ainda, que a maior ou menor área de terreno comprehendida n'estas adjudicações não é de certo uma questão indifferente. Nem isto significa tambem que em toda a extensão da área concedida se encontrem bancos de ostras, ou que as vantagens para o concessionario estejam na rasão directa da extensão da área que lhe é adjudicada.

Como um dos illustres deputados desejou conhecer a cifra da exportação das ostras depois da adjudicação feita ao sr. Bocage, e creio que é a esta adjudicação e não á que foi feita ao sr. Faria e Maia que s. ex.ª se refere, direi que o que consta de uma nota que tenho presente com relação ao de 1869, é que n'esse anno o valor das ostras exportadas em navios portuguezes foi de 364$000 réis, e em navios estrangeiros de 1:528$500 réis, e a importancia do direito de 180 réis por cada metro cubico de ostras foi de 42$758 réis.

Concluo, sr. presidente, pedindo aos illustres deputados que tenham em vista as disposições do regulamento de 15 de setembro de 1868, e que as cotejem mesmo com as disposições do contrato em discussão. Creio que aquellas, mais ainda do que estas, poderiam ter provocado as representações que á camara se têem dirigido contra o projecto em discussão.

São estas as considerações que entendi dever apresentar á camara, e tomarei de novo a palavra quando seja necessario fazer por parte do governo qualquer outra declaração.

O sr. Candido de Moraes: — Se a camara considerasse o requerimento feito pelo concessionario de uma empreza analoga áquella cuja concessão se discute agora, a leitura d'esse requerimento equivaleria a uma proposta de adiamento do projecto de que se trata, porquanto a petição feita por aquelle cavalheiro era para que a camara não examinasse primeiro o contrato que agora se discute, mas que tomasse em consideração o que primeiramente fôra celebrado; e que seguindo-se a ordem natural devia ser apresentado á apreciação do parlamento em primeiro logar do que este, cujo adiamento foi agora proposto.

Ouvi o que o sr. Mello e Faro disse relativamente ao modo por que a commissão de commercio e artes tinha encarado a questão de que se trata, e parece-me que aquella illustre commissão, tratando de manifestar a sua opinião sobre esse ponto, se conservou perfeitamente nos limites das suas attribuições (apoiados).

Perguntou-se se seria conveniente fomentar o desenvolvimento de uma industria, e a commissão de commercio não podia, sem falsear a sua missão, responder de uma maneira differente d'aquella que respondeu, disse: «o desenvolvimento d'esta industria seria conveniente para o desenvolvimento da riqueza do paiz» naturalmente responderia similhantemente a respeito de qualquer outra industria.

Porém o que me não pareceu igualmente opportuno foi o declarar o sr. Mello e Faro que, parecendo-lhe exagerado o imposto de 5$020 réis que o concessionario Bernardo Machado de Faria e Maia tinha aceitado sobre cada metro cubico de ostras, lhe parecia que um tal contrato não offerecia a garantia de seriedade.

O sr. Mello e Faro: — Não disse isso.

O Orador: — Então percebi mal, e retiro o argumento como resposta ao illustre deputado.

Mas argumentou-se já com o facto de ser excessivo o imposto em relação á materia sobre que recaía, e foi o argumento de que se serviu o sr. ministro das obras publicas, quando disse que o principio da licitação não offerecia toda

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a garantia para se levar á realidade o fomento de uma industria importante como esta.

Não posso concordar com s. ex.ª n'este ponto, porque não está demonstrado que o concessionario Machado não possa proceder á exploração das ostreiras, e não possa auferir lucros, pagando como compensação pelo monopolio que exerce sobre a exploração d'esta industria a quantia que elle julga estar nas circumstancias de pagar. E em segundo logar nós não temos que examinar o quantum d'este imposto em relação ao preço por que as ostras são vendidas aqui, ou em outra qualquer localidade do reino.

As circumstancias são diversas, porque a exportação das ostras faz-se para Inglaterra, para França, para a Belgica, e em geral para o norte, e n'esses paizes o preço póde reputar-se muito superior ao preço d'ellas.

O sr. Presidente: — Lembro ao sr. deputado que está em discussão só o adiamento.

