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RECTIFICAÇÃO

Na ordem do dia publicada hontem para o dia 19, em vez do projecto de lei n.° 137, de 1862, é o projecto de lei n.° 137, de 1863, para que aos officiaes do exercito, que tiveram a sua primeira praça nos corpos das extinctas milicias, lhes seja levado em conta, para o effeito da reforma, todo o tempo que activamente serviram nos respectivos corpos.

Proposta de lei, extinguindo o monopolio do tabaco, apresentada pelo ministro e secretario d'estado dos negocios da fazenda, o sr. Joaquim Thomás Lobo d'Avila, em sessão de 19 do corrente.

Senhores. — Na questão de principios é hoje ponto inconcusso, que a liberdade deve ser preferida ao monopolio, esta é a regra doutrinal, aceita e sustentada pelos mais distinctos publicistas e economistas da escola liberal; é ella um caracteristico do progresso das idéas e do desenvolvimento da civilisação, traduzido em reformas uteis, operadas no modo de ser de todos os povos cultos. Escusado é pois renovar a argumentação que serviu para estabelecer estes principios.

Mas os monopolios, os exclusivos e os privilegios não acabaram todos por uma vez; sustentados por muitos interesses, mantidos por muitos preconceitos, e defendidos por muitas apprehensões, tem sido necessaria uma luta constante, e por vezes violenta, das boas doutrinas, para ir demolindo successivamente estas instituições, talvez accommodadas ao regimen e indole de outras eras, mas em completo desaccordo com o principio de liberdade, que ô a base das sociedades modernas.

Posto que a questão do tabaco seja, pela sua natureza propria, uma d'aquellas que se deve encarar debaixo de um ponto de vista especial, para ser devidamente apreciada, todavia não é menos verdade que, para a sua mais acertada resolução, cumpre que nos inspiremos das boas doutrinas, embora não as possamos applicar de um modo absoluto. Assentado como verdadeiro o principio da liberdade de industria, está marcado o fim para que devemos caminhar; e qualquer passo que se dê n'esse sentido, sem prejuizo dos interesses do estado, e com vantagem para o publico, é um progresso relativo, que nenhum homem illustrado pôde deixar de reconhecer.

E fóra de duvida que o tabaco, satisfazendo uma necessidade artificial, e não representando nenhum dos objectos necessarios á vida, está no caso de poder supportar a acção do imposto com menos inconvenientes para a sociedade; é esta a opinião de todos os economistas que, combatendo outras taxas que oneram o consumo, acham esta perfeitamente justificavel, embora seja avultada. A questão versa pois sobre o melhor meio de tributar este consumo, e de auferir d'elle um bom rendimento, conciliando as conveniencias do thesouro com as dos contribuintes; ou, em outros termos mais definidos, sobre a escolha do systema que, assegurando igual ou maior renda ao estado, diminua a despeza e os vexames de cobrança, melhore as condições do consumidor e permitta o desenvolvimento de novas industrias.

Tres são os systemas principaes, que se offerecem para resolver este problema, os quaes apreciaremos na ordem chronologica em que têem sido apresentados entre nós:

1.º O monopolio administrado por particulares, a quem o estado o arrenda, ou o denominado — contrato do tabaco. Este systema, que ha seculo e meio se segue em Portugal, e que tem sido successivamente abandonado por todas as nações onde existiu, parece-me ser o que menos satisfaz ás indicações que deixo feitas. Em seu abono só se pôde dizer, que allivia o estado de cuidados administrativos, e lhe assegura uma certa renda. Emquanto a melhorar as condições do consumo, a indole do contrato e a experiencia que ha dos seus resultados, leva-nos á convicção de que pouco ou nada d'elle podemos esperar em relação á diminuição de preços e melhoria de qualidade de tabacos. Vexames, em nenhum systema os ha maiores, pois até se abdicam, em menoscabo da constituição, direitos magistrativos para investir n'elles os contratadores; permitte-se-lhes ter uma força armada debaixo das suas ordens; põe-se a seu particular serviço uma excepcional e rigorosa legislação penal, com um grande cortejo de rigores; numa palavra o contrato é uma especie de status in statu, pela natureza das attribuições que lhe são conferidas, e das concessões que lhe são feitas. Pelas fortunas avultadas que o contrato tem proporcionado aos diversos contratadores, desde que existe, é licito e logico concluir, que o estado não aufere d'este monopolio uma renda proporcional aos sacrificios que fazem os consumidores.

Julgo inutil proseguir n'esta analyse, entrando em pormenores para demonstrar que a arrematação não satisfaz ás boas regras que devem presidir á administração d'este rendimento publico, porque em parte alguma nas outras nações existe similhante systema, nem apparece escriptor que o sustente, e até entre nós poucos defensores tem, condemnando-se em geral a arrematação, e discutindo-se unicamente o systema que a deve substituir. Pelo que respeita á segurança de uma certa renda, para que este unico argumento podesse prevalecer, seria necessario demonstrar que por qualquer outro systema se não poderia garantir ao estado uma renda igual ou maior; e é isso o que não está provado, mas, antes pelo contrario, se vê pelo exemplo de outras nações, em que não ha arrematação, que o rendimento do tabaco é, proporcionalmente maior; podendo alem disso provar-se, como terei occasião de o fazer, que o regimen da liberdade, estabelecido em condições convenientes, assegura pelo menos uma renda igual, alem de reunir outras vantagens.

2.º A régie, ou administração por conta do estado, mostra mais defensores, e acha-se auctorisada com o exemplo de algumas nações em que este systema está em pratica.

A régie tem em geral os inconvenientes que caracterisam a exploração de qualquer industria por conta do estado. A idéa de fazer este commerciante e fabricante é altamente reprovada pelos sãos principios de economia politica, derivados da experiencia e da analyse racional dos factos. Falta-lhe o incentivo do interesse individual, e o estimulo da concorrencia para procurar todos os meios de augmentar o consumo, melhorando a qualidade dos productos, variando as suas especies e diminuindo o preço da venda. E igualmente accusada a régie, mesmo nos paizes em que a sua administração é mais perfeita, como, por exemplo, na França, de adaptar pouco os seus productos ao gosto do publico, de não ter melhorado bastante a sua fabricação, principalmente no que respeita a tabaco de fumo, de manter preços de venda que não estão em relação com as qualidades de tabaco fornecido, como se vê no importante e minucioso inquerito dos tabacos feito n'aquelle paiz. A sua fiscalisação é difficil e vexatoria, sem ser a mais efficaz, e a sua administração é mais despendiosa do que seria a particular, estabelecida a liberdade de fabrico e venda, segundo a opinião dos homens mais competentes n'esta especialidade, que foram interrogados em França, como se vê de paginas 327 a 370 do citado inquerito, opinião que á priori se podia emittir, porque não é crivel que a administração do estado possa completamente substituir para todos os effeitos a actividade dos interessados.

N'estas condições não parece que a régie, ou o monopolio do tabaco por conta do estado seja o systema preferivel para assegurar a renda que este aufere dos encargos que pesam sobre o consumo do tabaco.

