232 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
quando o deve fazer, do que tomar o expediente de alimentar e animar agitações e desordens no paiz.
Oxalá que o governo se não convença já tarde de que deve sair ou mudar de rumo! No principio dos tumultos não se levantava voz senão contra os impostos: agora já se começa a ouvir - abaixo o governo e viva a republica!
Não abuse, pois, o governo da persuasão que tem de que a opposição é quem faz os tumultos, porque a verdade é que o paiz está realmente agitado, e por tal fórma, que se a opposição quizesse explorar o estado do paiz, em vez de tumultos, talvez tivessemos a revolução na rua. (Apoiados.)
Parece-me que de maneira nenhuma se devem attribuir os tumultos a manejos da opposição, e que póde ser mais util á segurança e tranquillidade publica não os attribuir simplesmente, nem principalmente, a similhante causa: d'aqui não vinha perigo nenhum, o se com effeito, contra o que eu sinceramente julgo, a opposição, ou alguns amigos da opposição, têem concorrido para as agitações populares, parecia-me de boa politica tirar-lhes os motivos ou pretextos, com que convencem o povo.
Eu estou convencido que o povo está naturalmente sobresaltado e agitado, e tem causas poderosas para isso.
Essas causas, julgo eu, são a pobreza do povo, o grande augmento que os impostos têem tido na administração d'este governo e o esbanjamento dos dinheiros publicos. (Apoiados.)
Estas é que são, no meu entender, as causas verdadeiras da agitação, que lavra em todo o paiz; emquanto se não attenuarem ou modificarem não se modifica o estado do paiz, que não póde realmente com tantos sacrificios, como se lhe estão exigindo.
Por mais que o sr. ministro da fazenda diga que o paiz está prospero, a verdade é que o povo está pobre e muito pobre. Se alguém está rico não é de certo o povo! E as rasões, d'onde o sr. ministro concluiu a prosperidade do paiz, não procedem absolutamente, e não convencem da riqueza do povo: que o paiz está prospero, diz s. exa., mostra-o o augmento das receitas tributarias e a sabida dos fundos publicos.
Estas rasões, por si só não convencem da verdade da asserção, que o sr. ministro da fazenda avançou.
O augmento das receitas tributarias póde provir mais do rigor do fisco, do que da prosperidade do contribuinte, por isso não basta dizer que as receitas tributarias augmentaram, é preciso acrescentar e provar, que o contribuinte as pagou desafrontadamente e sem sacrificios, ou ao menos sem grandes sacrificios, mas isso é que o sr. Marianno de Carvalho não provou e nem ao menos disse; e fez bem, porque se o dissesse atraiçoava completamente a verdade; é que o povo, se paga as variadas contribuições que lhe exigem, é com grande sacrificio das suas proprias necessidades.
A subida dos fundos tambem póde não provar, que o paiz e especialmente o povo está prospero, porque a subida dos fundos póde dar-se independentemente da prosperidade do paiz e até com prejuízo d'elle.
Os fundos sobem porque o thesouro está rico, e o thesouro póde estar rico, exactamente porque o povo está pobre.
Quantos mais tributos se pagarem, mais prospero ficará o thesouro, mais habilitado a pagar os seus encargos, e por isso os fundos publicos sobem, mas, quantos mais impostos se pagarem, mas pobre fica o contribuinte que os paga.
E aqui está como a subida dos fundos póde não indicar prosperidade do povo, e póde dar-se exactamente á custa e com sacrificio d'essa mesma prosperidade.
Alem d'isto, e com effeito, a subida dos nossos fundos, actualmente tem uma explicação ou da-se uma explicação, que não mostra precisamente a prosperidade do paiz. Diz-se geralmente, que a subida é artificial; que um certo grupo de banqueiros e capitalistas, interessados em que o governo se conserve no poder, tem feito subir os nossos fundos, comprando muitos, e não offerecendo nada ou quasi nada á venda.
O sr. Marianno de Carvalho tem conhecimento d'esta versão, e, como quem se sangra em saude, disse que se a subida dos fundos é devida a um syndicato, porque era que os seus adversarios não tinham tambem feito um syndicato para o mesmo fim.
Fizessem-n'o tambem! dizia s. exa. O illustre parlamentar o sr. Fuschini fazendo justiça ao sr. Marianno de Carvalho já outro dia aqui disse, que era muito grande o talento de s. exa., mas que elle não sabia qual admirar mais se o seu talento extraordinario, se a sua grandissima habilidade. Se assim é, o que aliás não nego, digo eu, que se os adversarios do sr. Marianno de Carvalho não fizeram syndicatos para fazerem subir os fundos é porque não têem tanta habilidade como s. exa.
Mas melhor fôra, que em vez de empregar o seu talento o a sua habilidade em fazer subir antecipadamente os nossos fundos, os empregasse em beneficio real do seu paiz e em melhorar as condições do contribuinte, que são tristes.
Póde o sr. Marianno ter muito talento e muitissima habilidade, mas se não mudar de systema nunca ha de chegar a ser um homem grande, porque nunca póde ser grande aquelle, que tendo muito talento e muita habilidade, em vez de empregar tão felizes dous a bem do seu paiz, se limita a gastal-os em beneficio dos seus amigos e do seu partido.
Muito melhor serviço faria o sr. Marianno, se em vez de fazer subir simplesmente os fundos, fizesse diminuir as despezas o descer os tributos.
Assim bem mereceria do seu paiz, que por ora não tem aproveitado com o talento e habilidade de s. exa.
Parece-me, pois, pelo que tenho dito, que as rasões que o sr. ministro da fazenda deu, não provam por si sós que o paiz esteja prospero, por isso póde uma das causas da agitação do paiz estar, como eu disse, na pobreza do povo, que é infelizmente real e evidente.
Outra causa que no meu entender tem concorrido muito para a agitação do paiz e o excessivo augmento de tributos, com que este governo nos tem beneficiado.
Esta causa não produziria tanto effeito se não existisse a primeira, mas é tão evidente e tão real como esta, e consiste na excessiva exageração da contribuição industrial, na da renda de casas e sumptuaria e na da decima de juros; e está tambem nos grandes encargos districtaes, municipaes e parochiaes, que o governo creou e conservou.
Não é preciso cansar a attenção da camara para demonstrar este facto, que nós todos presenciâmos e de que todos estamos convencidos; não ha duvida nenhuma de que todos os impostos têem augmentado muito, e tanto, que é com grande sacrificio que o povo os paga, por isso não admira e é até plausivel acreditar, que aqui esteja nova causa importante da agitação do paiz.
Alem do augmento directo, que tiveram propriamente os impostos geraes do estado, acontece que o governo, usando do auctorisação, que o parlamento lh'e deu, teve de auctorisar os districtos a lançarem uma percentagem até 15 por cento; as camaras municipaes até 50 por cento e as juntas de parochias até 35 por cento, isto, é, ao todo 100 por cento; de sorte que os impostos geraes para o estado, que já são excessivos, são dobrados, ou mais do que isso, porque alem de tudo isto ainda o estado pede mais para os encargos districtaes que tomou sobre si o addicional de 8,7 por cento; de modo que as contribuições estão actualmente em mais do dobro d'aquillo, em que têem estado, e a sim não admira que o povo se inquiete e se agite, o contrario é que seria para admirar.
E não se diga que uma cousa é a auctorisação dada ás corporações administrativas e outra cousa é o uso que ellas