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N.° 14

SESSAO DE 7 DE FEVEREIRO DE 1898

Presidente do exmo sr. Eduardo José Coelho

Secretários-os exmo srs.

Joaquim Paes do Abranches
Frederico Alexandre Garcia Ramires

SUMMARIO

Approvada a acta, o ar. presidente declarou ter recebido duas representações, uma das classes graphicas de Coimbra contra a ultima proposta de lei de imprensa, e outra das classes graphleas de Lisboa e Porto contra a concorrencia estrangeira, protegida pelo tratado litterario de 1866. Em seguida dá-se couta do expediente, e têem segunda leitura quatro projectos de lei.-- O sr. Matoso Corte Real apresenta um projecto de lei, creando um officio de tabellião de notas em Miranda do Corvo, o pede às commissões respectivas que dêem parecer sobre o projecto de lei relativo aos terceiros distribuidores postaes das cabeças de districto, cuja iniciativa renovou o anno passado.- O sr. Malheiro Reymão. Refere-se desfavoravelmente ao despacho do ministerio do reino que denegou approvação ao orçamento da camara municipal de Vianna do Castello, respondendo-lhe o sr. presidente do conselho. - O sr. Oliveira Matos refere-se às questões levantadas em Coimbra entre a academia e o commissario de policia, que alteraram a ordem publica, assegurando o sr. presidente do conselho que a ordem está restabelecida.- O sr. Ribeiro Coelho pede a construção dos caminhos de ferro da Regua a Chaves o de Mirandella a Bragança, dando-lhe sobro o assumpto varias explicações o sr. ministro das obras publicas.- O sr. Simões Bailio requer vários esclarecimentos.

Na ordem ao dia prosegue-se na discussão do projecto de lei n.º 25, concessões de terrenos no ultramar, usando da palavra os srs. Marianno de Carvalho, ministro dos negócios estrangeiros, Luiz do Magalhães, presidente do conselho o Teixeira de Sousa,

Primeira chamada - Ás duas horas da tarde. Presentes, 8 srs. deputados.

Abertura da sessão- Ás tres horas.

Presentes á segunda chamada-55 srs. deputados. São os seguintes: - Abel da Silva, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alfredo César de Oliveira, António Ferreira Cabral Paes do Amaral, António Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, António Máximo Lopes de Carvalho, António de Menezes e Vasconcellos, António Simões dos Reis, António Teixeira de Sousa, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto José da Cunha, Carlos Augusto Ferreira, Conde do Alto Mearim, Conde da Serra de Tourega, Conde de Silves, Eduardo José Coelho, Francisco Barbosa do Conto Cunha Sotto Maior, Francisco de Castro Mattoso da Silva Corte Real, Francisco José Machado, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Silveira Vianna, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa de Abreu , Lima Vieira, João Abel da Silva Fonseca, João Baptista Ribeiro Coelho, João Joaquim Izidro dos Beis, João de Mello Pereira Sampaio, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Ornellas de Matos, Joaquim Paes de Abranches José Adolpho de Mello e Sousa, José Benedito de Almeida Pessanha, José da Cruz Caldeira, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Malheiro Beymão José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Matos, José Maria Pereira de Lima José Mathias Nunes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo

Cayola, Luciano Afonso da Silva Monteiro, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Fischer Berquó Poças falcão, Manuel António Moreira Júnior, Manuel Telles de Vasconcellos Marianno Cyrillo de Carvalho, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro e visconde de Melicio.

Entraram durante a sessão os srs.:- Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, António Eduardo Vilaça, Bernardo Homem Machado, Carlos José de Oliveira, Conde de Burnay, Elvino José de Sousa e Brito, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Ressano Garcia, Henrique da Cunha Matos de Mendia; Jacinto Candido da Silva, João Lobo de Santiago Gouveia, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Tose Alves Pimenta de Avellar Machado, José Augusto torreia do Barros, José Capello Franco Frazão, José Ferreira, José Eduardo Simão Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José da Fonseca Abreu Castello franco, José Frederico Laranjo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Luiz Ferreira Freire, Luiz José Dias, Luiz Osório da Cunha Pereira de Castro, Manuel Afonso de Espregueira, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Sertorio do Monte Pereira.

Não compareceram á sessão os srs.:- Albano de Mello Ribeiro Pinto, Álvaro de Castellões, António Carneiro de Oliveira Pacheco, António Tavares Festas. Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto César Claro da Ricca, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paçô Vieira, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Furtado de Mello, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João António de Sepulveda, João Catanho de Menezes, João. Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Simões Ferreira, José de Abreu do Conto Amorim Novaes, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Bento Ferreira de Almeida, José Maria Barbosa de Magalhães, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Libanio António Fialho Gomes, Manuel Pinto de Almeida e Visconde da Ribeira Brava.

Acta- Approvada.

O sr. Presidente:- Tenho a participar á camara que me veiu procurar uma commissão, representante das classes graphicas das cidades de Coimbra e Lisboa, que me apresentou, e recebi, uma representação, que supponho está redigida em termos dignos, contra a proposta de lei de liberdade de imprensa.

A commissão, a que me refiro, alem de pedir que apresentasse a sua representação na camara, pediu-me tambem a sua publicidade no Diario do governo.

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Consulto a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo, se estiver redigida em termos dignos e convenientes.

Foi auctorisada a sua publicação.

Voe por extracto a pag. 250.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio da marinha,, acompanhando um exemplar da collecção das providencias de natureza legislativa publicadas pelo commissario régio na provinda de Angola, conselheiro Guilherme Augusto de Brito Capello, desde 18 de junho de 1896 até 15 de fevereiro de 1897.

Para a secretaria.

Segundas leituras

Projecto de Lei

Senhores.- Por mais de uma vez se tem tentado reformar o curso superior de letras de Lisboa, introduzindo-se n'elle o estudo de novas disciplinas que o pozessem á altura de estabelecimentos, análogos que ha lá fora, e contribuíssem portanto para os nossos progressos intellectuaes.

Motivos de differente ordem obstaram até hoje á realisação de algumas dessas projectadas reformas !

Entre as cadeiras que deviam fazer parte do curso superior de letras, ha uma que, pela sua importância especial, sobreleva as demais susceptíveis de ser creadas: é a cadeira de philologia portugueza.

Não só em todos os paizes cultos da Europa se reconhece ao ensino das línguas nacionaes, nos respectivos estabelecimentos scientificos, o devido valor, tornando-o parte obrigada dos quadros das disciplinas que se professam, mas, mesmo n'aquelles paizes que não são de origem romanica, taes como a Allemanha, a Áustria, a Suécia, a Noruega, a Ensaia, se ensinam linguas novo-latinas, e por conseguinte a língua portugueza; de modo que ao passo que em Portugal não existe cadeira especial para o ensino superior da lingua portugueza, da nossa lingua nacional,, este ensino faz-se noutros paizes, e até às vezes com muito brilho. Tanto porque a lingua portugueza é um dos elementos mais vitaes da nossa nacionalidade, como porque só pelo seu estudo scientifico e desenvolvido, o que melhor se consegue com a existencia de uma cadeira especial em que esse ensino se faça superior e oficialmente, se podem resolver muitas questões de alto interesse histórico e espalhar no publico aquellas noções philologicas, que hoje tanto contribuem para o complemento de uma boa educação intellectual, torna-se evidente a necessidade do estudo da historia da lingua portugueza, pelo menos no estabelecimento scientifico em que elle melhor quadra, que é o curso superior de letras de Lisboa.

Como, porém, por um lado mal se deve, attentas as condições actuaes do thesouro publico, pensar em o sobrecarregar, comquanto fosse de maior utilidade a reforma geral do curso, no sentido de o dotar de outras cadeiras e, por outro lado, está ha muito tempo vaga a cadeira de litteratura grega e latina, cuja importancia, não obstante ser grande, fica inferior para nós portuguezes, ao da historia da nossa língua nacional, póde sem prejuízo de ninguém, sem o encargo pecuniário para o estado, e com muita vantagem do ensino publico, substituir-se a cadeira vaga de litteratura grega e latina por uma cadeira de philologia portugueza, até que as circumstancias económicas da nação permittam a coexistência de ambas e ainda de outras.

A suppressão da cadeira de litteratura grega e latina não é tão radical como á primeira vista parece, pois no curso superior de letras estabeleceu-se, recentemente uma cadeira de grego, na qual os estudiosos podem colher noções theoricas e praticas da respectiva litteratura, e faz parte das disciplinas do curso uma cadeira de litteratura moderna, especialmente portugueza, onde o professor se occupa necessariamente da litteratura latina nas relações que esta tem com as modernas.

O estudo da litteratura grega e latina acha-se, pois, sobretudo para as necessidades mais urgentes do nosso paiz, regularmente compensado, e, com a modificação apontada, fica pela primeira vez representado entre nós com consagração official em cadeira propria, é ensino superior da língua, portugueza.

Em vista do exposto:

Considerando que é da maior importancia no curso superior de letras de Lisboa a existencia de uma cadeira própria, onde se ensine superiormente em todas as suas phases e em relação às varias questões que levanta, a língua portuguesa;

Considerando que póde ser substituída; por essa cadeira a actual de litteratura. grega e latina, que ha muito está vaga:

Tenho a honra de apresentar á sancção das cortes o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É extincta a cadeira de litteratura grega e latina, que faz parte do curso superior de letras de Lisboa.

Art. 2.° E creada no mesmo curso .superior de letras uma cadeira de philologia portugueza, que, na organisação do quadro das disciplinas do curso, fica substituindo para todos os efeitos a cadeira de litteratura; grega e latina.

§ 1.° A primeira nomeação de professor para a nova cadeira pertence immediatamente ao governo, como é de uso em taes circumstancias, mas só poderá recair em indivíduos cuja competencia esteja provada por trabalhos especiaes publicados sobre os assumptos da cadeira agora creada.

§ 2.° O professor da nova cadeira tem os mesmos vencimentos, direitos e regalias que os outros lentes do curso superior de letras.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos deputados, em 4 de fevereiro de 1898.=: O deputado, Alexandre Cabral.

Lido na mesa, foi admittido e enviado às commissões de instrucção primaria e secundaria e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores.- A lei que regula actualmente os tirocínios de embarque dos officiaes da marinha de guerra nacional, comquanto obedeça a um principio hoje admittido em quasi todas as marinhas do globo de assegurar a competencia profissional aos promovidos- torna-se como está estatuído entre nós, um tanto gravoso, se se atender que a nossa marinha, em. regra, só serve fora dos portos do continente do reino, nas estações que defendem as colónias, onde um clima debilitante conjugado com as exigencias do serviço quer no mar quer em terra, abalam as organisações mais robustas.

Outro facto de não somenos importancia, como reforçador do estado gravoso acima mencionado, consisto no serviço permanente das lanchas- canhoneiras nos nossos rios de África, onde a responsabilidade! effectiva do official, mais árdua em epochas de tranquilidade anormal, é aggravada com as febres palustres inherentes às regiões adjacentes a esses rios.

Accresce alem d'isto, que a lei actual, não resalvando para todos os portos a garanti que possa derivar para a promoção, do excesso de tirocínio nas diversas graduações, colloca officiaes da mesma arma em circumstancias diversas, muito embora bastas vezes sejam iguaes os deveres dos cargos que desempenham.

As condições especiaes de promoção que o decreto de

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14 de agosto de 1892 conseryon das leis anteriores aos officiaes de marinha soffrem., pois, pela presente proposta uma pequena alteração mais compensadora aos serviços prestados pelos officiaes superiores, estabelecendo-se tombem uma alternativa para os subalternos que, sem alterar profundamente a lei que rego o assumpto, regularisa os tirocinios que na maioria dos casos os officiaes de marinha são chamados, por conveniencia de serviço, a fazer nas divisões navaes. Este projecto de lei, baseado em um principio de equidade, não traz augmento algum de despega para o thesouro. Em vista pois do exposto, tenho a honra do vos apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo l.º Alem das condições geraes de promoção estabelecidas pelo decreto de 14 de agosto de 1892, devem os officiaes de marinha satisfazer ao disposto nos seguintes artigos,

Art. 2.º. Para a promoção a primeiro tenente é necessário;

1.° Contar quatro annos de posto do segundo tenente;

2.° Ter servido em commissão de embarque, como segundo tenente) por tempo não inferior a dois. annos fora dos portos do continente do reino;

3.° Estar habilitado a exercer em geral as funcções de immediato e em particular os de commandante de pavios de pequena lotação.

Art, 3.° Para a promoção a capitão tenente é necessário:

1.º Contar tres annos no posto de primeiro tenente ;

2.° Ter servido em commissão de embarque como primeiro tenente, por tempo não inferior a dois annos, fora da portos do continente do reino, ou ter seis annos, de serviço de embarque desde guarda marinha, fora dos portos do continente do reino, sendo, pelo menos, dois annos em guarda marinha e um anno em primeiro tenente; :

3.º Ser julgado apto para exercer commissão de commando.

Art. 4.° Para a promoção a capitão do fragata é necessário:

1.° Contar dois annos de posto de capitão tenente;

2.° Ter servido em commissão de embarque como capitão tenente, por tempo não inferior a seis meses, fóra. dos portos do continente do reino,

Art. 5.° Para a promoção a capitão de mar e guerra é necessário;

1." Contar um anno de. posto de capitão de fragata;

2.° Ter servido em commissão de embarque fóra dos portos do continente do reino por tempo não. inferior a um anno desde a sua promoção a capitão tenente, ou seis mezes como capitão de fragata;

3° Ser julgado apto a comandar mais de um navio.

Art. 6 Para a promoção a contra almirante é necessario:

1.° Contar um anno de posto do capitão de mar e guerra;

2.° Ter servido em commissão de commando, como official superior, fora dos portos do continente do reino, por tempo não inferior a um anno, sendo, polo menos, seis mezes no posto de capitão de mar e guerra.

Art, 7.b Os officiaes que por falta de tirocinio de embarque não hajam sido promovidos, alcançarão promoção quando satisfeitas as condições geraes d'estas, tenham cumprido o mesmo tirocínio, occupando então o logar da escala que corresponda a vacatura que, forem preencher.

§ 1.° Quando ao tempo de existir vacatura a preencher pelo official não habilitado com o tirocínio completo, esteja este já embarcado fóra dos portos do continente para satisfação do prescripto, a sua promoção verificar-se-ha logo que seja completo o tirocínio, e o official conservara A sua anterior situação na escala, sendo considerado supranumerário no respectivo quadro até que seja incluído neste na primeira vacatura.

$ 2.° Se o official nas condições previstas pelo paragropho anterior tiver interrompido involuntariamente o tirocínio, deverá ser promovido Jogo. que p conclua, sendo considerado supranumerário ate entrar para o quadro na (primeira, vacatura, conservando a sua situação anterior na escala.

Art. 8.º A promoção a vice-almirante é feita por antiguidade, observadas, as condições geraes da promoção. 9.°

Os officiaes que forem desempenhar alguma commissão de serviço para o ultramar não são dispensados de nenhuma das condições exigidas neste decreto, para entrarem no quadro efectivo.

& unico. O official a quem competir promoção por. escala no posto que estiver vencendo ou tenha já vencido em sorvido no ultramar, entrara para o quadro effectivo, depois de satisfazer aos tirocínios de embarque exigidos por esta decreto, indo occupar o logar na escala que já lhe pertencia, caso não tenha sido preterido por outro motivo legal.