O Orador: — O sr. Rodrigues de Freitas propoz o adiamento para o projecto ser submettido ás commissões de fazenda e de pescarias; e eu entendo que a commissão de fazenda deve ser consultada sobre este projecto, por causa do imposto que se fixa em um dos artigos do contrato.

Estou portanto manifestando as minhas duvidas em relação á exiguidade ou demasias d'este imposto, e portanto justificando a necessidade que tenho de ser informado pela commissão de fazenda.

Em todo o caso parece-me conveniente ouvir a opinião da commissão de fazenda, bem como a de pescarias, porque confesso que não estou habilitado para dizer toda a influencia que o contrato que se discute póde exercer sobre o desenvolvimento d'essa industria. Por outra parte tambem me declaro em circumstancias menos proprias para examinar se o imposto que se lança sobre esta industria é ou não conveniente, ou se pecca por exiguo, como parece a alguns cavalheiros que têem assento nesta camara, ou por exagerado, como pensam outros.

O que me parece conveniente, e o que justifica o adiamento é não só a necessidade de serem ouvidas as commissões de fazenda e pescarias, mas tambem porque existem individuos a quem o governo concedeu o exercicio d'essa industria em circumstancias estipuladas por um modo qualquer que não posso apreciar; e não me parece justo que se anteponha um contrato d'esta natureza a qualquer outro. A camara deve considera-los conjunctamente, porque podem ser mesmo contradictorios, ou incompativeis as condições de uns com as dos outros.

Por estas rasões votarei o adiamento; se não tiver mais esclarecimentos mesmo sobre o assumpto que se discute, votarei contra o projecto.

O sr. Faria Guimarães: — A commissão de commercio e artes deu o seu parecer muito laconico, porque o governo tinha exposto extensamente os motivos que o levaram a fazer esta concessão, e porque já em contrato identico, em 1868, tendo sido ouvidas as commissões de marinha e obras publicas, em seus pareceres desenvolveram o assumpto de modo que não deixou á commissão actual logar para lhe dar novo desenvolvimento.

Portanto sendo este contrato celebrado em condições identicas ao que foi celebrado em 1868 com o sr. dr. Bocage, entendeu a commissão que estava no caso de ser igualmente approvado; depois appareceu aqui um requerimento, a que se referiu o sr. Candido de Moraes, de Bernardo Machado, pedindo que se não approvasse este contrato sem ser approvado igualmente outro que tinha sido celebrado com elle. Em consequencia d'isso, creio eu, o governo mandou para a mesa o contrato celebrado com Bernardo Machado para ser igualmente approvado. Sobre esse contrato ainda a commissão não deu parecer, nem foram ouvidas outras commissões, nem sei se será preciso.

Se a commissão de commercio deve dar parecer sobre o contrato do sr. Bernardo Machado antes de se votar o do sr. marquez de Niza, é uma cousa que a camara póde resolver; mas talvez não haja necessidade, porque um não prejudica o outro. Mas como se referiram a esse contrato entendi do meu dever dizer isto aqui na camara, a commissão examinará e dará parecer.

Na questão de adiamento nada direi, a camara resolverá como entender.

Em 1868 foram ouvidas as commissões de marinha e obras publicas. Aqui estão os pareceres que podem ser consultados pelos illustres deputados, para verem que essas commissões foram de opinião que o contrato era de vantagem publica, e creio que até agora não tem havido ninguem a reclamar contra elle.

Limito a isto as observações que tinha a apresentar, e se a camara resolver que o projecto seja enviado ás commissões de pescarias e de fazenda, tambem o será a proposta relativa á concessão feita ao sr. Bernardo Machado.

O sr. Adriano Machado: — A minha moção de ordem é a seguinte (leu).