Se apreciarmos este systema com applicação ao nosso paiz, os seus inconvenientes aggravam-se de um modo consideravel, attentas as nossas peculiares circumstancias. Se quizessemos passar da arrematação d'este monopolio como existe actualmente, para a sua administração por conta do estado, teriamos de empatar desde logo um capital de 600:000$000 réis, proximamente, para a acquisição da fabrica, compra do tabaco, e custeio do fabrico, abatida já a importancia das fianças dos administradores das comarcas; teriamos de fazer uma despeza de 400:000$000 réis com a fiscalisação, administração, e commissões de venda; ver-nos-íamos obrigados a não diminuir os preços actuaes, e mesmo a augmenta-los, para não corrermos tão grande risco de desfalque na renda; não veriamos assim diminuido, mas antes augmentado o incentivo ao commercio illicito; provavelmente não poderiamos contar com tanta efficacia na acção administrativa, em presença das difficuldades, com que tem de lutar a auctoridade, que não se exerce entre nós com o mesmo rigor do que n'outros paizes da Europa onde existe a régie, como na França, na Hespanha e na Austria.

Em conclusão, a régie exigiria um grande empate de capital, um consideravel accrescimo de despezas de administração, um augmento provavel nos preços de venda; o que daria em resultado uma avultada diminuição de receita, uma cobrança mais onerosa, um maior incitamento aos descaminhos, uma diminuição provavel no consumo, cujas condições aggravava, a continuação dos actuaes vexames, sem contar as difficuldades, os embaraços e os encargos que accresceriam ao governo do estado para reger e estipendiar o immenso pessoal d'este novo ramo de serviço, ou antes d'esta empreza fabril e commercial, em que o thesouro iria arriscar um importante capital. Em verdade, para quem reflectir maduramente sobre este assumpto, o systema da régie é o menos admissivel entre nós, e aquelle que nos prepararia a mais deploravel decepção pelos seus resultados igualmente nocivos ao publico e ao estado; teria todos os inconvenientes da arrematação sem a vantagem de assegurar a renda; não teria nem as excellencias da liberdade, nem os proveitos do monopolio.

3.° A liberdade de fabrico e venda assegura ao estado uma renda igual ou maior do que o monopolio; melhora as condições do consumo, porque póde fornecer o tabaco de qualidades superiores mais barato; acaba com os privilegios odiosos do contrato, e attenua os vexames da fiscalisação; abre campo a novas industrias, estabelecendo a concorrencia em beneficio do consumidor; diminua as despezas de fabrico e de administração, entregando á actividade e ao interesse individual esta industria.

Quando fallamos da liberdade do fabrico e venda do tabaco, não nos referimos, nem nos podiamos referir, a uma liberdade absoluta. Toda a liberdade tem restricções e limites impostos pela utilidade e conveniencia sociaes, e nenhuma ha que se exerça de um modo absoluto, quer na ordem civil, quer na politica ou economica; não podia pois exigir-se, em boa doutrina, que a liberdade da industria do tabaco fosse uma excepção a esta regra. Mas acresce que na questão que nos occupa se não trata de dar a liberdade a uma industria como a outra qualquer, ficando simplesmente sujeita ás regras communs; a resolução d'esta questão está subordinada a duas condições necessarias e essenciaes, as quaes se deve conciliar do modo mais conveniente. Em condições são: 1.º, dar melhor satisfação aos preceitos de economia politica; 2.º, assegurar a renda que o thesouro aufere do consumo do tabaco. D'esta base fundamental deriva a necessidade de não deixar ir a liberdade até ao ponto de comprometter a renda, sem todavia a tornar tão restricta e tão cercada de vexames, que a não deixe muito superior ao monopolio; devendo ainda advertir-se que, no momento da transição de um para outro regimen, a prudencia aconselha o emprego de mais algumas precauções e cautelas, que depois a experiencia poderá permittir senão que se extingam, ao menos que se attenuem em grande parte.

Se, guiados por um principio justo e racional, devemos sem receio tentar um passo no caminho da liberdade, o exemplo de outras nações não condemna a imprudencia d'esta empreza. Se ha paizes importantes, como a França,

a Hespanha, a Austria e a Italia, onde existe a régie, outros ha tambem muito illustrados, e em muito maior numero, onde existe a liberdade, como são: os Estados Unidos, o Brazil, as ilhas da America do Sul, a Dinamarca, a Suecia, a Noruega, a Hollanda, a Belgica, a Prussia, Baden, Wurtemberg, o ducado de Nassau, a Hesse-Eleitoral, o reino de Saxonia, a Suissa, a Hungria e a Inglaterra.

Não entraremos na analyse do modo por que existe regulada a liberdade do tabaco em cada um d'estes paizes, porque isso nos levaria a escrever um livro em vez de um relatorio; e diremos que julgamos preferivel o systema de Inglaterra, porque é o paiz onde a liberdade d'esta industria se permitte dentro de limites que asseguram uma boa receita ao estado, superior a todas as que d'este ramo auferem os outros estados, como se vê da seguinte nota comparativa:

Inglaterra....................... 25.218:000$000

França........................... 24.300:000$000

Austria.......................... 8.916:000$000

Italia........................... 6.826:000$000

Hespanha......................... 6.718:000$000

Nos paizes onde é permittida a liberdade de cultura, venda e fabrico do tabaco, como, por exemplo, na maior parte dos estados da Allemanha, na Belgica e na Hollanda, o rendimento annual que d'aqui tira o estado é de pouca importancia, não excede 200:000$000 réis, termo medio, e provém de um pequeno direito de entrada, de uma diminuta taxa sobre a venda, e de um imposto modico sobre o cultivo n'alguns d'estes estados, como na Prussia e na Saxonia. É facto averiguado e fóra de toda a discussão, que para se assegurar um bom reddito do tabaco, permittida a liberdade do seu fabrico e venda, se torna indispensavel prohibir a cultura; porque, se esta fosse permittida, á proporção que pelo seu desenvolvimento se abastecesse o mercado interno, alem de prejudicar outros ramos de agricultura, iria diminuindo o producto dos direitos de entrada, sendo assim desfalcado este rendimento sem possibilidade de supprir o desfalque pelo imposto sobre a cultura ou producção do tabaco, que, como a experiencia mostra, é pouco rendoso e de muito difficil e despendiosa cobrança. É por estes motivos que nos estados em que se aufere uma grande renda do tabaco, ou existe o monopolio, ou a liberdade de fabrico e venda com certas restricções, e a prohibição da cultura.

Julgando pois o governo que devia abandonar o systema do monopolio pelas rasões já ponderadas, e querendo, por assim o exigirem as nossas circumstancias, assegurar a receita que o estado tira do tabaco do modo menos oneroso, e adiantando um passo no caminho da liberdade, nenhum outro systema podia adoptar mais adequado a este intuito de conveniencia publica do que aquelle que existe em pratica em Inglaterra ha mais de dois seculos.

Lancemos agora a vista sobre o modo por que tem sido entre nós administrado o rendimento do tabaco para verificar se a experiencia propria nos fornece algumas indicações aproveitaveis.