Art. 10.° As attribuições da officiaes de marinha são as que derivam da sua situação, e em conformidade dos regulamentos correspondentes.

§ 1,° O pessoal da armada, que não esteja desempenhando commissão de embarque, será distribuido pelas diversa? commissões de serviço dependente da direcção geral da marinha,

§ 2.° O ministro da marinha póde, sem prejuizo da escala das estações, conceder licenças temporárias sem vencimentos, a officiaes de marinha, para commandarem paquetes nacionaes, contando-se-lhes o tempo para os effeitos. de promoção e reforma.

Art. 11.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões dos srs. deputados, em 4 de fevereiro de 1898. = O deputado, F. J. Machado

Projecto de lei

Senhores: - Por decreto de 4 de janeiro de 1897 foi concedido á junta de parcehia da freguezia de S. Sebastião de Lagos, o extincto convento de Nossa Senhora da Gloria, igreja, e mais dependencias (em reinas) para n'ella se construir um asylo onde possam albergar-se os potras desvalidos,

Esta concessão foi provisória.

O projecto de lei que tenho a honra de mandar para a mesa, tem por fim tornar difinitiva esta concessão,

Como a camara vê, é simples e innocente o meu pedido, nem augmenta a despesa publica nem offende direitos ou interesses de ninguém, e recommenda-se pelos intuitos de caridade, a que visa e que tanto, nobilitam os seus iniciadores.,

Alem de que já algumas quantias têem sido aplicadas. á sua construcção, havidas da caridade publica e particular que muito será incitada pela certeza da propriedade definitiva do referido convento

Por estas considerações, que a clareza do assumpto me. dispensam de. desenvolver e acrescentar, tenho a honra de solicitar da camara a sua approvação ao seguinte projecto de lei :

Artigo l.º É concedida á junta de parochia da freguesia de S. Sebastião de Lagos o convento em minas denominado de Nossa Senhora da Gloria, já na posso provi poria da mesma junta por decreto de 4 de fevereiro de

1897, para n'elle construir um asylo destinado a albargue de pobre desvalidos.
Art 2º caducara essa concessão, quando não corresponda ao fim a que é destinada. . .
Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 4 de fevereiro de 1898.= O deputado por Lagos, Joaquim Tello. Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de fazenda

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Projecto de lei

Senhores deputados: - A falta de um lyceu central no Alemtejo corta a carreira litteraria a todos os estudantes pobres do sul do paiz, que não podem vir cursar as aulas em Lisboa.

A creação dos lyceus centraes foi feita com desigualdade e com injustiça, pois emquanto no norte do paiz ha dois lyceus centraes, um no Porto e outro em Braga, nos quatro districtos do sul, Evora, Portalegre, Beja e Faro, que occupam um terço da superficie total do paiz, não ha nenhum.

Apesar de ser muito maior a densidade da população ao norte do que ao sul do paiz, as estatisticas mostram que o movimento do lyceu de Braga, com relação aos alumnos do novo regimen da instrucção secundaria, não tem sido mais consideravel do que o movimento do lyceu de Evora.

No actual anno lectivo ha no lyceu de Braga trinta e seis alumnos matriculados; sendo quatorze na 1.ª classe, dezoito na 2.ª classe e quatro na 3.ª classe; emquanto que no lyceu de Evora ha quarenta e seis; sendo vinte e dois na 1.ª dezesete na 2.ª, e sete na terceira classe. Com respeito, pois, aos alumnos do novo regimen de instrucção secundaria no actual anno lectivo, depois de estar já funccionando como central o lyceu de Braga, ha uma differença de dez alumnos a favor do lyceu nacional de Evora.

Evora, que foi séde de uma universidade durante dois seculos, e onde o edificio do lyceu não só é de primeira ordem, mas é o primeiro do paiz em capacidade, disposição das aulas e elegancia architectonica, é o ponto mais central da provincia transtagana, e por isso já representaram ao governo, pedindo um lyceu central em Evora, differentes camaras municipaes não só do districto de Evora, mas dos districtos de Beja, Portalegre e Algarve.

Se a elevação do lyceu nacional de Evora a lyceu central cansasse um pequeno augmento de despeza, isso seria apenas uma justa compensação, porque à camara de Evora concorre annualmente para a instrucção com cerca de 8 contos de réis, e
não chega a 5 contos de réis o que o estado ali despende com a instrucção primaria do concelho.

Se realmente houvesse algum augmento de despeza, esta só se effectuaria depois do augmento da receita, isto é, a partir do anno lectivo de 1900-1901, que é quando começarão a funccionar as classes do curso complementar. Essa despeza seria ainda inferior por haver no lyceu de Evora um professor de philosophia que, terminado o anno lectivo de 1899 a 1900, ficará sem cadeira própria, e portanto addido, visto acabar o ensino de philosophia nos lyceus nacionaes.

O augmento da receita é incontestavel, porque muitos paes alemtejanos, que não podem mandar os filhos frequentar os cursos complementares aos lyceus de Lisboa e Coimbra, mandal-os-hão para o lyceu de Evora, onde a vida é muitissimo mais barata.

E como em relação ao districto de Vizeu ha analogia de circumstancias, submetto á approvação de v. exa. o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São elevados a lyceus nacionaes centraes os lyceus nacionaes de Evora e de Vizeu.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos deputados, 4 de fevereiro de 1898. = O conego Alfredo Cesar de Oliveira = Conde da Serra de Tourega = José Gil de Borja Macedo e Menezes = Sertorio de Monte Pereira = Antonio Tavares Festas.

Lida na mesa, foi admittida e enviado ás commissões de instrucção primaria e secundaria e de fazenda.

O sr. Francisco Matoso Côrte Real: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei creando um officio de tabellião de notas no concelho de Miranda do Corvo, districto de Coimbra, comarca da Louzã, com séde na capital do concelho.

No relatorio que precede este projecto exponho as suas bases fundamentaes, e as rasões que o justificam.

Peço a v. exa. que o faça enviar, com toda a brevidade, á commissão de legislação civil.

Estando com a palavra, aproveito a occasião para pedir às commissões de fazenda e do orçamento que prestem toda a attenção ao projecto, cuja; renovação requeri o anno passado, e que tem por fim equiparar os vencimentos dos distribuidores de 3.ª classe dos correios, cabeças de districtos do continente e ilhas adjacentes, ao que recebem os seus collegas nos districtos de Lisboa e Porto.

No relatorio que precede esse projecto expõe-se detidamente os seus fundamentos, e por isso me abstenho de os repetir, limitando-me a pedir, tanto á commissão de fazenda, como á do orçamento, que dêem, com toda a brevidade, o seu parecer sobre elle.

(S. exa. não reviu.)

O projecto ficou para segunda leitura.

O sr. Malheiro Reymão (para um aviso previo): - Sr. presidente, manifestei o desejo de interrogar o sr. ministro do reino ácerca de algumas indicações, que fez em seu despacho de 1 de janeiro, relativamente, ao orçamento da camara municipal de Vianna.

É restricto e preciso o ponto, para o qual desejo chamar a attenção de s. exa. o sr. ministro do reino.

Foi communicado á camara municipal de Vianna do Castello, que, por despacho do sr. ministro do reino, lhe havia sido denegada approvação ao seu orçamento, e se lhe mandava proceder á organisação de um outro orçamento, devendo-se obedecer a differentes indicações, que vem referidas no despacho alludido.

Não tenho que referir-me á maioria d'ellas, mas apenas a algumas que reputo offensivas dos interesses de algumas corporações d'aquelle concelho, e expressamente contrarias a direito.

No despacho, a que me estou referindo, determina-se que as verbas de despeza n.os 12, 13 e 20 sejam englobadas n'uma verba unica, para ser rateada proporcionalmente pelos credores da camara - as juntas de parochia do concelho, empreiteiros de obras municipaes e arrematantes dos terrenos do largo do jardim velho.

As verbas são as seguintes:

(Leu.)

Como v. exa. vê pela leitura das verbas do orçamento, a que me venho referindo, a verba n.° 20 era uma reposição ou entrega que a camara municipal do concelho fazia de fundos especiaes.

(Pausa.)

Repito, a verba n.° 20 tendia a auctorisar o pagamento pela camara municipal de algumas quantias pertencentes a duas juntas de parochia e que eram destinadas á construcção de cemiterios.

Uma d'ellas constituia deposito ou fundo especial para a construcção de cemiterios, que a camara tinha recebido em virtude do decreto de 6 de agosto de 1892.

Outra, era nem mais nem menos, do que a importancia de um legado deixado por um benemerito filho da freguezia de Capareiros e destinado á construcção e reparação do cemiterio d'aquella freguezia.

Comprehende v. exa. e a camara, que só por mal informado, o sr. ministro do reino podia ordenar procedimento contrario ao seguido pela camara municipal, porque aquellas verbas eram destinadas ao pagamento de dividas, que constituiam e constituem um direito sagrado de outras corporações. Seria um proceder manifestamente contrario á vontade de quem deixou aquelle legado com applicação especial ás despezas de conservação de um cemiterio pa-

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rochial, em uma das freguezias mais populosas do concelho, e não estaria em caso algum, nas attribuições do sr. ministro do reino dar-lhe destino contrario ao que lhe estava designado.

Como v. exa. vê, a camara municipal de Vianna inseria no seu orçamento uma verba destinada ao pagamento d'aquellas quantias, por serem fundos especiaes especialmente destinados á construcção e conservação de cemiterios, e por despacho do sr. ministro do reino terão que ser englobadas e distribuidas por differentes credores da camara.

Creio que não fui injusto, dizendo que esta indicação era contraria a direito.

Com respeito á verba destinada para pagamento aos arrematantes dos terrenos do antigo jardim, não se comprehende bem qual é a indicação feita n'aquelle despacho.

For virtude de uma illegal e antiga arrematação de terrenos pertencentes ao municipio, que depois foi annulada, ficaram differentes individuos credores da camara por diversas quantias.

D'estes, uns requereram o pagamento das suas dividas, e a camara reconhecendo esses direitos, inscreveu no orçamento do anno passado 50 por cento d'essa importancia, para effectuar o pagamento, e no anno corrente inscreveu a restante quantia.

Como se ha de dividir proporcionalmente por differentes credores a somma total d'esta divida? Parece que a intenção do sr. ministro do reino era mandar pagar a todos os credores igualmente, quando alguns têem ainda pendente uma questão em juizo, para se chegar a apurar a responsabilidade da camara municipal para com elles.

Isto não só era contrario ao direito que deve regular a administração da camara municipal, como seria reconhecer direitos que estão ainda dependentes de ultima decisão judicial.

As mesmas rasões militam a favor dos empreiteiros do mercado municipal. São credores por quantias certas de que a camara municipal reconheceu a exigibilidade que já foram pagos de metade dos seus creditos pelo orçamento anterior, devendo, pois, effectuar-se o pagamento, conforme a verba que foi inserta no orçamento presente á approvação do sr. ministro do reino.

Creio, porém, que s. exa., informado pela representação que a camara municipal do concelho de Vianna do Castello vae fazer a proposito das indicações que lhe foram feitas n'aquelle despacho, reconhecerá que é absolutamente impossivel á camara conformar-se e obedecer a essas ordens..

Para outro ponto desejo chamar tambem a attenção de s. exa.

N'esse mesmo despacho foi tambem alterada uma verba destinada ás despezas de fiscalisação dos impostos indirectos.

Para essa fiscalisação inscreveu a camara no seu orçamento uma determinada quantia, e pelo despacho de s. exa. é essa quantia reduzida, declarando-se que no novo orçamento não poderá ser superior a 620$000 réis com destino a pagar a um fiscal na rasão de 500 réis diarios e a cinco guardas á rasão de 240 réis cada um.

Ora, parece-me excessivo das attribuições do sr. ministro do reino fixar uma quantia certa para uma despeza eventual que póde ser maior ou menor segundo o numero de empregados, segundo as necessidades e natureza da fiscalisação, tornando-se por conseguinte impossivel determinar precisamente o que cada individuo receberá de ordenado pois poderá ser em muitos casos inferior ao que se fixou, como em muitos outros não poderá deixar de excedel-o.

Ao mesmo tempo vejo que no ministerio do reino não ha opinião assente a este respeito, porque em despacho de dezembro do anno findo, o sr. ministro do reino declarava que as despezas de fiscalisação de impostos indirectos deviam limitar-se aos ordenados a um fiscal e a quatro guardas, e na indicação feita á camara municipal de Vianna do Castello em despacho de 17 de janeiro do anno corrente auctorisam-se cinco fiscaes. Ora mais, ora menos!

Permitta-me s. exa. o sr. ministro do reino que lhe assevere que a verba de 620$000 réis auctorisada por s. exa. é insufficiente, para se poder fazer a fiscalisação, como é necessario fazer, para uma exacta cobrança dos impostos indirectos, tanto mais que a camara municipal de Vianna do Castello se tem esforçado por fazer uma severa e exacta arrecadação d'esses impostos.

Assim o rendimento do anno de 1894-1895 foi de 14 contos de réis, e o do anno findo foi de 18, approximando-se muito de 19 contos de réis.

Ora isto tem-se conseguido sem attrictos nem difficuldades, simplesmente com a severidade de uma fiscalisação que realmente augmentou o rendimento primitivo, parecendo-me, portanto, que este ponto deve merecer dos poderes publicos attenção e deferimento.

Acontece ainda que os encargos das camaras municipaes dos concelhos de primeira ordem têem sempre subido, de maneira que luctam com gravissimas difficuldades para poderem fazer face às obrigações que lhes são impostas, e isto torna indispensavel que ellas arrecadem o maximo dos seus rendimentos.

N'esta questão da fiscalisação dos impostos indirectos reconheço que o sr. ministro do reino obrou dentro dos limites das suas attribuições legaes, mas o meu fim era simplesmente chamar para esta parte a attenção de s. exa., ponderando-lhe que, havendo a camara municipal de Vianna do Castello mais de uma vez representado neste sentido, tem a meu ver sobrada rasão para solicitar de s. exa. que modifique a sua opinião, permittindo-lhe que despenda mais do que a quantia que se indica no despacho de reforma do orçamento, a fim de que o municipio não veja aggravada a situação em que se encontra, e ao mesmo tempo para que se não commettam fraudes que arruinam o commercio licito.

Quanto ao primeiro ponto, parece-me que por erradas informações fornecidas ao sr. ministro do reino se estabeleceu uma restricção às liberdades da camara municipal, que reputo contraria a direito.

Não se podia mandar distribuir por differentes credores da camara municipal, verbas das quites, umas eram legadas, outras economisadas pelas juntas respectivas e todas destinadas á construcção de cemiterios.

Se me quizesse alongar em considerações, poderia dizer quanto é importante, sobretudo no Minho, na maior parte das suas freguezias, a creação de cemiterios; mas quero limitar-me quanto possivel a uma exposição succinta do meu aviso previo.

Com respeito aos demais credores que têem direitos já reconhecidos, approvados pela corporação respectiva, não podem esses direitos ser prejudicados, e não podem deixar de se inscrever no orçamento do anno proximo, quantias que já estavam inscriptas no anno passado.

Eram estas as considerações que tinha a fazer sobre o aviso previo, que tive a honra de mandar para a mesa.