A materia de que nos occupâmos é importantissima. Trata-se de uma industria que em algumas nações produz valores espantosos. Nos Estados Unidos o consumo annual das ostras é avaliado em 20.000:000 bushels americanos, 704:800 metros cubicos, orçados em 20.000:000 de dollars ou réis 18.700:000$000. Em Londres gastam-se 155:000 bushels imperiaes, 5:633 metros cubicos no valor de 450;000$000 réis. Só uma companhia, a Whitstale Oyster Company, em 1859, vendeu 62:000 libras esterlinas. D'esta quantia 50:000 libras eram o preço das ostras de creação artificial ás quaes os inglezes muito impropriamente chamam nativas. Não ha rasão nenhuma para suppor que entre nós se não possam conseguir iguaes resultados. As nossas leis, porém, não são sufficientes. Precisámos de uma legislação acommodada ás necessidades especiaes d'esta industria.

Se fizermos essa legislação depois de approvado este projecto, os beneficios d'ella virão tarde para o grande espaço que se trata de conceder a um só individuo. Desde Lagos até ao Guadiana, 115 kilometros! Mais, desde Mira até Ovar, 50 kilometros! E ainda a lagoa de Obidos, cuja superficie é de muitos hectares!

Façamos, pois, a lei a tempo de acudir ás 33 leguas de costa ameaçadas pelo presente contrato. A isto se propõe a minha moção, e com ella teria prevenido, se a palavra me houvesse tocado mais cedo, um dos argumentos do sr. ministro das obras publicas.

Disse s. ex.ª, defendendo o contrato, que elle está feito em harmonia com o regulamento de 15 de dezembro de 1868 contra o qual ninguem reclamou. É verdade; mas a minha proposta vem reclamar contra o proprio regulamento.

As concessões devem fundar-se em bases muito diversas das d'este contrato. N'elle ha só duas clausulas que parecem a favor do publico, mas que não o são.

A primeira é a que obriga o concessionario a pagar 180 réis por metro cubico que exportar. Isto, porém, não é um encargo que se lhe impõe: é uma nova concessão que se lhe faz. Equivale a dizer que o parlamento renunciando ao seu direito constitucional de determinar os impostos, se obriga a não tributar o metro cubico exportado com um direito superior a 180 réis, que é nada em relação ao preço do genero, que pois não vale só 5$020 réis como parece te-lo asseverado o illustre deputado o sr. Mello e Faro...

O sr. Mello e Faro: — Eu não disse que valia tão pouco: disse que o direito de 5$020 réis era exagerado.

O Orador: — Portanto ouvi mal; mas o que é verdade é que o direito de 180 réis estipulado no presente contrato é insignificante. Não digo isto por entender que deva ser elevado, mas para mostrar que esta clausula é a favor do concessionario e não a favor do publico, e contra o poder que a lei dá ao parlamento de lançar impostos independentemente de qualquer convenção, attendendo por um lado ás necessidades da fazenda, e por outro lado ás conveniencias da industria e do commercio.

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A segunda clausula que parece a favor do pubfieo é aquella em que o concessionario se obriga á ter no fim de tres annos um estabelecimento destinado á engorda das ostras; mas esta clausula pouco ou nada vale pelos termos vagos em que está concebida, e por não ser acompanhada de sancçâo nenhuma, sancção ha verdade muito difficil de estabelecer de um modo efficaz, emquanto não for alterada a base da concessão.

Se o Concessionário não fundar as ostreiras dentro de tres annos, serão tres annos perdidos para a industria e elle não perde nada.

Já assim não aconteceria se as concessões se limitassem a dimensões rasoaveis e se fossem feitas mediante arrendamento em hasta pública. Para não se exporem a perder a renda, os licitantes cuidariam de ver se podiam dispor dos capitães necessarios para a exploração, e o adjudicatario faria por aproveitar quanto antes o espaço que houvesse arrematado.

Não discuto o contrato que não está por ora em discussão, ainda que não teria duvida em o rejeitar desde já! As poucas observações que fiz, têem só por fim mostrar como releva encetar um caminho novo, e ver se aproveitamos a occasião de dotar o paiz com uma lei favoravel ao desenvolvimento de uma industria que promette muito.

Seria inopportune desenvolver agora as bases d'essa lei. A commissão de pescarias, illustrada pela exberiencia dás nações mais adiantadas, e conhecedora das circamstancias do paiz, é competente para nos apresentar úm trabalho digno d'ella e da camara. lato peço na proposta que vou mandar para a mesa.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta de adiamento

Proponho que seja encarregada a commissão de pescarias de formular um projecto de lei ácerca da ostricultura, sobreestando-Se na discussão do projecto n.º 20. = Adriano Machado.