Não está ainda averiguado desde quando o tabaco começou a ser em Portugal um artigo de consumo, e a produzir uma renda para o estado. A primeira arrematação de que ha noticia fez-se em 22 de setembro de 1639 em Madrid, por seis annos, e pela renda annual de 20:000 cruzados. A este contrato poz provavelmente termo a revolução de 1640, pois que novo arrendamento foi feito por alvará de 18 de março de 1641, tambem por seis annos, e pela renda annual de 32:000 cruzados. Por alvará de 23 de agosto de 1642 foram removidos os contratadores, extincto o estanco, e permittida a livre cultura do tabaco, sua introducção, fabrico e venda, pagando o cultivador 30 réis por arratel de tabaco produzido, duplicando-se os direitos até ali pagos pela entrada, o que os elevou a 1$280 réis por arroba, alem de 30 réis por arratel pela revenda, e estabelecendo-se o imposto de 400 réis pela licença da venda, alem da taxa de 30 réis por arratel pelas moendas (fabrico). Este systema, quasi identico ao que existe hoje na Prussia, durou perto de dois annos, pois o alvará de 26 de junho de 1644 restabeleceu o estanco. O systema da liberdade fóra adoptado em satisfação ás queixas que houve, de que o estanco (monopolio) prejudicava o desenvolvimento da cultura no Brazil e no reino; devendo d'aqui inferir-se que a cultura já era livre em Portugal antes de 1642. O restabelecimento do estanco fundou-se em haver diminuido a renda. A cultura conservou-se permittida até 1649, em que foi prohibida pelo alvará de 10 de maio, reconhecendo se que da sua existencia provinha desfalque na renda. Continuou depois o estanco administrado por arrematação, subindo a renda a 64:000 cruzados, 71:000 cruzados, e 81:110 cruzados até 1674, em que, sobre consulta da junta do tabaco, recaíu a resolução regia de 4 de agosto, que determinou que o estanco fosse administrado pela fazenda, dois annos antes de haver findado a ultima arrematação, approvada por alvará de 2 de março de 1670. Tomaram-se então contas aos contratadores, e verificou-se que haviam lucrado na sublocação feita ás comarcas do reino 51:000 cruzados, e que os sublocatários ganharam 132:000 cruzados, apesar de haver um contrabando igual á metade do consumo.

Do referido exame de contas nasceu a consulta da junta do tabaco de outubro de 1673, á qual se seguiu a lei de 5 e decreto de 15 de dezembro do dito anno, que mandou admittir o estanco por conta da fazenda, com prohibição de cultura e fabrico particular. O systema de administração que a junta parece ter seguido foi fornecer ella uns estancos e arrendar outros. Este systema continuou até 1698, em que ias côrtes julgaram que o rendimento podia augmentar dando-se nova fórma á sua cobrança, e abolindo-se o estanco por arrematação. N'este sentido foi expedido a decreto de 6 de abril do mesmo anno, que mandou começar

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a nova fórma de administração no 1.° de janeiro de 1699. Esta nova fórma é que era propriamente a régie, ou administração por conta do estado; pois que a outra, que existiu desde 1674 até 1698, era uma combinação da régie com a arrematação.

Em consultas de 28 de novembro de 1698 e 13 de janeiro e 4 de julho de 1699, a junta expoz os inconvenientes da nova fórma de administração do tabaco, e em resultado foi extincto por carta regia de 20 do mesmo mez, não só o estanco, mas a contribuição dos usuaes, mandando-se repartir pelos fogos do reino o que aquellas duas contribuições deviam produzir. N'estas consultas expunha a junta os inconvenientes que se offereciam da nova fórma mandada dar ao rendimento do tabaco: «porquanto, diz ella, o provimento d'este genero ás comarcas a obrigavam a fazer grandes despezas, em rasão de ser necessario ter um thesoureiro e um escrivão em cada cabeça de comarca, bem como a ter pessoas que vendessem os tabacos nas differentes terras de que se compunham essas comarcas, a todas as quaes pessoas deviam ser pagos ordenados; havendo alem d'isto as conducções e quebras do genero, descaminhos e roubos que a fazenda tinha a soffrer; pois era impossivel que tantos vendedores, feitores e officiaes fossem homens fiéis; acrescendo ser inevitavel no primeiro anno um grande contrabando, por se estar á espera que se acabasse a arrematação do estanco para o perder e arruinar, o que fazia crer que, ou se vendesse n'esta cidade todo o tabaco, ou se mandasse para as provincias por conta da fazenda, havia de ser muito pouco o consumo, porque os mesmos que o vendessem por conta da fazenda eram os que o haviam de introduzir por contrabando, sendo para estes delinquentes impossivel o castigo, porque com o mesmo pretexto vendiam tanto um como outro tabaco».

A liberdade do estanco estabelecida pela referida carta regia de 20 de julho de 1699 pouco tempo durou. A resolução de 3 de abril de 1700 prohibiu a qualquer pessoa o fabrico e venda do tabaco.

Estando a junta a tratar da melhor fórma de administrar o estanco, baixou o decreto de 18 de junho de 1700, que deu o contrato por seis annos e por 1.536:000 cruzados (614:400$000 réis) a D. Pedro Gomes, obrigando-se se o contratador a não vender os tabacos para as comarcas por maiores preços do que 2$000 réis por arratel de amostrinha, 1$600 réis por arratel de cidade, 1$000 réis o simonte e 800 réis o rolo; preços por que ainda hoje se vendem as respectivas especies de tabaco, á excepção da denominada simonte, que é vendida por 1$200 réis. Depois continuou uma serie de contratos até hoje.

D'estes apontamentos historicos infere-se, que quasi todos os systemas de rendimento do tabaco, organisados com maior ou menor imperfeição, têem sido experimentados entre nós. O systema de liberdade de cultura, fabrico e venda, que vigorou desde 1642 até 1644, forneceu pela pratica mais uma prova da asserção que já proferi de que, sem prohibir a cultura, não é possivel assegurar por este systema um rendimento importante ao estado. O systema mixto ou especie de régie intéressée, em que a administração do estado se combina com a arrematação que vigorou desde 1674 até 1698, produziu o resultado de augmentar um pouco a renda, o que de certo tambem proveiu de se haver generalisado mais o uso do tabaco, mas apesar d'isso tinha ainda o inconveniente, que as côrtes de 1698 lhe reconheceram, de permittir grandes lucros aos arrematantes, e outros abusos que desfalcavam a renda.

A régie, ou administração por conta do estado, logo no primeiro semestre de 1699, em que foi experimentada, causou tal despeza e desfalque, e fez receiar tão grande diminuição na renda, que pouco tempo durou, sendo abandonada em julho de 1699; o que offerece mais uma prova em abono da opinião que emitti dos graves inconvenientes da adopção d'este systema entre nós, os quaes são postos em evidencia pelas consultas da junta do tabaco d'aquella epocha.

O systema de dar completa liberdade ao tabaco, isentando-o de impostos especiaes, e fazendo entrar este genero na regra commum, substituindo a renda que elle produzia por uma contribuição de repartição, paga por todos os habitantes do paiz, experimentado entre nós pela carta regia de 20 de julho de 1699, tambem não produziu os resultados que se esperavam, sendo em seguida abandonado, e voltando-se a tributar o tabaco de um modo especial.

N'estes dois seculos de experiencia vê-se em resultado geral, que a régie não se pôde reputar adaptada ás nossas peculiares condições; que o contrato mereceu a preferencia como um expediente para saír de difficuldades administrativas, e não como um meio de auferir o maior rendimento com a menor despeza de cobrança; e que o regimen da liberdade do fabrico e venda do tabaco, com a prohibição da sua cultura nunca foi ensaiado entre nós, não havendo portanto argumento algum de experiencia que nos induza a receiar a implantação d'este systema, que tão bons resultados financeiros e economicos tem produzido em Inglaterra.

N'este paiz, de 1643 a 1652, o tabaco pagava um pequeno direito de entrada e um imposto de cultura, que então era permittida, systema similhante ao que hoje existe em alguns estados da Allemanha, e que produzia uma diminuta renda ao thesouro. N'aquelle intervallo Carlos I tentou organisar a régie, mas sem exito favoravel. Em 1652 foi prohibida a cultura de tabaco em Inglaterra, augmentado o direito de entrada, e estabelecido um imposto de licença de fabrico e venda. Em 1783 prohibiu-se a cultura na Escocia, e em 1830 na Irlanda, depois de um minucioso inquerito que esclarece muito esta questão, e fornece provas concludentes de que a liberdade de fabrico e venda com direito de entrada não póde produzir uma boa renda ao estado, sem a prohibição da cultura.

