162 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
stancias e proceder em harmonia com ellas, procurando estabelecer a conciliação entre as duas cidades; e quando se convencer que essa conciliação é impossivel, procurar então, e só então, uma solução, que, tanto quanto seja possivel, satisfaça as duas partes.
E isto é tão verdade quanto n'estas questões é preciso estudar todos os interesses, e até não esquecer as rivalidades dos povos.
Já o decreto de 15 de abril de 1869, que tem as assignaturas do sr. marquez de Sá, do sr. Pequito de Seixas e de outros cavalheiros, que são insuspeitos para o illustre deputado e para o seu partido, estabeleceu o principio de que duas terças partes dos eleitores do uma freguezia podem requerer a desannexação d'essa freguezia para outro concelho.
Refere-se, é verdade, a freguezias, mas o principio que se accentua n'esse decreto é o de se dever attender á vontade dos povos. E todavia vem agora o illustre deputado, pretendendo que se decida rapidamente, sem exame, contra a vontade dos povos de Guimarães, que querem ser desannexados, e a favor dos povos de Braga, que querem que aquella cidade continue unida ao districto!
O governo segue melhor caminho; não é por Guimarães nem por Braga; o governo é por uma decisão madura e reflectidamente estudada do assumpto, quando porventura se levantar uma intransigencia absoluta. (Apoiados.)
Mas ha mais alguma cousa.
No relatorio, que precede aquelle decreto, dizia-se que em materia de divisão territorial, e chamo a attenção da camara para isto, era preciso attender a diversissimos interesses, e até a preconceitos não raras vezes injustificaveis. São as palavras d'esse relatorio; e entretanto o illustre deputado não quer que nós tenhamos em attenção cousa nenhuma, quer que decidamos prompta o rapidamente.
Estes é que são os principios do governo, comparados com o procedimento da opposição, antes e depois. A principio guardou ella silencio, parecendo que ia de accordo com o governo; depois, apresentou-se querendo que o governo decida de repente, e imaginando o illustre deputado que para manter a paz publica é preciso que o governo comece por declarar quaes são os vencidos, como se esses vencidos se resignem á voz do illustre deputado!
Realmente, para evitar o derramamento de sangue que o illustre deputado tanto receia, não me parece que seja o melhor meio resolver a questão sem mais exame, antes de esgotados todos os meios de conciliação.
Pois estas divergencias que se levantam entre duas povoações não podem porventura desapparecer, transigindo amanhã aquelles que hoje parecem absolutamente intransigentes?
Será aquella a maneira de o conseguir? Será a maneira do illustre deputado, mas não é a maneira do governo; o governo não procede nem deve proceder assim.
S. exa. disse ainda que esta questão podia ser grave para o governo que succedesse a esta.
Vi apparecer n'estas palavras uma esperança; mas essa esperança morreu de repente, porque logo calculei que se outro governo, a não ser este, tivesse de resolver esta questão, ella de certo não seria collocada em um terreno de tanta intolerancia e tão pouco habil, como, no meu modo de ver, foi collocada pela opposição. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(S. Exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. José Borges de Faria: - Começo por ler e mandar para a mesa a minha moção de ordem, que é a seguinte:
«A camara, reconhecendo a necessidade da manutenção da integridade do districto de Braga, passa á ordem do dia.»
Como v. exa. vê, esta moção não tem significação alguma politica, nem eu podia vir fazer de uma questão local importante uma questão de politica geral. Estou separado do governo, estou em opposição ao governo, mas não estou ligado a nenhum grupo politico da opposição. Em tempo opportuno darei as rasões por que me encontro n'este lado da camara, e confio que serão cabaes e completas e justificarão o meu procedimento.
N'este momento são outros os meus intuitos, e farei por me conservar dentro d'elles. Não faltará occasião azada para ajuste e liquidação de contas. Eu a procurarei brevemente.
Sr. presidente, eu tenho a honra de ser deputado por Braga e presidente da camara municipal d'aquella cidade, e por consequencia não posso deixar de defender esta questão, tendo obrigação rigorosa de não a collocar no terreno politico, (Apoiados) porque devo sacrificar tudo ao bem estar e á defeza dos interesses da terra que aqui represento e de que sou filho. (Muitos apoiados.)
Só me custa ter de entrar n'esta questão pela situação especial em que me encontro agora actualmente n'esta casa, e por isso desejo tornar bem claro que não me quero apresentar n'esta occasião, difficil para o governo, para liquidar contas com elle, ou para dizer quaes as rasões por que estou collocado na opposição.
Não quero, portanto, desviar a questão do seu caminho.
Pedi a palavra porque desejava fazer ligeiras, mas claras considerações, ácerca de uma questão que vae de certo agitar a camara, como já tem agitado e continua a agitar duas cidades vizinhas e importantes.
Sr. presidente, a cidade de Braga não insultou Guimarães. (Apoiados.) Foram, é infelizmente verdade, insultados por bastantes pessoas, tres cavalheiros de Guimarães, procuradores por esta cidade á junta geral.
O seu faccioso procedimento, contrariando acintemente os desejos de Braga e os desejos de todos os outros concelhos de districto, poderia attenuar esta manifestação reprehensivel e impropria de uma cidade civilisada.
Os insultos foram immediatamente reparados. A camara municipal, a que tenho a honra de presidir, deu immediatamente, por proposta minha, plena e completa satisfação aos cavalheiros offendidos e á cidade de Guimarães; e digo plena e completa satisfação, porque ella foi por unanimidade. (Muitos apoiados.)
No mesmo dia a junta geral do districto de Braga procedeu do mesmo modo, e tambem por unanimidade votou uma moção em que dava plena e completa satisfação a Guimarães e aos seus procuradores.
Portanto, Guimarães devia estar plenamente satisfeita, a não ser que esta illustre cidade se queira manifestar mais intransigente, mais pundonorosa e mais susceptivel do que a fidalga Hespanha ou a poderosa Allemanha.
Todos sabem que por occasião da questão das Carolinas a Allemanha foi insultada pela Hespanha, insultos que podiam abrir um abysmo entre as duas nações; deram-se as satisfações pelas instancias convenientes e a Allemanha ficou satisfeita e o insulto esquecido.
A Hespanha viu Affonso XII assobiado e apupado pela gentalha de Paris, e quando o governo francez acudiu pressuroso dando categoricas e publicas manifestações de pezar por um facto que não podia nem devia ser attribuido á grande cidade, a Hespanha estendia-lhe a mão amiga, e os profundos aggravos ficaram de todo apagados.
Pois Guimarães, guardadas as devidas proporções, está nas mesmas circumstancias; a camara municipal de Braga e a junta geral do districto, que então estava funccionando, escreveram nas actas das suas sessões o seu pezar, e Guimarães parece não ter dado apreço ao procedimento correcto e cordeal d'aquellas corporações, que representam o municipio e o districto.
Sr. presidente, nunca houve antigos odios nem antagonismos tradicionaes entre Braga e Guimarães como o prova o facto de terem sido quasi sempre de Guimarães os governadores civis de Braga.