Foi apoiado o adiamento.

O sr. Presidente: — Não sei se a camara quererá que estas duas propostas de adiamento, que são independentes uma da outra, se discutam conjunctamèhte.

Consulto a camara a este respeito.

A camara resolveu affirmativamente.

O sr. Pinheiro Borges: — Eu fui prevenido pelos meus illustres collegas, os srs. Marques Pires e Rodrigues de Freitas, na apresentação da proposta de adiamento, e vou expender às rasões que Se apresentam ao meu animo para á approvar.

O illustre relator da commissão, o sr. Faria Guimarães, ha pouco tempo que veiu justificar um dos meus argumentos.

Disse s. ex.ª que a commissão de commercio é artes tinha dado um parecer muito laconico sobre este contrato, e expoz as rasões d'isso; mas a par d'este laconismo do parecer féis muita impressão no meu animo uma circumstancia que ainda se não considerou.

A commissão de commercio e artës é composta de sete membros e tem como aggregado o sr. Rodrigues dê Freitas, cavalheiro muito entendido em materías economicas. Ora, eu julgo que estando o parecer apenas assignado por tres membros da commissão, e tendo o sr. Rodrigues de Freitas assignado vencido o parecer não tem maioria.

Alem d'isto pelas representações que vieram a esta camara, nota-se haver um queixume contra este projecto com relação ao monopolio de exploração das ostras. Eu perguntei a alguns dos illustres signatarios do parecer se a commissão tinha tido conhecimento d'essas representações, e elles responderam-me que fito.

Há pouco tempo, visitando eu o litoral do Algarve, ouvi tambem queixume Contra este projecto. Por consequencia parece-me haver interesses offendidos, é não só interesses offendidos em relaçfto aos individuos que hoje sé empregam na exploração e commercio das outras, mas tambem dos individuos que, em certas epochas do anno, costumam estabelecer armações de pesca em differentes partes do litoral.

Portanto, tratando se de estabelecer um monopolio da exploração das ostras, parecendo haver interesses offendidos, existindo na camara algumas representações a este respeito, estabelecendo o projecto um certo imposto; por tudo isto entendo que devem ser ouvidas sobre este assumpto as commissões de pescarias e fazenda, e isto alem das considerações feitas pelo meu illustre collega, o sr. Adriano Machado, pois tambem eu tenho minhas apprehensões de que este projecto vá embaraçar a fiscalisação das costas.

Creio que todos estes motivos bastam para apoiar a proposta de adiamento, proposta que eu já tinha redigido quasi nos mesmos termos em que foi apresentada pelo sr. Rodrigues de Freitas. Se o adiamento for approvado, reservo-me para quando o projecto vier de novo á discussão fazer algumas considerações; mas desde já declaro que o rejeito no caso do adiamento não ser approvado.

O sr. Barros e Cunha: — Está unicamente em discussão se é Conveniente que se adie este projecto para serem ouvidas as commissões de pescarias, agricultura e fazenda e outras mais que o sr. deputado por Ovar pede que sejam consultadas, e tomarem conhecimento das representações que foram enviadas á camara, depois d'este contrato ter sido submettido á sua apreciação, a fim de que, instruindo o parlamento a respeito dos direitos que se dizem offendidos, possa deliberar com perfeito conhecimento de causa. Tem-se discutido porém, não só o adiamento, mas o contrato em s¡, as suas conveniencias e inconveniencias, os direitos offendidos, as condições em que ficaram um e Outro concessionario, a concorrencia de concessões que não foram ainda apresentadas á camara, mas que estão descansando no seio da commissão de commercio e artes; emfim muitas outras cousas com as quaes me parece que não devo prender a attenção dos meus collegas n'este momento.