O rendimento do tabaco que no começo d'este seculo era em Inglaterra de 1.200:000 libras esterlinas ou réis 5.500:000$000, eleva se a 5.600:000 libras esterlinas, ou 25.200:000$000 réis, ou mais do quadruplo, o que demonstra que este systema assegura uma boa receita, e não tolhe o desenvolvimento do consumo. Em França, sendo a renda do monopolio do tabaco de 7.200:000$000 réis no começo do seculo, quando se estabeleceu a régie, agora eleva se a 24.300:000$000 réis, isto é, não chegou a quadruplicar, apesar de ter uma população muito superior á de Inglaterra, de haver levantado os preços de venda, e de ser o paiz onde a administração por conta do estado é a mais perfeita.

A respeito de Portugal citaremos o luminoso e bem elaborado relatorio do ex.mo sr. Antonio José d'Avila sobre o tabaco; diz elle:

«Se compararmos o augmento de consumo entre nós que foi de 22,89 % nos noventa e oito annos que decorreram de 1759 a 1856, com o de 250 % que teve logar em França nos quarenta e um annos que decorreram de 1815 a 1855, com o de 102 % que se verificou em Hespanha nos oito annos de 1847 a 1854, com o de 63,45 % que se realisou na Sardenha n'este ultimo espaço de tempo, parece-me que o resultado não póde ser favoravel ao systema de arrematação do monopolio do tabaco.»

Tendo pois o governo deliberado adoptar o systema seguido em Inglaterra para tributar o consumo do tabaco, em substituição do monopolio, pelas rasões que ficam ponderadas, restava fixar o quantum dos direitos a estabelecer nas alfandegas pela entrada dos tabacos, de modo que juntos com o imposto de fabrico, não onerassem este producto com encargos superiores aquelles que sobre elle hoje pesam, a fim de permittir a sua venda por preços inferiores aos do contrato, melhorando assim a situação do consumidor.

Para proceder n'esta averiguação e chegar a um resultado pratico, o governo partiu, da base do consumo actual das diversas especies de tabaco, assim como do conhecimento da importação para satisfazer aquelle consumo, e das despezas que se fazem com a compra, fabrico e venda do tabaco, para poder apurar, deduzidos todos os gastos do producto da venda, qual a latitude que lhe ficava para poder lançar os novos impostos sem aggravar, mas antes melhorar as condições do consumo. Segundo as informações que o governo colheu, este consumo é hoje o seguinte:

[Ver diário original]

Corresponde o consumo do tabaco de cheiro a 28 2/3 por cento do consumo total.

Corresponde o consumo do tabaco de fumo a 71 1/3 por cento.

Sendo pois o consumo o que fica indicado, teremos que para o fabrico das differentes especies de tabaco, em que o mesmo consumo ha de ter logar, será necessario despachar na alfandega em cada anno 100:000 arrobas de tabaco, ou kilogrammas................. 1.468:800

Este tabaco terá de quebras na fabrica 13 por cento approximadamente, igual a........................ 190:944

Encontrando-se n'ellas o acrescimo que deixa o rapé, na rasão de 20 por cento dos 328:276 kilogrammas, em que se calcula o consumo d'esta especie de tabaco........................ 65:655

Ficam reduzidas essas quebras a............ 125:289

Producto das ditas 100:000 arrobas em tabacos

manipulados........................... 1.343:511

que é approximadamente a quantidade que se consumirá.

Para o fabrico no paiz do tabaco em pó, do rapé, do rolo em onças e em cigarros, e de charutos, importar-se-hão:

Kilogrammas de tabaco................... 1.300:000

Abatidas as quebras na fabrica, 13 por cento... 169:000

Encontrando-se n'ellas o acrescimo no rapé... 65:655 103:345

Fica sendo o producto liquido em tabaco manipulado, kilogrammas... 1.196:655

E como o consumo provavel será de... 1.344:906

A importação de tabaco fabricado virá a dar-se em... 148:251

Computadas assim as quantidades de tabaco manipuladas e para manipular, que serão importadas, resta ver que direito será mister estabelecer para que a fazenda publica obtenha um rendimento igual ao que actualmente tira pelo monopolio. Este direito deve ser approximadamente o seguinte:

Sobre 1.300:000 kilogrammas de tabaco para ser manipulado no paiz, 1$200 réis por kilogramma... 1.560:000$000

100:000 de charutos importados, a 2$800 réis... 280:000$000

Sobre 48:251 kilogrammas de tabaco de outras especies, tambem importado, a 1$600 réis... 77:201$600

Imposto sobre o fabrico, 100 réis por kilogramma, dos 1.300:000 kilogrammas importados... 130:000$000

Licenças para venda, calculando 10:000 casas de venda a 3$000 réis cada uma, termo medio... 30:000$000

2.077:202$600

Abatendo o custo da fiscalisação, que fica a cargo do governo, e que é hoje de... 120:000$000

Fica a importancia liquida de... 1.957:202$600

que produzirá para o estado o novo systema que o governo propõe.

Actualmente o contrato produz o seguinte:

Preço da arrematação... 1.521:000$000

Direitos que pagam na alfandega os contratadores pelo despacho do tabaco 227:147$446

1.748:147$446

Differença a mais pelo novo systema..... 209:055$154

Partimos da hypothese do consumo actual; mas é provavel que este augmente, como tem acontecido até aqui, e ainda mais, porque se facilitam ao consumidor diversas qualidades de tabaco de fumo, que elle até aqui não tinha, ou só podia obter a grande custo, e por preços mais elevados.

O augmento de consumo que tem havido entre nós desde 1834 vê-se do seguinte mappa extrahido das notas da ementa:

[Ver diário original]

Este augmento de consumo que tem havido entre nós é incomparavelmente menor do que o verificado nas outras nações onde o tabaco não é dado de arrematação, o que prova que este systema não é o mais conveniente para o desenvolvimento do consumo, e apesar d'isso elle tem-se dado na escala que acabamos de indicar. Se considerarmos o consumo desde o começo do seculo, veremos que tem triplicado em França, quadruplicado em Inglaterra, tendo apenas experimentado entre nós um acrescimo de 24 por cento.

O consumo medio por habitante, tirado da estatistica de mr. Maurice Block, em relação aos homens de idade de mais de dezoito annos, é o seguinte:

Kilogr.

Hanover.................................. 6,250

Prussia, Saxonia, etc................... 4,875

Belgica.................................. 4,500

Paizes Baixos............................ 4,128

Dinamarca................................ 4,000

Austria.................................. 3,375

Noruega.................................. 3,200

França................................... 2,750

Gran-Bretanha............................ 2,508

Hespanha................................. 2,375

Suecia................................... 2,185

Portugal................................. 1,750

Pela comparação d'estes dados se vê que o consumo de Portugal é inferior ao de muitas outras nações, e que portanto é plausivel a supposição de que ha de augmentar, sobretudo com o novo systema, que permitte á Inglaterra a elevação do consumo a mais 50 por cento do que o nosso, guardadas as proporções da população.