O sr. Presidente do Conselho (José Luciano de Castro): - As observações que acaba de fazer perante a camara o illustre deputado o sr. Malheiro Reymão, tenho apenas a responder que entendi dever conformar-me com as informações que da respectiva direcção geral recebi sobre o assumpto.

Se estivesse prevenido dos termos em que s. exa. fez as suas considerações, teria vindo munido com essas informações e não teria duvida em as ler á camara para que s. exa. visse que eu não tive em vista fazer politica com a camara municipal de Vianna, e que apenas segui as indicações que pela repartição competente me foram dadas passagem, a s. exa., que sou inteira-

Direi

de

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mente opposto ao systema centralisador estabelecido pelo código administrativo em vigor, mas sou forcado a respeital-o, visto que é lei do estado.

Em todos os assumptos que se relacionam com o orçamento, são sempre apresentadas informações para eu sobre elles resolver, chegando muitas vezes até a serem-me apresentados processos sobre a nomeação de um coveiro ou de um sacristão. E sobre essas informares que eu resolvo sempre, e nunca levado por qualquer espirito político.

No caso de que se trata fiz a mesma cousa: li a informação que me foi apresentada, e parecendo-me judiciosa, conformei-me com ella.

Quanto á verba que foi. englobada para pagar aos credores do município, parece-me que as observações de s. exa. não são inteiramente procedente, porque o que se quiz foi englobar as verbas de maneira que se pagasse igualmente a todos os credores, o que não quer dizer que é indispensável que se pague a todos no anno a que pertence e orçamento; por isso que se póde pagar em annos differentes.

Pelo que respeita á receita destinada á construcção de cemitérios, e que s. exa. disse que pertence a duas juntas de parochia e que portanto não podia ser distratada, o pensamento que presidiu á resolução do poder central, foi de que esta receita, embora derivada de legados especiaes, constituía receita da junta de parochia, e que tendo a receita da junta de parochia passado para a camara municipal, ficava fazendo parte das receitas do município.

. Disse s, exa. tambem que a camara municipal de Vianna ia representar ao governo, fazendo observações e reparos sobre as clausulas que se mandavam inserir no orçamento da mesma camara. Quando essa representação me for presente examinarei o assumpto, e se achar juntas as reclamações, póde s. exa. ter a certeza de que hão de ser attendidas.

Como disse, não tenho aqui o processo, porque não vinha prevenido para esta discussão, mas se s. exa. quizer, n'outra qualquer occasião o trarei á camara, e então s. exa. verá que eu não fiz mais de que conformar-me com o parecer da respectiva direcção geral. Digo isto para provar a s. exa., que na resolução que tomei não houve nenhuma intenção política.

O sr. Malheiro Reymão:- Eu nem uma só vez proferi a palavra política.

O Orador: - Creio bem que o illustre deputado me fez justiça; mas digo que, reportando-me á informação da respectiva direcção geral, me conformei com ella, por me parecer A expressão da verdade. Como, porém, a camara municipal vae representar ao governo, eu não terei duvida em reparar qualquer injustiça que possa haver.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Oliveira Matos:- Pedi a palavra para dirigir algumas observações e perguntas ao nobre ministro do reino, que vejo presente, sobre os lamentáveis acontecimentos que se têem passado nos últimos dias na cidade de Coimbra e com que tanto se tem alarmado o paiz.

Desejava que s. exa. se dignasse informar-me e á camara se a ordem está completamente restabelecida, como parece, e se porventura ella estará bem garantida, tendo-se mantido como deve sel-o o prestigio da auctoridade, que é indispensável, attendendo-se ao mesmo tempo a todas os reclamações justas e legaes, no sentido de bem se manter e alliar tanto o exercício e manifestação da liberdade dos cidadãos, como o respeito devido áquelles que têem a obrigação em nome da lei e da segurança publica de manter a ordem na cidade de Coimbra.

A meu ver, pela experiência que tenho da minha prolongada residencia n'aquella cidade e do que costumam ser os chamados conflictos académicos, as occorrencias ali pausadas não podem ter a gravidade que se lhes tem que se lhe tem que-

rido attribuir, principalmente por parte dos exagerados exportadores de más novas, que tudo exploram.

E compraz-me ver confirmada esta minha opinião com as ultimas noticias particulares recebidas d'aquella localidade, que annunciam estar resolvida satisfactoriamente a questão levantada, não se tendo repetido hontem os tumultos e arruaças, tendo cessado as desordens, parecendo que tudo entrou no socego da vida normal e pacata da velha Coimbra.

Oxalá que assim seja.

O que agora me parece do todo o ponto conveniente é que o nobre ministro do reino, desejando informar-se minuciosamente do que se passou, para poder tomar as providencias que o caso reclama, mande proceder a um rigoroso inquérito ácerca das cansas mas remotas ou próximas, casuaes ou propositadas, que motivaram este desagradável conflicto, que podia ter tido graves consequencias, e que foi precedido de incidentes, que precisam ser esclarecidos para o apuramento dag responsabilidades a liquidar.

É necessário, é indispensável mesmo terminar por uma vez, para socego e tranquillidade de todos, com. um certo mal-estar que ha tempos se vinha fazendo notar na cidade de Coimbra, e .que parece originado na fraqueza da auctoridade universitária em desaccordo com a auctoridade civil.

Devem apurar-se as verdadeiras responsabilidades de cada um desses poderes, e tambem as dos que os desacataram, dando causa ao conflicto.; E, apurada toda a verdade com a serenidade e circumspecção que o melindroso assumpto exige, que sejam punidos conforme o merecerem aquelles que tenham commettido faltas, excessos ou abusos, quer sejam os representantes da auctoridade, quer aquelles que lhes faltassem ao respeito a ella devido, resistindo ostensivamente às suas ordens e promovendo o tumulto e a anarchia, saindo fora dos limites legaes.

O sr. ministro do reino, que algumas informações officiaes já deve ter, não ignora de certo qual foi a origem d'aquelles tumultos, que podiam ter consequencias graves, mal calculados pela irreflexão juvenil dos promotores,
Ha algum tempo que se vem manifestando na opinião publica da cidade de Coimbra, e na dos seus mais considerados habitantes e homens de sciencia, o receio de sérios conflictos académicos e universitários, motivados pela fraqueza d'aquelle a quem competia manter firmemente a disciplina, apasiguar os animos por Vezes exaltados da mocidade irrequieta, sendo paternal e bondoso, sem deixar de ser enérgico e inflexível, fazendo respeitar-se e ao logar que occupa, quando fosse preciso.

É- me muito desagradável, sr. presidente, fazer neste logar apreciações que possam magoar alguem, e muito mais aquelles que merecem o meu respeito é a minha consideração, e com cujas relações e amisade me honro; mas superior a todas as considerações pessoaes está o cumprimento do meu dever e a necessidade de, no interesse publico, na causa da manutenção da ordem, segurança individual e respeito às instituições e auctoridades que as representam, dizer o que em minha consciencia entendo ser justo e verdadeiro.

O sr. reitor da universidade, a quem tenho de me referir, um venerando e respeitável ancião, conhecido e considerado em todo o paiz e justamente considerado tambem no estrangeiro pelos seus notáveis trabalhos, como um sábio e erudito professor, um homem honesto, laborioso, e de incontestado merecimento, que tem desempenhado dignamente todas as commissões do serviço publico que durante a sua longa vida lho têem sido confiadas, acha-se de tal forma enfraquecido pelo adiantado dos annos, o pelos achaques de doença de que tanto soffre, estando quasi sempre de cama, que não possue hoje, a força de vida, a energia o acção necessárias e indispensáveis, para poder

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desempenhar, suficientemente que seja, os funcções do alto e melindroso cargo que lhe esta confiado.

Todos o sabem e reconhecem. Sem offensa nem desdouro para s. exa. é esta infelizmente a pura verdade.

Não esta no meu animo amesquinhar os méritos que tem e os relevantes serviços prestados por aquelle illustre funccionario, ao seu paiz, nem faltar a merecida consideração e respeito que lhe é devido e lhe tributo, mas como não póde prolongar-se indefinidamente a sua permanencia n'um logar que não póde exercer, como não podo nem deve continuar a sustentar-se a causa que tantos males tem produzido ao ensino, ao professorado e A academia, e que de dia para dia augmentam, augmentando o desprestigio do nosso primeiro estabelecimento scientifico, eu não posso deixar do chamar especialmente a attenção do illustre ministro do reino para a reitoria da universidade.

Eu bem o sei, bem o vejo, como está sendo desagradável e até doloroso para o sr. conselheiro José Luciano, o illustre ministro do Reino, que é vizinho, particular e dedicado amigo velho e admirador das distinctas qualidades que exornam o venerando funccionario a quem me refiro; mas perdoe-me a. exa. que eu lho diga, ainda que luso magoe a sua nobilíssima alma e os mais delicados e respeitáveis sentimentos do amisade, que s. exa., como verdadeiro estadista que é, como ministro do reino, zelosa pela causa da instrucção e pela da ordem publica, não póde antepor, nem decerto anteporá, conheço a firmeza do seu caracter, as suas sympathias e affeições pessoaes. ao cumprimento, embora doloroso, de um dever que se lhe impõe tomando uma medida que é geralmente reclamada como urgente e indispensável.

O actual sr. reitor não póde nem deve continuar a manter-se A testa daquelle nosso estabelecimento scientifico, que precisa ser superiormente dirigido por quem tenha os requisitos, que hoje faltam ao alquebrado e bom velhinho, que se acha sem força nem auctoridade para dignamente poder manter o prestigio de tão importante logar. . .

Não póde nem deve prolongar-se a cansa primordial e originaria, pela indisciplina e relaxo a que tudo chegou, de um mal que tantos males tem causado e que mais póde causar ainda se, por desventura se não tomarem immediatas providencias.

Ha erros e faltas graves a emendar, o talvez mesmo a castigar, para que as cousas na universidade e em Coimbra entrem num verdadeiro caminho de ordem, paz e tranquilidade, com proveito de todos, mas o remédio deve assentar em bases solidas e duradoiras, para que o mal se não repita dentro em pouco.

É preciso que com o termo dos conflictos e arruaças na rua, se ponha tambem termo aos conflitos e incidentes entre a auctoridade universitária e a civil, em manifesta desharmonia pelas fraquezas e tolerancias lamentáveis da primeira.

Urge acabar com o estado de anarchia que ultimamente se tem manifestado, ora tudo e todos, dentro e fora da universidade, com desgosto para o illustrado corpo docente, com prejuízo para o ensino, com desconsideração para com o decoro do nosso primeiro estabelecimento scientifico. e com offensa para a lei e desprestigio da auctoridade, de que resultaram as lamentáveis occorrencias entre a academia e a policia, que a todas contristam como um notável symptoma de decadencia e errada comprehensão de deveres e direitos..

E o melhor é, que ninguém quer ficar com a culpa do que de censurável o alarmante BO tem passado nos últimos dias, desculpando-se cada qual o melhor que podo e tentando declinar de si a responsabilidade, que a alguém de ve caber.

Sr. presidente, eu não desejo nem é intenção minha, accusar seja quem for,, som rasão; e não só queira ver nas minhas palavras serenas e desapaixonados, sem politica nem feição partidária, que ponho do parte em questões de ordem publica, a mais levo desconsideração da minha parte, para com o digno reitor da universidade cujas qualidades pessoaes admiro e respeito pelo seu glorioso passado, ou para com a illustre academia, que eu muito prexo e a quem presto a homenagem que lhe é devida; mas entendo que é preciso apurar-se toda a verdade Acerca dos actos .que se passaram o deram logar aos tumultos que tanto alarmaram por esse paiz fora as innumeras familias dos estudantes e alteraram com prejuízo e grave risco a tranquilidade da pacifica cidade do Coimbra, que só queixa, porque muito soffre, com taes distúrbios que perturbam a sua vida normal.

Entendo que não podem nem devem ficar impunes os promotores, se os houve, ou os culpados, dos motins e desordens que a policia foi obrigada a reprimir com violencia, tendo do empregar a força para restabelecer a ordem e se fazer respeitar; mas tambem entendo que se por parte da auctoridade houve excessos ou abusos desnecessarios que se não justifiquem, ella deve ser censurada conforme o merecer.

O que é porém preciso constatar, porque se affirma como certo, por noticias fidedignas recebidas da localidade, é que a verdadeira e única origem dos conflictos que determinaram a intervenção da força policial para os reprimir na estacão do caminho de ferro, no regresso da commissão académica que fora ao Porto, se baseou na resistencia accentuada As ordens do commissario do policia, que . antes dá. desordem aconselhara e prevenira, que não consentia manifestações e as prohibira terminantemente, tendo so empregado o uso da força quando se viu desacatado desobedecido menos respeitosamente.

A ser assim, não podaria o representante da auctorida , de proceder de outra forma.

O primeiro dever de todo o cidadão português é a obdiencia e o respeito as determinações e ordens da auctoridado, bem o deve sabor a academia que é muito illustrada, e não póde haver leis de excepção para qualquer classe ou indivíduo.

Quem desobedece sujeita-se As consequências, porque o representante da poderes constituídos, aquelle a quem esta confiada a manutenção da ordem publica, que tem por obrigação garantir a segurança individual, seria indigno do logar que lhe confiaram se o não soubesse manter a toda a altura do seu prestigio.

Se o grupo académico se tem submettido, acatando as ordens do commissario, como lhe cumpria, o que em nada offendia os seus brios e idéas políticas differentes o até muito adversas das que a auctoridade tem obrigação de defender, decerto que a repressão violenta só teria evitado e aos submettidos restava o direito de, poios meios legaes, protestarem depois contra a violência ou arbitrariedade de que se julgassem victimas.

Dentro da lei, nos limites da ordem, ha recursos para a expansão e manifestação de todos os direitos, como de todas as liberdades.

Mas, infelizmente, e por algumas vozes o tenho prasenceado em Coimbra, ha entre a academia quem julgue que póde ser superior A lei o A auctoridade, e que o melhor meio de fazer triumphar as suas idéas avançadas de opposição As instituições, é resistir, desobedecer, promover arruaças e conflictos que obriguem A repressão violenta, para depois haver rasões de queixa contra a auctoridade. . .

Felizmente que a grande maioria, a quasi totalidade da nobre o digna academia, assim não pensa nem usa taes processos.

Mas, repito, apuro-se toda a verdade, não se accuse nem censuro ninguém injustamente, e apurada que seja, castiguem-se os culpados e por igual se punam os delinquentes, para salutar exemplo, sejam académicos, sejam funccionarios.
Quem o merecer, que soffra.

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E dada a competencia e seriedade do digníssimo delegado governo, que em commissão acaba de ser mandado a Coimbra, o sr. D. João de Alarcão, que a todos merece confiança pelo seu caracter e bom senso, é de esperar, que não só tenham acabado, como já se diz, todas as manifestações de desordem, mas que as responsabilidades se apurem por completo, como é indispensável.

O espirito publico em Coimbra, agitou-se bastante, inquietou-se mesmo; e devo dizer, não era apoiando o grupo académico com quem se deram os distúrbios que elle se manifestava com mais vehemencia e energia. Que o nobre ministro do reino o pondere.