Fez-se uma concessão para estabelecer ostreiras artificiaes, como exclusivo de exportação, mediante um certo imposto por metro cubico ao sr. dr. Bocage. Muitas considerações entraram na mente dos legisladores quando approvaram aquella concessão, sendo uma d'ellas que aquelle monopolio, limitado em tempo e restricto a certos bancos do Tejo, tinha por fim desenvolver uma industria, que entre nós estava apenas no estado natural, porque assim se podia considerar a exploração das ostreiras naturaes. Mas uma das considerações mais importantes que actuou na mente de muitas pessoas, que deram a sua approvação aquelle contrato, foi ser a concessão feita a um professor que pelos seus conhecimentos especiaes de embryologia, estava no acaso de estabelecer quasi como um instituto de ostricultura, dar lições aquelles que eram inscientes, e acordar a indifferença dos especuladores para com esta industria que julgavam de pouca utilidade.

Sem duvida a concessão feita ao digno par o sr. marquez de Niza, considerada unicamente debaixo do ponto de vista da sua competencia pessoal, não era menos rasoavel nem menos adequada do que a que se fez ao sr. dr. Bocage.

Todas as pessoas que conhecem a completa educação do digno par e a sua variadíssima instrueção, me não chamarão exagerado.

Todos sabem as variadas aptidões e gosto do digno par. Quando elle quiz fazer agricultura, fê-la a mais perfeita. Quando tratou de fazer caudelarias, apresentou admiraveis exemplares que obtiveram os primeiros premios, e ainda hoje os cavàllos que se querem recommendar, pela genealogia, vão buscar certidão ao livro dos costados das caudelarias, considerados como dos mais perfeitos e que o digno par estabeleceu.

Mas não tenho a decidir-me aqui pelas considerações pessoaes que podiam actuar no meu espirito, seja em relação á qualidade especial das pessoas, seja aos interesses industriaes; ou lucros do fisco sobre o assumpto que se trata,

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seja em relação ás minhas affeições pessoaes. Se tivesse de me decidir por estes motivos, declaro desde já á v. ex.ª que approvava o contrato que está sobre essa mesa.

Decido-me por outras rasões, regulo-me por outros principios.

Sr. presidente, sou contra todos os monopólios, contra todos os exclusivos, contra toda a restricção que se possa oppor ao exercicio livre de qualquer industria, seja qual for a conveniencia ou fundamento, que se pertenda exhibir para a desculpar (apoiados).

Tudo quanto tende a regulamentar, dirigir, encadear a liberdade e actividade do homem em assumptos industriaes, commerciaes, ou productos da intelligencia é-me repugnante e antipathico!

N'esta questão porém represento especialmente os interesses de uma provincia na qual vinte ou trinta mil familias vivem da industria da pesca, e é em nome d'ellas, que não têem de certo grande protecção nas nossas leis fiscaes (O sr. Eduardo Tavares: — Apoiado), que não têem outro capital senão a vida, que tomo a liberdade de fazer á camara considerações muito succintas.

Principiarei por dizer que os povos do litoral do Algarve não foram privados do uso em que estavam de pescar, comer e exportar ostras!

Eu não estou convencido de que o regulamento á que alludiu o meu illustre amigo, o sr. ministro das obras publicas, publicado em 18 de dezembro de 1868, 6 já em execução, possa offender nenhuma das indústrias da pesca em geral, nem a pesca das ostras em particular, como me parece que sé póde deprehender dá reflexão que s. ex.ª apresentou de que não tendo os povos reclamado contra elle, auctorisava o governo a vender, arrendar, ou contratar monopolios.

Este regulamento tem por fim determinar as epochas em que as ostreiras devem ser exploradas, e as condições da exploração; porque de Certo não é justo no que pertence á pesca e á caça, que os destruidores d'estes elementos de riqueza e alimentação publica abusem do direito do mais forte, Ou do mais esperto, como lhe qüizerem chamar, para prejudicarem o seu desenvolvimento e o seu progresso.