Fundado n'estas considerações, que têem em seu abono a auctorisada opinião do ex.mo sr. Antonio José d'Avila, que já citámos, parece-nos que ninguem poderá taxar de exagerada a hypothese de que o nosso consumo augmente na totalidade 10 por cento, o que dará um acrescimo de receita na importancia de 207:720$260 réis, que addicionada ao excedente já calculado de 209:055$154 réis dá um augmento total de 416:755$414 réis.

Sendo o custo medio do tabaco que se consome n'um anno entre nós de 400:000$000 réis, e a despeza de fabricação de 130:000$000 réis, d'aqui resulta uma media de:

Custo do tabaco por kilogramma.............. Rs. 297,42

Despezas com a fabricação................... » 96,66

Custo do kilogramma do tabaco manufacturado. » 394,08

Sendo o consumo annual de 1.344:906 kilogrammas, como vimos, e o seu valor pelo preço da venda de réis 2.830:434$000 réis, o termo medio por kilogramma é de 2:104,5 réis.

Decretada a livre importação, fabrico e venda do tabaco, teremos que para a manipulação no paiz, se o custo da materia prima e mais despezas do fabrico for por

Kilogrammas de réis.............. 394,08

Impondo-lhe um direito de........ 1$200

E mais os 3 por cento para emolumentos dos empregados da alfandega... 36 1$236

O imposto de fabrico de.......... $100

1$730,08

que vendido por.................. 2$104,50

deixará o lucro de............... 374,42

correspondente a 21 por cento do capital despendido; de

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duzindo d'este lucro as despezas de administração e as commissões de venda, ficarão 12 por cento de lucro para o fabricante.

E evidente que se o fabricante, por effeito da concorrencia, ou pelo desejo de augmentar a venda dos seus productos, limitar o lucro a uma percentagem menor, e se as despezas de fabrico, administração e commissões de venda se reduzirem, entreguei á actividade e interesse individual, o que é muito provavel, isso fará com que o tabaco se venda mais barato e se melhore a sua qualidade. Portanto a taxa do direito de entrada e imposto de fabrico que se adoptaram diminuem os encargos que hoje pesam sobre o tabaco pelo systema do monopolio.

O governo não foi procurar para typo da reforma que propõe as antigas tabellas inglezas, em que os direitos eram mais elevados. Tomou por base a ultima reforma de Gladstone, consignada no bill de 27 de março de 1863, no qual reduziu os direitos sobre o tabaco, obviando assim em parte os descaminhos, e proporcionando ao mercado este genero melhor e mais barato.

Pelas indicações feitas nos calculos que precedem se vê que o direito de entrada estabelecido por kilogramma de tabaco em bruto é de 1$200 réis, de 2$800 réis para os charutos e de 1$600 réis para quaesquer outras especies de tabaco preparado; o imposto de fabrico 100 réis por kilogramma, e o de licença para venda varia, segundo a importancia das terras, desde 1$200 até 24$000 réis. Em Inglaterra o direito sobre a materia prima é de 1$525 réis por kilogramma; acrescendo mais 5 por cento addicionaes; ao passo que entre nós, pela reforma proposta ao direito de 1$200 réis só acrescem 3 por cento addicionaes; vendo-se em ultima analyse que a nossa pauta é mais favoravel a esta industria do que a ingleza.

O governo preferiu adoptar um direito maior de entrada, e estabelecer um imposto modico de fabrico e de venda em vez de diminuir aquelle e aggravar estes; porque qualquer que seja a fórma e denominação do imposto, elle sempre vae pesar do mesmo modo, em definitivo, sobre o consumo do tabaco; e deve optar se por aquelle que é de mais facil e menos despendiosa cobrança. Foi tambem por estas rasões que o governo propoz que se pagasse na alfandega no acto do despacho o imposto de fabricação de 100 réis por kilogramma, seguindo n'esta parte a opinião de Bowring e Parnell, que reclamaram esta modificação no systema inglez para diminuir os vexames. Por esta mesma ordem de considerações é que o governo igualmente se afastou do projecto apresentado ás côrtes em Hespanha pelo ministro Bruil em 1855.

O governo estabelece o drawback ou a restituição do direito na importancia de tres quartos do seu valor só em referencia ao rapé, porque é esse que faz objecto do nosso commercio de exportação, e fixa-o por este modo, sem dependencia da verificação da quantidade de liquidos que podem ir encorporados n'esta especie de tabaco manufacturado, para evitar processos difficeis de realisar nas alfandegas, afastando-se n'esta parte da pauta ingleza, que é muito casuistica e complicada a tal respeito.

A commissão do parlamento inglez que deu o seu parecer sobre o inquerito dos tabacos, disse que o systema de liberdade de importação, fabrico e venda, nos termos em que se acha estabelecido em Inglaterra, era o mais adequado para auferir uma boa renda com uma cobrança facil e segura, uma vez que se prohibisse a cultura, se não exagerassem os direitos de entrada e se estabelecessem leis repressivas da fraude. A cultura é e continua prohibida entre nós; os direitos não são exagerados, mas ficam inferiores aos estabelecidos na ultima pauta ingleza. O que resta é organisar uma boa fiscalisação, a exemplo do que se fez em Inglaterra, acrescentando á das alfandegas toda aquella que hoje tem contrato do tabaco, concentrando a importação e fabrico por ora em Lisboa e Porto, a fim de exercer uma activa vigilancia sobre as fabricas e sobre as alfandegas, e manter uma legislação penal especial que, posto seja menos rigorosa e vexatoria do que a consignada na lei de 27 de junho de 1857, e no alvará, e condições do contrato, se conserve todavia tão rigorosa e severa quanto é necessario para dar as precisas garantias contra os descaminhos, abusos e fraudes.

São estes os principios baseados n'uma bem entendida precaução aconselhada pela experiencia, que determinaram as diversas disposições da proposta de lei que lhe dizem respeito. Depois a pratica indicará as modificações que se possam fazer no sentido da maior liberdade, sem comprometter esta receita. Por falta d'estas precauções, o tabaco em folha, que se conseguisse introduzir no paiz por contrabando, poderia ser manipulado nas fabricas escapando á acção do fisco, e o tabaco manufacturado, que do mesmo modo se introduzisse, poderia dar-se como manipulado no paiz, deixando de pagar os direitos que a lei lhe impõe.

Pelo que respeita ao receio da diminuição da renda por effeito do contrabando, não parece ao governo que elle seja fundado; porque continua a mesma fiscalisação que hoje existe, e o incitamento para o commercio illicito será menor, visto que os tabacos se podem vender por preços mais baixos, adoptado o systema que o governo propõe. Em 1840, dizia mr. Cambon, relator da commissão encarregada de dar o seu parecer sobre a questão do tabaco perante o parlamento francez que «o systema da liberdade, diminuindo o preço do tabaco, augmentaria o seu consumo; que daria os melhores resultados para o commercio e a agricultura; e que a objecção que se fazia com a impossibilidade em que se veria a administração para exercer a sua fiscalisação, não podia resistir a uma discussão séria».

Hoje as diversas especies de tabaco consumido entre nós, e os seus valores pelos preços de venda são os que constam da seguinte tabella:

[Ver diário original]

D'onde se vê que as fontes principaes de rendimento são o rapé, que produz 709:440$000 réis, o rolo em onças e cigarros que produz 518:320$000 réis, os charutos de 10 réis que produzem 608:000$000 réis, e a folha picada que produz 523:128$000 réis.