Eu não quero, já o disse, formular accusações a ninguém, mas tendo obrigação de acompanhar o movimento dessa opinião, da minha querida Coimbra e dos meus amigos que de lá me informam, devo dizer que ella era mais favorável ao procedimento da auctoridade do commissario de policia, que acaba de receber inequívocas provas de estima e consideração publica, por parte dos mais grados habitantes da cidade, sem distracção do cor política. Pode ter havido algum excesso ou violencia na execução das medidas repressivas, mas dada a alteração da ordem e a desobediencia formal, o primeiro dever do commissario era, mantel-a como fez, e por isso não me parece que seja merecedor das censuras e accusações tão exageradas que se lhe fazem, pois é preciso dar o devido desconto á paixão partidária dos ânimos juvenis exaltados, e aos bons desejos de ha muitos manifestados por certos académicos contra o enérgico e destemido commissario, que em defeza da ordem e das instituições monarchicas e poderes constituídos, tem por vezes destemidamente arriscado a vida.

V. exa., sr. ministro do reino, é liberal convicto, reconhecido pelos seus nobres sentimentos, tantas vezes manifestados na defeza das nossas liberdades ameaçadas, mas não deixará, não consentirá, que em nome da liberdade se commettam abusos e desacatos comdemnaveis, porque então deixaria de ser liberal para ser tolerante e fraco; e permittindo a licença e a anarchia assumiria a grave responsabilidade das consequencias dessa fraqueza, que seria um crime no momento histórico que vamos atravessando.

Felizmente, a sua honrada e gloriosa tradição de homem enérgico, de justiceiro, de mantenedor da ordem e rigoroso sustentáculo das instituições, dá-nos a garantia de que agora como sempre, saberá cumprir dignamente os seus deveres, mantendo a toda a altura o prestigio da auctoridade, attendendo às reclamações da academia se forem justas, e fazendo respeitar o direito, a liberdade e a ordem, como suprema auctoridade em quem todos confiam e de quem tudo esperam.

E terminando ouso rogar a v. exa., que se porventura, pelas informações officiaes que tem, poder dar á camara alguma noticia que tranquillise completamente paiz ácerca das noticias alarmantes de Coimbra, tenha a bondade de o fazer, agradecendo desde já a benevolência de s. exa. O sr. Presidente do Conselho e Ministro do Reino (Luciano de Castro):- Posso dar a s. exa. noticias absolutamente tranquilizadoras ácerca do estado da ordem publica em Coimbra.

Os tumultos e as desordens que ameaçaram a paz e a tranquillidade publica naquella cidade, acabaram completamente.

As providencias tomadas pelo sr. governador civil do districto de Lisboa, que para ali mandei em commissão, pelo aperto e urgência das circumstancias, por estar fora de Coimbra, retido por doença de pessoa de família o sr. governador civil effectivo, e haver pedido a demissão o substituto, fizeram cessar por completo todos os receios de alteração da ordem. Hoje mesmo recebi noticias que me asseguram não haver o menor receio de que ella seja alterada.

Quanto às providencias a tomar para concluir a obra apenas iniciada, dei instrucções precisas e categóricas ao sr. governador civil para fazer instaurar os competentes processos, e averiguar dos excessos que se attribuem ao commissario de policia, que foi suspenso, para se proceder com toda a justiça e imparcialidade.

A missão que o sr. governador civil começou a desempenhar está ainda no seu principio, e aquella auctoridade não sairá de Coimbra emquanto a sua obra não estiver completa.

Estão instaurados os processos contra aquelles que promoveram a alteração na ordem publica e começada uma investigação administrativa pelos excessos de que a academia de Coimbra arguiu o commissario de policia.

Este, como disse, foi suspenso porque o sr. governador civil entendeu que elle não dispunha da tranquillidade e serenidade de espirito indispensáveis para manter a ordem, e porque tendo a commissão académica apresentado- queixas contra elle ao sr. governador civil substituto, essas queixas deviam ser examinadas e só o podiam ser desde que o commissario de policia fosse suspenso e se procedesse a immediatas averiguações. Como disse, a suspensão do commissario de policia tranquillisou a cidade e tranquillisou igualmente a academia. Besta liquidar as responsabilidades, quer do commissario de policia, quer dos académicos que ameaçaram por vezes perturbarem a ordem publica.

Quanto ao sr. reitor da universidade, permitta-me o illustre deputado dizer-lhe que eu tenho a responsabilidade de manter a ordem publica, e que emquanto eu mantiver no seu logar aquele funccionario, que é um ancião respeitável, (Apoiados} um sábio illustre, um homem que tem passado a sua vida no serviço das letras e da pátria, só eu sou o responsável perante o parlamento por qualquer alteração na ordem publica, É a mim que s. exa. tem a dirigir-se e não a elle.

Bem sei que s. exa. fallou delle com grande respeito, com grande veneração pelas suas altas qualidades e relevantes serviços, mas desde que se referiu a elle como funccionario, a minha obrigação é dizer que para responder por elle estou eu aqui. Se entender, dever substituil-o pensarei na maneira mais conveniente de o fazer; mas emquanto elle estiver á testa da universidade assumo a responsabilidade dos seus actos perante o parlamento.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente:- Tem a palavra o sr. Ribeiro Coelho.

Previno a v. exa. de que se entra na ordem do dia às quatro horas e meia.

O sr. Ribeiro Coelho: - Sr. presidente, pedi a palavra para solicitar do nobre ministro dias obras publicas o seu decidido apoio em favor, da construcção das linhas férreas da Regua a Chaves e de Mirandella a Bragança. S. exa., que tão desvelado empenho tem manifestado pelo desenvolvimento das forças económicas do paiz, certamente ha de acolher com interesse e benevolência a rápida exposição que vou dirigir-lhe, no intuito de patentear aos olhos de s. exa. a inadiável necessidade de dotar a província de Traz os Montes com aquelles dois importantíssimos melhoramentos.

Seja-me permittido iniciar constatando p desamor com que a província de Traz os Montes tem sido tratada por todos os governos do nosso paiz.

Desde 1860 tem-se realisado largos melhoramentos em Portugal, e todavia a província de Traz Montes quasi não tem sido quinhoeira desses melhoramentos.

Para o provar bastará dizer que com uma extensão de 11:000 e tantos kilometros quadrados, tem apenas 919 kilometros de estradas e estas no mais deplorável estado, e 55 kilometros de linha férrea de penetração, e está de via reduzida.

Ao passo que se quizesse comparar esta província com um dos districtos mais pequenos, encontraria que o distri-

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cto de Aveiro, com uma extensão cinco vozes menor, tem igual numero de estradas e é atravessado por uma linha ferrea de via larga.

Não sei, sr. presidente, como explicar o abandono a que tem sido votada a provincia de Traz os Montes. Tenho ouvido explicar este facto, verdadeiramente estranhavel, pelo desconhecimento que vae nas altas regiões do poder, dos recursos naturaes d'esta provinda, recursos consideraveis, que se não têem desenvolvido á mingua de meios de transporte rapido o facil. (Apoiados.)

Não me parece que nenhum homem publico do nosso paiz possa ignorar que o artigo de exportação que mais pena na nossa balança commercial é o artigo «vinho do Porto», e que este artigo é produzido na sua quasi totalidade na região compreendida entre o valle do Corgo e o valle do Sabor. Apesar da crise que atravessamos, e apesar de não terem sido devidamente acautelados os nossos interesses nos tratados commerciaes, a exportação dos vinhos denominados do Porto representa 6:000 e tantos contos annuaes, em oiro!

Parece-me que esta quantia é alguma cousa importante.

Mas não é só o vinho generoso que constitue a riqueza da provincia de Traz os Montes. É necessario desconhecer completamente as condições economicas d'esta provincia para se presumir que ella não tem largos recursos de vida, que inteligentemente explorados seriam lançados no seio da economia nacional, concorrendo assim para a prosperidade publica.

Esta provincia produz abundantemente todos os generos agricolas, e do mais fino quilate.

Não venho apresentar uma memoria economica da provincia de Traz os Montes; por isso alem da região vinicola indicarei apenas o valle, que se estende entre Villa Pouca, Valle Passos, Chaves e a fronteira hespanhola.

Este valle é de tal maneira fertil e rico em productos agricolas, que bastava elle para inundar com os seus productos uma grande parte do paiz. E não são só os generos agricolas que constituem a riqueza d'aquella provincia. Na proprio sub-solo alojam-se jazigos mineraes de primeira ordem. Ha minas de amianto, estanho, ferro, chumbo e antimonio, e se ellas não estão exploradas é isso devido á falta de vias de facil transporto. Especialisarei um verdadeiro thesouro de riqueza, que parece ignorado nas altas regiões do poder. Refiro-me ás minas de marmore e alabastro de Santo Adrião, no concelho de Vimioso; estas minas constituem uma enorme montanha de riquezas que seriam precisos seculos para esgotal-as.

É para lamentar que estes importantissimos jazigos não estejam ainda ligados por um caminho de ferro, ou por uma estrada municipal sequer, á circulação geral do paiz. Foi necessario que a companhia que actualmente explora este thesouro se dispozesse a construir uma estrada que ligue estas minas com a estrada hespanhola de Zamora a Alcaniças. Este facto á tanto mais para estranhar, quanto é certo que as estradas no paiz abundam e até em algumas regiões superabundam para os propriedades dos influentes politicos.

É para estranhar que os poderes publicos não tenham para isto olhos de ver e não saibam auxiliar a exploração de uma riqueza, que podia engrandecer-nos e até certo ponto melhorar mesmo a situação economica do paiz. (Apoiados.)

As duas unicas capitaes de districto que não ouviram ainda o silvo da locomotiva a vapor são Villa Real e Bragança. Não sei atinar com uma explicação satisfactoria, e muito menos absolutoria do procedimento dos governos.

Aquella provincia, alem de possuir tão grandes elementos de riqueza, anda em dia com todos as suas contribuições, inclusive o imposto de sangue, dando um largo contingente dos seus filhos não só para os seus regimentos, mas até para o preenchimento das lacunas de outras provincias, onde a politica tem isentado do serviço militar milhares de mancebos.

N'uma epocha, em que a cada passo celebrâmos com justiça as glorias dos nossos heroes, será justo que eu lembro á camara e ao governo, que se Mousinho de Albuquerque cinge uma aureola de gloria, deve-o não só ao seu heroismo, mas principalmente ás batalhas em que o poderio do regulo Gungunhana foi abatido e aniquilado. Pois n'essas batalhas pelejou o bravo regimento do caça dores 3. Este regimento tem o seu quartel em Bragança; os seus soldados são transmontanos. N'essas batalhas os filhos de Traz os Montes bateram-se como leões. (Apoiados.)

Parecia-me, portanto, que aquella provincia devia merecer mais favor aos poderes publicos. (Apoiados.) Ella tem poucas estradas, e essas quasi completamente intransitaveis. Tem apenas uma linha ferrea de penetração, a de Foz Tua a Mirandella.

E nada mais.

Desejava que o sr. ministro das obras publicas se interessasse deveras pela construcção do caminho de ferro da Regua a Chaves, construcção que não traz encargo para o estado. Esta linha percorrerá o valle do Corgo, enjoa vinhedos recuperarão o seu antigo esplendor. Alem d'isso percorrerá o planalto de Villa Real fertilissimo em generos agricolas. Depois atravessará o valle de Chaves, valle extensissimo e uberrimo, que é, se não o primeiro, um dos primeiros do paiz.

s generos agricolas, que n'aquella região alcançam um preço diminutissimo, subiriam immediatamente, porque seriam lançados no seio do paiz pela linha ferrea, cooperando assim na reorganisação da economia nacional.

Alem d'isso as thermas de Vidago, Pedras Salgadas, Chaves, etc., attrahiriam maior concorrencia de indigenas e estrangeiros, que facilmente poderiam aproveitar as admiraveis virtudes therapeuticos das mencionadas thermas. (Apoiados.)

É com relação ao caminho de ferro de Mirandella a Bragança, direi, que á uma linha ferrea muito facil de construir, porque não tem obras de arte, nem grandes aterros, nem trincheiras, e tem um percurso relativamente pequeno. Parece-me que o districto de Bragança merecerá e compensará bem qualquer sacrificio, que o estado tiver de fazer na construcção d'esta linha ferrea, que é a aspiração legitima d'aquelles povos, o que é de toda a justiça que se faça.

Desde 186O que se têem feito grandes melhoramentos no paiz, mas a provincia da Traz os Montes tem sido votada quasi ao abandono por todos os governos; tem sido tratada como filha espuria, e não como outra qualquer fracção do paiz.

Todo o meu pezar é, sr. presidente, não ter auctoridade nem influencia para convocar os meus collegas da provincia do Traz os Montas para constituirmos uma liga de defeza dos interesse d'esta provincia, para instarmos incessantemente junto do governo até que justiça fosse feita, e satisfação fosse dada ás legitimas aspirações da transmontanos; isto sem prejuizo e com independencia das sympathias politicas de cada um.

Lembram ainda que depois de esgotados as minas do Brazil, o marquez de Pombal descobriu as minas do Alto Doura, que tem sido o melhor elemento da nossa balança commercial; mas estas minas têem sido menosprezadas pelos governos modernos, que pouco ou nenhum auxilio têem prestado ao Alto Douro.

Peço ao sr. ministro das obras publicas que empenhe toda a sua actividade e zêlo em favor da construcção immediata do caminho de ferro da Regua a Chaves, e promova quanto, possa a construcção do caminho de ferro de Mirandella a Bragança.

Sei que a concessão do caminho de ferro da Regua o Chaves está dada; sei tambem que surgiram difficuldades,

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mas estas dificuldades são faceis de resolver. Os concessionarios pedem com justiça que se insira no contrato uma clausula que os ponha a par de quaesquer concessionarios que porventura se proponham de futuro construir qualquer linha ferrea que passe ou termine em Chaves.

Eu sei que o sr. ministro das obras publicas poderá responder-me, que na epocha de grave crise que atravessamos não será a occasião mais propria para se effectuarem estes melhoramentos. Eu direi desde já a s. exa. que este argumento não me convence e até o averbo de contraproducente. Entendo que é exactamente nas epochas de grandes crises que é mister desenvolvermos com mais energia o trabalho nacional, promovendo assim a riqueza publica. Não comprehendo como é que se quer debellar a crise, deixando paralysar o trabalho e a circulação dos productos, que é um estimulo poderosissimo da producção das utilidades indispensaveis á existencia e desenvolvimento da nação. Se nos acostâmos ao auxilio estranho, bem cruel será o desengano. O estrangeiro, se parece auxiliar-nos como dez é para nos explorar como cem ou mil.

Como n'esta casa se usa invocar a cada momento o que se passa lá fóra, lembrarei que a Italia fez a maior parte dos seus caminhos de ferro justamente nas epochas das mais desoladoras crises. Portanto, não colhe o argumento derivado do facto de atravessarmos uma grande crise.

Demais, sr. presidente, com a decima parte do que se tem gasto desde 1890 em lavagens de frontispicios de edificios publicos em Lisboa, tinham-se construido muitos caminhos de ferro.

Quando tanto se despende em obras, que nem eram indispensaveis nem urgentes, não se póde argumentar com as precarias circumstancias do thesouro para cohonestar a incuria na constatação de linhas ferreas utilissimas.

O sr. Presidente: - Está a dar a hora.