Por consequencia, se a concessão que se faz tem unicamente por fim restringir o modo e a epocha em que se devem pescar ostreiras, em que se deve tirar o Cascabulho, que assim se chamam as ostras pequenas que são pescadas e levadas para a engorda nos deltas dos rios, e nos quintaes qüe estão juntos dos moinhos que têem agua por motor, não me parece que haja objecção a oppor-se-lhe. Ainda porém n'esse sentido acho melhor a proposta apresentada pelo meu amigo, o sr. Adriano Machado, porque estes artigos do codigo civil que tratam das cousas de uso commum, não só a pesca mas tambem a caça, precisam de regulamentos muito pensados e muito explicitos para impedir que alguns abusem da propriedade que é de todos.

Acontece porém que n'esta concessão das ostras ha mais do que isso, ha o exclusivo da exportação dás ostras, e por consequencia á offensa de direitos adquiridos, porque üo Algarve já se engordam ostras ha muito tempo ë já d'ahi são exportadas. É isto o que se me diz. Eu não posso garantir á camara que está seja exactamente a verdade, mas é o que se diz e é isso o que me obriga a fallar para pedir que se examinem as representações (apoiados).

No litoral do Algarve, a que se refere esta concessão; nas deltas dos rios, nos sítios onde ha moinhos, cujo motor é a agua, é nos pontos em que a ondulação dá maré é menos sensivel ha ostreiras que são largamente exploradas, ha parques servindo pára á engorda das ostras, e tão abundante é a producção que, muitas vezes, vem com outros ramos da pesca nas redes, e d'ahi são exportadas para Cadiz, Gibraltar, etc. entrando tambem n'uma parte müíto importante da alimentação das classes pobres, que este contrato, no monopolio proposto, restringe.

Sendo assim, e não se póde duvidar de que o é, depois dos commentarios, é contra o § 2.° da artigo 145.º da carta constitucional, e contra á § 23.° do mesmo ar-tígo 145.º privar os individuos que exercem aquella industria do direito de continuarem a exerce-la, o que é Sobre maneira injusto, principalmente quando consta que alguns d'ésses individuos já fizeram rejeitar o uso em que estão de ha muitos annos de exportarem ostras e ameijoas, exploração é industria que o monopolio que se propõe viria perturbar e destruir.

(Havia susurro na sala.)

Peço a v. ex.ª a bondade de manter na assembléa a ordem possivel, a não querer v. ex.ª, como creio que não quer, que eu consuma aqui a pouca vida que tenho, sendo obrigado a gritar para me fazer ouvir, ou que abandone então a defeza dos interesses individuaes, que podem ter compromettidos, calando-me e sentando-me, ou indo-me embora.

O sr. Presidente (tocando á campainha): — Peço ordem, para se poder ouvír o orador.

(Restabeleceu-se o silencio.)

O Orador: —Eu sei de dois pontos na parte da costa onde a empreza se quer estabelecer, entre o» quais existe exactissimamente uma continuidade de bancos calcareos que são os proprios para as ostras se crearem, e nos quaes effectivamente se criam as mais saborosas que podem servir para os usos culinários. Esses bancos vão de Lincão até Casella, e internando-se bastante pelo mar. Em todos esses pontos onde se criam ou podem crear as ostreiras, criam-se simultaneamente outros artigos da pesca. Ora, como ha concessão feita ao digno par do reino, o Sr. marquez de Niza, se não determina a facha da latitude até á qual a sua empresa póde alargar o privilegio, segue-se que o direito que se lhe dá, para que proceda nos termos conducentes a evitar que o seu exclusivo possa ser perturbado, poderia, a não se tomarem as devidas cautelas, trazer gravissimos inconvenientes pára as outras industrias da pesca. E o meu fim é unicamente pedir ao parlamento que tenha em toda a consideração regular e acautelar os direitos dos pescadores, pára que não sejam prejudicados por está concessão.

Por ultimo hão posso de maneira nenhuma deixar passar sem que a contrarie, no que se refere ás costas do Algarve, uma proposição que se avançou aqui, e é que as ostreiras eram uma riqueza submersa!... Riqueza submersa!... Esta proposição foi talvez apresentada, sem que a a pessoa que a avançou tivesse antecipadamente pensado se isto Se podia dizer. As ostras, como todos os productos da pesca são do uso commum. E de todos os artigos da pesca são dos moluscos menos submersos.