No rapé não póde haver receio de contrabando, não só porque o nosso rapé tem um fabrico particular, diverso do dos outros paizes e accommodado ao gosto do publico, mas porque o seu preço é menor, pois se vende a 2$091 réis o kilogramma, ao passo que em Hespanha custa 3$263 réis, e em França 2$160 réis. No rolo em onças e cigarros tambem se não deve temer o contrabando, nem hoje existe, porque não ha esta especie de tabaco em Hespanha, e em França se vende a 1$980 réis o kilogramma, ao passo que entre nós o seu preço é de 1$743 réis. Pelo que respeita aos charutos de 10 réis, não os ha nos outros paizes iguaes na qualidade e no peso de 4,80 grammas, que se vendam por um preço tão modico. Em referencia á folha picada, em onças, o seu preço entre nós é de 1$917 réis, ao passo que em Hespanha a do tabaco filippino se vende a 1$919 réis, e a do tabaco commum a 1$727 réis o kilogramma, differença que não dá bastante margem para os riscos e despezas de contrabando; a folha picada superior vende-se em França a 2$160 réis, e a inferior, que não póde concorrer com a nossa, a 1$800 réis.

Portanto vê-se que não temos que receiar o commercio illicito no tabaco manufacturado, que fórma a base do nosso consumo, e a fonte principal d'esta receita; e tanto isto é assim, que o contrabando hoje, segundo as informações que o governo colheu, só se faz em charutos superiores, principalmente nos denominados «sevilhanos» que se vendem a 30 réis, e em alguns outros de maior preço. Ora, o consumo de charutos superiores entra apenas hoje no nosso consumo geral por um valor de 50:000$000 réis; por conseguinte já se vê que o risco de contrabando n'esta parte pouco desfalque póde produzir na renda. Nos charutos de 20 réis, de que se vendem hoje 166:000$000 réis, tambem pelas mesmas rasões ponderadas a respeito dos charutos de 10 réis, pouco ou nada ha a temer da concorrencia illicita.

Emquanto ao descaminho no que respeita ao tabaco em bruto, é pouco de receiar, porque o contrabando é muito mais difficil e menos productivo em objectos de grande volume e pequeno valor, como este é. Alem d'isso, em Hespanha é prohibida a venda da folha do tabaco, e portanto pela fronteira de terra não temos a receiar a sua introducção; e em referencia ás costas maritimas é a do Algarve, pela sua proximidade de Gibraltar, que mais se presta ao commercio illicito, a que temos meios de obviar concentrando ali uma maior e mais activa fiscalisação.

Tendo o governo melhorado a organisação do regimen fiscal nas fronteiras, e juntando agora a esta fiscalisação a que pertencia ao contrato do tabaco, não ha motivos para suppor que não seja bastante efficaz. Demais, temos a vigilancia e fiscalisação interna nas fabricas e nos districtos, para evitar a cultura da herva santa, que será complementar á das fronteiras terrestres e maritimas, e poderá apprehender qualquer tabaco que tenha escapado sem pagar o direito.

O governo não vê pois motivo para que se suspeite a probabilidade do augmento de contrabando, que produza um desfalque na renda do tabaco; antes pelo contrario, todas as rasões ponderadas auctorisam a suppor que esse desfalque deverá ser menor.

Por ultimo acrescentaremos a opinião emittida pelo ex.mo sr. Antonio José d'Avila, no seu já citado relatorio, sobre este ponto; diz elle: «A unica objecção plausivel que se póde fazer ao estabelecimento d'este ultimo systema régie é o receio de que a fiscalisação affrouxe, e o contrabando augmente por tal fórma, que diminua muito o rendimento d'este monopolio; porém este receio não póde justificar-se em vista dos resultados que se têem obtido na Hespanha, paiz muito mais accessivel ao contrabando do que o nosso Portugal, quando não fosse senão pela circumstancia de ter junto a si Gibraltar e as provincias vascongadas que, como já observei, são pelos seus fóros isentas de monopolios, e inundara com muita facilidade de generos estancados as provincias limitrophes, como é conhecido em toda a Hespanha e consta dos documentos que remetto a V. ex.ª».

«Nem comprehendo como possa haver esse receio, depois dos factos que expuz, e que tornam patente o insignificante augmento que tem tido entre nós este rendimento nos ultimos cem annos, quando a população tem consideravelmente augmentado, e o consumo do tabaco cresce todos os dias numa grande progressão. Se o consumo legal não manifesta pois este augmento, é porque o contrabando cresce tambem na mesma, ou em quasi igual progressão, o que prova a inefficacia do systema actual para o reprimir.»

Na proposta de lei, que o governo tem a honra de vos apresentar, declara-se a obrigação que têem os contratadores de pagar os novos impostos por todo o tabaco que tiverem no momento de terminar o contrato; sendo fóra de duvida que elles não têem direito de se subtrahir á regra commum applicavel a todos os fabricantes de tabaco. A quantidade d'este genero existente em todos os depositos e administrações do contrato que deve ser submettida ao pagamento de direitos, deduzidos os que já pagaram pela pauta em vigor, não é difficil de verificar independentemente da declaração dos contratadores, quer pelos varejos que se devem dar, e inventario geral que se deve fazer, quer pelo conhecimento que ha do tabaco que receberam por transferencia do contrato anterior d'aquelle que depois despacharam, e do que tem sido absorvido pelo consumo; esclarecimentos estes que estão ao alcance do governo. Como esta quantidade de tabaco costuma ser, senão para o fornecimento de um anno, ao menos para uma grande parte d'elle, o estado poderá realisar desde logo uma avultada importancia da receita que o tabaco deve produzir; o que é mais uma garantia para não receiar o desfalque na renda.

Seria uma falta de equidade e de justificada contemplação pela sorte dos actuaes empregados do contrato do tabaco se o governo não attendesse a que, pela adopção do novo systema que propõe, elles ficariam, privados da posição permanente com que contavam para o seu sustento e o de suas familias. Tanto o pessoal de fiscalisação que o governo conserva por carecer d'elle, como o de contabilidade, que aproveitará do modo mais conveniente ao serviço publico, são pois considerados na proposta de lei, que o governo vos apresenta.

A idéa de passar do contrato para a liberdade, adoptando por algum tempo a régie como systema de transição, arriscaria o estado a grandes perdas sem vantagem nenhuma para o publico; obrigaria o thesouro, como já tivemos occasião de dizer, a um avultado desembolso de capital para a compra da fabrica e dos tabacos, sujeitando se depois a vender pelo que lhe dessem o que havia comprado, e a um desfalque de rendimento necessariamente resultante d'estas mudanças e transtornos de administração, ficando depois do mesmo quem arrematasse os tabacos e a fabrica n'uma posição excepcional em referencia aos outros concorrentes; por isso que durante a administração do monopolio por conta do estado, este tambem não podia consentir, sem sacrificio do rendimento, que se introduzissem tabacos e se estabelecessem fabricas. De sorte que, o que provavelmente resultaria d'esta desordem administrativa, seria o mesmo que aconteceu em 1700, quando a junta do tabaco, existindo a régie, estudava a melhor fórma de administrar este rendimento, isto é, voltava-se á idéa da arrematação como uma necessidade.

Pelo que respeita ás ilhas adjacentes o governo, accedendo ás reclamações de ha muito feitas por aquelles povos, e querendo experimentar um outro regimen que cria uma nova fonte de riqueza publica sob o ponto de vista agricola, propõe que ali se estabeleça a liberdade de cultura, fabrico e venda do tabaco, recebendo o estado o equivalente da renda liquida que das ilhas tira o contrato, em direitos de entrada estabelecidos com caracter protector da nova cultura, e em addicionaes ás contribuições directas que as mesmas ilhas pagam.