O Orador: - Eu termino já.

É preciso fazer economias, diz-se; mas para fazel-as é necessario sabel-as fazer com criterio. As despezas reproductivas devem fazer-se do par com as economias; de outra sorte, sob calor de economias, reduziremos o paiz á miseria. Ora não ha despezas mais reproductivas do que aquellas que se fazem com a abertura de vias ferreas nas regiões aonde ha riquezas importantes a desenvolver, como succede com a provincia transmontana.

Peço, pois, ao sr. ministro das obras publicas que attenda a estas considerações e faça com que os caminhos do ferro da Regua a Chaves e de Mirandella a Bragança não fiquem para as kalendas gregas.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Augusto José da Cunha): - Ouvi com a toda a attenção as ponderações feitas pelo illustre deputado, e creio que s. exa. tem alguma rasão nas suas queixas a respeito de um certo abandono em que se encontra a provincia de Traz os Montes em relação ás outras provincias.

As causas d'esse abandono, do atrazo de viação que soffre a provincia de Traz os Montes, são devidas ás difficuldades de acudir a toda a parte com os recursos necessarios para desenvolver a viação. Os recursos não são grandes, as exigencias são muitas e o governo tem, como é natural, muita difficuldade em distribuir convenientemente esses recursos.

A respeito do caminho de ferro de Villa Real a Chaves, s. exa. sabe que está feita a respectiva concessão, concessão feita já pelo actual governo.

O assumpto foi estudado, veiu á camara e fez-se a concessão; não appareceram, porém, capitães para se emprehender esse caminho de ferro. Os concessionarios pretendem que se modifique um pouco o contrato, que se lhes garanta um juro dos seus capitaes, mas esta questão de garantia de juro, como s. exa. sabe, é hoje realmente bem pouco sympathica.

A garantia de juro foi um principio seguido durante muitos annos, mas a experiencia tem feito reconhecer que não dá bom resultado na pratica, porque põe os concessionarios num certo desleixo de velar pelos interesses das suas emprezas. É esta a difficuldade quedem havido, creio eu, em começar os trabalhos para a construcção d'aquella via ferrea e duvido mesmo que, ainda que se insira no contrato alguma condição relativa á garantia de juro, condição que é hypothetica e não definitiva, ella de o resultado que s. exa. deseja; entretanto essa questão ha de ser estudada. S. exa. póde mesmo apresentar na camara um projecto de lei, que o governo o estudará e fará o que julgar mais conveniente para se encetarem os trabalhos d'aquella linha ferrea.

Quanto á outra via ferrea não ha por emquanto estudos, feitos.

É isto o que tenho a dizer ao illustre deputado.

(S. exa. não reviu.)

OBDEM DO DIA

Continua em discussão o projecto n.° 25 de 1897

O sr. Presidente: - Continua com a palavra, que lhe ficou reservada da ultima sessão, o sr. Marianno de Carvalho.

O sr. Marianno de Carvalho: - Continua no uso da palavra, que lhe ficou reservada, embora não esteja presente o sr. ministro da marinha, porque, nada tem a dizer de desagradavel para s. exa.

Como não está ligado a partido algum, combate o governo ou defende-o, conforme lhe parece justo.

Contra o que tencionava, tem de referir-se hoje, embora de leve, a uma questão que é para elle, orador, muito desagradavel.

Durante a leitura, feita pelo sr. primeiro secretario, do oficio do sr. Barbosa de Magalhães, não póde apanhar todas as minuciosidades da redacção d'esse officio, e por isso, só depois de o ver impresso, é que notou que na copia do outro officio, n'aquelle incluido, e que lhe fôra dirigido, havia uma lacuna que tom bastante importancia.

Alem d'isto, na narrativa que n'esse officio se faz das diversas sessões da commissão do ultramar, omitte-se uma, e isto tambem tem importancia.

Novamente narra o orador os factos que se deram no anno passado, mostrando que a commissão do ultramar resolvera que o artigo 68.° da proposta do governo e transformado no artigo 71.° do projecto, se redigisse de fórma que as concessões, que envolvessem direitos de soberania e as que excedessem 50:000 hectares, ficassem dependentes da sanação das cortes, por ser este o pensamento do governo, ficando o sr. Barbosa de Magalhães encarregado de escrever o parecer, e formular o projecto n'essa conformidade.

Quando, porém, este, já impresso, foi publicado, viu que o artigo 71.°, se correspondia ao pensamento do governo quanto às concessões que envolvessem direitos de soberania, não correspondia, no que respeita às concessões de mais de 50:000 hectares.

O sr. ministro da marinha, que era o sr. Barros Gomes, notou esta alteração, que attribuiu a equivoco, e declarou que se faria uma emenda. Fez-se effectivamente, e elle, orador, assignou-a, como vencido em parte, por entender que todas as concessões superiores a 10:000 hectares devem ser sujeitas á sancção parlamentar.

Na ultima terça feira, chegando mais tarde á commissão do ultramar, a que estava presidindo o sr. Elvino de Brito, que lhe cedeu logo o seu logar, via sobre a mesa um officio tarjado de preto, que lhe era dirigido, e, abrindo-o, encontrou n'elle um officio do sr. Barbosa de Magalhães, acompanhando a emenda votada pela commissão.

Antes de encerrar a sessão apresentou a emenda, mas pediu licença para reservar o officio, porque, tendo-lhe este causado algum reparo, precisava, a respeito d'elle, conversar com o sr. Barbosa de Magalhães.

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O sr. Franco Frazão: - Pergunta se s. exa., n'essa occasião, leu a emenda á commissão.

O Orador: - Responde que não leu a emenda nem tinha necessidade de a ler, visto estar assignada e portanto ser conhecida pelos membros da commissão.

O sr. Franco Frazão: - Como v. exa. appellou para o testemunho dos membros da commissão do ultramar, permitta-me v. exa. que, na minha qualidade de membro d'essa commissão, lhe diga que havia membros da actual commissão, e eram a maioria, que não tinham assignado aquella emenda e eu era um d'elles, e por isso não podiam ter sabido a que emenda v. exa. se referia quando tão sybilinamente e sem a ler a ella se referiu.

Se v. exa. me dá licença, digo o que se passou no meu espirito.

Eu nunca tinha ouvido fallar em tal emenda, e pergunto se podia porventura saber o que ella era sem a ouvir ler? V. exa., que nos merece toda a confiança, não tinha julgado necessario fazel-o nem dizer nada sobre a emenda e, não obstante isso e tendo d'ella completo conhecimento, veiu depois para a camara fallar sobre a alteração do artigo 71.° sem referencia á emenda!

Eu nada disse aqui sobre a emenda, porque no meu espirito não existia um vislumbre sequer de suspeita de que se tratava de uma emenda do anno passado e de tal importancia que isentava o governo e a commissão da responsabilidade que sobre elles se queria fazer recair.

Isto é importante e convem que seja repisado.

V. exa. não leu i, commissão do ultramar a emenda ao artigo 71.° A fórma como noticiou a soa recepção foi tão laconica, que bastantes dos membros da commissão não podiam nem poderam saber de que emenda se tratava.

V. exa., conhecendo a emenda, que até assignára, fallou aqui da adulteração do artigo 71.°, deixando pairar suspeitas sobre todos, não se referindo nem por sombras á existencia da emenda.

A commissão do ultramar devia talvez ter pedido a v. exa. que lesse a emenda que recebera, mas confiou no seu presidente, convencida de que elle não deixaria de fazer a leitura de um documento importante para a discussão, que muito teria esclarecido a commissão se lhe fosse communicado, e cujo conhecimento pela camara teria evitado algumas afirmações pouco uteis para o governo, para as instituições e para a dignidade d'este parlamento.

O Orador: - Comprehende que o sr. deputado não conhecesse o texto da emenda, visto que só este anno faz parte da commissão; mas devia suppor que ella era do anno passado, porque a commissão resolveu não apresentar emendas este anno, salvas, já se vê; as emendas propostas individualmente.

Pela sua parte, não póde ser suspeito de querer ficar com a emenda, porque a apresentou á commissão.

Voltando ao officio enviado á mesa pelo sr. Barbosa de Magalhães, diz que na copia do officio que s. exa. lhe dirigiu, e que ali vem inserto, falta a palavra «sómente» antes das palavras «em sua sessão de 17 de agosto de 1897». Esta falta altera o sentido do documento, e porque isto tem importancia, deseja que esse officio seja publicado com as considerações que está, expondo.

É o seguinte:

«Ex.mo sr. -Não podendo com parecer á sessão de hoje da illustre commissão do ultramar, de que v. exa. é digno presidente, tenho a honra de enviar a v. exa., para ser presente á mesma commissão, a substituição que ella, sómente em sua sessão de 17 de agosto de 1897, resolveu que eu, como relator, propozesse ao artigo 71.° do projecto de lei n.° 25, quando o mesmo projecto, já então impresso e distribuido ha muitos dias, entrasse era discussão na camara dos senhores deputados, o que na sessão parlamentar do anno passado não houve occasião de fazer.

«Isto explica a rasão por que do parecer impresso em 21 de julho do mesmo anno não podia ainda constar aquella substituição posteriormente deliberada.

«Deus guarde a v. exa. Lisboa, 1 de fevereiro de 1898.- Ex.mo sr. presidente da commissão do ultramar. = J. M. Barbosa da Magalhães.»

Lendo em seguida as declarações do sr. relator e as do sr. ministro da marinha, affirma que o procedimento de a. exa. foi perfeitamente correcto, sendo-lhe muito grato fazer esta declaração, porque gosta de fazer justiça a todos.

Passa depois o orador a fazer differentes considerações em referencia a alguns artigos do titulo 3.° do projecto, indicando ao mesmo tempo algumas modificações que julga necessarias.

E se só agora as apresenta é por não ter podido assistir á discussão d'aquelle titulo na commissão, a qual, desde já declara, não tornará a presidir.

Assim, não está do accordo com as clausulas que se contêem noa §§ 6.°, 7.° e 8.° Do mesmo modo discorda da disposição do § 19.°, que entende dever ser modificado.. Se o não for, dará em resultado não ser possivel continuar a haver credito predial em Africa.

O orador entra depois na apreciação do artigo 71.° e pede a attenção da camara para o artigo 67.° que, tal como está redigido, não fica claro. Este artigo prende-se com concessões feitas pelo commissario regio, Mousinho de Albuquerque.

E a proposito, entende dever dizer á camara que, sendo certo ter combatido actos d'este commissario regio, como tambem combateu actos do sr. Antonio Ennes e do sr. Neves Ferreira, que igualmente desempenhavam funcções similhantes, não é porque não tenha muita consideração por Mansinho, e narra a camara que em 1890 o conhecia apenas de nome. As suas relações começaram em Moçambique, onde viu que elle estava prompto a prestar todos os serviços que lhe reclamassem no ultramar.

Mais tarde teve intimo e amigavel convivio com Mousinho em Lourenço Marques, onde era governador do districto, e elle, orador, commissario regio, em missão de estudo unicamente.

D'esse convivio concluiu que podia haver a mais completa confiança, no valor militar e na honestidade do seu caracter.

A confiança no valor militar resulta de diversos factos e entre elles o deter elaborado Mousinho um projecto de segurança militar que elle, orador, achou muitissimo bom.

Aponta ainda o seguinte facto. No periodo mais difficil da guerra com os vatuas, propunha-se o valente capitão Geraldes, digno emulo de Caldas Xavier, ir a Manjacaze, onde estava o Gungunhana, prendel-o e trazel-o preso para Lourenço Marques, e Mousinho declarou que tambem iria, pois que tinha sido convidado para esta temerosa empreza.

Quanto á sua probidade pessoal, bastará dizer que quando elle, orador, chegou a Lourenço Marques encontrou Mousinho de Albuquerque embaraçado com uma enorme quantidade de concessões feitas pela camara e que elle queria destruir, mas sem saber como. Suggeriu-lhe então idéas em virtude das quaes era possivel reivindicar para o estado essas concessões, aniquilando-as; e procedeu assim, porque calculou quantos explorações não andariam em roda de Mousinho de Albuquerque, que era pobre como agora é.

Em volta dos grandes homens têem torneado as ambições, cansando-lhes bastantes degostos, como succedeu com Fontes, Loulé, Passos o Saldanha, e a mesma idéa que faz d'estes vultos fez, na sua esphera, de Mousinho de Albuquerque.

Mas, d'ahi a applaudir todos os seus actos vae uma grande distancia.

Passa em seguida a analysar se nas concessões feitas

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por Mousinho de Albuquerque ha algumas que caibam dentro do decreto que se discute.

Não conhece as condições de arrendamento das terras do Chai-Chai, mas conhece outras em que as clausulas do arrendamento estão fóra da alçada do poder executivo.

Por isso entende que as concessões de Mousinho de Albuquerque devem ficar sujeitas á sancção parlamentar.

Faz mais algumas considerações sobre as concessões de terrenos, e termina pedindo ao governo que declare se essas concessões ficam suspensas e sujeitas á decisão do poder legislativo.

(O discurso será publicado na integra quando o orador o restituir.}

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - Sr. presidente, ao pedir a palavra dois fins me animaram; um, esclarecer a verdade dos factos sobre que directamente fui interpellado; outro, trazer á camara a discussão serena e pacifica do projecto, pondo de parte suspeições que entendo que n'este momento vão cair completamente no chão. Eu entendo que a camara deve discutir serena e imparcialmente, á luz das muitas intelligencias dos membros d'esta casa e da sua competencia, este problema, que é importante, que urge resolver, e que o governo entendeu propor ás camaras. Este problema já o governo transacto o apreciára pela mesma fórma.

Um d'stes fins está já completamente conseguido; portanto, uma parte principal do meu esforço caducou.

O illustre deputado que usou da palavra antes de mim, analysou o projecto, discutiu-o, combateu-o nas suas deficiencias e creio que mandou ou mandará para a mesa emendas, mas dando, em todo o caso, á commissão indicações, de entre as quaes ella acceitará de certo as que julgar aproveitaveis.

S. exa. collocou a questão precisamente no terreno em que, por amor do paiz e dignidade desta casa, eu desejava que ella só mantivesse: Folgo muito de eu não ter que empenhar esforços cara conseguir um resultado desde já conquistado pela competencia e illustração do sr. deputado que me precedeu.

Na questão de facto, porém, eu desejaria dizer alguma cousa para a collocar, segundo a força da minha memoria, ao abrigo de qualquer discussão.

Eu vim intervir n'esta questão muito especialmente por um dever de lealdade.

O sr. Barbosa de Magalhães procurou-me em minha casa e mostrou-me, antes de mandar para a mesa, o officio que toda a camara conhece já, appellando para a minha memoria que, embora fraca, não deixa de recordar-se dos factos, uma vez que alguem a ajude indicando a sequencia d'elles, para ver se eu podia dizer qualquer cousa que se tornasse necessaria para confirmar com o testemunho presencial as palavras d'aquelle cavalheiro.

Eu disse a s. exa. que a exposição dos factos, pelo menos nas suas linhas geraes, era absolutamente exacta e que não tinha duvida em vir á camara confirmar, na parte que me dizia respeito, as animações de s. exa. A isso vim.