Não direi mais. Deixo á eloquencia conhecida do reverendissimo representante de Ovar, que mandou á proposta de adiamento para a mesa, justifica-la como é mister, e acrescentar as rasões, que expuz, no interesse dos povos ao Algarve, as noticias é informações que ella cautelosamente de certo reservou sobre os interesses qúé n'este negocio estão commettidos á sua solicitude, e que eu não quero preterir. Pretence lhe esse encargo de que estou certo se desempenhará melhor do que eu o poderia fazer.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Quasi não precisava usar da palavra, visto que só está em discussão o adiamento; comtudo, como o sr. ministro das obras publicas, respondendo ás breves reflexões que fiz, se dignou apresentar á sua opinião acerca do contrato, farei por mostrar, tanto quanto me é possivel, que as rasões adduzidas por s. ex.ª não provam quanto s. ex.ª avançou.

Antes d'isso referir-me-hei ao que observou o sr. Mello e Faro na qualidade de membro da commissão de commercio e artes.

S. ex.ª disse que a commissão unicamente considerava que a cultura das ostras, ou estabelecimento de matreiras artificiaes e reservatórios de engorda, era de conviniencia para o paiz e que por isso não punha divida nenhuma na approvação do contrato.

Devo porém lembrar á camara, que nenhnma outra commissão foi ouvida a este respeito. Não se tratava de elabo-

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rar um parecer interlocutorio, mas sim definitivo, e unico sobre este objecto. A commissão diz simplesmente:

«A concessão de que trata a mencionada proposta, acha-se por tal modo fundamentada no relatorio que a acompanha, que a commissão se limita a propôr que seja approvada ».

Este parecer, como v. ex.ª vê, diz sómente que o governo apresentou um relatorio suficientemente esclarecido, mas não avalia os argumentos, não nos diz nada de novo, e remette-nos, portanto para o sobredito relatorio.

Quando eu propuz que este projecto fosse a outra commissão (e devo lembrar com toda a franqueza ao sr. ministro das obras publicas, que não tem rasão para duvidar da sinceridade da minha proposta), não tinha o menor proposito de retardar a discussão d'este assumpto. S. ex.ª disse que se tinha proposto que este projecto fosse á commissão e agricultura, á commissão de administração, á commissão de fazenda e a outras commissões, ás quaes é costume mandar os projectos que se não querem discutir. Peço licença a s. ex.ª para lhe dizer que não posso aceitar estas I palavras. Creio que o nobre ministro não desejava offendei aquelles que tinham proposto o adiamento, mas, á falta de rasões, lançou mão do primeiro expediente que lhe appareceu.

Conheço a posição delicada de s. ex.ª que, sendo agora ministro das obras publicas, precisa mostrar-se solidario com o governo n'esta questão; mas não sei se s. ex.ª estará de accordo com as infelizes doutrinas defendidas no relatorio que precede este projecto.

S. ex.ª diz: «Não se faz senão regular o exercicio d'esta industria, e levantar-se alguem contra este projecto (que estabelece um monopolio), é o mesmo que inhibir que se regule o exercicio d'esta doutrina».

Este argumento é bom para os que gostam das dictaduras e dos governos absolutos; esses asseveram que as dictaduras e os governos absolutos têem par fim regular o exercicio da liberdade. Parece-se isto com as celebres leis de liberdade de imprensa, que dizem no primeiro artigo que todos podem publicar jornaes, mas que logo no segundo artigo estabelecem taes disposições restriotivas, que poucos se atrevem a escrever e publicar periodicos.

O tal exercicio da liberdade da industria de que s. ex.ª nos fallou não é mais nem menos que o monopolio; e é novo dizer-se no parlamento que se vae regular o exercicio da liberdade de uma industria, estabelecendo o exclusivo do ramo de trabalho cuja liberdade se quer regular. E um argumento novo, e eu declaro que fiquei surprehendído com elle, e que não achei argumentos para lhe contrapor.

Para defeza d'este projecto se produzem notaveis doutrinas; em primeiro legar, o monopolio é a liberdade; e em segundo logar, o concurso é um meio excellente, menos para esta casa, porque n'elle, o concurso vae affectar todos os individuos que podem dar garantias, e obriga a aceitar a proposta d'aquelle individuo que não dá garantias nenhumas.

