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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ropeu, e é necessario que estejamos preparados para isso. (Apoiados.)

Agora mesmo que se estão fixando as condições da paz, é de receiar, e com justo fundamento, que sejam feridos os interesses inglezes, e em tal caso ninguem ha na Inglaterra, nem o proprio sr. Gladstone, que tem combatido a intervenção, que se opponha á acção armada.

Quando isto aconteça, diga-me v. ex.ª e a camara em que situação ficamos nós?

Não quero discutir agora se temos ou não obrigação, pelos tratados de alliança offensiva e defensiva feitos com a Inglaterra, de dar-lhe um contingente no caso que ella venha a tomar parte na luta. Para mim é ponto muito duvidoso se temos ou não esta obrigação. Não tenho opinião assente sobre o assumpto. Mas quando pela força das circumstancias o governo entender que temos obrigação de dar um contingente militar, pergunto se o podemos fazer no estado actual do nosso exercito. Creio que não. (Apoiados.)

Sr. presidente, não ignora v. ex.ª, que ainda ha pouco tempo a imprensa hespanhola discutia qual devia ser a politica da Hespanha; assegurando que o ideal da Hespanha devia ser Marrocos, Gibraltar e Portugal.

Eu não tenho receio de que se realise esse ideal, principalmente estando no governo hespanhol um cavalheiro distinctissimo, respeitador sincero da independencia portugueza (Apoiados.) não tenho medo actualmente d'essa politica, mas póde a rotação constitucional levar ao poder cavalheiros profundamente desaffectos á independencia do nosso paiz.

E ha-os em Hespanha (Apoiados), ha em Hespanha muitos homens publicos que têem declarado, não só no parlamento, mas na imprensa, as suas opiniões completamente ibericas. (Apoiados.)

É preciso, portanto, estarmos prevenidos para tudo, e não é um governo fraco e incompleto como este, mas um governo forte e robusto, que póde na occasião opportuna conjurar todos os perigos. (Apoiados.)

Não tenho receios do actual governo hespanhol, disse e repito-o á camara, desejando que fique bem consignado, mas tenho receios do futuro, porque póde ser que homens profundamente desaffectos á independencia de Portugal venham a fazer parte do governo d’aquelle paiz.

Mas não é só isto.

Talvez que o nobre presidente do conselho de ministros entenda que nos devemos conservar indefezos, porque eu sei que ha muita gente no paiz que julga que isto são considerações completamente declamatorias, e que não têem applicação alguma a Portugal; mas é certo que o governo, pela sua imprevidencia na questão do Oriente, já prejudicou altamente os interesses da nação.

E sabe v. ex.ª onde foi que o governo prejudicou altamente os interesses do paiz? Foi na abertura da subscripção para o ultimo emprestimo. Se o governo tivesse aberto a subscripção em Londres e em París, antes de rebentar a guerra, outros de certo teriam sido os resultados. (Apoiados.)

E o governo não se devia deixar enganar a respeito da significação do protocollo de Londres de 31 de março. De todos os estadistas da Europa foi talvez o nobre presidente do conselho de ministros o unico que se deixou enganar por esse documento.

Ninguém acreditou que o protocollo de Londres de 31 de março fosse mais do que uma esperança de paz, e que podesse resolver a questão do Oriente.

Não admittindo o protocollo de Londres de 31 de março o principio de intervenção nas condições estatuidas nos tratados de 1856, e dispondo alem d'isso a cessão de uma certa parte de territorio ao Montenegro, o sr. presidente do conselho de ministros tinha obrigação de ver, que era impossivel que a Turquia acceitasse taes condições e que a guerra não rebentasse. (Apoiados.)

Todos viram isso. E sabe v. ex.ª porquê? Porque desde a independencia da Grecia até hoje o principio da interferencia das potencias, na administração interna da Turquia, é profundamente odiado n'este paiz e porque o sentimento nacional manifestado nas discussões do parlamento ottomano se oppunha tenazmente á cedencia do territorio.

Se o sr. presidente do conselho de ministros fizesse estas considerações, e tivesse aberto a subscripção entre a data do protocollo e a da declaração de guerra, teria evitado o perigo, teria aberto uma subscripção em condições muito mais vantajosas do que aquellas em que o fez, (Apoiados.) e teria feito uma excellente collocação do emprestimo. (Apoiados.)

S. ex.ª, porém, não o fez. S. ex.ª, que devia estar alerta sobre o que se passava na Europa, discutiu, como os padres de Bysancio, a questão theologica dos enterros, em quanto lá fóra nas ruas de París era arrastado o credito publico pelas mãos dos especuladores do emprestimo de D. Miguel. (Muitos apoiados.)

Sendo isto assim, sendo a situação da Europa o mais grave possivel, o que devia ter feito o governo? Devia ter feito o mesmo que fizeram os governos da Belgica, da Hollanda e da Dinamarca, pedindo ás camaras creditos para augmentar o armamento do exercito e desenvolver as fortificações do paiz, e não devia confiar unicamente na alliança das grandes potencias. (Apoiados.)

Tenho plena confiança na alliança com a Inglaterra.

A Inglaterra tem feito grandes serviços a este paiz, e grande foi o serviço que prestou, ajudando a implantar o systema liberal entre nós. (Apoiados.)

Mas muitas vezes a força das circumstancias é superior á vontade dos governos.

Alliada era a Inglaterra da Turquia, e as circumstancias têem até hoje impedido que ella lhe preste auxilio, e se a Turquia não tivesse tratado do seu armamento militar, se os seus meios de defeza não estivessem no pé em que os encontrou a Russia, de certo que o imperio ottomano já teria succumbido.

Creio profundamente nas allianças, e conheço as vantagens d'ellas, mas é preciso não confiar só no seu auxilio, mas applicar os recursos proprios para a defeza do paiz.

O que devia ter feito o governo para prover ás necessidades do paiz?

A sua primeira obrigação era, segundo penso, apresentar uma nova lei de recrutamento militar.

O governo tem nas repartições do ministerio do reino todos os elementos necessarios para a feitura d'essa lei. Comquanto eu seja em these pelo serviço militar obrigatorio, eu não queria que o governo viesse ao seio do parlamento apresentar a proposta de lei que assentasse n'aquelle principio, porque governar é transigir com as circumstancias e no nosso paiz ha uma repugnancia inveterada e tradiccional para o serviço militar; mas desejava que o governo apresentasse uma nova lei de recrutamento militar, estabelecendo um praso mais longo para o serviço activo, porque este serviço por tres annos é insufficiente. Não se póde fazer um bom soldado em tres annos de serviço effectivo; quando elle começa, póde assim dizer-se, a aprender os rudimentos da arte militar, cáe immediatamente na estagnação da reserva.

É preciso que o nosso paiz levante a sua organisação militar á altura em que se encontra nas nações estrangeiras.

Tenho ainda de chamar a attenção da camara para outros pontos.

O meu illustre amigo o sr. Thomás Ribeiro (illustre pelas suas qualidades e pelo seu talento) pediu ao governo que lhe enviasse todos os documentos relativos á questão hespanhola. É escusado dizer que o governo fechou-se na mais completa reserva diplomatica. E comtudo o sr. presidente do conselho declarou que a questão é simples. Eu tambem creio que é simples a questão, porque se limita á fixação das nossas aguas territoriaes, assim como a nação

Sessão de 23 de janeiro de 1878