12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
como consequencia fatal, a longa serie dos seus erros, que são verdadeiros crimes.
Sr. Presidente: V. Exa., se porventura foi ao Terreiro do Paço nos ultimos dias do anno findo, havia de ver legiões de pretendentes, subindo as escadas das Secretarias do Estado, para irem solicitar dos Srs. Ministros o emprego cubiçado ou a sinecura rendosa. Aquelle estranho espectaculo fazia lembrar a soberba descripção da batalha de Covadonga, feita por Alexandre Herculano no seu Eurico, onde elle escreve que esquadrões após esquadrões desciam da montanha e se alongavam na planicie em ordem de combate.
Pois eu vi tambem, nos ultimos dias do anno de 1901, esquadrões após esquadrões de pretendentes, não descendo das montanhas, mas subindo as escadas dos Ministerios, para irem junto ás secretariados Ministros, transformadas em balcões de despacho (Apoiados), dar batalha aos cofres publicos! (Apoiados).
V. Exa. viu que nem mesmo os parentes dos Ministros, desde o irmão do Sr. Presidente do Conselho, até ao concunhado do Sr. Ministro das Obras Publicas, nenhum d'elles deixou de receber grossa prebenda.
É por isso que homens de bem, - e não digo que os não haja ainda no partido de que é chefe o Sr. Hintze Ribeiro - como o Sr. Dantas Baracho, o Sr. Jacinto Candido, o Sr. Figueiredo Mascarenhas, o Sr. Moraes Sarmento, e ainda outros, se afastaram de um Governo que assim procede, se afastaram de um chefe de partido que num momento historico, solemne, como este que atravessamos, esquece os seus deveres, despreza o caminho direito que devia seguir, - fazer economias, restringir despesas, - para se metter por estes atalhos de talhar á farta as postas com que vae presentear os seus parentes e amigos. (Apoiados).
Pode porventura tolerar-se, consentir-se isto? Não, Sr. Presidente, não se pode, não se deve tolerar, nem consentir!
É por isso que nós vimos hoje, aqui, o Sr. João Arroyo, orador que encanta sempre a Camara com a sua palavra quente e elegante, atravessar o momento mais difficil da sua carreira parlamentar.
S. Exa., apertado entre factos indestructiveis, fazia-me lembrar, e peço venia para esta minha comparação, um d'aquelles tigres de Bengalla ou leões da Nubia, em que S. Exa. nos falou, preso dentro de uma jaula, arremessando-se vigorosamente contra as grades que tenta despedaçar, mas não podendo lutar contra a rijeza do ferro, por isso ser superior ás suas forças.
Os argumentos do Sr. Alpoim, fundados em factos e em diplomas legaes que S. Exa. indicou á Camara, eram os varões de ferro contra os quaes em vão lutava o talento brilhantissimo do Sr. Arroyo.
Sr. Presidente: V. Exa. viu, repito, que o Governo ficou completamente a descoberto (Apoiados); e quando amanha se ler, no extracto tachigraphico d'esta sessão, o discurso do Sr. Arroyo e se comparar essa oração com os discursos eloquentíssimos do Sr. Alpoim, o país ha de reconhecer que o Governo não pode ter defesa, porque quando se levanta a defendê-lo um orador da envergadura do Sr. João Arroyo e tem apenas, para o defender, ditos espirituosos, phrases engraçadas, e nem um argumento, nem um facto, que possa levar o convencimento aos espiritos mais rebeldes, é porque esse Governo não tem defesa; é, na verdade, um reu indefensavel.
E o país não poderá absolver nunca quem, num momento como este que o país atravessa, tendo auctorizações larguissimas, em que havia as condições fundamentaes de não augmentar as despesas publicas (Apoiadas) e de simplificar os serviços, augmenta as despesas, e em vez de simplificar os serviços os complica e baralha espantosamente (Muitos apoiados); e depois de fazer tudo isto ainda vem dizer - como disse o Sr. Presidente do Conselho - que fez economias e que as economias resultantes das medidas publicadas foram de 3:000$000 réis! (Apoiados). Que irrisão! (Apoiados).
É por isso que eu, na minha moção mandada para a mesa, convido o Governo a que, visto ter feito essas apregoadas economias, para nos confundir, a nós que o estamos accussado de as não ter feito, antes ter augmentado as despesas, publique no Diario do Governo a conta minuciosa d'essas economias (Apoiados), feitas á custa do aggravamento dos impostos. (Apoiados}.
Respondam-nos com argumentos, com factos, e não com phrases espirituosas e elegantes como as que pronunciou o Sr. João Arroyo (Apoiados).
Sr. Presidente: sinto-me bastante fatigado e vejo que a Camara o está ainda mais, por isso desejava saber se ha numero legal de Srs. Deputados para a Camara poder funccionar, e peço, portanto, a V. Exa. que mande fazer a contagem.
Fez-se a contagem.
O Sr. Presidente: - Estão na sala 70 Sra. Deputados, portanto pode continuar a sessão.
O Orador: - V. Exa. e a Camara sabem que na lei de meios, de 12 de junho de 1901, foram incluidas todas as auctorizações parlamentares que tinham sido concedidas ao Governo pela carta de lei de 3 de setembro de 1897, que diz que é o Governo auctorizado a reorganizar os serviços dos Ministerios e os d'elles dependentes, em ordem a obter a maior reducção da despesa, não podendo deixar de observar, entre outras, as regras seguintes: - Não augmentar as despesas publicas, não contratar novos empregados, emquanto houver addidos, ou provisorios, e não conceder aposentações illegaes.
V. Exa. sabe que na lei de 1901 se compendiaram todas as auctorizações que havia anteriormente e que tinham sido concedidas ao Governo por varias leis, em primeiro logar, porque sendo aquella lei a lei de meios, que é de uma importancia maxima, capital, não podiam deixar de nella ficar incluidas todas as auctorizações anteriores, por isso que a importancia d'estas auctorizações especiaes era muito inferior á da auctorização geral da lei de meios.
Em segundo logar, porque teve o Governo, em virtude d'essa lei de 12 de junho de 1901, auctorização para reformar todos os serviços, com uma latitude que não tinha em outra lei.
Logo, evidentemente nessa latitude de reformar todos os serviços iam incluidas todas as auctorizações que anteriormente tinham sido concedidas ao Governo.
Isto é claro, nitido, e já o demonstrou á Camara, com toda a clareza, o meu velho amigo o Sr. Alpoim, quando aqui falou pela primeira vez.
Portanto, em virtude d'esta lei de 1901, quaes eram as duas obrigações imperiosas e restrictas que o Governo tinha?
Primeira, reduzir todas as despesas actuaes; segunda, simplificar todos os serviços da maneira mais conveniente para a execução d'elles e tambem para o Thesouro e para o país (Apoiados).
Ora, pergunto eu a V. Exa. Sr. Presidente, se realmente o Governo cumpriu estas duas obrigações impreteriveis que lhe impunha a lei de 12 de junho de 1901?
Pergunto: as despesas publicas foram reduzidas?
Não foram, e, pelo contrario, foram augmentadas, e em muito, como terei occasião de demonstrar, como o Sr. Alpoim já demonstrou, e como o proprio Sr. Presidente do Conselho confessou, pois teve de dizer que, se é certo que essas despesas augmentaram, é tambem exacto que criou receitas para as contrabalançar, e que d'essas receitas ainda resultaram 3:000$0000 réis de economia!
Está provado, portanto, que o Governo faltou á primeira obrigação que lhe impunha a lei de 12 de junho de 1901; que, em logar de reduzir a despesa, a augmentou, e em muito. (Apoiados).