A doutrina de s. ex.ª é esta; mas eu confesso que não sei quaes são as rasões que s. ex.ª teve para fundamentar esta asserção. É facil proferi-la, mas é difficil sustenta-la.

Já o meu illustre amigo e mestre, o sr. Adriano Machado, muito bem disse a tal respeito, que n'este contrato não ha garantia alguma; e comtudo o sr. ministro parecia affirmar que havia todas as seguranças desde o momento em que não se desse o concurso.

Lendo este contrato, debalde procuro onde estão as garantias. Simplesmente se diz que durante tres annos ha de o concessionario estabelecer um reservatorio de engorda. Nada mais.

Se porventura o concessionario não cumprir estas condições, o contrato deixa de subsistir; mas não ha pena imposta por este facto.

Se o contrato não for cumprido, não haverá prejuizo para o estado, ainda quando se adopte a doutrina do monopolio, contra a qual eu me declaro? Parece-me que ha um prejuizo, e vem a ser que não podemos durante tres annos contratar com outro, por conseguinte deixámos de aperfeiçoar a cultura das ostras, sobre a qual o sr. ministro funda muitas esperanças de augmento de riqueza publica.

O governo diz o seguinte no relatorio:

«A licitação dá margem a que se possa sophismar o justo intuito com que ella se estabeleceu. Os licitantes podem desviar da praça concorrentes serios, offerecendo lanços exagerados.»

Tambem me parece pouco conveniente que venha dizer-se no parlamento, e por parte do governo, que os individuos

Que concorreram para pedir esta concessão não têem granes habilitações para cumprirem o que promettem. Sei que pela mente do sr. ministro não passou nem a sombra de intenção de offender os requerentes; mas noto a s. ex.ª que desde o momento em que se diz «que não houve concorrentes dignos» são offendidos todos os concorrentes. Sei que s. ex.ª não os quiz molestar.

(Interrupção do sr. ministro das obras publicas que se não percebeu.)

O que o nobre ministro acaba de dizer é a prova do que eu tinha avançado. Diz s. ex.ª «não me referi de modo algum ás qualidades dos requerentes»; pois se s. ex.ª não se referiu ás qualidades d'esses individuos, como é que no relatorio d'este contrato se diz que o concurso não dá garantias, e que os licitantes desviam os concorrentes serios? Desde o momento em que se diz que tal systema não offerece garantias, affirma-se que os concorrentes não as apresentaram, e não são pessoas em quem devamos confiar. Não menos do que isto é o que se encontra no relatorio, embora eu reconheça que não seja essa a intenção de s. ex.ª Esta é a verdade. Essas são as rasões infelizes d'este infelicíssimo relatorio.

Disse tambem s. ex.ª que as representações não vieram na occasião em que se publicou o decreto que regulou a ostricultura.

Se s. ex.ª ligaria muita importancia ás representações no caso de terem vindo na occasião da promulgação do decreto, qual a rasão por que não dá importancia áquellas que se têem apresentado contra este contrato?

Eu não sei, sr. presidente, se essas representações são de data anterior ou posterior ao parecer da commissão de commercio e artes. Não sei mesmo se foram consideradas por essa commissão; mas se ella não teve occasião de as estudar, mais uma rasão para que o projecto se mande ás commissões a que ha pouco me referi. Não quero que elle fique lá esquecido, porque sou o primeiro a opinar, que a camara deve vota-lo o mais brevemente possivel, ainda que depois de ouvir as commissões respectivas; porque, segundo as condições 2.º e 8.º o concessionario deve ter no fim de tres annos, em plena actividade, um reservatorio de engorda; e esses tres annos começaram a correr em 23 de novembro de 1870.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda feira é a continuação do projecto n.º 20, o projecto de lei da commissão de guerra relativo aos sargentos quarteis mestres, e o parecer da commissão de administração publica sobre a auctorisação pedida pela camara municipal de Figueiró dos Vinhos relativamente a um pedido que lhe foi concedido para estabelecer as repartições publicas, e se houver tempo trabalhos em commissões.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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