O sr. Marianno de Carvalho alludiu á existencia de uma segunda sessão a que o sr. Barbosa de Magalhães não alludira, seguramente por se não lembrar, sessão em que se leu o parecer e em que se notou a divergencia que existia entre as resoluções da commissão, que se verificou, lembro-me d'isso, n'um domingo.

Essa sessão foi convocada para a uma hora da tarde e discutiu-se até às sete horas, já com luxes, analysando-se artigo por artigo, paragrapho por paragrapho, o projecto e, no fim da discussão, estando já todos cansados, votou-se o artigo, que não era o 71.° da minha proposta, mas o 68.°, sobre a sancção parlamentar a dar ás concessões. Ora, nada mais natural que, depois de seis horas de debate, de uma discussão tão longa, quando já alguns membros da commissão se haviam levantado para se retirarem, que não fosse facil ao sr. relator apanhar o sentido preciso e exacto das resoluções tomadas. Houve de pois uma segunda sessão, que se verificou de noite, e quando o sr. Marianno de Carvalho alludiu a ella, referindo-se ás minhas palavras, eu fiz do meu logar um signal de assentimento, que ao illustre deputado pareceu ser uma referencia a essa parte, mas como d'ahi se tiraram talvez illações no sentido de que eu contestára a afirmação feita no officio do sr. Barbosa de Magalhães, eu quero destruir essa impressão.

É certo o que o illustre deputado disse, e eu confirmo, que havia n'esse ponto uma lacuna. A exposição feita pelo sr. Marianno de Carvalho é, portanto, perfeitamente exacta com relação á ordem dos factos, mas isso não invalida as affirmações do sr. Barbosa de Magalhães.

A este respeito devo dizer que tem havido um bocadinho de politica, porque nós não sabemos; todos abstrabir-nos do desejo de ver as galerias muito concorridas. A politica, porém, leva-nos ás vezes tão longo, que se procede injustamente. Hoje são v. exa., ámanhã somos nós, senão mudarmos de habitos. A gravidade do momento, porém, é tal, que seria bom que todos mudassem de orientação. Pela minha parte, prezo-me de nunca ter levantado questões que pozessem em duvida a honestidade dos ministros.

E, agora, pergunto ao meu sympathico amigo pessoal, mas inimigo politico, o sr. Jacinto Candido, se valia a pena, n'estas circumstancias, levantar uma questão, que, tanto aqui, como lá fóra, commoveu o espirito publico e animou os debates nesta camara? Pergunto a s. exa. se valia a pena levantar esta bulha ácerca de uma suspeita, quando na propria opposição se encontrava quem a podesse desvanecer por completo. Ha n'esse lado da camara dois conspicuos deputados que a podiam desvanecer. s. exa. ignorava essa circumstancia?!...

O sr. Jacinto Cândido: - Interrompendo o orador, declara que não quiz levantar uma questão de caracter escandaloso; seria isso contrario ao sen espirito, quando para o fazer não tivesse um fundamento seguro.

Do que tratou foi de justificar a questão previa que havia sido proposta. Quem fez uma affirmação com essa caracter foi o sr. ministro da marinha quando disse que o projecto não representava o pensamento da commissão, o que equivalia a dizer que estava falsificado.

O Orador: - Essa explicação vem mais uma vez affirmar os seus principios. Nós, os homens publicos, como v. exa. sabe, vivemos numa atmosphera de suspeição, e portanto, todo o nosso empenho deve ser evitar por todas as fórmas dar origem a essas suspeições.

Pois v. exa. não viram ainda outro dia, a proposito da questão dos exclusivos, levantar-se de repente no Porto e correr com fóros de verdade a affirmação de que o parlamento e o governo tinham querido aproveitar-se do momento de distracção, em que aquella cidade realisava festas em honra de Mousinho de Albuquerque, para, subrepticiamente, se fazer a pprovação de um projecto que contrariava os interesses da industria, projecto que tinha sido apresentado pela administração transacta, que o governo actual tinha mantido, e que se não estava na tela do debate, pelo menos podia ser discutido pela imprensa, porque fôra apresentado ha tempo?

Não viram essa suspeição, e ácerca d'ella pretender-se mover as massas e os operarios?

Não ha acto algum do governo que não levante immediatamente uma suspeita sobre a probidade dos homens publicos em Portugal.

Ê uma situação desgraçada. Contribua, por isso, v. exa. contribua eu, o governo, toda a camara, que deve prezar as instituições parlamentares, para levantar o prestigio e a auctoridade do poder; contribuamos todos para acabar com esta desgraçada situação, que é o martyrio dos ho-

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mens publicos, que só por um sentimento muito forte do dever é que se sentam n'estas cadeiras. (Apoiados.)

O sr. ministro da marinha póde ter esquecido um momento, por qualquer circumstancia, os factos succedidos o anno passado; isso acontece a todos; mas s. exa. preveniu lealmente a camara de que ácerca daquelle artigo as intenções do governo eram outras.

Eu appello para todos que conhecem o sr. ministro da marinha, para que digam se este cavalheiro não á um homem animado unicamente do cumprimento do seu dever, tendo arreigado o sentimento de brio...

O sr. Teixeira de Sousa: - Ninguem poz isso em duvida. (Apoiados.}

(Aportes.)

O Orador: - As explicações vem, e eu estimo-as, mão podia talvez discutisse de outra fórma.

O illustre ex-ministro da marinha, o sr. Ferreiro de Almeida, propor que o projecto voltasse á commissão, mas v. exa. sabe que ha necessidades muito naturaes nos trabalhos parlamentares que obrigam ás vezes a precipitar o debate.

Dou d'isso um exemplo.

O anno passado, antes de estarem promptos os pareceres sobre as medidas de fazenda, aproveitou-se o tempo para tratar de projectos de marinha e ultramar. Durante um certo tempo teve logar a discussão d'esses projectos e agora mesmo, a proposto da conversão, foi esse projecto retirado para ser revisto pela commissão, tendo o meu collega da fazenda submettido á apreciação da camara dois alvitres, ou continuar os debates sobre o projecto, apresentando-se as emendas durante a discussão, ou recolher o projecto á commissão, para ellas serem ali apresentadas, o que a s. exa. lhe parecia mais conveniente para o andamento dos trabalhos parlamentares, porque assim se conseguia aproveitar este tempo.

A camara adoptou este alvitre, e o projecto foi novamente á commissão para ali se estudarem as propostas apresentadas pelo governo.

Entretanto, foi o projecto das concessões no ultramar dado para a discussão, levantando-se logo que ella se iniciou o debate em que estamos empenhados, e que se teria evitado se na commissão do ultramar ne procedesse de outra fórma.

O sr. Marianno de Carvalho: - Peço a v. exa. o obsequio de declarar que o illustre deputado procedeu sempre correcta e lealmente na commissão do ultramar a que presidiu, assim como correcta e lealmente o governo tem sempre procedido para com s. exa.

Ainda hontem, quando estava reunida a commissão do orçamento para discutir o orçamento do ministro dos estrangeiros, s. exa. fez uma pergunta, sobre a qual recebeu uma resposta clara e explicita, da qual s. exa. poderá usar na apreciação que porventura possa fazer d'esse assumpto aqui na camara; mas lamento que não fosse lido no seio da commissão o officio do sr. Barbosa de Magalhães, por isso que alguns membros da commissão não tinham conhecimento da emenda, e porque, naturalmente, este debate não teria tomado as proporções que tomou, e no espirito esclarecido e na consciencia recta do sr. Jacinto Candido não se teriam levantado suspeições de especie alguma.

Mas, como ia dizendo, resolveu-se que este debate seguisse desde já, para se aproveitar o momento em que a camara estava menos occupada em trabalhos, e porque podia haver inconveniente em que as emendas se accumulassem por tal fórma, que o projecto fosse annullado nas suas bases essenciaes.

Este projecto não devia, por consequencia, provocar uma discussão d'esta ordem. As suas linhas geraes soo a definição clara do que cabe ao parlamento e ao governo central sobre concessões, a definição das terras, e a definição precisa de quaes sejam as garantias de seriedade que devem ter as emprezas a que sejam concedidas, para que não haja especulação.

Eu não contesto nem a importancia, nem a conveniencia, nem mesmo a parte pratica de muitas das indicações do sr. Marianno de Carvalho; pelo contrario, algumas são muitas judiciosas, e vem de um homem que tem uma alta competencia, que conhece directamente os colonias e que tem elementos para poder esclarecer o debate.

Aproveitem-se as emendas, estudem-se com cuidado, mas, pergunto eu, ellas alteram porventura essencialmente as linhas geraes do projecto?

Sabem todos perfeitamente, e os factos o estão demonstrado, como o sr. ministro da marinha podia aproveitar-se das circumstancias particulares de momento, para andar para diante o resolver estas intrincadas questões, mas não o fez, e ou julgo não só absolutamente correcto, mas absolutamente conveniente o procedimento de s. exa.

Dito isto, e conseguido que entremos no cominho iniciado pelo sr. Marianno de Carvalho, espero que esta questão primaria, que tinha suscitado interesse geral, cáia pela base, e que concluamos pacifica e amigavelmente o exame do projecto, para que em seguida demos logar com completa placidez á questão gravissima da conversão, que é importante para a nossa existencia como nação honrada
e livre. (Apoiados.}

Mais uma vez, fazendo referencia ás palavras dos ilustres chefes do partido regenerador, o sr. Hintze Ribeiro, e o sr. João Franco, hoje ausente, appello para s. exa., o fim de, com o seu tacto politico, experiencia e responsabilidades tão definidos da seus actos, cooperem com o governo, para sair d'aqui uma lei que possa ser apresentada aos credores estrangeirou, como o producto da harmonia, do paz e da boa inteligencia entre os partidos monarchicos, n'uma questão capital para elles, e em que sejam defendidos os interesses da nação. Conto com esse concurso. Da parte do nobre presidente do conselho, que tem a responsabilidade principal da politica do governo, esta declaração tem sido aqui feito por um modo o mais peremptorio e affirmada em palavras as mais claras.

Quando eu o anno passado trouxe á camara a questão dos melhoramentos do porto de Lourenço Marques, levantaram-se immediatamente suspeições, dizendo-se que ia beneficiar amigos e levantar a questão internacional. Como é sabido, a imprensa anti-monarchica levantou duvidas e objecções para lançar suspeições ás mãos cheias sobre todos nos. Dirigi-me então aos dois illustres chefes da opposição, acima de tudo homens de estado, amigos do seu paiz e homens de bem, dizendo-lhes: «Vejamos, como homens de estado, amigo do paiz e homens do bem, onde estão os deficiencias do projecto e onde desejam que elle seja modificado, pois que eu acceito todos os modificações que vão de accordo com os interesses do paiz e não modifiquem a idéa principal e essencial de levar por diante os melhoramentos do porto de Lourenço Marques, por uma fórma prudente, não levantando questões internacionaes, e tendo em attenção os nossos recursos.

Da parte de s. exa. encontrei a mais franca, leal e patriotica cooperação, acceitando eu modificações ao projecto em tudo quanto no seu espirito esclarecido levantara duvido ou suscitara difficuldades.

Viemos á camara, e dos dois lados encontrei apoio com relação áquelle projecto.

Ainda com relação a esta questão, que é capital, porque eu entendo que nós não podemos viver eternamente no regimen do decreto-travão, n'esta anarchia, que é preciso liquidar, porque póde trazer graves complicações internacionaes, appellei tambem para o chefe da opposição

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246 DIARIO DA CAMARA DOS 8ENHOEES DEPUTADOS

n'esta casa, o sr. João Franco, que levantou a duvida das concessões não ficarem dependentes da sanação parlamentar, mas da parte do qual encontrei o melhor apoio. E se o projecto não se discutiu o anno passado, não foi por circumstancias dependentes da vontade do sr. João Franco, que estava prompto a cumprir a sua palavra e discutir o projeto no sentido de o melhorar.

A politica de hoje não póde ser a de crear estorvos ao governo. A nossa missão é tão grave, as nossas responsabilidades são tamanhas, que o que se deve é desejar ver resolvida a questão de fazenda, e não nos estarmos a preoccupar com estas pequenas questões que, desauctorisando o parlamento e o poder, em nada contribuem para o bem do paiz.

Vou terminar, mas antes devo declarar que as concessões feitas pelo sr. commissario regio hão de vir todas á camara.

O sr. Marianno de Carvalho: - Mas ficam suspensas até as côrtes resolverem?

O Orador: - O sr. ministro da marinha de certo que se dará pressa em trazel-as aqui e provocar sobre ellas uma resolução da camara.

Quem as recebeu, recebeu-as dentro dos limites e bases da legislação actual, portanto, o decreto-travão está em vigor. O governo podia tel-as feito, mas não as fez para não complicar a situação politica. Quem recebeu essas concessões sujeitou-se á legislação que vigorava na epocha em que foram feitas, e se as camaras as quizerem derogar estão no direito de o fazer.

O governo entretanto, repito, dar-se-ha pressa em trazel-as á camara para se resolver esta situação.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Luiz de Magalhães: - Sr. presidente, serei muito breve, não só porque não sou orador... de grande folego, mas porque me parece que os tempos, que vão correndo, são mais para obras do que para palavras.

Cabe-me a vez de fallar depois do meu illustre e prezadissimo amigo, o sr. Barros Gomes.

S. exa. sabe a profunda e sincera amisade que lhe dedico e a grande admiração que tenho pelo seu caracter, pelo seu talento e pelas suas qualidades de estadista. As nossas relações nasceram da amisade commum por um grande e nobilissimo espirito, cuja perda o paus inteiro deplora, e é ainda hoje a saudade d'essa memoria querida um dos fortes laços que reciprocamente nos prendem.

Não leve, pois, s. exa. a mal, nem tome isso como um acto de menos consideração da minha parte, que eu não responda á passagem do seu discurso relativa a esse caso chamado da falsificação, que aqui foi levantado e que tão triste e lamentavel se me afigura para o prestigio e decoro do parlamento. E não o faço por uma rasão muito simples, que eu lealmente exporei á camara: tenho as minhas relações cortadas com o sr. Barbosa de Magalhães, e, n'estes termos, creio que os mais elementares principios do cavalheirismo me vedam o discutir, em publico, os seus actos e as suas palavras. (Apoiados.)

Mas não me parece que esse caso seja essencial para a questão levantada aqui pelo meu querido amigo o sr. Jacinto Candido sobre a proposta do sr. Ferreira de Almeida. A questão da falsificação é uma questão puramente incidental. A questão previa é que é, a meu ver, a questão importante; porque o que é urgente resolver é se, depois do que aqui se revelou, o projecto deve voltar á commissão ou ser discutido na camara conjunctamente com as emendas. (Apoiados.)

Eu não tenho auctoridade para fallar em nome do partido regenerador, porque não sou regenerador; mas supponho que, d'este lado da camara, aquella questão partiu sem o menor intuito politico e simplesmente com o desejo de facilitar a discussão de um projecto que se refere a um assumpto importantissimo, pois se prende com os processos da valorisação dos nossos dominios coloniaes, preciosos recursos que podem vir a se para nós, uma das mais fortes garantias da conservação da nossa idependencia economica.

Ora submetter o projecto a nova revisão da commissão respectiva era, de certo, o meio de o fazer discutir mais rapidamente; e eu julgo que tanto o governo como a camara estão de accordo quanto á necessidadede uma discussão immediata de tal projecto, pois que n'elle se fixam normas da administração ultramarina: em que bom é que de uma vez se assente. (Apoiados.)

