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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Pretende o illustre deputado que n'este acto eu lesei o thesouro, porque deixava de confiscar o deposito d'aquella companhia, mas alem d'isso as obras que ella tinha feito. Honro-me com a accusação que o illustre deputado me fez, e comquanto seja verdade que combati tenazmente, e, já depois de approvada na generalidade e nos seus primeiros artigos, a proposta de lei para se conceder a isenção, por todo o tempo da exploração, á companhia dos caminhos de ferro do norte e leste, do imposto de transito, consegui reduzil-a; tambem é verdade que nunca combati que se concedessem á companhia os meios para ella completar a 5.ª secção.

Foi minha a proposta reduzindo a vinte e cinco os oitenta e oito annos que queriam conceder-lhe, porque entendi que os vinte e cinco annos de isenção do imposto eram o sufficiente para habilitar a companhia a realisar o acabamento da 5.ª secção, e no sentimento de toda a camara e do paiz se entendeu que devia ser-lhe concedida.

De nós todos, membros da opposição n'essa epocha, nem um só nunca poz em duvida que fosse equitativo auxiliar a companhia no acabamento da sua linha ferrea; mas, se isso então já estava no nosso sentimento, era do meu dever, depois de construido e aberto o caminho de ferro do Minho e Douro, tendo necessidade de ligar uma linha ferrea com a outra, não permittir que a companhia, que tão boa vontade mostrara de concluir aquellas obras, podesse soffrer, porque um caso de força maior a tinha impedido de as acabar no tempo determinado. Isto faço eu todos os dias.

São illegalidades que eu pratico todos os dias com todos os individuos empreiteiros de obras publicas, quando os directores das obras publicas das localidades informam favoravelmente, ou quando a junta consultiva se conforma com as representações d'esses empreiteiros, que allegam um incidente qualquer, um caso fortuito que obstou a que satisfizessem no tempo proprio aquillo a que se haviam compromettido. Ainda nem uma só vez deixei de deferir.

Mas queria a camara que o governo, nas circumstancias em que se achava a construcção da ponte sobre o Douro, deixasse de deferir ao pedido da companhia.

Não consultei a junta consultiva de obras publicas, não consultei a procuradoria geral da corôa!

Tomo a responsabilidade do acto, e se o parlamento me quer votar uma moção de censura, póde ter a certeza de que eu terei essa moção como um dos documentos mais honrosos para o meu nome.

Tenho presente todo o processo, e para não faltar cousa alguma, tenho até o supplemento á Correspondencia de Portugal, em que se pretendeu apresentar ao paiz o acto por mim praticado como attentatorio da constituição.

Tenho feito muito poucas concessões ou antes nenhuma; ao contrario tenho rescindido quasi todas as concessões que encontrei no ministerio a meu cargo.

Vamos á questão da prorogação do praso para a conclusão da 5.ª secção do caminho de ferro do norte.

Uma voz: — A legalidade.

O Orador: — A legalidade disse o illustre deputado que se fundou em dois documentos, no codigo civil e no contrato Salamanca. O codigo civil estabeleceu os casos de força maior, e este caso era de força maior. Vou ler o que a este respeito informou o fiscal do governo junto da companhia. (Leu.)

Ora quando por todo o paiz e no estrangeiro se abriam subscripções a favor das victimas das inundações, não queriam os illustres deputados que uma companhia que estava fazendo uma obra, como era aquella da ponte sobre o Douro, tivesse sido embaraçada por essas inundações! (Apoiados.) Não queriam ver n'isto um caso de força maior! (Apoiados.)

(Interrupção, que não se percebeu.)

O illustre deputado affirma que a companhia não pediu?

(Interrupção.)

Pois vou satisfazel-o. (Leu.)

O sr. Filippe de Carvalho: — Porque não publicou esse documento, que é importante?

O Orador: — Peço ao illustre deputado que me não reprehenda. (Apoiados.)

O sr. Filippe de Carvalho (com vehemencia): — Reprehendo, porque devo reprehender.

(Susurro.)

O Orador: — O illustre deputado póde reprehender-me, se quer; mas não me censure nem me reprehenda agora por ter remediado a minha falta. (Apoiados.)

O sr. Filippe de Carvalho: — Este systema de occultar documentos importantes á publicidade!

O sr. Presidente: — Faz favor de estar calado? (Riso.)

O Orador: — Não desejo continuar por mais tempo a abusar da paciencia da camara. Os meus esforços durante o periodo em que tenho tido a honra de fazer parte do actual gabinete têem todos sido tendentes para corresponder á confiança do meu digno presidente do conselho, auxiliando-o tanto quanto me é possivel nas difficuldades com que temos lutado e ainda lutâmos, e procurando ao mesmo tempo corresponder á confiança do paiz na justiça do qual confio.

É doloroso e melancholico ter muitas vezes de fazer a si proprio a mais cruel de todas as violencias por não poder condescender com pretensões, com desejos, com interesses muitas vezes dignos de toda a consideração, mas para os quaes por parte do governo ha um unico a cumprir, que é o de resistir e resistir tenazmente a essas solicitações. (Apoiados.)

Eu sinto que a desconfiança que a camara dos senhores deputados manifestou ao governo, e para a qual eu só contribui com os actos que pratiquei n'esta casa durante o tempo em que fui opposição, se convertesse a meu respeito n'um sentimento de hostilidade, que espero que ainda mais tarde ha de soffrer talvez importantes e largas modificações.

Não creio, porém, que a camara dos senhores deputados possa ter-se offendido commigo, pelos factos que acabo n'este momento de expor á sua consideração, e que foram base para a censura do illustre deputado que me antecedeu; eu não podia proceder de outra maneira, e pergunto a qualquer dos illustres deputados que me ouve, se collocado no meu logar, procederia de uma maneira differente. (Apoiados.)

Em todo o caso, não procuro diminuir a gravidade das faltas que me atribuem, e, estimando que a camara julgasse opportuno esclarecer a situação em que mutuamente nos achamos, resignar-me-hei com o que o destino tiver determinado; na certeza de que, para mim, quanto mais curta for a demora n'este logar, tel-o-hei como uma das maiores finezas e dos maiores obsequios que os meus collegas me pódem fazer na situação actual.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é trabalhos em commissões, e para depois de ámanhã é a continuação da que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Sessão de 23 de janeiro de 1878