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SESSÃO N.° 14 DE 22 DE MARÇO DE 1909 7

sica e se encontra em todos os bons tratados da materia, julgou que a Coroa estava inhibida de o fazer, salvo se na carta organica da colonia se tivesse pactuado conservar-lhe esse direito.

Quando no começo do seculo XIX a Inglaterra intentou a suppressão do estado de escravidão nas Antilhas, a assembleia eleita da Jamaica recusou-se a votar certas despesas recommendadas pela metropole, e tendo Lord Melbourne proposto ao Parlamento inglês a suspensão da constituição da ilha foi derrotado.

Em 1865, depois de abafada a rebellião produzida pela questão da mão de obra, essa constituição foi modificada, mas só depois de a Assembleia assim o resolver, e de ter dado ao Governo da metropole a competente autorização.

Na historia dessas Antilhas inglesas, verdadeiros paraizos do mundo, tão formosas e tão ricas, por mais de uma vez se viu as suas assembleias sustentarem a seguinte doutrina:

"Não podendo ser admittidas por representação na Camara dos Communs e na dos Lords, as nossas legislaturas estão sujeitas directamente ao Rei de Inglaterra como seu proprio Rei, e não reconhecemos áquellas Casas do Parlamento o direito de interferirem nos nossos negocios".

Sr. Presidente: orgulhoso brado é este, quasi um desafio e uma ameaça de revolta!

Pois não consta que os governadores fossem demittidos nem as assembleias dissolvidas, e estou em dizer que esse Parlamento inglês, que ainda ha pouco, dirigindo-se á nova Camara ottomana, se intitulava "o mais velho Parlamento do mundo", teve decerto um sorriso de sympathia para esses seus irmãos mais novos, alegre por os ver tão convencidos dos seus direitos e prontos a defendê-los.

E isto succede, Sr. Presidente, em seculos já passados. Porque o mais curioso de tudo isto, Sr. Presidente, é que, ao passo que nos, em pleno seculo XX, hesitamos, titubeamos na concessão de uma formula attenuada de autonomia, ensaiamos processos cuja adopção e vantagens lá fora se não discutem já, a Inglaterra, essa grande nação, que tanto mais. se admira quanto se estuda, já em 1662, alguns annos depois da nossa historica revolução, dera uma constituição representativa á Jamaica, e em 1791, pouco depois da revolução francesa, e quando nos não sonhava-mos ainda em Governo representativo, procede da mesma forma com o Canadá.

Sr. Presidente: nos primeiros meses do anno de 1908 surgiu um conflicto agudo entre o governador da Africa Oriental Inglesa e dois plantadores, um dos quaes Lord Delamere, ambos membros do conselho legislativo da colonia, a proposito de uma portaria sobre mão de obra indigena, e o governador suspendeu-os das suas funcções.

A questão, foi debatida na Camara dos Communs, e o Governo inglês, confirmando a suspensão imposta, manifestou, ao mesmo tempo, aos membros suspensos, que lhe seria muito agradavel vê-los, mais tarde, retomar os seus logares, voltando a collaborar na administração da colonia. Effectivamente, os ultimos jornaes ingleses dizem-me que assim succedeu.

Na India inglesa, Sr. Presidente, o Governo responde ao desenvolvimento do espirito nacionalista fazendo collaborar mais largamente os habitantes nos conselhos do imperio.

Assim resolvem as grandes questões os grandes homens de Estado.

Ao contrario, nos encontramos como unico recurso a suspensão.

E digam-me se somos ou não ainda os mesmos ignorantes e acanhados administradores, os mesmos reaccionarios e centralizadores politicos de sempre.

Mas, Sr. Presidente, se a suspensão do conselho de governo revela o recrudescimento da furia centralizadora, se o não aperfeiçoamento do diploma denota a falta de habilitações dos Ministros, outro indicio se deprehende
tambem de sua attitude para com a provincia de Moçambique: a mais completa incomprehensão da situação politica actual da Africa do Sul e da melindrosa diplomacia que temos de adoptar a seu respeito.

Sr. Presidente: Moçambique não está isolado na costa oriental de Africa como os sultanatos de Bornu ou do Uadai no coração d'ella; não tem por vizinhos, como Angola, colonias tropicaes, mais avançadas, sim, do que a nossa, mas atrasadas em relação ás inglesas da Africa do Sul.

Moçambique, e muito especialmente alguns dos seus districtos, estão apertados entre o mar e as colonias inglesas, umas dotadas de Governo parlamentar como o Natal, o Transvaal, o Cabo, outras gozando de um conselho legislativo, como o Nyassaland, e ainda outras, como a Rhodesia, onde se pôs já a questão de conciliar a exploração do territorio por uma companhia majestática com os direitos dos colonos brancos que reclamam instituições representativas.

Moçambique está infiltrada pelos capitaes ingleses, pela lingua, pelos costumes e pela influencia desta origem, e Lourenço Marques, sobretudo, em contacto intimo com as colonias do sul, tem que viver em estreita união com ellas, de se amoldar, de certa forma, á sua maneira de ser, de as acompanhar nos seus processos de Governo.

De ha muito, Sr. Presidente, que eramos tidos por atrasados, e quando, em 1907, se promulgou a reorganização administrativa de Moçambique, um com de admiração e de approvação se fez ouvir na Africa do Sul.

Podia ler á Camara diversos jornaes d'esta procedencia onde abundam os artigos elogiosos, mas não o farei para a não cansar.

Referir-me-hei pois apenas ao Transvaal Leader que em um dos seus numeros dizia assim:

"Por meio d'este decreto um país de infinitas possibilidades, possuindo um porto que deve inevitavelmente attrahir uma grande parte do commercio do nosso continente, passou do estado de tutela para o de maioridade.

Não devemos continuar a considerar a provincia de Moçambique como um apanágio da Coroa de Portugal, ou um manancial para os filhos mais novos da sua aristocracia. Ex Africa semper aliquid novi.

O Transvaal não pode ser espectador indifferente a uma revolução tão profunda de methodos administrativos.

Por maior que seja a estreiteza dos laços de parentesco entre o Transvaal e as colonias inglesas da costa, não podemos resistir á influencia que nos impelle para deante no caminho que o destino nos traçou, isto é, relações commerciaes e politicas cada vez mais estreitas com Lourenço Marques.

Desde algum tempo se tornava evidente que a colonia portuguesa se aproximava rapidamente de uma grande mudança, Portugal tinha começado a reconhecer a importancia da sua situação na Africa do Sul.

Emquanto a provincia permanecesse no estado de estiolante vassalagem, ella seria apenas uma quantité négligea-blenos conselhos da Africa do Sul".

Esta declaração é positiva e categorica. Medite nella o Sr. Ministro da Marinha. Calcule S. Exa. o que pensarão essas colonias, o que pensará o inglês, tão progressivo, tão amante da liberdade e da autonomia, ao ver que Portugal, com pretensões a ser considerado uma grande potencia colonial, não conseguiu installar na mais avançada das suas colonias um systema de Governo que a Inglaterra dá ás colonias tropicaes de plantação.

Lembre-se V. Exa. d'esse phenomeno grandioso que se está realizando na Africa do Sul, a formação de uma nação nova pelo englobamento definitivo de quatro colonias até ha pouco divididas por antagonismos de interesses que pareciam irredactiveis.

Lembre-se de que Lourenço Marques, pela força das circunstancias, pela posição geographica, pela ligação dos