Indo á commissão as emendas, lá seriam apreciadas mais rapidamente, porque as commissões são um parlamento reduzido, não na ali galerias que estimulem o prurido da rhetorica, falla-se menos, resolve-se com mais presteza, as paixões partidarias não se acirram tanto como aqui na camara, e quando um projecto como este, sem caracter politico, aqui viesse devidamente emendado e modificado, a sua discussão seria breve, a sua votação immediata e ficaria, assim, regulado, sem attritos, um assumpto importantissimo como este.

O governo, porém, não acceitando a indicação da opposição parlamentar, procedeu, a meu ver, impoliticamente e provocou, com desastrada inhabilidade um escandalo, que melhor seria se não tivesse dado. (Apoiados.)

Mas, alem disto, é realmente para estranhar que, por uma especie de perrice, permitia-se-me o termo, se tivesse deixado tomar um caracter irritante a esta questão das concessões ultramarinas, questão a que ninguem d'este lado da camara pensou dar côr politica, e que se tivesse feito protelar um debate esteril, que tão bem podia ter-se evitado, quando me parece que nós estamos n'uma situação em que o tempo se não póde malbaratar, porque mais importante do que este projecto ha um outro, que já está dado para discussão,- projecto que devia antecipar-se a este, como a todo e qualquer outro, pois se refere, a um assumpto que é para nós de vida ou de morte: á questão da conversão.

Em vez, porém, de dar a preferencia devida a esse assumpto primacial, o governo sacrifica-o a outros, sujeitando-o a uma dilação, que não sei se aproveitará á propria politica do gabinete ou virá a ser-lhe nefasta...

Sr. presidente, a questão de fazenda é a questão suprema, é a questão vital da nossa situação presente. (Apoiados.)

E estando aqui a prender-nos com questiúnculas de processos parlamentares, com byzantinices regimentaes, n'um momento tão grave como este, damos á Europa, que está com os olhos fixos em nós (porque com a nossa situação financeira tem travados interesses proprios) uma tristissima demonstração da nossa insouciance politica, da inconsciencia com que olhâmos e encaramos certos problemas, de cuja solução está dependente nada menos de que o futuro do nosso paiz! Porque a verdade, é que estamos sob a imminencia de um perigo, que parecemos inteiramente desconhecer!

Recordo-me, agora, de um dito do meu illustre amigo e grande tribuno, o sr. visconde de Chanceleiros, que, se me não engano, s. exa. aqui referiu na camara. Andando uma vez s. exa. nas suas propriedades da Cortegana, encontrou-se com alguns officiaes de engenheria, que andavam em estudos e trabalhos do campo. Perguntando-lhes qual o objecto d'essa missão militar, foi-lhe respondido que procediam, por ordem de Fontes, então ministro da guerra, a estudos sobre as linhas de defeza de Lisboa. Então o grande orador disse aos officiaes que o seu trabalho era inutil, que a linha de defeza devia ser outra e recommendou-lhes que, quando estivessem com Fontes, lhe dissessem que elle é que sabia por onde o inimigo havia de entrar em Lisboa.

Mais tarde, encontrando-se com o ministro, este inquiriu, com curiosidade, qual era essa passagem estrategica

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desconhecida, por onde o estrangeiro tão facilmente nos podia invadir. Ao que s. exa. respondeu: «É pela junta do credito publico!»

Foram uma prophecia estas palavras! Effectivamente ahi está já aberta a brecha por onde o inimigo ha de penetrar aqui!

E sendo esta a nossa situação, situação cheia de gravidade, cheia do perigos, estamos a perder tempo com questões regimentaes, e o governo não duvida provocar um incidente desnecessario e, sob todos os pontos de vista, lamentavel, pela sua recusa tenaz em acceitar uma proposta que era garantia de uma discussão seria, proficua e rapida, em assumpto de tanto alcance como este! (Apoiados.)

Não é, sr. presidente, que eu não entenda que seja urgente a discussão d'este projecto. Julgo-a mesmo urgentissima e por tres rasões principaes que passo a expor.

A primeira é porque, por elle, se estabelecerá a regulamentação definitiva das concessões no ultramar, o que não é indifferente, pois essas concessões têem sido feitas duma fórma um tanto anarchica, como o proprio sr. ministro da marinha o confessou.

A segunda é porque n'este capitulo se fixarão, por fim, as attribuições dos commissarios regios e dos governadores do ultramar, o que de certa fórma equivale a resolver um ponto grave dia direito publico.

E a terceira, finalmente, por uma consideração muito especial, que foi justamente a que me determinou a pedir a palavra n'este debate.

A proposito de concessões ultramarinas e da discussão d'este projecto, formou-se aqui (sem que da parte de ninguem -já o digo! -houvesse o minimo intuito de a crear, e só pela fórma como a questão foi posta) uma atmosphera, não direi de suspeita, mas de duvida e de mysterio, propicios á formação de suspeitas e equivocos, que, alastrando lá para fóra, determinou uma falsa e errada corrente de opinião, contra a qual, não ha muitos dias ainda, um notavel jornalista levantou na imprensa o primeiro grito de protesto.

Ora essas duvidas envolviam o nome de um homem, que todos devemos respeitar, mais do que respeitar, amar! não só pelos seus heroicos feitos, pela magnanimidade do seu coração, pela sua elevação moral, mas porque a elle devemos essa inebriante sensação de orgulho, que todos sentimos, quando, pela sua bravura epica, vimos a nossa patria elevar-se de novo, aos olhos do mundo, pelo prestigio da espada e do valor guerreiro! (Muitos apoiados,)

A verdade, sr. presidente, é que, logo depois da primeira sessão, em que aqui se tratou das concessões ultramarinas, começou a suppor-se lá fóra que essas monstruosas cedencias de territorios do estado, a que varios oradores haviam alludido, eram todas da responsabilidade do actual commissario regio de Moçambique!

O Sr. Ferreira de Almeida, referindo-se a outras concessões, fallou aqui em concessões de milhões de hectares, e lá fará immediatamente se julgou que todos esses milhões de hectares concedidos representavam dissipações administrativas de Mousinho de Albuquerque, que estava partindo em fatias a provincia de Moçambique para a dar de mão beijada aos seus apaniguados e amigos!

Ora, preoccupado com estes erroneos juizos (que, se não attingiam o caracter do homem, porque esse está, como o seu heroismo, acima de toda a duvida, attingiam, comtudo, os seus creditos de administrador prudente e zeloso) e sendo amigo pessoal de Mousinho de Albuquerque, procurei informar-me do que fossem essas decantadas concessões, e, com grande satisfação minha, verifiquei que a bem pouco se reduziam. Porque, depois de ter estudado o assumpto, eu posso dizer d'aqui, á camara e ao paiz, que, durante a sua administração na provincia de Moçambique, Mousinho de Albuquerque não fez uma unica concessão territorial, no sentido restricto, no sentido proprio da palavra!

Todas essas concessões se reduzem a puros e simples arrendamentos, a prasos relativamente curtos, um por quarenta annos, outro por vinte o cinco, e os restantes por dezenove annos e meio, ou d'ahi para baixo.

Não ha, pois, concessões, porque não ha alienação de propriedade. Se os contratos de arrendamento são maus, o que agora não discuto, não têem o contra das alienações in perpetuam. Mais tarde, terminado o arrendamento, póde tratar-se em melhores condições.

Eu não quero usurpar as attribuições do sr. ministro da marinha, que é quem, me parece, podia expor isto á camara; mas no que vou dizer não ha inconfidencia de secretaria, pois todos esses contratos são do dominio publico, visto haverem sido publicados no Boletim official da provincia de Moçambique.

O quadro das condições, dentro de que esses arrendamentos foram feitos, póde considerar-se apertadissimo. Afóra os arrendamentos de exclusivos, a que depois me referirei, todos os de territorios são, como disse, a prasos relativamente curtos, com severas penalidades e o direito de rescisão no caso de não cumprimento, por parte dos arrendatarios, das obrigações que lhes são impostas.

Em todos elles ha a fiscalisação do poder central nas obras que os arrendatarios façam e a reversão para o estado, ao fim do contrato, de todos os terrenos arrendados e todos os immoveis n'elle construidos, sem que pela sua parte o estado seja obrigado a dar a minima indemnisação aos concessionarios.

Não ha nenhuma isenção de impostos nem mesmo no uso de obras feitas pelo proprio concessionario, como caes acostaveis, pontes do embarque e desembarque, etc., onde as mercadorias embarcadas ou desembarcadas ficam sujeitas às taxas regulamentares.

As companhias que se constituirem hão de ser portuguezas e não ha direito de transferencia para estrangeiros, nem de sublocação a terceiro, sem o consentimento do poder central.

Dois terços do pessoal d'essas companhias, quer sejam empregados superiores, quer operarios, hão de ser portuguezes.

Se o governo precisar de fazer a expropriação de algum dos terrenos que tiverem sido arrendados, e em que se hajam feito obras, essa expropriação ha de ser paga, não pelo valor que taes obras possam haver dado ao terreno, mas apenas pelo valor do material empregado nas construcções.

As rendas são pagas adiantadas, e a maxima area de cada uma d'essas concessões é de 1:500 hectares. D'aqui a essas de milhões de hectares, a que se referiu o sr. Ferreira de Almeida e que equivaliam quasi a cessões de districtos inteiros, vae, me parece, uma differença bastante grande!

De resto, o numero d'essas concessões até hoje feitas é insignificante, uma meia duzia d'ellas apenas. É relativamente á de Chai-chai, a que se referiu o sr. Marianno de Carvalho, devo dizer que ella não estava feita ainda e que conhecida a anterior, o commissario regio não deferiu o requerimento, em que era pedida.

Quanto a concessões do exclusivos, são apenas tres: uma de dynamite que ficou sem effeito, porque estava já anteriormente dada a outro concessionario, o que o commissario regio ignorava; outra do lotarias de corridas de cavallos (e não de jogo, como se disse), com obrigação da construcção de um hyppodromo e de um club em Lourenço Marques, de cujos beneficios liquidos o governo do districto aufere uma percentagem de 30 por cento para fins de beneficencia publica (fundação de um albergue nocturno, de um dispensario, cozinhas economicas, etc.);e a da moagem do trigo, por fim que representa a creação de uma industria nova, tendo adstricto um arrendamento de

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1:000 hectares de terreno, com obrigação da fundação de dez colonias agricolas com familias portuguezas, e cujo pensamento fomentador é evidente e claro.

A hora, porém, vae adiantada e eu não me alongo mais n'esta exposição, por o julgar desnecessario, em vista de um pedido que vou fazer ao sr. ministro da marinha: e esse pedido é que s. exa. traga quanto antes á camara as concessões feitas por Mousinho de Albuquerque, para aqui serem discutidas e apreciadas e para, n'este grave assumpto, se discriminarem e liquidarem responsabilidades.

É preciso acabar de vez com essa lenda que faz do commissario regio de Moçambique um dictador façanhudo e intransigente, sempre em revolta contra os principios do governo representativo. (Apoiados.)

São esses, alem de tudo, os desejos do proprio Mousinho de Albuquerque, que não duvidaria até, se lhe permittissem, aproveitando-se para isso o governo de uma disposição do actual regimento da camara, vir perante o parlamento expor e defender as concessões por elle feitas e o seu plano de administração colonial.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Arthur Montenegro: - Começa por dizer que, tendo sido o sr. dr. Barbosa de Magalhães o primitivo relator d'este projecto, se encontra elle, orador, em circumstancias muito embaraçosas, porque tem de supportar uma comparação que necessariamente lhe ha de ser desfavoravel; mas tendo sido encarregado de o substituir, não póde deixar de entrar no debate para dar aos oradores precedentes as explicações que julga convenientes.

Quando o projecto entrou em discussão, não podia ter apresentado emenda alguma em nome da commissão, porque não estava auctorisado para isso. É certo que havia uma resolução anterior da commissão, mas ninguem lh'a communicára, e não sendo o anno passado deputado, não podia por isso ter a honra de fazer parte da commissão do ultramar, nem podia ter conhecimento d'essa resolução.

E n'este ponto, se elle orador não teve culpa de tal facto, tambem não a tiveram os antigos membros da commissão que, por esquecimento, lh'o não communicaram.

Na discussão d'este projecto tem havido uma questão grande e uma questão pequena: a questão pequena foi a meramente regimental, que está completamente elucidada; a grande é propriamente a que respeita á economia do projecto, um dos mais importantes de que um parlamento se póde occupar.

Entrando proprimente na economia do projecto, declara que lhe cumpre rectificar as considerações do sr. Marianno de Carvalho, quando disse «que os alvitres apresentados este anno na commissão o tinham alterado profundamente».

Em primeiro logar tem a dizer que na commissão simplesmente se conversou sobre alvitres; apresentaram-se versas opiniões, sem se assentarem formulas algumas, por parecer desnecessario, fazer um segundo projecto sobre emendas, quando depois havia a fazer o definitivo.

Na verdade os alvitres propostos, se foram importantes no sentido de não serem pueris, em nada alteram a economia fundamental do projecto.

Na enumeração das suppostas questões fundamentaes referiu-se o sr. Marianno de Carvalho a tres pontos. Em primeiro logar, fallou no alvitre que preferia á venda dos terrenos não cultivados pelo concessionario, á condição de os declarar pertencentes ao estado. Esta questão é na verdade importante, mas em nada altera a economia do projecto, cujo fim, debaixo d'este ponto de vista, é não deixar na mão do concessionario, que se revele pouco interessado pelas suas concessões, terrenos ao abandono; tirar-lh'os por meios energicos, declarando-os novamente propriedade do governo, ou por meio mais suave, pol-os novamente em praça, é debaixo d'este ponto de vista questão secundaria.

Ainda o sr. Marianno de Carvalho se referiu ao alvitre apresentado para se fazer a planta, não no praso de tres mezes, como determinava o projecto, mas sómente á maneira que se fosse cultivando. Esta é a outra questão tambem importante em si, mas secundaria no projecto. O ponto que o projecto teve em vista, foi encaminhar á confecção de um registo completo e verdadeiro da propriedade immobiliaria no ultramar, o que é importante. Mas que a planta se faça em tres mezes ou á maneira que se for cultivando, é questão, debaixo d'este ponto de vista, de somenos importancia.

Por ultimo o alvitre proposto relativamente aos terrenos marginaes, referidos no artigo 36.°, está nas mesmas circumstancias, pois o fim do artigo está perfeitamente attingido: é reservar sempre os terrenos marginaes de tanta importancia para a navegação.

Em seguida, o orador passa a responder ás observações apresentadas pelo sr. Marianno de Carvalho na sessão de hoje, relativamente ás disposições do projecto.

Com relação ao artigo 59.° declarou o sr. Marianno de Carvalho, que era sua opinião individual que todas as concessões excedentes a 10:000 hectares deviam ser sujeitas á sancção parlamentar.

Não repugna a elle, orador, a acceitação d'este parecer, embora seja sua opinião que as principaes garantias de seriedade hão de ser estatuidas nos proprios preceitos a que a lei sujeita a confecção previa dos respectivas contratos de concessões, pois julgo que em questões d'esta ordem, de mera regulamentação, a acção do parlamento é muito pouco efficaz.