Por este modo poder-se-ha tentar a experiencia da livre cultura e fabrico do tabaco no archipelago dos Açores e Madeira, debaixo dos melhores auspícios para o seu bom exito, desembaraçando os proprietarios, que se dedicarem a esta nova exploração, do imposto sobre a cultura que, sobre ser de muito difficil e vexatoria cobrança, tolheria, por não poder deixar de ser gravoso, o desenvolvimento d'esta industria. Se a experiencia produzir um bom resultado, como parece dever esperar-se, crear-se-ha uma nova fonte de riqueza para as ilhas, que poderá compensar a falta da producção vinicola, e fornecer tabaco nacional em concorrencia com o estrangeiro para a fabricação d'este genero no continente do reino.

Ha mais tempo que o governo desejara ter apresentado a proposta de lei, que submette agora á vossa apreciação; mas os negocios importantes que lhe occuparam a attenção e a do parlamento na anterior sessão legislativa não lhe permittiram dedicar a este tão grave assumpto todo o estudo e meditação que elle exigia, a fim de escolher, entre os diversos systemas, aquelle que lhe parece resolver esta questão do modo mais conveniente ao paiz. Nem d'esta demora se lhe afigura que resultassem inconvenientes, porque qualquer que fosse a anticipação com que o governo apresentasse a sua proposta, em referencia ao praso em que deve terminar o contrato, é certo que, pelas condições d'este, não é permittida, emquanto elle durar, a introducção de tabacos, nem o estabelecimento de fabricas para os preparar. De sorte que a prevenção só poderia servir para que aquelles que se quizessem dedicar a esta industria tivessem oc-

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casião de fazer algumas combinações, ou encommendar alguma remessa de tabaco para a epocha em que começasse a vigorar a liberdade do fabrico, acrescendo, pelo que respeita ao tabaco de fumo, que a concorrencia é facil de estabelecer em muito breve tempo, vista a proximidade dos principaes depositos d'este genero, que se acham em Gibraltar, em diversos portos de Inglaterra e da Hollanda.

O governo, solicito no empenho de facilitar quanto possivel a concorrencia em beneficio do consumidor, chamou a attenção do publico por portaria de [...] de janeiro do corrente anno sobre a faculdade que cada um tinha de encommendar tabaco e de o fazer depositar na alfandega de Lisboa, para os poder ter á mão no momento em que termine o contrato e comece o novo regimen de liberdade. Para assegurar mais o publico de que os preços de venda das diversas especies de tabaco não serão augmentados por effeito de faltar no primeiro momento a concorrencia, pelo menos em certa escala, basta lembrar a obrigação que pela condição 13.ª do contrato têem os contratadores de deixar tabaco das differentes especies para o consumo de dois mezes, alem do praso era que elle finda; o que desvanece todo o receio de que possa haver falta de tabaco ou elevação dos preços, pelo menos durante esses dois mezes.

Fundado nas considerações que acabo de expor-vos, tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° Fica abolido o monopolio do tabaco desde 1 de maio de 1864.

Art. 2.° Do referido dia 1 de maio em diante, é livre o fabrico e venda do tabaco no continente do reino, ilhas adjacentes e Macau.

Art. 3.° Toda a pessoa ou associação que quizer fabricar ou vender tabaco no continente do reino, deve previamente habilitar-se com a competente licença.

§ 1.° O governo designará, se assim o julgar conveniente, as terras onde, alem das cidades de Lisboa e Porto, poderão ser estabelecidas manufacturas de tabaco.

§ 2.° Uma lei especial regulará o fabrico, venda e cultura nas ilhas adjacentes (Açores e Madeira).

Art. 4.° De todos os tabacos que se importarem pagar-se-hão nas alfandegas os seguintes direitos:

Tabaco em folha ou em rolo, por kilogramma 1$200 réis;

Charutos, por kilogramma 2$800 réis;

Outras quaesquer especies de tabaco manipulado, por kilogramma 1$600 réis.

§ 1.° Não é applicavel ao tabaco a disposição do artigo 27.º dos preliminares da pauta geral das alfandegas.

§ 2.° O tabaco em folha ou em rolo só poderá ser importado pelas alfandegas de Lisboa e Porto, e não poderá ser despachado senão para as fabricas devidamente habilitadas.

Art. 5.° Pela exportação do rapé fabricado no paiz haverá a restituição de tres quartos do direito.

Art. 6.° O tabaco de manufactura nacional, uma vez exportado, não poderá ser mais admittido, ainda mesmo a pretexto de beneficiação, e aquelle que for encontrado nas alfandegas em estado de ruina será inutilisado.

Art. 7.º Todo o fabricante de tabaco fica sujeito a um imposto de industria na rasão de 100 réis por kilogramma de tabaco em rolo ou em folha, que despachar para a fabrica; sendo este imposto pago no acto do despacho.

Art. 8.° Todo o individuo que quizer vender tabaco manipulado é obrigado a munir-se da competente licença, com previo pagamento de um imposto, o qual será de 1$200 até 24$000 réis, conforme o local e o modo por que a venda for feita.

§ 1.° Estas licenças não isentam os vendedores de tabaco de outras contribuições a que estiverem sujeitos pelas industrias que exercerem.

§ 2.° É prohibida a venda do tabaco que não for manipulado.

Art. 9.°. Pela infracção ao disposto no artigo antecedente, ficam sujeitos os infractores a uma multa, que não será inferior a dez vezes o valor da licença nem superior a vinte.

Art. 10.° Todo o estabelecimento onde se fabricar tabaco fica sujeito á immediata inspecção e fiscalisação da auctoridade que para isso for designada pelo governo, a qual conhecerá que quantidades se fabricam de tabaco, e suas differentes especies, bem como se n'esse fabrico se empregam hervas ou plantas estranhas ao tabaco, ou quaesquer ingredientes nocivos á saude publica.

Art. 11.° É prohibida no continente do reino a plantação e cultura do tabaco (herva santa), e toda a pessoa que plantar, semear ou cultivar tabaco, fica sujeita ás mesmas penas que os descaminhadores de direitos do tabaco; isto alem da destruição da mesma plantação.

Art. 12.° Aquelle que no fabrico do tabaco empregar hervas ou plantas estranhas ao mesmo tabaco, ou outros quaesquer ingredientes prejudiciaes á saude publica, será condemnado na multa de 500$000 réis a 1:000$000 réis.

§ unico. No caso de reincidencia será condemnado no dobro da multa e no encerramento da fabrica; não lhe sendo mais permittido abrir estabelecimento d'esta ordem.

Art. 13.° Aquelle que commetter o crime de descaminho de direitos do tabaco será punido, alem do perdimento do genero apprehendido e dos transportes, com uma multa no tresdobro do valor do tabaco, comprehendidos os direitos, e dos transportes; e com prisão de um mez a um anno, segundo a gravidade do crime.

§ 1.° Nos casos de reincidencia as multas serão impostas em dobro pela segunda, e em tresdobro pela terceira vez; e a pena de prisão poderá ser respectivamente applicada até dois e tres annos; mas sempre será contado aos réus no cumprimento da pena o tempo de prisão soffrido durante o processo.

§ 2.° As penas estabelecidas n'este artigo são applicaveis aquelles que, sendo sabedores de que os direitos não foram pagos, commerciarem em tabaco.

Art. 14.º Quando o crime de descaminho de direitos de tabaco for praticado por individuo, que exerça qualquer funcção publica, a sentença condemnatoria importará o perdimento da mesma funcção.

Art. 15.° Aquelles que auxiliarem de qualquer modo o descaminho de direitos do tabaco serão considerados como cumplices no mesmo crime.

Art. 16.° Toda a auctoridade civil, militar ou judicial, que deixar de proceder contra os infractores ao disposto na presente lei, ou que não promover os respectivos processos, será punida nos termos da lei commum em vigor.

Art. 17.° De toda a tomadia de tabaco terão os apprehensores e o denunciante, quando o haja, metade do producto d'ella; se porém a apprehensão se verificar tambem no réu, n'este caso dois terços do mesmo producto pertencerão aquelles.

Art. 18.º Nos processos de tomadias de tabaco observar-se-ha, no que for applicavel, na conformidade da presente lei, o disposto nos artigos 349.° a 354.° e seus paragraphos da novissima reforma judiciaria.

§ 1.º Não é admissivel fiança n'estes crimes.

§ 2.° Os réus presos serão sempre remettidos ao poder judicial dentro de vinte e quatro horas.

Art. 19.° De todo o tabaco que ficar em ser, findo o actual contrato, quer nas fabricas, quer nas administrações, nos estancos ou em quaesquer depositos, pagará o mesmo contrato os direitos e impostos estabelecidos na presente lei, levando-se todavia em conta no direito de entrada aquelle que os contratadores tiverem pago na alfandega quando despacharam é tabaco para a fabrica.

Art. 20.° Todos os estabelecimentos onde se arrecadar, fabricar e vender tabaco ficam sujeitos á inspecção das auctoridades de saude, conforme a legislação e regulamentos sanitarios em vigor.

Art. 21.° Os actuaes empregados na contabilidade do contrato do tabaco ficam considerados como se tivessem pertencido a uma repartição publica, para o effeito de serem considerados como addidos ás diversas repartições do estado, a cujo serviço ficam obrigados; abonando-se-lhes os seus vencimentos nos termos do artigo 2.° do decreto de 16 de janeiro de 1834, quando não continuarem a ter vencimento e emprego na empreza do extincto contrato.

§ unico. Em igualdade de circumstancias, o pessoal estipendiado nos termos d'este artigo será preferido na admissão para os empregos das repartições do estado; cessando desde então o vencimento concedido por esta lei.

Art. 22.° Os actuaes empregados na fiscalisação do contrato do tabaco ficarão encorporados, para todos os effeitos, no pessoal da fiscalisação externa das alfandegas, e em tudo a elle equiparados.

Art. 23.° O governo fará todos os regulamentos necessarios para a boa execução d'esta lei.

Art. 24.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 19 de janeiro de 1864. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

Proposta de lei fixando o numero e vencimento dos empregados da junta do credito publico, apresentada pelo ministro e secretario d'estado dos negocios da fazenda, o sr. Joaquim Thomás Lobo d'Avila, em sessão de 19 do corrente

Senhores. — A organisação da contabilidade publica por um systema uniforme era uma das primeiras necessidades do paiz.

Compenetrado d'esta urgentissima necessidade, e dedicando-me a tão grave assumpto com o mais desvelado empenho, tive a honra de submetter á approvação de Sua Magestade o regulamento geral de contabilidade, que faz parte do decreto de 12 de dezembro proximo findo.

O relatorio que precede o mesmo decreto apresenta e desenvolve por tal fórma os seus fundamentos, que qualquer cousa que eu agora acrescentasse fôra uma repetição ociosa.

Devo porém chamar especialmente a vossa attenção para as rasões que me moveram a proceder pelo modo por que o fiz sobre um dos pontos essenciaes da administração da fazenda. Refiro-me á contabilidade relativa ao pagamento dos juros da divida publica consolidada, que mal podia deixar de comprehender no regulamento geral sem destruir o nexo que muito importava manter n'um trabalho de similhante natureza.

Tratando da materia vim no conhecimento de que, pela mais flagrante contradicção do espirito com a letra da carta de lei de 8 de junho de 1843, existiam na junta do credito publico dois fieis, um para receber e outro para pagar, sem haver um thesoureiro responsavel pelos avultados fundos que a junta administra, resultando d'ahi, por uma parte, o facto inadmissivel de figurar ella de seu proprio thesoureiro, accumulando as funcções incompativeis de ordenador e pagador das despezas a seu cargo, com quebra dos principios rudimentaes que regulam o assumpto; e por outra parte a absoluta impossibilidade de se cumprirem as disposições dos n.ºs 1.° e 14.° do decreto com força de lei. n.° 1 de 19 de agosto de 1859, o qual presuppondo a existencia n'aquella repartição de um thesoureiro pagador, commetteu ao tribunal de contas o encargo de julgar annualmente as d'esse funccionario, e de comparar o resultado do respectivo julgamento com as contas annuaes de exercicio da mesma junta, para o facto da sua declaração geral de conformidade, o que havia dado origem a repetidos conflictos, exigindo o tribunal a litteral execução da mesma lei, que a junta declarava inexequivel.

Circumstancias tão anormaes, em que se dava a par de um grave erro administrativo, um desacato formal e permanente á lei, fundado na inexequibilidade dos seus preceitos, aliás indispensaveis, exigiam a adopção de providencias que removessem de prompto tamanho estorvo á marcha regular do serviço publico.

Cingindo-me, portanto, ao espirito da carta de lei de 8 de junho de 1843, e á letra do decreto com força de lei n.° 1 de 19 de agosto de 1859, consignei no artigo 142.° do sobredito regulamento geral de contabilidade a impreterivel necessidade de um thesoureiro pagador doa juros da divida publica interna, regulando convenientemente o exercicio das funcções de similhante emprego.

Em vista d'esta succinta exposição, comprehendereis, senhores, os justos fundamentos que determinaram aquella providencia, tão util como indispensavel, reclamada pelas indicações mais triviaes do serviço; mas para que ella possa produzir todos os seus effeitos, carecendo de ser definitiva mente estabelecida por um acto legislativo, não só no que respeita aos vencimentos que deve ter o thesoureiro pagador da junta do credito publico, senão tambem quanto á organisação mais conveniente do pessoal doa respectivos empregados; é por estas considerações que tenho a honra de apresentar-vos a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° O numero e os vencimentos dos empregados da junta do credito publico, são os que designa a tabella junta que faz parte da presente lei.

Artigo 2.° Fica revogado o disposto no artigo 4.º da carta de lei de 8 de junho de 1843, e toda a demais legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, 19 de janeiro de 1864. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

Tabella dos empregados da junta do credito publico, e dos respectivos vencimentos

1 Contador geral................................ 1:200$000

2 Chefes de repartição, a 800$000 réis.......... 1:600$000

2 Primeiros officiaes, a 600$000 réis........... 1:200$000

4 Segundos officiaes, a 480$000 réis............ 1:920$000

6 Amanuenses de 1.ª classe, a 300$000 réis...... 1:800$000

6 Amanuenses de 2.ª classe, a 192$000 réis...... 1:152$000

1 Thesoureiro pagador:

Ordenado.............................. 1:200$000

Gratificação para falhas.............. 400$000 1:600$000

1 Fiel do thesoureiro pagador:

Ordenado.............................. 500$000

Gratificação para falhas.............. 100$000 600$000

1 Ajudante do fiel.............................. 300$000

1 Porteiro...................................... 480$000

4 Continuos, a 280$000 réis..................... 1:120$000

12:972$000

Ministerio dos negocios da fazenda, 19 de janeiro de 1864. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

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