Relativamente ao artigo 64.° § 2.°, disse o sr. Marianno de Carvalho «que não comprehendia qual a rasão por que as emprezas concessionarias hão de ter a sua sede em Lisboa ou Porto, e não n'outra qualquer terra do paiz.

A resposta está no § 3.° do mesmo artigo, quando dá ao governo o direito de escolher um certo numero de membros para a administração d'essas emprezas, porque certamente a sua escolha poderá ser mais minuciosa quando as sédes d'essas emprezas forem em Lisboa ou Porto, do que quando forem em outro qualquer ponto.

O orador ainda faz outras considerações, respondendo aos differentes argumentos apresentados pelo sr. Marianno de Carvalho, e conclue por declarar a sua preferencia pelas concessões em hasta publica, pelas maiores garantias de imparcialidade que offerecem, sempre que ellas não sejam de tal valor que exijam já uma confiança pessoal no concessionario.

(O discurso terá publicado na integra quando o orador o restituir,)

Leram-se as seguintes

Emendas

Artigo. l.º Supprimir as palavras «ou pelos costumes indigenas».

Art. 2.° Substituir a palavra «empreza» por «sociedade».

Art. 8.° «... na escala 1/500...»

Art. 8.° § 1.° «Os limites maximos de cada talhão serão, para cada povoado, fixados pelo governo em decreto especial».

§ «N'estas concessões dar-se-ha preferencia aos requerimentos para menor extensão.

Art 13.° § 1.° Substituir a phrase «multa de 500 réis»
por «multa de 100 réis».

§ 2.° Substituir o final do paragrapho desde «revertem ao estado» por «voltam de novo á praça os terrenos não regularmente aproveitados por conta do concessionario».

Art. 14.º Supprimir a palavra «quizer».

Art. 15.° § 3.° «Se o concessionario tiver saído fóra dos limites da concessão, marcados Conforme o artigo 8.°, poderá ...»

Art. 19.° «O terreno concedido será medido, e demar-

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cado officialmente, devendo o concessionario depositar na repartição de fazendo, dentro do proso de tres dias, a contar da adjudicação, a quantia julgada necessaria para as despezas de repartição e demarcação, calculadas, na conformidade da tabella que para estie fim for estabelecida pelo governador da provincia, em conselho. O governador do districto requisitará á repartição de obras publicas que preceda á medição e demarcação dos terrenos, dentro do praso de tres mezes, devendo a repartição fixar o dia em que ha de principiar tal trabalho, e avisar d'isso officialmente o interessado»!

Art. ... O concessionario será obrigado a, á medida que for cultivando o terreno concedido, fazer levantar annualmente a planta respectiva, quer por pessoa de sua escolha, quer por pessoal official.

§ No caso da planta ser levantada pelo pessoal official, observar-se-ha, na parte applicavel, o disposto no artigo 19.º

§ No caso da planta ser levantada por pessoa da escolha do concessionario, ser-lhe-ha concedido, para tal fim, pelo governo do districto, um praso de tres mezes, observando-se tambem o seguinte:

1.° Se no fim do praso asado não tiver apresentado a planta ao governo do districto, será esta mandada levantar pelo pessoal official, á custa do concessionario.

2.º (artigo 19.º, n.° 2.°).

3.º O governo do districto terá o direito de em qualquer tempo mandar verificar a exactidão das plantas feitos pelo concessionario.

§ «Se o concessionario tiver saído fóra dos limites da concessão, marcados conforme o artigo 19.°, observar-se-ha o disposto no § 3.° do artigo 15.°»

§ (artigo 19.°, § 3.°) «na escala 1/1000».

§ (Artigo 19.º, § 4.).

Art. 20.°, § 3.º: Substituir o final do artigo desde «caducará a concessão» por «voltarão de novo á praça os terrenos ainda não utilisados por conta do concessionario»,

Art. 21.°, § 1.° «Se, porem, antes de se proceder á fundação da colonia, n'uma regulo colonisavel, alguem desejar uma parcella de terreno na mesma região, poder-lhe-ha ser concedido, nos termos geraes d'esta lei».

Art. 23.º Acrescentar «... salvo o disposto no § 1.° do artigo 21.º».

N.° 1,º ... 30 hectares.»

Art. 32.°: Substituir á palavra «propriedade» por «utilisação».

Art. 33.°: Supprimir a phrase «por via do regra».

Art. 33.°, n.º 1.º : Substituir a palavra «propriedade» por «utilisação».

Art. 34.°: Substituir a palavra «propriedades» por «ter renos utilisados».

Art. 35.°, n.°4.°: Supprima-se.

Art. 36.°: Supprimir as palavras «cobertos por marés ... e os ...

Art. 37.°, § 4.°: «... tomar de aforamento ao estado».

Art. 38.° «... nos cofres da fazenda publica do districto oito dias antes do designado para a adjudicação».

Art. 39. Substituir afinal desde «indicando-se nos ...» por «sendo o adiamento annunciado immediamente».

Art. 42.°: A praça será sempre aberta para venda ou aforamento.

Art. 44.°, 45.º e 54.°: Substituir pelas disposições correspondentes da legislação geral do reino.

Art. 46.°: Substituir a phrase «todo o prego» por «o preço ou a l.ª prestação...»

Art. 47.º e 70.°: Acrescentar: ,.., «respeitados os direitos dos vizinhos».

Art. 58.°: A liquidação e a cobrança das prestações, fóros e multas relativas a concessões de terrenos, ficam » cargo do delegado do fazenda da circumscripção respectiva.

Art. 59.°, § l.° » Acrescentar «,,. e residente em territorio portuguez... = Arthur Montenegro.

Foram admittidos.

O sr. presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - O illustre deputado, o sr. Luiz de Magalhães, ao terminar o seu discurso pediu ao governo que, usando de uma faculdade que actualmente a lei lhe confere, convidasse o sr. Mousinho de Albuquerque a vir aqui, como commissario regio, defender os seus actos perante a camara.

Devo dizer, que não acceito essa indicação do sr. deputado, porque o governo perfilha todos os autos, do sr. Mousinho de Albuquerque, acceitando, por consequencia a responsabilidade d'esses actos como se por elle tivessem, sido praticados.

Se o illustre deputado, o sr. Luiz de Magalhães, não concorda com isto, apresente uma proposta de censura, discuta-se e a camara resolverá.

Pela minha parte, repito, o sr. Mousinho de Albuquerque merece a confiança ao governo, que responde por todos os seus actos,

Eu comprehendo o desejo do deputado, e respeito as puas nobres intenções, mas v. exa. ha de fazer ao governo a justiça de que elle não podia entrar n'esse caminho. Aqui não está o sr. Mousinho do Albuquerque, e se a camara acha os actos d'esse funccionario dignos de censura ou reprovação, não é a elle que deve pedir a responsabilidade, mas ao governo, que a não declina.

Repito se os illustres deputados entendem que Mousinho de Albuquerque infringiu a lei ou praticou algum acto menos conveniente, não é á personalidade do commissario regio, mas ao governo que devem pedir a responsabilidade d'estes actos.

Era esta, simplesmente, a declaração que tinha a fazer.

(S. exa. não reviu.}

O sr. Presidente): - Faltam poucos minutos para se encerrar a sessão. Segue-se a fallar o sr. Teixeira de Sousa, mas se s. exa. não quer fazer uso agora da palavra, póde reservar-se para a sessão de ámanhã.

O sr. Teixeira de Sousa: - Se v. exa. me permitte eu usarei da palavra n'esta occasião, e fal-o-hei rapidamente.

O sr. Presidente: - Tem então v. exa. a palavra.

O sr. Teixeira de Sousa: - Eu inscrevi-me na sessão de ante-hontem, e levanto-me n'esta a occasião, para fazer uma declaração que me foi incumbida pelos meus amigos politicos do partido a que tenho a honra de pertencer, vou usar da palavra, na ordem da inscripção, mas antes d'isso, dê me v. exa. licença para, em poucas palavras, fazer desapparecer a imprenso que, até certo ponto, podia ter ficado na camara e no publico, de que nós, deputados d'este lado da camara, em primeiro logar levantámos uma suspeição, e em segundo logar cenourámos os actos do sr. Mousinho de Albuquerque.

V. exa. ouviu que o sr. ministro dos estrangeiros pretendeu arrancar os applausos da sua maioria com uma affirmação absolutamente inexacta.

O sr. Jacinto Candido pronunciou aqui uma vez a palavra falsificação, mas teve o cuidado de dizer que fallava n'isso como consequencia ila affirmação feita pelo sr. ministro da marinha de que um erro typographico tinha alterado o modo do pensar e sentir da commissão, declarando ao mesmo tempo, muito categoricamente, que não tomava a responsabilidade d'essa affirmação.

Eu, que tambem entrei no debate, tive o cuidado de declarar que nós não levantámos d'este lodo da camara suspeição ácerca de nenhuma das entidades que tinha intervindo n'este projecto, e não me esqueci de declarar tambem que considerava inteiramente liquidada a situação espacial do sr. Barbosa de Magalhães.

Feita esta declaração, peço ainda licença para declarar

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a s. exa. que nós, deputados deste lado da camara, longe de amesquinhar quaesquer actos praticados pelo illustre commissario regio, pelo contrario não houve palavras que não empregassemos para exaltar o seu valor e os seus serviços.

D'este lado da camara não se fazem censuras aos actos praticados por esse illustre valente militar, e tanto que antes do digno presidente do conselho o ter elogiado, já o meu partido razia aos altos serviços d'esse illustre militar os mais calorosos e rasgados elogios, dando-lhe até a maior prova da alta consideração em que o tinha, nomeando-o commissario regio em Moçambique.

Mas a hora está adiantada, e a camara está suficientemente esclarecida ácerca dos differentes casos que se tem discutido.

V. exa. tem notado que, por cada dia que passa, novas relações se fazem, que, debaixo de ponto de vista politico são esmagadoras para o governo, para a commissão e para o decoro parlamentar. (Apoiados.}

Eu tambem concordo com o modo de ver do sr. Barros Gomes. Por dignidade de todos acabemos por uma vez com este espectaculo deprimento das instituições parlamentares. (Apoiados.} e que é mais demolidor do que toda a propaganda que todos os dias fazem os seus adversarios. (Apoiados.}

O que se apurou, porém, até agora, apesar da intervenção do sr. ministro, do sr. relator e de todos os oradores da maioria?

Levanta-se no primeiro dia o sr. relator e declara que a camara tinha reunido e tinha resolvido não apresentar emendas em seu nome, mas depois levanta-se o sr. ministro e diz que um erro typographico alterou profundamente o modo de pensar da mesma commissão. O sr. Marianno de Carvalho, que em seguida usa da palavra, diz que não foi erro typographico, e que pelo contrario havia uma alteração profunda no artigo 71.°, o mais importante do projecto, de modo que as concessões de terrenos superiores a 50:000 hectares ficavam dispensados da approvação do parlamento; finalmente, na sessão de quarta feira lê-se na mesa um officio do sr. Barbosa de Magalhães, em que declara ter remettido á commissão na terça feira a alteração do artigo 71.°, que já tinha sido assignada em agosto do anno passado, accrescentando que a commissão havia resolvido que ella fosse apresentado quando o projecto entrasse em discussão, para ser cumulativamente discutida com elle. (Apoiados.)

Então intervi eu para mostrar que o officio do sr. Barbosa de Magalhães, longe de attenuar a situação do governo e da commissão, pelo contrario a aggravava consideravelmente, por isso que emquanto a commissão declarava, aqui, na camara, que não tinha que apresentar nenhuma alteração ao projecto, já antes d'isso, quando a commissão se reuniu apreciara a proposta do sr. Barbosa de Magalhães, que tinha sido assignada em agosto do anno passado, (Apoiado.} mas o sr. relator interrompendo-me disse que a commissão não tinha conhecimento dessa emenda...

Uma voz: - Essa affirmação do relator era verdadeira.

O Orador: - A affirmação era até certo ponto verdadeira, mas o que eu digo é que a commissão que tinha assignado a substituição o anno passado, e que a conhecida inteiramente, dizia que nenhuma alteração tinha de apresentar ao projecto. (Apoiados.}

Mas o sr. relator diz que nada se alterou no projecto, o sr. Laranjo diz que o projecto foi modificado, mas que as modificações foram insignificantes, e o sr. Marianno de Carvalho, affirma que não foram insignificantes, mas pelo contrario tão notaveis que o projecto ficou inteiramente refundido. (Apoiados.}

O que se apurou, portanto, de tudo isto, é que, nós, com grande dificuldade, conseguimos arrancar a substituição ao artigo 71.° que estava guardada a sete chaves desde o anno passado, e que a sete chaves se continuou a guardar até terça feira, dia em que o projecto entrou em discussão. (Apoiados.}

Isto é mais uma pagina bem triste e vergonhosa da nossa historia politica. (Apoiados.}

O governo teima no seu proposito, e a commissão do ultramar insiste na sua resolução de não dar conta á camara das alterações que no projecto foram feitas?

Nós, os deputados d'este lado da camara; temos empregado todos os esforços para fazer luz completa sobre este assumpto, mas a maioria vae responder-nos com uma votação, em logar de dar satisfação á dignidade do parlamento offendida.

N'estas condições, nós, minoria, só temos um caminho a seguir, o que nos é imposto pela obstinação do governo e da commissão em não querer dar conhecimento d'aquillo que nós tinhamos o direito de conhecer, não discutir o projecto. Não discutiremos, pois. (Apoiados.}

Cubra-se a maioria e o governo com todas as glorias que advenham da sua força numerica. Nós diremos ao paiz que não discutimos o projecto, por saber que elle não o projecto da commissão; (Apoiado.) diremos ao paiz que á nossa attitude franca, sem reservas, sem intuitos politicos, e orientada unica e exclusivamente no interesse de bem servir o paiz, o governo e a maioria respondem por esta fórma desleal...

O sr. Presidente: - Parece-me que não foi ouvido o sr. relator da commissão, pois se v. exa. o tivesse ouvido veria que elle mandou para a mesa substituições a differentes artigos.

O Orador: - Pergunto eu a v. exa. volta este projecto á commissão? Se volta á commissão discutimos, se não volta não discutimos. (Apoiados.)

O sr. Presidente: - Quando se tratar da votação eu direi a v. exa.

O Orador: - Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu.)

sr. Presidente: - As substituições apresentadas pelo sr. relator ficam em discussão conjunctamente com o projecto.

A hora deu. A ordem do dia para ámanhã é a mesma que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e meia da tarde.

Documentos enviados para a mesa

Representações

Das classes graphicas de Coimbra contra é ultimo projecto de lei de imprensa.

Apresentada pelo sr. presidente da camara Eduardo José Coelho, enviada á commissão de legislarão criminal, e mandada publicar no Diario do governo.

Da liga das artes graphicas de Lisboa, em seu nome e em nome da do Porto, pedindo que seja posto um entrave á concorrencia estrangeira protegida pelo tratado, litterario de 1866, e que ambas sejam ouvidas na redacção de taxa pautal, que beneficie qualquer ramo graphico.

Apresentada pelo sr. presidente da camara Eduardo José Coelho, enviada á commissão de artes e industrias e negocios estrangeiros e internacionaes, e mandada publicar no Diario do governo.

O redactor = Sá Nogueira.

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